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A VISÃO INTERNACIONAL E O PAPEL DOS INSTITUTOS DE PESQUISA Waldimir Pirró e Longo Engenheiro Metalúrgico, M.E., PhD., L.D. Prof. Titular da UFF e Assessor do M.C.T. 1 1

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A VISÃO INTERNACIONAL E O PAPEL DOS INSTITUTOS DE PESQUISA

Waldimir Pirró e LongoEngenheiro Metalúrgico, M.E., PhD., L.D.Prof. Titular da UFF e Assessor do M.C.T.

Publicado nos Anais do Congresso ABIPTI 2000, p. 21 – 36, Fortaleza/CE, 2000.

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A VISÃO INTERNACIONAL E O PAPEL DOS INSTITUTOS DE PESQUISA

Waldimir Pirró e Longo Engenheiro Metalúrgico, M.E., Ph.D., L.D. Prof. Titular da UFF e Assessor do MCT

1.0- A VISÃO INTERNACIONAL

“O estudo destes institutos de pesquisa científica e tecnológica, dos mais significativos na História das Ciências no Brasil, mostra que nem o talento nem o idealismo de muitos de seus pesquisadores conseguiram salvá-los de períodos caracterizados por maior ou menor destruição de suas atividades e pelo êxodo de seus pesquisadores. Este é um fenômeno generalizado, devendo assim ser compreendido no âmbito mais geral do próprio papel atribuído à Ciência e Tecnologia em nosso País”.

História das Ciências no Brasil, EDUSP, vol.2, pg.375.

Atualmente, as complexas demandas das sociedades modernas são atendidas por tecnologias crescentemente resultantes da aplicação de conhecimentos científicos(1). Em decorrência da busca e apropriação sistemática, e bem sucedida, de conhecimentos científicos para a produção de tecnologias, que passou a ocorrer em larga escala a partir da segunda metade do século dezenove, o conhecimento científico deixou de ser um bem puramente cultural, para tornar-se o principal insumo para o sucesso econômico. Desde então, estima-se que os conhecimentos científicos e tecnológicos têm duplicado a cada 10 a 15 anos (2) e que mais de 80% deles foram gerados após a Segunda Guerra Mundial. A continuar tal dinâmica, dentro de 10 anos, 50% dos objetos que estaremos usando, ainda não foram inventados atualmente(3).

Em consequência, hoje, em pleno discurso político uníssono pelo “Estado Mínimo”, cresce, em todos os quadrantes da Terra, a interveniência dos governos na área científica e tecnológica. Essa tendência, na verdade, já tornara-se clara durante e logo após a Segunda Grande Guerra.

Durante o mencionado conflito, em ambas os lados beligerantes, ocorreu uma mobilização da comunidade científica e tecnológica, direcionada para a solução de problemas estratégicos dependentes do desenvolvimento de novos conhecimentos que resultassem desde produtos bélicos ( radar, propulsão a jato, energia nuclear, ciência dos materiais, etc.), até métodos de gerência (logística, auxílio à tomada de decisão, pesquisa operacional, controle estatístico, simulação, tratamento de informações, etc.)

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Nesse período, os institutos de pesquisas tecnológicas industriais- IPTIs tiveram papel relevante , como na Alemanha (4) , por exemplo ,aqueles subordinados à Força Aérea, algumas dezenas (Laboratório H. Goering, com mais de 70 prédios de laboratórios, 40 dos quais pertencentes ao Instituto do Armamento; Laboratório Graf Zeppelin, com seus túneis para estudos de aerodinâmica; Instituto de Motores de Automóveis e de Aviões; Instituto de Pesquisas Elétricas, voltadas para os empregos da eletrônica; Estabelecimento de Pesquisa em Aerodinâmica; campus de testes; Academia de Pesquisa Aeronáutica; etc) e o centro de pesquisas de foguetes de longo alcance, situado em Peenemunde, e nos Estados Unidos, as centenas de laboratórios e institutos federais de pesquisa e desenvolvimento.

A definição de objetivos e a alocação de recursos, seguidos de acompanhamento e avaliação, realizados na ocasião resultaram em extraordinários avanços científicos que, na sua esmagadora maioria, deram origem a inovadoras e importantes utilizações civis. A partir daí, os países desenvolvidos, vencidos ou vencedores, aperfeiçoaram sua atuação na área. Evidenciou-se que a capacidade tecnológica tornara-se fator estratégico central, não somente para o poderio militar, mas também, e principalmente, para o desenvolvimento econômico, social e político. Ciência e Tecnologia (C&T) passou a ser considerado um binômio, tratado no singular, em virtude da forte interação e interdependência entre a ciência e tecnologia, da crescente utilização de conhecimentos científicos para a geração de tecnologias, e do necessário avanço tecnológico para a produção de novos instrumentos que possibilitassem aos cientistas melhor estudarem o Universo.

Políticas de C&T passaram a ser explicitadas pelos governos, em geral, extremamente condicionadas pelas políticas econômicas e industriais praticadas. Os órgãos atuantes na área, passaram a funcionar harmonicamente, constituindo-se, implícita ou explicitamente, num verdadeiro “Sistema de Desenvolvimento Científico e Tecnológico”. Especial atenção passou a ser dada à formação de técnicos, pesquisadores e engenheiros, estes últimos, normalmente, responsáveis pela transformação de conhecimentos em produtos, processos ou serviços, adequados às exigências de uso e, simultaneamente, competitivos.

Tais ações são também explicadas pelo fato de que os grandes desafios enfrentados pelos países estão, hoje, intimamente relacionados com as contínuas e profundas transformações sociais ocasionadas pela velocidade com que tem sido gerados novos conhecimentos científicos e tecnológicos, sua rápida difusão e uso pelo setor produtivo e pela sociedade em geral.

