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INTRODUÇÃO
A proposta deste estudo surge como continuidade do trabalho desenvolvido
durante o processo de iniciação científica que resultou na monografia de conclusão
do curso de Licenciatura Plena em Educação Física, da Universidade Federal do
Espírito Santo (UFES). O objetivo da monografia foi realizar um mapeamento da
presença das grandes áreas1 do conhecimento na Educação Física escolar, por
meio dos artigos veiculados pela Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE),
no período de 1979-2004, cujo título foi: As Ciências Biológicas, Humanas e Sociais
na Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE) – 1979-2004.
O interesse por esse tema foi devido ao conhecimento de que, entre meados
do século XIX e o final do século XX, a constituição do pensamento pedagógico
sobre o componente curricular Educação Física se dá a partir de uma crescente
incorporação das Ciências Biológicas, a priori, com arraigado embasamento em
estudos da área médica, e também das Ciências Humanas e Sociais nesse campo.
Considerado o ícone representativo de uma certa intelectualidade do século
XX, Inezil Penna Marinho, em suas obras, estruturou o pensamento pedagógico da
Educação Física brasileira, o que foi fundamental para a consolidação acadêmico-
profissional para o que hoje se denomina Educação Física. Quanto aos estudos
sobre a crescente incorporação das Ciências Humanas e Sociais na Educação
Física, pode-se conferir Marinho (1944a, 1944b, 1948).
No que se refere a um passado mais recente, especificamente às últimas três
décadas, essa aproximação da Educação Física com as chamadas ciências-mãe é
denominada de “colonialismo epistemológico” por Sánchez Gamboa (2007), ao
entender que a Educação Física se torna um campo colonizado onde são aplicados
os métodos e as teorias dessas ciências e de suas subáreas, como as Ciências
Biológicas, com a Fisiologia, a Antropometria, a Medicina Esportiva; e as Ciências
Humanas e Sociais, com a Pedagogia, a Sociologia, a Antropologia, a Filosofia, por
exemplo.
Nesse sentido, a intenção daquele estudo inicial foi investigar, por meio de
um grande mapeamento, como ocorreu a incorporação dessas ciências na
constituição dos discursos de intelectuais que buscavam pesquisar a Educação
1 Biologia, Pedagogia, Sociologia e Antropologia.
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Física escolar, mormente no que se refere ao viés biológico e pedagógico,
apropriado com o intuito de apresentar informações sobre práticas e saberes
científicos em âmbito escolar.
Contudo, em relação ao corte biológico e pedagógico do conhecimento,
Ferreira Neto (1999, p. 241), em sua tese de doutoramento, já apontava que
A interpretação que põe em oposição a perspectiva da aptidão física e a perspectiva da cultura corporal parece artificial, tendo em vista que a Pedagogia na Educação Física brasileira [...] considerou a aptidão física como uma variável intrínseca ao trabalho corporal. A premissa defendida aqui é que, em qualquer teoria, mesmo as de fundamento histórico-social, é possível demonstrar que, se há prática de cultura corporal, há desenvolvimentos de aptidão física, independente do modo de produção dominante e do sistema político.
Interpretações que buscavam classificar a área numa ou noutra perspectiva
científica devem assumir o risco de tal feito considerando que, se, na década de
1980, as tensões da Educação Física giravam em torno de sua filiação ou não a um
ramo da ciência, ou de sua apresentação como uma ciência, os desafios atuais são
outros. Ao invés de preservar a dicotomia entre as Ciências Biológicas, Humanas e
Sociais, é preciso ampliar a discussão e questionar qual é a concepção de ciência
da qual se fala e qual é a que se pratica na área, especialmente na Educação Física
escolar.
Deseja-se argumentar que o movimento de institucionalização de uma nova
ciência e/ou o movimento de legitimação e legalização da Educação Física como
profissão foram gestados a partir dos modelos e ideais das clássicas disciplinas
científicas e das profissões que articularam sua legitimidade social a partir de um
projeto cientificista. As buscas intensas por status, por meio da afirmação da
autonomia teórico-científica, são marcas discursivas presentes na história do nosso
campo.
O estudo de Margotto (2000), circunscrito à última década do século XIX e às
três primeiras décadas do século XX, ao analisar a apropriação dos conhecimentos
oriundos da Psicologia pelos autores que escreviam nos periódicos paulistas de
educação, ressalta que a escola passou a ser objeto dos olhares para os quais se
dirigiram tanto os médicos, munidos das descobertas na área biológica, quanto uma
nova espécie de especialistas: os psicólogos. Além desses, pedagogos,
antropólogos, sociólogos e filósofos trataram de convencer o público de que a
escola exigia uma especialização do olhar respaldada pela ciência.
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Essa relação da escola com as diversas áreas do saber foi dada a ler na
RBCE pelos discursos de intelectuais que circulavam na revista e que conformavam
a disciplina Educação Física. Contudo, a influência desses saberes sobre o espaço
escolar e sobre suas práticas não é recente, como aponta a dissertação de
mestrado de Schneider (2003), que versa sobre a materialidade da Revista
Educação Physica no período entre 1932-1945. O autor identificou que essa
diversidade de saberes oriundos de distintas áreas do conhecimento já estava
presente desde a as primeiras décadas do século XX na Educação Física:
A Revista funcionou como um verdadeiro repertório de saberes, matérias que buscavam aproximar a Educação Física de vários campos do conhecimento, como a Antropologia e sua relação com a área, do mesmo modo procedendo com a Sociologia, a Filosofia, a Fisiologia e a Psicologia, entre outras (SCHNEIDER, 2003, p. 163).
Desse modo, percebe-se que impressos que circulavam no campo da
Educação Física, desde a década de 1930, dialogavam com diferentes áreas de
conhecimento, entendendo que estas teriam contribuições a esse campo por meio
de suas práticas, métodos e teorias.
É importante ressaltar que esta proposta de estudo é parte integrante de um
projeto maior intitulado A Constituição de Teorias da Educação Física no Brasil: o
debate em periódicos do século XX, que tem como objetivo a construção de um
itinerário de sistematização da(s) teoria(s) da Educação Física brasileira no século
XX. O referido projeto busca captar as características científico-pedagógicas dessas
teorias, tendo como referência sua inserção, limites e contribuições para a
implantação e consolidação da Educação Física como componente curricular nas
escolas, principalmente a partir de fontes periódicas da área da Educação e
Educação Física.
Tal projeto, inserido no PROTEORIA,2 utiliza periódicos da Educação e da
Educação Física como fonte privilegiada. A produção científica recente demonstrou
que o periódico foi utilizado desde o século XIX, como estratégia de divulgação das
perspectivas educacionais, oficiais ou não (FERREIRA NETO, 2000). No caso da
Educação Física, a partir da década de 1930, isso é particularmente visível. Por isso
considera-se que a teorização sobre Educação Física realizada no Brasil, no século
XX, tem nos periódicos uma fonte de pesquisa privilegiada pouco explorada.
2 Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física, localizado no Centro de Educação Física e Desportos, da Universidade Federal do Espírito Santo.
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Assim, longe de esgotar as possibilidades de pesquisa que emergem da
RBCE, tendo em vista que essa é uma fonte profícua de investigações na área da
Educação Física, o estudo inicial apresentado, com algumas alterações, será
aprofundado abrindo a possibilidade de problematizar o mesmo impresso3 sob uma
outra perspectiva.
DELIMITANDO AS PROPOSIÇÕES DO ESTUDO
A análise da produção científica tem sido utilizada para diversos fins,
permitindo avaliar pesquisadores, grupos de pesquisa, instituições científicas, bem
como as características e o nível da produção do conhecimento de diferentes áreas.
Como aponta Sánchez Gamboa (2007), as pesquisas que acompanham a produção
de uma específica problemática da Educação Física poderão revelar dificuldades
metodológicas e lacunas teóricas. Nesse sentido, o autor afirma:
Ainda são poucos os estudos que têm por objetivo a própria pesquisa em Educação Física. A ‘pesquisa sobre a pesquisa’ situada como uma nova área de estudos sobre as abordagens teórico-metodológicas que permeiam a pesquisa produzida e as análises sobre suas implicações epistemológicas [...] ajudaria a entender alguns elementos-chaves que determinam a qualidade da pesquisa (SÁNCHEZ GAMBOA 2007, p. 133).
Dessa forma, prestando atenção à trajetória da RBCE, seus processos de
continuidades e descontinuidades e, portanto, seus desdobramentos para a
Educação Física escolar, é que se apresentam os objetivos a serem alcançados por
esta pesquisa e que irão delinear o itinerário deste estudo. Os objetivos definidos
levaram em conta a movimentação dos atores e, principalmente, de seus discursos,
aqui considerados práticas de representação, veiculados no periódico em questão,
em três décadas de circulação e apropriação. Assim, objetiva-se:
a) apresentar a paisagem da pesquisa no que se refere a opções teórico-
metodológicas;
3 Os termos impresso, periódico e revista serão usados aqui como sinônimos.
17
b) apresentar um panorama dos 30 anos de existência da RBCE,
situando-a no espaço/tempo em que é produzida, posta em circulação e
apropriada;
c) mapear a RBCE, privilegiando artigos que se propuseram a estudar a
Educação Física escolar;
d) correlacionar e analisar as artes de fazer4 identificadas nos artigos
denominados com a escola, capazes de indicar as representações de
ciência, método e técnica existentes na produção da revista;
e) realizar o cotejamento entre os artigos classificados em sobre e com a
escola, ressaltando a reciprocidade de tais operações numa possível
relação equilibrada entre especulação e empiria.
Na busca por alcançar esses objetivos, ressalta-se que as características da
produção científica veiculada pela revista durante três décadas de circulação estão
marcadas pelo contexto social, político, cultural e econômico dos diferentes
momentos/movimentos pelos quais passou a Educação e, em especial, a Educação
Física brasileira, sendo o reflexo do que se entendia por ciência no âmbito da RBCE.
Silva (2003) reforça a hipótese aqui defendida, quando discorre sobre a
produção acadêmica dos mestrados nos anos de 1980, o que bem se aplica às
pesquisas publicadas na RBCE. Desse modo, a autora constata:
Em vários estudos que procuraram se afastar do modelo de pesquisa hegemônico nos mestrados nos anos 80, observamos que não há clareza em relação a problemática tratada. Algumas vezes, ao analisarmos os trabalhos, temos a impressão de que o autor desconhece qualquer concepção de pesquisa científica, das mais antigas às mais modernas, das mais ortodoxas às mais flexíveis. Demonstram, ainda, desconhecer os reais significados do problema de pesquisa. Muitos estudos são meras repetições de temas amplamente explorados, nacional e internacionalmente, não apresentando por isso nenhuma novidade científica. Os levantamentos bibliográficos realizados são muitas vezes superficiais e assistemáticos. Em alguns casos, o autor demonstra desconhecer a produção local, ou seja, da própria instituição na qual produziu a dissertação. Manifesta-se, ainda, uma falta de conhecimento mais profundo a respeito do referencial teórico-metodológico adotado na investigação. Muitos estudos, carecem portanto de rigor científic o e talvez a denominação pesquisa científica seja exage rada ou, no mínimo, inadequada para denominá-los (SILVA, 2003, p. 13, grifo nosso).
4 Esse termo foi tomado de empréstimo a Certeau (2007), entendendo que as práticas de pesquisa empreendidas nas escolas (locus das pesquisas selecionadas na RBCE) constituem-se como artes de fazer científicas.
18
A perspectiva dessa autora vai ao encontro do que Brandão (1994) relata
sobre pesquisa científica. Ele constata, em sua análise sobre a RBCE, que a
produção intelectual da área da Educação Física repousa sobre frágeis bases
científicas, teóricas e metodológicas.
Fundamentado nessa conjectura, é que este estudo se debruçou sobre as
práticas de pesquisa e saberes científicos que circularam na produção da RBCE,
com vistas a investigar essas práticas em termos de métodos e técnicas científicos
aplicados à Educação Física. Sobre isso, Certeau (2007), pondera que, desde o
século XVIII ao século XX, os historiadores destacam aquilo que fazem apenas
descrevendo ao invés de interpretar. Há uma disparidade entre o tratamento dado às
práticas e o reservado aos discursos, em que o primeiro registra uma “verdade” do
fazer, e o outro decodifica as “mentiras” do dizer. Contudo, há que se pontuar que
não há mal algum nas descrições; o problema está em fazê-las mal.
Dessa forma, Certeau (2007) relaciona a veracidade das práticas aos
embustes dos discursos, considerando o aparente distanciamento que se instalou
entre essas duas ações. Esse ponto de vista levou à ideia de que existem aqueles
que pensam e aqueles que executam na área da Educação Física. Na verdade,
essas ações, embora possuam características distintas, não podem ser isoladas
entre si e do todo. Oliveira (2001) se coloca sobre essa questão fazendo uma crítica
à produção historiográfica da Educação Física, apontando que
Uma significativa parcela da produção acadêmica sobre a Educação Física escolar – seja de cunho historiográfico, didático-metodológico, formativo etc. – enfrenta a discussão dos problemas adstritos ao espaço de atuação profissional do professor sem, contudo, atentar para aquilo que os próprios professores pensam sobre o que fazem, como fazem e por que fazem. Numa variante de análise, quando os professores são considerados, o são a partir de esquemas interpretativos pré-determinados, tais como a sua alienação, sua proletarização, sua indiferença, sua inércia, entre tantos outros. Faz-se tabula rasa da experiência singular de diferentes indivíduos e aprisiona-se essa mesma experiência em uma babel categorial que tenta explicar porque a história não foi como gostaríamos que fosse. Reedita-se assim, uma leitura da história que se confunde com a história oficial ou dos vencedores, uma vez que é negada à pessoas comuns – no nosso caso, professores – não só a sua leitura dos fatos como a possibilidade de marcar a sua forma de reagir diante dos fatos (OLIVEIRA, 2001, p. 5-6).
Esse autor tem razão ao afirmar que a produção acadêmica na área de
Educação Física, ao que parece − tomando por base os artigos da RBCE que fazem
parte do corpus documental desta pesquisa − tem priorizado um discurso sobre a
Educação Física escolar, sem, contudo, vivenciá-la “de dentro”, deixando clara uma
19
frágil aproximação com o trabalho dos professores na sala de aula (ou na quadra),
bem como com seus modos de ser, fazer e produzir. Produzir, sim, pois esses
praticantes da escola produzem saberes com base em suas experiências cotidianas
que podem contribuir, significativamente, para que entendamos melhor como
funcionam as particularidades, as miudezas de um lugar tão explorado, mas ainda
pouco conhecido: a escola.
Com isso, pretende-se justificar que a intenção deste estudo parte da
hipótese de que o periódico aqui investigado reproduz e reforça um discurso que
circula na história recente da Educação Física brasileira, no que se refere à
dicotomia teoria-prática. Deve-se mencionar que há autores na área de Educação
Física que apenas recentemente tentam se aproximar da escola, passando a
considerar que o campo da intervenção também pode produzir saberes que
emergem da prática pedagógica.
ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Para enfrentar os desafios postos nesta pesquisa, o plano de exposição
envolveu a introdução, cinco capítulos, considerações finais, referências e
apêndices. Na introdução, realizou-se a contextualização do tema, expondo,
também, os objetivos a serem perseguidos, assim como a estrutura organizacional
do estudo.
No primeiro capítulo, apresentou-se a paisagem da pesquisa que se pretende
realizar, enfatizando a problematização em torno dos caminhos teórico-
metodológicos escolhidos para investigar a RBCE, de modo a operar com as artes
de fazer científicas dadas a ler e a ver na revista. Além disso, realizou-se um
levantamento dos usos que têm sido feitos de periódicos da Educação e da
Educação Física, em especial a RBCE, na historiografia brasileira, seja como fonte,
seja como objeto de estudo.
No segundo capítulo, a intenção foi apresentar um panorama dos 30 anos de
existência desse periódico, situando-o no espaço/tempo em que foi produzido e
posto em circulação pelo CBCE, como dispositivo de controle e didatização do
campo. Assim, buscou-se identificar na RBCE a produção do conhecimento no que
se refere às práticas de pesquisa e aos saberes científicos mobilizados na disciplina
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Educação Física na escola e veiculados pela revista, atentando para as lutas de
representação travadas nesse espaço e, em maior proporção, no interior do próprio
periódico.
No terceiro capítulo, expõe-se o mapeamento de todos os artigos já
publicados pela RBCE que apresentaram interesse em estudar o tema Educação
Física Escolar, privilegiando a escola básica e regular de ensino. A posteriori, foram
identificados os distintos objetivos que delinearam esses artigos, visando com isso a
determinar aqueles que pretendiam abordar a Educação Física Escolar por um viés
teórico-reflexivo, aqui denominados de sobre a escola; e aqueles que, de alguma
forma, buscavam empreender uma aproximação com esse espaço, denominados de
com a escola.
No quarto capítulo, procedeu-se à investigação das representações de
ciência, método e técnica existentes na Educação Física que circularam por meio
dos discursos veiculados na produção da RBCE, ao longo de sua trajetória. A
intenção foi investigar o que se praticava em termos de métodos e técnicas
científicos aplicados à Educação Física, aqui chamados de práticas de pesquisa.
Esse olhar para uma tipologia científica buscou analisar o que essas representações
sugerem em relação ao debate sobre teoria da Educação Física brasileira, a partir
da segunda metade do século XX.
No quinto capítulo, objetivou-se identificar as representações de teoria que
foram mobilizadas no campo da Educação Física por articulistas que abordaram o
tema escola na RBCE. Isso foi feito com base no cotejamento entre os artigos
classificados em sobre e com a escola, entendendo que as representações
presentes em ambas as práticas de pesquisa são meios capazes de revelar
aspectos ainda não compreendidos no processo de constituição de um modo de
pensar a Educação Física e os saberes que lhe deram suporte como disciplina
escolar. Nesse sentido, foram ressaltados os processos de continuidades e
descontinuidades que permearam a constituição e a atuação dessas perspectivas no
campo da Educação Física.
21
CAPÍTULO 1
1 DA PROBLEMÁTICA À PROBLEMATIZAÇÃO: A PAISAGEM DE UMA PESQUISA
A pretensão aqui foi apresentar a paisagem da pesquisa, levando em
consideração que “O caminhar de uma análise inscreve seus passos, regulares ou
ziguezagueantes, em cima de um terreno habitado há muito tempo” (CERTEAU,
2007, p. 35). Assim, este capítulo reuniu os encaminhamentos teórico-
metodológicos, os usos do impresso na historiografia da Educação e da Educação
Física e, por fim, a organização em capítulos. Esse percurso indica, portanto, as
opções quanto à “maneira de caminhar” desta pesquisa, que pertence, aliás, às
maneiras e artes de fazer operadas por Certeau (2007).
Enveredar pelos 30 anos de produção da RBCE, que se apresenta como
dispositivo de divulgação e circulação de saberes afeitos à escola, contribui para
uma melhor visualização do que vem sendo produzido sobre Educação Física
escolar no campo. A análise desta produção também fornece subsídios para se
compreender a concepção de ciência, método e técnica aplicados à Educação
Física, bem como suas maneiras de fazer científicas.
A análise da produção científica de um campo de conhecimentos permite
identificar seu nível de desenvolvimento, assim como seu impacto sobre a
comunidade acadêmica e a sociedade em geral, admitindo um dimensionamento
comparativo entre os diferentes campos do saber. Nascimento (2005) ressalta que
os estudos sobre produção científica são relevantes também porque possibilitam
redefinir as políticas de pós-graduação de uma área com base nos dados
fornecidos pelas avaliações.
Diante do exposto, a escolha pelo periódico aqui privilegiado justifica-se por
ele se apresentar como uma das instâncias de difusão da produção acadêmica dos
pesquisadores da área e por ser um dos periódicos de maior tempo de circulação e
periodicidade, tornando-se um relevante veículo de publicações científicas para a
comunidade acadêmica. Ao longo de sua trajetória, a RBCE vem registrando a
história da Educação Física brasileira com base em diferentes temas, objetos e
problematizações, publicando artigos originais em português e inglês, oriundos de
22
pesquisas teóricas ou empíricas, assim como artigos de revisão, resenhas e relatos
de experiência.
A revista foi utilizada aqui como fonte, diretriz que configura estudos com
base no uso de periódicos, por eles permitirem, a propósito da leitura, acompanhar
de modo contínuo a atualidade das preocupações pedagógicas (CATANI; SOUZA,
1999), persistindo ao longo do tempo e podendo ser consultados muitas vezes e sob
distintos enfoques. Esses documentos surgem num determinado contexto e
fornecem informações sobre esse mesmo contexto, sendo essa a perspectiva
adotada aqui, ou seja, conhecer a história da Educação Física escolarizada por
meio do estudo interno do próprio periódico, prestando atenção às informações que
ele dá a ver e a ler. Convém lembrar que o documento, como argumenta Le Goff
(1996, p. 547-548), resulta
[...] de uma montagem consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento [...] que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu significado aparente.
Isso significa entender o periódico como o documento-monumento que ele é.
Contudo, enxergando-o como um testemunho que é produto de um lugar de poder e
que, por isso, o historiador deve se esforçar em não tomá-lo como algo pronto,
verdadeiro, inquestionável. Le Goff (1996, p. 548) complementa afirmando:
Cabe ao historiador não fazer o papel de ingênuo. [Pois] qualquer documento é, ao mesmo tempo, verdadeiro [...] e falso, porque um monumento é em primeiro lugar uma roupagem, uma aparência enganadora, uma montagem. É preciso começar por desmontar, demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de produção dos documentos-monumentos.
Com isso, pode-se afirmar que o documento não é um elemento neutro,
passivo, inquestionável, mas um objeto que carece de ser interrogado por seus
leitores. Deve-se saber que todo documento é monumento, pois resulta de um lugar
de poder. Contudo, é necessário ter a ciência de que se deve ultrapassar a barreira
das “cascas” de sua aparência, numa atitude de ressignificar aqueles documentos.
Como explica Ragazzini (2001, p. 14),
A fonte é uma construção do pesquisador [que permite] encontrar materialmente e reconhecer culturalmente a intencionalidade inerente ao seu processo de produção. Para encontrar é necessário procurar e estar
23
disponível ao encontro: não basta olhar, é necessário ver. Para reconhecer é necessário atribuir significado, isto é, ler e indicar os signos e os vestígios como sinais.
Entendendo a revista dessa forma, buscou-se, em sua leitura, reconhecer
qual discurso se fazia circular sobre práticas de pesquisa e saberes científicos no
âmbito da Educação Física Escolar, durante as três décadas de existência da
RBCE. Pensa-se que proceder dessa forma permite conhecer e reconhecer, em
suas páginas, maneiras de fazer possíveis, particulares e interessadas por parte
daqueles que buscavam e buscam ser a voz autorizada no campo da Educação
Física.
Quanto ao recorte temporal da pesquisa, este se estende de 1979 a 2009, ou
seja, do ano de sua criação até os dias atuais, perfazendo seus 30 anos de
existência. A opção por esse intervalo se justifica por se compreender que a
produção do conhecimento na área da Educação Física, como em qualquer outra,
toma rumos que se configuram, paulatinamente, ao longo do tempo, num processo
de continuidades e descontinuidades, e estas últimas talvez sejam mais
significativas para se entender a trajetória de uma revista científica, bem como o
contexto de sua criação, circulação e apropriação.
1.1 ENCAMINHAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
A respeito da trajetória da revista, faz-se menção à Marc Bloch que discorre
sobre o tempo histórico em que os fenômenos acontecem. Bloch (2001, p. 60) parte
da premissa de que “[...] nunca se explica plenamente um fenômeno histórico fora
do estudo do seu momento”. E complementa afirmando que “[...] a ignorância do
passado não se limita a prejudicar a compreensão do presente; compromete, no
presente, a própria ação” (BLOCH, 2001, p. 63).
Ao considerar que o conhecimento do passado permite que se balizem as
nossas ações no presente, reporta-se ao que diz Lucien Febvre, citado por Certeau
(2006, p. 22), quando define o passado como “[...] uma reconstituição das
sociedades e dos seres humanos de outrora por homens e para homens engajados
na trama das sociedades humanas de hoje”. A partir das proposições desses
autores, reafirma-se a importância de estudar as representações de um passado,
24
não tão distante, no presente. Assim, é possível vislumbrar um panorama das
transformações ocorridas na área por meio do que vem sendo produzido e veiculado
pela revista, especialmente no que se refere à Educação Física Escolar. Esta
pesquisa, então, está “[...] fundada entre o corte de um passado, que é seu objeto, e
um presente, que é o lugar de sua prática, [em que] a história não pára de encontrar
o presente no seu objeto, e o passado, nas suas práticas” (CERTEAU, 2006, p. 46).
Considerando a história da leitura e dos impressos, bem como o processo de
renovação da história em busca de “novas abordagens” de “velhos objetos”
(NUNES, 1992), é que se faz imperativo mencionar Roger Chartier como uma das
principais referências, considerada basilar para o movimento denominado Nova
História Cultural, que “[...] tem por principal objecto identificar o modo como em
diferentes lugares e momentos uma realidade social é construída, pensada, dada a
ler” (CHARTIER, 1991, p. 16-17).
Os ensaios de Chartier defendem uma mudança da história social da cultura
para uma história cultural da sociedade, entendendo esta como uma representação
coletiva, passando a considerar as práticas culturais compartilhadas por vários
grupos, compreendendo que essas práticas culturais “[...] devem ser vistas como
culturalmente ‘constituídas’ ou ‘construídas’” (BURKE, 1997, p. 98).
Dessa forma, compreender como se manifesta a produção científica sobre
Educação Física Escolar na RBCE não é fazer diagnóstico definitivo e nem propor
soluções, mas procurar os seus sentidos5 e seu movimento interno, buscando
entender o processo de constituição de suas práticas de pesquisa. Isso será feito
com base nas orientações de Certeau (2007, p. 49), quando este fala sobre o
processo de apropriação do texto por meio da leitura, ao afirmar que “A leitura
introduz [...] uma ‘arte’ que não é passividade”.
Dessa forma é que se procedeu à entrada desta pesquisadora nos artigos, ou
seja, contestando a suposta passividade, estabilidade e rigidez dos documentos e
percebendo-os, em sua dinamicidade, como espaço de expressão dos interesses
políticos, epistemológicos, sociais e culturais da Educação Física e das relações de
poder circunscritas na comunidade acadêmica. Sobre as escrituras, o autor pondera:
5 Sobre a produção de sentidos, Certeau (2007, p. 264) diz que “[...] uma literatura difere de outra menos pelo texto que pela maneira como é lida, e que enfim um sistema de signos verbais ou icônicos é uma reserva de formas que esperam do leitor o seu sentido”.
25
Numa sociedade sempre mais escrita, organizada pelo poder de modificar as coisas e reformar as estruturas a partir de modelos escritos (científicos, econômicos, políticos), mudada aos poucos em ‘textos’ combinados [...], pode-se muitas vezes substituir o binômio produção-consumo por seu equivalente e revelador geral, o binômio escrita-leitura. O poder instaurado pela vontade (ora reformista, ora científica, revolucionária ou pedagógica) de refazer a história, graças a operações escriturísticas efetuadas em primeiro lugar num campo fechado, tem aliás por corolário uma intensa troca entre ler e escrever (CERTEAU, 2007, p. 262-263).
Com base na perspectiva sobre o binômio produção-consumo, a atividade
leitora está circunscrita por relações de forças socioculturais entre produtores e
consumidores, num processo contínuo que se entremeia. Para Certeau (2007), o
consumo, que tem como característica suas astúcias, é uma produção que não se
faz notar por produtos próprios, mas por uma arte de utilizar aqueles que lhe são
impostos. As reflexões de Certeau (2007) sobre a atividade leitora nos lembram que
todo texto é produto de uma leitura, é sempre uma construção do leitor, ou seja, de
sua apropriação. O leitor, por sua vez,
Inventa nos textos outra coisa senão aquilo que era a ‘intenção’ deles. Destaca-os de sua origem (perdida ou acessória). Combina os seus fragmentos e cria algo não sabido no espaço organizado por sua capacidade de permitir uma pluralidade indefinida de significações (CERTEAU, 2007, p. 264-265).
Ainda quanto ao conceito de apropriação, Chartier (1988), que se vale das
proposições de Certeau, define-a como modos de interpretação, de construção de
sentidos.
A apropriação, tal como a entendemos, tem por objectivo uma história social das interpretações, remetidas para as suas determinações fundamentais (que são sociais, institucionais, culturais) e inscritas nas práticas específicas que as produzem (CHARTIER, 1988, p. 26).
Inserindo na discussão o conceito de representação, que predomina no
conjunto da recente produção em História da Educação no Brasil, Chartier (1988)
denomina-a como prática que constitui o social de forma ordenada, hierarquizada e
classificada pelas posições dos agentes que nela se articulam, entendendo-o como
alguma coisa que não se separa de sua materialidade. Para Schneider (2003), a
representação está no objeto, é o objeto, o qual passa a ser estruturante da
realidade e dos modos de apropriação. É, pois, um objeto cultural.
Para Chartier (1988, p. 17), a produção dessas “[...] representações do mundo
social [...] são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam”.
26
Portanto, a noção de representação pode ser entendida como a produção de uma
rede de relações, que é usada quando se quer compreender o funcionamento da
sociedade ou definir as operações intelectuais que lhes permitem entender o mundo.
Diante disso, Chartier (1991, p. 184), propõe uma dupla6 acepção para a noção de
representação, afirmando que
[...] as acepções correspondentes à palavra ‘representação’ atestam duas famílias de sentido aparentemente contraditórias: por um lado, a representação faz ver uma ausência, o que supõe uma distinção clara entre o que representa e o que é representado; de outro é a apresentação de uma presença, a apresentação pública de uma coisa ou de uma pessoa.
De acordo com as proposições desse autor, as formas produzem sentidos, o
que é particularmente visível nas páginas da RBCE quando está em foco sua
materialidade. Isso significa que a forma de representação é determinante do
sentido do que é representado, evidenciando a posição do sujeito que representa.
Essas proposições permitiram pensar que os artigos veiculados pela RBCE
teciam discussões sobre a temática escola com a pretensão de abordar, sob
ângulos distintos, o funcionamento da disciplina Educação Física, levando em
consideração as teorias e tendências educacionais vigentes, bem como as disputas
pelo poder, pelo acúmulo de capital social, cultural e simbólico que a área buscava,
que perfaz a trajetória da revista. Dizendo de outra forma, são as lutas de
representação que, pelo monopólio do campo da Educação Física brasileira,
buscavam ser a voz autorizada na relação com o mundo social, propondo que,
nessa relação, exista,
[...] em primeiro lugar, o trabalho de classificação e de delimitação que produz as configurações intelectuais múltiplas, através das quais a realidade é contraditoriamente construída pelos diferentes grupos; seguidamente, as práticas que visam fazer reconhecer uma identidade social, exibir uma maneira própria de estar no mundo, significar simbolicamente um estatuto e uma posição; por fim, as formas institucionalizadas e objectivadas graças às quais uns ‘representantes’ (instâncias colectivas ou pessoas singulares) marcam de forma visível e perpetuada a existência do grupo, da classe ou da comunidade (CHARTIER, 1988, p. 23, grifo do autor).
6 Em referência a essa dupla função do conceito de representação, Ginzburg (2001, p. 85 ), em apropriação de Roger Chartier, afirma que “[...] ‘representação’ faz as vezes da realidade representada e, portanto, evoca a ausência; por outro, torna visível a realidade representada e, portanto, sugere a presença. Mas a contraposição poderia ser facilmente invertida: no primeiro caso, a representaçãp é presente, ainda que como sucedânio; no segundo, ela acaba remetendo, por contraste, à realidade ausente que pretende representar”.
27
As lutas de representações são importantes para se compreender os
mecanismos pelos quais um grupo impõe ou tenta impor a sua concepção do mundo
social, os seus valores e o seu domínio. A essas lutas de representação, Bourdieu
(1983) se refere como luta pelo monopólio da competência científica, entendendo
O campo científico, enquanto sistema de relações objetivas entre posições adquiridas (em lutas anteriores), é o lugar, o espaço de jogo de uma luta concorrencial. O que está em jogo especificamente nessa luta é o monopólio da autoridade científica definida, de maneira inseparável, como capacidade técnica e poder social; ou se quisermos, o monopólio da competência científica, compreendida enquanto capacidade de falar e de agir legitimamente (isto é, de maneira autorizada e com autoridade), que é socialmente outorgada a um agente determinado (BOURDIEU, 1983, p. 122-123).
Resumindo, o que está em jogo no campo científico é o monopólio da
autoridade e da competência científica, expresso por meio das relações de poder
estabelecidas no campo social da Educação Física, lugar de luta pelo acúmulo de
capital simbólico,7 como capital fundado no conhecimento e no reconhecimento de
um determinado padrão de cientificidade, ditado por alguns cientistas em nome da
verdade e da razão. Assim, “[...] os dominantes são aqueles que conseguem impor
uma definição da ciência segundo a qual a realização mais perfeita consiste em ter,
ser e fazer aquilo que eles têm, são e fazem” (BOURDIEU, 1983, p. 128).
Tanto Bourdieu (1983) quanto Chartier (1988) corroboram que não existem
práticas científicas puras e neutras, assim como produção e veiculação de
conhecimento. O que há são jogos de interesse por parte dos praticantes da ciência,
que tentam fazer com que a sua concepção de cientificidade, ou aquela defendida
por seu grupo, se transforme em um paradigma dominante, nos termos de Kuhn
(2007), na defesa de uma ciência revolucionária.8
Decorre daí a intenção deste estudo em analisar os discursos veiculados na
RBCE, acreditando que eles podem indicar como foi se configurando a disciplina
Educação Física na escola, entendendo esses discursos como representações do
que se acreditava como práticas escolares cotidianas. 7 “Capital simbólico é uma propriedade qualquer (de qualquer tipo de capital; físico, econômico, cultural, social), percebida pelos agentes sociais cujas categorias de percepção são tais que eles podem entendê-las (percebê-las) e reconhecê-las, atribuindo-lhes valor. Mais precisamente, é a forma que todo tipo de capital assume quando é percebido através das categorias de percepção, produtos da incorporação das divisões ou das oposições inscritas na estrutura da distribuição desse tipo de capital [...]” (BOURDIEU, 1996, p. 107). 8 Para Kuhn (1970), as transformações paradigmáticas são revoluções científicas, e a transição sucessiva de um paradigma a outro, por meio de uma revolução, é o padrão usual de desenvolvimento da ciência amadurecida.
28
Retomando as categorias de prática e de representação, operadas com a de
apropriação, Carvalho e Hansen (1996, p. 15, grifo dos autores) afirmam que elas
[...] têm grande valor heurístico, pois permitem desnaturalizar as representações e deslocá-las da generalidade transhistórica de categorias mágicas como influência, imitação e transplante de idéias. A dissolução da naturalidade da representação faz com que os resíduos do arquivo falem a partir de si mesmos e, para isso, os reatualiza como evidências de práticas datadas, isto é, como representações de prática que resultam de práticas de representação . Quando se determina o caráter dessas práticas, pode-se também especificar o caráter das representações que elas produzem; e, uma vez que as mesmas práticas são formalizadas culturalmente, também se evidencia que são representações.
Esses conceitos articulados permitem uma “entrada” na revista de modo que
se compreendam as representações que a própria área tem de Educação Física
escolar nas décadas de 1980, 1990 e 2000, veiculadas por um periódico que se diz
representativo do pensamento pedagógico vigente.
Também foram consideradas as representações daqueles que escreviam
textos9 para a revista, bem como daqueles que efetivamente os faziam/fazem
circular, ou seja, os editores, uma vez que os autores escreviam textos que outros,
os editores, transformavam. Entender o conceito de representação como práticas
requer pensar numa rede de relações entre o que representa e o que é
representado, bem como as próprias representações.
Vislumbrar novos horizontes em um terreno há muito visitado constitui-se em
árdua tarefa que requer que novas categorias sejam construídas, para que esses
“velhos objetos” apresentem suas facetas pouco exploradas ou ainda inexploradas.
Schneider (2003, p. 15) sinaliza que, para a concretização dessa tarefa, deve-se
considerar a esfera da cultura, que é “[...] indicada como um locus privilegiado, pois
nela se pode ter contato com mundos que ainda necessitam ser compreendidos”, o
que torna a dimensão cultural um ambiente profícuo para se compreender o campo
educacional e a História da Educação.
Percebe-se, assim, uma estreita interlocução entre as proposições de Chartier
no campo da Nova História Cultural com a renovação dos estudos histórico-
educacionais. Fonseca (2003, p. 61) confirma essa assertiva ao dizer que “[...] é
9 Textos aqui considerados com base em Chartier (1988), quando este distingue texto e impresso, explicando o trabalho de escrita e a fabricação do livro. “[...] Façam o que fizerem, os autores não escrevem livros. Os livros não são de modo nenhum escritos. São manufacturados por escribas e outros artesãos, por mecânicos e outros engenheiros, e por impressoras e outras máquinas”(CHARTIER, 1988, p. 127).
29
inegável uma mudança no perfil da pesquisa em História da Educação no Brasil e a
influência que a [Nova] História Cultural tem tido nela”. Ainda conforme a autora, é
possível inferir que,
Entre os chamados novos objetos, predominam a história da leitura e dos impressos, sobretudo os escolares, a história da profissão docente, os processos de escolarização, a cultura escolar e as práticas educativas e pedagógicas. Além disso, ‘antigos’ objetos têm passado por releituras à luz de referências da História Cultural, como é o caso das idéias pedagógicas e do sistema escolar (FONSECA, 2003, p. 61).
É necessário salientar que os saberes e os modelos que a RBCE publica
possuem a inscrição de quem os autorizou a circular, seus editores, e é por esse
viés que a revista e as representações nelas contidas foram examinadas. Dessa
forma, as práticas escolares, como representações de professores/pesquisadores, e
estas traduzidas como um modo de ver o mundo, distinto de outros, repleto de
inventividades,10 é que esta pesquisa se propôs a investigar, considerando o lugar
de onde falam os autores que escreveram e escrevem no periódico em questão.
Nesse sentido, Schneider (2007, p. 136) observa:
Ao utilizar o impresso como objeto de estudo, produz-se as condições capazes de desinrigecer a História da Educação no Brasil, muito em função de ao se voltar as atenções para a imprensa periódica como objeto de investigação, voltar-se também o foco sobre as ações dos grupos e indivíduos que, na disputa por ser a voz autorizada sobre as questões educacionais, produziram [um] dispositivo como forma de dar a ver e a ler, a um público leitor, os saberes que acreditavam ser os mais adequados para a atuação docente dos professores.
As proposições de Certeau (2007) anunciam, para as pesquisas que tenham
por objeto o impresso, que é pertinente falar que o lugar de poder, ocupado por
grupos que escrevem para os periódicos, “É um domínio do tempo pela fundação
de um lugar autônomo” (CERTEAU, 2007, p. 99), onde o poder é preliminar ao
saber.
Nesta pesquisa, o lugar de poder do qual se fala é uma instituição científica,
o CBCE, organismo que, pela via da estratégia, constrói um “saber próprio” e o
coloca à leitura por intermédio da revista por ele chancelada. Quanto ao conceito de
estratégia, Certeau (2007, p. 99) o define como
10 O termo inventividade foi usado tomando como referência Certeau (2007), quando este se refere às distintas, possíveis e criativas “maneiras de fazer” dos praticantes, criando, assim, maneiras de utilizar a ordem imposta, por meio de táticas astuciosas. Dessa forma, o autor se refere aos usos como “[...] ‘ações’ [...] que são a sua formalidade e sua inventividade próprias e que organizam em surdina o trabalho de formigas do consumo” (CERTEAU, 2007, p. 93).
30
[...] o cálculo (ou a manipulação) das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder (uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição científica) pode ser isolado. A estratégia postula um lugar suscetível de ser circunscrito como algo próprio e ser a base de onde se podem gerir as relações com uma exterioridade de alvos ou ameaças (os clientes ou os concorrentes, os inimigos, o campo em torno da cidade, os objetivos e os objetos de pesquisa etc.).
Tomando como base esse conceito, percebeu-se que o impresso se tornou
instrumento estratégico para que um grupo fizesse valer sua voz como força
autorizada a intervir no campo. Essa é a relação que o CBCE estabelece com sua
revista que, sob chancela dessa entidade científica, atua como dispositivo de
divulgação de informações que subsidiem a prática pedagógica do professor.
A escola pode, então, ser considerada a extremidade final da interligação
entre o poder e o saber. É, pois, fundamental considerar a produção de sentidos em
suas descontinuidades, tal qual postula Chartier (1988), quando sugere pensar uma
história cultural do social, como algo que ultrapassa a história das mentalidades,
considerando que “[...] as categorias aparentemente mais invariáveis devem ser
construídas na descontinuidade das trajectórias históricas” (CHARTIER, 1988, p.
27).
Entende-se ser necessário discutir de forma mais detida a noção de
dispositivo adotada por este estudo. O arcabouço conceitual para essa discussão
terá como base as teorizações de Chartier (1988) e de Anne-Marie Chartier
(2002).11
Para Chartier (1988), o dispositivo é um mecanismo de controle que age
estrategicamente por intermédio de relações de poder que buscam definir como as
leituras devem ser realizadas, ou seja, formas de dominação destinadas à produção
de objetos determinados e/ou de uma escrita comum autorizada a circular por meio
do impresso. Outro aspecto levantado por esse autor é que o dispositivo tem a
função de “[...] moralizar os textos que o necessitam e criar para todos os livros [...]
as condições de uma nova legibilidade, simplificando e talhando o texto original”
(CHARTIER, 1988, p. 177).
A-M. Chartier (2002) afirma que os dispositivos não são utilizados apenas
como estratégias de controle, mas também como “[…] o lugar de realizações
inventivas, as que tratam do ‘como fazer’ e que acompanham as reformas vindas de
11 Sobre a utilização de periódicos como dispositivo, ver também os trabalhos de Biccas (2001) e Schneider (2007).
31
cima ou as inovações do campo” (A-M CHARTIER, 2002, p. 11). Dessa forma,
sublinha-se outro entendimento para o dispositivo, desta vez como mecanismo de
didatização do texto ou, no caso da revista, didatização do conhecimento científico,
conforme postula Toledo (2001) em estudo sobre a Coleção Atualidades
Pedagógicas, quando afirma que
[...] há todo um investimento em um aparelho crítico dos livros, que tem como função ou a didatização da obra ou uma sofisticação de sua apresentação. Os prefácios, as notas do tradutor, os comentários de especialistas, introduzidos nos volumes, auxiliam a homogeneização de apresentação dos textos em uma mesma coleção e, ao mesmo tempo, são um diferencial que acompanham a sua publicação. Um volume que pertence a uma coleção, que investe no aparelho crítico de apoio à leitura, é um produto diferenciado que oferece algo mais para o leitor, além do texto publicado (TOLEDO, 2001, p. 4).
A autora refere-se, nesse trecho, especificamente, ao trabalho com as
coleções, indicando que, a partir do conjunto de livros em coleção, é possível
recompor os projetos específicos como estratégias que visam a públicos leitores
característicos ou, ainda, a estratégia que constitui públicos leitores pelas
especificidades da publicação (TOLEDO, 2001).
Assim, pensa-se que a função de didatização se aplica também ao conjunto
das revistas do CBCE que, por meio de seu aparelho crítico (alvo de constantes
modificações em busca de um modelo ideal, sofisticado em sua apresentação),
opera no sentido de auxiliar a circulação e apropriação do conhecimento científico
que o CBCE, como instituição chanceladora da revista, visava a incutir no público
leitor.
Com isso, percebe-se que a RBCE atua, simultaneamente, como estratégia
de controle e de didatização do campo, sob a chancela do CBCE, o que resulta no
entendimento do periódico como dispositivo de produção de sentidos, por meio de
estratégias editoriais que visam a manter o controle sobre o campo. No entanto,
segundo Chartier (1988), essa decifração da escrita não esgota as possibilidades
de leitura, ao passo que são nos modos de apropriação que reside a especificidade
dos dispositivos.
Investigando a RBCE como dispositivo de controle, é preciso observar como
se dá o processo de tradução das informações expressas na revista como possíveis
contribuições para as aulas, para o que é praticado, efetivamente, nas escolas no
que se refere à disciplina Educação Física. Foram observados dois
32
movimentos/momentos internos: aquele em que os estudos são realizados numa
perspectiva reflexiva sobre o cotidiano escolar, e aquele que se desenvolve na
perspectiva em que a prática pedagógica é evidenciada de modo que são propostas
transformações nesse espaço.
Nesse momento, é oportuno trazer o conceito de trabalho de tradução de
Boaventura de Souza Santos. Para ele, “[...] a tradução é o procedimento que
permite criar inteligibilidade recíproca entre as experiências do mundo, tanto as
disponíveis como as possíveis” (SANTOS, 2004, p. 802). Assim, o trabalho de
tradução atua tanto sobre os saberes quanto sobre as práticas e, por conseguinte,
sobre seus agentes. Dessa forma, o trabalho de tradução deve incidir
simultaneamente sobre os saberes e sobre as práticas em que eles se traduzem.
Como se objetivou neste estudo adentrar o contexto da Educação Física
Escolar, foi necessário atentar para o lugar em que se encontra a escola na “cadeia
evolutiva” da produção e transmissão do conhecimento, especificamente, no
contexto da RBCE. Nesse sentido, compreender a produção acadêmica da RBCE
pela pesquisa documental bibliográfica significa assumi-la como fonte de
mensagens, pois esses documentos são o testemunho de vastas experiências e a
marca de um devir histórico.
Essa produção vem fomentando, ao longo de sua trajetória, o debate e a
constituição da área, incorporando-se aos avanços na área de Educação. Isso
equivale a reconhecer o status político e epistemológico dos documentos já que,
pertencendo a uma realidade e representando-a, eles estabelecem relações entre
discursos, aqui entendidos como práticas de representação.
Assumindo os artigos da RBCE como documentos e, portanto, testemunhos
de uma época, foi preciso recorrer ao paradigma indiciário de Ginzburg como
metodologia para investigar os discursos veiculados pela revista ao longo dos 30
anos. Para o autor, “[...] pistas talvez infinitesimais permitem captar uma realidade
mais profunda, de outra forma inatingível” (GINZBURG, 2003, p. 150). Partindo
desse pressuposto, buscou-se, por meio de indícios, vestígios, sinais, aquilo, por
vezes, silenciado pelos articulistas12 desses artigos. Contudo, o próprio autor
questiona:
12 Os articulistas foram aqui entendidos como os autores que escreveram textos para a RBCE.
33
Mas pode um paradigma indiciário ser rigoroso? A orientação quantitativa e antiantropocêntrica das ciências da natureza a partir de Galileu colocou as ciências humanas num desagradável dilema: ou assumir um estatuto científico frágil para chegar a resultados relevantes, ou assumir um estatuto científico forte para chegar a resultados de pouca relevância [...]. Mas vem a dúvida de que este tipo de rigor, é não só inatingível mas também indesejável para as formas de saber mais ligadas à experiência cotidiana [...] (GINZBURG, 2003, p. 178).
