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CAPÍTULO I O MODELO EUROPEU DO DESPORTO 1 - O MODELO EUROPEU DO DESPORTO A partir do fim da Segunda Guerra Mundial e até meados da década de 80, coexistiam na Europa dois modelos de desporto, a saber, o modelo da Europa de Leste e o modelo da Europa Ocidental. O primeiro tinha uma orientação mais ou menos ideológica: o desporto era parte integrante da propaganda. Nos países da Europa Ocidental desenvolveu-se um modelo misto, em que coexistiam as iniciativas de organizações governamentais e não governamentais. É importante sublinhar que o desenvolvimento do desporto foi paralelo ao da televisão, basicamente em condições de exclusividade da televisão pública. O desporto na Europa Ocidental é assim resultado de acções públicas e privadas. Nos países do Norte da Europa, o Estado não desempenha uma função reguladora, ao passo que, nos países do Sul, o Estado intervém na regulação do desporto.

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CAPÍTULO IO MODELO EUROPEU DO DESPORTO

1 - O MODELO EUROPEU DO DESPORTO A partir do fim da Segunda Guerra Mundial e até meados da

década de 80, coexistiam na Europa dois modelos de desporto, a saber, o modelo da Europa de Leste e o modelo da Europa Ocidental. O primeiro tinha uma orientação mais ou menos ideológica: o desporto era parte integrante da propaganda. Nos países da Europa Ocidental desenvolveu-se um modelo misto, em que coexistiam as iniciativas de organizações governamentais e não governamentais. É importante sublinhar que o desenvolvimento do desporto foi paralelo ao da televisão, basicamente em condições de exclusividade da televisão pública. O desporto na Europa Ocidental é assim resultado de acções públicas e privadas. Nos países do Norte da Europa, o Estado não desempenha uma função reguladora, ao passo que, nos países do Sul, o Estado intervém na regulação do desporto.

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1.1 Organização do desporto na Europa Nos Estados-Membros, o desporto está organizado tradicionalmente em

federações nacionais (geralmente uma por país) que, por sua vez, estão associadas em federações europeias e internacionais. Esta estrutura forma uma pirâmide hierárquica.

1.1.1 Estrutura em pirâmide

1.1.1.1 Os clubes Os clubes estão na base da pirâmide. Proporcionam a toda a população a

possibilidade de praticar desporto a nível local, promovendo assim o conceito do “desporto para todos” e apoiando a geração de desportistas. A este nível, o voluntariado é especialmente importante e benéfico para o desenvolvimento do desporto europeu. Em Portugal, por exemplo, há cerca de 70 000 treinadores que não são remunerados e 40 000 membros de direcções e comités que exercem as suas funções em regime de voluntariado.

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Uma das características do desporto europeu a este nível reside no facto de ser praticado por amadores. Tal como sublinhado por Marcelino Oreja, membro da Comissão Europeia responsável pelo desporto, no discurso proferido no 7º Fórum Europeu do Desporto, em 1997, o desporto amador reflecte o verdadeiro amor ao desporto e a participação desinteressada numa actividade desportiva. Neste domínio, o desporto exerce uma função social importante, contribuindo para aproximar as pessoas. Na Áustria, por exemplo, cerca de 39% da população é sócia de um clube ou de uma federação desportiva.

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1.1.1.2 As federações regionais

As federações regionais situam-se imediatamente acima dos clubes. O seu campo de acção circunscreve-se normalmente a uma região, onde são responsáveis pela organização de campeonatos e pela coordenação do desporto a nível regional. Nalguns países, por exemplo, na Alemanha, há organizações regionais onde estão filiados todos os clubes de uma região.