As mudanças que vêm ocorrendo tão rapidamente, têm afetado profundamente o homem, o meio ambiente e as instituições sociais de maneira sem precedentes na história da humanidade. Particularmente as instituições têm sofrido enormes impactos provocados pelo frequente emprego de novas tecnologias que, via regra, alteram hábitos, valores e tradições que pareciam imutáveis. A introdução de novas tecnologias, quase sempre, é uma decisão do setor produtivo, não discutido e não planejado pela sociedade. As alterações ambientais e comportamentais resultantes são de tal magnitude e, às vezes, tão inesperadas, que as instituições sociais não

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têm conseguido acompanhá-las e adaptar-se, enfrentando, então, sérias crises. Estão, nesse caso, instituições como partidos políticos, governos, religiões, as forças armadas, universidades, institutos/laboratórios centros de pesquisa e empresas (5). Assim, existe um hiato entre o avanço científico e tecnológico e a capacidade de reação e de reorganização dos grupos ou entidades sociais para o trato da nova realidade (6).

No caso das empresas e, também, dos IPTIs, a ocorrência de tal hiato poderá levá-las ao desaparecimento. Daí, avulta de importância por parte delas, o contínuo monitoramento da evolução científica e tecnológica, e das mudanças sociais. O acesso e gerência das informações, bem como a previsão e avaliação tecnológicas, passaram a ser de importância vital.

Diante dessa dinâmica, que resulta num mundo em constante mutação graças aos avanços da ciência e tecnologia, a imagem que se formula é a de uma esteira rolante constantemente acelerada sobre a qual pode-se considerar que estão indivíduos, empresas ou países, que precisam correr cada vez mais para permanecerem no mesmo lugar. Caso não acompanhem ou suplantem a esteira da evolução científica tecnológica, os indivíduos tornam-se profissionalmente obsoletos, as empresas perdem competitividade e vão à falência, os países amargam o subdesenvolvimento e uma insuportável dependência externa de insumos mais estratégico do mundo moderno: o conhecimento.

Na realidade, em se tratando da evolução científica e tecnológica, não há patamar definitivo a ser atingido, pois a escalada é contínua. O rápido desenvolvimento tecnológico da microeletrônica, da informática, das telecomunicações e da automação, assim como o exponencial crescimento das suas aplicações, afetaram de tal maneira as qualificações exigidas para o trabalho, o acesso às informações, a circulação do conhecimento, a organização e o funcionamento do setor produtivo, as relações sociais e as políticas governamentais, que se admite estarmos vivendo a Terceira Revolução Tecnológica / Industrial ou , como alguns preferem, a Era do Conhecimento / Informação.

A engenharia, particularmente a industrial , sofreu e continua sofrendo profundas alterações, tanto na sua concepção e na sua operação, quanto no seu relacionamento com os serviços correlatos. A possibilidade atual dos meios eletrônicos, permitindo as informações fluírem instantaneamente do cliente para a fábrica e da fábrica para os seus fornecedores, aliada à automação, tornou possível “produzir competitivamente, diferentes produtos, em quaisquer quantidades, melhor e mais barato” atendendo cada vez mais os desejos do usuário do bem produzido. Esta concepção, extremamente flexível, vem substituindo aquela rígida, até então vigente, que se propunha a “produzir cada vez mais, da mesma coisa, melhor e mais barato”, sem muitas opções para o cliente, o consumidor. Além disso, o fator tempo tem sido decisivo, além da produtividade e da qualidade. A prática seqüencial de pesquisa, desenvolvimento experimental, estudos de viabilidade, engenharia de produto/processo, produção, etc., utilizada correntemente na busca da inovação, está ultrapassada. Tais etapas são hoje integradas, considerando-se, simultaneamente, todos os problemas envolvidos, encurtando-se com isso o tempo de criação, produção e uso de um novo bem ou serviço. Esta é a origem do que tem sido chamado de “engenharia simultânea”, cuja prática é

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fator central para o sucesso numa situação como a atual em que o ciclo de vida dos produtos é cada vez menor. Assim, conhecimentos científicos podem dar origem a revolucionárias tecnologias num tempo menor do que aquele que levamos para “formar” um engenheiro ou um sociólogo

Particularmente no que diz respeito a serviços tecnológicos, não se pode mais pensar e agir localmente. Graças às ligações eletrônicas em redes mundiais, serviços podem ser prestados por atores situados em quaisquer partes do planeta. Não é impossível que neste instante um arquiteto trabalhando em seu escritório em Niterói, montado após a “terceirização” a que foi instado pela grande empresa construtora em que trabalhara, esteja projetando um “Shopping Center” a ser construído em Cali, na Colômbia. Igualmente, questões formuladas por uma empresa brasileira que demandaram pesquisas encomendadas a um centro situado na Coréia do Sul, talvez estejam sendo respondidas agora pela Internet.

Ainda como conseqüência da circulação ampla de informações, recursos financeiros e de produtos, passou a ocorrer instantaneamente a busca universal dos consumidores pelos mesmos bens e serviços. No caso das indústrias, estas passaram a ter que dominar as tecnologias que as colocassem continuamente na competição global. Como conseqüência dessa convergência sobre o domínio e uso das mesmas tecnologias, os produtos passaram a diferenciar-se na competição não só pelo “design” , preço e pela qualidade, mas pelos serviços complementarmente oferecidos ( financiamento, troca, manutenção, assistência, etc....).

Adicionalmente, é preciso entender que o progresso tecnológico causou profundas alterações no modo de produção, na distribuição da força de trabalho e na sua qualificação. Vivemos hoje a era pós industrial na qual, nos países centrais, cerca de 70% da força de trabalho foi deslocada para o setor terciário da economia, tecnologicamente cada vez mais sofisticado, entre 20 e 30% permanecem no secundário, e menos de 5% encontram-se em atividades agrícolas cada vez mais intensivas em máquinas e técnicas poupadoras de mão-de-obra não qualificada.