Com base nessa proposta metodólogia para explorar os artigos, em especial
no que se refere aos aspectos teórico-metodológicos, foram assumidos também os
riscos desse tipo de recurso considerando a subjetividade de interpretação dos
possíveis indícios encontrados na revista, de modo que, mais uma vez, as
ponderações de Ginzburg se fazem fundamentais para a condução deste trabalho.
Segundo o autor, “Ninguém aprende o ofício de conhecedor ou de
diagnosticador limitando-se a pôr em prática regras preexistentes. Nesse tipo de
conhecimento entram em jogo [...] elementos imponderáveis: faro, golpe de vista,
intuição13 (GINZBURG, 2003, p. 179).
Tendo por base essa metodologia, o material selecionado na revista integrou-
se a um banco de dados no qual foram registradas informações referentes ao
fichamento dos artigos selecionados para a análise (corpus documental), de modo a
facilitar sua consulta, acessibilidade e posterior discussão. Esse banco de dados foi
composto pelos itens: volume, número, mês e ano do artigo, título, autor(es), relação
dos autor(es) com a pós-graduação, objetivos, teoria e metodologia utilizadas para a
construção do estudo.
Assim, tomando como referência o paradigma indiciário (GINZBURG, 2003),
foi feita uma análise do conteúdo dos artigos que se encontravam em formato de
texto completo,14 nos quais se identificou, no título, resumo e/ou palavras-chave, a
presença das palavras: “escola”, “escolar”, “escolares”, “escolarização” e “colegiais”,
tendo o artigo privilegiado o tema Educação Física Escolar na educação básica
(infantil, fundamental e médio), em escola regular.
A concentração de estudos que tomam a criança como foco de pesquisas na
RBCE pode ser considerada um indicativo do interesse sobre esse público, visto ser
esse um campo profícuo para pesquisas no campo da Educação, em especial sobre
crianças inseridas na escola, espaço propício para investigações sobre o
13 Quanto à intuição, o autor usa esse termo como sinônimo de processos racionais. 14 Excluem-se resumos de teses e dissertações, resenhas, relatos de experiência, pontos de vista, entrevistas, debates e cartas ao leitor.
34
comportamento dos alunos em frente às novas propostas de práticas educativas,
considerando o conhecimento científico sobre a criança em seus processos de
aprendizagem escolar.
Contudo, foi preciso prestar atenção aos indícios presentes nesses estudos
que envolviam a escola, especialmente em termos teórico-metodológicos, uma vez
que foi observada certa fragilidade sob esse aspecto em alguns artigos da revista.
Esse é um ponto fundamental para as pesquisas no campo da Educação Física,
uma vez que essas fragilidades, denominadas de obstáculo epistemológico por
Bachelard (1996), podem comprometer o progresso da produção científica no
campo.
Esse autor assim se posiciona: “Quando se procuram as condições [...] do
progresso da ciência, logo se chega à convicção de que é em termos de obstáculos
que o problema do conhecimento científico deve ser colocado” (BACHELARD, 1996,
p. 17, grifo do autor). Nesse sentido, pensa-se que reforçar a produção do
conhecimento por oposição, ou seja, especulação versus empiria, pode se constituir
em obstáculo epistemológico para o campo da Educação Física.
Especialmente quanto aos aspectos teóricos, foram mobilizadas as
proposições de Gauthier et al. (1998) que defendem a constituição de uma teoria da
pedagogia, isto é, uma construção conceitual que integraria dimensões
especulativas e empíricas. Com base nesses autores, é possível traçar um paralelo
com a constituição de uma teoria da Educação Física brasileira, de tal modo que se
poderia pensar numa teoria da Educação Física que levasse em consideração as
perspectivas especulativas e empíricas que atualmente circulam no campo científico.
Sob essa perspectiva é que os artigos foram investigados, prestando atenção,
especialmente, aos usos do referencial teórico-metodológico mobilizados pelos
articulistas.
1.2 CAIXA DE UTENSÍLIOS OU BIBLIOTECA PEDAGÓGICA: USOS DO IMPRESSO NA HISTORIOGRAFIA
É a partilha de um conjunto determinado de códigos culturais que distingue práticas diferenciadas de apropriação, definindo comunidades distintas de usuários e conformando os usos que cada uma delas faz dos objetivos e dos modelos que lhes são impostos (CARVALHO, 2001, p. 137).
35
É dessa forma que a autora estabelece relações entre o suporte material, os
destinatários visados e os usos praticados com os impressos pedagógicos. Sobre o
uso de impressos em pesquisas no campo educacional, Carvalho (2001) examina
modalidades distintas de configuração material dos impressos destinados aos
professores, relacionando-as com diferentes estratégias pedagógicas de
conformação das práticas escolares.
De acordo com Catani e Souza (1999), a investigação com materiais desse
tipo, ou seja, impressos periódicos, pode contribuir para ampliar a compreensão da
vida escolar em termos da história do seu cotidiano, da ação dos atores educativos e
das práticas pedagógicas. “Trata-se de um dos poucos dispositivos capazes de
tornar visíveis as vozes dos alunos na tradução de como apreendem e recriam
configurações [...]” (CATANI; SOUZA, 1999, p. 17).
Uma das modalidades supracitadas refere-se ao uso do impresso como uma
caixa de utensílios, cuja composição deve ser buscada no campo normativo das
concepções pedagógicas correntes que prescreviam a boa arte de ensinar como
boa cópia de modelos. Essa pedagogia fundamenta-se no princípio de que ensinar a
ensinar significa fornecer bons moldes, roteiros de lições e/ou modelos de práticas
exemplares (CARVALHO, 2001). O impresso assim compreendido se organiza,
[...] segundo a lógica de fornecer ao professor ‘coisas para usar’ na sala de aula [...]. Nessa lógica, a revista é composta como uma espécie de caixa de utensílios cujos usos supõem regras que não necessitam explicitação e que, portanto, são dadas como regras culturalmente compartilhadas (CARVALHO, 2001, p. 144).
Essa modalidade de impresso, adotado nas décadas de 1910 e 1920 pela
pedagogia experimental, trazia a concepção pedagógica como arte de ensinar
embasada na cópia de modelos prescritivos de práticas de ensino, cujo sentido
estava em os professores extraírem deles seus princípios e aplicá-los
inventivamente (CARVALHO, 2001). Como exemplos de impressos que fizeram
circular concepções pedagógicas caracterizadas como caixa de utensílios,
apresentam-se como pioneiras e representativas a Revista Educação Physica
(1932-1945) e a Revista de Educação Física (do Exército) (1932- atual).
Contudo, essa pedagogia como arte de ensinar, cuja lógica era fornecer ao
professor “coisas para usar”, não sendo mais capaz de balizar a prática escolar, foi
substituída pela lógica da biblioteca pedagógica, que passa a fornecer ao professor
fundamentos para subsidiar a prática docente com um repertório de saberes
36
autorizados. Segundo Carvalho (2001, p. 154), “No campo normativo da pedagogia
da Escola Nova, os usos escolares do impresso são regulados por normas distintas
daquelas que prescrevem a arte de bem ensinar como boa cópia de modelos [...]”.
Nesse campo normativo, o que importa é constituir uma cultura pedagógica, compondo-se um repertório de valores e de conhecimentos destinados a balizar a prática docente. Para tanto importa suscitar novos hábitos de leitura no professorado, propondo-se roteiros de leitura e prescrevendo modos de ler e de utilizar o lido (CARVALHO, 2001, p. 155).
O periódico aqui investigado tem sua produção caracterizada por essa última
concepção, qual seja, a biblioteca pedagógica, que constituía a pedagogia com base
em motivações políticas, sociais e econômicas, defendendo a necessidade de
fornecer aos leitores um repertório de informações e de referenciais que orientassem
a prática docente. Dessa forma, o aparelho crítico dessa revista foi constituído com
base em elementos que oferecessem aos leitores condições para a reflexão, e não
para a aplicação imediata nas aulas de Educação Física, tal qual sugeria o modelo
da caixa de utensílios.
Assim, analisado como caixa de utensílios ou como biblioteca pedagógica, o
impresso se constituiu em um objeto profícuo para a produção de uma história da
educação e, por conseguinte, da Educação Física, menos centrada em leis e
regimentos oficiais e mais preocupada com os processos de apropriação de saberes
que são postos em circulação.
Estudos sobre a imprensa periódica foram se constituindo testemunho vivo de
ideologias políticas, métodos e concepções educacionais de um período.
Considerando o campo educacional, especialmente do ponto de vista pedagógico,
Frade (2002, p. 99) afirma
[...] que a imprensa [periódica] não só fornece a ‘informação’ de que a escola tanto precisa [...] quanto possibilita a ‘atualização’ dos professores e alunos. A imprensa [periódica] também contribui na construção de sentidos para a aprendizagem, quando a escola se apropria de seus suportes e textos, visto que as informações produzidas nesse métier são veiculadas em suportes autênticos, abordando temas e fatos cotidianos que estão na ordem do dia. Isso já poderia ser bem problematizado, se se pensar no uso que a escola pode fazer do impresso como fonte, em sala de aula.
Nesse contexto, eleger os periódicos como fonte ou objeto de estudo conduz
o historiador a uma ampliação em suas fontes tradicionais, levando-o a acessar
mecanismos discursivos que configuram determinados campos do saber. Vilela et al.
(2004, p. 402) afirmam:
37
A análise desses materiais possibilita apreender como os indivíduos produzem seu mundo social e cultural – na intersecção das estratégias do impresso, que visa instaurar uma ordem desejada pela autoridade que o produziu ou permitiu sua publicação, com a apropriação feita pelos leitores: nesse espaço percebemos as dependências que os unem e os conflitos que os separam, detectamos suas alianças e enfrentamentos.
A abordagem do tema proposto requer pensar, inicialmente, como os
articulistas que escreviam para o impresso em questão e o grupo que o idealizava e
o colocava em circulação compreendiam e projetavam a disciplina Educação Física
para crianças escolarizadas, utilizando diferentes modelos de práticas pedagógicas.
Por meio dessas representações, a análise abrange o modo como a
educação das crianças, com base nos saberes que a ela dão suporte pela via da
Educação Física, era projetada estrategicamente pelo grupo que dava vida e voz à
revista, reconhecendo aí “[...] um tipo específico de saber, aquele que sustenta e
determina o poder de conquistar para si um lugar próprio” (CERTEAU, 2007, p.
100). As referidas representações são aqui assumidas conforme extração de
Chartier (1988, p. 20) que afirma:
[...] por um lado, a representação como dando a ver uma coisa ausente, o que supõe uma distinção radical entre aquilo que representa e aquilo que é representado; por outro, a representação como exibição de uma presença, como apresentação pública de algo ou de alguém.
Com isso, esta pesquisa foi desenvolvida nos moldes propostos pelo
conceito de representação, em que os discursos produzidos sobre a Educação
Física, num tempo e espaço escolar, são práticas de representação de atores que
vivenciam determinados momentos históricos. Pensando nas práticas que
envolveram a produção desses discursos sobre a escola na RBCE, é que se
procurou compreender seus significados.
No contexto do uso do impresso periódico na historiografia, alguns estudos
têm nos periódicos suas fontes de pesquisa, primárias ou secundárias, exclusivas
ou não, destacando-se, especialmente, aqueles ligados à pós-graduação em nível
de mestrado e doutorado, entendendo-os como trabalhos de maior fôlego.
Para demonstrar que esse tipo de estudo não é tão recente, são
apresentadas, inicialmente, algumas pesquisas que tomaram como fonte ou objeto
de estudos os periódicos para compor uma produção voltada para a História da
Educação. Além desses, também são apresentados alguns estudos que utilizaram
38
periódicos da Educação Física, direcionados à produção de uma historiografia da
Educação Física brasileira.
Empreender esse tipo de levantamento bibliográfico foi importante no
sentido de situar o que já havia sido produzido por outros pesquisadores, seja no
campo da Educação, seja no campo da Educação Física, tomando o periódico
como objeto de investigação privilegiado. Esse levantamento permitiu demonstrar
que estudar periódicos não se constitui alternativa recente para ambas as áreas.
Assim, no processo de revisão, foram localizados os seguintes estudos que
recorreram a periódicos da área da Educação: Denice Barbara Catani (1989), Maria
Helena Câmara Bastos (1994), Ana Clara Bortoleto Nery (1993, 1999), Maurilane de
Souza Biccas (2001) e Maria Rita de Almeida Toledo (2001). Entendendo ser
importante situar esses estudos, espacial e temporalmente, foi realizada uma
descrição desses trabalhos, incluindo o tipo do estudo (dissertações e teses), o
título, o período e os objetivos a serem alcançados.
Catani (1989), com sua tese de doutorado, intitulada Educadores à meia-luz:
um estudo sobre a Revista de Ensino da Associação Beneficente do Professorado
Público de São Paulo (1902-1918), numa tentativa de reconstrução do ciclo de vida
do periódico, por meio de sua produção, pretendeu contribuir para a compreensão
da história dos investimentos dos professores paulistas no trabalho de delimitação e
organização do debate relativo às questões do ensino entre 1910 e 1920. Além
disso, a autora procurou situar o espaço dessa Associação como chanceladora do
periódico especializado no processo de constituição do campo educacional paulista.
Com atenção voltada à reconstrução nacional do Estado Novo, Bastos (1994)
produziu sua tese de doutoramento cujo título é O novo e o nacional em revista: a
Revista do Ensino do Rio Grande do Sul (1939-1942), na qual a autora analisou a
proposta político-pedagógica de renovação educacional rio-grandense, privilegiando
a questão do novo e do nacional no discurso do periódico, considerando o papel da
revista na modelização das práticas escolares e na orientação do fazer pedagógico
do professorado.
Ainda no que se refere ao campo educacional paulista, Nery (1993, 1999)
desenvolveu seus estudos, em nível de mestrado e de doutorado, acerca dessa
temática em periódicos. Nery (1993), em sua dissertação de mestrado, intitulada A
Revista Escolar e o movimento de renovação educacional em São Paulo (1925-
1927), analisa esse periódico que foi editado pela Diretoria-Geral da Instrução
39
Pública do Estado de São Paulo, no período citado, constatando-se a ocorrência de
disputas entre alguns membros da Sociedade de Educação15 de São Paulo e o
corpo editorial da Revista Escolar, em função de diferentes concepções do que era
relevante para o conhecimento pedagógico.
Já em seu estudo de doutorado denominado A sociedade de educação de
São Paulo: embates no campo educacional (1922-1931), Nery (1999) objetivou
analisar e discutir aspectos da estruturação do campo educacional paulista a partir
dos embates16 ocorridos entre 1922 e 1931 pelo monopólio das revistas
pedagógicas, investigando os discursos dos agentes e quais seriam as reais causas
desses embates.
Biccas (2001), em sua tese intitulada O impresso como estratégia de
formação de professores(as) e de conformação do campo pedagógico em Minas
Gerais: o caso da Revista de Ensino (1925-1940), estudou a Revista do Ensino
como estratégia de formação de professores(as), na qual buscou compreender, por
meio de sua materialidade, como o campo pedagógico mineiro foi sendo
conformado a partir das estratégias editoriais. Além disso, a autora procurou
evidenciar as motivações que levaram os responsáveis pela educação nesse
Estado a criar o periódico, destacando-se sua origem, interrupções e reativações na
sua circulação e diferentes propostas editoriais.
No estudo de doutoramento de Toledo (2001), denominado Coleção
atualidades pedagógicas: do projeto político ao projeto editorial (1931-1981), a
autora parte da proposta da História Cultural, considerando o impresso um objeto
cultural, operando com os conteúdos da Coleção em relação à materialidade de
seus processos de produção, circulação, imposição e apropriação pelos agentes
envolvidos, visando a traçar o perfil dessa Coleção.
Além dos estudos que utilizaram periódicos no âmbito da História da
Educação, foi possível localizar, também, pesquisas que recorreram a periódicos da
área da Educação Física, como indica Ferreira Neto (2005), quando analisa as
15 Fundada em 1922, em São Paulo, tinha como membros, entre outros, Fernando de Azevedo, Sampaio Dória, Lourenço Filho e Oscar Freire. De agosto de 1923 a dezembro de 1924, a instituição publicou um periódico intitulado Revista da Sociedade de Educação. Em janeiro de 1925, foi lançado o primeiro número da Revista Escolar, cujo corpo editorial era composto por João Pinto e Silva, José Veiga, Alduíno Estrada, Augusto Ribeiro de Carvalho e Antônio Faria (NERY, 1999). 16 Essa foi uma constatação feita por Nery (1993), que embasa os questionamentos de seu doutoramento.
40
fontes que vêm sendo usadas no Grupo de Trabalho Temático (GTT) Memória,
cultura e corpo do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE):
A variabilidade no uso de fontes tem se ampliado na última década [...]. Em ordem de recorrências, aparece o uso de bibliografia secundária, revistas, relatos orais, jornais, legislação, crônica/literatura, documentos oficiais/relatórios, imagens, livros didáticos, etnografia, fontes digitais da web (FERREIRA NETO, 2005, p. 152).
No contexto da Educação Física brasileira, foram localizados os seguintes
estudos: Magali Alonso de Lima (1980), Mario Ribeiro Cantarino Filho (1982), Sonia
de Deus Rodrigues Bercito (1991), Silvana Vilodre Goellner (1992,1999), Marcus
Aurélio Taborda de Oliveira (2001), Renato Souza Pinto Soeiro (2003), Edivaldo
Góis Júnior (2003), Meily Assbú Linhales (2006) e Cláudia Emília Aguiar Moraes
(2007). Esses estudos destacados são descritos a seguir.
Lima (1980), em sua dissertação de mestrado, denominada O corpo no
espaço e no tempo: a Educação Física no Estado Novo (1937-1945), utiliza como
fonte a Revista Educação Physica, a Revista de Educação Física (do Exército), o
Boletim de Educação Física e a Revista Cultura Política. A análise da autora recai
sobre os discursos que circulavam no período do Estado Novo que consideravam a
Educação Física como locus de disciplinarização do corpo, compreendendo-o como
alvo do poder, vinculado a modelos de comportamento social, político e econômico
que nele são impressos por meio de técnicas específicas.
Outra dissertação que se atém ao período do Estado Novo foi a de Cantarino
Filho (1982), intitulada A Educação Física no Estado Novo: história e doutrina, que
recorria à Revista Educação Physica, entre outros periódicos da época, somente
para fins de referência e reafirmação de seus argumentos, não fazendo menção
particular ao trato do periódico como fonte, já que, em seu estudo, enfatizava o
governo de Getúlio Vargas, fazendo referência ao autoritarismo e às formas de
controle social.
A dissertação de Bercito (1991), cujo título é Ser forte para fazer a nação
forte: a Educação Física no Brasil (1932-1945), também ressalta o período estado-
novista. A autora analisa a Revista de Educação Física (do Exército) e a Revista
Educação Physica, prestando atenção também ao Boletim de Educação Física e a
artigos publicados em outros periódicos oficiais do Estado Novo, tendo em vista
investigar o processo de disseminação da Educação Física a partir da década de
41
1930, que, por meio de um projeto político-ideológico, visava à construção de uma
“nação forte” rumo ao progresso.
Já Goellner (1992), em sua dissertação de mestrado intitulada O método
francês e a Educação Física no Brasil: da caserna à escola (1920-1946), referencia,
entre outras fontes, a Revista de Educação Física (do Exército) na qual busca situar
a utilização e oficialização do método francês no contexto brasileiro. A autora
sublinha a importância de analisar os periódicos que circulavam no período da
investigação pelo ponto de vista técnico e por suas relações com a ideologia
dominante. Quanto à sua tese de doutoramento, intitulada Bela, maternal e
feminina: imagens da mulher na revista Educação Physica, Goellner (1999) recorre
às imagens veiculadas na revista para discorrer sobre como o corpo feminino era
visto nas décadas de 1930 e 1940. Dessa forma, a autora faz uma leitura das
representações de gênero e de corpo que circularam no Brasil durantes as décadas
de 1930 e 1940.
Em sua tese de doutorado, intitulada Educação Física escolar e ditadura
militar no Brasil (1968-1984): entre a adesão e a resistência, Oliveira (2001) discute
a reconfiguração da disciplina escolar Educação Física no Brasil nos anos da
ditadura militar, usando como fonte a Revista Brasileira de Educação Física e
Desportos, periódico publicado entre 1968 e 1984 pela Divisão de Educação Física
do Ministério da Educação e Cultura. Além da revista, o autor utiliza ainda
programas escolares para a Educação Física e depoimentos de professores dessa
disciplina.
Soeiro (2003), em sua dissertação de mestrado denominada A contribuição
da Escola de Educação Física do Exército para o esporte nacional: 1933-2000,
utiliza a Revista de Educação Física (do Exército), tomando-a como uma de suas
fontes, já que também usou boletins escolares, boletins internos e boletins do
Exército como fonte. O objetivo do estudo era apresentar a trajetória da Escola de
Educação Física do Exército (EsEFEx) e suas contribuições para o esporte tanto no
Exército quanto na sociedade civil.
Por sua vez, Góis Junior (2003), em sua tese intitulada O século da higiene:
uma história de intelectuais da saúde: Brasil, século XX, propõe-se a analisar a
trajetória do movimento higienista ao longo do século XX, realizando uma
comparação entre a primeira e a segunda metade desse século. O autor aborda,
entre outras fontes, a revista Educação Physica, afirmando que seu ano de criação e
42
circulação é também o período em que se inicia um debate da Educação Física em
torno das teorias higienistas e dos métodos de ensino.
A tese de doutoramento de Linhales (2006), cujo título é A escola, o esporte
e a “energização do caráter”: projetos culturais em circulação na Associação
Brasileira de Educação (1932-1945), além dos arquivos dessa Associação (ABE),
utilizou a Revista de Educação Física (do Exército) como fonte secundária. O
estudo abordou as relações estabelecidas entre o esporte e a educação escolar e
tem como lugar da narrativa as práticas discursivas e institucionais produzidas e
realizadas pela ABE, em 1920 e 1930. O propósito foi, então, compreender as
maneiras pelas quais os signos e códigos esportivos compuseram ordenamentos e
enunciações que modelavam a escola moderna como tempo/espaço privilegiado na
socialização das futuras gerações.
A dissertação de Moraes (2007), Esporte proletário: uma leitura da imprensa
operária brasileira (1928-1935), utilizou, além de outras fontes, a Revista Educação
Physica com a finalidade de mostrar, em referência à história das práticas
esportivas, como o pensamento pedagógico, associado às transformações do
mundo do trabalho, interveio na classe operária.
No que se refere à apresentação e descrição de pesquisas que utilizaram o
impresso periódico como fonte ou objeto de estudo, optou-se por fazê-lo de forma
separada quanto a algumas produções17 desenvolvidas por membros do
PROTEORIA, considerando que os periódicos foram utilizados sob variados focos
de abordagem, a saber: História da Educação Física; Formação de Professores e
Cotidiano Escolar; Teoria da Educação Física; Avaliação de Periódicos da
Educação Física e Produção Científica/Pós-Graduação. Neste trabalho é possível
encontrar artigos, dissertações e tese, mas, para este momento, foram priorizadas
as duas últimas.
Inicia-se, então, este trabalho apresentando a tese de doutoramento de
Amarílio Ferreira Neto (1999), intitulada A pedagogia no Exército e na escola: a
Educação Física brasileira (1880-1950), que utilizou a Revista de Educação Física
(do Exército) como fonte historiográfica. Esse autor pretendeu investigar a
17 Essas produções se referem a artigos publicados pelos membros do PROTEORIA, instituto que congrega pesquisas na área de Educação e de Educação Física, podendo ser conferidas no endereço eletrônico www.proteoria.org, no item “Textos publicados pelo grupo”.
43
contribuição dos militares brasileiros na constituição de uma pedagogia da
Educação Física no Brasil, no período entre 1880 e 1950.
A dissertação de Omar Schneider (2003), cujo título é A Revista de Educação
Physica (1932-1945): estratégias editoriais e prescrições educacionais, objetivou
analisar e compreender essa revista, atentando para sua fórmula editorial, para os
procedimentos e intervenções que os editores realizaram para constituir o projeto
de um periódico comercial, porém de destinação pedagógica.
Kalline Pereira Aroeira (2004), com a dissertação Currículo e formação
docente em periódico de Educação Física: trilhando algumas questões da
identidade do professor, privilegia, como fonte, a Revista Brasileira de Ciências do
Esporte (RBCE), entre 1979-2002, para analisar a discussão sobre currículo e
formação docente em Educação Física.
A dissertação de Rafaelle Flaiman Lauff (2007), sob o título Útil e agradável:
a Revista de Educação (1934-1937), privilegia as estratégias editoriais e as
prescrições educacionais postas em circulação pela Revista de Educação do
Espírito Santo (REES), publicada na Capital do Estado durante três anos. Percebe-
se que Lauff (2007) envereda pelos mesmos caminhos que Schneider (2003),
contudo tem como foco outro impresso, apresentando uma face pouco explorada,
ou mesmo inexplorada da REES, visando a adentrar ao campo educacional desse
espaço.
Também em 2007, tem-se a dissertação de Magda Terezinha Bermond,
intitulada A Educação Física escolar na Revista de Educação Física (1932-1952):
apropriações de Rousseau, Claparède e Dewey. A intenção desse estudo foi
compreender as relações estabelecidas entre as propostas de práticas e conteúdos
para as aulas de Educação Física escolar e concepções pedagógicas de Rousseau,
Claparède e Dewey.
Andrea Brandão Locatelli, ainda em 2007, produz a dissertação Saberes
docentes na formação de professores de Educação Física: um estudo sobre
práticas colaborativas entre universidade e escola básica. Seu objetivo foi analisar
os saberes docentes produzidos na prática colaborativa do Estágio Supervisionado
do Curso de Educação Física da Universidade Federal do Espírito Santo.
A dissertação de Rosianny Campos Berto (2008), Regenerar, civilizar,
modernizar e nacionalizar: a Educação Física e a infância em revista nas décadas
de 1930 e 1940, estudou, como fontes/objetos, a Revista de Educação Física (do
44
Exército) e a Revista Educação Physica, buscando compreender o modo como
foram produzidas e veiculadas as representações acerca da educação da infância
escolarizada ou fora da escola, entre as décadas de 1930 e 1940, pelos diferentes
grupos de intelectuais que projetavam a Educação Física.
Os trabalhos ora apresentados, dissertações ou teses, são exemplos do que
vem sendo produzido na área de Educação e Educação Física utilizando as
publicações periódicas como fonte ou objeto de estudos. Assim, tendo esse tipo de
pesquisa se firmado como importante opção para a História da Educação e, de
modo semelhante, para a História da Educação Física, é que se faz relevante
mencioná-lo.
1.3 CONSUMO E PRODUÇÃO: USOS DA RBCE NA EDUCAÇÃO FÍSICA
Para uma contextualização com o tema proposto por este capítulo,
buscaram-se pesquisas que se apropriaram da RBCE como fonte ou objeto do
estudo, de forma ampla ou pormenorizada. Para isso, teve-se como base as
orientações de Certeau (2007) quanto ao conceito de usos, que o autor define como
a apropriação feita de determinado objeto por grupos ou indivíduos, que resulta na
fabricação (produção ou criação) de algo utilitário.
É importante salientar que os conceitos de consumo e fabricação encontram-
se intimamente relacionados, de modo que, para Certeau (2007), o consumo é o uso
astucioso, subversivo, que procura se apropriar daquilo que é produzido pelo outro,
em uma caça furtiva, visando a uma fabricação, na qual o consumidor se insere
pelas suas artes de fazer, impondo sua marca ao novo produto. A uma produção
corresponde outra produção qualificada de consumo que
[...] é astuciosa, é dispersa, mas ao mesmo tempo ela se insinua ubiquamente, silenciosa quase invisível, pois não se faz notar com produtos próprios mas nas maneiras de empregar os produtos impostos por uma ordem econômica dominante (CERTEAU, 2007, p. 39).
A noção de fabricação é permeada pela ideia de uma criação inventiva, em
que o consumidor age no tempo e no espaço vislumbrando a produção de algo
utilitário por meio de suas práticas. Assim,
45
A ‘fabricação’ que se quer detectar é uma produção, uma poética – mas escondida, porque ela se dissemina nas regiões definidas e ocupadas pelos sistemas da ‘produção’ (televisiva, urbanística, comercial etc.) e porque a extensão sempre mais totalitária desses sistemas não deixa aos ‘consumidores’ um lugar onde possam marcar o que fazem com os produtos (CERTEAU, 2007, p. 39).
A apropriação do impresso em questão se dá sob a forma de biblioteca
pedagógica (CARVALHO, 2001) com a intenção de produzir algo a partir de uma
leitura interessada das informações fornecidas pela revista, fabricando, assim,
novas pesquisas na área da Educação Física. Desse modo, os conceitos de
consumo e fabricação de Certeau (2007) contribuíram para realizar o levantamento
de estudos que se valeram da RBCE como fonte ou objeto, entendendo que
pesquisadores de diferentes vertentes temáticas se apropriaram desse periódico
sob diferentes olhares, colhendo informações para produzirem/fabricarem suas
próprias pesquisas.
Assim, por meio de um levantamento da produção, foi possível localizar cinco
pesquisas que se valeram da RBCE como mote do estudo, consumindo suas
informações, seja como fonte, seja como objeto, visando à fabricação de novos
estudos. Os trabalhos encontrados são, em sua maioria, dissertações de mestrado:
Carlos da Fonseca Brandão (1994), Cristina Borges de Oliveira (2003), Kalline
Pereira Aroeira (2004), Ana Flávia Souza Sofiste (2007) e Diego Luz Moura (2009);
além de uma tese de doutorado: Maria Izabel Brandão de Souza Mendes (2006).
Esse momento foi importante para determinar o caminho que os pesquisadores já
haviam trilhado, no sentido de compreender a produção da área e a própria revista
por meio de estudos mais aprofundados, como dissertações e teses.
Brandão (1994), em sua dissertação A revista do Colégio Brasileiro de
Ciências do Esporte (1978-1993), visou a identificar problemas da pesquisa em
Educação Física no Brasil, analisando para tanto os artigos publicados pela RBCE
no período indicado, considerados representantes da produção intelectual no
campo da Educação Física nos últimos anos. Observou-se que o autor fez um uso
da revista como fonte.
Oliveira (2003), em sua dissertação Políticas educacionais inclusivas para
infância: concepções e veiculações no Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte
(1978-1999), tinha como objetivo ampliar a sistematização de informações que
46
pudessem contribuir para o avanço do conhecimento sobre inclusão da criança
deficiente nas aulas de Educação Física escolar. Para tanto, a autora privilegiou
concepções e representações de criança e deficiência veiculadas pela RBCE,
utilizando esse periódico como fonte.
A dissertação de Aroeira (2004), Currículo e formação docente em periódico
de Educação Física: trilhando algumas questões da identidade do professor,
pretendeu analisar a discussão sobre currículo e formação de professores de
Educação Física, utilizando como fonte a produção da RBCE entre 1979 e 2002. A
autora empreendeu essa discussão com base nas referências teóricas fornecidas
pela Teoria Crítica Curricular.
Quanto à dissertação de Sofiste (2007), denominada Profissional ou
professor de Educação Física? interfaces de uma profissão regulamentada, a
autora analisou os discursos produzidos na RBCE a respeito do debate travado
acerca da regulamentação do profissional de Educação Física e ainda os fatores
sócio-históricos que configuraram o status dos responsáveis pelo ensino dessa
disciplina. Percebe-se neste caso mais um uso da revista como fonte.
Já a dissertação de Moura (2009) intitulada Cultura e Educação Física: uma
análise etnográfica de duas propostas pedagógicas, teve como objetivo geral
analisar as apropriações da perspectiva cultural na produção acadêmica da
Educação Física e nas aulas de Educação Física em duas instituições escolares do
Rio de Janeiro. O autor usa a RBCE, além de outros três periódicos, como fonte de
informações.
A única tese de doutorado encontrada foi a de Mendes (2006), cujo título é
Mens sana in corpore sano: compreensões de corpo, saúde e educação, que
propõe a ideia de que a máxima Mens sana in corpore sano subsume
compreensões de corpo, saúde e educação reapropriadas e reorganizadas por
teorias científicas e pedagógicas nos séculos XIX e XX. A RBCE nessa pesquisa
também foi utilizada como fonte, vislumbrando ser possível perceber, nos artigos
selecionados, a reapropriação dessas teorias a partir das temáticas: corpo, biologia,
atividade física, fisiologia do esforço e saúde, tendo em vista que essas teorias que
receberam contribuições das ciências biomédicas influenciaram a Educação Física
em busca de cientificidade.
Essa exposição sobre as produções que têm sido empreendidas com base
em diferentes abordagens do periódico em questão demonstra a iniciativa, por parte
47
de alguns autores, em aprofundar questões postas em circulação pela RBCE e que
vêm contribuindo para a área, levando em consideração que este é um canal para
veiculação de saberes no interior da comunidade científica, com vistas à difusão do
conhecimento.
Ressalta-se o interesse, por parte dos pesquisadores, em fazer uso da
produção da RBCE, mormente na década de 2000, talvez indicando um
reconhecimento, após quase 30 anos de circulação, desse dispositivo como
representativo de pesquisas na área de Educação Física, observando um avanço
no que se refere à linguagem do impresso.
48
CAPÍTULO 2
2 LEITURAS DO CAMPO DA EDUCAÇÃO FÍSICA: O CONTEXTO DE CRIAÇÃO, CIRCULAÇÃO E APROPRIAÇÃO DA RBCE
Sistematizam-se aqui dados sobre a Revista Brasileira de Ciências do
Esporte (RBCE) analisando sua materialidade, apresentando informações que
possam contribuir para visualizar um panorama do contexto em que a revista é
criada, posta em circulação e apropriada por professores/pesquisadores da
Educação Física.
Seguindo as proposições da Nova História Cultural que, ao utilizar o impresso
como objeto privilegiado, parte de um modelo que o toma pela sua materialidade,
objetivou-se proceder dessa forma, entendendo que a materialidade é a
manifestação das estratégias de conformação dadas a ver e a ler pelos editores do
periódico como fórmulas editoriais recrutadas para fazer circular as representações
daqueles atores que lutavam pelo campo em constituição.
Ressalta-se que não foi pretensão deste estudo empreender uma arqueologia
do objeto, tal qual o fez Schneider (2003) com a revista Educação Physica. O que se
pretende é abordar materialmente a RBCE nos pontos em que apresente relação
com a proposta de investigação do estudo, qual seja, a Educação Física escolar, na
perspectiva sobre ou com a escola.
Foi necessário, para analisar as três décadas de existência da RBCE, tomar
como eixo o papel que o CBCE, como instituição chanceladora dessa revista, vem
desempenhando na construção do campo acadêmico chamado de Educação Física.
Entender o CBCE como um locus representativo da área, um lugar de
circulação, difusão e crítica de políticas, de posições e de proposições para a
Educação Física facilita compreendê-lo como um território de tensões, de lutas e de
poder, em que diferentes representações de sociedade, de ciência, de Educação
Física, de esporte e de lazer disputaram e disputam sua orientação como entidade
científica, levando em consideração que o que estava em jogo era a disputa pela
acumulação de capital simbólico (BOURDIEU, 1996). É preciso estar ciente de que
essas lutas que envolveram momentos/movimentos importantes no campo científico
da Educação Física, especificamente, no que se refere à revista como suporte
49
material, permitem compreendê-la na descontinuidade da trajetória histórica desse
campo.
Além da disputa interna no CBCE, nota-se também a dominação política que
essa instituição científica exerce sobre a área. No entanto, sua trajetória abre
espaço para questionamentos sobre sua cientificidade, colocando em evidência sua
(in)definição no campo científico. Considera-se a criação do CBCE um registro que
marcou a história da ciência no campo da Educação Física. Considerando esta
pesquisa como histórica, retomam-se as orientações de Michel de Certeau, quando
discorre sobre os meandros da escrita da História e suas operações:
Em história, tudo começa com o gesto de separar, de reunir, de transformar em ‘documentos’ certos objetos distribuídos de outra maneira [...]. Na realidade ela consiste em produzir tais documentos, pelo simples fato de recopiar, transcrever ou fotografar esses objetos mudando ao mesmo tempo o seu lugar e o seu estatuto [...]. Longe de aceitar os ‘dados’, ele os constitui. O material é criado por ações combinadas, que o recortam no universo do uso. [...] e que o destinam a um reemprego coerente (CERTEAU, 2006, p. 81).
Tomando por base as orientações acima, parte-se da compreensão de que
toda pesquisa historiográfica18 é uma “operação”, que regula a escrita da História,
da qual é imprescindível a articulação entre um lugar social, práticas científicas e
uma escrita. Trazendo as proposições anunciadas por Certeau (2006) para
pesquisas que tenham por objeto o impresso periódico, é pertinente mencionar que
essa tríplice articulação parte de um lugar de poder de onde fala o grupo que
chancela o periódico (por exemplo, uma instituição científica); de mecanismos de
controle e de dominação destinados à produção de objetos determinados; e de uma
escrita comum autorizada a circular por meio do impresso.
A RBCE, posta aqui em análise para fazer circular informações e prescrições
sobre o que se produzia na área, parte de um lugar de poder instituído, o CBCE,
que estrategicamente (CERTEAU, 2007) produz, conforma um discurso que se quer
que seja reproduzido sobre a Educação Física escolar, suas práticas e saberes,
18 “Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-econômico, político e cultural. Implica um meio de elaboração que circunscrito por determinações próprias: uma profissão liberal, um posto de observação ou de ensino, uma categoria de letrados, etc. Ela está, pois, submetida a imposições, ligada a privilégios, enraizada em uma particularidade. É em função deste lugar que se instauram os métodos, que se delineia uma topografia de interesses, que os documentos e as questões, que lhes são propostas, se organizam” (CERTEAU, 2006, p. 66-67).
50
tratando do convencimento de um público leitor sobre determinados projetos,
propostas pedagógicas ou leis sobre a área da Educação e da Educação Física.
Quanto às práticas científicas da RBCE, intimamente ligadas ao lugar de
poder do qual são produto, por meio do grupo que chancela o periódico, são aqui
entendidas como as formas que produzem sentidos e, também, os discursos que
veiculam os saberes elaborados na área e postos em circulação no interior da
comunidade científica. Aliado a isso existe uma escrita comum autorizada a circular
por meio do impresso.
No caso específico desta pesquisa, buscou-se compreender o processo pelo
qual se produz conhecimento no campo da Educação Física como componente
curricular. Isso se traduz numa possibilidade de se alcançar os desdobramentos
dessa disciplina em âmbito escolar, revelando aspectos ainda não compreendidos
no processo de constituição de um modo de pensar a Educação Física e os saberes
que lhe deram suporte como disciplina escolar.
Criada em setembro de 1979, a RBCE se autointitula órgão de divulgação
oficial do CBCE, como pode ser visualizado no primeiro exemplar da revista (RBCE,
v. 1, n. 1, 1979), atuando como veículo de circulação e divulgação do conhecimento
produzido no campo da Educação Física nas últimas três décadas, amparando
pesquisas com distintos assuntos.
Esse periódico se caracteriza como uma revista científica preocupada com
temáticas relativas aos aspectos médico-biológicos das variáveis do comportamento
humano, à prática pedagógica e às discussões de cunho político e epistemológico
sobre a Educação Física, cuja produção é, basicamente, direcionada a
professores/pesquisadores. Especificamente, o impresso é tomado como material
que possibilita desvelar o campo educacional, informando sobre sistemas
escolares, processos educativos, modos de articulação teoria-prática, formação de
professores, polêmicas, debates e discussões que compõem esse campo
educacional.
Stumpf (1998, p. 2) chama a atenção para os periódicos científicos e sua
definição, afirmando que eles
[...] se constituem em uma das categorias das publicações seriadas, que apresentam como características particulares serem feitas em partes ou fascículos, numeradas progressiva ou cronologicamente, reunidas sob um título comum, editadas em intervalos regulares, com intenção de
51
continuidade infinita, formadas por contribuições, na forma de artigos assinados, sob a direção de um editor, com um plano definido [...].
Com essa definição do que é um periódico científico, retoma-se a descrição
da trajetória da RBCE atentando especialmente para sua periodicidade.
2.1 O RITMO DA RBCE
Esse é um ponto fundamental para se entender como um periódico se
estrutura e circula no campo científico, de modo a cumprir o papel de difusor do
conhecimento, constituindo-se um importante polo de divulgação. Como observa
Schneider (2003), em seu estudo sobre o ritmo da revista Educação Physica, as
estratégias que emprega para manter-se regular e atrair novos leitores, mantendo a
fidelidade dos antigos, permitem que se desenhe sua periodicidade.19
O cumprimento da periodicidade constitui uma das principais características
das publicações periódicas, o que é indicativo da agilidade da revista no processo de
recebimento e publicação dos artigos, bem como de sua boa qualidade (FERREIRA
NETO, NASCIMENTO, 2002). Prestando atenção a essas indicações sobre a
periodicidade das revistas, é que se empreendeu a análise na RBCE.
Essa revista foi criada originalmente para ter uma periodicidade
quadrimestral, ou seja, publicar três revistas por ano, especificamente, nos meses
de janeiro, maio e setembro, contendo textos de profissionais e estudantes de todas
as áreas das Ciências do Esporte (RBCE, v. 1, n. 1, 1979). Dessa forma, a RBCE,
até o ano de 2009, publicou 8620 exemplares e 80221 artigos, conforme pode ser
visualizado no Apêndice A.
Contudo, assim como qualquer periódico científico, a RBCE enfrentou
dificuldades para sua manutenção, deixando pistas disso já em seu segundo
19 “O emprego do termo periodicidade no estudo, referindo-se ao campo editorial, deve ser entendido como o período entre edições sucessivas de um mesmo tipo de publicação, ou como a regularidade do ritmo de produção de uma série e as causas suscetíveis de explicá-la no campo da História” (SCHNEIDER, 2010, p. 58, [no prelo]). 20 Considera-se, nesta pesquisa, como exemplar da revista, aquelas em que constam o registro de International Standard Serial Number (ISSN), sigla que representa o número designado a uma publicação seriada, na qual se encaixa o periódico, que tem por finalidade identificá-lo segundo padrões internacionais. 21 Chegou-se a esse total, conferindo, em cada exemplar da revista, o número de artigos publicados, com exceção dos textos em formato de resenhas, pontos de vista, entrevistas e debates, resumos de teses e dissertações, relatos de experiência e pôsteres.
52
exemplar, quando explicita que “As dificuldades gerais para que a sucessão de
publicações não sofresse interrupção eram fatores previamente conhecidos; mas
resolvemos correr os riscos da falha e de não cumprir o prometido” (RBCE, v. 1, n. 2,
s/p, 1980).
Mesmo enfrentando dificuldades, como falta de artigos para serem
publicados, seja por motivo de não envio, seja por sua baixa qualidade, seja por
motivos financeiros, a RBCE manteve-se ininterrupta até os dias atuais. Sobre a sua
duração, é preciso dizer que ela se mantém sem interrupções, valendo-se, por
vezes, de estratégias editoriais (CHARTIER, 1988), visto que detém o poder de
manipular as publicações conforme seus interesses, levando em consideração o
lugar de onde fala. Durante sua trajetória, foram registrados atrasos e alterações
para que não perdesse sua periodicidade, por exemplo, a publicação de números
acumulados em um único exemplar.
Nessas alterações, podem ser observadas: um suplemento publicado em
setembro de 1981, não devendo ser considerado como exemplar da revista, pois
não apresenta ISSN; o v. 11, n. 3, de 1990, não menciona na capa (conforme outros
exemplares) o mês de publicação (talvez para não evidenciar um possível atraso);
os números 1, 2 e 3 do v. 12, de 1992, foram publicados todos num único exemplar;
em 1994, o v. 15, n. 3, do mês de maio, foi publicado em junho, e o de setembro em
outubro; o v. 20 publicou o n. 2 e o n. 3 referentes aos meses de abril a setembro de
1999; no v. 21, são publicados o n. 2 e o n. 3 referentes aos meses de janeiro a
maio de 2000. Além disso, registra-se a publicação dos anais22 dos CONBRACEs no
formato de revista, trazendo a programação desse evento e os resumos dos
trabalhos apresentados, bem como, a partir de 1999,23 os textos completos.
Sobre as lacunas identificadas na periodicidade das revistas científicas,
Ferreira Neto e Nascimento (2002, p. 42) ponderam que a “A divulgação da
produção científica pressupõe a adoção de padrões editoriais consistentes e a
manutenção de uma periodicidade pontual e previsível”. Partindo da reflexão dos
autores, é possível constatar, em alguns editoriais, que a RBCE apresenta
22 Encontram-se anais publicados em formato de revista em quase todos os anos ímpares em que o CONBRACE acontece, sempre no mês de setembro, bianualmente, exceto os anais de 1997, que são publicados separadamente. Cf.: suplemento n. 1, de 1981; v. 5, n. 1, de 1983; v. 7, n. 1, de 1985; v. 9, n. 1, de 1987; v. 11, n. 1, de 1989; v. 13, n. 1, de 1991; v. 15, n. 1, de 1993; v. 17, n. 1, de 1995; v. 21, n. 1, cadernos 1, 2 e 3 de 1999. 23 Do I CONBRACE de 1979 até o XI CONBRACE de 1999, os anais são veiculados impressos. A partir do XII CONBRACE de 2001 até os dias atuais, eles são veiculados no formato de CD-ROM.
53
fragilidades nesse quesito, expondo em diversos momentos dificuldades para
cumprir sua meta, expressando o tom de sua preocupação em seus editoriais:
Entendendo a grande dificuldade que todos sentem quando da necessidade de publicar algum trabalho, como falta de tempo e principalmente paciência e perseverança e, acreditando na qualidade dos trabalhos realizados pelos membros do CBCE, nós, Editores da RBCE, gostaríamos em breve de podermos ver sobre as nossas mesas, muitos trabalhos para que possamos, passar aos leitores da RBCE, a seriedade com que, principalmente os membros pesquisadores atuam na área Ciências do Esporte (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, v. 4, n. 3, p. 73, 1983).
[...] continuamos com falta de trabalhos, sendo este um dos motivos de seu atraso, sendo que outros nos mandam trabalhos totalmente fora das normas de publicação desta Revista (RBCE, v. 6, n. 2, p. 138, 1985).