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1.1.1.3 As federações nacionais

No nível seguinte situam-se as federações nacionais, uma para cada modalidade. Geralmente todas as federações regionais estão filiadas na respectiva federação nacional. Estas federações regulam todas as questões gerais da sua modalidade, representando simultaneamente essa modalidade nas federações europeias ou internacionais. Organizam também os campeonatos nacionais e actuam como órgãos reguladores. Uma vez que existe uma única federação nacional para cada modalidade, estas federações têm uma posição monopolista. Por exemplo, há uma única federação nacional de futebol em cada país. Só esta federação pode organizar campeonatos nacionais oficiais. Nalguns países, as funções da federação são reguladas pela legislação nacional.

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1.1.1.4 As federações europeias

No topo da pirâmide estão as federações europeias, organizadas à imagem das federações nacionais. Só se pode filiar na federação europeia uma única federação nacional de cada país. Estas organizações procuram afirmar a sua posição impondo regras que prevêem geralmente sanções para os participantes em campeonatos que não foram reconhecidos ou autorizados pela federação internacional.

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As federações desportiva europeias

As federações desportiva nacionais

As federações desportiva regionais

As federações das bases / clubes

1.1.2 Um sistema de promoção e despromoçãoA estrutura em pirâmide implica a interdependência entre os diferentes níveis, não só doponto de vista da organização, como também do da competição, uma vez que sãoorganizadas competições a todos os níveis. Um clube de futebol que joga a nívelregional pode qualificar-se para os campeonatos a nível nacional ou mesmointernacional (por exemplo, a taça UEFA), ganhando jogos e sendo promovido.

Poroutro lado, um clube pode ser despromovido, quando não consegue qualificar-se. Adespromoção e a promoção são características comuns a todos os campeonatosnacionais. Essa abertura a novos participantes torna os campeonatos nacionais maisinteressantes do que se fossem competições fechadas.

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Este sistema de promoção e despromoção existe também a nível europeu. As federações nacionais de todas as modalidades (ou seja, o topo da pirâmide) estão filiadas nas respectivas federações europeia e internacional que, por seu turno, organizam campeonatos europeus e internacionais. Contudo, a qualificação para essas competições é decidida geralmente a nível nacional.

Este sistema de promoção e despromoção é uma das principais características do modelo europeu do desporto. Os Estados Unidos criaram um modelo de campeonatos fechados e de federações desportivas múltiplas. As mesmas equipas que participam num campeonato continuam a jogar sempre na mesma liga. Na Europa, a tendência vai no sentido da combinação dos dois sistemas. Numa proposta recente da UEFA, os clubes qualificar-se-iam não só através de um sistema de promoção e despromoção, como também preenchendo determinados critérios económicos e técnicos.

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1.2 Características do desporto na Europa 1.2.1 Abordagem a partir das bases Uma das características do desporto europeu reside no facto de

assentar numa abordagem que parte das bases. O desporto desenvolve-se a partir do nível dos clubes, que organizam o desporto a nível local, não estando tradicionalmente ligado ao Estado ou a uma empresa.

Tal como comprovado pelo facto de o desporto europeu ser geralmente dirigido por amadores e por voluntários não remunerados, que são responsáveis pela organização do desporto na Europa e para quem o desporto representa um passatempo e um contributo prestado à sociedade. Neste aspecto, o desporto europeu difere do desporto americano, que é uma actividade comercial. Nos Estados Unidos, o desporto baseia-se numa abordagem mais profissional.

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1.2.2 Ligação à identidade nacional Como sublinhado na Declaração de Amesterdão, o

desporto na Europa tem um significado social importante. A declaração refere explicitamente que o desporto desempenha um papel na formação da identidade e na aproximação das pessoas.

O desporto representa e reforça a identidade nacional e regional, dando às pessoas a sensação de pertencerem a um grupo. Aproxima jogadores e espectadores, proporcionando a estes últimos a possibilidade de se identificarem com a sua nação, contribui para a estabilidade social e é um símbolo da cultura e da identidade nacionais.

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Embora, entretanto, globalização também já tenha começado a afectar o desporto europeu, este pode ser considerado como uma das últimas paixões nacionais. A ligação à identidade nacional ou mesmo regional é, consequentemente, uma das características do desporto na Europa.