Embora os setores primários (agricultura, pesca e exploração florestal) e secundário (manufatura industrial, extrativismo, produção e distribuição de eletricidade, gás e água, obras de engenharia civil) tenham crescido, o número de empregados nos mesmos é cada vez menor. Isto deve-se não somente à crescente mecanização e automação desses setores, mas também à “terceirização” de muitas das suas atividades anteriormente verticalizadas, principalmente aquelas classificadas como prestação de serviços, inclusive os de engenharia. Há uma tendência das indústrias, em concentrarem-se estritamente na fabricação daqueles componentes ou produtos nos quais são crescentemente especializadas e competitivas. A informática associada às telecomunicações, tornou possível transportar, economicamente, enormes quantidades de informações, criando a possibilidade do fornecimento à distância de várias necessidades de fábrica, contribuindo para modificar, como já foi dito, as relações entre a produção de bens e a prestação de serviços. As distâncias e as fronteiras nacionais deixaram de ser barreiras nestas relações.

Nesta realidade, até agora descrita, tornam-se cada vez mais elevadas as qualificações exigidas para os postos de trabalhos em qualquer dos setores de produção, fato que coloca uma grande e contínua pressão

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sobre as necessidades educacionais das populações. Com as constantes mudanças tecnológicas, os indivíduos que não as acompanharem, ficarão prematuramente inabilitados para o trabalho. Serão parte do que tem sido chamado de desemprego estrutural. A conclusão é que não há mais formação terminal.

É preciso ter presente que o mundo em que vivemos hoje, todos cidadãos necessitam conhecimentos básicos de ciência, das tecnologias mais usadas, de matemática e informática, continuamente atualizados. Esta é uma exigência não só para o mercado de trabalho, mas, antes de tudo, para que o cidadão não seja um alienado, um desajustado, um ignorante diante dos bens e serviços utilizados no seu dia a dia.

A desqualificação para o mercado de trabalho, seja através da obsolescência ou da má formação escolar, dá origem ao que tem sido chamado de “analfabetismo tecnológico”. Os analfabetos tecnológicos não retornarão ou ingressarão adequadamente no mercado de trabalho nem que a economia cresça e expanda os empregos.

Evitar a obsolescência da força de trabalho através da chamada educação continuada é hoje uma preocupação da maioria dos países. Tendo em vista o custo elevado em trazer periodicamente essa força para dentro das salas de aula, a solução que está se ampliando, é levar os conhecimentos aos locais de trabalho utilizando modernos meios eletrônicos de comunicação (internet, vídeo, televisão, etc.).

Outro fato estratégico de grande repercussão que vem ocorrendo na área tecnológica é a pesquisa cooperativa.

Desde o início dos anos 70, em muitos países industrializados, foram tentadas várias formas de diminuir os custos das pesquisas, estudos e desenvolvimentos tecnológicos e de aproveitar melhor o potencial tecnológico disponível. Essas tentativas deram ensejo ao aparecimento de formas compartilhadas para o desenvolvimento tecnológico, genericamente denominadas pesquisas cooperativas (redes cooperativas, projetos multiclientes. joint ventures, centros cooperativos, consórcios, etc.).

A pesquisa cooperativa caracteriza-se pela definição de uma área temática a ser explorada ou de um projeto específico visando produzir uma inovação ou resolver um problema tecnológico, e que requeiram atividades rotuladas como sendo de pesquisa básica, pesquisa aplicada, desenvolvimento experimental ou engenharia, objetivando produzir novos conhecimentos, executado de forma coletiva, reunindo instituições de pesquisa e empresas que participam com recursos financeiros ou técnicos, custeando ou executando partes das tarefas, tendo acesso, em contrapartida, a todas as informações geradas . Em geral, os resultados, as inovações, os desenvolvimentos tecnológicos, ficam em nível pré-comercial, o que permite a adesão ao empreendimento de empresas competidoras entre si, como se verá mais adiante.

Por muitos anos, a comunicação sobre tecnologias do interesse comum entre firmas concorrentes foi inibida na cultura empresarial estadunidense devido ao rigor das penalidades antitruste lá praticadas. Os enormes custos legais e indenizações resultantes de ações judiciais e penalidades prejudicaram a cooperação entre empresas do mesmo setor . A legislação antitruste norte-americana surgiu com o Sherman Act (7), de 1890, que baniu qualquer truste ou outra associação empresarial capaz de

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interferir no comércio interestadual ou no comércio externo. Baniu, também, qualquer acordo ou combinação entre empresas que viesse a monopolizar o mercado. Adicionalmente a este quadro de repressão ao truste, a Antitrust Law, de 1914, impediu que organizações se agrupassem sob diretorias entrelaçadas. Embora estas medidas tenham evitado a prática do conluio, elas também impediram maior grau de inovação na indústria norte-americana.

Enquanto isso, o governo japonês encorajava as suas empresas a compartilharem livremente suas informações. Além disso, financiava consórcios industriais para concentrarem-se em pesquisas que gerassem vantagens competitivas em mercados promissores. Isto ensejou o desenvolvimento de tecnologias que auxiliaram o extraordinário desempenho industrial e comercial japonês. No Japão, a Fair Trade Commission, o órgão responsável pela execução da Antimonopoly Act de 1947, decidiu considerar fora do escopo do Ato a cooperação entre empresas com o intuito de produzir inovações (8) . Na mesma direção, a União Européia, em 1968, publicou a Notice of Cooperation between Enterprises, estabelecendo que a colaboração em P&D está, normalmente, fora do escopo dos artigos do EEC Treaty que tratam das medidas antitruste.