Sabemos do atraso da revista, não precisa ficar bravo e deixar de ser membro do CBCE. O problema não é só dos Editores e sim de todos os membros, principalmente daqueles credenciados como pesquisadores e dos que fazem pesquisa em Ciências do Esporte. Sendo assim, estamos na ‘Nova República’ batendo na mesma tecla – não há trabalhos para publicar – e com isso a revista não chega às mãos dos membros do CBCE. Publicar qualquer coisa nem sequer entra em cogitação em se tratando de uma revista científica [...]. Alguns membros chegam a argumentar que não enviam seus trabalhos, pois estes ‘não se enquadram na linha da revista’. Isso é falso, pois nossa revista nunca recusou um trabalho que fosse sério e coerente (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, v. 6, n. 3, p. 175, 1985).
Essa cobrança é amenizada quando o editor do exemplar v. 6, n. 3, de 1985,
coloca a RBCE em meio às dificuldades pelas quais passam outras revistas
científicas: “[...] a maioria das revistas científicas, principalmente no Brasil, sofre do
que poderíamos chamar de irregularidade aguda, portanto esse problema não é
exclusivo dos Editores e membros do CBCE [...]”.
No Gráfico 1, é possível perceber o ritmo de publicação da RBCE em seus 30
anos de existência, visualizando os momentos em que a periodicidade se mantém,
intercalados com momentos de dificuldades que impossibilitam a revista de manter
sua proposta original.
54
1
2 3 4 5 6 7 8
9
10 11
12
13
14
15 16 17 18
19
20
21 22
23 24 25 26 27 28 29 30 31
1
2
3
419
79
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Per
iodi
cida
de
Anos
Gráfico 1 – Ritmo de produção da RBCE (1979-2009), com indicação dos volumes e dos números das revistas publicadas por ano
1- 1(1); 7- 6(2), 6(3), 7(1); 13- 13(1); 19- 18(2), 18(3); 25- 24(2), 24(3), 25(1); 2- 1(2), 1(3), 2(1); 8- 7(2), 7(3), 8(1); 14- 12(1/2/3), 13(2), 13(3), 14(1); 20- 19(2), 19(3), 20(1), 26- 25(2), 25(3), 26(1); 3- 2(2), 2(3), 3(1); 9- 8(2/3), 9(1); 15- 14(2), 14(3), 15(1); 21- 20(2/3); 21(1/cad. 1, 2, 3); 27- 26(2), 26(3), 27(1);
4- 3(2), 3(3), 4(1); 10- 9(2), 9(3), 10(1); 16- 15(2), 15(3), 16(1); 22- 21(2/3), 22(1); 28- 27(2), 27(3), 28(1); 5- 4(2), 4(3), 5(1); 11- 10(2), 10(3), 11(1); 17- 16(2), 16(3), 17(1); 23- 22(2), 22(3), 23(1); 29- 28(2), 28(3), 29(1); 6- 5(2), 5(3), 6(1); 12- 11(2), 11(3); 18- 17(2), 17(3), 18(1); 24- 23(2), 23(3), 24(1); 30- 29(2), 29(3), 30(1);
31- 30(2), 30(3), 31(1).
55
Como se pode perceber no Gráfico 1, a RBCE lança seu primeiro e único24
exemplar no ano de 1979 com a proposta de ser veiculada quadrimestralmente,
conseguindo manter esse objetivo por sete anos. Entretanto, observa-se que, em
1987, o periódico foi editado duas e não três vezes, ferindo, pela primeira vez, a
periodicidade da revista, fato que se repete em 1990. Em 1991, é editado apenas
um exemplar durante todo o ano. Esse exemplar reúne os anais do CONBRACE
desse ano, provavelmente para não interromper a duração25 do periódico.
Já em 1992, são publicados quatro exemplares. Um deles editou números
acumulados (v. 12, n. 1, 2 e 3). O ano de 1997 pode ser considerado uma exceção,
uma vez que, mesmo publicando apenas duas revistas, não considera os anais do
CONBRACE como exemplar (como acontece nos anos anteriores e também nas
subsequentes).Os anais foram publicados separadamente, em formato diferente das
revistas. Quanto ao ano de 1999, foi publicado o v. 20, com o n. 2 e o n. 3 editados
num único exemplar, e o v. 21 com o n. 1 composto por três cadernos, com o
montante dos textos completos publicados por ocasião dos anais do CONBRACE
desse ano.
Como pode ser visto no Gráfico 1, no ano 2000, aparece a última alteração na
periodicidade da RBCE. São publicados apenas dois exemplares. Esse é um ano
que marca a trajetória da revista pois é quando é dado início a um novo ciclo da
revista (especificamente, o v. 22, n. 1) que passa a circular com novo design, em
formato de livro, com uma parceria entre o CBCE e a Autores Associados. Nos anos
seguintes, até a presente data, são lançados três exemplares da RBCE por ano,
cumprindo a periodicidade prevista.
A trajetória do periódico, explícita no movimento que vai se desenhando no
Gráfico 1, traz indícios de uma certa fragilidade científica – refletindo as limitações
do próprio campo de Educação Física − se considerarmos sua oscilação em termos
de periodicidade.
Apesar de manter sua publicação ininterrupta desde 1979, a revista não
consegue manter sua periodicidade, apresentando, com frequência, números
atrasados. No que se refere à produção científica, deve-se reconhecer que a RBCE
encontra-se inserida num contexto geral problemático acerca do critério
24 Visto que foi publicada em setembro de 1979, dando prosseguimento a esse volume no ano seguinte. 25 Marcada pela data de início e o tempo ininterrupto de existência do periódico (FERREIRA NETO; NASCIMENTO, 2002).
56
cientificidade, como afirmam Ferreira Neto e Nascimento (2002, p. 36): “Nesse
sentido [...], um certo amadorismo ainda se faz presente no cenário brasileiro de
publicação de revistas científicas da Educação Física, que ainda carecem de
padrões mínimos de qualidade editorial e gráfica [...]”.
Dessa forma, o tempo de publicação de um periódico pode influenciar
positivamente a sua qualidade. Todavia, no caso da RBCE, mesmo completando 30
anos de existência, ela ainda têm apresentado dificuldades quanto à sua
organização, embora, nos últimos nove anos, a questão da periodicidade tenha sido
regularizada.
Ainda em termos organizacionais, chama-se a atenção para outro indício de
que essa revista ainda não atingiu a maturidade necessária aos periódicos
científicos. Isso com referência à opção da RBCE por veicular ora exemplares
temáticos, ora exemplares não temáticos. Essa discussão sobre as temáticas será
feita no próximo tópico.
2.2 AS TEMÁTICAS COMO PRÁTICAS DE PRODUÇÃO DE SENTIDOS
Quanto às temáticas,26 ressalta-se seu papel estratégico na produção de
sentidos no campo da Educação Física por meio de seus dispositivos: RBCE e
CONBRACEs,27 ambos registrando temáticas que representavam − na visão do
CBCE − os anseios e as tensões existentes no percurso da Educação Física no
Brasil. Sob esse aspecto, Silva (2005, p. 61) evidencia:
[As temáticas] [...] expressam a orientação dada pela direção nacional ao debate acadêmico-científico. Demonstram, ainda, o que a entidade científica almeja que sua comunidade debata. De fato, as temáticas podem ou não expressar os clamores da área, mas quase sempre indicam até que ponto a entidade científica está sensível aos reclamos sociais de forma geral e de sua comunidade em particular.
Entretanto, para efeito de discussão, apenas a RBCE foi analisada, por ser
ela o foco deste estudo. Sobre o conteúdo da revista do CBCE, esta apresenta
momentos em que publica exemplares cujos artigos possuem diversos temas e, em
outras ocasiões, assume a opção por veicular exemplares com uma temática central. 26 Cf. temáticas das RBCEs e dos CONBRACES nos Apêndices B e C, respectivamente. 27 Encontra-se análise aprofundada sobre os CONBRACEs e sua relação com os caminhos da produção do conhecimento em Educação Física no Brasil em Silva (2005).
57
Analisando os primeiros anos da RBCE, percebe-se que não havia a preocupação
de editar revistas temáticas, permanecendo assim até o v. 8, n. 1, de 1986.
Essa tentativa é percebida pela primeira vez no v.8, n. 2/3, de 1987, cujo tema
era O que é Motricidade Humana? Até o ano 2000, foram várias as tentativas de
manter a revista temática, porém intercaladas com alguns exemplares não
temáticos. Até que, conforme o editorial da RBCE, v. 21, n. 2/3, de 2000, com o
propósito de emprestar ao periódico melhor qualidade de edição, o CBCE opta por
manter a revista com uma temática central a cada número, visando a contemplar a
produção emanada dos Grupos de Trabalho Temático (GTT),28 além da produção
tradicionalmente presente a partir da espontânea participação dos pesquisadores da
área.
Essa proposta vigora até o v. 30, n. 1 de 2008, que foi o período mais longo
das revistas temáticas. Hoje, a partir do v. 30, n. 2 de 2009, a RBCE exibe uma
organização não temática, apresentando artigos que tratam de diversos temas,
problemáticas e abordagens e que revelam parte dos distintos enfoques da atual
produção acadêmica da Educação Física.
As temáticas que a RBCE dá a ler, quando faz circular seus artigos pelo
campo da Educação Física, refletem o posicionamento assumido pelo CBCE, como
instituição chanceladora, e de um grupo seleto e vital para o direcionamento político
e científico de um campo, a saber: os editores. Parte-se aqui da visão dos editores
como atores do processo de produção e circulação dos impressos, forjando aí a sua
marca. Schneider (2007, p.135) afirma que o impresso,
Para produzir os efeitos esperados, utiliza-se de uma linguagem que pode ser exagerada, sensacionalista, ‘fundamentada’ na ‘imparcialidade’ ou na militância, mas uma característica que não deve ser creditada à imprensa é a neutralidade. Desse modo, o impresso coloca-se na condição de intermediário da sociedade, ou seja, por intermédio da imprensa, busca-se forjar a opinião pública.
28 O endereço eletrônico do CBCE (www.cbce.org.br) define GTT como instâncias organizativas responsáveis por aglutinar pesquisadores com interesses comuns em temas específicos; pela reflexão, produção e difusão de conhecimento acerca do referido tema; e por sistematizar o processo de produção de conhecimento com vistas à parametrização das ações políticas das instâncias executivas do CBCE.
58
Essa ideia fica clara quando tomamos por base as proposições de Chartier
(1988, 2004) sobre a Bibliothèque Blue,29 entendida como uma fórmula editorial que
visa a atingir os leitores, de modo a retirar, de um repertório de textos já editados,
aquilo que lhes parecem convir às expectativas e competências do grande público
que pretendem atingir. Nesse caso, o público leitor pensa, decide e age não pelas
coisas em si, mas pela “roupagem” que lhe é dada pelos editores da revista
(SCHNEIDER, 2007).
No campo da Educação Física escolar, ao observar a movimentação dos
editores da RBCE e as tendências de pesquisa por eles valorizadas por meio das
temáticas explicitadas, em 30 anos de circulação, é possível identificar algumas
características das pesquisas que eram desenvolvidas, ressaltando-se estudos
voltados aos aspectos biológicos e fisiológicos do homem, especialmente em
crianças, e também aqueles oriundos da grande área das Ciências Humanas.
Considerando a RBCE um recurso importante para compreendermos a
história recente da Educação Física escolar, assim como também da constituição de
seu campo, é que se traz para esta discussão Pierre Bourdieu e suas teorizações
sobre o campo científico, considerado por esse autor como o lugar de uma luta
concorrencial e desigual constante entre agentes dominantes e agentes dominados,
cujo interesse maior é o monopólio da autoridade/competência científica, de modo
que quem a conquista está autorizado a falar e agir com autoridade nesse campo
(BOURDIEU, 1983).
A discussão sobre autoridade no campo científico está intimamente
relacionada com o que esse mesmo autor denomina como capital simbólico. Para o
Bourdieu (1990, p. 35), “[...] as lutas pelo reconhecimento são uma dimensão
fundamental da vida social” e nascem da percepção de que existe um jogo a ser
jogado, no qual “[...] está em jogo a acumulação de uma forma particular de capital”
(BOURDIEU, 1990, p. 36). Desse modo, o capital simbólico projeta-se como
possibilidade de ser conhecido e reconhecido, de forma a deter o poder de
reconhecer, consagrar o que merece ser conhecido e reconhecido.
29 Chartier discute o papel desempenhado pelos editores de Troyes e a coleção de livros intitulada Bibliothéque Bleue, designada como o mais poderoso instrumento de aculturação escrita da França do Antigo Regime.
59
Vale ressaltar que a inserção do “sobrenome”30 Ciências do Esporte ao nome
do periódico fez parte dos esforços envidados na luta pelo reconhecimento da
autoridade e da competência científica dessa instituição, configurando-se, também,
e principalmente, como uma luta pela acumulação de capital simbólico (BOURDIEU,
1996), como capital fundado num determinado padrão de cientificidade, ditado por
alguns “cientistas” em nome da verdade e da razão.
Dito de outra forma, seria a capacidade do periódico de produzir de forma
autorizada e com autoridade, resumindo, assim, o objetivo “não dito” do CBCE,
relembrando as orientações de Bloch (2001) quando este afirma que os documentos
não falam por si sós, devendo o autor saber interrogá-los. Com isso, chama-se a
atenção para o que está nas entrelinhas das páginas da RBCE e nos interesses de
sua instituição chanceladora.
Essa movimentação é observada no CBCE que, desde de sua fundação,
busca ser a voz autorizada no campo da Educação Física por meio de práticas que
refletem formas específicas de comunicação, ou seja, a revista e o congresso, além
de reuniões científicas, como seminários e congressos regionais.
Nesse contexto, considera-se a RBCE como um dispositivo31 de controle do
campo (CHARTIER, 1988), que age a partir das relações de poder, visando a definir
as formas de leitura do impresso (por meio de protocolos), mesmo que a revista seja
forjada, também, com a função de didatização (A-M CHARTIER, 2002) do
conhecimento científico, ao propor, em seus artigos, uma fórmula editorial32
(CHARTIER, 1991) que permita ao leitor o manuseio do impresso, por exemplo, as
capas, os editoriais, as ilustrações, a organização por seções, enfim, aquilo que
facilite a compreensão do leitor quanto ao conteúdo do qual se apropria.
Como consta em editorial do primeiro exemplar da RBCE (v. 1, n. 1, p. 2,
1979), o CBCE “[...] emergiu da necessidade de estudar o esporte num contexto tão
amplo quanto científico”, estabelecendo para tanto os seguintes objetivos:
a) promover e incrementar a investigação científica relacionada com o efeito da
atividade física sobre a saúde do ser humano em várias etapas da vida;
30 Em alusão à Crônica Esportiva escrita por Osmar Pereira Soares de Oliveira, publicada no exemplar v. 1, n. 1 de 1979. 31 E os outros eventos também. Contudo o foco neste estudo é a RBCE. 32 Sobre fórmula editorial, ver Ferreira Neto et al. (2003).
60
b) congregar os profissionais e estudantes que estejam atuando na área de
ciências do esporte e atividade física;
c) promover, apoiar e integrar pesquisas;
d) determinar os índices de aptidão nas áreas biológica, psicológica e social da
população brasileira;
e) zelar pela manutenção de um elevado padrão de ética na área de ciência do
esporte.
Nesse mesmo editorial, há referência ao CBCE fazendo menção à sua
postura: “[...] de credos políticos e religiosos, nada de favorecimentos, mas a ética
em primeiro lugar. O CBCE poderá estudar a política do esporte, sem fazer política
no esporte” (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 1979, p. 2).
Contudo, Bourdieu (1983, p. 126-127, grifo nosso) nos ensina sobre a intrincada
relação entre política e ciência:
É o campo científico, enquanto lugar de luta política pela dominação científica, que designa a cada pesquisador, em função da posição que ele ocupa, seus problemas, indissociavelmente políticos e científicos , e seus métodos, estratégias científicas que, pelo fato de se definirem expressa ou objetivamente pela referência ao sistema de posições políticas e científicas constitutivas do campo científico, são ao mesmo tempo estratégias políticas. Não há ‘escolha’ científica – do campo da pesquisa, dos métodos empregados, do lugar de publicação; ou, ainda, escolha entre uma publicação imediata de resultados parcialmente verificados e uma publicação tardia de resultados plenamente controlados – que não seja uma estratégia política de investimento objetivamen te orientada para a maximização do lucro propriamente científico, isto é, a obtenção do reconhecimento dos pares-concorrentes .
Dessa forma, é questionável a posição que o CBCE diz assumir quanto à
ausência de credos políticos, por entender que, no campo científico, ciência e
política são elementos indissociáveis. Isso leva a crer que essa era mais uma
estratégia do CBCE calculada para conformar uma representação no campo, no que
se refere à sua neutralidade política e, portanto, científica, visando a demonstrar seu
“interessado desinteresse” por disputas no campo da Educação Física.
Como uma instituição ligada prioritariamente ao desenvolvimento e à
discussão da pesquisa, o CBCE, quando de sua criação, assumiu as características
do American College of Sports Medicine,33 o que pode explicar a inicial presença de
profissionais da área médica na direção do CBCE, bem como a produção de artigos
33 Colégio Americano de Medicina do Esporte, entidade científica formada por médicos.
61
científicos na área de conhecimento referente à Educação Física, privilegiando
estudos ligados à aptidão física, antropometria, biomecânica, anatomia e fisiologia.
Essa perspectiva de estudos permaneceu com vigor pelo menos durante os três
primeiros biênios34 com médicos na direção nacional da instituição. De modo geral,
em seus 30 anos, o CBCE foi representado, na ordem cronológica em que se
sucederam, pelos ex-predidentes que seguem, bem como sua formação científico-
acadêmica.
a) Victor Keihan Rodrigues Matsudo (1978-1981). Possui graduação em
Medicina, com residência médica em ortopedia e traumatologia, e
especialização em Medicina Esportiva, estreitando relações com a Educação
Física, atuando principalmente nos temas aptidão física e detecção de
talentos;35
b) Cláudio Gil Soares de Araújo (1981-1983). Possui graduação em Medicina,
especializado em Medicina Desportiva e Cineantropometria, com mestrado e
doutorado em Ciências Biológicas, com áreas de concentração distintas: a
primeira em Biofísica e a segunda em Fisiologia;
c) Osmar Pereira Soares de Oliveira (1983-1985). É o terceiro no rol dos
médicos, com especialização em Medicina Esportiva e em Medicina do
Trabalho, enveredando, mais tarde pelo caminho do jornalismo, tornando-se
cronista e narrador esportivo;
d) Laércio Elias Pereira (1985-1987). Possui graduação em Educação Física,
especialização em Handebol como Técnico Desportivo, mestrado e doutorado
em Educação Física. Foi o primeiro professor a assumir a direção dessa
instituição;
e) Celi Nelza Zulke Taffarel (1987-1989 e 1989-1991). Foi a primeira presidente
do CBCE a permanecer por dois mandatos. Também graduada em Educação
Física, tem especialização em Ciências do Esporte, mestrado em Ciência do
Movimento Humano e doutorado em Educação;
34 A permanência de cada diretoria é de dois anos, realizando-se as passagens dos mandatos, oficialmente, nos CONBRACEs. 35 Os dados apresentados sobre os presidentes do CBCE foram extraídos das informações por eles próprios postadas em seus respectivos curriculum lattes, e também em algumas obras publicadas em forma de livro.
62
f) Valter Bracht (1991-1993 e de 1993-1995). É o próximo da sequência de
presidentes que permaneceram por dois mandatos. Graduado em Educação
Física, especialização em Treinamento Desportivo, mestrado em Ciência do
Movimento Humano e doutorado em Ciência do Esporte, com concentração
em Sociologia do Esporte;
g) Elenor Kunz (1995-1997 e 1997-1999). É graduado em Educação Física, com
mestrado também em Educação Física e doutorado em Ciência do Esporte;
h) Lino Castellani Filho (1999-2001 e 2001-2003). Possui graduação em
Educação Física, especialização em Curso Técnico em Futebol e em
Relações Internacionais e Desenvolvimento Social, mestrado em Filosofia e
História da Educação e doutorado em Educação;
i) Ana Márcia Silva (2003-2005). É graduada em Educação Física,
especialização em Educação Psicomotora, mestrado em Educação e
doutorado em Ciências Humanas – Sociedade/Meio Ambiente;
j) Fernando Mascarenhas (2005-2007 e 2007-2009). Graduado em Educação
Física, possui especialização em Filosofia Moderna e Contemporânea,
mestrado e doutorado em Educação Física;
k) Leonardo Alexandre Peyré Tartaruga (2009-2011). Graduado em Educação
Física, possui mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano.
Com base do panorama apresentado sobre a formação acadêmica daqueles
que já ocuparam ou ainda ocupam o lugar de poder que confere autoridade de fala,
de escrita e, portanto, de teorização no campo da Educação Física, pensa-se que é
possível compreender a trajetória de mudanças observadas nas páginas da RBCE e
nos CONBRACEs quanto aos temas privilegiados, como reflexo de movimentos
internos, especialmente o crescimento, no interior do CBCE, do segmento de
professores de Educação Física − com suas pós-graduações em Educação ou áreas
afins.
A visão hegemônica, ou paradigmática (KUHN, 2007), sobre a produção
científica da Educação Física no Brasil esteve, de modo geral, até a primeira metade
dos anos de 1980, influenciada por uma concepção positivista de ciência que
valorizava abordagens metodológicas que se valiam de medições, quantificações e
análises estatísticas dos dados voltadas para a antropometria, fisiologia, ergometria,
63
enfocando temas ligados a aspectos médico-biológicos da atividade física, ao
esporte de alto rendimento e à avaliação da aptidão física (SILVA, 2005).
Essas características conferem com o período em que o CBCE foi presidido
por médicos, justificando-se o tipo de pesquisa, os métodos e as técnicas científicas
aplicadas nos estudos. Vale destacar, nesse ínterim, os esforços envidados por essa
instituição, especialmente durante as primeiras gestões, para o acúmulo de capital
simbólico por aqueles que desejavam dar projeção à perspectiva biológica da
aptidão física por eles defendida. Os artigos publicados pela RBCE que, em um
determinado período, trazem essas características, sofreram críticas quanto à sua
estrutura, quando se afirma que eles
Contém referências a trabalhos de autores que estudam o mesmo problema – forma ‘científica’ de legitimar o problema como um problema importante – descrições minuciosas do material e método utilizados na pesquisa – confundindo ‘objetividade e reprodutibilidade’ da pesquisa com a superação do ‘empirismo’ em educação física. A exposição e discussão dos dados não ultrapassam ao que podemos chamar de ‘constatação’, entendida aqui no seu sentido depreciativo de óbvio. Conclusões não conclusivas apontam que mais pesquisas devem ser feitas sobre o mesmo assunto [...]. A epopéia termina com extensas bibliografias, algumas só com artigos estrangeiros, outras com várias referências a pesquisas do próprio autor, outras já incorporando os artigos publicados nas RBCE’s anteriores. Quase chegam a assustar [...] (PAIVA, 1994, p. 112).
A autora, quando critica a produção da revista, faz também uma crítica ao
fazer científico realizado na área representada por esse periódico. Segundo Brandão
(1994), ao longo de sua existência, a RBCE deu mostras, por meio de seus
editoriais, de que se autoconsidera como um veículo de informação científica.
Contudo, a qualidade dessa informação é questionável, visto que em estudo
realizado pelo autor, foi detectado que, de um total de 204 artigos publicados no
período de 1979-1993, constatou-se que 108 apresentaram algum tipo de problema
de ordem teórica ou metodológica, o que leva o autor a afirmar que
A RBCE apenas reflete a situação da área que, em parte, ela representa, ou seja, por mais que desejasse, não seria possível esconder a inconsistência teórica e científica que ainda se faz presente na área de Educação Física. Isso se torna mais claro e preocupante quando constatamos que muitos dos autores que publicaram artigos contendo absurdos são professores, mestres e até doutores dos cursos de graduação, e mesmo pós-graduação, em Educação Física, nas mais conceituadas universidades brasileiras (BRANDÃO, 1994, p. 136).
O posicionamento de Paiva (1994) e o de Brandão (1994) revelam o valor que
a memória coletiva (LE GOFF, 1996) desempenhou no campo da Educação Física
64
quanto à desvalorização dos estudos da área biológica. Conforme esse autor, a
memória coletiva faz parte das grandes questões das sociedades, das classes
dominantes e das dominadas, ambas lutando pelo poder, reforçando que
[...] a memória coletiva é não somente uma conquista, é também um instrumento e um objeto de poder. São as sociedades cuja memória social é sobretudo oral ou que estão em vias de constituir uma memória coletiva escrita que melhor permitem compreender esta luta pela dominação da recordação e da tradição, esta manifestação da memória (LE GOFF, 1996, p. 476).
Ao que parece, alguns autores do campo da Educação Física contribuíram
para a construção dessa memória, desqualificando trabalhos desenvolvidos sob a
perspectiva, por eles denominada, de “biologicista”, como se essa vertente fosse
menos importante que outras. Mas, considerando que a “memória é uma ilha de
edição” (SALOMÃO, 1996), entende-se que ela é, portanto, seletiva e política.
Seletiva, pois escolhe, define, edita o que deve ser preservado e o que deve ser
esquecido, operando com alguns fatos selecionados.
Segundo Chagas36 (2009), “A memória não é passado; é uma representação
do passado no presente. Por ser representação é que ela não é total, operando,
então, com seleções”. Dessa forma é que se constrói uma memória coletiva.
Percebe-se, então, que a memória é também e, talvez principalmente,
política, porque, ao operar selecionando alguns fatos e outros não, atua valendo-se
do poder e dos interesses de quem seleciona. Lovisolo assevera (1989, p. 16): “[...]
a memória coletiva firma-se cada vez mais conscientemente como leitura seletiva”.
Infere-se daí que a memória é, portanto, uma construção de caráter político. Chagas
(2009) afirma que “Onde há memória há poder, e onde há poder há memória”.
Entendendo dessa forma a construção da memória no presente, é que se
vislumbrou colocar em evidência as condições de sua produção e circulação no
campo da Educação Física, buscando compreendê-la e não julgá-la. Nesse sentido,
refere-se ao cuidado de não “cair na armadilha” de seguir um discurso enraizado
que induz à desqualificação de estudos nas áreas biológicas.
Conforme desejava um determinado grupo que pretendia criar uma memória
para a Educação Física, pesquisas que concebiam a ciência como medição,
quantificação e comparação de dados estatísticos não mais atendiam às 36 Conferência proferida no XVI CONBRACE E III CONICE, na cidade de Salvador (BA), pelo Prof. Dr. Mário de Souza Chagas no GTT Memórias da Educação Física e do Esporte, cujo tema era “Memória”.
65
necessidades da comunidade científica, bem como da população em geral da área,
que ansiava por novos conhecimentos e por novas práticas e representações de um
fazer científico que contemplassem as demandas sociais. Considerando que o poder
da memória pode operar a favor ou contra determinadas causas, nota-se nesse
discurso uma influência que reduz a importância desse tipo de estudo para a área
naquele momento. Segundo Caparróz (2005, p. 11),
Pode-se observar que, entre o final dos anos de 1970 até meados dos anos de 1980, parece haver uma união de forças, num esforço concentrado por parte de todos aqueles que se situavam no campo dos ‘progressistas’, para a construção de um movimento renovador na área capaz de se contrapor ao paradigma biológico hegemônico.
Assim como se criam memórias, inventam-se tradições que podem incluir “[...]
tanto as tradições realmente inventadas, construídas ou formalmente
institucionalizadas, quanto as que surgiram de maneira mais difícil de localizar num
período limitado e determinado de tempo [...] e se estabeleceram com enorme
rapidez” (HOBSBAWN, 1997, p. 9). Para Lovisolo (1989, p. 19), a “[...] memória [...]
já é uma tradição”. Portanto, pode-se inferir que a memória existe mesmo que tenha
sido inventada.
Em início dos anos de 1980, forja-se o diagnóstico de que a Educação Física
estava em crise ou que ela precisava entrar em crise, conforme indicavam alguns
intelectuais da área,37 especialmente Medina (1983) em sua obra A educação física
cuida do corpo... e “mente”: bases para a renovação e transformação da educação
física, considerada um importante marco que influencia e alavanca o movimento
renovador no que se refere às produções da área (CAPARRÓZ, 2005). Essa
perspectiva de crise, é entendida
[...] como uma perturbação que altera o curso ordinário das coisas, ou como uma situação social decorrente da mudança de padrões culturais, que se supera na elaboração de novos hábitos por parte do grupo, quando ocorre a desestabilização das tradições, sem contudo a superação das mesmas, ou ainda como uma mutação dos valores, do conceito filosófico do mundo ou da forma de agir diante da vida, uma mudança na orientação do modo de viver [...] (MEDINA, 1983, p. 35).
Contudo, é possível afirmar que essa suposta crise existiu apenas para um
pequeno nicho da comunidade científica, que defendia a urgência de a área entrar
em crise, sendo capaz de questionar criticamente seus valores, práticas e métodos,
37 Ver trabalhos de Medina (1983), Oliveira (1994), Caparróz (1997) e Daolio (1997).
66
justificar-se a si mesma e procurar sua identidade. Contudo, como aponta Caparróz
(2005), a Educação Física não entrará em crise amparada apenas pela vontade de
alguns de seus intelectuais, por prescrição, depositando nessa crise as esperanças
de uma possível saída para o desenvolvimento qualitativo da área.
Ressalta-se, então, que esse movimento aconteceu distante do campo de
intervenção da prática pedagógica, do ensino e da atividade docente que se dá na
escola. Daí decorre o fato de que não se deve generalizar a amplitude dessa crise,
uma vez que ela não contempla todas as interfaces da Educação Física como área
de conhecimento.
Dessa forma, compreende-se que a própria criação de uma memória coletiva
para a Educação Física, por parte de determinado grupo, constituiu-se em tradição
inventada, na medida em que é capaz de estabelecer ou legitimar relações de
autoridade, socializar, inculcar ideias, sistemas de valores e padrões de
comportamento (HOBSBAWN, 1997). Esses eram os objetivos dos intelectuais ao
anunciar tal crise. Dito isso, as tradições inventadas podem ser entendidas como
[...] um conjunto de práticas normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica automaticamente, uma continuidade em relação ao passado (HOBSBAWN, 1997, p. 9).
Nesse ínterim, o próprio autor questiona: o que os historiadores ganham com
o estudo da invenção das tradições? E responde que,
Antes de mais nada, pode-se dizer que as tradições inventadas são sintomas importantes e, portanto, indicadores de problemas que de outra forma poderiam não ser detectados nem localizados no tempo. Elas são indícios. [...] esclarece bastante as relações humanas com o passado e, por conseguinte, o próprio assunto e ofício de historiador (HOBSBAWN, 1997, p. 20-1).
Inventada a crise, é possível extrair contribuições importantes para a
Educação Física, como é o caso da movimentação em torno do “alerta” dado em
relação à contraposição a uma perspectiva de estudos − um paradigma – que se
estabelecera, abarcando parte considerável da produção desenvolvida no campo
científico, no início da década de 1980.
Diante dessa situação, a tentativa era superar o modelo que dava suporte ao
tipo de ciência realizada até então, diversificando a produção científica da área,
67
abrindo para o campo da Educação Física outros caminhos investigativos,
enfatizando a necessidade de ela pautar-se numa linha mais humanista.
Seguindo essa linha, o discurso que aqueceu o debate por parte dos
intelectuais da Educação Física, nesse momento, perpassa à questão política, cujo
esforço foi tensionar as relações estabelecidas no campo, com um movimento
intenso de questionamento e contestação das práticas (CAPARRÓZ, 2005). Dessa
forma, a aproximação da Educação Física com a área da Educação proporcionou o
contato daquela com as teorias críticas das abordagens pedagógicas, movimento
que buscou afetar diretamente a intervenção na Educação Física escolar.
Em seu estudo na RBCE, Aroeira (2000) destaca que a presença das teorias
da Educação na Educação Física já era evidente nas décadas de 1980 e 1990.
Esses dados também foram encontrados por Ferreira Neto et al. (2003) ao
estudarem o debate sobre graduação veiculado no exemplar de “15 anos da revista
Motrivivência”. Eles destacam, ainda, que, apesar da variabilidade de autores e de
obras, existe a presença com maior ênfase de, pelo menos, duas orientações
teóricas: teoria crítica e teoria crítica do currículo. Esses resultados guardam
semelhanças com os achados desta pesquisa, no que se refere aos estudos da
RBCE que são alicerçados numa perspectiva crítica, como poderá ser conferido no
próximo capítulo.
Diante do cenário que se apresentava, o CBCE buscou uma reformulação em
seus quadros. Assim, os pesquisadores envolvidos com debates e publicações que
clamavam por mudanças na área, ao exercer a direção do CBCE, provocaram uma
reconfiguração no direcionamento das pesquisas, privilegiando temas afeitos à
grande área das Ciências Humanas e Sociais, contemplando as dimensões
culturais, socioeconômicas, políticas e educacionais no campo da Educação Física e
esportes, com problemáticas específicas da prática pedagógica. Para tanto, foi
necessária uma aproximação profícua com outras áreas de conhecimento.
Apesar de não partilharem das mesmas matrizes teórico-filosóficas, esses
professores tinham um posicionamento (motivado por interesses) em comum:
lutavam em lado oposto ao do paradigma dominante no campo, alicerçado em
princípios anatomofisiológicos. Contudo, mantendo sua política científica, essa
reformulação se deu atendendo, estrategicamente (CERTEAU, 2006), às
necessidades compatíveis com os próprios interesses do CBCE, que continuava a
68
determinar “o quê”, “o como” e “o porquê” dos estudos, a partir do lugar de poder
que ocupa(va).
Como base de compreensão científica, os argumentos de Kuhn (2007)
caminham no sentido de defender o desenvolvimento da ciência por meio de
revoluções científicas.38 Segundo esse autor,
[...] quando os membros da profissão não podem mais esquivar-se das anomalias que subvertem a tradição existente da prática científica – então começam as investigações extraordinárias que finalmente conduzem a profissão a um novo conjunto de compromissos, a uma nova base para a prática da ciência. Os episódios extraordinários nos quais ocorre essa alteração de compromissos profissionais são denominados, neste ensaio, de revoluções científicas. Elas são os complementos desintegradores da tradição à atividade da ciência normal, ligada à tradição (KUHN, 2007, p. 25-6, grifos nossos).
Dessa forma, estabeleçe-se uma relação entre o processo de evolução da
ciência proposto por Kuhn (2007) com a trajetória histórica do campo de
conhecimento da Educação Física, tendo em vista o movimento de mudanças no
paradigma vigente.
No que se refere à tendência de estudos que valorizam excessivamente as
características físicas do indivíduo, baseada na Biologia, na Psicologia e na
Estatística, pode-se perceber que, desde a década de 1940, ela já estava presente
nos estudos do americano Stephen Jay Gould,39 que discute, numa perspectiva
histórica, os principais aspectos do determinismo biológico, apoiando-se em estudos
provenientes da craniometria (medida do crânio) e em testes psicológicos,
perspectiva científica da escola que se baseou na mensuração das faculdades
mentais via testes de inteligência, aptidão e personalidade.
Essa tendência de medições e quantificações foi gradativamente vulgarizada,
tornando-se instrumento de trabalho dos professores e ganhando espaço na
Educação Física brasileira, sendo, pois, refletida nos estudos apresentados na
RBCE, especialmente em seus primeiros anos de circulação.
38 Para Kuhn (2007, p. 125), revoluções científicas são “[...] episódios de desenvolvimento não-cumulativo, nos quais um paradigma mais antigo é total ou parcialmente substituído por um novo, incompatível com o anterior”, ou seja, uma revolução corresponde a uma mudança de paradigma. 39 A sua obra A falsa medida do homem se torna referência para compreender as teorias que buscaram, em fins do século XIX e início do XX, hierarquizar as diferentes raças humanas, a partir de medições de partes específicas do corpo que pudessem indicar maior ou menor probabilidade de inclinação à criminalidade. Esse autor aborda testes realizados por médicos, como Cesare Lombroso, com base no somatotipo e na antropometria, para construir boa parte das teorias racistas que serviram de justificativas para se afirmar o que era normal e o que era patológico na conduta humana.
69
Gould (1999) ressalta que o determinismo biológico é de evidente utilidade
para os grupos detentores do poder, tendo origem em um contexto político. Por isso
esse autor procura demonstrar a debilidade científica e os contextos políticos dos
argumentos deterministas, criticando, pois, o mito que diz ser a ciência uma empresa
objetiva, afirmando que ela deve ser entendida como um fenômeno social, humano,
e não como trabalho de robôs programado para recolher a informação pura, e
complementa:
A ciência, uma vez que deve ser executada por seres humanos, é uma atividade de cunho social [...]. Boa parte das transformações que sofre ao longo do tempo não corresponde a uma aproximação da verdade absoluta, mas antes a uma alteração das circunstâncias culturais [...]. Os fatos não são fragmentos de informação puros e imaculados; a cultura também influencia o que vemos e o modo como vemos (GOULD, 1999, p. 5-6).
Quando se refere à natureza humana, o autor inclui, além da dimensão
biológica, a dimensão cultural, defendendo que “As sociedades humanas mudam
por evolução cultural, e não como resultado de alterações biológicas” (GOULD,
1999, p. 346), uma vez que a evolução biológica continua em nossa espécie, mas de
forma muito lenta, se comparada com a evolução cultural. “A evolução cultural não é
apenas rápida; é também facilmente reversível pois seus produtos não estão
codificados em nossos genes” (GOULD, 1999, p. 347).
A perspectiva de ciência pautada por uma intensa aproximação com saberes
e práticas de um campo de estudos marcado, essencialmente, pelo que é objetivo e
quantitativo, revela o que talvez seja o maior problema epistemológico de nossa
cultura, segundo Maturana e Varela (2005), qual seja, a extrema dificuldade que
temos ao lidar com tudo aquilo que é subjetivo e qualitativo, que, nos termos de
Gould (1999), se aproxima do que é cultural. Assim,
[...] não é fácil aceitar que o subjetivo e o qualitativo não se propõem a ser superiores ao objetivo e ao quantitativo; e que não pretendem descartá-los e substituí-los, mas sim manter com eles uma relação complementar. Não entendemos que todas essas instâncias são necessárias, e que é essencial que entre elas haja um relacionamento transacional, uma circularidade produtiva. Tal situação tem produzido, como foi dito, consequências éticas importantes. Parece incrível, mas muitas pessoas (inclusive cientistas e filósofos) imaginam que o trabalho científico deve afastar de suas preocupações a subjetividade e a dimensão qualitativa – como se a ciência não fosse feito por seres humanos. [...] [assim] a subjetividade (tanto quanto a objetividade), e a qualidade (tanto quanto a quantidade), são na verdade indispensáveis ao conhecimento e, portanto, à ciência (MATURANA E VARELA, 2005, p. 15).
70
Os resultados desse processo de conscientização dos atores envolvidos com
a produção do conhecimento no campo científico aparecem refletidos na RBCE, se
observado o conteúdo dos artigos publicados por esse periódico, sendo ele, então,
considerado uma síntese das questões empreendidas nos últimos 30 anos da
Educação Física brasileira.
Nesse ponto, retoma-se o que Chartier (1988) ensina, quando se refere às
representações como práticas forjadas mediante interesses de determinados
grupos. No caso de pesquisas que vão do objetivo ao subjetivo, do quantitativo ao
qualitativo, como preconizam Maturana e Varela (2005), desenhando sua trajetória,
pode-se atribuir uma forma de pensar e conformar o campo científico por meio das
artes (ou maneiras) de fazer essa ciência (CERTEAU, 2007).
Percebida desse modo, a revista pode ser considerada como uma fonte
profícua para compreender as teorias e métodos que ofereciam suporte às
pesquisas no campo, em especial àquelas desenvolvidas sobre a Educação Física
escolar, considerando que esses dois elementos são fundamentais para a definição
de cientificidade.
Partindo da ideia de método, procura-se deixar claro que não se pretende
reforçar a já tão dicotomizada relação teoria-prática existente na área, exatamente
por se entender que, nessa relação, não devem existir hierarquização de saberes, e
sim “ [...] duas operações diferentes mas imbricadas, uma discursiva (na e pela
linguagem) e a não discursiva” (CERTEAU, 2007, p. 136). Nesse sentido, a
operação não discursiva se refere às práticas que ainda não foram articuladas pelo
discurso, ou seja, aquelas circunscritas ao saber da ação pedagógica (GAUTHIER,
1998).
Considerando essas duas operações, Sánchez Gamboa (2007) pondera que
teoria e prática são duas categorias que indicam sempre uma relação. E sobre essa
relação, o autor afirma:
Algumas tendências defendem o primado da teoria perante a prática; outras, o primado da prática como forma de supremacia que confere validez à teoria. Esse dualismo parece ser superado quando, em vez de destacar um ou outro termo, se prioriza a relação dinâmica entre eles, a qual, a sua vez, é inserida num processo maior envolvente, relativizando assim suas autonomias. Tanto a teoria como a prática são partes da ação social humana, a qual não resulta de uma teoria, posta em prática, nem de uma prática que se torna teoria, mas na interrelação dinâmica e complexa em que uma tenciona a outra (SÁNCHEZ GAMBOA, 2007, p. 37).
71
Nesses termos, ressalta-se a tensão, o confronto, a contradição que, juntos,
geram um movimento dinâmico e necessário entre essas duas operações no campo
da Educação Física. Dada a complexidade do processo de constituição desse
campo de conhecimentos, assim como a busca por sua identidade, a ação
pedagógica enfrenta desafios decorrentes da tentativa da área de justificar-se sobre
seus fazeres-saberes, oriundos de vários campos de saber. A relação entre saberes
e fazeres é analisada por Fensterseifer (1999, p. 181), que afirma: “A reflexão
epistemológica vai buscar auscultar os ‘saberes’ que correspondem aos ‘fazeres’ da
Educação Física, ou seja, de que forma se legitima teoricamente esse fazer”.
Esse conjunto de saberes, resultante de incorporações sistemáticas de novos
conhecimentos ao campo científico da Educação Física, retomando o que já estava
posto na década de 1940 nos estudos de Inezil Penna Marinho, torna-se um marco
para a redefinição dos caminhos da área no Brasil, impactando diretamente sobre a
produção do conhecimento que circula no interior do CBCE e que é veiculado pela
revista e pelos CONBRACEs. Como pode ser constatado na obra de Marinho
(1944a, 1944b, 1948), essa tendência de estudos não é tão recente quanto se
supõe, quando ganha força da década de 1980.
Esse processo de mudança de perspectiva ocorreu no campo promovendo
transformações no tipo de pesquisas realizadas, bem como em suas teorias, seus
métodos e técnicas científicas. No que se refere à Educação Física Escolar que
circula na RBCE, percebe-se que, inicialmente, as pesquisas realizadas baseavam-
se em dados “coletados” na própria escola com alunos da educação básica, que
eram utilizados para fornecer os dados necessários para a realização de pesquisas40
de tipo correlacional, em sua maioria.
Esse tipo de estudo faz o cruzamento das informações obtidas por meio de
aferições nos escolares, como idade, peso, altura, dobras cutâneas, maturação
sexual, cotejados com dados de testes de corrida, agilidade, força, impulsão,
velocidade e flexibilidade. Assim, essa era a representação de pesquisa científica
que os autores que produziam para o periódico tinham até meados da década de
1980, com mais vigor, sendo essa tendência “diluída” nos anos seguintes da revista,
40 A discussão sobre os tipos de pesquisa será empreendida no próximo capítulo, quando serão analisados os artigos que abordam a Educação Física Escolar na RBCE, bem como os métodos utilizados nesses estudos.
72
em que são encontrados artigos com essas características de forma mais espaçada
temporalmente, ou mesmo concentrada em exemplares temáticos.
Ainda em fins da década de 1980, outros temas começaram a aparecer com
maior frequência, especialmente aqueles relacionados com o funcionamento da
Educação Física escolar, seus praticantes e suas práticas, vislumbrando conhecer o
seu cotidiano, dando maior atenção à variável comportamento do que a medidas e
testes físicos.
Pensa-se que a temática proposta por um periódico pode ser reveladora de
intencionalidades, talvez veladas, do que realmente se propõe a investigar e, nesse
contexto, questiona-se: qual é o lugar que ocupa a temática escola na RBCE, no que
se refere à sua ação pedagógica, em seu viés de intervenção? A temática escola foi
contemplada com um GTT específico pelo CBCE, espaço destinado a estudos sobre
a inserção da disciplina curricular Educação Física no âmbito da educação escolar,
ao seu ordenamento legal e às distintas perspectivas metodológicas animadoras das
suas práticas pedagógicas.
Analisando as temáticas propostas pela revista, chama a atenção o fato de
apenas o exemplar de janeiro de 2002 (v. 23, n. 2) trazer, como temática específica,
a “Educação Física escolar”. Esse foi o único em 30 anos de circulação da RBCE.
Esse fato deve ser ressaltado e, principalmente, questionado, visto ser de
significativa importância a ausência de outros exemplares com a temática Educação
Física escolar nesse periódico, uma vez que este já expressava, desde a década de
1980, preocupação com a instituição escolar, veiculando artigos que enfocavam a
escola, seus praticantes e suas práticas em exemplares com temáticas variadas.
Importante, também, foi observar, nesse mesmo exemplar, a ausência de
artigos nos quais se percebesse a intenção de realizar intervenção nas aulas de
Educação Física, numa perspectiva de pesquisa com a escola, mas dar fôlego a
discussões teóricas sobre a Educação Física Escolar.
Destarte, esses dados são reveladores de uma situação que percorre os 30
anos de publicações da RBCE, qual seja, o aparente descuido com relação aos
artigos que publica, tendo em vista que, no exemplar específico sobre escola, não foi
possível encontrar estudos voltados à prática da disciplina Educação Física nesse
espaço. Isso fez indagar: qual é o verdadeiro lugar reservado à temática escola, em
seu aspecto de intervenção nesse periódico?
73
Embora não seja objetivo deste estudo, é importante mencionar o recente
lançamento de mais um projeto editorial chancelado pelo CBCE, denominado
Cadernos de Formação RBCE. Esse novo dispositivo surge exatamente no mês em
que a RBCE completa 30 anos de existência, apresentando-se associado à revista.