1.2.3 Competições internacionais

Considera-se que as equipas nacionais representam a nação e é de tradição na Europa que os diferentes países entrem em competição entre si e organizem competições

internacionais.

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Na Europa, o desporto é uma das últimas paixões nacionais. Há uma necessidade psicológica de confronto entre os países e o desporto é uma forma de confronto sem derramamento de sangue. As competições internacionais constituem para os países europeus uma oportunidade de afirmarem a sua cultura e as suas tradições, salvaguardando assim a diversidade cultural que é uma das características da Europa. Neste aspecto a Europa difere dos Estados Unidos, onde não há necessidade de competições entre os estados federais. A Califórnia, por exemplo, não tem de competir com o Texas.

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1.2.4 Aspectos negativos A função social de formação da identidade pode ter aspectos

negativos, tais como o ultra nacionalismo, o racismo e a intolerância.

No passado, as ditaduras tiraram partido da popularidade do desporto para promover a sua própria ideologia. O regime nazi, por exemplo, utilizou os Jogos Olímpicos de Berlim como instrumento de promoção da sua ideologia. As vitórias das equipas nacionais são frequentemente utilizadas como um instrumento de propaganda. O regime de Mussolini apresentou as vitórias da Itália nos campeonatos do mundo de futebol de 1934 e 1935 como prova da superioridade do fascismo sobre a democracia. E nos países do antigo bloco de Leste o desporto tinha também uma orientação ideológica e era utilizado para fins de propaganda.

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A violência dos “hooligans” é um problema com que se confronta actualmente o desporto europeu. O hooliganismo nem sempre tem conotações políticas: alguns espectadores vítimas da exclusão económica ou social aproveitam as manifestações desportivas para dar largas à sua frustração. Estas consequências negativas do desporto são desconhecidas nos Estados Unidos.

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1.3 Importância do desporto na Europa Tradicionalmente, os Estados-Membros da União Europeia

sempre foram palco de uma percentagem significativa de grandes manifestações desportivas: por exemplo, 54% dos Jogos Olímpicos de Verão, entre 1896-1996, e 50% dos campeonatos do mundo de futebol, entre 1930 e 1998. Esta concentração significativa de manifestações desportivas de nível mundial na UE é em parte um fenómeno histórico. A revolução industrial começou na Europa, e o desenvolvimento económico e social que se lhe seguiu contribuiu para o desenvolvimento do desporto na Europa. O desporto também teve a sua origem na Europa. O movimento olímpico, por exemplo, foi consequência de uma iniciativa europeia.

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Por outro lado, a maioria das principais organizações desportivas internacionais estão sediadas na Europa. Por todas estas razões, a Europa pode ser considerada como o grande motor do desporto a nível mundial e a evolução mais recente demonstra que o desporto europeu é muito dinâmico. Apresentamos no ponto seguinte as principais tendências da evolução do desporto na Europa.

Existe um modelo europeu de desporto com características específicas, que foi exportado para quase todos os países e continentes, à excepção da América do Norte. O desporto europeu tem uma estrutura única e essas características específicas devem ser tidas em conta no desenvolvimento futuro do desporto na Europa.

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2 - EVOLUÇÃO 2.1 Tendência para a globalização

Até aos anos 50, o desporto a nível europeu

estava associado às equipas e aos representantes nacionais. Só as equipas e os indivíduos que representavam o seu país participavam em competições no estrangeiro. Um dos primeiros exemplos destas competições é o Campeonato Mundial de Futebol, que data da primeira metade do século XX.

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Depois da Segunda Guerra Mundial, os países europeus chegaram à conclusão de que, no seu próprio interesse, era necessário evitar futuros conflitos e preservar a paz, através de uma acção comum. Esta evolução no sentido da cooperação esteve na origem da primeira Comunidade Europeia, em 1952, e da criação de uma televisão pan-europeia com a fundação da Eurovisão e da União Europeia de Radiodifusão.