Diante de tais fatos, o governo norte-americano, considerando que a concorrência se dá entre empresas, porém, num cenário de interesses das nações às quais pertencem, promulgou, em 1984, o National Cooperative Research Act legitimando certas atividades conjuntas de pesquisa e desenvolvimento tecnológico entre empresas concorrentes. A idéia central foi promover um relaxamento na lei Sherman. Ainda na década de 80, o governo dos E.U.A através do Technology Transfer Acts e do Bayh-Dole Act, reestruturou o relacionamento entre empresas privadas e as instituições federais de pesquisa (laboratórios e institutos nacionais). Pelo Federal Technology Transfer Act de 1986, foram criados os Cooperative Research and Development Agreements- CRADAs (9) . Sob a vigência de um CADRA, os laboratórios federais são autorizados a cooperar, em P&D, com empresas privadas, podendo ceder a estas o direito da propriedade intelectual que resulte do trabalho conjunto (o governo federal retendo uma licença não exclusiva da referida propriedade). Em consequência do exposto, a pesquisa cooperativa ganhou o apoio legal nos países mais desenvolvidos, passou a fazer parte das suas políticas de inovação e são encorajadas por incentivos fiscais e por incentivos não fiscais (10) . Assim, neles, a pesquisa cooperativa vem se tornando um dos principais instrumentos de desenvolvimento e difusão tecnológica. Suas características de custo reduzido, amplo campo de aplicação, potencial de difusão, acessibilidade mesmo para as pequenas e médias empresas e grande capacidade de integração universidade/comunidade tecnológica/empresa têm motivado um crescimento vertiginoso na sua utilização. Evidentemente, os países em desenvolvimento adotaram procedimentos semelhantes, formal ou informalmente, e parte de suas entidades nacionais de produção, pesquisa e ensino, públicas e privadas, passaram a trabalhar cooperativamente, tanto a nível local como a nível internacional.

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A pesquisa cooperativa atualmente é considerada, também, um estágio avançado das relações entre universidades, centros de pesquisa, empresas e, eventualmente, órgãos de governo (11) . Como salientado anteriormente, as modernas inovações tecnológicas são cada vez mais dependentes de conhecimentos advindos das pesquisas básicas. Nos países desenvolvidos, as universidades têm sido atuantes nessas pesquisas, contribuindo decisivamente para o progresso tecnológico. Nos países de industrialização tardia, onde há reduzidos ou inexistentes investimentos por parte das empresas, estas, normalmente, não dispõem de uma estrutura própria de pesquisa e desenvolvimento tecnológico. As empresas, ainda que modestamente, tentam, como solução, desenvolver pesquisas aplicadas nas universidades. Estas iniciativas, em geral, esbarram em conceitos e atitudes negativas e controvertidas referentes ao papel institucional das universidades face à prestação de serviços ao setor produtivo. Por outro lado, a experiência mostra que a maioria das empresas não desenvolve uma elevada cultura científica e tecnológica, que tem como uma das conseqüências, enorme dificuldade em entender, dialogar e interagir num estreito relacionamento não só com as universidades mas, também, com os IPTIs. Já nos países que lideram os avanços da ciência e da tecnologia, a cooperação entre universidade, IPTIs e empresa representa um fator chave no desenvolvimento das pesquisas estratégicas para a indústria. Mesmo nos trabalhos de pesquisa realizados exclusivamente entre empresas, dificilmente as contribuições acadêmicas deixam de estar presentes, ainda que de forma indireta.

As principais razões para uma empresa buscar trabalhar em pesquisas em cooperação com universidades e os IPTIs, são : reduzir riscos, custos e tempos inerentes às pesquisas, desenvolvimentos,

engenharia não rotineira, produção e à introdução de novos produtos e serviços no mercado;

usufruir de benefícios fiscais e não fiscais criados pelos governos para incentivar o desenvolvimento científico e tecnológico;

ter acesso a laboratórios e instalações; ter acesso a recursos humanos qualificados; obter a solução de problemas específicos; aumentar a sua competitividade; ter “janelas ou antenas tecnológicas” de forma a conhecer intensamente

os avanços que estão ocorrendo em sua área de atuação (technological forecasting and assessment);

ter acesso antecipado a resultados de pesquisas; aperfeiçoar o treinamento de funcionários; melhorar a sua imagem e prestígio junto à sociedade; implementar parte de sua estratégia tecnológica, de forma a seguir o

padrão de pesquisas praticado pelos concorrentes em seu setor de atuação.

As pesquisas cooperativas caracterizam-se, basicamente, pelo modo de apropriação de seus resultados. Assim sendo, as alianças que se formam podem ser de dois tipos: aquelas cujos resultados das pesquisas serão de

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propriedade de uma única empresa que mobiliza parceiros para auxilia-la no desenvolvimento das mesmas (proprietary research, também chamadas do tipo “solução de problema”, uma vez que estão, em geral, voltadas para esta finalidade específica), e as pesquisas onde várias empresas compartilham seus resultados (non proprietary research). A cooperação, no segundo tipo, dá-se na fase pré-competitiva. Entende-se por pesquisa pré-competitiva aquela cujo resultado fornece conhecimentos para o estágio pré-comercial do produto ou são de emprego genérico para a melhoria de produtos existentes. Esta característica é que permite que o desenvolvimento da tecnologia se dê de maneira cooperativa, podendo ter, inclusive, como participantes e co-financiadores, empresas competidoras ou rivais. Exemplos seriam as pesquisas cooperativas em corrosão, ruído, poluição e ergonomia, conduzidas por fabricas de automóveis concorrentes entre si no produto final.

Graças aos modernos meios de comunicação e de transportes, as pesquisas cooperativas, a partir dos anos 90, ganharam maior dinamismo, tiveram as distâncias entre parceiros tornadas menos relevantes e diminuídos os custos operacionais . Exemplos de experiências brasileiras na indução da formação de pesquisas cooperativas são o Sub- Programa RECOPE do Programa de Desenvolvimento das Engenharias-PRODENGE (12) e o Componente de Desenvolvimento Tecnológico-CDT do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico- PADCT (13 ) . Finalmente, as tecnologias de base empírica são facilmente entendidas e, portanto sua cópia e produção por empresas retardatárias, é uma questão de oportunidade e de disponibilidade econômica. Por sua vez, por serem fruto da aplicação de conhecimentos científicos, as tecnologias modernas mais relevantes e seus processos de produção, não são facilmente compreendidos e, consequentemente, são extremamente difíceis de serem copiados. Isto é, são altamente discriminatórios: quem não tiver competência científica e capacidade tecnológica estará condenado à periferia, mesmo que disponha dos demais fatores de produção (capital, mão-de-obra e matérias-primas). A geração de tecnologias de base científica exige acúmulo de capital para investimentos contínuos em pesquisa, desenvolvimento e engenharia, mobilizando cérebros com competência em amplo espectro de conhecimentos e capacidade gerencial para produzir novos bens e serviços de elevada qualidade. Nesse contexto, pode-se definir um “novo operariado” caracterizado por carregar consigo, o principal equipamento de produção: o seu cérebro.