Traz em seu editorial a seguinte descrição:
Trata-se [...] de uma publicação serial que deve ter duas edições por ano, sempre com um conjunto de textos que se destine à prática pedagógica, na forma de análises, propostas, comentários, relatos, enfim, tudo o que possa interessar aos professores e às professoras de Educação Física [...]. Os Cadernos diferenciam-se da RBCE porque esta tem a preocupação de atuar para o desenvolvimento da pesquisa, especificamente no estágio de divulgação dos produtos dela oriundos, sempre com vistas ao avanço da Educação Física/Ciências do Esporte, em várias de suas faces. [...] os Cadernos de Formação RBCE se materializam em textos que procuram dialogar mais diretamente com o cotidiano daqueles que atuam no magistério, não apenas em seus fazeres, mas muito e m função das possibilidades de reflexão que emergem das práticas e que sobre elas se debruçam (EDITORIAL CADERNOS DE FORMAÇÃO RBCE, 2009, p. 7, grifo nosso).
Chama a atenção a missão destinada a esse novo dispositivo, incumbido de
publicar pesquisas que apresentem laços mais estreitos com a prática pedagógica,
afirmando ser esse o diferencial dos artigos veiculados pela RBCE, uma vez que
esse periódico estaria mais preocupado com o desenvolvimento da pesquisa no
estágio de divulgação de seus produtos. Fato é que, dos oito estudos que os
Cadernos de Formação RBCE veicularam em seu primeiro exemplar, todos
abordaram a Educação Física Escolar.
2.3 EDITORES E EDITORIAIS: ATORES E ESPAÇOS AUTORIZADOS
Percebendo o CBCE como um lugar de poder que se vale de estratégias
científicas de divulgação por intermédio da RBCE como dispositivo, Ferreira Neto
(2005, p. 4) afirma que “[...] nas maneiras de organizar/dispor os artigos se costuma
induzir maneiras de ler, compreender e construir sentidos”. Isso é observado nas
publicações da revista ao longo dos 30 anos de sua trajetória acadêmico-científica,
em especial no que se refere às temáticas privilegiadas em diferentes momentos
trilhados durante essas três décadas.
Quando se trata da constituição do campo da Educação Física, deve-se
ressaltar a importância do papel do editor, considerando-o ator fundamental na
74
forma como o campo científico se constitui, uma vez que os editores assumem
posições-chave no processo de divulgação de propostas, de teorias e de atores
considerados como autorizados a falar em nome de uma comunidade (FERREIRA
NETO et al., 2003, p. 69). É preciso reforçar, na análise das transformações
ocorridas na RBCE, o papel dos editores:
Para compreendermos a forma como se constitui o campo da Educação Física, precisamos incluir na análise o papel do(s) editore(s), personagem que fornece oportunidades para que um grupo, constituído por atores que muitas vezes possuem orientações teóricas diferentes, seja percebido como constituído por autores autorizados a falar como autoridades sobre uma determinada temática que se julga seja capaz de preenher as expectativas e necessidades do professorado (SCHNEIDER, 2007, p.147).
Dessa forma, os editores de impressos científicos ou pedagógicos são
aqueles que possuem o poder de decidir o que deve chegar aos leitores, definindo,
assim, o que é ou não pertinente veicular na revista. Ratificando o papel dos editores
em relação à constituição do campo da Educação Física, Schneider41 (2007, p. 144)
chama a atenção para a função exercida por eles:
[...] os editores põem-se na condição de decisores, deliberando por meio do impresso quem deve ser conhecido e reconhecido pela sua comunidade de leitores como os líderes da Educação Física no Brasil [...]. Percebe-se que o impresso se tornou instrumento estratégico para que os editores fizessem valer sua voz como força autorizada para intervir nos órgãos educacionais em favor dos professores de Educação Física, ainda que esses professores fossem eles mesmos.
Entretanto, Ferreira Neto et al. (2003) enfatizam o fato de a figura do editor
ocupar uma posição central na constituição do campo da Educação Física, mesmo
não estando na linha de frente da revista, e sim nos bastidores de onde controla,
decide, censura, autoriza “o que” e “quem” deve circular no campo.
É por intermédio dos editores que o periódico se torna um dispositivo de
controle, conforme sugere Chartier (1988), ao afirmar que o dispositivo atua como
estratégia de luta e de produção cultural, valendo-se das relações de poder para
definir as maneiras como as leituras devem ser empreendidas. Esse mecanismo se
configura em formas de dominação destinadas à produção de objetos determinados
e/ou de uma escrita comum autorizada a circular por meio do impresso. É possível
41 É preciso ressaltar que Schneider (2003) identifica a função dos editores em seu estudo na Revista Educação Physica, nas décadas de 1930 e 1940, mas que bem pode ser atribuída a este estudo na RBCE, que abarca as três últimas décadas do século XX.
75
perceber, então, a função precípua dos editores, qual seja, o controle do campo
científico.
Lembrando que esse mesmo dispositivo, além de controlar, tem a função de
moralizar os textos, criando condições de legibilidade, simplificando e talhando o
texto original (CHARTIER, 1991), ao que Toledo (2001) postula como dispositivo de
didatização do texto. Esse entendimento é complementado por A-M Chartier (2002),
quando afirma que os dispositivos são usados também como “[…] o lugar de
realizações inventivas, as que tratam do ‘como fazer’ e que acompanham as
reformas vindas de cima ou as inovações do campo” (A-M CHARTIER, 2002, p. 11).
As artes de fazer que conferem o caráter de didatização aos textos
correspondem à fórmula editorial adotada, ou seja, aquilo que atribui legibilidade aos
textos, como as capas, o formato, as imagens, os sumários, as temáticas, os
editoriais, enfim, elementos intencionalmente posicionados para atrair leitores,
favorecendo sua leitura, promovendo com isso maior circulação das revistas
científicas.
Nesse sentido, ao criar estratégias editoriais como recurso de didatização e
controle da leitura, os editores produziam a imagem de um grupo organizado,
representação necessária como meio de reivindicar espaço de atuação no campo da
Educação Física (SCHNEIDER, 2007). Tendo em vista a tentativa de constituição da
fórmula editorial da RBCE, foi enfatizada, nesse estudo, a função dos editoriais
como dispositivo.
Por meio desse dispositivo, o(s) editor(es) fala(m) com os leitores, indica(m)-lhes por qual registro as matérias selecionadas deverão ser lidas, interfere(m) no que é publicado ao recortar e adicionar sentidos ao pensamento dos autores, muitas vezes distantes do que foi proposto originalmente nos textos. Enfim, nos editoriais, o(s) editor(es) se capacita(m) como voz autorizada a aproximar os vários assuntos tratados no impresso, ao mesmo tempo em que indica(m) protocolos de leituras para o que foi pelo Conselho Editorial previamente selecionado como digno de ser conhecido pelos leitores (SCHNEIDER, 2007, p. 145).
Na RBCE, os editoriais se apresentaram de maneira explicativa, informativa e
problematizadora dos assuntos abordados pela revista, temática ou não, tornando-
se, estrategicamente, um espaço em que os editores são autorizados a instruir os
leitores quanto ao uso do periódico, assim como informar sobre seu conteúdo, a
organização das seções, a opção por veicular exemplares temáticos ou não
76
temáticos, as mudanças de diretoria a cada dois anos (o que implica a existência de
novos editores e, talvez, de uma nova estrutura).
Além disso, identifica-se nos editoriais uma outra função, que é a de alertar e
cobrar dos membros pesquisadores do CBCE, quando necessário, em relação à
qualidade questionável e à insuficiente quantidade de artigos enviados para
avaliação e posterior publicação (entre outros problemas que a revista enfrenta).
Contudo, em editorial de um exemplar da RBCE, os editores solicitam aos
autores que leiam atentamente as normas de envio de trabalhos para a RBCE,
enfatizando que estão
[...] um pouco cansados de [bancar] os ‘co-autores anônimos’ , corrigindo erros de Português, refazendo gráficos, refazendo resumos em Inglês, colocando datas em referências bibliográficas, etc..., pois para nós isso está sendo um preço bastante alto que estamos tendo que pagar, para mantermos as características de uma revista de alto padrão científico (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, v. 6, n. 3, p. 175, 1985, grifos do autor).
Nessa passagem, chamou a atenção o fato de os editores afirmarem que
estão cansados de serem “co-autores anônimos” dos textos enviados para publicar
na revista. No entanto, percebe-se certa contradição nessa fala, uma vez que os
editores atuam exatamente com tal função, ou seja, interferindo no que é publicado,
recortando e adicionando sentidos ao pensamento dos autores, decidindo o que
deve ser conhecido e reconhecido pelos leitores, atuando, sim, como coautores dos
trabalhos, mas permanecendo sempre no anonimato e enfatizando que os “Artigos
publicados são de inteira responsabilidade dos autores e não refletem
necessariamente a opinião do C. B. C. E.” (RBCE, v. 4, n. 1, p. 1, 1982).
Ratifica-se a ideia da coautoria com autoria em Chartier (1988), quando este
afirma que o que quer que façam, os autores não escrevem livros, e sim textos que
outros transformam em objetos impressos. Essa é a função dos editores que,
posicionados nos bastidores, dão uma nova disposição aos textos que selecionaram
para imprimir, fazendo-o em função dos leitores que desejam ou pensam atingir e,
assim, controlam o que circula no campo acadêmico, delimitando o que é científico e
o que não é científico em Educação Física.
Quanto à composição da editoria da RBCE, observa-se, em sua ficha
técnica,42 certa dificuldade em padronizar uma estrutura administrativa, visto a
42 Cf. Apêndice D.
77
variabilidade de cargos e componentes a cada nova gestão. Logo quando foi criada,
em 1979, a ficha técnica da revista era a mesma que a do CBCE, compondo-se
pelos seguintes cargos: presidente, presidente eleito, vice-presidente de Medicina,
vive-presidente de Educação, vive-presidente de Ciências Básicas, secretário-
executivo, tesoureiro e os comitês de Cineantropometria, Psicologia e Educação.
Já em 1980, a RBCE passa a ter a sua própria ficha técnica, composta pelos
cargos: diretor responsável, editor-científico, editor-executivo, editores de seção
(Avaliação, Crescimento e Desenvolvimento, Educação, Medicina, Psicologia e
Sociologia, Treinamento Desportivo) e editor-chefe.
Nos anos subsequentes, continuam as mudanças no quadro de cargos da
revista e, em 1990, a ficha técnica da RBCE volta a unir-se à do CBCE, tendo uma
única diretoria para dirigir ambas as instâncias. Essa alternância ainda ocorre outras
vezes, como pode ser constatado no Apêndice D, onde aparecem os cargos
relacionados com a presidência do CBCE, nos anos de 1992, 1993, 1994 e 1995. De
1996 até os dias atuais, colégio e revista permanecem com diretorias
independentes.
Ao proceder à leitura dos editoriais, nota-se a sua ausência no exemplar v. 3,
n. 1 de 1981 e em todos do ano de 1982. Quando reaparece é no v. 4, n. 2, de 1983,
afirmando que “A Revista Brasileira de Ciências do Esporte entra agora em uma
nova fase. Sua estrutura foi um pouco modificada, com a introdução de algumas
seções e a reintrodução de outras” (p. 29), incluindo nessa reintrodução a seção
Editorial.
Essa nova fase à qual o editorial se refere parece guardar relações com a
presença de estudos educacionais que começavam a surgir nas publicações,
incentivadas pela presença de uma área pedagógica na revista, embora sua
passagem tenha sido muito rápida, uma vez que desaparece já no primeiro
exemplar de 1983, retornando no último exemplar publicado nesse mesmo ano.
A identificação deste processo de continuidades e descontinuidades, quanto à
presença ou não de uma área pedagógica na RBCE, demonstra que essa era uma
questão que ainda carecia ser mais bem estudada pela editoria científica da revista
que vinha de uma tradição em pesquisas na área médica. Isso está direta e
intrinsecamente ligado à definição de fazer científico assumida pelo CBCE que, no
decorrer de três décadas, caminhou junto com o desenvolvimento da pós-graduação
no Brasil. Sobre essa relação, Silva (2005, p. 53) afirma que
78
[...] os veículos de divulgação existentes nos anos de 1970 exprimem os interesses, os conflitos, e a hegemonia da concepção de ciência e do conhecimento produzido por aqueles que se propunham a fazer ciência em educação física. Uma análise dos trabalhos publicados nos periódicos em circulação daquela época permitirá um resgate de outros elementos dessa fase embrionária, mas extremamente significativa para a compreensão dos rumos da pesquisa em educação física no Brasil.
Nesta nova fase citada, começam a ser editados artigos cujos temas estavam
aparentemente isolados diante do que era veiculado pela RBCE, caracterizando-se
por pesquisas sobre o processo educacional que efetivamente acontecia nas
escolas. Essas pesquisas se tornam alvo dos olhares dos profissionais da área que
passam a realizar trabalhos ligados a temas, como formação de professores,
métodos de ensino e funcionamento da prática da disciplina Educação Física nas
escolas de 1º grau.
As mudanças que ocorrem a partir dessa redefinição na linha editorial da
revista são anunciadas no editorial do v. 9, n. 3, de 1988, que, apesar de não estar
assinado, é de responsabilidade da editora científica Antonia Dalla Pria Bankoff:
A história da revista do CBCE, até então marcada pela estreita visão de ciência, visão esta que sempre privilegiou o lado biológico do homem, com temas como: a performance, o rendimento e a eficiência dos treinamentos físicos, colocando em destaque o rigor, a ‘neutralidade’ e o poder da concepção positiva de ciência, não possibilitou até este momento que outros níveis de abordagens fossem publicados. Hoje, porém, este mesmo periódico aparece com outra roupagem. Numa linguagem sem muitos jargões, mais rigorosa, comprometida e séria apresenta uma outra forma de abordagem, que pretende levar aos membros do CBCE, não um conhecimento sagrado e de difícil de compreensão e aplicação, mas um conhecimento comprometido com a denúncia, com a crítica, na busca de soluções concretas para os problemas sociais [...]. Este portanto, não é um número especial, mas especial é a forma como a informação está sendo veiculada e, especial é o espaço conquistado dentro da linha editorial da revista do CBCE. Resta-nos apenas agradecer ao CBCE pelo espaço cedido e continuar lutando para que novas frentes sejam abertas e que a visão sectária e corporativa de ciência seja estirpada do pensamento dos membros pesquisadores do CBCE (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, v. 9, n. 3, 1988, s/p).
Esse posicionamento se mantém no exemplar v. 10, n. 1, de 1988, mesmo
com a mudança na editoria, a qual passa a ser de responsabilidade de Laércio Elias
Pereira, provavelmente em caráter transitório, visto que sua permanência é bastante
efêmera, correspondendo apenas a esse número da revista.
Da pretensão inicial em incentivar a produção científica, tem-se atualmente o entendimento de que o desenvolvimento científico, também na área de ciências do esporte, se dá em determinadas condições históricas e de acordo com determinados interesses, estando inter-relacionados e
79
conectados com outros fenômenos sociais, contraditórios e próprios de uma sociedade que se estrutura sob a égide do modo de produção capitalista. [...] torna-se imprescindível a utilização do saber crítico historicamente elaborado (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE BCE, v. 10, n. 1, 1988, p. 4).
Desse modo, pode-se ter noção do papel dos editores e dos editoriais ao
exporem concepções de ciência, “falando” com os leitores, induzindo-os a práticas e
comportamentos determinados, imprimindo suas definições do que é científico no
meio acadêmico da Educação Física. A ideia, então, era formar uma massa crítica
ou uma comunidade científica no Brasil, com a esperança de que essa formação
crítica transformasse o processo de desenvolvimento nacional (LOVISOLO, 2005).
A Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), consonante com os objetivos assumidos pela atual diretoria, vem contribuindo para com o processo de reflexão crítica acerca da produção e veiculação do conhecimento na Educação Física brasileira. Nesse sentido, tem questionado o entendimento da Ciência como mera quantificação e descrição de dados, tem tentado alertar que o critério de determinação do que é científico não passa apenas pelo correto tratamento estatístico dos dados coletados em determinada situação. Tem ainda chamado a atenção para a questão da não- neutralidade da Ciência, para o compromisso social do pesquisador, para o não-reducionismo da Ciência a uma única abordagem metodológica (a empírico-analítica), da Educação Física a um único campo de análise (o anátomo-fisiológico), do Homem a uma única dimensão (a biológica) [...]. Considerando a existência de outras tendências na produção científica, sustentadas por diferentes pressupostos epistemológicos, a Revista pretende possibilitar a veiculação das mesmas, expondo-as de maneira a expl icitar as diferenças e divergências existentes entre elas, bu scando suscitar nos leitores um posicionamento crítico . Com essa finalidade, a RBCE passa a apresentar novas seções, abrindo espaço para publicações não apenas de artigos, mas também de resenhas críticas, pontos de vista, cartas ao leitor, entrevistas/debates e relatos de experiência (REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, v. 10, n. 2, p. 46, 1989, grifo nosso).
A passagem grifada desse editorial deixa ver/ler a representação do papel
estratégico dos editores, cabendo pensar esse espaço como dispositivo de
didatização e controle da leitura, onde os editores se capacitam como voz
autorizada, indicando protocolos de leitura. Assim, eles produzem uma
representação de grupo organizado, capaz de reunir e sistematizar as várias
perspectivas científicas circulantes no campo da Educação Física, colocando-as à
disposição do público leitor.
Não se pode esquecer de que a ciência é, por princípio, lugar de disputa,
conflito e poder. Baseado nisso, Bourdieu (1983) esclarece a acumulação de capital
científico na luta pelo domínio do campo, luta em que cada um dos agentes deve
determinar o valor de seus produtos e de sua autoridade de produtor legítimo, em
80
que está sempre em jogo o poder de impor uma definição de ciência. A definição
mais apropriada será a que lhe permita ocupar legitimamente a posição dominante.
A luta científica é expressa na trajetória da RBCE, evidenciando-se que os
dominantes impõem uma representação de ciência que subsiste por algum tempo,
fornecendo “problemas e soluções [...] para uma comunidade de praticantes de uma
ciência” (KUHN, 2007, p. 13), apesar de todas as práticas de resistências, até que
não mais seja seguido esse paradigma científico.
Importante é ter noção de que a tipologia de ciência assumida pela revista
teve impactos diretos sobre sua produção, circulação e apropriação, por entender
que os temas relacionados com a escola foram contextualizados em diferentes
momentos da história recente da Educação Física com, também, diferentes
enfoques. Assim, o passo seguinte foi identificar as opções em termos de teoria e
metodologia feitas pelos articulistas dos artigos que se debruçam sobre a escola.
81
CAPÍTULO 3
3 PRÁTICAS DE PESQUISA E SABERES CIENTÍFICOS: MAPEA NDO AS FONTES
Em história, tudo começa com o gesto de selecionar, de reunir, de, dessa forma, transformar em ‘documentos’ determinados objetos distribuídos de outra forma. Essa nova repartição cultural é o primeiro trabalho [...]. Esse gesto consiste em ‘isolar’ um corpo, como se faz em física. Forma a coleção [...]. Longe de aceitar os dados, ele os constitui. É a marca dos atos que modificam uma ordem recebida e uma visão social (CERTEAU, 1988, p. 30-31).
Com base nas orientações desse autor sobre a constituição das fontes de
pesquisa, foi possível visualizar as etapas do mapeamento da RBCE, que teve início
com a seleção dos artigos considerados necessários a esta pesquisa, sua leitura e
fichamento, o que, segundo Certeau (1988), faz parte do processo de transformação
dos objetos, neste caso, uma revista, a partir da impressão de novas marcas que
modificam uma ordem, uma disposição anterior.
Assim, iniciou-se o mapeamento dos 86 exemplares que compõem os 30
anos de publicação da RBCE, desde o primeiro, datado de setembro de 1979, até o
exemplar de setembro de 2009, começando, então, o processo de seleção dos
artigos que se propuseram a realizar estudos sobre e com a escola, sob
determinados aspectos que envolvem suas práticas de pesquisa.
Passou-se, então, a esclarecer os dois movimentos identificados nos artigos
da RBCE. O que se chama de pesquisas sobre a escola são aquelas realizadas fora
da escola, isto é, que não tiveram a pretensão de vivenciar esse espaço − ou mesmo
que não puderam, como é o caso de pesquisas históricas − circunscrevendo seus
estudos a uma prática especulativa acerca da Educação Física escolar, de modo
que privilegiaram abordagens reflexivas43 sobre essa temática.
No que diz respeito aos estudos denominados com a escola, faz-se referência
àqueles artigos cujos autores optaram por realizá-los na escola, estabelecendo,
assim, algum tipo de aproximação que envolvesse seus praticantes e suas práticas,
mesmo que, em níveis diferenciados, conforme objetivos e pressupostos assumidos
pela pesquisa.
43 Com essa denominação não se teve a intenção de desmerecer esse tipo de estudo, uma vez que se entende que essas pesquisas, dadas as suas peculiaridades, possuem métodos, critérios e rigor científico.
82
Para tanto, foi estabelecido um critério que direcionou para a seleção de
artigos completos que apresentavam a palavra escola − e algumas de suas
derivações, como escolar, escolares e escolarização − e também a palavra colégio,
no título, no resumo e/ou nas palavras-chave. Além disso, os artigos deveriam
privilegiar o tema Educação Física Escolar na educação básica (educação infantil,
ensino fundamental e ensino médio), em escola regular.
Respeitando esse último critério, não fizeram parte desta seleção artigos
cujos estudos foram desenvolvidos em escolas onde existe um outro tipo de rotina,
com suas práticas cotidianas voltadas a um público específico, com características e
objetivos bem particulares, que se distinguem da ação pedagógica empreendida na
escola regular. Assim, foram identificados, mas não selecionados, os artigos que
visavam a estudar escolas religiosas, escolas técnico-profissionalizantes, escolas-
parque e escolas indígenas.
Percorridos todos os exemplares publicados nas três décadas de circulação
da RBCE e aplicados os critérios apresentados, foram selecionados 143 artigos.
Visando a uma demonstração desse corpus documental44 geral, independentemente
das perspectivas sobre e com a escola, apresenta-se na Tabela 1 esse quantitativo
distribuído de acordo com o respectivo ano de publicação:
44 Compuseram esse corpus geral de documentos artigos que já anunciavam, nas primeiras linhas pré-textuais, seu interesse em investigar aspectos da escola, conforme foi explicado. É preciso mencionar a ciência quanto à possível existência de outros trabalhos publicados na RBCE que apresentam o mesmo interesse. No entanto, o foco desta pesquisa e, portanto, o seu recorte deteve-se sobre aqueles estudos que a priori, sem precisar adentrar ao texto propriamente dito, traziam indícios explícitos da presença da escola e de suas práticas como foco de análise.
83
Tabela 1 – Número de artigos selecionados por ano de publicação
ANO DE PUBLICAÇÃO45 NÚMERO DE ARTIGOS
1980 3 1981 1 1982 2 1984 4 1985 1 1986 4 1987 2 1988 6 1990 3 1992 3 1993 2 1994 7 1995 5 1997 1 1999 47 2000 3 2001 5 2002 10 2003 5 2004 5 2005 4 2006 5 2007 8 2008 2 2009 5
TOTAL 143
Chama a atenção, nessa tabela, a distribuição desigual do número de artigos
nos anos de 1999, em maior proporção, e em 2002, bem distante do quantitativo
anterior, porém, ainda assim, mais expressivo que em outros anos. Isso pode ser
explicado tendo em vista que, em setembro de 1999, é publicado um exemplar da
RBCE46 em três cadernos, com um número superior de artigos, se comparado com
as revistas anteriores, o que faz ampliar, consideravelmente, o quantitativo de
artigos veiculados por todo esse exemplar. Assim, haverá sempre maior quantidade
de artigos selecionados na década de 1990.
45 É possível notar que não aparecem nessa tabela os anos de 1979, 1983, 1989, 1991, 1996 e 1998, visto que os exemplares publicados nesse período não contemplaram os critérios estabelecidos por esta pesquisa, consequentemente, não sendo selecionado nenhum artigo. 46 O exemplar ao qual se refere é o v. 21, n. 1, cadernos 1, 2 e 3, publicação que se enquadra na rotina de estratégias lançadas pela RBCE para manter sua periodicidade. Isso é feito, inserindo-se na revista a produção dos CONBRACEs, ou seja, os artigos apresentados nesses eventos são reunidos e publicados como anais em formato de revista.
84
Quanto ao ano de 2002, é possível explicar o aumento de artigos visto que a
revista já se encontrava em sua fase temática47 e o exemplar do mês de janeiro de
2002 possuía o tema Educação Física Escolar. Esse exemplar é bastante
representativo da ausência desse tema durante todo o período em que a revista
permaneceu organizada por temáticas, visto que esse é o único exemplar que
concentra discussões relativas à escola.
Nesse contexto, os artigos estão assim distribuídos: 23 na década de 1980,
68 na década de 1990 e 52 na década de 2000, totalizando 143 artigos. O Gráfico 2
ajuda a visualizar os dados da tabela anterior, evidenciando o movimento do número
de artigos selecionados por ano:
Gráfico 2 – Demonstrativo de artigos selecionados por ano
Após o mapeamento inicial, empreendeu-se a leitura e o fichamento dos
artigos, procurando entender os sentidos e o movimento interno presente nas
páginas da revista. Nessa etapa, foram obtidas as informações avaliadas como
necessárias e, a partir delas, foi construído um quadro descritivo com os seguintes
indicadores: referência do exemplar (volume, número, mês e ano), título do artigo,
autores, objetivos, titulação dos autores, relação do estudo com a pós-graduação,
indicação da metodologia e da teoria utilizadas. Entretanto, para efeito de análise, a
atenção voltou-se a alguns desses indicadores julgados mais importantes,
47 Cf. Apêndice A.
85
entendendo-os como fundamentais para a definição dos estudos sobre e com a
escola, a saber: recursos teórico-metodológicos, a titulação dos autores (doutores,
mestres, especialistas e/ou estudantes) e a possível relação entre os estudos
desenvolvidos e os sistemas de pós-graduação stricto sensu e lato sensu.
O mapeamento desses indicadores permitiu apontar o quantitativo de
trabalhos que se propuseram estudar o cotidiano da escola, bem como a forma
como vem sendo apresentada a disciplina Educação Física nesse espaço. Por meio
desse mapeamento geral, foi possível examinar o que tem sido veiculado pela
RBCE em termos teórico-metodológicos em seus artigos científicos.
O debate sobre a constituição da natureza científica da RBCE passa,
necessariamente, pelo conhecimento de suas práticas de pesquisa. Nesse ponto,
chama-se novamente para a discussão Certeau (2007, p. 42), quando esse autor se
refere às práticas como “[...] uma maneira de pensar investida numa maneira de
agir, uma arte de combinar indissociável de uma arte de utilizar”.
Considerando as práticas de pesquisa da RBCE, na acepção de Certeau
(2007), pode-se inferir, segundo Ferreira Neto (2005), que essas “artes ou maneiras
de fazer” (compor temáticas, privilegiar objetos, teorias, periodizações, fontes,
metodologias e referências) influenciam o que deve ser visto/ouvido/lido por leitores,
e somente leitores em potencial. Assim, “Cabe sobretudo a todos nós,
pesquisadores/leitores, especializados ou não, ouvirmos/vermos/lermos também e,
às vezes, prioritariamente, o que deveria permanecer na obscuridade, ou seja, fora
do alcance da história” (FERREIRA NETO, 2005, p. 154).
Conforme anuncia esse autor, importante se faz conhecer as práticas de
pesquisa empreendidas na disciplina Educação Física, na perspectiva sobre ou com
a escola.
3.1 OS PESQUISADORES-PRATICANTES E SUAS OPERAÇÕES SOBRE E COM A ESCOLA
Conforme foi discutido, um primeiro contato com a RBCE foi feito tendo como
suporte os editoriais no sentido de evidenciar, de forma panorâmica, as
representações capazes de dar a ver as lutas pelo monopólio de um espaço, neste
86
caso, capaz de fazer reconhecer aqueles atores autorizados a falar num campo
ainda em constituição, qual seja, a Educação Física.
Nesse sentido, visualizar o periódico como estratégia permite observá-lo
como representação, mas uma representação que não é neutra, conforme explica
Chartier (1991), sendo, pois, necessário que se observe que essas representações
são coletivas, o que pressupõe que estejam sempre em concorrência pela
demarcação de um lugar de poder.
Para este momento da pesquisa, pretende-se delinear as formas de
abordagem do objeto de investigação, tendo em conta direcionamento conferido ao
tema em debate, qual seja, a escola, no interior da RBCE. Por isso, inicia-se com
uma indagação: por que investigar a presença de artigos que abordam a escola na
RBCE? A escola, sob os seus mais variados aspectos, tornou-se objeto de inúmeros
estudos de diferentes áreas do conhecimento, buscando compreender os
comportamentos dos diferentes atores que compõem esse espaço, os métodos de
ensino e avaliação, a estruturação do currículo, enfim, tudo que cerca o cotidiano
escolar, entendendo-se que a escola exigia uma especialização do olhar respaldada
pela ciência.
É preciso lembrar que o contexto histórico de mudanças e renovação da
Educação Física brasileira, nos anos de 1980 e 1990, fez emergir um considerável
debate político-acadêmico na área que culminou no surgimento de uma literatura
nacional relativa à Educação Física Escolar.
A instituição escolar, presente na RBCE na forma da disciplina Educação
Física, é tomada como foco de análise por se acreditar na possibilidade de recriação
de um dos objetos mais estudados e, paradoxalmente, pouco conhecidos, que é a
escola. Assim, entende-se que um “[...] velho objeto de investigação pode tornar-se
novo aos nossos olhos na medida em que soubermos trazer à tona, na travessia da
pesquisa, aspectos antes ignorados ou secundarizados” (NUNES, 1992, p. 151).
Segundo Nunes (1992), a história da educação veio estudando a instituição
escolar utilizando leis, regulamentos, preceitos, doutrinas, sistemas de ideias
pedagógicas e/ou políticas públicas para o ensino, elementos que, de certa forma,
não davam conta de explicar seu funcionamento. Contudo, pouco se sabe sobre
seus fazeres-saberes, como eles se materializam e quais os seus efeitos. Dessa
forma, a autora chama a atenção para o fato de que
87
Essas questões crescem em importância se considerarmos que elas operam um deslocamento de enfoque dos modelos dominantes de escolarização (a Escola Tradicional e a Escola Nova, por exemplo) para as múltiplas e diferenciadas práticas de apropriação desses modelos nas quais a ênfase da problematização recai sobre os usos diversos que os agentes escolares fazem da própria instituição escolar, sobre a prática de apropriação de práticas não escolares no espaço escolar e os múltiplos usos não escolares dos saberes pedagógicos (NUNES, 1992, p. 152).
Assim, o que passa a importar para se compreender a escola são como as
leis, as informações e as ideias são apropiadas pelos atores aos quais se destinam,
quais usos são feitos e como se materializam no cotidiano por meio das estratégias
de imposição e de táticas de apropriação (CERTEAU, 2007).
Para Nunes e Carvalho (1993), a possibilidade que se abre para que essa
compreensão aconteça relaciona-se com a ampliação do que deve ser considerado
como fonte, empreendendo outras e novas reflexões no que se refere ao espaço
escolar e suas relações. Desse modo, entende-se que os dispositivos, como as
revistas científicas, são um caminho possível, uma vez que sua função se associa
aos mecanismos pelos quais os saberes são impostos e as práticas são
normatizadas.
Contudo, é preciso refletir se as revistas de circulação mais recentes, como é
o caso da RBCE, que remonta as três últimas décadas, cumpre esse papel de
imposição de saberes e “normatização” de práticas, uma vez que seus leitores são
pesquisadores, professores e alunos dos cursos de graduação, tornado-se, portanto,
uma referência para a comunidade acadêmica, normatizando e didatizando a leitura
do campo, prescrevendo o que é interessante e o que é desinteressante para a
comunidade de leitores.
Como a escola não é um local de mera reprodução dos fazeres-saberes
produzidos pela sociedade, ressalta-se o papel dos professores também como
agentes produtores desses fazeres-saberes, junto aos seus alunos e ao contexto no
qual estão inseridos. Nesse sentido, cabe lembrar que a ação educativa da
Educação Física, balizada por saberes de outras áreas do conhecimento, é forjada,
também, por seus próprios profissionais, ao pretenderem cumprir uma função social
e conquistar status acadêmico com base em saberes já estabelecidos e, portanto,
reconhecidos socialmente.
Para estudar o modo como se efetivavam as práticas de pesquisa da
disciplina Educação Física numa perspectiva de trabalho com a escola, faz-se
fundamental adentrar essa realidade no modo como estavam postas suas
88
representações na RBCE, situando possibilidades, limites e necessidades do
contexto vivido pelo professor.
Por isso é que se buscou investigar como essas representações das práticas
de pesquisa circularam e foram dadas a ler na revista, entendendo com isso ser
possível identificar elementos constituintes e constituidores da prática pedagógica de
professores de Educação Física, que permitam pensar a legitimidade da área,
pautada na experiência, que é anterior à retórica legitimadora da academia. Ao
abordar a experiência docente, Taborda de Oliveira (2005, p. 40) afirma:
Diferentemente de nós [pesquisadores], que vamos à escola, ‘coletar dados’, seja na forma de fontes históricas, de dobras cutâneas, de desvios posturais ou de comportamento, os professores vão à escola para vivê-la em todas as suas idiossincrasias, mazelas, lacunas. Eles viveram e vivem toda essa profusão de possibilidades a partir de um registro irredutível, que só pode ser explicado pela experiência [...]. Por isso muitos pesquisadores continuam achando que o problema do professor, ou da escola, é a falta de interlocução com a universidade, com a ciência. Assim, muitas pesquisas que tratam das coisas da escola são feitas com condescendência e complascência. Talvez tenhamos passado da hora de reconhecer que o que temos a falar como pesquisadores àqueles que estão no ‘chão da escola’, há muito aprendemos com a herança cotidiana que eles próprios nos legam. A experiência dos professores tem sido solo fértil – ainda que por nós negligenciado – no qual regurgitamos nossa retórica cientificista, eivada de procedimentos de aplicação e validação.
Segundo Vago (2003), a conformação deste lugar chamado escola se dá a
partir de lógicas diferenciadas, em que estão envolvidas as percepções de diferentes
sujeitos sociais. Desse modo, investigar a escola na RBCE perpassou o
entendimento desta como produto de práticas diferenciadas de atores que, interna
e/ou externamente, criam e recriam esse espaço, de maneiras bem particulares,
com objetivos e métodos específicos, contribuindo para configurar o que se conhece
por cultura escolar.
De acordo com Faria Filho et al. (2004), estudos48 sobre culturas e instituições
escolares têm demonstrado que não apenas o espaço e o tempo são elementos
estruturantes das instituições e experiências escolares, mas também os sujeitos
sociais, os mais diversos, como a família, a Igreja e o mundo do trabalho, que se
mobilizam e mobilizam conhecimentos e experiências de diversas áreas, na
pretensão de dotar as instituições escolares de racionalidades e formas de
socialização.
48 Cf. em Hilsdorf (2001), Gatti (2001), Vago (2003), Cachorro (2003).
89
Assim, os trabalhos que se debruçam sobre os sujeitos escolares (professores, alunos, diretores, inspetores, etc.) e suas ações conformadoras e instituidoras das culturas escolares têm crescentemente utilizado as categorias de gênero, classe, raça, geração, etnia, entre outras, como instrumental teórico-metodológico para entender as ações e os lugares ocupados por esses sujeitos nas teias que envolvem e fabricam as culturas escolares (FARIA FILHO, 2004, p. 152).
Avança-se, pois, na discussão sobre cultura escolar, antes entendida como
manifestações de práticas instauradas apenas no interior da escola por aqueles que
compõem a sua cotidianidade: alunos, professores, diretores, pedagogos,
cozinheiros, vigilantes, extrapolando-se, assim, os “muros da escola”.
Contudo, deve-se ressaltar que, nessa operação, os praticantes da escola
não são consumidores passivos de saberes impostos de fora para dentro. Segundo
Vago (2003, p. 213), “São produtores de um saber encarnado, vivo, instituidor,
aberto, em movimento: a escola e seus agentes não são objetos manipuláveis do
conhecimento dito científico, racionalizado, pronto, mas lugar de sujeitos praticantes
e produtores de conhecimento”. Os sujeitos entre os quais estão, também, aqueles
que vêm “de fora” desse espaço, ou seja, o entorno, os pais, os pesquisadores, que
estabelecem relações com a escola, com maior ou menor intensidade.
De forma específica, os pesquisadores que investigaram a Educação Física
escolar e escreveram sobre essa temática para a RBCE foram aqui denominados de
pesquisadores.
Assim como Alves (1998), compreende-se o cotidiano da escola como lugar e
como espaço (CERTEAU, 2007). A escola é lugar, pois é composta por objetos e
indivíduos discriminados, marcados e hierarquizados (ALVES, 1998), com posições
e funções definidas, tal como postula Certeau (2007, p. 201) ao afirmar que
Um lugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência. Aí se acha portanto excluída a possibilidade, para duas coisas, de ocuparem o mesmo lugar. Aí impera a lei do ‘próprio’: os elementos considerados se acham uns ao lado dos outros, cada um situado num lugar ‘próprio’ e distinto que [os] define. Um lugar é portanto uma configuração instantânea de posições. Implica uma indicação de estabilidade.
A escola, então, é um lugar caracterizado por disputas, pela luta em busca do
“[...] monopólio dos instrumentos de poder objectivados [sic]” (BOURDIEU, 2002, p.
174) onde ocorrem múltiplas relações sociais envolvendo seus praticantes. Aliado a
isso, a escola é considerada como espaço, noção também articulada por Certeau
90
(2007, p. 202), entendendo-a como um lugar praticado, pleno de operações que se
movimentam:
O espaço é um cruzamento de móveis. É de certo modo animado pelo conjunto dos movimentos que aí se desdobram. Espaço é o efeito produzido pelas operações que o orientam, o circunstanciam, o temporalizam e o levam a funcionar em unidade polivalente de programas conflituais ou de proximidades contratuais (CERTEAU, 2004, p. 202).
Com esse entendimento sobre a escola, ressalta-se que a questão sobre a
qual se pretende debruçar neste capítulo diz respeito às práticas de pesquisa que
foram realizadas nesse espaço, como e com quais finalidades foram empreendidas.
Com base na análise dos artigos publicados na RBCE sobre Educação Física
Escolar, entende-se que os praticantes são pesquisadores que partem de práticas
diferenciadas fundamentadas pelo discurso científico.
Também aqui se recorre a Certeau (2007), quanto à relação entre
especulação e empiria, como é o caso da dicotomia teoria/prática. Contudo, Certeau
(2007, p. 136, grifo nosso) apresenta uma outra configuração do saber aliada às
suas maneiras de fazer:
A distinção não se refere mais essencialmente ao binômio tradicional da ‘teoria’ e da ‘prática’, especificado pela separação entre a ‘especulação’ [...] e as ‘aplicações’ concretas, mas visa duas operações diferentes, uma discursiva (na e pela linguagem) e a não discursiva. Desde o século XVI, a idéia de método abala progressivamente a relação entre o conhecer e o fazer, a partir das práticas do direito e da retórica, mudadas pouco a pouco em ‘ações’ discursivas que se exercem em terrenos diversificados e portanto em técnicas de transformação de um ambiente, impõem-se o esquema fundamental de um discurso que organiza a maneira de pensar em maneira de fazer [...]. Eis o ‘método’, semente da cientificidade moderna. Portanto, a fronteira não separa mais dois saberes hierarquizados, um especulativo, o outro ligado às particularidades, [...] mas ela opõe as práticas articuladas pelo dis curso às que (ainda) não o são (grifo nosso).
As ideias anunciadas formulam um pressuposto essencialmente não
hierarquizado, que parte da existência de práticas discursivas e não discursivas −
que se atribuem às práticas de pesquisa − de acordo com a abordagem escolhida
pelos pesquisadores para estudarem a escola. Chama-se a atenção para o fato de
que, sejam de fundo especulativo, sejam de fundo propositivo, as pesquisas são
sempre práticas de pesquisa, com seus procedimentos e técnicas, queiram ou não
aqueles que se propõem a teorizar.
91
Esse pressuposto será adotado para proceder à análise dos artigos da RBCE,
respeitando suas opções teórico-metodológicas, seja com estudos descritivos e/ou
analíticos, que apresentam caráter de denúncia, de crítica, ou de reflexão sobre a
Educação Física Escolar, seja com estudos de caráter propositivo, cujos
pesquisadores participaram efetivamente do cotidiano da escola, juntamente com os
professores, intervindo em suas práticas no sentido de contribuir para ressignificá-
las.
Parte-se, então, da compreensão de que os pesquisadores do campo da
Educação Física, especialmente aqueles que produziam textos para a RBCE, são
praticantes autorizados a realizar operações de pesquisa na escola. Essas
operações apresentam diferenças quanto aos procedimentos utilizados e às práticas
de pesquisa empreendidas, sob as quais é possível identificar distintos movimentos
realizados pelos pesquisadores, a saber: pesquisas sobre e com a escola.
Os estudos que se desenvolveram com o objetivo de empreender discussões
sobre a escola o fizeram com base em aspectos teórico-descritivos da Educação
Física Escolar. Os artigos que apresentaram essas características não explicitaram
interesse em ir à escola para vivenciar esse espaço e seus praticantes, mas
visaram, antes, à discussão em âmbito teórico, sobre suas práticas cotidianas,
legislação e organização escolar e a história do processo de escolarização da
disciplina Educação Física. Essa opção, por vezes, dificulta a aplicabilidade do
conteúdo trabalhado nos artigos, por parte dos professores da escola, devido ao
distanciamento desse tipo de pesquisa com a realidade escolar em sua faceta mais
óbvia: a intervenção pedagógica propriamente dita.
Para ilustrar essa situação, optou-se por mencionar trechos de artigos da
RBCE das três últimas décadas, que caracterizem a perspectiva denominada de
sobre a escola. Neles é possível identificar objetivos que indicam a opção por
realizar estudos especulativos sobre assuntos que perpassam a instituição escola:
Evidenciar e clarificar através das teorias que explicam a Educação Física as visões a-históricas, a-críticas e falseadoras da realidade que são compartilhadas pela maioria dos profissionais desta área do conhecimento humano. Neste trabalho, nos propomos a analisar e assinalar uma outra faceta da Educação Física escolar que é a sua contribuição no processo de socialização das crianças e adolescentes. Em função de nossas análises, podemos dizer que a socialização através do esporte escolar pode ser considerada, em nossa sociedade, como uma forma de controle social, pela adaptação do praticante aos valores e normas dominantes (BRACHT, 1986 p. 62).
92
[...] explicita-se o conceito de ‘cidadania’. A seguir são estabelecidas relações com a Educação Física/Esporte a partir dos princípios da ‘Inclusão’, ‘Alteridade’ e ‘Formação/Informação Plenas’. [...] consideram-se algumas relações entre o princípio da Formação/Informação Plenas e o actual processo de globalização examinando as implicações para a Educação Física/Esporte. Por fim, [...] apresentam-se indicações para a possibilidade para uma ‘Educação Física cidadã’ (BETTI, 1999, p. 84).
[...] objetiva identificar e discutir a gênese e o sentido dos parâmetros curriculares nacionais, buscando apreender seus desdobramentos para a educação física, suas prioridades e seus compromissos. Como procedimento de pesquisa realizou-se análise de conteúdo de dois volumes: documento introdutório e documento da área de educação física de quinta a oitava séries (RODRIGUES, 2002, p. 135).
Por outro lado, foram identificados estudos desenvolvidos numa perspectiva
denominada aqui de com a escola, vertente caracterizada por sua aproximação com
o espaço escolar, que visava à construção/reconstrução da experiência coletiva.
Nesse tipo de pesquisa, foi possível perceber a intenção do pesquisador de
se fazer presente na escola e, em níveis diferenciados,49 atuar como parte daquele
sistema de signos, para “de dentro” poder intervir no cotidiano escolar. Assim, é
realizada intervenção na prática pedagógica das aulas de Educação Física, com a
apresentação e realização de propostas que contribuam para ressignificar tais
práticas.
A título de exemplificar como esses estudos se caracterizam, a seguir serão
citados trechos de artigos da RBCE, também das três últimas décadas, que foram
desenvolvidos numa perspectiva com a escola:
O propósito deste estudo foi determinar a relação entre cada componente do somatotipo e variáveis de performance física em escolares. Foram avaliados 180 escolares do sexo masculino, com idades entre 11 e 16 anos. O somatotipo dos escolares foi determinado através da técnica antropométrica [...] (GUEDES, 1982, p. 99). [...] investigou como o aluno experimenta o sentimento denominado prazer, em aulas de Educação Física Escolar e quais as interferências para seu alcance. Para tanto, foram analisadas e interpretadas entrevistas abertas, semi-estruturadas de 58 alunos, na faixa etária de 10 a 15 anos, de ambos os sexos, das redes estadual e particular de ensino, [...] de 5ª a 8ª séries [...] aplicados logo após uma aula de Educação Física (BETTI, 1995, p. 158).
[Mostrar] por meio da descrição de experiências práticas de ensino, a possibilidade de reinventar o esporte nas aulas de educação física
49 Visto que essa aproximação pode acontecer de diferentes maneiras, conforme será explicitado no item “A arte de produzir dados”, neste mesmo capítulo.
93
diferentemente das práticas que se orientam pela sua cópia irrefletida, estimulando meninos e meninas pouco habilidosos, podendo vir a ser uma estratégia importante de inovação pedagógica (MEDEIROS, 2007, p. 292).
Observam-se nesses discursos representações diferentes de práticas de
pesquisa desenvolvidas na escola. Na primeira exposição, evidencia-se a
representação de fazer científico pautado na coleta de dados com escolares, sem
demonstrações de interesse no cotidiano escolar e em seus praticantes. Quanto ao
segundo trecho, nota-se preocupação com o aluno, por meio da valorização de
instrumentos, como entrevistas, que requer maior proximidade com os praticantes da
escola. Na última exposição, percebe-se uma perspectiva mais propositiva para as
aulas de Educação Física, visando à ressignificação da prática pedagógica.
A intervenção proposta por algumas pesquisas remete às proposições de
Certeau (2007), quando esse autor se refere às maneiras e artes de fazer, que aqui
correspondem, analogamente, às ressignificações das práticas pedagógicas
sugeridas pelos pesquisadores para as aulas de Educação Física na escola. No uso
tático das estratégias construídas/impostas, os professores que, por vezes, são os
próprios pesquisadores, imprimem seus diferentes fazeres-saberes.
Um fazer diferente, criativo, que amplia os horizontes das maneiras de fazer
das práticas pedagógicas instituídas. Assim, quando se diz uso tático das
estratégias, refere-se à movimentação astuciosa de alguns
professores/pesquisadores pelo espaço da escola, ao subverter a prática
pedagógica instituída e propor transformações no cotidiano das aulas de Educação
Física. Nesse sentido, Locatelli (2007) afirma que deve haver um distanciamento da
ideia de tomar o espaço escolar apenas como objeto de investigação e
desenvolvimento de práticas de ensino, sem contribuir de fato com as práticas nele
já existentes.