Paralelamente a estes primeiros passos no sentido da integração europeia a nível político, surgiram as primeiras competições desportivas europeias. A UEFA foi fundada em 1954, e com ela as primeiras competições entre clubes europeu. O jornal francês “L’Équipe” sugeriu em 1955 a criação de um Campeonato Europeu.

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Embora o Campeonato do Mundo de Futebol date da década de 1930, só recentemente o desporto adquiriu um carácter global. E um dos principais factores que contribuíram para tal foi a transmissão televisiva das manifestações desportivas mais populares, como os Jogos Olímpicos e o Mundial de Futebol.

2.2 As principais mudanças da década de

1980

O COI resolveu abolir a distinção entre o desporto amador e o

desporto profissional, abrindo a todos os atletas a participação nos Jogos Olímpicos. Permitiu também que os jogos tivessem patrocinadores comerciais, contribuindo assim para a comercialização do desporto em geral. Os patrocínios são hoje uma das principais fontes de financiamento do desporto.

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Em meados da década de 1980, a televisão estatal perdeu o seu monopólio na maioria dos países da Europa Ocidental. Tal como nos Estados Unidos, surgiu uma concorrência feroz pelos direitos de transmissão televisiva das principais manifestações desportivas.

A venda dos direitos de transmissão televisiva e os patrocínios são hoje responsáveis por 65% - 85% do financiamento das manifestações desportivas, sendo a principal fonte de financiamento do desporto profissional na Europa. Porém, outro aspecto a ter também em conta prende-se com a rápida e extensa evolução tecnológica da televisão.

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O bloco de Leste desapareceu, e com ele as restrições impostas aos atletas, o que contribuiu para aumentar o número de atletas profissionais dos países da Europa Central e Oriental.

O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias

reconheceu, no processo Bosman, que não há razão para que os atletas profissionais não usufruam dos benefícios do mercado único e, nomeadamente, da livre circulação dos trabalhadores.

Consequentemente, as competições nacionais foram

abertas a jogadores de toda a Europa, o que contribuiu para a revitalização das grandes ligas europeias5.

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2.3 Evolução recente da década de 1990 Para fazer face à criação das superligas europeias, muitos

clubes importantes tiveram de conceber novas formas de financiamento. Os clubes de futebol (Manchester United, Tottenham Hotspur e muitos outros) estão cotados na bolsa desde Novembro de 1997, o que lhes permite obter os financiamentos necessários para manter a sua posição de liderança no desporto europeu. Por outro lado, algumas sociedades de investimento conquistaram influência adquirindo participações maioritárias em vários clubes de futebol: por exemplo, a English National Investment Company (ENIC) controla já quatro clubes, a saber, o Glasgow Rangers, o Slavia de Praga, o Vicenza (Itália) e o AEK de Atenas.

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A nova proposta de criação de uma liga fechada, exterior à UEFA, despertou o interesse de muitos dos principais clubes europeus. Nessa liga não haveria um sistema de promoção e despromoção. É uma nova forma de competição que não tem qualquer ligação com a actual estrutura em pirâmide.

Os principais clubes estão interessados nesta superliga principalmente porque não estão satisfeitos com a repartição das receitas da Liga dos Campeões por parte da UEFA. Consideram que essa iniciativa permitiria que os participantes na competição recebessem directamente uma maior percentagem e os organizadores uma percentagem menor das receitas. Se se concretizar esta evolução no sentido da adopção do sistema de competições fechadas que existe há muito nos Estados Unidos, os lucros dos grandes clubes aumentarão muitíssimo. Nesta nova abordagem, as grandes equipas defrontar-se-ão regularmente, como acontece há muito nos principais modalidades desportivas praticadas nos Estados Unidos.

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A UEFA foi obrigada a reagir, propondo uma nova iniciativa que procura combinar o sistema tradicional de promoção e despromoção com o sistema de campeonatos fechados; está a oferecer assim aos clubes uma quota-parte mais importante das receitas geradas pela venda dos direitos de transmissão.