O resultado disso tem sido a concentração do poder em todos os níveis. No nível individual, o extraordinário valor e a importância do “novo operariado”, que tem dado origem a uma nova visão das relações capital/trabalho. No setor empresarial observa-se a fusão de empresas, a formação de grandes conglomerados tecnológicos, não confinados a fronteiras nacionais. Neste caso observa-se que quanto mais impregnada de ciência for o produto ou as tecnologias de produção de um bem ou de um serviço, menor é o número de empresas competindo nos mercados. Finalmente, de uma certa maneira, a mesma coisa está ocorrendo ao nível de países. Observa-se neste final de século, a tendência dos países a aglomerarem-se em torno de fortes lideranças tecnológicas para formarem blocos econômicos e, por extensão, políticos e militares(14).

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Na realidade os avanços científicos e tecnológicos em geral, e os avanços das comunicações e dos transportes, em particular, estão provocando a internacionalização da cultura, a globalização da produção dos mercados e da economia, e a planetarização dos países.

Salienta-se que o grande movimento estratégico posto em marcha pelos chamados países centrais é a planetarização dos outros países , sendo a globalização é tática essencial para o seu sucesso.

2.0 - AS MUDANÇAS GLOBAIS E OS INSTITUTOS DE PESQUISA TECNOLÓGICAS INDUSTRIAIS - IPTI’s

“Preservação do laboratório não é uma missão”. Report of the White House Science Council,

“Federal Laboratory Review Panel”, Washington, 1983.

Inúmeros trabalhos sobre desenvolvimento tecnológico produzidos nos mais diferentes países (15 a 22), desenvolvidos ou em desenvolvimento, mostram que, devido aos fatos marcantes ocorridos nas últimas décadas no cenário científico e tecnológico, descritos no item anterior, estabeleceu-se um “hiato gerencial” na maioria dos IPTI’s: um descompasso entre o avanço no conhecimento e suas conseqüências no setor produtivo, e a capacidade dos mesmos adaptarem-se continuamente à nova realidade. Na década de 80 e na atual, passou-se a questionar o desempenho e a utilidade de muitos IPTI’s, principalmente aqueles não especializados, ou seja, atuantes em amplo campo de conhecimentos tecnológicos, nem sempre competentes em todos no nível requerido, e difíceis de serem agregados na solução de algum problema específico. Na realidade, estes mais se assemelham a um “conglomerado de institutos” dentro de um instituto, alguns atualizados e competentes, e outros ultrapassados e quase inúteis. Em conseqüência, em muitos países, os governos federais, estaduais e municipais promoveram estudos que resultaram em profundas alterações em seus institutos, chegando até o fechamento de alguns.

Ao longo dos anos 80 e 90, de uma maneira geral, as empresas industriais decresceram seus investimentos em pesquisa exploratória e em desenvolvimento de tecnologias pioneiras, em favor de atividades mais relevantes para a competitividade de seus produtos e processos. No sentido de diminuir custos e fazer face à complexidade das mudanças tecnológicas, a tendência é das empresas compensarem a perda de sua capacidade própria, pela adesão a pesquisas conduzidas cooperativamente com as mais diversas participações de instituições públicas ou privadas, nacionais e estrangeiras, e pela aproximação com universidades e IPTI’s, formando, com estas alianças estratégicas em áreas em atividades vitais.

Comumente, também, são estabelecidas alianças estratégicas entre empresas individualmente e prestador, ou prestadores, de serviços tecnológicos. São parcerias em geral duráveis que satisfazem os interesses de longo prazo das partes envolvidas.

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Essa mudança de atitude se deve em grande parte à globalização da produção, dos mercados e prestação de serviços tecnológicos proporcionada pelos modernos meios de comunicação, e à competição com rivais que não investem em pesquisa mas que são extremamente rápidos no uso de desenvolvimentos produzidos em qualquer lugar do planeta, assistidos e amparados por alianças tecnológicas estratégicas.

Diante deste quadro, a competência associada à capacidade de atender eficientemente o setor produtivo por parte das universidades e dos IPTI’s passa a ser fundamental, assim como a adoção de práticas que levem à diminuição dos tempos necessários ao lançamento de novos produtos e processos, como aquelas alcançadas através da mencionada engenharia simultânea.

IPTI’s e universidades voltadas para a pesquisa além do ensino, são, em geral, mantidos pelo poder público. Tem-se, portanto, um problema: ao mesmo tempo que são questionados pelos mantenedores, os IPTI’s (e também as universidades) são fundamentais na nova realidade. Num momento de transição paradigmática do setor produtivo como o que estamos vivenciando, qualquer atitude drástica de curto prazo com relação às universidades e IPTI’s pode ser desastrosa e, portanto, tem que ser vista na sua perspectiva de consequências a médio e longo prazos, levando em consideração suas novas atribuições face ao setor produtivo.

Na década de 80, o governo dos Estados Unidos, promoveu estudos (18)

e tomou medidas no sentido de reorientar seus cerca de 700 institutos e laboratórios. Os estudos recomendaram, resumidamente, as seguintes ações:

redefinição de suas missões; atração, retenção e motivação do pessoal científico e técnico exigido para

o cumprimento das missões, com carreiras e salários desvinculados do serviço público regular;

orçamento plurianual, com flexibilidade operacional reservando-se 5 a 10% para pesquisas definidas autonomamente e para cooperação com universidades e indústrias;

diminuição de ingerência de agências governamentais na gerência, dos mesmos;

criação de comitê de aconselhamento com representantes de indústrias e de universidades e mandato do diretor dependente do desempenho do instituto;

interação com universidades, indústrias e usuários dos resultados, facilitando o uso de suas instalações, trabalhando cooperativamente e intercambiando pessoal.