De fato, a produção de conhecimentos que envolvem a escola, em suas mais
diversas facetas, é marcada por pesquisas que discutem sobre o que a escola
deveria ser, como deveria proceder, qual metodologia deveria assumir e, também,
por pesquisas desenvolvidas numa perspectiva com a prática escolar. É preciso
esclarecer que foram definidas subcategorias dentro desses últimos estudos, as
quais puderam ser constituídas com base na metodologia dos trabalhos que
apresentam diferentes maneiras de se aproximar da escola.
94
A opção, nesta pesquisa, por abarcar tanto os estudos sobre quanto os
estudos com a escola deve-se ao fato de se entender que há uma linha de
continuidade entre ambas as perspectivas, com contribuições das primeiras sobre a
última, visto que a teoria emerge de prática, considerando, também, que teorizar se
constitui como prática, mas que fala de um lugar particular, o mundo das ideias. São,
pois, práticas articuladas por um discurso: o científico.
Pacheco50 (2008), quando se assume como pesquisador praticante, o faz
como parte do próprio objeto de estudo. Por isso, compreende não fazer sentido a
hierarquização da objetividade sobre a subjetividade, a separação entre sujeito e
objeto, teoria e prática, a relação de distanciamento e subordinação do objeto ao
sujeito, entre outros procedimentos metodológicos.
Procura, então, pensar essas relações como processos híbridos, “[...]
provocando [...] a impossibilidade de se pesquisar ou se falar ‘sobre’ os cotidianos
das escolas [...] e nos convoca a uma opção pelo ‘com’ os cotidianos, visto que, se
estamos incluídos [...] em nosso objeto, chegamos, às vezes, a nos confundir com
ele” (PACHECO, 2008, p. 66, grifos do autor).
Dessa forma, as incursões de Pacheco (2008) são aqui apropriadas no
sentido de ressaltar a não hierarquização da relação sujeito-objeto e, por
conseguinte, dos estudos desenvolvidos nas perspectivas sobre e com a escola. Na
esteira dessa discussão, ressalta-se que nenhuma das perspectivas arroladas por
esse estudo é considerada menos importante ou mesmo descartada, entendendo
que elas possuem focos de análise diferenciados e, portanto, particulares, mas
complementares em suas diferenças.
Com essa compreensão é que a temática Educação Física escolar na RBCE
foi investigada, evidenciando as opções e trajetórias dos autores dos artigos e
trazendo-as para discussão.
3.2 O PERCURSO TEÓRICO- METODOLÓGICO DA RBCE
A etapa de identificação da metodologia utilizada pelos pesquisadores-
praticantes nos 143 estudos realizados na escola é o trajeto que leva ao tipo de
50 As análises de Pacheco (2008) se detêm às pesquisas que partem do entendimento do pesquisador-praticante intrinsecamente relacionado com o espaço escolar.
95
pesquisa empreendido. Desse modo, a indicação da metodologia é de grande
utilidade numa pesquisa, visto que define o caminho percorrido pelo pesquisador,
contribuindo para conferir ao estudo credibilidade e legitimidade científica, além de
facilitar a atividade leitora.
Partindo para a organização dos artigos, foi possível identificar que, do total
selecionado (143), 99, ou seja, em 69% dos artigos, a indicação da natureza da
pesquisa não foi feita de maneira direta na escritura do texto. Essa opção por parte
dos autores fez com que operasse com as orientações de Ginzburg (2003) quanto à
decifração das pistas deixadas ao longo dos artigos, instigando à observação
daquilo que foi silenciado, como ensina Bloch (2001, p. 27), ao afirmar que “O
essencial é enxergar que os documentos e os testemunhos só falam quando
sabemos interrogá-los [...]”. E esse foi o esforço: interrogar o não dito.
O paradigma indiciário (GINZBURG, 2003) autoriza a investigação de
possíveis pistas e singularidades trazidas pelos artigos, especialmente no item
materiais e métodos em que são indicados os tipos de pesquisa, os instrumentos
utilizados, os procedimentos adotados, o público-alvo, o tipo de escola e o nível de
ensino.
O momento de decifrar a metodologia utilizada foi fundamental, pois ela
definiria a perspectiva das pesquisas, ou seja, sobre ou com a escola, uma vez que,
decifrando a trajetória percorrida pelos pesquisadores-praticantes, seria possível
comparar os objetivos previstos com aqueles que efetivamente foram realizados,
chegando-se, então, às pesquisas que objetivaram discorrer sobre a escola, mesmo
distante dela, e às pesquisas que se propuseram a estar junto com a escola em seu
cotidiano. Sobre os procedimentos metodológicos adotados nas pesquisas, Pires
(2008, p. 60) lembra que, “Efetivamente, queira-se ou não, o pesquisador seleciona
fatos, escolhe ou define conceitos, interpreta seus resultados, etc.; em suma ele
constrói, de sua parte, seu objeto tecnicamente e teoricamente”.
Embora a indicação da natureza da pesquisa não tenha sido privilegiada de
maneira direta pela maioria dos estudos aqui considerados, foi evidenciada, em
todos os casos, inclusive naqueles que citaram o tipo de pesquisa, a preocupação
em apresentar e, principalmente, descrever detalhadamente os instrumentos e
procedimentos de pesquisa, talvez por se entender que esse procedimento
caracterizasse uma pesquisa científica. Contudo, a não explicitação do tipo do
96
estudo configura-se em forte indicador da fragilidade, já que essa é uma exigência
inquestionável da lógica de organização do campo científico.
Na Tabela 2, são listadas a natureza das pesquisas encontradas nos 143
artigos selecionados, sua recorrência e, também, observa-se é explicitado pelo
autor.
Tabela 2 – Variabilidade quanto à natureza das pesquisas e suas recorrências indicadas ou não nos artigos
Nº NATUREZA DAS PESQUISAS NÚMERO DE RECORRÊNCIAS
AUTOR INDICA OU NÃO A NATUREZA
DA PESQUISA 1 Bibliográfica 52 7 indicam
45 não indicam 2 Pesquisa-ação 16 5 indicam
11 não indicam 3 Correlacional 14 1 indica
13 não indicam 4 Descritiva 10 5 indicam
5 não indicam 5 Documental 7 7 não indicam 6 Exploratória 7 7 não indicam 7 Histórica 6 1 indica
5 não indicam 8 Experimental 5 2 indicam
3 não indicam 9 Estudo de caso 5 2 indicam
3 não indicam 10 Qualitativa 3 3 indicam 11 Etnográfica 2 2 indicam 12 Bibliográfico-documental 1 1 indica 13 Filosófico-antropológica 1 1 indica 14 Filosófica 1 1 indica 15 Quase-experimental 1 1 indica 16 Estudo longitudinal 1 1 indica 17 Reflexão-pesquisa escolar-ação 1 1 indica 18 Qualitativa de tipo descritiva 1 1 indica 19 De campo com abordagem qualitativa/descritiva 1 1 indica 20 Empírica de caráter descritivo 1 1 indica 21 Bibliográfico-documental e pesquisa de campo,
caracterizando-se como um estudo de caso de tipo etnográfico
1 1 indica
22 Bibliográfica de cunho qualitativo 1 1 indica 23 Exploratória-bibliográfica 1 1 indica 24 Qualitativa com características de pesquisa
etnográfica e de pesquisa-ação 1 1 indica
25 Trabalho teórico de revisão bibliográfica 1 1 indica 26 Descritiva correlacional 1 1 indica 27 Pesquisa de campo 1 1 indica TOTAL 143 44 indicam/99 não
indicam
Como pode ser observado, 27 denominações diferentes, quanto à natureza
da pesquisa, aparecem nos artigos que compõem o corpus documental geral, entre
97
os estudos que fazem indicação explícita da natureza da pesquisa utilizada e os que
não o fazem. Essas denominações estão dispostas de forma decrescente, da mais
recorrente para a menos recorrente. Do total de repetições de cada tipo de pesquisa,
é possível comparar sua ocorrência, notando que a soma daqueles que não foram
indicados no texto, isto é, 99 (69%), é muito superior aos 44 (31%) artigos cujos
autores indicaram a natureza da pesquisa como parte da metodologia.51
O objetivo de listar todos os tipos de pesquisa encontrados, tanto os indicados
pelos autores quanto os que não o foram, foi demonstrar a multiplicidade de
denominações conferidas, por vezes, aos mesmos tipos de pesquisa. Alguns
pesquisadores debruçaram-se sobre estatísticas; outros se puseram a examinar
registros, relatórios, revistas, jornais; outros recorreram aos questionários e às
entrevistas; outros passaram a vivenciar as atividades do meio estudado.
Considerando essa diversidade de métodos e, consequentemente, de
instrumentos para pesquisar a Educação Física Escolar, ela poderia ser agrupada
conforme sua abordagem, uma vez que algumas pesquisas possuem as mesmas
características, embora com denominações distintas. Assim, após nova organização,
ficaram agrupadas da seguinte forma:
Tabela 3 – Redistribuição do quantitativo de pesquisas quanto à sua natureza Nº NATUREZA DAS PESQUISAS NÚMERO DE
OCORRÊNCIAS 1 Bibliográfica 55 2 Pesquisa-ação 18 3 Correlacional 16 4 Descritiva 13 5 Documental 8 6 Exploratória 7 7 Histórica 6 8 Experimental 6 9 Estudo de caso 5 10 Qualitativa 3 11 Etnográfica 3 12 Filosófica 2 13 Pesquisa de campo 1 TOTAL 143
Com maior expressão está a pesquisa bibliográfica com 55 ocorrências,
seguida pela pesquisa-ação com 18, pela pesquisa correlacional com 16 e pela
51 Cf. Apêndice E, no qual estão relacionadas, de maneira mais detalhada, as diferentes modalidades de pesquisar a Educação Física na escola, identificadas nos exemplares da RBCE por ano, conforme seleção dos artigos.
98
pesquisa descritiva com 13 ocorrências. No grupo com menor número de ocorrências,
aparece a pesquisa documental oito vezes, a pesquisa exploratória sete vezes, a
pesquisa histórica e a pesquisa experimental com seis ocorrências, o estudo de caso
aparece em cinco artigos, a pesquisa qualitativa e a etnográfica foram mencionadas
três vezes, a pesquisa filosófica teve duas ocorrências e a pesquisa de campo
aparece uma vez.
É bom esclarecer que, mesmo com a reorganização dos tipos de pesquisa,
seria possível ser ainda mais pontual de modo a reduzir a quantidade de
classificações, considerando que várias delas poderiam ser classificadas como
qualitativas, por exemplo. No entanto, fez-se a opção por manter essas classificações,
entendendo-se que essa nova distribuição permite a visualização das principais
modalidades utilizadas para desenvolver pesquisas no campo da Educação Física
Escolar. Dessa forma, a identificação da natureza da pesquisa conduziu à percepção
da existência dos dois movimentos investigados na RBCE, ou seja, pesquisas sobre e
com a escola.
Essa categorização foi empreendida não com o intuito de criar fronteiras, mas
de dar a ver e a ler as representações que o campo da Educação Física veio
publicizando em torno de suas práticas de pesquisa ao longo dos últimos 30 anos por
intermédio da RBCE. Representações essas que em muito contribuíram para a
conformação de um modo de fazer ciência que parece reforçar a dicotomia teoria-
prática na área. Isso indica que estamos diante de dois movimentos do fazer científico
de um campo que, por sua vez, recruta diferentes métodos e instrumentos
metodológicos para se aproximarem da realidade escolar e compreendê-la.
Assim, na classificação sobre a escola estão relacionadas aquelas pesquisas
que empreenderam discussões a respeito da escola, de seu funcionamento e de
seus praticantes sem, contudo, estar presentes nesse espaço, compartilhando de
sua cotidianidade.
Dentre as pesquisas selecionadas na RBCE com essas características, foram
destacadas as seguintes: pesquisa bibliográfica, pesquisa documental, pesquisa
filosófica, pesquisa histórica, pesquisa descritiva e pesquisa qualitativa, que somam
76 artigos que realizam suas pesquisas fora da escola, o que representa 53% do
total geral.
Na segunda categoria, estão as pesquisas realizadas com a escola, ou seja,
aquelas que partem do estudo de determinados aspectos da realidade escolar, de
99
maneira que a aproximação dos pesquisadores-praticantes se dê de forma efetiva
com a escola, em seu cotidiano. Essa aproximação pode acontecer de maneiras
diferenciadas, haja vista os tipos de pesquisa que alicerçam esses estudos, a saber:
pesquisa correlacional, pesquisa experimental, pesquisa-ação, pesquisa de campo,
pesquisa exploratória, estudo de caso, pesquisa descritiva e pesquisa qualitativa.52
Fazem parte dessa categoria 67 artigos, correspondendo a 47% dos 143 artigos
selecionados na RBCE. Esses dados foram representados no gráfico que segue:
Gráfico 3 – Comparativo entre pesquisas sobre e com a escola
Tomando como base as pesquisas que foram desenvolvidas na perspectiva
com a escola, que são a minoria, se comparadas com aquelas realizadas fora do
espaço escolar, por meio de estudos especulativos, é possível estabelecer
categorias que correspondem ao grau de aproximação delas com a escola.
É pertinente lembrar que a pretensão foi chegar ao número de artigos
publicados pela RBCE cujos autores, de fato, desenvolveram suas pesquisas numa
perspectiva propositiva com a escola e seus praticantes, vislumbrando com isso ser
possível traçar um panorama dos investimentos do campo científico, no que diz
respeito à Educação Física como disciplina escolar.
Foi evidenciado que o envolvimento com a escola aconteceu em níveis
diferenciados, visto que os pesquisadores partiam de pressupostos, métodos e
instrumentos distintos para estudar a escola, suas práticas e seus praticantes.
52 As pesquisas descritivas e qualitativas aparecem nas duas classificações, pois ora se apresentam como pesquisas sobre a escola, ora como pesquisas com a escola.
100
Então, foram eleitas duas categorias de análise que se referem aos 67 artigos aqui
classificados de com a escola. As referidas categorias foram denominadas de arte
de coletar dados e arte de produzir dados.
Antes de detalhar essas diferentes formas de aproximação com a escola, foi
necessário esclarecer as expressões arte de coletar dados e arte de produzir dados.
Assumindo como referência para este estudo as formulações de Certeau (2007),
passou-se a considerar o pesquisador − antes, tido como um “de fora” da escola −
como um praticante autorizado a circular nesse espaço, construindo ali relações com
os outros praticantes da escola.
Entendendo assim sua atuação, não há que se falar apenas em coleta de
dados, mas em produção de dados (CARVALHO, 2008), uma vez que a inserção do
pesquisador na escola não é passiva, promovendo alterações àquela realidade.
Nessa perspectiva, os dados não existem independentemente da presença do
pesquisador, visto que é ele que os faz aparecer conforme suas escolhas,
selecionando e transformando fatos do cotidiano escolar em informações
importantes que falam sobre aquele cotidiano. É possível pensar, então, que o
pesquisador dá sentido e significado àquilo que se apresenta diante dele.
Contudo, em alguns artigos, foram identificadas características que não
permitem classificá-los na categoria arte de produzir dados, uma vez que não
estabelecem relações com a escola para que o processo de produção de dados
aconteça, já que utilizam seus praticantes, especialmente os escolares, como fontes
de informação. São classificados, portanto, na categoria arte de coletar de dados.
Fundamentado no que foi realizado em termos teóricos e metodológicos
pelos artigos, foi possível extrair duas diferentes formas de aproximação ou
intervenção com a escola, tendo como base as artes de coletar e de produzir dados,
categorias que passam a ser detalhadas a partir das técnicas de pesquisa
empregadas. Para cada uma dessas duas categorias, procurou-se investigar:
a) o número de vezes que são identificadas nos artigos e sua distribuição pelas
três últimas décadas;
b) a natureza da pesquisa privilegiada;
c) a utilização dos sistemas público e/ou privado de ensino como locus da
pesquisa;
d) os níveis de ensino privilegiados (infantil, fundamental e/ou médio);
101
e) a composição da autoria e titulação;
f) a procedência territorial;
g) a relação entre o artigo e a pós-graduação;
h) o uso das teorias.
Entende-se que a investigação desses aspectos pode fornecer subsídios
suficientemente capazes de indicar o percurso teórico-metodológico assumido pela
RBCE ao longo de três décadas, ao veicular suas pesquisas com foco na Educação
Física escolar.
A exposição desses elementos foi empreendida por meio das categorias arte
de coletar dados e arte de produzir dados, identificadas como dois movimentos
internos da RBCE, assim denominados devido às maneiras pelas quais essas
pesquisas foram construídas, especificamente no que diz respeito a seu aspecto
metodológico, este, por sua vez, intrinsecamente, relacionado com a discussão
epistemológica. Por esse motivo, a relação epistemologia e metodologia foi
enfatizada, dado o grau de interdependência entre esses aspectos para o campo da
Educação Física.
Dessa forma, os dados referentes a essas duas categorias foram
apresentados neste capítulo, com o intuito de apresentar o estado da arte no que se
refere às práticas de pesquisa e aos saberes que circularam e ainda circulam na
RBCE. Contudo, sua análise foi reservada ao Capítulo 4.
3.2.1 Arte de coletar dados
Essa forma de pesquisar a escola, expressa principalmente nos primeiros
anos de circulação da RBCE, fez parte de um momento vivenciado pela Educação
Física brasileira e por seus profissionais que, preocupados com o status científico,
buscavam definir e regulamentar espaços para uma produção científica que fosse
capaz de conferir autoridade à área (SILVA, 2005), o que significa dizer, nos termos
de Bourdieu (1983), uma busca pelo acúmulo de capital científico.
Tendo em vista esse objetivo, a produção científica da área, em específico
aquela dada a ler na revista, no que se refere à temática escola, esteve, mormente
na década de 1980, amparada por estudos cujas abordagens metodológicas
102
privilegiavam a quantificação, comparação e análise estatística dos dados,
enfatizando temas voltados principalmente para o estudo da aptidão física em
escolares. Por esse motivo, nessa categoria, quando se fala em pesquisador,
entende-se aquele que se mantém distante da intervenção na escola, bem como de
seus praticantes, atendo-se a realizar a coleta dos dados de seu interesse,
colocando em ação sua prática de pesquisa, sem contudo, participar de forma mais
efetiva daquele cotidiano. O que está em jogo, então, é a arte de praticar uma
determinada ciência: a de coletar dados.
Assim, do total de 67 trabalhos desenvolvidos sob a perspectiva com a
escola, o número de artigos que apresenta as características da arte de coletar
dados chega a 19. Esses realizaram suas coletas de dados por meio de
procedimentos como medições, testes físicos e pesagens em escolares.
Situando temporalmente essas pesquisas, foi possível identificar que 12
foram localizadas na década de 1980, 5 na década de 1990 e 3 na década de 2000,
indicando que, com o passar do tempo, esse tipo de pesquisa tendeu a diminuir sua
recorrência, considerando que esses estudos não contemplavam um plano “macro”
que envolvesse outras dimensões, além da biológica, que se faziam necessárias
para ampliar as discussões no campo da Educação Física, especialmente aquela
desenvolvida em âmbito escolar, dada a necessidade de compreender a escola e
seus praticantes num contexto cultural, social, econômico e político.
A aproximação entre pesquisadores-praticantes e escola acontecia de forma
bastante incisiva sobre os alunos, valorizando a aferição de medidas
antropométricas de peso e altura, medição de dobras cutâneas, estágio de
maturação sexual, diâmetro ósseo, circunferência e altura tronco-cefálica. No que
concerne à coleta de dados, Zelditch, citado por Deslauriers e Kérisit (2008), propõe
dois grandes critérios para julgar a validade dos instrumentos para coleta de dados:
um se refere à capacidade desses instrumentos de trazer as informações desejadas;
o outro diz respeito à sua eficácia.
Assim, nos artigos analisados, para realizar a coleta de dados, os
pesquisadores se valiam de medições, especialmente, dobras cutâneas e testes
físicos, aplicados para verificar o nível de aptidão física dos escolares. Ressalta-se a
ocorrência de testes de impulsão vertical e horizontal, preensão manual,
cicloergômetro submáximo, composição corporal, flexão abdominal e análise
nutricional. Esses testes visavam à identificação das condições em que se
103
encontram as valências físicas dos alunos, como força, flexibilidade, agilidade,
resistência cardiorrespiratória e resistência muscular.
É possível inferir que a representação desses pesquisadores, ao
desenvolverem estudos com tais características, está diretamente relacionada com a
influência que a área médica tinha/tem sobre o campo da Educação Física, que
assume como seus os pressupostos da fisiologia, da biomecânica, da anatomia e da
antropometria, correlacionando variáveis mensuradas por meio de estudos
quantitativos e análises estatísticas por corroborar o entendimento da “[...] mística da
ciência que afirma que os números constituem a prova máxima da objetividade”
(GOULD, 2003, p. 10), sendo, pois, inquestionáveis, visto que são obtidos por meio
de procedimentos rigorosos normatizados, como queria essa perspectiva de ciência.
De modo geral, os objetivos especificados nos estudos com escolares,
caracterizados como arte de coletar dados, buscavam verificar a distribuição e as
dimensões das dobras cutâneas; determinar a relação entre cada componente do
somatotipo e variáveis de performance física; determinar os efeitos do treinamento
sistemático de futebol sobre a capacidade física de trabalho; analisar a força
muscular de membros superiores; verificar os possíveis benefícios da atividade física
programada sobre a aptidão física geral; apresentar e discutir as características dos
agravos constitucionais da boca; avaliar o estado nutricional dos alunos por meio de
medidas antropométricas e aspectos do crescimento e da aptidão física relacionados
com a saúde.
No entanto, o artigo de De Rose e De Rose (1980), localizado no exemplar v.
1, n. 3, chama a atenção, pois, apesar de se valer de procedimentos como
medições, testes físicos e pesagens nos escolares, apresenta como objetivo
[...] detectar a influência do componente nutricional, decorrente do fator sócio-econômico, no desenvolvimento somático e motor do pré-escolar, e as consequências desta influência no desempenho dos alunos em situações de ensino-aprendizagem (DE ROSE; DE ROSE, 1980, p. 21).
Esse artigo, diferente de todos os outros de sua categoria – arte de coletar
dados – explicita a preocupação com os processos que ocorrem na escola com seus
praticantes, prestando atenção aos processos somáticos e funcionais das crianças e
às consequências dessa influência nas situações de ensino-aprendizagem.
É importante ressaltar que esse é o primeiro artigo a ser identificado desde o
primeiro critério, pelo qual foram selecionados 143 artigos do total geral que compõe
104
o corpus documental desta pesquisa. Além disso, prestando atenção à sua
localização temporal, esse é um artigo publicado logo no segundo ano de circulação
da revista. Essa, possivelmente, já era uma indicação do rumo que tomariam as
pesquisas realizadas na área, privilegiando o que se passava dentro da escola e que
envolvia seus praticantes, mesmo recorrendo a técnicas quantitativas para obtenção
de informações. No entanto, as pesquisas na área parecem ter tomado outro
direcionamento, como pôde ser observado nos artigos que se seguiram a esse.
As pesquisas classificadas nessa categoria eram compostas por uma
“amostra”,53 normalmente bastante numerosa, valendo-se de procedimentos como
mensurações, testes físicos e pesagens. “Essa amostra não se constitui ao acaso,
mas sim em função de características precisas, que o pesquisador pretende
analisar” (DESLAURIERS; KÉRISIT, 2008, p. 138).
Esses estudos foram realizados na escola, numa perspectiva mais estanque
entre o pesquisador e os demais praticantes da escola, havendo uma delimitação
entre suas posições, o que parece indicar um entendimento de que estar na escola
não significa, necessariamente, participar dela. Contudo, entende-se que, embora
não haja intervenção na prática pedagógica, os pesquisadores praticam o espaço
escolar com suas práticas de pesquisa, ou seja, sua ciência de coletar dados.
Sobre esse aspecto, é pertinente apresentar a natureza das pesquisas que
foram realizadas por meio desse fazer científico. Dos 19 artigos classificados nessa
categoria, apenas 4 indicaram explicitamente o tipo de pesquisa, enquanto a maioria
expressiva, ou seja, 15 artigos, não o fizeram. Esse último grupo requereu maior
atenção para identificar, por meio dos vestígios deixados, qual tipo de pesquisa foi
desenvolvido. Após essa identificação, reunindo os artigos que indicaram implícita
ou explicitamente a natureza das pesquisas que realizaram coleta e tratamento de
dados, foram localizadas: pesquisa correlacional com 15 recorrências, pesquisa
experimental que aparece 3 vezes e pesquisa descritiva que, nesta categoria,
aparece apenas 1 vez.
Como se pode observar, a arte de coletar dados é representada
significativamente por pesquisas que visavam a explorar possíveis relações entre
variáveis, de modo a correlacioná-las. Neste caso, trata-se das variáveis
53 Essa é a referência feita pelos autores a um grupo de alunos selecionados para realizar as medições, testes e pesagens, para posterior comparação e análise estatística.
105
antropométricas aferidas nos escolares como forma de correlacionar essas
dimensões ao nível de aptidão física.
Outro elemento importante a ser apresentado nessa subcategoria diz respeito
ao sistema de ensino que os artigos privilegiam. Podiam ser desenvolvidos em
escolas do sistema público, privado ou em ambos os sistemas de ensino. Sob esse
aspecto, foram contabilizadas 14 pesquisas desenvolvidas em escolas públicas,
nenhuma em escola do sistema privado (exclusivamente), 2 pesquisas que reuniram
ambos os sistemas de ensino e 3 artigos que não indicaram o sistema de ensino sob
o qual atuaram. Esses dados podem ser mais bem visualizados no gráfico que
segue.
Gráfico 4 - Distribuição dos artigos que realizaram coleta de dados por sistemas de
ensino
Analisando o gráfico, é possível inferir que a grande maioria dos
pesquisadores nessa categoria escolheu como locus de suas pesquisas escolas do
sistema público, representando 74% do total. Com 16% estão as pesquisas que
abordaram escolas públicas e privadas, simultaneamente, e com 10% aparece a
parcela de artigos que não fez indicação do sistema de ensino sobre o qual atuou.
Chama a atenção o fato de que, das 19 pesquisas, nenhuma privilegiou escolas do
sistema privado exclusivamente, talvez pelo fato de ser mais fácil encontrar
“problemas” nas escolas da rede pública.
Conforme foi observado na metodologia das pesquisas, a aproximação com a
escola acontecia por parte dos pesquisadores-praticantes, por eles considerarem
como público-alvo crianças e/ou adolescentes em idade escolar que estivessem
106
inseridos nesse contexto. Sobre o público-alvo, isto é, o nível de ensino privilegiado
pelas 19 pesquisas encontradas nessa categoria, é possível identificar que 3
privilegiaram a educação infantil, outras 3 o ensino fundamental, nenhuma estudou o
ensino médio e 13 artigos não indicaram o nível de ensino privilegiado.
A maioria dos artigos, 13, não indicou o nível de ensino abordado. No entanto,
há indícios que podem levar a identificá-los, uma vez que os pesquisadores citam as
idades dos escolares por considerarem como uma variável fundamental para o tipo
de pesquisa desenvolvido nessa categoria, dadas as correlações que eram feitas
entre as idades e outras variáveis obtidas por meio das medições e testes físicos.
Assim, com base na análise das faixas etárias expostas nos artigos,
aproximando-as do nível de ensino correspondente, verifica-se que, dos 13 artigos
que não indicaram, a priori, o nível de ensino, 6 desenvolveram pesquisas com
escolares de 7 a 14 anos, concluindo-se, portanto, que pertencem ao ensino
fundamental; 1 estudo foi realizado com alunos de 15 a 18 anos, podendo-se inferir
que foi privilegiado o ensino médio; e, por fim, 4 pesquisas tiveram como amostra
alunos com idades pertencentes a dois níveis de ensino diferentes.
Somando os dados explicitados nos artigos e aqueles identificados por meio
do indícios, tem-se que 3 estudos privilegiaram a educação infantil, 9 atuaram no
ensino fundamental, 1 no ensino médio, 4 pesquisas envolveram dois níveis distintos
de ensino e 2 estudos, definitivamente, não indicaram sequer a idade, totalizando as
19 pesquisas que visavam à coleta de dados. No Gráfico 5, é possível visualizar
essa distribuição:
Gráfico 5 - Distribuição dos artigos que realizaram coleta de dados por níveis de
ensino
107
Ao analisar o gráfico, é possível perceber que maior atenção é dispensada ao
ensino fundamental, que aparece em 47% das pesquisas realizadas na escola,
seguido por 21% das pesquisas que se valem de mais de um nível de ensino. Na
sequência, vem a educação infantil com 16%, depois os artigos que não indicaram o
nível de ensino com 11% e aqueles que enfocaram o ensino médio com 5% do total.
Levando em consideração a constituição do campo científico, entendeu-se
como relevante inserir, nesta apresentação, a composição da autoria dos artigos e
a titulação desses autores. Quanto ao primeiro, procurou-se caracterizar o estilo da
produção por meio do número de autores por artigo, tentando-se perceber como a
comunidade acadêmica se organiza na proposição e na produção de estudos
publicados na RBCE. Com isso a intenção foi identificar o quantitativo de artigos
com autoria individual e com autoria coletiva. Quanto ao segundo, buscou-se
relacionar as formas de organização, individual ou coletiva, com a titulação
apresentada pelos autores, quando o estudo foi realizado. Assim, essa titulação
pode se apresentar da seguinte forma: doutor(a), doutorando(a),54 mestre,
mestrando(a) especialista, graduado(a) e/ou acadêmico(a).
Retomando a composição da autoria dos 19 artigos que compuseram a
categoria arte de coletar dados, foram encontrados 5 artigos com autoria individual e
14 com autoria coletiva. De maneira geral, a forma coletiva de organização dos
artigos foi apresentada com a participação de dois a três autores. Pode-se inferir daí
que as pesquisas publicadas no âmbito da RBCE privilegiaram a formação de
autoria numa perspectiva de coletividade do processo de organização do trabalho
científico, que perpassa o caminho desde a problematização de um objeto de
investigação até sua publicação.
Para proceder à apresentação dos achados relativos à titulação dos autores,
foi preciso fazê-la de forma separada, ou seja, primeiro a titulação presente nos 5
artigos com autoria individual e depois a titulação apresentada nos 14 artigos com
autoria coletiva. Nos artigos em que não foi identificada a titulação de seus autores,
foi necessário recorrer ao currículo na Plataforma Lattes, comparando a data de
publicação do artigo com sua respectiva titulação à época.
54 Mesmo entendendo que as denominações doutorandos e mestrandos não se configuram como título, esses termos foram usados devido à sua relação com a pós-graduação.
108
Mediante essas etapas, foi possível localizar, quanto à autoria individual: um
mestre, um mestrando, dois especialistas e um autor cujo nome não consta nos
registros da Plataforma Lattes. No que se refere à autoria coletiva, que se apresenta
em número expressivo, se comparada com os artigos com autoria individual, foi
possível encontrar: dez doutores, dois doutorandos, três mestres, seis especialistas,
cinco acadêmicos, três autores, cujo currículo não indica a titulação à época do
estudo, e outros sete autores cujos nomes não constam na Plataforma Lattes.
Com o intuito de visualizar melhor esses números, optou-se por reunir as
titulações encontradas nos artigos com autoria individual e com autoria coletiva em
forma de gráfico, de modo que uma nova configuração se apresenta: 10 (24%)
doutores, 2 (5%) doutorandos, 4 (10%) mestres, 1 (2%) mestrando, 8 (20%)
especialistas, 5 (12%) acadêmicos, 3 (7%) autores cujo currículo na Plataforma
Lattes não indica a titulação à época de publicação do artigo e 8 (20%) cujos nomes
não constam na referida Plataforma.
Gráfico 6 – Titulação encontrada nos artigos que realizaram coleta de dados na escola
Nesta categoria, caracterizada por obter informações para suas análises por
meio de coleta de dados em escolares, é possível inferir que a maioria dos
pesquisadores que realizaram estudos na escola eram doutores (24%), seguidos por
especialistas (20%). Além desses, representando um percentual também elevado
(20%), está um grupo de autores cuja formação, à época da realização do estudo,
não foi possível identificar, pois não apresentaram sua titulação nos artigos e
109
também não constam seus registros no currículo da Plataforma Lattes. Nesse
gráfico, chama a atenção o fato de que acadêmicos, isto é, alunos ainda em
formação inicial, publicaram mais do que doutorandos, mestres e mestrandos.
Quando observado se os artigos eram oriundos de pesquisas da pós-
graduação, pôde-se inferir que, dos 19 artigos um é parte de dissertação de
mestrado e 18 não indicaram a origem do estudo. Foi possível ainda identificar nos
artigos outro elemento que possui estreita relação com o sistema de pós-graduação,
a saber, a procedência territorial dos estudos publicados pela revista. A
investigação desse elemento permitiu detectar em quais Estados brasileiros foram
produzidos os artigos sobre Educação Física escolar, na perspectiva adotada por
este estudo, bem como de qual região do País provém a maior parte dessa
produção.
A identificação desses dados foi facilitada na maioria dos artigos, visto que
eles indicaram a localização geográfica em que estavam inseridas as escolas
selecionadas como locus para o desenvolvimento da pesquisa. Quando os artigos
não indicaram explicitamente, essa informação foi obtida levando em consideração a
instituição de ensino superior onde a pós-graduação foi realizada.
Sobre esse aspecto, foram localizados artigos provenientes dos seguintes
Estados e suas respectivas recorrências: São Paulo/SP (9), Paraná/PR (4), Minas
Gerais/MG (2), Rio de Janeiro/RJ (1), Paraíba/PB (1), Santa Catarina/SC (1) e Rio
Grande do Sul/RS (1). O gráfico que segue ilustra esses dados:
Gráfico 7 – Procedência, por Estados, de artigos que realizam coleta de dados
110
A partir desses dados, foi possível inferir que houve predominância de artigos
provenientes da Região Sudeste, concentrando 12 trabalhos, seguida da Região Sul
com 6 artigos e da Região Nordeste com apenas 1.
Quanto ao uso de teorias nessa categoria, foi possível encontrar indícios do
pensamento médico-higienista com foco na Educação Física relacionada com a
aptidão física e a promoção da saúde, por meio da construção dos estudos que se
valiam de testes aplicados aos alunos para identificar o nível de aptidão física de
acordo com as faixas etárias e outras variáveis, além das medidas antropométricas
aferidas e comparadas com um valor ideal conforme outras tantas variáveis.
De acordo com Góis Junior e Lovisolo (2003), pode-se inferir que ainda
circulam nas pesquisas atuais resquícios do discurso médico-higienista de fins do
século XIX e início do século XX, o que vai de encontro à representação existente no
campo da Educação Física de que esse movimento teria chegado ao fim nas
décadas de 1930 e 1940. Como pôde ser percebido nas páginas da revista, essa
representação de ciência se mantém para além da terceira e quarta década do
século XX, sendo essa uma prática inerente às pesquisas desenvolvidas na década
de 1980.
O fato de os pesquisadores não indicarem explicitamente a teoria de fundo do
estudo não quer dizer que ela não exista. Pelo contrário, esse tipo de estudo,
desenvolvido a partir de pesquisas empíricas, baseadas em medições, análises e
comparações dos dados coletados nas escolas, apoiava-se em algum suporte
teórico, mesmo que esse não seja reconhecido, a priori, por seus leitores. Dessa
forma, os 19 artigos dessa categoria estariam ligados ao modo como os
conhecimentos eram apropriados pelos articulistas da RBCE, fundamentando as
suas representações.
Nesse sentido, percebe-se a presença de uma lógica diferenciada nessas
pesquisas, em que o rigor não estava na narrativa empregada, mas no método
utilizado. Logo, as medições, quantificações e análises estatísticas dos dados
coletados em escolares configuravam um fazer científico rigoroso.
111
3.2.2 Arte de produzir dados
A partir de meados da década de 1980, o mote dos estudos publicados pela
revista do CBCE apresenta mudanças concernentes àquelas que vinham ocorrendo
no interior dessa entidade científica, provocando uma reorientação do tipo de
pesquisas realizadas na área. Por serem espaços de luta, os campos passam por
reordenações e a história do CBCE reflete isso. Segundo Bracht (2009, p. 35-36)
[...] as diferenças e as tensões no interior do CBCE giram em torno da visão de ciência, particularmente da relação entre ciência e política (aspecto agudizado na década de 1980 em função do contexto político brasileiro) e, consequentemente, da visão do papel social da educação física ou das práticas corporais (atividade física e esportiva) da população em geral. Cabe salientar que o CBCE a partir de meados da década de 1980 reflete e é participante ativo de um processo de repensar a prática social educação física, incluído aí o esporte (campo que era, à época, sua referência maior). Na configuração das relações de força no interior do campo da educação física a partir da década de 1990, o CBCE, majoritariamente, em função dos grupos que assumem sua direção, vai constituir-se num espaço, num ator, situado no espectro contra-hegemônico em relação à visão de ciência predominante, bem como, à visão do que deveria ser a intervenção no campo da educação física e do esporte.
Nesse momento, articulava-se uma nova forma de pensar a/na área,
contemplando discussões até então pouco expressivas no campo da Educação
Física, em especial aquelas que envolvem a escola, seus praticantes e as práticas
que nela se efetivam.
Como um marco ao qual se pode atribuir essa mudança, aparece o VI
CONBRACE realizado em Brasília (DF), em 1989, no qual foi assinalado um
momento crucial para a história do CBCE e, principalmente, para os novos
direcionamentos que foram tomados pela produção científica da área (SILVA, 2005).
Nesse contexto, o CBCE, por meio das publicações de sua revista, dá a ler
sua nova orientação em termos epistemológicos, teóricos e metodológicos, voltando-
se mais atentamente para problemas socioeconômicos e políticos inerentes ao
debate acadêmico e ao processo de produção do conhecimento. Sob esse aspecto
é que se inserem, como recursos a esse novo direcionamento, as práticas de
pesquisa e suas técnicas, que funcionam como mediadoras entre o pesquisador e a
realidade, os fenômenos, os praticantes da escola, enfim, aquilo que se pretendia
pesquisar.
Situado o contexto em que as pesquisas que compõem a categoria arte de
produzir dados ganham força, percebe-se que elas foram desenvolvidas numa
112
perspectiva de intervenção no espaço escolar envolvendo, além dos alunos, outros
praticantes, especialmente os professores, cuja atuação era/é fundamental para se
entender os desdobramentos do cotidiano escolar. Diferente da categoria anterior
(arte de coletar dados), esta se deu com base nas relações estabelecidas entre o
pesquisador e a cultura escolar, relações estas que perpassaram por conflitos e
consensos, tensões e resistências, num espaço onde há um cruzamento de móveis
e onde as relações se desdobram, segundo noções mobilizadas por Certeau (2007).
Isso significa dizer que os artigos de maior interesse para esta pesquisa foram
aqueles desenvolvidos numa perspectiva de construção da disciplina Educação
Física junto com a escola e seus agentes. Sobre essa perspectiva de estudos com a
escola, Ferraço (2008, p. 26) tem se
[...] dedicado a estudar o cotidiano em meio às redes de fazeressaberes que são tecidas pelos sujeitos praticantes em suas narrativas, usos, negociações, traduções e mímicas. Isso implica no fato de o pesquisador, sempre que possível, vivenciar com os sujeitos das escolas esses processos, buscando muito mais produzir do que coletar dados.
Quando o autor fala em “produzir mais do que coletar dados”, faz inferência
às pesquisas que envolvem os sujeitos que praticam o cotidiano das escolas,
considerando que estes, mais do que objetos de análises, são protagonistas e
autores das pesquisas, uma vez que é considerada pelos pesquisadores a
participação ativa, especialmente dos alunos, no processo de ressignificação da
prática proposto por alguns autores de artigos da RBCE.
Dessa forma, estes vislumbravam transformações nas práticas cotidianas
das aulas de Educação Física, em detrimento da utilização desse espaço apenas
como campo específico para coleta de dados. Pérez e Azevedo (2008, p. 42)
complementam essa posição afirmando:
Na pesquisa com o cotidiano, em especial com o cotidiano escolar, a reconstrução da experiência coletiva traduz uma prática singular de pesquisa. (Re)construir a experiência coletiva no cotidiano da escola implica, entre outras coisas, desvelar as tessituras das redes de saberes que dão sentido às nossas ações cotidianas, compartilhando-as coletivamente, por meio de um processo de investigação que tem como ponto de partida e como ponto de chegada a reinvenção da escola como um espaço apto a acolher o passado e a criar o futuro.
Esse foi o mote desta pesquisa, ou seja, explorar o modo como os
pesquisadores dos artigos publicados na RBCE objetivavam (re)inventar, (re)criar,
113
(re)construir as aulas de Educação Física na escola por meio de novas metodologias
de ensino, atuando nesse espaço de maneira a ressignificar essa realidade.
Faz-se importante ressaltar que essas relações são estabelecidas a partir das
representações dos grupos que as forjam mediante seus interesses (CHARTIER,
1988). Dessa forma, apreende-se que os pesquisadores, munidos de diferentes
práticas de pesquisa, circulavam pelo espaço da escola com olhares atentos,
escutas interessadas e falas direcionadas a um outro grupo de praticantes, para
que, assim, fatos cotidianos inerentes à escola fossem percebidos como dados e,
portanto, produzidos como tal num processo de interação/intervenção, capazes de
conduzir a respostas esperadas pelo campo educacional no que se refere ao
funcionamento, estrutura e organização da escola.
Foi possível inferir, por meio dos objetivos apresentados pelos pesquisadores
ao desenvolverem seus estudos na escola sob o enfoque apresentado, que, de
modo geral, os artigos objetivaram: diagnosticar o funcionamento da prática da
Educação Física; buscar alternativas metodológicas para o ensino dessa disciplina;
realizar análises críticas dos conteúdos; identificar as representações que guiavam a
prática dos professores bem como seu entendimento do papel da escola; questionar
se a Educação Física se constituía um componente curricular; discutir a inserção
dessa disciplina na proposta político-pedagógica da escola, determinando seu papel
na estruturação do currículo escolar; identificar como tem sido praticada a avaliação;
refletir sobre a organização dos saberes nos ciclos de aprendizagens.
Esses objetivos indicam uma mudança no pensamento científico do campo da
Educação Física no que se refere às práticas de pesquisa, ao que se buscava
conhecer e como fazê-lo, voltando a atenção para problemas de ordem
socioeconômica, política e cultural.
Com isso, notou-se uma redução no número de pesquisas que buscavam
estudar aspectos médico-biológicos55 em crianças, perspectiva que esteve
fortalecida no início da década de 1980 e, por conseguinte, nos primeiros anos de
publicação e circulação da revista do CBCE. Concomitantemente a esse processo,
observou-se, no campo da Educação Física, um aumento de pesquisas que tiveram
55 Os grupos das chamadas áreas biológicas, que antes fizeram parte da direção nacional do CBCE, da editoria da revista, das mesas-redondas e das palestras, após essa divergência acadêmica, não mais se fizeram presentes nesses espaços, preferindo criar ou conferir força a outras instâncias voltadas para a difusão e o debate de assuntos como fisiologia, antropometria, biomecânica e aptidão física.
114
por objetivo investigar a escola, suas práticas e seus praticantes. A categoria
denominada arte de produzir dados foi identificada na revista por meio de diferentes
ações pedagógicas, que podem ser denominadas de subcategorias.
A primeira acontece mediante aplicação de diferentes técnicas de pesquisa,
como observações, entrevistas e questionários, aos praticantes da escola, com
vistas a identificar e publicizar questões concernentes à Educação Física escolar,
numa perspectiva de denúncia em relação aos seus limites e possibilidades. A
segunda, de inserção mais verticalizada no espaço escolar, com apresentação e
realização de propostas metodológicas para as aulas de Educação Física, com
vistas à intervenção na prática pedagógica ali existente. Essas ações pedagógicas,
realizadas por meio da produção de dados, serão detalhadas nos itens que seguem.
3.2.2.1 Observações, entrevistas e questionários?
Em um primeiro momento, pode parecer estranho que técnicas de pesquisa,
como observações, entrevistas e questionários, façam parte da categoria arte de
produzir dados e não da anterior, denominada arte de coletar dados. Por esse
motivo, elas aparecem em forma de questionamento, para que seja visível que essa
alocação se deu permeada por indagações em torno de onde seriam mais bem
situadas. Entretanto, dois fatos relevantes pesaram nessa decisão.
O primeiro é o fato de o pesquisador se encontrar inserido no ambiente
escolar, atuando nesse espaço de modo a alterar seu cotidiano. Sua presença como
um “de dentro”, ou seja, como um praticante da escola, é muito favorável para o
desenrolar de sua pesquisa, visto que, autorizado a habitar aquele espaço, pode
conhecer seus meandros, limites e possibilidades.
O segundo e principal fato diz respeito à questão de os artigos abordarem a
escola, seus praticantes e suas práticas, com o objetivo de “publicizar” o que
acontecia nesses espaços. Assim, há diferença significativa daqueles estudos que
também eram desenvolvidos nesse espaço, mas com o intuito de compor uma
“amostra” para obter dados antropométricos, não apresentando, aparentemente,
interesse por discussões afeitas a essa instituição.
Situado o contexto em que alguns artigos foram caracterizados como arte de
produzir dados, é preciso detalhar como os pesquisadores se valem das técnicas
115
(observações, entrevistas e questionários) para desenvolver seus estudos,
considerando que esses são procedimentos operacionais que permitem ao
pesquisador a apreensão de parcela da realidade escolar, possibilitando-lhe
desenvolver sua pesquisa.
Dessa forma, buscou-se identificar, do total de 67 artigos que realizaram
pesquisas com a escola, o número de artigos que usaram como técnicas para
produção de dados, as observações, as entrevistas e os questionários, podendo, às
vezes, o estudo recorrer a mais de uma dessas técnicas, combinando, normalmente,
duas delas.
Foi possível, então, localizar 29 artigos: 2 se valem exclusivamente de
observações; 5 fazem exclusivamente entrevistas; 3 recorrem exclusivamente a
questionários; 14 utilizam mais de uma técnica no desenvolvimento do estudo; e 5
pesquisas não fazem indicação de quais recursos utilizam para produzir seus dados.
Esses achados estão distribuídas conforme o Gráfico 8:
Gráfico 8 – Técnicas de pesquisa mais usadas
Pode-se observar que artigos que utilizaram mais de um tipo de técnica para
produção de dados abarcaram boa parte (14) dos estudos da subcategoria em
questão, indicando que, talvez, a combinação desses recursos, possibilite maior e
melhor compreensão da realidade escolar. As observações descritas eram das aulas
de Educação Física, nas quais alunos e professores eram o alvo dos olhares do
pesquisador. As entrevistas e os questionários, em suas várias possibilidades
116
estruturais, também eram direcionados a alunos e professores e, em alguns casos
aos pais.