3 -PROBLEMAS 3.1 Funções das federações desportivas

Até à década de 1980, as federações desportivas eram principalmente órgãos reguladores. Mas à medida que os direitos de transmissão televisiva adquiriram mais importância, começaram a negociar esses direitos, agindo assim tal como qualquer outra empresa comercial. A questão que se coloca é a de saber se as federações podem ser simultaneamente órgãos reguladores e entidades comerciais. Tanto os principais clube

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Consequências do acórdão do Tribunal de Justiça no processo “Bosman”, memorando dos comissários Van Miert, Flynn e Oreja, SEC (96) 212 de 2 de Fevereiro de 1996.

Filiados nessas federações, como os menos importantes entendem que os seus interesses deixaram de estar adequadamente representados.

Além disso, nalguns países foram criadas ligas que são independentes das federações. É o que acontece em Inglaterra e em Espanha, no caso do futebol, e na Itália e em França, no do basquetebol.

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3.1.1 Problemas com os grandes clubes Os grandes clubes pretendem receber uma quota-parte mais

importante das receitas da federação, ameaçando que, caso contrário, sairão da federação e criarão os seus próprios campeonatos. A maioria das federações nacionais tem regras segundo as quais os clubes nelas filiados não podem participar em campeonatos que não tenham sido organizados ou autorizados pela federação, penalizando-os quando infrinjam essas regras. Se os principais clubes europeus participarem em campeonatos fechados, serão excluídos dos campeonatos nacionais? Isso seria o fim de uma das principais características do modelo europeu, a saber, a ligação à identidade nacional. Deverá esta orientação nacional ser mantida e, se assim for, qual será a melhor maneira de a preservar?

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3.1.2 Problemas com os pequenos clubes Os pequenos clubes, pelo seu lado, queixam-se de que as

federações deixaram de desempenhar a sua missão “pública”, ou seja, a promoção do desporto. Afirmam também que o sistema de solidariedade que colocava à sua disposição uma parte das receitas das federação não funciona eficazmente. A questão que se coloca é a de saber se as federações, que funcionam como empresas privadas, mas que têm simultaneamente a função de promover o desporto, poderão atingir o equilíbrio mais correcto entre estas duas tarefas ou se a promoção do desporto deverá ser confiada a um organismo público.

Resta saber o que é que acontecerá às federações se perderem simultaneamente os grandes e os pequenos clubes.

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3.2 Direito da concorrência Regra geral, o monopólio das federações não é posto em

causa, uma vez que se reconhece que a sua estrutura institucional é a forma mais eficiente de organizar o desporto. Os regulamentos da maioria das federações nacionais e internacionais estipulam que os seus filiados só podem participar em manifestações desportivas organizadas ou, pelo menos, autorizadas pela própria federação. Mas podem surgir problemas se alguém entender que os seus interesses seriam mais adequadamente representados por uma nova federação. As federações deverão ser autorizadas a concorrer livremente nesse mercado? No caso do pugilismo, essa concorrência é já uma realidade, havendo várias federações internacionais (WBF, WBA, WBC e IBF).

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A questão que se coloca neste contexto é se as federações devem alterar os seus regulamentos e a sua estrutura internacional (uma única federação por país e por modalidade) para cumprir as disposições do Tratado CE sobre as regras da concorrência, sobre o mercado único e os acórdãos do Tribunal de Justiça. E se for esse o caso, qual será o impacto dessas alterações no sistema europeu (modelo em pirâmide)? Numa decisão recente, o Tribunal de Arbitragem Desportiva defende que os órgãos reguladores do desporto são semelhantes a órgãos estatais, no que se refere à sua estrutura e às suas funções de órgãos reguladores. Afirma ainda que a sua actuação deve ser regida por princípios semelhantes, por exemplo, no que se refere à alteração da legislação ou das regras administrativas.