Evidentemente, nos países em desenvolvimento o impacto das mudanças no cenário mundial tiveram conseqüências bem mais severas no setor produtivo e, obviamente, nas suas instituições de pesquisa que, com maior razão, passaram a ser questionadas e cobradas por desempenho em ambiente para o qual não foram criadas ou preparadas.

Segundo Araoz (20), na raiz dos questionamentos colocados sobre a atuação do IPTI’s dos países em desenvolvimento, estão os seguintes desafios (alguns comuns aos institutos do mundo inteiro):

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constantes e aceleradas mudanças tecnológicas; a crescente importância do comércio num mundo altamente

interdependente e com sistemas de produção globalizados; a liberalização da economia e o abandono da política de substituição de

importações; o encolhimento do papel do Estado, e as privatizações; atração de investimentos estrangeiros como fontes de capital, tecnologia,

acesso a mercados e de técnicas de gerência; e uma crescente preocupação com o meio ambiente.

3.0-AS MUDANÇAS LOCAIS E OS INSTITUTOS DE PESQUISA TECNOLÓGICAS E INDUSTRIAIS

Pode-se traçar um paralelo entre os IPTÍ´s e as políticas públicas federais. Assim é, que durante a Segunda Grande Guerra, como nos outros países, os institutos tiveram um papel importantíssimo, ao participarem ativamente da mobilização industrial liderada pelas Forças Armadas. Nesse período de grande brilho encarregaram-se de tarefas que cobriam desde a normalização, certificação e metrologia, até a produção semi industrial em plantas piloto. Ajudaram a dar início ao processo de industrialização do País. Nesse período o Governo Federal era o grande cliente, sendo os objetivos tecnológicos claramente identificados, cobrindo amplo espectro de setores industriais.

No após guerra até os anos 80 a atuação dos institutos foi marcada pelas políticas governamentais de industrialização, calcada na reserva de mercado, na substituição de importações, no controle e na substituição das importações, no controle de câmbio e no crescimento de empresas nacionais. Os planejamentos inicialmente privilegiaram investimentos na infra-estrutura necessária à industrialização (estradas de ferro e de rodagem, geração de energia elétrica, portos, comunicações, etc.), sem descuidar da agricultura. Nesse período, na ausência de capital privado nacional, criaram-se empresas estatais federais e estaduais para atendimento de serviços essenciais e produção de bens estratégicos para o crescimento pretendido (ELETROBRAS, TELEBRAS, PETROBRAS, EMBRATEL, PORTOBRAS, NUCLEBRAS, etc.). Ao longo do tempo, as empresas estatais passaram a ser as maiores demandadoras de desenvolvimentos tecnológicos autóctones, prestação de serviços técnicos e engenharia. O resultado de tal política foi muito positiva para o Brasil. Entre 1945 e 1975, o crescimento industrial foi de 8,8% ao ano e o agrícola de 5,6%. Entre 1955 e 1961, o PNB cresceu, em média, 9,4% ao ano e o Produto Industrial 12%, também em média. Entre 1967 e 1987, a percentagem de manufaturados nas suas exportações cresceu de 7,4 para 50. Nos anos 60 e 70, estruturou-se um completo e robusto sistema nacional de desenvolvimento científico e tecnológico (FUNTEC, FNDCT, Finep, INPI, INMETRO, etc), no qual os institutos desempenharam um papel importante, principalmente para os grandes projetos nacionais (Ex.: a criação e operacionalização do PROALCOOL) .

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Nessa ambiência, os institutos existentes foram extraordinariamente ampliados, paralelamente à criação de outros, principalmente na esfera estadual. Novamente, os objetivos eram claros e a demanda , pelo setor produtivo, razoavelmente elevada.

A conjuntura atual é resultado da grande mudança de postura nas políticas públicas que ocorreu no final da década de 80, estendendo-se pelos anos 90 . Nesse período, foi promovida uma súbita abertura no mercado interno , atração indiscriminada do capital estrangeiro, a desestatização das grandes empresas públicas no bojo de uma crise gerencial e econômica do Estado Nacional, sem que houvesse medidas de preparação e salva guardas que preservassem as empresas nacionais. O resultado é uma conjuntura caracterizada pela desnacionalização simultânea da produção industrial e da prestação de serviços públicos.

Em primeiro lugar, os segmentos mais dinâmicos do setor produtivo estão dominados por empresas multinacionais. Os segmentos automobilístico, químico-farmacêutico, eletrônico profissional e de entretenimento, aparelhos de uso doméstico, comunicações, e tantos outros, funcionam e progridem na área tecnológica, independentemente do aporte de inteligência local. As empresas estrangeiras, como regra geral, fazem suas pesquisas e desenvolvimentos nas matrizes e/ou em suas filiais localizadas em países do primeiro mundo. Lá usufruem de extraordinária infra-estrutura científica e tecnológica constituída por bem equipados centros de pesquisa e universidades, além de vigorosos incentivos criados pelos governos para estimular a geração de inovações. Para elas é ainda muito melhor negócio que suas filiais situadas em países periféricos paguem royalties para suas matrizes, pelo uso das tecnologias que as mesmas geraram alhures, no lugar de empreenderem um esforço local.

Em segundo lugar, as empresas nacionais que ainda sobrevivem atuam, em geral, em segmentos de pouca complexidade tecnológica e de baixa agregação de valor, além daquele correspondente ao custo da mão-de-obra. Exemplo dessa atuação é a produção de commodities, normalmente importante no montante das exportações dos países em questão. Outras fazem parte de cadeias produtivas de empresas estrangeiras, das quais são absolutamente dependentes tecnologicamente. Com relação à mão-de-obra empregada, há que se chamar a atenção para a perversidade da situação: nível educacional deficiente, mal preparada, sem assistência social decente, sem uma organização sindical forte, vilmente paga e, no momento, acuada pelos atos que vêm sendo praticados contra os míseros “direitos trabalhistas” que mal eram garantidos anteriormente. Espalha-se em nome da produtividade o conceito de que o moderno é ter trabalho e não emprego, que pode ser traduzido como “ cada um que se vire”.