Os 29 artigos desta subcategoria estão assim distribuídos temporalmente: 4
na década de 1980, depois 14 na década de 1990 e 11 na década de 2000.
Observou-se, nesse ponto, um deslocamento da quantidade mais expressiva de
artigos para a década de 1990, ao passo que, na categoria arte de coletar de dados,
esse quantitativo se localizava na década de 1980. Isso revela a trajetória de
mudanças nos objetivos, métodos e técnicas utilizados nas pesquisas realizadas na
área, que, na década de 1980, apresentavam pressupostos que foram mudando até
chegar à década de 1990 com artigos que privilegiavam temas mais afeitos à
instituição escolar, suas práticas e representações, incluindo a de seus praticantes.
No que diz respeito à natureza da pesquisa utilizada nos artigos que tiveram
como principal fonte de dados as observações, as entrevistas e os questionários, foi
identificado o tipo de pesquisa em 19 artigos (66%). Os 10 artigos (34%) restantes
não indicaram a natureza da pesquisa. Foi necessária sua identificação por meio
dos vestígios deixados em sua trajetória metodológica.
Foi possível, então, identificar os seguintes tipos de pesquisa, bem como o
sua recorrência: pesquisa descritiva (8), pesquisa experimental (3), pesquisa
exploratória (7), estudo de caso (5), pesquisa qualitativa (2), etnografia (3) e
pesquisa de campo (1).
Os tipos de pesquisa apresentados e as maneiras de observar, entrevistar e
aplicar questionário recrutadas para sua execução são exemplos característicos e
recorrentes para estudos realizados com a escola, visto que permitem ao
pesquisador inserir-se nesse espaço de modo a operar modificações, por sua
presença que observa e inquire direta ou indiretamente os praticantes da escola.
No que tange ao sistema de ensino , das 29 pesquisas realizadas, 19 (66%)
foram feitas em escolas do sistema público de ensino, 3 (10%) em escolas privadas,
2 (7%) em ambos os sistemas e 5 (17%) não fazem indicação da escola em que o
estudo é desenvolvido. O Gráfico 9 que segue ilustra os dados que se referem aos
diferentes sistemas de ensino:
117
Gráfico 9 - Distribuição dos artigos que realizaram observações, entrevistas e
aplicaram questionários por sistemas de ensino
Apresentada a distribuição dos artigos por sistema de ensino, observou-se
que o número de pesquisas desenvolvido no sistema público foi superior ao número
de pesquisas na rede privada, tendo em vista a relativa facilidade de acesso do
pesquisador às escolas públicas, ao professor de Educação Física da escola, bem
como ao corpo pedagógico da instituição.
Quanto ao nível de ensino , ou seja, se infantil, fundamental e/ou médio,
identificou-se que, dos 29 artigos produzidos a partir de pesquisas que
empreenderam observações, entrevistas e questionários, desenvolvidos em escolas
do sistema público, privado e/ou em ambos, nenhum privilegiou a educação infantil
exclusivamente; 15 (52%) realizaram pesquisas nas várias séries que compõem o
ensino fundamental; 1(3%) privilegiou o ensino médio; 5 (17%) desenvolveram
estudos abordando dois níveis de ensino diferentes; e 8 (28%) não indicaram qual o
nível de ensino priorizado. Esses dados podem ser conferidos no gráfico que segue:
118
Gráfico 10 - Distribuição dos artigos que realizaram observações, entrevistas e
aplicaram questionários por níveis de ensino
Novamente, verificou-se a prevalência de estudos desenvolvidos em escolas
de nível fundamental, com mais da metade dos artigos. Quanto aos artigos que não
indicaram o nível de ensino, desta vez não foi possível identificá-los por meio dos
indícios, pois o artigo sequer cita as idades dos alunos que participaram da
pesquisa. Chama a atenção, também, o fato de nenhum estudo priorizar a educação
infantil exclusivamente. Além disso, outro ponto que se deve ressaltar é que nenhum
dos artigos explicita a razão de sua escolha por um ou outro nível de ensino, apenas
seleciona, na maioria das vezes, alunos e professores, com os quais será realizada
a pesquisa.
Quanto à composição da autoria dos artigos, isto é, a forma como se
organizavam os autores que escreviam para a revista em questão, esta pode se
apresentar de forma individual ou em coletividade. Além disso, outro elemento de
fundamental importância nesse processo se refere à titulação desses autores, visto
que, dependendo do seu nível de formação, há maior ou menor probabilidade de
que as pesquisas sejam realizadas com rigor científico.
No que se refere aos estudos que foram desenvolvidos recorrendo a
observações, entrevistas e questionários, foram identificados 29 artigos dessa
subcategoria, 16 se organizaram por meio de autoria individual e 13 com autoria
coletiva.
Partindo desses dados, nos artigos escritos apenas por um autor, foram
identificadas as seguintes titulações: 4 doutores, 3 doutorandos, 6 mestres, 1
mestrando, 1 especialista e 1 graduado. Quanto aos artigos compostos por dois ou
119
mais autores, observou-se a seguinte organização: 15 doutores, 2 doutorandos, 7
mestres, 7 especialistas, 1 graduado, 3 acadêmicos e 4 autores cuja titulação não foi
identificada nem no artigo nem no currículo no formato da Plataforma Lattes.
Reunindo o quantitativo de autores e suas respectivas titulações, tanto de
autoria individual quanto coletiva, apareceram: 19 doutores, 5 doutorandos, 13
mestres, 1 mestrando, 8 especialistas, 2 graduados, 3 acadêmicos e 4 autores cuja
titulação não foi possível identificar. Essa distribuição pode ser visualizada no gráfico
que segue:
Gráfico 11 - Titulação encontrada nos artigos que realizaram observações, entrevistas
e aplicaram questionários na escola
Foi observado no gráfico a prevalência de doutores (35%) nas publicações da
RBCE, em estudos que se valeram de técnicas de pesquisa, como observação,
entrevistas e questionários para desenvolverem suas pesquisas na escola. Essa
titulação é seguida por mestres (24%) e especialistas (14%). Um dado importante na
categoria arte de produzir dados, por meio desses recursos, é o fato de acadêmicos
(5%), ou seja, alunos em formação inicial, fazerem-se mais presentes como autores
da RBCE do que professores graduados (4%) e mestrandos (2%).
No que se refere à origem das pesquisas, isto é, sua ligação com o sistema
de pós-graduação, foi identificado que, dos 29 artigos que compõem essa categoria,
2 foram produzidos a partir de monografias de especialização, 10 eram oriundos de
dissertações de mestrado, 3 eram parte de teses de doutorado e a maioria, ou seja,
14, não indicaram sua origem.
120
Ainda no que se refere à metodologia empreendida pelos artigos, ressalta-se
a importância de outro elemento na discussão sobre a pós-graduação, a saber, a
procedência territorial desses estudos, para que possa ser identificado de qual
Estado partiram e, consequentemente, de qual região do País, inferindo de onde
provém a maior parte da produção científica. Foi detectada, então, a presença dos
seguintes Estados: São Paulo/SP (6), Rio Grande do Sul/RS (7), Santa Catarina/SC
(5), Paraná/PR (4), Rio de Janeiro/RJ (4), Pernambuco/PE (2) e Espírito Santo/ES
(1). Essa distribuição pode ser visualizada melhor no gráfico que segue:
Gráfico 12 – Procedência, por Estados, de artigos que realizaram observações,
entrevistas e aplicaram questionários
Nesse gráfico, é possível perceber uma predominância de artigos da Região
Sul, com 16 dos 29 estudos realizados. A Região Sudeste aparece em seguida, com
11 trabalhos, e a Região Nordeste com 2. Na categoria arte de produzir dados por
meio de observações, entrevistas e questionários, observou-se que a Região Sul
passa à frente da Região Sudeste que, até então, concentrava a maior parte dos
artigos publicados na RBCE sobre Educação Física escolar, nos termos objetivados
por este estudo. Quanto à Região Nordeste, esta continua com uma quantidade
ínfima de artigos, haja vista sua produção da categoria anterior para esta.
No que se refere à utilização de teorias , dos 29 artigos que recorreram a
observações, entrevistas e questionários para a construção da pesquisa, em 18
(62%) não foi possível identificar, de maneira explícita, o instrumental teórico do qual
se valeram os pesquisadores ao explorarem a escola. Foi necessário recorrer aos
121
indícios presentes na escritura do artigo, como os objetivos propostos e os autores
de referência mobilizados pelos pesquisadores. Dessa forma, foram identificadas
algumas teorias que dão suporte aos estudos. São elas: “teoria construtivista”,
“teoria da aprendizagem motora”, “teoria crítica”, “antropologia interpretativa”, “teoria
do movimento humano”, “história das disciplinas escolares”, “teoria pós-crítica do
currículo”, “teoria do desenvolvimento humano” e “teoria das representações
sociais”.
Quanto aos 11 artigos restantes (38%), identificou-se explicitamente, o
suporte teórico mobilizado pelos autores, uma vez que eles fizeram essa indicação,
aparecendo, então, as seguintes denominações: teoria do desenvolvimento humano,
teoria das representações sociais, proposta crítico-superadora, método dialético
hermenêutico, análise cultural, perspectiva pós-estruturalista, teoria do gênero,
pressupostos da educação e fenomenologia. Algumas dessas indicações de
referencial teórico parecem equivocadas, visto que demonstram se apropriar de uma
teoria que não chega de fato a sê-lo, configurando-se mais como uma abordagem
metodológica.
3.2.2.2 Pesquisas com a prática pedagógica
Para além das técnicas de pesquisa, como observação, entrevista e
questionário, recrutadas em alguns trabalhos desenvolvidos em escolas, foi
identificada outra forma de atuação nesses espaços, também classificada na
categoria arte de produzir dados, denominada de pesquisas com a prática
pedagógica.
Esse âmbito de pesquisa parte do entendimento de que o olhar para o
contexto escolar deve se dar a partir das possibilidades que esse espaço pode vir a
produzir, no que se refere às práticas que vão se configurando com a escola nas
aulas de Educação Física.
Foi possível inferir, por meio da leitura de alguns artigos da RBCE, que os
pesquisadores pretenderam desenvolver na escola propostas de ensino
comprometidas com o fazer pedagógico, mediante novas metodologias, numa
tentativa de ressignificação das práticas escolares. As investigações que se
efetivaram por meio de intervenção na prática pedagógica eram caracterizadas por
122
dar vez e voz aos praticantes da escola, às suas produções e ressignificações.
Parte-se aqui do entendimento de que essa intervenção corresponde bem ao que se
denomina de arte de produzir dados, visto que as propostas empreendidas pelos
pesquisadores-praticantes visavam à intervenção direta nas aulas de Educação
Física, de modo a ressignificar algumas práticas realizadas na escola.
É preciso esclarecer que, nesse tipo de pesquisas, os pesquisadores também
“lançavam mão” de observações, entrevistas e aplicação de questionários, mas com
a atenção voltada ao processo de ressignificação das práticas proporcionadas aos
alunos pelos professores da disciplina Educação Física.
Dessa forma, observou-se que houve um avanço em relação às pesquisas
que se propuseram a acontecer na escola por meio das técnicas de pesquisa para
aquelas que, intervindo diretamente nas aulas, provocaram mudanças, adaptações,
reformulações. Sobre esse aspecto, Locatelli (2007, p. 79) afirma:
O âmbito de pesquisas da prática pedagógica permite-nos uma compreensão sobre como se faz necessário aproximar-se das ações dos [praticantes] realizadas no contexto escolar para podermos fundamentar melhor as discussões acerca das possibilidades de superação de problemas enfrentados no processo educativo. Indica, portanto, que no cerne das práticas educativas encontram-se soluções diversas e variadas para os diversos e variados problemas levantados na área educacional, assim como, aspectos culturais, que ali se manifestam de múltiplas maneiras que nos possibilitam uma melhor compreensão da forma como são possíveis estas práticas se organizarem e produzirem suas relações e saberes.
Esse é o entendimento assumido por este estudo, ou seja, da prática
pedagógica emergem os problemas que, por sua vez problematizados, podem
produzir soluções para a própria disciplina Educação Física Escolar. Bossle e Molina
Neto (2009) enfatizam que os saberes e práticas oriundos de problematizações
sobre o próprio contexto e das situações de conflito são iniciativas poderosas na
construção de aprendizagens na Educação Física nas escolas.
Com relação aos achados, foi possível mapear, quanto ao número de
artigos contemplados por pesquisas com a prática pedagógica, que estas
apareceram 19 vezes: 10 na década de 1990 e 9 na década de 2000. Em 1980, não
foi localizado nenhum artigo com características de pesquisa com a prática
pedagógica, uma vez que nessa época se priorizava um outro viés de práticas de
pesquisa. Assim, o estudo da prática pedagógica ganha força na década de 1990,
123
como pode ser percebido pelo número de artigos com essas características que
começam a circular nesse período.
Desses 19 artigos, 18 se materializam por meio de pesquisa-ação, visto que
esse tipo de pesquisa reforça a ideia de assumir a prática pedagógica dos
professores de Educação Física como objeto de análise, legitimando uma
perspectiva que se justifica e se valida pela associação entre investigação e
intervenção, conhecimento e ação, com a participação dos pesquisadores-
praticantes, que, nesse tipo de pesquisa, são os próprios professores da disciplina
responsáveis pelo planejamento, execução e avaliação dos processos de pesquisa.
Sobre esse tipo de pesquisa, André (1995) diz que envolve um plano de ação
baseado em objetivos, num processo de acompanhamento dessa ação planejada e
no relato do processo.
Além da pesquisa-ação, encontrou-se um artigo que privilegiava a pesquisa
exploratória. Contudo, foi preciso recorrer aos indícios para identificar esses tipos de
pesquisa, visto que a maioria não trazia essa informação. Dessa forma, foi possível
identificar que 7 artigos assumiram explicitamente que recorriam à pesquisa-ação,
ao passo que 12 não explicitaram. Contudo, pela metodologia e procedimentos
descritos, com referência a esses 12, foi possível concluir que 11 recorreram à
pesquisa-ação e 1, à pesquisa exploratória.
Somando os artigos que indicaram a natureza da pesquisa com aqueles que
não o fizeram, foram localizados 18 artigos caracterizados como pesquisa-ação e 1
como pesquisa exploratória, totalizando 19 artigos. Entendendo ser importante
anunciar quem são os autores/pesquisadores-praticantes que têm assumido a opção
por empreender pesquisas que estudem a escola sob a perspectiva da prática
pedagógica, é que se apresenta a tabela que segue:
124
Tabela 4 – Indicação dos autores que realizaram intervenção na prática pedagógica
NATUREZA DA PESQUISA COM A
PRÁTICA PEDAGÓGICA AUTORES/PESQUISADORES-PRATICANTES
Pesquisa-ação
CARRARO (1992), HILDEBRANDT; OLIVEIRA (1994), TAVARES (1995), AYOUB (1999), CASTRO JUNIOR; ABIB (1999), FRATTI, (1999), VENTORIM (1999), SAMPAIO; LIÀO JUNIOR (1999), MENDONÇA (1999), DEVIDE; RIZZUTI (2001), SILVEIRA; PINTO (2001), BRACHT, et al (2002), CASTRO JUNIOR; SANT’ANNA SOBRINHO (2002), OLIVEIRA; PIRES (2005), BATISTA; BETTI (2005), MEDEIROS (2007), FREIRE; FEIJÓ (2008), MENDES; PIRES (2009).
Pesquisa-exploratória CAMARGO; AMARAL; PALAFOX (1999)
Dada a quantidade expressiva de trabalhos desenvolvidos com base na
pesquisa-ação, é importante trazer elementos que contribuam para sua
compreensão. Esse tipo de pesquisa é definido por Thiollent (2008) como: PAG
[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.
Nessas pesquisas, o pesquisador, normalmente, é o próprio professor da
disciplina de Educação Física que propõe aos alunos, de forma coletiva, novas
práticas ou mesmo práticas ressignificadas que vão sendo incorporadas às práticas
escolares dos alunos.
Quanto ao sistema de ensino privilegiado pelos artigos cujos autores
desenvolveram pesquisas diretamente relacionadas com a prática pedagógica, foi
verificada, mais uma vez, a preferência por escolas públicas, com 12 das 19
pesquisas desenvolvidas nesses espaços. Foram localizados ainda 3 estudos em
escolas da rede privada, 1 estudo que utiliza ambos os sistemas de ensino e 3 que
não indicam o tipo de escola privilegiado, conforme o gráfico que segue:
125
Gráfico 13 - Distribuição dos artigos que realizaram pesquisa com a prática
pedagógica por sistemas de ensino
Assim se configura a distribuição dos sistemas de ensino que a perspectiva
de intervenção na prática pedagógica privilegia. Ressalta-se o aumento de estudos
que foram realizados em escolas do sistema privado, representando 16% dos 19
artigos que realizaram pesquisas com essa perspectiva na RBCE, do total de 67
trabalhos.
No tocante aos estudos que explicitaram os níveis de ensino enfocados, a
educação infantil e o ensino médio não foram contemplados; o ensino fundamental
foi alvo de 13 pesquisas; 1 artigo envolveu mais de um nível de ensino; e 5 não
fizeram indicação explícita do nível de ensino privilegiado. Entretanto, os vestígios
deixados pela escrita desses últimos levam a crer que, desses 5 artigos, 1
corresponde ao ensino infantil, 1 ao ensino fundamental e, nos outros 3, não foi
possível identificar dados suficientes que permitissem fazer essas afirmações.
Por fim, os níveis de ensino ficaram assim distribuídos: 1(5%) artigo com foco
na educação infantil; 14 (74%) voltados para o ensino fundamental; nenhum artigo
para o ensino médio; 1(5%) para mais de um nível de ensino; e 3 (16%) em que não
foi possível identificar o nível de ensino. Esses números estão representados no
gráfico que segue:
126
Gráfico 14 - Distribuição dos artigos que realizaram pesquisas com a prática
pedagógica por níveis de ensino
Nesse gráfico, foi observada a forte presença de estudos voltados para o
ensino fundamental, tal qual já foi identificado, concentrando sua atenção,
especialmente, às primeiras séries desse nível de ensino.
Quanto à composição da autoria dos 19 artigos da subcategoria pesquisas
com a prática pedagógica, foi possível identificar autorias individuais em 7 artigos e
autorias coletivas em 12. Buscou-se, então, chamar a atenção para a interligação
entre os pressupostos da ciência e o nível de formação em que se encontram os
autores/pesquisadores que escreveram para a revista, de modo que sua titulação
tem influência significativa sobre a qualidade teórico-metodológica dessas
pesquisas.
Nesse contexto, os autores dos artigos apresentaram, à época da realização
dos estudos, as seguintes titulações com relação à autoria individual: um doutor, três
mestres, um mestrando, dois especialistas. Quanto aos artigos de autoria coletiva
foram identificados: cinco doutores, dois doutorandos, sete mestres, dois
mestrandos, quatro especialistas, três graduados, dois acadêmicos e dois autores
cujos registros não constam na Plataforma Lattes. Analisando de forma conjunta
esses dados, tanto de autoria individual quanto coletiva, apresenta-se o seguinte
quantitativo: seis doutores, dois doutorandos, dez mestres, três mestrandos, seis
especialistas, três graduados, dois acadêmicos e dois autores cuja titulação não foi
possível identificar. O gráfico a seguir representa esses dados:
127
Gráfico 15 - Titulação encontrada nos artigos que realizaram pesquisas com a prática
pedagógica
Nesse gráfico, é perceptível um aumento do número de mestres (29%)
publicando suas pesquisas na RBCE e, por sua vez, uma redução dos doutores
(17%), quando comparados com a subcategoria Observações, entrevistas e
questionários. Chama a atenção a inversão na lógica de produção compatível com o
nível de formação, ou seja, da titulação do pesquisador, visto que os doutorandos
(6%) publicaram consideravelmente menos que os mestres, e os mestrandos
publicaram o equivalente à metade dos especialistas. Ressalta-se, ainda, que os
doutorandos aparecem como autores o mesmo número de vezes que os
acadêmicos na revista, equivalendo ambos a 6%. A investigação da ligação dos 19
artigos que realizaram pesquisas na escola com o sistema de pós-graduação
revelou que 2 eram oriundos de monografias de especialização, 5 eram parte de
dissertações de mestrado, 1 de tese de doutorado e 11 não indicaram a origem.
Além da titulação, outro elemento que possui estreita relação com o sistema
de pós-graduação é a procedência territorial dos artigos selecionados nessa
subcategoria, ou seja, em qual Estado é produzido o estudo e, consequentemente,
qual a região do País que mais tem produção científica. Foi possível inferir que os
Estados que se fizeram presentes foram: São Paulo/SP (4), Minas Gerais/MG (4),
Santa Catarina/SC (3), Espírito Santo/ES (2), Bahia/BA (2), Rio de Janeiro/RJ (1),
Paraná/PR (1), Pernambuco/PE (1) e o Distrito Federal/DF (1). Esses dados estão
expressos no gráfico que segue:
128
Gráfico 16 - Predominância, por Estados, de artigos que realizaram intervenção com a
prática pedagógica
É possível perceber que a Região Sudeste assume a liderança na produção
de artigos, concentrando 11 dos 19 artigos que compõem essa subcategoria. Na
sequência, está a Região Sul que totaliza 4 artigos, seguida pela Região Nordeste
com 3 e pela Região Centro-Oeste, que apareceu com 1 artigo.
Outro aspecto importante de ser observado se refere às teorias assumidas
pelos autores dos artigos para empreender a fundamentação da discussão. Foi
observado que a grande maioria indicou, explicitamente, o suporte teórico, fato
identificado em 14 das 19 pesquisas, ao passo que apenas 5 não fizeram essa
indicação de maneira direta no artigo.
Foi possível notar, então, uma inversão em relação à prática de indicação de
teoria dos artigos classificados na categoria arte de coletar de dados ou mesmo na
categoria arte de produzir dados − na subcategoria observações, entrevistas e
questionários −, uma vez que estas vinham apresentando maior concentração de
artigos que não tinham por hábito identificar formalmente a teoria de suporte do
estudo. No entanto, deve-se reconhecer que, mesmo os autores não anunciando a
teoria por eles mobilizada, ela se fazia presente imbricada no discurso empregado
pelos articulistas.
A seguir são listadas as teorias mobilizadas nos artigos e que foram
explicitadas em sua escritura, da forma como foram anunciadas: materialismo
histórico-dialético; aulas abertas; teoria da aprendizagem crítico-social; teoria crítica;
teoria pedagógica de Paulo Freire; proposta crítico-superadora do Coletivo de
129
Autores; teoria das representações sociais; perspectiva crítica de Paulo Freire e de
Vygotsky; filosofia benjaminiana; metodologia compreensiva de Ferrés;56 ideias de
Habermas, teoria das mediações e fenomenologia.
Por outro lado, nos artigos que não explicitaram suas teorias a priori, foi
possível identificá-las por meio de vestígios, principalmente nas referências
utilizadas ao longo da escritura dos trabalhos ou no item referências bibliográficas.
Desse modo, foram identificadas as seguintes bases teóricas: teoria crítica, teoria
crítica do currículo, teoria pedagógica de Paulo Freire, pedagogia crítico-social dos
conteúdos, teoria do jogo, e teoria do movimento humano.
Assim, foram apresentados os dados referentes às diversas manifestações de
práticas de pesquisa empreendidas pelos autores da RBCE ao longo das três
últimas décadas, no que diz respeito ao espaço escolar e seus praticantes. No
capítulo seguinte, faz-se o cotejamento dessas informações, de modo que os
fazeres-saberes científicos anunciados nos artigos categorizados como arte de
coletar dados e arte de produzir dados sejam analisados como artes de fazer ciência
no campo da Educação Física.
56 Ferrés (1996), por intermédio de uma “metodologia compreensiva”, propõe a educação no meio e com o meio. Para esse autor, educar com o meio significa utilizar as mídias como parte do processo pedagógico, como uma ferramenta que facilita a dinâmica de ensino e aprendizagem. Assim, “[...] um método que objetive a educação no meio e com o meio deve possibilitar a integração da experiência que as mídias provocam, e ‘chegar à reflexão por meio da emoção’” (FERRÉS, 1996, p. 99).
130
CAPÍTULO 4
4 TIPOLOGIA DE CIÊNCIA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: AS ARTES DE FAZER E SUAS RELAÇÕES
O objetivo, neste capítulo, foi analisar os achados que se referem à Educação
Física Escolar na RBCE, partindo das artes de fazer ciência identificadas nos 67
artigos realizados na perspectiva denominada aqui de pesquisas com a escola, ou
seja, aquelas que foram desenvolvidas nesse espaço, mas com distintas maneiras
de atuação.
Buscou-se, então, relacionar esses achados, demonstrando seus processos
de continuidades e descontinuidades, suas aproximações e diferenças,
considerando os pressupostos que os artigos categorizados como arte de coletar
dados e arte de produzir dados assumiram ao longo dos 30 anos de circulação da
revista.
Para cumprir o objetivo proposto, empreendeu-se uma exploração
verticalizada em termos de métodos e técnicas científicos aplicados aos artigos
sobre Educação Física Escolar na RBCE, visando, assim, a identificar possíveis
correntes epistemológicas e metodológicas orientadoras dos artigos e, por
conseguinte, do campo da Educação Física, dado o impacto que essa revista tem
sobre o campo. Nesse sentido, Vaz (2003, p. 119) acredita que a insistência em se
fazer a disussão epistemológica e metodológica se deve a dois motivos:
[...] a necessidade política e acadêmica de consolidação da área [...] aproximando-se ou distanciando-se das ciências humanas/sociais, aplicadas e / ou naturais [...]; e o prestígio que o tema confere aos que a ele se dedicam, que seriam os responsáveis pelo ‘firmamento’ da área, uma vez que, diz nosso imaginário acadêmico, [...],[que] a atividade de pesquisa é superior ao ensino ou à extensão [...].
Além disso, como aponta Sánchez Gamboa (2007), a preocupação com
questões teóricas, metodológicas e epistemológicas expressa a busca de uma nova
forma de fazer pesquisa, tendo em vista a superação do que o próprio autor
denomina de “colonialismo epistemológico” das ciências mães, afirmando que “A
Educação Física torna-se um campo colonizado onde são aplicados os métodos e
as teorias dessas ciências-mãe [...]” (SÁNCHEZ GAMBOA, 2007, p. 26).
Analisando os objetivos apresentados nos artigos, prestando atenção aos
vestígios, é perceptível o deslocamento de interesses de editores e autores ao longo
131
das três últimas décadas, no que se refere à produção da RBCE, fato que impactou
quanto à natureza das pesquisas que eram desenvolvidas no campo da Educação
Física, especialmente na escola, que perpassavam ora por aspectos das ciências
biológicas ora pelas ciências humanas e sociais. Esse fato pode ser conferido nas
temáticas centrais dos CONBRACEs que, a partir da década de 1990, privilegiaram
discussões de cunho epistemológico,57 revelando a preocupação do campo com a
produção de seu conhecimento, enfatizando a reflexão sobre seu fazer, suas
práticas de pesquisa e seus saberes.
Dessa forma, a área de conhecimento denominada Educação Física será, em
alguma medida, determinada por outra, cuja interface apareça com mais vigor (VAZ,
2003). Sánchez Gamboa (2007) afirma que a Educação Física funciona como
campo de passagem. O ponto de partida e de chegada são os referenciais teóricos
já constituídos das várias ciências.
Esse deslocamento provocou alterações nas perspectivas educacionais de
determinados períodos da história da Educação Física brasileira, identificado por
meio de análises dos discursos que envolviam o contexto de produção e circulação
dos artigos que, num primeiro momento, objetivaram realizar pesquisas que fossem
capazes de conferir autoridade, ou capital científico, nos termos de Bourdieu (1983),
ao campo da Educação Física, valendo-se, para tanto, do modelo das Ciências
Biológicas de pesquisa. Esse modelo sofreu oposição por parte de uma
intelectualidade partidária das Ciências Humanas, de vertente crítica que, na esteira
do debate sobre os modelos pedagógicos, enfatizou polaridades teóricas que
parecem ter conduzido as discussões na área.
Sobre essa questão, Vaz (2003, p. 120) aponta a articulação entre uma
perspectiva teórica e as vozes, por vezes, caladas dos objetos de conhecimento:
Popularizou-se, no campo da educação física, a partir do final do anos de 1980, a idéia de que era preciso criticar as pesquisas realizadas com metodologias e com objetos oriundos do que chamamos ‘ciências naturais’. Como sabemos, o conjunto de saberes que formam essas ‘ciências’ pouco ou nada têm de naturais, já que tanto seus procedimentos investigativos quanto os objetos sobre os quais se debruçam são constituídos sob determinação – marcante, mas não exclusivamente – social, cultural e histórica.
Mesmo com a contradição que encerravam essas críticas, ao desconsiderar o
contexto social, político e cultural que envolvia os objetos de pesquisas empírico- 57 Cf. Apêndice C.
132
analíticas e, também, a tarefa daqueles que são responsáveis por traduzir os dados
em discurso inteligível, mantinha-se a denominação reducionista àquelas pesquisas
vinculadas ao esporte de rendimento, à biomecânica, à antropometria ou à fisiologia
do exercício, de maneira que a compreensão era de que o “ [...] conhecimento
estava como que para ser descoberto, e não produzido” (VAZ, 2003, p. 121).
Contudo, é necessário dispensar maior cautela, quando se julgam como
reducionistas pesquisas com essas características, dada a sua importância num
determinado momento da história da Educação Física. Ressalta-se que as
denominadas “Ciências do Esporte” eram representantes e representadas sob a
forma de pesquisa empírico-analítica. Esse paradigma de ciência era fortemente
marcado na RBCE no início da década de 1980. Sobre esse tipo de estudo, Paiva
(1994, p. 111) faz uma crítica, afirmando que
As práticas da pesquisa empírico-analítica foram reduzidas a meras aferições submetidas – às vezes sem adequação – a tratamentos estatísticos. A problematização, característica comum a toda prática que se pretende realmente científica, foi reduzida a indagações triviais que uma consulta mais atenta a um bom livro didático que abordasse a questão poderia resolver. Daí redunda que o que era entendido como ‘pesquisa descritiva’ admitia – quando admitia – um baixíssimo nível de reflexão teórica e nenhum tipo de teorização.
A autora ainda estende a crítica ao conteúdo dos artigos que eram publicados
pela revista, afirmando que estes, em sua maioria, contêm
[...] referências a trabalhos de autores que estudam o mesmo problema – forma ‘científica’ de legitimar o problema como um problema importante – descrições minuciosas do material e método utilizados na pesquisa – confundindo ‘objetividade e reprodutibilidade’ da pesquisa com a superação do ‘empirismo’ em educação física. A exposição e discussão dos dados não ultrapassam ao que podemos chamar de ‘constatação’, entendida aqui no seu sentido depreciativo de óbvio. Conclusões não conclusivas apontam que mais pesquisas devem ser feitas sobre o mesmo assunto [...]. A epopéia termina com extensas bibliografias, algumas só com artigos estrangeiros, outras com várias referências a pesquisas do próprio autor, outras já incorporando os artigos publicados nas RBCEs anteriores. Quase chegam a assustar [...] (PAIVA, 1994, p. 111-112).
Esse é um exemplo de mal-entendido acerca do paradigma científico vigente,
uma vez que não foram respeitadas as características do fazer científico de uma
determinada época, que apresentava limitações, sim, mas que era a representação
possível que se tinha de práticas científicas no campo da Educação Física.
Na tentativa de compreender o progresso da ciência, Kuhn (2007, p. 13)
desenvolve o conceito de “paradigma”, definido-o como “[...] realizações científicas
133
universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e
soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”. Isso
indica que o campo da Educação Física comunga de um certo paradigma científico
durante um período de tempo até que outro paradigma, incompatível com o anterior,
seja aceito pela comunidade científica. Assim, as diferenças de comunicação e o
tipo de exercício profissional entre os praticantes das ciências naturais e sociais
levou a Kuhn a desenvolver o conceito de paradigma.
Considerando que as práticas de pesquisa empírico-analíticas foram, durante
alguns anos, o entendimento de fazer científico assumido e difundido pelo CBCE,
por meio de sua revista, parece que as críticas que sofreu fizeram parte de um
movimento denominado por Kuhn (2007, p. 125) de revolução científica, na qual “[...]
um paradigma mais antigo é total ou parcialmente substituído por um novo [...]”.
Dessa forma, as críticas que passaram a circular na área confluíam para um
processo de mudança paradigmática, isto é, reforçavam-se as representações na
comunidade científica de que a perspectiva empírico-analítica não mais dava conta
de explicar os problemas de pesquisa na área. Assim, “[...] as mudanças de
paradigma realmente levam os cientistas a ver o mundo definido por seus
compromissos de pesquisa de uma maneira diferente” (KUHN, 2007, p. 146),
confirmando, então, as revoluções científicas como uma nova visão de mundo.
Trata-se, dessa forma, não de pensar na inadequação dos paradigmas a uma
realidade, mas de sua incompatibilidade com as escolhas da comunidade científica.
Cabe, então, perguntar: como se forma essa comunidade? Responde o autor
apontando “[...] que os membros de uma comunidade científica constituem a única
audiência e os únicos juízes do trabalho dessa comunidade”(KUHN, 2007, p. 259).
Contudo, esse movimento crítico da Educação Física também foi alvo de
questionamentos sobre a validade das análises e apropriações dos referenciais
críticos de inspiração marxista mobilizados no debate da área. Em seu estudo,
também com artigos sobre a Educação Física Escolar, Moura (2009, p. 31) aponta
que:
De modo geral, os artigos analisados afirmam que o movimento crítico da educação física, no impulso de disseminar os ideais marxistas, desconsideraram a necessidade de evidências empíricas. As denúncias eram disparadas sem apoio de dados, o que permitiu muitas generalizações nos argumentos. [...] os críticos da educação física perderam de vista a especificidade da área ao direcionar o foco da argumentação na luta contra o sistema capitalista como o centro da argumentação da educação física.
134
Esse era o discurso que circulava no campo da Educação Física na década
de 1990, quando o que estava em voga era a divulgação dos ideais críticos da
sociedade, em que não havia espaço para se discutir o cotidiano das aulas e as
práticas ali desenvolvidas.
A análise que Moura (2009) faz em seu estudo corrobora os dados
encontrados nesta pesquisa quanto a alguns artigos publicados pela RBCE que
foram desenvolvidos numa perspectiva sobre a Educação Física escolar, que
atentavam para temas, como a função socializadora do esporte, a legislação e
organização escolar, ou mesmo alguns artigos que foram desenvolvidos na
perspectiva com a escola, mas que priorizavam análises quantitativas e estatísticas
de dados coletados em escolares. Mas, se, por um lado, essa produção revela
lacunas e fragilidades, por outro, representa o produto de intenções e interesses de
um momento histórico.
Entretanto, quando se percebeu que esse movimento crítico não dava mais
conta de responder aos anseios da área, tornando-se repetitivo e sem renovação,
ganha força um movimento em torno de novas concepções, abordagens e
tendências capazes de fornecer parâmetros norteadores para a Educação Física
Escolar.
É possível perceber, pela escritura dos artigos, o crescente interesse por
investigações que abordavam o funcionamento dessa disciplina, interagindo com os
praticantes desse espaço, valendo-se de técnicas de pesquisa para obtenção de
dados que refletissem aquela realidade.
Esse movimento tomou novos rumos por intermédio de alguns pesquisadores
no que se refere à necessidade de mudanças no ensino da Educação Física, com
reorientação de suas práticas, aproximando-se do “como fazer” para que essas
mudanças ocorressem por meio de pesquisas com a prática pedagógica, em que
novas propostas, metodologias e formas de avaliar fossem postas em prática no
cotidiano escolar.
Ao longo dos 30 anos da RBCE, esse processo de mudanças no foco das
pesquisas se deu cercado por lutas na busca por ser a voz autorizada no campo da
Educação Física, colocando em evidência usos diferenciados de práticas
empreendidas. No que se refere a essas práticas de pesquisa, denominadas de
artes de fazer, é possível apreender as representações do campo no que tange às
concepções de ciência existentes na Educação Física, que circulam na produção da
135
revista, atentando para o que se diz e o que se faz/pratica em termos de métodos e
técnicas científicos aplicados à disciplina em questão, especialmente no espaço
escolar. Assim, percebe-se que as relações de força se davam em torno de objetos
de pesquisa, métodos e técnicas aplicados a determinados nichos da comunidade
científica.
Foi necessário, então, movimentar a discussão, questionando-se que ciência
é essa feita pelo CBCE e que é tomada como norteadora da Educação Física por
meio da RBCE? Parte-se do entendimento de que a diretriz é dada por teóricos da
área com diferentes concepções políticas, teóricas, metodológicas e epistemológicas
sobre Educação Física, que se revezam na direção nacional desse colégio, cada
qual emitindo sua posição sobre o que se pretendia por verdade científica no campo,
também conhecida como paradigma nos termos de Kuhn (2007).
Segundo Taborda de Oliveira (2005), deve-se levar em consideração que
cada gestão traz a marca de um determinado grupo de sustentação. Esse processo
se dá
[...] às vezes com mais continuidade, às vezes com menos; é fato que a direção de uma entidade como esta é dada por uma correlação de forças que com freqüência mistura ciência, ideologia, política e interesses pessoais e/ou de grupos (às vezes esses interesses são muito mais prosaicos do que disputas ideológicas, científicas ou políticas!). Nenhum problema nessa constatação, e o melhor que fazemos é reconhecer e admitir que no conflito reside também o rumo de uma área que se pretende acadêmica (TABORDA DE OLIVEIRA, 2005, p. 29).
As palavras desse autor indicam que das aparentes divergências, ou mesmo
de uma suposta crise, pode surgir uma convergência. Assim, a necessidade de
discussão quanto à concepção ou às concepções de ciência parte dos próprios
membros do CBCE, como se pode perceber na sugestão de Maria Izabel de Souza
Lopes, em carta ao CBCE, num momento de reformulação do estatuto desse órgão:
O CBCE deve discutir a concepção de ciência, sua produção e apropriação. Creio que não se trata de impor uma linha científica, visto ser um colegiado, mas que se discuta as concepções de ciência que se desenvolvem pelos membros do CBCE (COLÉGIO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 1986, apud PAIVA, 1994, p. 159).
A pluralidade de posições dos autores e editores sobre o papel político e
científico do CBCE expressa um pouco do que a área vêm tentando ser. Portanto
aqui foi levado em consideração o que vem sendo praticado em termos de
136
metodologia e epistemologia pela comunidade acadêmica, na ânsia cientificista da
Educação Física em busca de sua legitimação.
Contextualizando a área, no que se refere ao seu campo de conhecimentos e
à sua identidade epistemológica, fez-se necessário situá-la em meio ao debate que
envolve os saberes58 que a constituem. Sabe-se que a Educação Física é
circunscrita por conhecimentos advindos de outros campos do saber 59 que têm sido
mobilizados para justificar a produção da própria Educação Física, bem como sua
aplicação na prática pedagógica que pode ser considerada a extremidade do
complexo processo de constituição do campo de conhecimentos da Educação
Física, logo, de seus fazeres-saberes, bem como da produção de sua identidade,
ressaltando os desafios enfrentados na vivência cotidiana dessa disciplina na
escola.
A Educação Física vem se constituindo da tessitura desses campos do saber,
permeada por profissionais de variadas inserções no campo acadêmico, assim como
por diferentes correntes de pensamento, o que levou a área a se configurar tal qual
uma “colcha de retalhos” (LOVISOLO, 1995), caracterizando-se mais como um
campo de aplicação do conhecimento científico do que de sua produção. Isso leva a
crer que uma possível tipologia de ciência para a área da Educação Física, que
inclui métodos e técnicas científicos, também se constitua com base nessa “colcha
de retalhos”.
Considerando o fato de que essas distintas vertentes têm impacto na
produção do conhecimento na área da Educação Física e, de forma acentuada, na
prática dos professores na escola, é que se justifica a busca pela concepção de
ciência expressa na RBCE, que supostamente representa o pensamento da área,
atentando para o que se diz e o que se faz/pratica em termos de métodos e técnicas
científicos aplicados à Educação Física Escolar.
58 Saberes apropriados das ciências-mãe, que compõem o que Sánchez Gamboa (2007) denomina de “colonialismo epistemológico”. 59 Deve-se reconhecer que a hipótese de que uma Teoria da Educação Física brasileira, constituída no século XX, é resultante de incorporações sistemáticas de conhecimentos oriundos das Ciências Biológicas, Humanas e Sociais. Essa hipótese já estava posta na década de 1940, com os estudos do professor Inezil Penna Marinho (1944), em que o autor defendia a criação de um novo método de Educação Física que repousasse sobre as mesmas bases que fundamentam a educação. Diferentemente dos conceitos anatomofisiológicos em que se baseia o “Método Francês”, dominante até então, passa a existir o “Método Nacional de Educação Física”, cujas bases científicas se apoiam no moderno conceito biossócio e psicofilosófico da Educação Física. Dessa forma, o autor advoga uma abordagem da Educação Física por meio da Biologia, da Sociologia, da Psicologia, da Pedagogia, da História e da Filosofia.
137
Desse modo, atribui-se à ciência uma tarefa árdua que Ferreira Neto (1999, p.
239) resume quando reflete “[...] sobre o que e o como a ciência pode possibilitar que
esse componente curricular obtenha a tão desejada legitimidade pedagógica no
interior da escola”. Cabe lembrar que o discurso de legitimação da área
desconsiderou os fazeres-saberes da ação pedagógica dos professores, por não os
conhecerem como válidos, visto que seriam destituídos dos princípios científicos
necessários à ótica da ciência e, também, aqueles que desejavam legitimar o
discurso apenas pelo viés acadêmico.
Entretanto, deve-se ressaltar que a legitimidade da área pode ser construída,
também, por meio desses fazeres-saberes que conformam a prática pedagógica, o
que levaria a área a caminhar a contrapelo60 do que a tradição exortava a fazer,
quando valorizava (e ainda valoriza) apenas o discurso teórico, embasado
cientificamente e, portanto, reconhecido pela comunidade acadêmica. O
entendimento aqui é que as práticas antecedem os saberes científicos.
Nesse contexto, Nóbrega et al. (2003, p. 184), ao pensar sobre o
conhecimento produzido, ressaltam a necessidade de refletirmos para além do que
já está posto, ou seja, do conhecimento que já foi produzido, mas
[...] sobre as condições dessa produção [...]. O mapa do conhecimento produzido apresenta-se como subsídio para percorrermos novas trilhas investigativas sobre o nosso próprio fazer, sobre a configuração dos saberes e das práticas da educação física.
Enfatizando as práticas de pesquisa, é que os 67 artigos, cujas pesquisas
foram desenvolvidas na escola, foram analisados valorizando tanto aqueles que
tiveram como base métodos e técnicas amparados por um discurso científico
caracterizado pela realização de medições e testes físicos em escolares (utilizando-
os como amostras em seus experimentos, sendo essa perspectiva muito próxima
aos estudos da Medicina), quanto os artigos que, numa vertente diferenciada,
buscavam respostas para seus questionamentos, aproximando-se da prática
pedagógica e, em alguns casos, intervindo de modo a propor novas metodologias de
ensino para a disciplina Educação Física Escolar, com base, talvez, no
60 Esse termo vem da expressão escovar a tradição a contrapelo, utilizada por Walter Benjamin (1892-1940), filósofo alemão da Escola de Frankfurt, em suas fragmentárias teses Sobre o Conceito de História.
138
entendimento de que essa intervenção fosse capaz de promover transformações
importantes na condução dessa disciplina na escola.
Sobre essa última atuação, ou seja, a intervenção, chama-se a atenção para
o argumento que move este estudo, qual seja, os escassos investimentos por parte
do CBCE e, consequentemente, da RBCE, em estudos de natureza empírica.
Percebe-se, pelos achados, que a produção do campo da Educação Física
distanciou-se do cotidiano da escola em seu aspecto de intervenção, atendo-se, na
maioria das vezes, a operar análises sobre esse cotidiano.
Se compararmos o número de pesquisas publicadas pela revista em 30 anos
de circulação, total que corresponde a 80261 artigos, com o número de pesquisas
que abordaram a Educação Física Escolar, ou seja, 14362 e, mais especificamente a
prática pedagógica com a realização de intervenção nas aulas, chega-se a 19
artigos.
É visível que esse quantitativo cai drasticamente, fato que fortalece o
argumento de que autores e editores que constituíram a revista parecem
desconsiderar os questionamentos e dificuldades daqueles que vivenciaram, e ainda
vivenciam, a prática pedagógica cotidianamente. Ressalta-se que isso era feito em
prol de análises que ensejavam fomentar temas, como a luta de classes, a
alienação, o sistema capitalista, a influência da mídia, a legislação, os estereótipos
masculino e feminino, a cidadania e outras denúncias anunciadas.
Contudo, essa relação de temas abordados pela revista não parece fazer
parte dos anseios dos professores que atuavam e atuam na escola. Então ficam as
indagações: será que, realmente, os professores estavam preocupados com
questões relativas a esses temas? Ajudariam a solucionar os problemas concretos
da realidade complexa das aulas de Educação Física? Poderiam contribuir para
acrescentar algum elemento ao ferramental pedagógico de que dispõem os
professores? A análise dos 19 artigos desenvolvidos nas aulas de Educação Física
parece indicar que não!
61 Foram contabilizados os artigos publicados do exemplar v. 1, n. 1, de setembro de 1979, ao exemplar v. 31, n. 1, de setembro de 2009. Cf. Apêndice A. 62 Chegou-se a esse número aplicando os critérios de seleção determinados por esta pesquisa, que buscava, inicialmente, artigos que apresentavam, no título, resumo e/ou nas palavras-chave, as palavras escola, escolar, escolares, escolarização e colegiais, sendo o estudo direcionado à escola básica. Em seguida, foram separados aqueles nos quais se identificou o objetivo de desenvolver uma análise sobre a Educação Física escolar.
139
Mediante essa contextualização envolvendo os artigos selecionados na RBCE
que realizaram pesquisas na perspectiva com a escola, passou-se, de fato, aos
elementos que permitiram realizar a caracterização desses artigos num primeiro
momento, e sua análise, posteriormente.
Assim, colocando à parte os temas em voga na revista, foi empreendida a
análise desses elementos tão importantes quanto as temáticas para o campo
científico, conforme a seguinte sequência: número de artigos e sua distribuição nas
três últimas décadas; natureza da pesquisa empreendida; sistemas e níveis de
ensino privilegiados; composição da autoria, titulação dos autores, procedência
territorial dos estudos e a relação com a pós-graduação; e o uso de teorias.
Esses elementos foram aqui relacionados com base nos achados referentes
às categorias arte de coletar dados e arte de produzir dados, de modo que foram
destacados suas proximidades e distanciamentos, contribuindo, assim, para o
entendimento das artes de fazer ciência da RBCE no campo da Educação Física.
Contudo, a análise do último elemento, referente ao uso de teorias, foi
empreendida no capítulo seguinte. Essa opção se deu mediante o entendimento de
que a análise teórica requereria uma discussão em separado por considerar a
complexidade que tal aspecto requer, especialmente para a compreensão das
práticas de pesquisa empreendidas no campo da Educação Física. Dito isso, passa-
se aos aspectos que foram analisados neste capítulo.
4.1 NÚMERO DE ARTIGOS E SUA DISTRIBUIÇÃO: 1980, 1990, 2000
Para este momento, pretende-se apresentar o número de artigos localizados
nas categorias arte de coletar dados e arte de produzir dados, vislumbrando com
isso identificar, nas três últimas décadas, ou seja, 1980, 1990 e 2000, a recorrência
de estudos com essas características. Do total de 67 artigos que tiveram suas
pesquisas realizadas sob a perspectiva denominada aqui de com a escola,
objetivou-se traçar um panorama de sua distribuição pelos 30 anos da RBCE, que
corresponde ao recorte temporal citado.
No que se refere à categoria arte de coletar dados, foram encontrados 19
artigos (29%) assim distribuídos: 12 na década de 1980, em 1990 foram
identificados 5, e 2 nos anos 2000. Quanto às pesquisas da categoria arte de
140
produzir dados por meio de observações, entrevistas e questionários, aparecem 29
artigos, representando 42% do total, cuja circulação na RBCE se dá da seguinte
forma: 4 em 1980, em 1990 foram 14, e 11 nos anos 2000. Ainda nessa última
categoria, foram identificados aqueles artigos que buscaram produzir dados por
meio de intervenção na prática pedagógica contabilizando, também, 19 artigos
(29%), assim concentrados: 10 na década de 1990, e 9 na década de 2000, não
sendo encontrado nenhum artigo na década de 1980.
A exposição do número de artigos que desenvolveram suas pesquisas na
perspectiva com a escola, ao longo das três últimas décadas, permitiu relacionar as
características de sua produção com o pensamento científico predominante no
campo da Educação Física, pensamento também conhecido como paradigma, nos
termos de Kuhn (2007), que se manifestou em momentos bem demarcados
temporalmente.
Assim, é possível inferir que, em inícios da década de 1980, a revista
privilegiava temáticas e práticas de pesquisa de cunho médico-biológico, valendo-se,
principalmente, de pesquisas cuja tradição em termos científicos era realizar a coleta
de dados, visando a obter de suas “amostras” de escolares informações que
pudessem ser analisadas estatisticamente, traçando um perfil. Observando as
décadas seguintes, nota-se uma redução no número de artigos que se valeram da
arte de coletar dados, talvez pelo fato de, nas décadas de 1990 e 2000, a atenção
estar voltada a outras temáticas e a outros fazeres científicos.
Quanto à categoria arte de produzir dados, especialmente por meio de
técnicas de pesquisa, como observações, entrevistas e questionários, localizou-se o
maior número de artigos selecionados, ou seja, 29, o que representa 42% dos 67
artigos que tiveram seus estudos desenvolvidos na escola. Os dados dessa
categoria apontam que houve um deslocamento do quantitativo mais expressivo de
artigos que estudaram a Educação Física Escolar na revista, da década de 1980
para a década de 1990, visto que foram encontrados 4 e 14 artigos,
respectivamente, nessas décadas, de modo que se observa um salto numérico de
um período para o outro.
Esse fato pode ser explicado com base na mudança das temáticas
privilegiadas pela RBCE que, já em fins da década de 1980, não priorizava estudos
com medições e aplicação de testes físicos em escolares, mas temas voltados a
aspectos comportamentais dos praticantes da escola, antes entendidos apenas
141
como os escolares, passando a envolver professores, corpo pedagógico, diretores,
enfim, todos aqueles que vivenciam aquele espaço.
No que se refere à produção de dados por meio de intervenção na prática
pedagógica das aulas de Educação Física, foram localizados, também, 19 artigos
que representam 29% do total de estudos realizados no espaço escolar. Sob essa
perspectiva, não foi identificado nenhum estudo nos anos de 1980. Foram
localizados apenas 10 artigos nas décadas de 1990, e 9 artigos em 2000, visto que
foi nesse período que pesquisas com caráter de intervenção ganharam força,
vislumbrando com isso promover transformações na disciplina Educação Física, no
que se refere às metodologias de ensino empregadas nas aulas em suas mais
diversas possibilidades, com base na criação de novas ações pedagógicas.
Pelo que foi exposto, pode-se inferir que o quantitativo mais expressivo de
artigos foi localizado na categoria arte de produzir dados, que se valeu de
observações, entrevistas e questionários, técnicas essas mobilizadas pelos
pesquisadores-praticantes, visando à sua inserção na escola, para, assim, junto aos
praticantes desse espaço, produzirem os dados por meio de sentidos atentos e
treinados e questionamentos interessados e direcionados àqueles que pudessem
contribuir com a pesquisa.
Contabilizando o quantitativo de artigos por década (incluindo as duas
categorias e subcategorias), tem-se 16 em 1980, em 1990 foram 29, e 22 nos anos
2000. Essa maior concentração de artigos em 1990 pode ser explicada devido a
uma mudança de paradigma em termos de práticas de pesquisa que se passou a
empreender no campo da Educação Física. Ou seja, as pesquisas cujo foco de
investigação era a escola e seus praticantes ganharam força nessa década, daí o
quantitativo mais expressivo. Destaca-se, então, que a pesquisa em Educação
Física encontra várias possibilidades metodológicas e epistemológicas. Duas delas
são a pesquisa denominada de quantitativa e a outra de qualitativa.
No caso da década de 1980, o esforço da comunidade científica era de
superar a relativa hegemonia dos modelos quantitativos de pesquisa, apostando,
para isso, em modelos qualitativos, mormente em fins dessa década. Assim, a
escolha por um ou outro paradigma deveria ser compreendida
[...] na sua relação com os outros níveis de articulação da pesquisa científica. [Os modelos de pesquisa] devem estar articulados com os métodos, os referenciais teóricos, as abordagens epistemológicas e os
142
pressupostos filosóficos nos quais se fundamentam as pesquisas (SÁNCHEZ GAMBOA, 2007, p. 86).
Com isso, esse autor aponta para um falso dualismo entre os modelos
quantitativos e qualitativos de pesquisa, indicando por sua inter-relação. Contudo,
percebe-se que, nos artigos da RBCE, esteve muito presente a defesa de
determinado modelo em detrimento do outro. Essa movimentação do campo
científico em torno das práticas de pesquisa foi bem demarcada ao longo das três
últimas décadas.
4.2 NATUREZA DAS PESQUISAS
Como a pesquisa é uma forma de registrar o universo de fatos que
conformam um problema determinado (CARBALLO, 2003), a sua natureza é que
define a forma como isso será feito, de modo que se pode dizer que
As diferentes formas de medir, respondem segundo o critério que até agora empregamos, a um tipo de instrumento que chamamos quantitativos, típico da tradição metodológica positivista. Outras formas de compreender a realidade estarão englobadas no conceito de instrumentos qualitativos, que pretendem captar os significados de outros sujeitos, estando mais ligados à tradição metodológica hermenêutica (CARBALLO, 2003, p. 132).
Além das pesquisas quantitativas, já bastante difundidas no campo da
Educação Física, foi constatado, a partir dos anos de 1960, um impulso aos métodos
qualitativos de pesquisa, revelando que seu reconhecimento não é mais o mesmo
de antes. “Certamente nuanças se impõem; entretanto, é possível afirmar que os
métodos qualitativos são mais conhecidos, melhor aceitos, e até mais valorizados,
do que no passado” (POUPART et al., 2008, p. 31). Na esteira dessas mudanças,
[...] a pesquisa qualitativa não se pratica segundo um modelo único, ao contrário, seus ‘praticantes’ têm recorrido a diversas técnicas ou abordagens e também demandado diferentes modelos de análise, que podem variar de acordo com as situações, os objetivos de pesquisa, ou ainda, a posição epistemológica dos pesquisadores (POUPART et al., 2008, p. 33).
Isso é comprovado quando se observa a maior recorrência de pesquisas
numa perspectiva qualitativa, dentre aquelas que foram realizadas na escola.
Nesse momento da pesquisa, foi importante explicitar as diferenças entre
métodos e técnicas aplicados às investigações científicas, por se entender que são
143
fundamentais para o delineamento da pesquisa. Dessa forma, compreende-se
método como o caminho que conduz a um fim determinado, adequando-se às
exigências da pesquisa, sendo solidário ao seu suporte teórico. Além disso, “[...]
depende mais profundamente das decisões que se tomam do que dos instrumentos
ou capacidades práticas escolhidas ou empregadas” (CARBALLO, 2003, p. 131).
Nesse contexto, Nóbrega (2005) evidencia que o método é o responsável
pelo processo de objetivação do real obtido por meio do sistema de investigação, e
não o objeto. Daí a importância do método, reconhecida por Bloch (2001, p. 68, grifo
nosso) quando afirma:
Uma ciência [...] não se define apenas por seu obje to. Seus limites podem ser fixados, também, pela natureza própria de seus métodos . Resta portanto nos perguntarmos se, segundo nos aproximemos ou afastemos do momento presente, as próprias técnicas da investigação não deveriam ser tidas por essencialmente diferentes. Isto é colocar o problema da observação histórica.
Além do método, as técnicas também merecem atenção no contexto da
produção científica, visto que são procedimentos eficazes e sistematizados para
realizar a ação, selecionando as “[...] formas de intervenção e o maquinário centrais
ou acessórios, que serão empregados para a obtenção/produção de dados”
(CARBALLO, 2003, p. 132).
Esse mesmo autor ainda afirma que o fato de se decidir pelo uso de
determinadas técnicas de coleta-construção de dados é capaz de indizir a
conclusões por vezes distantes das suposições iniciais, o que leva a crer que elas
são determinantes no processo de investigação científica e são capazes de conduzir
a pesquisa por caminhos inesperados.
Segundo Sánchez Gamboa (2007), a técnica é a expressão prático-
instrumental do método, sendo esse elemento articulado ao paradigma científico
dominante. Logo, a produção científica é dependente desta articulação entre
métodos e técnicas científicos, numa confluência epistemológica, arranjo necessário
à construção da própria pesquisa.
Feita a contextualização da relação entre pesquisa, métodos e técnicas
científicos, passa-se à caracterização desses elementos nos artigos localizados nas
categorias arte de coletar dados e arte de produzir dados, que apresentaram
144
diferentes classificações63 quanto à natureza das pesquisas empreendidas na
escola, como pode ser visualizado na Tabela 2.64 A entrada nos artigos se deu
justamente por sua metodologia, especificamente pela natureza da pesquisa
desenvolvida. Procedeu-se dessa forma por se entender que os métodos e as
técnicas recrutados nos artigos, especialmente quanto à natureza da pesquisa,
deixam ver marcas, por vezes, silenciadas por autores e mesmo por um campo
científico.
Embora a indicação da natureza da pesquisa não tenha sido privilegiada pela
maioria dos estudos aqui considerados, tendo em vista que, dos 67 artigos que
realizaram pesquisas na escola, 38 omitiram esse dado, identificou-se, em todos os
casos, inclusive naqueles que citaram o tipo de pesquisa, a preocupação em
apresentar e, principalmente, descrever de forma detalhada os procedimentos e
instrumentos mobilizados para a execução do estudo, o que inclui métodos e
técnicas, em espaço reservado na RBCE denominado Materiais e Métodos.
Para empreender a análise da natureza de pesquisa que predominou nas
páginas da RBCE, optou-se por fazê-lo comparando as categorias arte de coletar
dados e arte de produzir dados, de modo que puderam ser percebidas as mudanças
dos tipos de pesquisa empreendidos nas escolas, tendo em vista o contexto
científico-cultural em que estavam inseridos os pesquisadores que desenvolveram
esses estudos.
Dessa forma, percebeu-se que, nos artigos caracterizados por um
entendimento de pesquisa aqui denominado de coleta de dados, prevaleceram
pesquisas correlacionais desenvolvidas por meio de análises quantitativas e
estatísticas em escolares, visando à correlação de variáveis somatotipológicas por
meio de aferição de medidas antropométricas e aplicação de testes físicos.
Esses dados eram comparados com valores considerados ideais e os alunos
tinham suas medidas antropométricas avaliadas tendo como parâmetro protocolos
rigorosos da área da Medicina Esportiva, além das performances físicas que eram
julgadas mediante altos níveis de rendimento. Em menor proporção, apareceram
pesquisas de tipo experimental, longitudinal e descritiva. 63 Chama-se a atenção para as classificações, pois, embora elas sejam boas para ajudar a pensar a realidade, ao serem tomadas como estruturas rígidas, podem mais atrapalhar do que facilitar o entendimento. Por isso, é preciso esclarecer que as classificações que foram empreendidas neste estudo não pretenderam engessar os tipos de pesquisa encontrados, assim como qualquer outro elemento ao longo da escritura do texto. 64 Cf. página 96.
145
Quanto aos artigos classificados na categoria arte de produzir dados, com
foco na subcategoria que realiza observações, entrevistas e questionários com os
praticantes da escola como forma de adentrar ao espaço escolar, cujas pesquisas
se concentraram na década de 1990, houve uma predominância de pesquisas do
tipo descritiva, caracterizadas por observar, registrar e analisar os fenônemos sem,
entretanto, entrar no mérito de seu conteúdo.
Assim, em pesquisas dessa natureza, o pesquisador atua na escola visando
a detectar as especificidades dessa realidade, com possíveis soluções para os
problemas identificados. Os artigos da RBCE que se valeram desse tipo de
pesquisa, em sua maioria, buscavam diagnosticar o funcionamento da prática da
Educação Física Escolar.
Tomando por base esse objetivo, os pesquisadores empreenderam distintas
maneiras de acessar a realidade escolar. Uma delas, a entrevista, constitui-se na
possibilidade de interrogar os atores e utilizá-los como recurso para a compreensão
das realidades sociais (PALMER, apud POUPART, 2008). Assim, “[...] misturar-se às
atividades cotidianas dos atores, com a ajuda da observação participante, constitui o
melhor meio de perceber suas práticas e interações, como também de interrogá-los
durante a ação” (PARK; BECKER; GEER, apud POUPART, 2008, p. 217).
Como se pode perceber na revista, é comum a utilização de mais de uma
técnica na realização da pesquisa (fato observado em 14 das 29 pesquisas dessa
subcategoria), uma vez que a interação de diferentes maneiras de praticar o espaço
escolar permite que se apreenda mais e melhor esse cotidiano. Dessa forma, na
categoria arte de produzir dados, o entrevistado, neste caso os praticantes da escola
– alunos, professores, pais – são vistos como informantes de suas práticas e de
suas maneiras de pensar, como testemunhas privilegiadas.
Quanto à observação, esta “[...] se caracteriza pela inserção do observador no
grupo estudado, segundo um procedimento de compreensão do real [...] e é a
participação ou o envolvimento do pesquisador que permite chegar à compreensão
da realidade pesquisada” (CHAUCHAT, apud JACCOUD; MAYER, 2008, p. 262).
Esse fazer científico é dado a ver nos artigos da RBCE com vistas à investigação
das práticas escolares, bem como da ação dos praticantes que habitam esse
espaço, de modo que esse fazer deve acontecer no meio pesquisado.
Ainda nessa categoria, mas no que diz respeito às pesquisas empreendidas
com a prática pedagógica, ou seja, aquelas que foram desenvolvidas numa
146
perspectiva propositiva com intervenção direta nas aulas de Educação Física, pode-
se inferir que foram privilegiadas pesquisas de tipo pesquisa-ação. Essas pesquisas
caracterizaram-se por assumir a prática pedagógica dos professores de Educação
Física como objeto de análise, legitimando uma perspectiva que se justifica e se
valida pela associação entre investigação e intervenção, conhecimento e ação com
a participação dos pesquisadores-praticantes que, nesse tipo de pesquisa, são os
próprios professores da disciplina, responsáveis pelo planejamento, execução e
avaliação dos processos de pesquisa, suscitando a produção de conhecimento que
derive da intervenção e que a provoque.
Em quantidade expressiva, na subcategoria pesquisas com a prática
pedagógica, estão os estudos denominados de pesquisa-ação que foram
encontrados em 18 dos 19 trabalhos assim classificados. Essa abordagem
metodológica apareceu nos artigos como possibilidade de ressignificação de
práticas pedagógicas e de suas distintas metodologias, mas também como
referência para a formação do pesquisador que assume posição diferenciada
daquele professor como aplicador e reprodutor de conhecimentos.
De acordo com essa abordagem metodológica, a escola é vista como
produtora de práticas sociais, de valores e de conhecimentos, numa busca
constante de soluções para seus problemas, soluções estas que emergem da
própria prática pedagógica problematizada, em última instância, ressignificada. Em
artigo da RBCE sobre o ensino do jogo como abordagem metodológica, o autor
aponta que
[...] o professor, em sua prática pedagógica, quando no ensino do jogo na escola, deve procurar caminhos para não se acomodar diante daquelas concepções retrógradas e atrasadas, e tentar lançar mão de outras concepções que o levem a busca de um ensino transformador na escola (TAVARES, v. 16, n. 2, 1995, p. 105).
Segundo Thiollent (2008, p. 18), a ideia de pesquisa-ação pressupõe “[...]
pesquisas nas quais as pessoas implicadas tenham algo a ‘dizer’ e a ‘fazer’ [...]. Com
a pesquisa-ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na
própria realidade dos fatos observados”. Em face disso, essa modalidade de
intervenção parece ter sido acionada com maior frequência nas décadas de 1990 e
2000, dadas as suas características, por possibilitar ao pesquisador vivenciar o
espaço pesquisado, bem como observar seus praticantes.
147
A constatação de que a maioria dos estudos (38) da categoria arte de
produzir dados não apresentou a natureza da pesquisa indica o pouco cuidado da
comunidade acadêmica na sua divulgação, uma vez que se denominam “pesquisas”
e não se identificam como tal.
Isso demonstra que esses estudos se desautorizam da condição de pesquisa,
quando não assumem explicitamente a opção metodológica seguida. A não
explicitação da identidade da pesquisa configura-se em forte indicador de sua
fragilidade, já que essa é uma das exigências inquestionáveis da lógica de
organização do campo científico. Sobre essa “falha” detectada no periódico,
Brandão (1994, p. 136) levanta
[...] a constatação iminente de que a área de Educação Física apesar de sua grandeza numérica institucional, ainda se constitui num campo de conhecimentos extremamente frágil, no que diz respeito, principalmente, aos seus pressupostos teóricos e científicos, mas também em relação a sua pretensa seriedade metodológica e intelectual.
Conforme Nóbrega (2005), a decisão quanto ao que é científico depende de
uma política constitutiva das ciências, considerando para tanto a produção de sua
comunidade científica e a história de sua experiência social.
No campo da Educação Física, especificamente na RBCE como uma revista
que representa parcela de sua produção, é possível identificar, assim como o fez
Brandão (1994), fragilidades metodológicas em termos de práticas científicas, como
a não explicitação da natureza da pesquisa. Esse apontamento é importante na
medida em que “O debate sobre a constituição atual da natureza científica do CBCE
passa necessariamente pelo conhecimento profundo das práticas [de pesquisa] da
RBCE e dos CONBRACEs” (FERREIRA NETO, 2005, p. 152).
Assim, os variados tipos de pesquisa que foram desenvolvidos com a escola
justificam-se, talvez, por uma maior possibilidade de captar com clareza as situações
da dinâmica escolar, fazendo parte dela. Com base, então, no pluralismo
metodológico identificado nos artigos da RBCE e anunciado por Santos (2000), têm-
se a combinação entre métodos qualitativos e quantitativos de pesquisa e,
consequentemente, o uso articulado de várias técnicas de investigação.
148
4.3 SISTEMAS E NÍVEIS DE ENSINO PRIVILEGIADOS
Apesar de as informações sobre os sistemas e níveis de ensino aparecerem
juntos, eles foram analisados separadamente, conforme achados das categorias arte
de coletar dados e arte de produzir dados.
Constatou-se que, dos 67 trabalhos que compuseram as categorias citadas,
45 foram realizados em escolas da rede pública de ensino, exclusivamente. Assim, o
número de pesquisas que se valeram do sistema público, exclusivamente, foi
superior ao das demais classificações, isto é, artigos que utilizaram somente o
sistema privado, artigos que priorizaram os sistemas público e privado,
concomitantemente, e artigos que não indicaram o sistema de ensino privilegiado,
que, juntos, somam 22 trabalhos.
Esse quantitativo está assim distribuído: nos artigos que fizeram coleta de
dados, a rede pública de ensino apareceu 14 vezes (74%) do total de 19 artigos; já
nas pesquisas que realizaram produção de dados por meio de observações,
entrevistas e questionários, a opção por escolas da rede pública foi identificada 19
vezes (65%) do total de 29 estudos identificados nessa categoria; e aqueles estudos
que fizeram intervenção na prática pedagógica optaram em fazê-lo em escolas
públicas 12 vezes (63%) em 19 trabalhos que intervieram nas aulas de Educação
Física.
Como exemplo de artigo que mencionou o sistema de ensino no item Material
e Método da revista, aparece o de Guedes (1984, p. 50) no qual foi possível
identificar a seguinte passagem “Tomaram parte deste estudo 600 escolares
devidamente matriculados na rede pública de ensino dos municípios de Londrina-PR
(300) e Santa Maria-RS (300) [...]”. Nesse estudo, o autor identificou elementos
importantes, como o número de escolares mobilizados pela pesquisa, o sistema de
ensino com o qual se trabalhou e onde estão localizadas as escolas que foram o
locus da pesquisa.
Ao contrário, considera-se importante mencionar, também, um exemplo de
artigo que não fez indicação do sistema de ensino privilegiado: “Em uma das aulas
com uma 3ª série do 1º grau, formamos 4 grupos com 8 alunos, e cada grupo
recebeu uma Revista em Quadrinhos diferente, com uma estória previamente
selecionada, que tratava do tema: futebol” (CARRARO, 1992, p. 283). Nesse
149
exemplo, a autora omitiu o contexto em que a pesquisa foi desenvolvida, quando
optou em não explicitar se a escola era pública ou privada.
Quanto à predominância de estudos em escolas públicas, foi possível inferir
que essa influência se deve à relativa facilidade de acesso do pesquisador às
escolas públicas, uma vez que, nesse tipo de instituição, é possível observar e
intervir no cotidiano escolar, acompanhando seus processos de modo mais
autônomo, ao passo que, em escolas da rede privada, essa realidade não é tão
acessível, podendo, ainda, estar vulnerável a interesses daqueles que queiram
deixar essa realidade no anonimato.
Charlot (2000) contribui para pensar a opção pelos sistemas de ensino,
quando explica sobre a leitura da realidade social que pode ser “negativa” ou
“positiva”. É possível afirmar, com base nesse autor, que é mais fácil encontrar
problemas do que elementos positivos em escolas públicas, visto que
A leitura positiva é antes de tudo uma postura epistemológica e metodológica. Praticar uma leitura positiva não é apenas, nem fundamentalmente, perceber conhecimentos adquiridos ao lado das carências, é ler de outra maneira o que é lido como falta pela leitura negativa (CHARLOT, 2000, p. 30).
Desse modo, torna-se comum as pesquisas investigarem e apontarem mais
as falhas, as carências, as deficiências das escolas e, consequentemente, de seus
praticantes, uma vez que indicar essas lacunas se constitui em prática mais fácil que
buscar compreender os processos que concorreram para que determinada situação
ocorresse na escola. Dessa forma, é possível justificar a escolha, na grande maioria
das vezes, de escolas públicas como locus para realizar as pesquisas, em
detrimento de escolas privadas, considerando-se as distintas maneiras de encarar a
realidade escolar.
Outro dado levantado foi quanto à não justificativa, por parte dos autores de
todos os artigos selecionados das duas categorias, quanto à escolha da rede de
ensino, se pública ou privada, ou mesmo ambas, para a realização do estudo. A não
justificativa para tal escolha parece ignorar determinados procedimentos exigidos em
trabalhos científicos, nos quais se espera, no mínimo, a apresentação de dados
completos. Além disso, a não divulgação da rede de ensino em alguns trabalhos
acaba por impedir que o leitor compreenda com maior profundidade o estudo, visto
que fica privado do contexto mais geral que cerca a pesquisa.
150
Como o interesse desta pesquisa é direcionado aos artigos com vistas à
intervenção na prática pedagógica das aulas de Educação Física, a indicação do
sistema de ensino privilegiado foi importante por caracterizar o espaço em que o
estudo foi desenvolvido, o que permite maior possibilidade de aprofundamento, uma
vez que leva em consideração as condições físicas e materiais da escola em
questão e, por conseguinte, os seus limites e possibilidades, quando da realização
do estudo. Batista e Betti (2005, p. 146) afirmam que “Articular o fazer corporal com
o saber sobre esse fazer exige buscar estratégias de ensino inovadoras e criativas,
mas também exeqüíveis e compatíveis com o contexto escolar concreto das escolas
brasileiras e seus alunos”.
Nesse sentido, uma caracterização prévia do ambiente a ser pesquisado atua
como elemento facilitador no momento da pesquisa, quando se considera a
realidade encontrada nas escolas públicas e privadas, cujas estratégias de ensino
poderão variar conforme a organização física e estrutural, corpo docente e discente,
horários, possíveis atividades extras, maior ou menor disponibilidade de acesso,
enfim, elementos que permitam ao pesquisador conhecer o espaço no qual atuará.
Um outro elemento a ser analisado e que tem estreita relação com o sistema
de ensino privilegiado pelos estudos se refere aos níveis de ensino escolhidos para
realizar as pesquisas em Educação Física eEscolar. Esse é um indicador importante
de ser analisado, uma vez que, mesmo de forma implícita, deixa ver/ler as marcas
de uma necessidade de estudos que aprofundem a temática escola por níveis de
ensino.
Serão apresentados, então, os níveis de ensino identificados nos artigos das
categorias arte de coletar dados e arte de produzir dados: educação infantil, ensino
fundamental e ensino médio, que, juntos, compõem a Educação Básica. Além
desses, foram identificados estudos que recorreram a mais de um nível de ensino
para desenvolver sua pesquisa, e aqueles artigos que não indicaram o nível de
ensino privilegiado, sendo necessário, portanto, ir em busca de indícios que
levassem a essa informação, por exemplo, as idades dos escolares que participaram
das pesquisas, que se encontram indicadas no texto, as quais puderam ser
comparadas com o possível nível de escolaridade desses praticantes.
Apresentados os níveis de ensino que apareceram na revista, foi possível
inferir que, dos 67 artigos classificados em com a escola, 38, ou seja, 57%, estão
concentrados no ensino fundamental, exclusivamente, com ênfase nas primeiras
151
séries, enquanto os 29 artigos restantes concentraram seus estudos na educação
infantil, no ensino médio, ou em mais de um nível de ensino, concomitantemente.
Os dados apontam, então, que o ensino fundamental foi privilegiado pelos
autores que publicaram seus trabalhos na revista, ficando assim distribuídos: 9
artigos (47%) − de um total de 19 − que fizeram estudos caracterizados como coleta
de dados; 15 artigos (52%) – de um total de 29 − que empreenderam observações,
entrevistas e questionários com os praticantes da escola; e 14 artigos (74%) – de um
total de 19 − que, efetivamente, intervieram na prática pedagógica. Como exemplo
que corrobora esses dados, localizou-se o seguinte artigo na RBCE:
A dinâmica usada na coleta de dados foi desenvolvida em três momentos com turmas de 6ª a 8ª séries do ensino fundamental do CEEB com o intuito de realizar uma sondagem sobre as representações sociais que esses alunos têm sobre a EF escolar (DEVIDE; RIZZUTI, 2001, p. 119).
A concentração significativa de estudos com interesse em aprofundar
questões concernentes a crianças em idade compatível com o ensino fundamental,
especialmente em suas primeiras séries, pode ser explicada visto ser esse um
campo profícuo para pesquisas sobre crianças em idade escolar. Os artigos
selecionados investigavam, basicamente, os valores das medidas antropométricas e
de testes físicos, além do comportamento dos alunos em frente às novas propostas
de práticas educativas, considerando o conhecimento científico sobre a criança em
seus processos de aprendizagem escolar.
Reconhece-se, então, a importância de estudar a criança e, mais que isso,
estudá-la em seu contexto, o escolar. Segundo Berto, Schneider e Ferreira Neto
(2008, p. 15), “[...] o sentimento de infância ganha impacto no século XVIII, quando a
criança passa a ser pensada como objeto de estudo e de afeto”. Cientes disso, os
autores analisaram como a infância se tornou objeto nas representações de
intelectuais de diferentes extrações nas décadas finais do século XIX e nas décadas
iniciais do século XX.
Assim, o pensamento em relação à criança é bastante explorado na primeira
metade do século XX, momento de redescoberta da criança, colocada como cerne
do sistema social, direcionando-lhe o máximo de atenção. Esse movimento foi
corroborado por intelectuais de todas as áreas (BERTO; SCHNEIDER; FERREIRA
NETO, 2008). Desse modo, os homens de ciência focavam seu olhar nas crianças, o
que fez com que a infância recebesse tratamento cada vez mais especializado e
152
diferenciado nas escolas, por meio de uma certa associação de profissionais de
distintas formações, como pedagogos, médicos, psicólogos, além dos próprios
professores, o que pode ser observado na formação dos autores dos artigos da
RBCE.
Considerando o contexto escolar em que estão inseridas as crianças, Neira
(2008) nos lembra que, nesse ambiente, elas atuam, participam, aprendem,
ensinam, inventam, criam, reproduzem e produzem cultura de maneiras diversas,
visto que a escola pode estar inserida em diferentes contextos sociais, econômicos,
políticos e religiosos que, por sua vez, configuram um grupo social específico em
que as “[...] crianças produzem cultura e são produzidas na cultura em que se
inserem e que lhes é contemporânea” (NEIRA, 2008, p. 58).
As considerações desse autor talvez expliquem a recorrência de artigos na
RBCE, especialmente na década de 1980, que visavam a comparar diferentes níveis
socioeconômicos com os valores de dobras cutâneas e com o desenvolvimento
somático e neuromotor dos escolares, como pode ser conferido nos exemplares v. 1,
n. 3, de maio de 1980 e v. 2, n. 1, de setembro de 1980. No primeiro, os autores
objetivam verificar a influência do fator socioeconômico sobre características
somáticas e funcionais de crianças pré-escolares e as consequências dessa
influência nas situações de ensino-aprendizagem. No segundo, o objetivo era
identificar a distribuição e as dimensões das dobras cutâneas em escolares da
região central e periférica da cidade de Londrina e compará-las.
Assim, os pesquisadores perceberam que estudar a criança no ambiente
escolar, tomando como pressuposto a sua condição de atores culturais em
constante produção e reconstrução, permite que se conheça mais e melhor seus
comportamentos no cotidiano das salas de aula, o das “quadras de aula”, fato que
possibilita que se elaborem práticas pedagógicas construídas e ressignificadas
mediante a participação ativa das próprias crianças.
Nessa esteira, percebeu-se a necessidade de compreender e investigar a
escola como lugar de organização e produção de uma cultura própria, específica,
peculiar. Segundo Vago (2003, p. 192, grifo nosso),
Esse procedimento procura dar atenção aos dispositivos de organização interna e às suas práticas, como por exemplo, as representações, os tempos, os espaços, os agentes escolares, os aconte cimentos e as práticas escolares . Esses dispositivos e práticas são, então, cotejados como questões relacionadas à educação física como componente curricular,
153
objetivando analisar como se vislumbram e fertilizam na sua inserção na cultura escolar.
Prestar atenção às práticas, ao que acontecia nas aulas de Educação Física
em termos de métodos e técnicas científicos, por meio dos artigos da RBCE, foi o
viés de análise escolhido para esta pesquisa, por entender que a compreensão
dessas representações veiculadas pela revista pode dizer muito sobre essa
disciplina, sua condição e sua condução no interior da escola, entendendo-as como
discursos que apreendem e estruturam o mundo (CHARTIER, 1988). Assim, as
representações produzidas e colocadas em circulação a seu respeito podem ser
uma maneira de penetrar na cultura escolar, e nela encontrar a disciplina Educação
Física, acompanhando seus movimentos.
No caso dos níveis de ensino, as representações dos autores parecem
indicar a necessidade de se voltar as atenções ao estudo de crianças no contexto
das aulas de Educação Física, especialmente nos primeiros anos que compreende o
ensino fundamental.65 Contudo, foi possível perceber, por meio dos dados
quantitativos – de 143 artigos, apenas 19 voltam suas atenções à prática
pedagógica – o distanciamento dos autores que realizaram pesquisas sobre ou com
a escola em seu principal aspecto, que é a intervenção nas aulas de Educação
Física e, mais que isso, a promoção de mudanças nesse espaço, bem como nas
maneiras de praticá-lo.
4.4 COMPOSIÇÃO DA AUTORIA, TITULAÇÃO DOS AUTORES E PROCEDÊNCIA TERRITORIAL DOS ARTIGOS: RELAÇÕES COM O SISTEMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
Para contextualizar este tópico, foi necessário iniciá-lo com a análise do
sistema de pós-graduação stricto sensu em Educação Física e seus impactos na
área, entendendo que essa discussão permite empreender a análise dos artigos
com maior clareza. Dessa forma, pretende-se explicitar o estado da arte da
produção científica, no que tange à Educação Física escolar na RBCE, e sua
possível ligação com o sistema de pós-graduação em nível de mestrado e
doutorado.
65 A classificação encontrada nos artigos quanto aos ciclos que compunham o ensino fundamental seguia a estrutura seriada do 1º ao 8º ano, divididos em quatro ciclos, conforme a Lei de Diretrizes e Bases-LDB (Lei nº 9.394/96).
154
A avaliação da produção científica das diversas áreas possibilita identificar
seu estágio de desenvolvimento, produção e impacto sobre a comunidade científica.
Por isso, tem se constituído em um dos aspectos mais importantes no processo de
avaliação dos programas de pós-graduação no País, tendo em vista que existe uma
relação entre pós-graduação e produção científica, quer pelo seu fazer científico,
quer pelo papel na formação de professores e pesquisadores. Segundo Resende e
Votre (2003), faz parte da tradição brasileira o estabelecimento de estreita relação
entre a pós-graduação stricto sensu e a produção científica.
Esse tipo de avaliação tem se tornado preocupação constante dos
pesquisadores e vários indicadores podem ser utilizados para esse fim. Entre esses,
os artigos publicados em periódicos científicos constituem um dos itens de maior
peso. Com efeito, o incremento e a qualidade da produção do conhecimento e de
técnicas e recursos de intervenção profissional na área da Educação Física devem-
se, fundamentalmente, ao surgimento dos cursos de mestrado no final da década de
1970 e de doutorado nos anos de 1980 (RESENDE; VOTRE, 2003).
Entretanto, reconhece-se que muito ainda está por se fazer quando o assunto
é o sistema de pós-graduação, especialmente nas esferas do rigor acadêmico, do
debate epistemológico e da relação teoria-prática. Sobre esses desafios, Resende e
Votre (2003. p. 51, grifo nosso) assim se posicionam:
Precisamos debater e definir critérios mais realísticos que signifiquem avanços efetivos na qualidade e quantidade da produção do conhecimento, ante o estágio de desenvolvimento da educação física. Um aspecto fundamental é que, ao contrário do que se propala, os atuais critérios não estão levando em conta, de forma satisfatória, a consciência do caráter multidisciplinar que caracteriza a tradição da formação e da intervenção acadêmica e profissional na educação física. Seus mentores não conseguem ou não querem perceber a necessidade da p rodução de conhecimentos que se utilizem das lentes teóricas d e campos como o das ciências humanas e sociais, não reconhecendo e não valorizando a tradição teórico-metodológica da produção de conh ecimento e dos meios de socialização dessas vertentes da educação física .
Esse é um assunto por demais importante que se constitui pauta de
constantes66 discussões sobre os rumos da pesquisa científica no Brasil,
constituindo-se em desafio para os programas de pós-graduação stricto sensu em
Educação Física que investem em linhas de pesquisa relacionadas com assuntos
pedagógicos e socioculturais, linhas essas que diferem em termos teórico-
66 Cf. RBCE, v. 24, n. 2, jan. 2003, cuja temática é “Pós-Graduação em Educação Física”.
155
metodológicos das pesquisas cujo foco é a natureza, o funcionamento biológico, a
geração de tecnologias e produtos materiais. Essas linhas são abarcadas,
valorizadas e reconhecidas pela posição cientificista da Capes.67
Localizada na área das ciências da saúde, conforme alocação da Capes, a
Educação Física “[...] é a única que apresenta a singular característica
multidisciplinar, que abrange temáticas de estudo e de investigação inerentes às
ciências humanas e sociais, além das ciências da saúde” (RESENDE; VOTRE, p.
64). Essa localização têm causado problemas quanto à avaliação da produção
acadêmica da Educação Física visto que são julgadas mediante parâmetros das
ciências da saúde e não das humanidades.
Esse problema tem a ver, segundo Lovisolo (2005), com a sistemática da
avaliação dos programas de pós-graduação no que tange ao seu reconhecimento,
classificação e distribuição de recursos na forma de bolsas para mestre e doutores e
manutenção de atividades.
Tendo em vista que a principal missão da pós-graduação é a capacitação do
docente-pesquisador como recurso humano qualificado para a produção de
conhecimentos relevantes e inovadores para o desenvolvimento da área (AMADIO,
(2003; KOKUBUN, 2003), o princípio geral de avaliação deveria ser realizado a partir
de objetivos específicos das áreas e dos programas e não de normas postas como
universais, independentemente de abordagem teórico-metodológica privilegiada
pelas pesquisas, assim como pensa Lovisolo (2005).
Na esteira da discussão sobre a produção científica oriunda da pós-
graduação, voltou-se a atenção para a produção que a RBCE fez e vem fazendo
circular no campo no que diz respeito à Educação Física escolar. Em um dos
exemplares da própria revista, Lovisolo (1998, p. 21) esclarece sobre a função das
pós-graduações, afirmando que elas “[...] devem concentrar esforços para gerar
respostas para a Educação Física escolar. Devem produzir propostas que permitam
que o educador ‘físico’ escolar trabalhe com maior competência, resultados e
satisfação pessoal”.
A afirmação desse autor reforça a importância dos produtos e processos
gerados por meio das pós-graduações para a transformação da escola, sendo
capazes de fornecer respostas às demandas que emergem desse espaço e de seus
67 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
156
praticantes. Em outros termos, conhecer as metodologias, os métodos e as técnicas
de pesquisa empreendidas pelos autores/pesquisadores-praticantes em suas
pesquisas veiculadas na RBCE, parece ser de suma importância para o
desenvolvimento científico no campo da Educação Física.
Nesse contexto, é possível dizer que a transformação da escola, em
específico, da disciplina Educação Física, no que se refere à intervenção nas aulas,
está diretamente relacionada com o produto das pesquisas que têm como objeto de
estudo a escola. Daí a relevância de pesquisas que forneçam instrumentos para a
melhoria da prática pedagógica, ressaltando a função social da disciplina Educação
Física na escola.
Dito isso, são relacionados, a seguir, elementos composição da autoria,
titulação dos autores e procedência territorial dos artigos, entendendo que eles são
fundamentais à discussão sobre o sistema de pós-graduação na área da Educação
Física, uma vez que podem contribuir para compreender sua organização e atuação
no campo ao fornecer subsídios para a discussão e análise. Essa foi a pretensão
para este momento da pesquisa, ou seja, analisar os dados que se referem a esses
elementos, cotejando essas informações com o funcionamento do sistema de pós-
graduação.
Quanto à composição da autoria dos artigos, isto é, se individual ou coletiva, o
intuito foi caracterizar o estilo da produção, buscando compreender como a
comunidade acadêmica se organizava e ainda se organiza na proposição e na
produção de estudos publicados na RBCE, em termos de recursos humanos.
Nesse contexto, foi possível inferir que, na categoria arte de coletar dados,
predominaram pesquisas de autoria coletiva, já que, dos 19 artigos, 14 (74%) foram
realizados em coletividade. Na categoria arte de produzir dados, nos artigos que
recorreram às técnicas de pesquisa, como observação, entrevista e questionário,
prevaleceram autorias individuais, visto que, dos 29 artigos identificados, 16 (55%)
foram produzidos por apenas um autor; já naqueles artigos que realizaram
intervenção na prática pedagógica, prevaleceram pesquisas com autoria coletiva,
haja vista que, dos 19 artigos encontrados, 12 (63%) possuíam mais de um autor.
No total geral, das 67 pesquisas desenvolvidas na perspectiva com a escola,
39 (58%) foram articuladas por mais de um autor, o que configura a autoria coletiva,
enquanto as 28 (42%) pesquisas restantes foram compostas por autoria individual.
Foi possível apreender, então, que as pesquisas publicadas no âmbito da RBCE
157
privilegiaram a formação de autoria dos artigos numa perspectiva de coletividade do
trabalho científico.
A predominância desse estilo de produção na revista talvez tenha ligação com
a valorização de uma nova forma de organização do ensino superior (LOVISOLO,
2003). Essa nova organização da produção científica, segundo esse autor, está
centrada na formação não mais espontânea e seletiva de laboratórios considerados
como um ideal organizacional, reconhecidos política e oficialmente como estímulo à
constituição do Grupo de Pesquisa pelo CNPq. Assim, essa formatação inclui “[...]
doutores produtivos desenvolvendo projetos com doutorandos, mestres e alunos da
graduação [...]” (LOVISOLO, 2003, p. 103).
Tendo como ideal de grupos de pesquisa a formatação descrita, passa-se a
inferir que o trabalho de grupo gera também produções em grupo, reunindo
pesquisadores experientes, doutorandos, mestres, mestrandos e alunos de iniciação
científica, ao que o autor chama de “pirâmide de base larga”, num só trabalho a ser
publicado como resultado dos estudos que vêm sendo desenvolvidos no grupo de
pesquisa.
Para Lovisolo (2003, p. 103), “Cursos de pós-graduação e grupos de pesquisa
são, assim, os pilares da formação e produção de pesquisas na Universidade”.
Lovisolo (1999, p. 98) apresenta, ainda, duas hipóteses que podem explicar as
diferenças na composição da autoria:
A primeira apontaria para o tipo de organização institucional que, em função de objetivos diferenciados, criaria estilos de trabalho privilegiando quer o realizado em equipe quer o trabalho individual [...]. A segunda hipótese colocaria o número de autores como variável que depende do tipo de área temática privilegiada por cada instituição. Assim, por exemplo, a instituição com maior concentração em linhas duras de pesquisas [...] teria um estilo de trabalho que privilegiaria o grupo, como resultado das exigências do trabalho de laboratório ou de medidas. Em contrapartida, a instituição que concentra suas pesquisas na área de sociais e humanas teria um predomínio dos autores individuais, como resultados do estilo de trabalho e de pesquisa nelas dominante.
Contudo, as hipóteses defendidas por Lovisolo explicam apenas em parte a
opção por estilos individuais e coletivos de autoria quando se refere à organização
institucional. Quanto à segunda hipótese, não é possível fazer essa generalização,
uma vez que não se aplicam a todos os artigos em questão, pois, mesmo aqueles
alicerçados em referenciais das ciências humanas e sociais apresentaram autoria
158
coletiva e não individual, tal qual postulara Lovisolo, como foi o caso das pesquisas
que realizaram intervenção na prática pedagógica.
Destarte, o que se percebe, é uma mistura de ambas as hipóteses levantadas
por Lovisolo, já que a RBCE publicou artigos com características de pesquisas em
áreas duras, mas também artigos com características das humanidades. Desse
modo, como afirma o próprio Lovisolo (1999, p. 105), “Os valores indicam que por
prudência deveríamos manter em aberto as duas hipóteses”. Dessa forma é válida
uma interação entre o estilo institucional e a área temática em relação ao número de
autores por artigo. Sánchez Gamboa (2007, p. 111) também se posiciona quanto à
forma de se trabalhar a pesquisa, afirmando que se deve articular
[...] graduação com a pós-graduação, integrando outros níveis de progressão acadêmica, com os projetos de iniciação científica, de mestrado, de doutorado, de recém-doutor e mesmo de pós-doutorado, [...] assim como a possibilidade de os grupos de pesquisa, organizados em laboratórios ou núcleos, implementar as formas de orientação coletiva que acontecem em todos os níveis e ao longo de todo o processo das respectivas pesquisas.
Outro elemento relevante, quando se perspectiva a discussão sobre a pós-
graduação, é a titulação dos autores que publicaram suas pesquisas na RBCE.
Foram considerados como titulados aqueles professores que cursaram a pós-
graduação e obtiveram seus certificados de conclusão, tornando-se mestres ou
doutores. Molina Neto, Muller e Amaral (2003, p. 95) chamam a atenção para a
importância da titulação, afirmando que ela
Representa ascensão profissional [...]. Tanto para o profissional que exerce o magistério (na rede pública ou privada de ensino), quanto para o profissional liberal, inserido no mercado de trabalho, o mestrado [e o doutorado] representa avanços na carreira, melhor remuneração e mais oportunidades de trabalho.
Assim, observou-se que a titulação representa um ganho de status
profissional perante a comunidade acadêmica, passando os profissionais titulados a
considerarem-se mais capacitados teoricamente para exercer suas atividades
acadêmicas. Os autores citados referem-se, especificamente, à titulação de mestres
e doutores. Contudo, nesta pesquisa, foi feito o levantamento de outras categorias
consideradas importantes de serem investigadas nas revistas, dado o interesse em
identificar o nível de formação dos autores que escreviam/escrevem para a RBCE.
Assim, foram consideradas também as categorias: acadêmicos (aqueles que
ainda se encontram em formação inicial), graduados (professores formados que
159
ainda não realizaram pós-graduação lato sensu), especialistas (professores com
pós-graduação lato sensu), mestrandos (professores com pós-graduação stricto
sensu em nível de mestrado, ainda em curso) e doutorandos (professores com pós-
graduação stricto sensu em nível de doutorado ainda em curso).
Entende-se que essas categorias “intermediárias” entre a formação inicial e a
formação continuada demonstram os processos enfrentados pelos pós-graduandos
durante seus cursos, bem como seu amadurecimento teórico, que deveria se
apresentar de forma avançada, em relação a mestres ou doutores. Assim, a
preocupação com a titulação dos docentes que atuavam no ensino superior em
Educação Física e que publicavam suas produções na RBCE caminhava pari passu
com o perfil científico desejado na área, de modo que a pesquisa científica fosse
compatível com o nível intelectual dos titulados.