Em terceiro lugar, a grande maioria das empresas nativas importa conhecimentos do exterior através da chamada “transferência de tecnologia”. A “transferência” compreende contratos para o uso de patentes, licença para fabricação, fornecimento de tecnologias não patenteadas, uso de marcas, elaboração de projetos, serviços de engenharia, assistência técnica e franchise. Esta opção, sob o ponto de vista micro econômico é correta, pois na maioria das vezes, é mais barata

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que o esforço próprio, evita os riscos inerentes à tentativa de geração de novas tecnologias, encurta os tempos para a introdução do novo produto no mercado, a transferência é paga a posteriori através de percentual do faturamento resultante da venda do produto ou serviço (royalties) e, ainda, pode beneficiar o comprador pela credibilidade do cedente dos aludidos conhecimentos, através do uso da sua marca [23]. Porém, sob o ponto de vista macro econômico, se tal procedimento for generalizadamente utilizado como substitutivo de qualquer esforço próprio de desenvolvimento, condenará o país a ser mais dependente de decisões tomadas no exterior, nem sempre coincidentes com seus interesses, e a ter produtos cuja competitividade e colocação no mercado internacional não dependem de sua vontade política - enfim, a ser periférico na ordem econômica global. Na realidade, espera-se que a aquisição externa de tecnologias por empresas nacionais seja complementar ao esforço próprio em pesquisa e desenvolvimento experimental na busca de inovações tecnológicas [23].

Um resultado dessa situação e que há uma enorme transferência de empregos que exigiriam alta qualificação, para os países centrais. Constata-se, então, uma microcefalia no setor produtivo: produz-se, comparativamente, com muito menos postos de trabalho que exigem nível superior ou melhor qualificação profissional.

Finalmente, em terceiro lugar, não havendo uma política industrial explícita que privilegie a empresa nacional e o desenvolvimento tecnológico autóctone e não havendo grandes projetos nacionais em curso, a situação dos institutos pertencentes aos governos federal e estaduais, tornou-se bastante difícil. Simultaneamente, com a crise econômica do poder público em geral, a situação dos mesmos foi agravada, obrigando-os a procurar recursos financeiros com o aumento da prestação de serviços, bem como com a disputa no balcão das próprias agências federais e estaduais de fomento, pela aprovação de projetos auto gerados pelos seus próprios pesquisadores. Em outras palavras, em grande parte, deixaram de ser um braço executivo de políticas e estratégias de governos. Assim, particularmente, no caso do Brasil, aos desafios apontados por Araoz para os IPTI´s, amplie-se com o seguinte:

atitude nacional passiva diante da globalização; ausência de qualquer estratégia prévia que preparasse e fortalecesse

tecnologicamente o setor produtivo nacional, para a competição resultante da abertura súbita do seu mercado;

os setores mais dinâmicos de sua economia, estão totalmente entregues a empresas estrangeiras que desenvolvem suas tecnologias nas matrizes (agora custeadas parcialmente com recursos das suas filiais brasileiras, legalmente enviados, de acordo com ato administrativo recentemente colocado em vigor pelo INPI);

inúmeras indústrias nacionais deixaram de se dedicar à fabricação tornando-se simples montadoras de componentes importados, associaram-se a empresas produtoras estrangeiras das quais tornaram-se representantes comerciais ou fecharam;

modestos incentivos fiscais praticados pelo governo diante da situação atual descrita;

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ausência da prática de incentivos não fiscais de modo sistêmico e completo;

constantes cortes nos orçamentos das agências federais de fomento ao desenvolvimento científico e tecnológico;

crise econômica dos governos federal e estaduais (mantenedores dos institutos);

arrocho salarial do setor público; intranqüilidade criada com as repetidas ameaças no futuro das

universidades federais, acompanhadas de cortes nos seus orçamentos; falta de cultura e de aparato legal concernente à pesquisa cooperativa; ausência de um PROJETO BRASIL explicito, no qual ficasse claro o papel

da ciência e da tecnologia, o que resulta em indefinição quanto ao amanhã (próximo e distante).

Acontece que a maioria dos nossos institutos moldou a sua estrutura e atuação em cenário científico e tecnológico, político e econômico bastante diverso do atual, demorando-se a promover as alterações exigidas pela nova conjuntura.

Aparentemente, eles cresceram aspirando realizar atividades consideradas nobres, relacionadas com a geração de tecnologias, voltando-se, em consequência, para a oferta de pesquisa aplicada, desenvolvimento experimental e engenharia, e, com menor entusiasmo, na realização de testes e de outros serviços técnicos. Acontece que a maioria das empresas, seja por causa da atual conjuntura, seja pelas suas características, necessita de outros serviços, que conduziu os IPTI´s a um esforço de captação para as emergentes necessidades de um setor produtivo, de configuração, porte, postura, objetivos e estratégias totalmente diversas daquelas com que tinham familiaridades. Algumas dessas necessidades são listadas abaixo:

transferência e adaptação de tecnologias; previsão e avaliação tecnológicas; engenharia reversa; disseminação de informações; consultoria em geral (gestão da produção, gestão de serviços, gestão

tecnológica, pós-venda, etc.) calibração e aferição de instrumentos de medição; certificação de conformidade; uso compartilhado de suas facilidades (laboratórios associados, alianças

estratégicas, encubadeiras , etc...) recuperação e extensão da vida de equipamentos; softwares; integração de sistemas e automação (indústrias e serviços) modelagem e simulação pareceres técnicos; desenho industrial e ergonomia; logística; estudos setoriais; proteção patentária; treinamento de pessoal em novas técnicas ( também no chão de fábrica); educação continuada (também no chão de fábrica);

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estágios em seus laboratórios;

Verifica-se também que, ainda são pouco utilizados os meios mais modernos disponíveis de comunicação eletrônica para relacionamento profissional com os clientes, com consultores externos, universidades e outros institutos, assim como para oferta de treinamento e educação continuada no próprio local de trabalho dos instruendos.

4.0 - ORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES DOS INSTITUTOS DE PESQUISA TECNOLÓGICAS INDUSTRIAIS - IPTI’s

Trabalho recente propôs um modelo para a atuação dos IPTI´s baseado na avaliação das melhores práticas organizacionais observadas em 09 institutos internacionais (22) . Tomando-se por base o trabalho citado, propõe-se modelo que acrescenta atividades sugeridas:

Quadro 1 – Modelo de atuação para um instituto tecnológico

MonitoraçãoPrevisão e avaliação tecnológicasInformaçãoAvaliação multi-clienteEstudos comparativosEstudos setoriaisSolicitações da IndústriaOrganizações InternacionaisProjetos auto iniciados

Difusão TecnológicaConsultoria, assessoria, Projetos cooperativos e direcionados à cadeia produtivaUso compartilhado de instalaçõesDemonstração de tecnologias Treinamento especializadoEducação continuadaSpin –off - de pessoal para indústria - de empresa

Serviços TecnológicosMateriais e outros testesCertificação e padrõesCalibração e aferição de instrumentosServiços de CADSoftwaresModelagem e simulaçãoLogísticaDesenho industrial

DesenvolvimentoProjetos industriais

- de pesquisa e desenvolvimento- de engenharia reversa- extensão de vida de equip.- transf. e adap. de tecnologia

Baseado em: Rush et al. , 1996 apud. Hoppe, 2000 (26)

O referido estudo destaca muito corretamente, com a qual se concorda, que algumas definições, quanto a atuação dos IPTI’s, transcendem suas próprias determinações relacionando-se com a sua inserção no sistema nacional de inovação. Assim, a definição entre atuar como líder tecnológico

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ou prestador de serviço depende do interesse do Estado em pagar por estas atividades; a presença de insuficiência de demanda ou “falhas de mercado”, que exijam a atuação direcionada dos IPTI´s, requer recursos do Estado .

O estudo, finalmente, sinaliza a necessidade dos IPTI’s estarem atentos aos desafios impostos pelo novo ambiente sócio-econômico e que influenciam diretamente a sua organização interna:

avaliar permanentemente a natureza do risco envolvido no processo de inovação;

buscar balanceamento entre pequenos e grandes clientes; buscar balanceamento entre as atividades de pesquisa e

desenvolvimento e os serviços correntes (TIB); monitorar a efetiva contribuição da instituição para o sistema de

inovação; buscar o balanceamento entre a captação de recursos privados e

públicos; estabelecer políticas de valorização para pessoal e estímulo às

lideranças.

5 .0 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

(1) LONGO, W. P., “Ciência e Tecnologia, evolução, inter-relação e perspectivas”. Anais do 9º Encontro Nacional de Engenharia de Produção, vol. 1,42, Porto Alegre, 1989.

(2) PRICE, D.S, “Litle science, big science”. Columbia University Press, Nova Iorque, 1963.

(3) DE BROCHARD, J.P. “A miragem do futuro”, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1991. (4) SIMON, L. E. , “ German research in World War II: an analysis of the conducte of researsh”, John Wiley & Sons, New York, 1946.

5) LONGO, W.P., “Ciência e Tecnologia e a Expressão Militar do Poder Nacional”, TE-86 DACTec, Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 1980.

(6) OLIVEIRA J.M. Amaral, “Origem e evolução do pensamento estratégico”, Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 1986.

(7) http://www.stolaf.edu/people/becker/antitrust/statutes/sherman.html#top

(8) Fair Trade Commission, “Research and development activities in private interprises and problems they pose in the competition policy”, Japan, 1984.

(9) http://www.icann.org/committees/dns-root/grada.htm

(10) Grupo de Estudos de Apoio ao M.C.T., “Incentivos fiscais e não fiscais”, Vol 1 e 2, Brasília, 2000.

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(11) STAL, EVA, “ Centros de pesquisa cooperativa: um modelo eficaz de interação universidade – empresa?”, tese de doutorado, USP, São Paulo, 1997.

(12) PRODENGE – Programa de Desenvolvimento das Engenharias, Finep, Rio de Janeiro, 1995.

(13) PADCT – Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico, M.C.T., Brasília, 1998.

(14) LONGO, W.P., BRICK, E.S. “Entraves ao acesso à tecnologia”, Anais do IV Seminário Internacional de Transferência de Tecnologia, Rio de Janeiro, 1992.

(15) BLANCHARD, P.A., e Mc Donald, F.B., “Revinving Une Spirit of interprise: role of the Federal Labs”, Physics Today, p. 42 a 49, janeiro 1986.

(16) GALVIN, R.W., “Forging a word class future for the National Laboratories”, Issues in science and technology, p. 67 a 72, fall 1995.

(17) ROSEMBLOON, R.S., E SPENCER, W.J., “The transformation of industrial research”, Issues in science and technology, p.68 a 74, spring 1996.

(18) OFFICE OF SCIENCE AND TECHNOLOGY POLICY, Report of the White House Science Councit, “Federal Laboratory Review Panel”, Washington, 1983.

(19) Background/benchmark study for the Vanezuelan Institute of Enginering”, Centre for Business Research, Brighton Business School, University of Brighton, 1993.

(20) ARAOZ, A., “Industrial Technology Research Institutes in Latin America: their role in the 1990’s”, Anais do Seminário Internacional “O papel dos institutos de pesquisa em tecnologia industrial”, p. 13 a 33, São Paulo, 1995.

(21) VASCONCELLOS, E., et al, “Gerenciamento da tecnologia”, Editora Edgar Blucher, São Paulo, 1992. (22) HOPPE DE SOUZA, WILLY. “Institutos tecnológicos mutidisciplinares: contribuições para uma reestruturação institucional e organizacional”. Dissertação de mestrado, São Paulo, 2000.

(23) LONGO, W.P., “Tecnologia e transferência de tecnologia”, Anais do Seminário sobre propriedade industrial e transferência de tecnologia”, São José dos Campos, SP, 1987.

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