Os dados sobre a titulação dos autores que publicaram na RBCE, ao longo
desses 30 anos, apontaram que os artigos classificados na categoria arte de coletar
dados foram produzidos majoritariamente por doutores (24%), seguidos por
especialistas (20%), acadêmicos (12%)68 e mestres (10%).
Chama a atenção nesses artigos o fato de acadêmicos, isto é, alunos ainda
em formação inicial, publicaram mais que doutorandos, mestres e mestrandos,
quando o que se espera é o oposto, ou seja, que aqueles que estiveram/estão
envolvidos com a pós-graduação possuam maior preparo para produzirem artigos
científicos, resultantes de suas pesquisas da pós-graduação ou mesmo de outros
estudos independentes. Em síntese, é o que espera o próprio sistema de pós-
graduação que exige que os pós-graduandos produzam artigos, visto que esse é um
dos critérios de avaliação da produtividade acadêmica feita pela comissão de
avaliação da Capes nos programas de pós-graduação (RESENDE; VOTRE, 2003).
A crescente quantidade de artigos que contam com a presença de alunos da
graduação parece indicar, segundo Lovisolo e Kowalski (1999), uma abertura
significativa das revistas para os autores não diretamente vinculados aos cursos de
pós-graduação. Lovisolo (2003) complementa essa afirmação apontando que
Os documentos oficiais de educação, ciência e técnica, enfatizaram crescentemente o desenvolvimento da pesquisa já na graduação, concretizado mediante programas de iniciação científica, encarregando-se
68 Entre a porcentagem de especialistas e de acadêmicos, existe uma categoria de autores cujos registros não constam na Plataforma Lattes e que representam 20% do total de titulados dessa categoria.
160
destes especialmente o CNPq (Pibic), além dos organismos estaduais de apoio á pesquisa [...], as jornadas de iniciação científica tornaram-se eventos cada vez mais freqüentes no Brasil, onde o que importa [...] é muito mais a apresentação dos processos formais de pesquisa e dos relatórios [...] do que os resultados (LOVISOLO, 2003, p. 99).
Com isso, é possível perceber que as agências de fomento à pesquisa têm
incentivado que essa iniciação acadêmica aconteça já na graduação. Para Lovisolo
(2003), a pesquisa na graduação teria como objetivo educacional a função de
socialização emocional e intelectual na cultura científica.
Outra informação importante refere-se aos 19 artigos que compuseram essa
categoria, dos quais 18 não fizeram indicação quanto à origem do estudo, isto é, se
este era/é produto de relatório de pesquisa de pós-graduação (como monografia de
especialização, dissertações ou teses) ou de estudo independente. Apenas um
artigo apresentou identificação como sendo parte de uma dissertação de mestrado.
Essa significativa concentração de pesquisas cujos autores não indicaram se
possuíam ou não ligação com a pós-graduação incorre em problemas, se
consideramos as exigências estabelecidas pelos órgãos de fomento à pesquisa sob
os programas de pós-graduação. Logo, torna-se essencial que o produto final
desses programas, em formato de relatório de pesquisa, isto é, dissertações e teses,
seja veiculado no campo científico, como artigos, em suportes materiais de ampla
veiculação, fazendo circular esse conhecimento. Assim, dar a ler e a conhecer a
produção científica fruto da pós-graduação contribui para o desenvolvimento da
ciência e tecnologia, justificando o investimento depositado no sistema de pós-
graduação brasileiro.
Nos artigos da categoria arte de produzir dados por meio de observações,
entrevistas e questionários, também predominou a presença de doutores (32%) à
frente dos trabalhos, seguidos em segundo lugar por mestres (24%), em terceiro por
especialistas (15%) e em quarta posição por doutorandos (9%). Neste caso, é
possível notar que a sequência da titulação parece se aproximar mais das
perspectivas depositadas pelo sistema nacional de pós-graduação sob o
desenvolvimento da produção científica oriunda dos pós-graduandos e/ou pós-
graduados. Entretanto, ainda se percebe maior produtividade por parte dos
especialistas do que de doutorandos, além dos acadêmicos (6%) e professores
graduados (4%) que publicaram mais que os mestrandos (2%).
161
Quanto à predominância de doutores, identificada tanto nos artigos que
realizaram coleta de dados quanto naqueles que se valeram de observações,
entrevistas e questionários para produzir seus dados, talvez possa ser explicada
pelo fato de muitos estudos serem orientados por professores doutores, e as
pesquisas serem realizadas na escola, efetivamente, por seus orientandos de
graduação (no caso de acadêmicos) ou mesmo da pós-graduação (mestrandos e
doutorandos), reforçando a forma de organização em grupos de pesquisa, sempre
liderados por doutores na chamada “pirâmide de base larga”, nos termos de Lovisolo
(2003). Essa pode ser uma explicação para a grande concentração de doutores
publicando artigos na RBCE.
Dos 29 artigos desenvolvidos por meio de observações, entrevistas e
questionários, foi possível inferir que 14 não indicaram explicitamente se eram
pesquisas oriundas da pós-graduação ou não. Quanto ao restante, 10 anunciaram
ser parte ou resumo de dissertações de mestrado, 3 de teses de doutorado e 2
indicaram ser parte de monografias de especialização. Mais uma vez, localizou-se
um quantitativo expressivo de artigos que omitiram a informação quanto à sua
origem, como produto da pós-graduação ou de trabalhos independentes, reforçando
a tensão entre as exigências normativas dos processos avaliativos e a divulgação de
pesquisas na área.
Por outro lado, observou-se, também, que aumentou o número de artigos que
mencionaram ser parte ou resumo de dissertações, teses, além das monografias de
especialização, que correspondem a programas de pós-graduação lato sensu. Essa
mudança de postura dos autores talvez de deva à consolidação dos programas de
pós-graduação e, junto a isso, ao cumprimento, por parte dos autores, da lógica que
rege o sistema de pós-graduação, contribuindo para o campo acadêmico com
produção e circulação de novos conhecimentos.
Esses dados parecem indicar um aumento do número de professores ligados
à pós-graduação na década de 1990 (onde se encontram publicados a maior parte
dos artigos dessa subcategoria) ou, numa explicação mais simples, que os autores
passaram a anunciar no texto mais vezes essa ligação com a pós-graduação, visto
que, nos artigos concentrados na década de 1980, apenas um fez essa indicação.
Quanto à titulação presente nos artigos da categoria arte de produzir dados
por meio da intervenção na prática pedagógica, prevaleceu a presença de mestres
(29%), seguidos por especialistas (18%) e, depois, por doutores (17%). Assim, é
162
possível supor que o trabalho de campo na escola e suas práticas era parte da
pesquisa do mestrado, dada a significativa quantidade de trabalhos oriundos de
dissertações de mestrado.
Fato que chama a atenção, também nesta categoria, é a equivalência quanto
ao aparecimento de professores graduados (9%) e mestrandos (9%) como autores
na RBCE, além dos doutorandos (6%) e acadêmicos (6%) que também estão
empatados em publicações na revista. Esse último, principalmente, merece atenção
dado o distanciamento em termos de formação acadêmica que separa ambos: um
em formação inicial e outro em formação continuada já em fins da pós-graduação
stricto sensu.
Essa organização da produção científica veiculada pela RBCE demonstra
uma inversão na lógica de produção esperada pelo sistema de pós-graduação,
quando se observa que doutorandos publicaram menos que mestres, mestrandos,
especialistas e graduados, e se encontram nivelados com alunos que estão
começando sua carreira profissional.
Nessa subcategoria composta por 19 artigos, a maioria (11) não indicou se
era fruto de pesquisas ligadas à pós-graduação. Mas, daqueles que citaram a
origem, foi detectado que um era proveniente de tese de doutoramento, cinco eram
oriundos de dissertações de mestrado e dois provinham de monografias da
especialização.
Essa distribuição também parece equivocada quanto às perspectivas do
sistema de pós-graduação, visto que a maioria dos artigos dessa subcategoria, que
se encontram distribuídos entre as décadas de 1990 e 2000, ainda permanecem
omitindo sua origem. Como citado na categoria anterior, esse comportamento cria
obstáculos ao avanço científico no campo da Educação Física, uma vez que impede
a “publicização” do que tem sido produzido nos programas de pós-graduação stricto
sensu, especialmente.
Depois da composição de autoria e da titulação, entendeu-se como relevante
analisar a procedência territorial dos artigos que a RBCE fez circular na área. Esse
elemento refere-se à localização geográfica da escola e, consequentemente, ao
locus da pesquisa. Sobre esse aspecto, foi inferido que a produção científica, de
modo geral, ficou concentrada na Região Sudeste com 34 dos 67 artigos que
compuseram o corpus documental desta pesquisa, abrangendo as categorias arte
de coletar dados e arte de produzir dados. A Região Sul aparece em segundo lugar
163
com 26 artigos, seguida pela Região Nordeste com 6, e pela Região Centro-Oeste
com apenas 1 artigo.
A concentração da produção científica nas Regiões Sudeste e Sul não
provocou surpresa, uma vez que essas são regiões de destacado desenvolvimento
social, político, cultural e econômico do País, fato significativo para o fomento à
pesquisas de ponta em diferentes áreas do conhecimento, com incentivos ao
desenvolvimento da ciência e tecnologia.
Nessas regiões, estão localizados os principais centros de referência de pós-
graduação em Educação e Educação Física do País, instituições cujo prestígio se
pode atribuir à tradição dos programas, ao corpo docente experiente, bem como à
trajetória acadêmica de alguns destes, capaz de conferir-lhes capital científico.
Assim, essas regiões reúnem grande número de universidades conceituadas, onde
é possível desenvolver trabalhos de pesquisa qualificada na área.
De acordo com Amadio (2003), dados de 1997 (MEC-CAPES) indicam o
funcionamento de 116 Instituições de Ensino Superior (IES) oferecendo cursos de
pós-graduação, com 1.180 cursos de mestrado e 627 de doutorado, com
aproximadamente 70.000 alunos matriculados. O autor ainda complementa
afirmando que “A grande maioria dos cursos de mestrado (62%) e de doutorado
(79%) e quase 80% dos alunos matriculados concentram-se nos estados da Região
Sudeste, principalmente em São Paulo” (AMADIO, 2003, p. 30-31).
Esses números corroboram os achados na RBCE em relação à procedência
territorial da produção científica da Educação Física de forma geral e, em específico,
sobre aqueles estudos que foram desenvolvidos na escola, já que foi identificada a
predominância do Estado de São Paulo (SP) como principal representante da
Região Sudeste, aparecendo 19 vezes dentre as categorias, e os Estados do
Paraná (PR) e Santa Catarina (SC), representando a Região Sul, cada um
aparecendo 9 vezes.
Chama a atenção, nesse ranking, o reduzido número de artigos que
procederam da Região Nordeste (6) e da Região Centro-Oeste, de onde partiu
apenas 1 artigo dentre aqueles 67 cujas pesquisas foram empreendidas no espaço
escolar. Nesse contexto, Amadio (2003, p. 31, grifo nosso) aponta:
Outros indicadores de potencial acadêmico-científico como titulação de docentes, recursos investidos e número de publicações seguem o mesmo padrão [ou seja, com a região Sudeste na liderança]. Esta grave distorção
164
resulta de um fenômeno vicioso. Observa-se que este crescimento desbalanceado acaba penalizando alunos de regiões m enos favorecidas, para os quais o deslocamento para real izar estudos de pós-graduação nos grandes centros nem sempre é poss ível .
Com base nesses dados, pôde-se constatar que ainda prevalece a Região
Sudeste como a grande responsável pela produção científica que circulou/circula no
País, visto que esta possui as condições necessárias para tal feito, como recursos
humanos, físicos, materiais e financeiros, que aparecem de forma ainda muito tímida
nas Regiões Nordeste e Centro-Oeste na produção e no período investigados.
Ciente de que mudanças se fazem necessárias nesse cenário, considerou-se
importante para compreender a lógica que rege esse processo, apresentar a relação
estabelecida por Kokubun (2003, p. 13, grifo nosso) envolvendo pós-graduação e
pesquisa:
[...] pode-se admitir que a capacidade instalada de pesquisa e desenvolvimento mantém relação direta com a dimensão da capacidade de oferecimento da PG [Pós-Graduação]. Em outras palavras, não é possível oferecer PG de qualidade sem a existência de atividades consolidadas de pesquisa previamente à sua implantação. A pesquisa deve anteceder a PG e não a PG implantar a pesquisa .
Com a análise sobre a procedência territorial dos estudos, encerra-se este
capítulo ciente de que outras questões poderiam ter sido suscitadas como pontos de
análise que, certamente, enriqueceriam o trabalho. Isso é dito referindo-se a todos
os elementos eleitos como importantes para se compreender as representação de
práticas de pesquisa empreendidas no campo por meio dos articulistas da RBCE.
Contudo, pensa-se que as análises elaboradas, da forma com que foram
construídas, não fecham as possibilidades, ao contrário, estimulam a pensar outros
tantos vieses analíticos.
165
CAPÍTULO 5
5 EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA: QUANDO TEORIZAR É SEM PRE
PRATICAR
O objetivo neste capítulo foi identificar as representações de teoria que foram
mobilizadas no campo da Educação Física por articulistas que abordaram o tema
escola na RBCE, em artigos caracterizados em sobre e com a escola, entendendo
que as práticas de pesquisa e os saberes mobilizados, em ambas as perspectivas,
são meios capazes de revelar aspectos ainda não compreendidos no processo de
constituição de um modo de pensar a Educação Física e os saberes que lhe deram
suporte como disciplina escolar.
Dessa forma, buscou-se dar visibilidade às representações de práticas de
pesquisa, em termos teóricos, que circularam na RBCE, conformando escritas e
leituras e, consequentemente, opiniões e comportamentos pelos últimos 30 anos na
Educação Física brasileira. Considera-se que os fundamentos teóricos balizadores
dos discursos da Educação Física escolar – voltados para o fomentar da atividade
epistemológica como interrogação constante dos saberes e práticas constituidores
desse campo – deveriam levar em consideração as duas operações apresentadas e
não uma em detrimento da outra.
Entendendo que existe uma linha de continuidade – mesmo com as
descontinuidades – presente na produção veiculada pela RBCE ao longo dessas
três décadas, na qual circulou uma diversidade de autores, estudos e uma
variabilidade de linhas teóricas, identifica-se uma contribuição recíproca entre os
estudos denominados sobre e com a escola. Os primeiros, de caráter especulativo,
assumem a função de alicerce e ponto de partida para as pesquisas que visam à
empiria e estas, por sua vez, permitem que os achados da prática de intervenção no
contexto escolar sirvam como base para novos estudos de caráter especulativo. Isso
demonstra a circularidade que visa a romper com uma dicotomia que,
aparentemente, opõe especulação e empiria.
A ideia de circularidade cultural69 é abordada por Ginzburg (1987, p. 13) que a
entende como “[...] um relacionamento circular feito de influências recíprocas, que se
69 No livro O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição, Ginzburg (1987) utiliza a noção de circularidade cultural, formulada por Mikhail Bakthin, que compreende haver uma influência recíproca entre a cultura popular e a das classes dominantes, para
166
movia de baixo para cima, bem como de cima para baixo [...]”. Levar em
consideração as reflexões desse autor significa direcionar o olhar para a
complexificação do objeto, neste caso, as práticas de pesquisa e os saberes
constituidores da Educação Física, e retirá-lo do lugar comum das leituras
simplificadoras da realidade que opta por uma ou outra perspectiva.
Nesse momento, recorre-se às proposições de Charlot (2000), quando se
refere à leitura positiva dos fenômenos. Para o autor, “[...] praticar uma leitura
positiva é prestar atenção também ao que as pessoas fazem, conseguem, têm e
são, e não somente aquilo em que elas falham e às suas carências” (CHARLOT,
2000, p. 30), aspectos mais comumente ressaltados em trabalhos acadêmicos.
É possível empreender a prática da leitura positiva sobre o trabalho de uma
intelectualidade próxima que pode ser representada por Victor Marinho de Oliveira,
Celi Neuza Zulke Taffarel, Go Tani, João Batista Freire, Valter Bracht, Lino Castellani
Filho, Carmen Lúcia Soares, Mauro Betti, Elenor Kunz e outros.
Dessa forma, há que se reconhecer diferenças substantivas nos fundamentos
da reflexão desse elenco de atores sociais, uma vez que cada um no seu tempo,
com as representações de teorização que possuíam, com os instrumentos científicos
disponíveis e com as apropriações possíveis dos saberes que circunscreviam a
área, corroborou para a criação, implantação e consolidação do campo da Educação
Física, tendo como ideia central o seu processo de escolarização.
Com as orientações de Charlot (2000), ressalta-se a importância de dedicar
atenção ao que as duas perspectivas de estudos apresentadas – sobre e com a
escola – são capazes de produzir em termos de pesquisas científicas e
conhecimentos para ser mobilizados na aulas de Educação Física, em detrimento
das limitações mediante suas peculiaridades. Destarte, foi valorizado o caráter de
complementaridade dessas artes de fazer científicas, muito embora tenham
evidenciado perspectivas teórico-metodológicas diferentes.
Contudo, as diferenças não são absolutas no que se refere à produção de
conhecimento científico. Ambas são as perspectivas produtoras de conhecimentos
legítimos e válidos. As pesquisas desenvolvidas mediante recursos ditos
especulativos ou empíricos parecem assumir identidades complementares. Essas
tecer os fios existentes entre as formulações de Menocchio – como era conhecido o moleiro Domenico Scandella, que viveu em Friuli (Itália), um herege do século XVI, queimado pela Ordem do Santo Ofício.
167
pesquisas são consideradas instrumentos para uma prática refletida e para a
produção e veiculação de conhecimento que possibilite a ressignificação dessa
mesma prática. Nesse sentido, Gauthier et al. (1998) defendem esse processo,
denominando-o de saber da ação pedagógica, demonstrando a importância da
“publicização” de pesquisas que, no caso da RBCE, abordaram a Educação Física
escolar para o processo de transformação da prática pedagógica.
Gauthier et al. (1998) apontam a existência de pesquisas demasiado
especulativas, sofrendo de insuficiência de bases empíricas. Por outro lado, existem
pesquisas tão empíricas que lhes faltam um quadro de reflexão de base para lhe dar
mais profundidade. Dessa forma, esses autores julgam pela necessidade de assumir
uma posição empírica e especulativa ao mesmo tempo, esboçando o que poderia vir
a ser, eventualmente, uma teoria geral da pedagogia, interpretando-a como teoria da
educação que é assumida como área de referência que influencia a Educação
Física.
Com base nessa relação, é possível afirmar que a ausência de articulação
entre ambas as perspectivas poderia constituir-se em obstáculo ao avanço da
pesquisa científica no campo, haja vista que o diálogo entre os pesquisadores ficaria
limitado ou mesmo inexistente.
Com referência à presença de obstáculos à produção científica, esta pesquisa
apoiou-se em Bachelard (1996), uma vez que esse autor anuncia seu entendimento
de obstáculo epistemológico afirmando que não se trata de obstáculos externos aos
fenômenos, mas “[...] é no âmago do próprio ato de conhecer que aparecem, por
uma espécie de imperativo funcional, lentidões e conflitos” (BACHELARD, 1996, p.
17). Estes, por sua vez, são apontados pelo autor como causas de estagnação,
regressão e inércia do conhecimento científico, uma vez que um obstáculo
epistemológico se impregna no conhecimento que não foi alvo de questionamentos.
Para Ferreira Neto (2000), pensar uma teoria da Educação Física brasileira
tem sido um exercício frequente no imaginário dos intelectuais no século XX.
Contudo, esse exercício requer investimentos em pesquisa, “[...] se não quisermos
permanecer com as certezas produzidas sob o ideário político e teórico-
metodológico da década de 1980, que, teimosamente, insistimos em reproduzir”
(FERREIRA NETO, 2000, p. 153), baseado na construção do conhecimento por
oposição.
168
Por outro lado, para possibilitar diferentes formas de construção do
conhecimento, necessário se faz questionar o que está posto como tradição,
inventada ou não, nos termos de Hobsbawn (1997), envolvendo teorização em
Educação Física nas três últimas décadas. Essa alternativa constitui-se em solução
possível para a existência de obstáculos epistemológicos, como o que é ressaltado
por esta pesquisa, qual seja, a dicotomização entre especulação e empiria.
Visando a fomentar o debate sobre a não dicotomização entre teoria e prática,
é importante atentar para a forma de pensar a Educação Física escolar, buscando
realizar uma leitura positiva (CHARLOT, 2000) da articulação entre especulação e
empiria, evitando opor esses aspectos. Nesse sentido, para compreender as
representações de teoria que permeavam o campo da Educação Física escolar,
investigou-se o que estava circulando na RBCE, em termos teórico-científicos.
Além disso, o olhar direcionado à investigação de uma tipologia de ciência na
Educação Física brasileira buscou analisar o que as representações de ciência,
método e técnica encontradas na produção da revista sugerem em relação ao
debate sobre teoria da Educação Física a partir da segunda metade do século XX.
Sobre essa teorização, Ferreira Neto (2000, p. 156, grifo nosso) afirma que, na
revista aqui abordada, assim como em outros periódicos da Educação Física,
[...] existe embutida uma concepção de teoria da Educação Física . Qual é ela? Ainda que devamos reconhecer que nas últimas três décadas tenham surgido reflexões sobre a possível existência de uma ciência autônoma, é no discurso e ação, construído no processo de escolarização da disciplina curricular Educação Física desde a segunda metade do século XIX e que foi reforçado durante o século XX, que buscamos encontrar e articular os nexos do já feito, isto é, entre especulação e empiria [...] e saberes elaborados sobre os fazeres [...].
Tomando por base a hipótese desse autor, foi possível perceber que as
práticas de pesquisa e os saberes científicos que se materializaram no campo da
Educação Física, por meio dos artigos veiculados na RBCE, o fizeram, também,
teoricamente, remontando a conhecimentos já postos desde o século XIX, e que
foram reforçados durante o século XX, por uma intelectualidade que pode ser
representada aqui por Fernando de Azevedo. Esse intelectual teve participação
importante no campo educacional, contribuindo com seu pensamento pedagógico
sobre a Educação Física brasileira, afirmando que
[...] a aplicação das teorias científicas [...] está em função e na dependência do progresso da ciência, cujo desenvolvimento está por sua vez
169
condicionado à precisão das técnicas de observação e verificação de fatos nitidamente isolados e definidos. Certo, a teoria tende à prática , e a rigor não pensamos senão para realizar e construir; e, por isto mesmo, o ´valor` social de uma teoria científica se mede pelo alcanc e de suas consequências práticas para o homem e para a civili zação (AZEVEDO, 1964a, p. 8, grifo nosso).
Aliado às práticas de pesquisa, Azevedo (1964) reforça o valor social da
teoria mediante sua aplicação prática e, com isso, destaca que a teoria tende à
prática, no sentido de que o teorizar necessita da prática como forma de se efetivar.
O que foi possível perceber, então, é que as ideias apresentadas ou manifestadas
pelos teóricos da Educação Física, muitas atualmente embutidas nas práticas de
pesquisas, e que, por vezes, parecem inovadoras, já foram esboçadas em outros
tempos e hoje fazem sentido quando indicam uma Educação Física construída por
continuidades e descontinuidades.
É preciso reconhecer que o atual debate epistemológico em torno do estatuto
científico da Educação Física repousa suas bases num campo de possíveis, um
campo de forças, caracterizado por suas ideologizações, conflitos e interesses, tal
qual aponta Bourdieu (1983), destacando que esse debate encontra seu ponto de
partida e de chegada na história da Educação Física, seus processos e suas
práticas.
Fundamental é perceber que, mesmo que os autores que estudam a prática
pedagógica não reconheçam alguma teoria que lhes dê suporte, o discurso como
um todo revela uma teoria subjacente, uma vez que prática e teoria se encontram
intrinsecamente imbricadas. Fensterseifer (1999) ajuda a compreender o quão teoria
e prática compõem um todo necessário à constituição do campo da Educação Física
como atividade epistemológica e intervenção:
A ausência de uma tradição reflexiva na Educação Física não significa que a seu ‘fazer’ não corresponda um ‘saber’. Todos sabemos que a toda prática corresponde uma teoria (ou várias), embora insistamos em falar de uma ‘prática em si’, como se ela não fosse mediada por uma teoria (FENSTERSEIFER, 1999, p. 180).
Embora os críticos atuais demonstrem não reconhecer as experiências
historicamente construídas, é possível perceber que a Educação Física vem sendo
constituída como disciplina de intervenção escolar e, por isso, deveria buscar sua
legitimidade nos saberes da ação pedagógica, tal qual postulam Gauthier et al.
(1998). Esses saberes são capazes de compor um repertório de conhecimentos
aptos a constituir uma teoria da pedagogia que tenha suporte na própria prática.
170
De modo geral, a Educação Física veio se apropriando dos saberes da
Pedagogia, que, por sua vez, se encontra inserida em meio a uma tentativa de
formular “[...] uma teoria geral da pedagogia, cujas raízes se encontram tanto nas
pesquisas empíricas como numa sólida problematização teórica” (GAUTHIER et al.,
1998, 321). Os autores explanam de maneira objetiva sobre esse esforço de
teorização:
O que propomos [...], e aquilo que defendemos, é a constituição de uma teoria da pedagogia, isto é, uma construção conceitual que integraria dimensões especulativas e empíricas, que estaria preocupada ao mesmo tempo com os elementos primordiais da tradição pedagógica, com os saberes oriundos da educação e com os saberes essenciais oriundos do encontro, com a confrontação com o diálogo entre os práticos e os pesquisadores; uma teoria preocupada com o ensino e a aprendizagem, com o conjunto dos métodos, como os processos e procedimentos através dos quais se ensina e se aprende na complexidade do contexto real da sala de aula comum (GAUTHIER et al., 1998, p. 394).
Sobre a constituição de uma teoria geral da Pedagogia, que levasse em conta
uma posição empírica e especulativa, ao mesmo tempo com vistas à identificação
dos saberes que dão suporte à ação pedagógica, Gauthier et al. (1998, p. 325, grifo
nosso) consideram
[...] que todo o trabalho de explicitação, de teorização, de pesquisa, de crítica do trabalho docente na sala de aula está por ser feito e é por isso que defendemos a elaboração de uma teoria geral da peda gogia que se origine não só das pesquisas empíricas mas também d e uma sólida problematização teórica .
Com base no que esses autores apontam, faz-se um paralelo com o nosso
campo supondo que uma possível teoria da Educação Física brasileira deveria levar
em consideração os conhecimentos dos quais veio se apropriando ao longo do
tempo, quais sejam, os saberes da Biologia, da Pedagogia, da Psicologia, da
Sociologia, da História, da Filosofia, conforme apontado por Inezil Penna Marinho já
na década de 1940. Daí a pluralidade de objetos de estudo e a pluralidade científica
do campo.
Com o progresso da ciência, alguns saberes passaram a ser considerados
insuficientes para dar conta de explicar objetos e fenômenos próprios do campo da
Educação Física, sendo necessário mobilizar saberes outros que cumprissem essa
tarefa (KUHN, 2007). No entanto, são esses saberes por vezes considerados
ultrapassados que constituem a base para o pensamento pedagógico vigente, como
aponta Nóbrega (2005, p. 108, grifo nosso):
171
A necessária revisão epistemológica da área passa p ela consideração da história da educação física , de suas aspirações de cientificidade, de sua polêmica relação com a produção do conhecimento e a intervenção profissional; bem como de uma revisão sobre as questões dos métodos de pesquisa utilizados nas investigações da área.
A autora evidencia a necessidade de levar em consideração “aquilo que veio
antes” do que atualmente se constitui como práticas e saberes no campo,
valorizando seu processo histórico, capaz de revelar que o que se pratica hoje, em
termos de teorias, métodos e técnicas, não é tão recente quanto se quer supor.
Sobre essa tipologia, especialmente no que envolve o método, Nóbrega
(2005, p. 111) aponta dois aspectos fundamentais: “[...] a pluralidade metodológica e
a relação com o aporte teórico [...]”. A investigação das representações
metodológicas dos autores da RBCE permitiu perceber a pluralidade metodológica70
que permeou as discussões que envolveram a Educação Física escolar nessa
revista.
Quanto ao suporte teórico, tão importante para a atividade científica, buscou-
se identificar as representações que foram feitas de teorias oriundas de distintos
campos do conhecimento pelos articulistas da RBCE. Essa foi a condição
fundamental para se compreender os rumos que foram definidos para a produção do
conhecimento em Educação Física Escolar.
Contudo, a análise da matriz teórica foi realizada considerando “[...] que
discursos elegantes também podem mascarar a imprecisão das teorias, dos
métodos, dos objetos, das hipóteses e das fontes” (FERREIRA NETO, 2005, p. 153)
e, por isso, é preciso prestar maior atenção à construção discursiva dos artigos,
observando o modo como as representações dos autores se faziam presentes,
também, quanto à opção por uma ou outra teoria.
Considerando que as teorias se relacionam intrinsecamente com a realidade,
neste caso as práticas de pesquisa empreendidas por pesquisadores na escola,
apresentam-se as ponderações de Silva (1999) sobre a existência de
correspondência entre teoria e realidade, com base na hipótese de que a teoria
encontra o real. Entretanto, a noção de teoria sempre vai ao encontro de uma forma
representacional, refletindo e espelhando a realidade. Nesse sentido, o autor afirma:
A ‘teoria’ não se limitaria, pois, a descobrir, a descrever, a explicar a realidade: a teoria estaria irremediavelmente implicada na sua produção. Ao
70 Conferir Tabela 2.
172
descrever um ‘objeto’, a teoria, de certo modo, inventa-o. O objeto que a teoria supostamente descreve é, efetivamente, um produto de sua criação [...]. Uma teoria supostamente descobre e descreve um objeto que tem uma existência independente relativamente à teoria (SILVA, 1999, p. 11-12).
Sánchez Gamboa (2007) também entende que as teorias são maneiras
diversas de ordenar o real, de articular aspectos de um processo global e de
explicitar uma visão de conjunto. As teorias, então, conferem aos objetos as bases
compreensivas que permitem entender quais usos e contornos esses objetos podem
assumir.
Dada a relevância da matriz teórica, confirmada por Ferreira Neto (2005, p.
151), quando este afirma “[...] que as [...] teorias ajudam a definir os objetos e as
fontes”, é que se propôs fazer o levantamento das teorias utilizadas nos artigos
selecionados. Sobre os usos dessas teorias, Ferreira Neto (2005, p. 148), em alusão
à sua importância, afirma que elas “[...] são os hardware do fazer científico. Elas
constituem os alicerces da compreensão do processo de definição de objetos e suas
possibilidades de explicação”.
Nesse processo, alguns autores reforçaram a necessidade de construção de
uma teoria da Educação Física de matizes brasileiras. Tendo em vista que o
pensamento epistemológico da Educação Física comporta uma pluralidade de
formulações, foi possível identificar algumas delas, bem como seus principais
expoentes, com base em suas representações de teoria da Educação Física,
divididos em duas matrizes: uma que entende a Educação Física como área de
conhecimento científico e a outra que a vê como prática pedagógica.
De modo resumido, a matriz científica compartilha da proposta de construção
de uma área do conhecimento que tenha o movimento humano (Jeferson Canfield,
Go Tani e Adroaldo Gaya) ou a motricidade humana (Manuel Sérgio e Carol
Kolyniak Filho) como objeto de estudo. Em que pesem as diferenças,71 essas
proposições revelam a aspiração pela cientificidade presente no campo da
Educação Física.
Sob o entendimento da Educação Física como prática pedagógica, foram
alojadas as seguintes posições: a cultura corporal de movimento tendo a prática
pedagógica como eixo integrador (Valter Bracht); a Educação Física como arte da
mediação (Hugo Lovisolo); a Educação Física como ciência da prática que vai do
71 O agrupamento de autores na matriz científica se deu devido ao entendimento de que eles compartilham ideias, embora com nuanças.
173
“colonialismo epistemológico” à articulação de um campo interdisciplinar (Silvio
Sánchez Gamboa); por uma teoria da prática (Mauro Betti); e a perspectiva crítico-
emancipatória da Educação Física (Elenor Kunz). Essa matriz pedagógica pauta-se
na intervenção e deve ser pensada para além dos dualismos estabelecidos entre o
campo científico e a área de intervenção, configurando-se em tentativas de
delimitação de um campo acadêmico que teorize a prática pedagógica, levando em
consideração que essas teorias possibilitam a intervenção na realidade e, por vezes,
até o seu controle.
Nesse sentido, essas perspectivas não devem ser julgadas, explicadas ou
mesmo descritas a partir de uma visão privilegiada, superior, pretensamente
universal, mas devem ser confrontadas no mesmo nível de validade. Nesses termos,
o objetivo aqui foi compreender e não julgar o já feito.
Lima (1999) aponta, como preocupação central da matriz científica, a
constituição de um campo científico ou de uma nova ciência, recebendo a Educação
Física atenção secundária, visto que essa matriz buscava uma ruptura ou
emancipação em relação a esse campo, embora tenha sua origem nele. Ao
contrário, para os representantes da matriz pedagógica, a Educação Física, como
prática pedagógica e social, está no centro de suas preocupações, tomando-a como
objeto de reflexão, em que sobressaem preocupações educacionais ou
pedagógicas. Segundo Molina Neto (2006, p. 147),
Essa relação indica, que certos antagonismos simplificadores, separações objetivadoras, segregações emocionais e discriminações profissionais produzidos na breve história da EF no Brasil já não se sustentam além do proselitismo político, pois paradigmas como o da complexidade, do caos e da incerteza dão forma a novas subjetividades científicas e deformam não só os tradicionais objetos de pesquisa, mas também a organização e a estrutura das disciplinas científicas clássicas.
Contudo, os teóricos da Educação Física, destacadas as suas significativas
contribuições para pensar o campo, parecem não reconhecer que o teorizar
específico da Educação Física deveria concentrar-se na integração das diferentes
abordagens, configurando-se num teorizar sintetizador de conhecimento à luz de
necessidades específicas da prática pedagógica. Ferreira Neto (2005, p. 29-30, grifo
nosso), levando em consideração as perspectivas dos teóricos da Educação Física,
aponta que
174
[...] é interessante observar os modos utilizados para dar legitimidade a uma determinada perspectiva acadêmica, em detrimento de outras. Entre esses modos podemos destacar alguns. O primeiro talvez seja a desqualificação do discurso da prática do outro . Nesse caso, com maior ou menor firmeza, com mais ou menos elegância, com maior ou menor virulência, aquilo que temos a dizer é muito melhor e mais interessante do que aquilo que o outro tem a dizer. Nossa perspectiva, não raro, assume o papel de porta-voz do novo, do atualizado, do correto, do moderno, do verdadeiro. Óbvio que, por contradição, o discurso do outro [...] só pode ser o velho, o errado, o arcaico, o falso, o mentiroso [...]. Trata-se de uma estratégia de apagamento de perspectivas contrárias às nossas.
O autor chama a atenção para a prática de desqualificação do discurso do
outro, fato que pode ser atribuído à relação que se estabeleceu entre os estudos de
caráter especulativo (sobre) e os de caráter empírico (com).
Atualmente, no campo da Educação Física escolar, têm-se conferido maior
legitimidade àquelas pesquisas realisadas no cotidiano da escola, levando em
consideração seus praticantes e suas práticas, colocando em segundo plano as
pesquisas que empreendem análises sobre esse cotidiano, mesmo não fazendo
parte diretamente desse espaço. As características desse tipo de estudo parecem
não mais proporcionar credibilidade em termos de validade científica, quando
comparadas com as pesquisas que abordaram a escola com base na vivência do
pesquisador no contexto estudado.
É preciso reconhecer que esse tipo de pesquisa desenvolvido fora do
contexto escolar, apesar de não ter seus resultados, por vezes, diretamente
aproveitados pelos professores de Educação Física em suas aulas, apresentam
certa ressonância com a prática, uma vez que nela se fundamenta.
Identifica-se, aqui, a função de biblioteca pedagógica (CARVALHO, 2001) da
RBCE ao publicar pesquisas de caráter especulativo ou ensaísta sobre a escola,
com a intenção de fornecer informações referentes a esse contexto aos professores
de Educação Física que, mediante a “publicização” desses conhecimentos, deles se
valem para aplicar em suas aulas, respeitando as peculiaridades de cada realidade.
Considerando que a caracterização e a exposição dos objetivos dessas artes
de fazer (sobre e com a escola) foram empreendidas em outro momento (Capítulo
3), este capítulo foi reservado para identificar o que aproxima essas duas
perspectivas de estudo. Para concretizar essa intenção, foram identificadas as
representações de teoria que circularam nos artigos veiculados na RBCE
categorizados como sobre e com a escola.
175
Como aponta Sánchez Gamboa (2007), a relação que se estabelece entre
teoria e prática não é de hierarquização, mas de tensão. Esse “tensionamento”
parece capaz de criar condições para que as perspectivas de estudo sobre e com a
escola aparecessem em momentos distintos, na produção de autores que ora
privilegiavam estudos especulativos sem ir de fato à escola, ora privilegiavam a
empiria, valorizando o contato direto com esse espaço, seus praticantes e suas
práticas. Dessa forma, a relação de tensão entre essas práticas de pesquisa
contribuiu para limitar a hegemonia de uma sobre a outra.
Retoma-se aqui o conceito de circularidade cultural de Ginzbug (1987),
percebendo que o movimento de influências recíprocas apontado pelo autor se dá
no sentido de que o processo de elaboração de uma teoria se efetiva exatamente
na prática. Parte daí a afirmação anunciada no início deste capítulo de que teorizar é
sempre praticar, concepção já posta por Azevedo (1964) quando este afirma que a
teoria tende à prática, uma vez que pensamos para realizar e construir, ou seja,
praticar. Nesse sentido, Fensterseifer (1999, p. 181, grifo nosso) afirma de modo
objetivo que
Pensar o que produzimos e o que se produz na Educaç ão Física, ou o que almejamos com nossa prática, é teorizar , e entendo ser essa a tarefa do professor/intelectual da Educação Física. Trabalho que permanece limitado, quando se esgota no momento da teoria (o que em parte tem acontecido na Educação Física). Por isso a necessidade de não romper com o diálogo teoria-prática, traduzido na dicotomia pensar-fazer, dualismo que habita tanto a fábrica quanto a escola.
Tomando como base essas orientações sobre o que é teorizar, é possível
pensar em teorizar sobre a escola e, também, teorizar com a escola, de modo que
não há separação possível entre tais práticas de teorização. Nessa esteira, pensa-se
que as 143 pesquisas a respeito da Educação Física escolar veiculadas pela revista
apresentaram alguma teoria de fundo, mesmo que essa não seja reconhecida, a
priori, pelos teóricos da área, capaz de contribuir para a atual configuração dos
estudos em Educação Física escolar.
Foram identificadas, então, diferentes denominações do que os autores
entendiam por teoria e como as representavam na revista durante os últimos 30
anos, bem como a recorrência delas. Podem ser verificadas na tabela que segue:
176
Tabela 5 – Representações de teorias encontradas na RBCE
TEORIA RECORRÊNCIAS Teorias Críticas da Educação e da Educação Física 70
Aptidão Física relacionada com a Saúde 20 História do Currículo/Disciplinas Curriculares 10
Teoria do Desenvolvimento Humano 7 Teoria das Representações Sociais 7
Teoria do Jogo 4 História Cultural 3 Psicomotricidade 3
Aprendizagem Motora 3 Teoria do Capital Humano 2
Teoria do Movimento Humano 2 Antropologia Interpretativa 2
Fenomenologia 2 Teoria da Personalidade 2
Psicologia Sócio-Histórica 2 Teoria Feminista 2
Pedagogia da Autonomia 2 Aprendizagem Social 1
Psicanálise 1 Teoria dos Sistemas 1 Teoria dos Valores 1 Etnografia Crítica 1 Teoria Foucaltiana 1
História Social da Infância 1 Teoria do Lazer 1
Teoria Antropológica 1 Teoria da Interpretação 1
Perspectiva Pós-estruturalista 1 Teoria do Gênero 1
Teoria das Mediações 1
Entendendo teoria como atitude epistemológica, isto é, conhecimento
fundamental à constituição da ciência, apresenta-se acima a configuração do campo
da Educação Física, em termos teóricos, por intermédio da RBCE. Destarte, aponta-
se que o fazer científico desse campo de conhecimento assim como suas práticas
de pesquisa se apresentam de forma bastante variada, visto ser um campo que
recebe influências de diferentes áreas do saber, manifestando, pois, suas
características.
No entanto, há uma outra hipótese explicativa para essa multiplicidade de
teorias. Segundo Robert Merton (1970), nas ciências sociais, a palavra teoria tem
sido empregada de forma bastante diversa, incluindo quase tudo, desde as menores
hipóteses de trabalho, as amplas mas vagas e desordenadas especulações, até os
sistemas axiomáticos de pensamento, daí o cuidado que se deve ter no uso da
palavra, pois, frequentemente, obscurece a compreensão ao invés de suscitá-la.
177
Esse parece ser o caso das diversas representações de teorias no campo da
Educação Física. No entanto, partindo das orientações de Charlot (2000) acerca da
leitura positiva dos fenômenos, é preciso reconhecer o esforço de alguns autores na
busca pela compreensão do espaço escolar, suas práticas e seus praticantes em
diferentes momentos desta recente história.
Considerando a importância de um teorizar sintetizador de conhecimento à
luz de necessidades específicas da prática pedagógica, as representações de
teorias identificadas surgem como resposta à multiplicidade de mobilizações que a
prática pedagógica requer, num constante “tensionamento” entre teoria e prática,
especulação e empiria.
Na perspectiva epistemológica dominante entre os cientistas
contemporâneos, é possível dizer que a principal característica das teorias é o seu
caráter provisório. A ciência não caminha através de acumulação linear de
conhecimentos, mas apoiada em sucessivos paradigmas que, segundo Kuhn, se
substituem sem fim, constituindo-se de um modo marcadamente descontínuo.
Considera-se uma teoria correta como a forma mais provável e mais eficiente de
explicar tal ou tal conjunto de questões, embora permanecendo aberta a revisões.
Assim, as verdades são sempre relativas e transitórias, representando o
estado da arte num momento fugidio. Parte de um jogo de conjecturas e refutações
que nunca se acaba: uma constante busca de modo que toda teoria, como
abordagem da realidade, é sempre parcial e seletiva, podendo um mesmo fato ser
explicado por diferentes perspectivas, sem, necessariamente, um estar errado.
Exemplo disso é que, em 12 dos 143 artigos, foi identificada mais de uma
representação de teoria na tentativa de explicar determinado fenômeno. Também é
possível afirmar que, mesmo os artigos que apontaram apenas uma teoria poderiam,
em outro momento, recorrer a outras teorias por entender que aquela não era
suficiente.
O esboço de organização teórica apresentado permite uma aproximação do
processo de constituição do modo de pensar a Educação Física, bem como dos
saberes que lhe deram suporte como disciplina escolar nos últimos 30 anos. Desse
modo, é possível afirmar que a trajetória de alguns teóricos da área conformou
modos de escrita e leitura e, consequentemente, de práticas de pesquisa nesse
campo.
178
Foi-se configurando aí uma linha tênue de continuidades e descontinuidades
no campo da Educação Física, com uma tradição de estudos marcadamente
relacionados com a aptidão física e saúde (20 artigos), nos quais se enfatiza o
processo de medição, o desempenho dos alunos nas capacidades físicas,
habilidades motoras e medidas antropométricas, com o objetivo de conferir uma
nota. Nessa abordagem, existe um modelo ideal e os testes servem para fornecer as
informações quantitativas que devem ser comparadas como uma norma, tabela ou
padrão.
Essa abordagem vai perdendo força e abrindo espaço para a conformação de
uma outra tradição no campo, a das teorias pedagógicas, que, no âmbito da
Educação Física, se colocam numa perspectiva crítica (70 artigos) em relação aos
usos e aos significados atribuídos pela sociedade às práticas escolares, contestando
fortemente os paradigmas de esporte de rendimento para a escola. No entanto, é
preciso dizer que o modelo esportivo e o biológico não foram abandonados e podem
ser encontrados com certa frequência nas aulas de Educação Física escolar.
Hobsbawn (1997) entende as tradições na medida em que sua invenção é
capaz de estabelecer ou legitimar relações de autoridade, socializar, inculcar ideias,
sistemas de valores e padrões de comportamento, como foi o caso de alguns
autores que se valeram de correntes teóricas para formar e conformar uma maneira
de pensar no campo, socializando conceitos, paradigmas e, consequentemente,
validando pessoas e posições por intermédio de artigos científicos veiculados na
RBCE, tomando-a como lugar de fala autorizada, isto é, como lugar de poder.
Assim, surgem novas formas de se pensar a Educação Física, resultando em
discussões, livros e artigos que, além de criticar o ocorrido até então, buscavam
elaborar novas propostas para a Educação Física na escola. Nesse sentido, a
Pedagogia da Educação Física brasileira encontra-se em um processo de
construção e de consolidação de suas vertentes críticas, com vários estudiosos
buscando novos elementos teóricos e metodológicos para os futuros
desenvolvimentos dessa área.
Dessa forma, em meados da década de 1980, começaram a aparecer as
teorias críticas da Educação e da Educação Física. As críticas estavam direcionadas
às intenções, às crenças e às suposições que estão subjacentes às práticas de
ensino e aprendizagem nas escolas. O pensamento crítico da Educação Física
acompanhou esse processo e vários autores apontaram para um movimento de
179
renovação teórica da Educação Física brasileira que, ao transformar-se, muda
radicalmente, não só em relação à sua prática, mas também com referência aos
pressupostos teóricos, dialeticamente produzidos e responsáveis pela mudança
dessa prática. Com isso as diferentes tendências críticas têm demonstrado
possibilidades de mudanças e contribuído para o debate e a reflexão no campo.
Outras representações de teoria bastante citadas na revista foram História do
Currículo e das Disciplinas Curriculares (10 artigos), Teoria do Desenvolvimento
Humano (7 artigos) e Teoria das Representações Sociais (7 artigos). Além dessas,
outras 25 diferentes representações de teorias foram identificadas na revista, porém
com recorrência reduzida (entre uma e quatro aparições).
Assim, dos 143 artigos cujo tema central é a escola, foram identificadas 30
distintas representações de teorias. Esse quantitativo indica uma organização
teórica diversificada que requer cuidado por parte dos autores dos artigos, visto que
são eles os responsáveis pela circulação dessa gama de teorias.
Apresentadas essas representações de teorias identificadas na RBCE, é
possível compreender melhor os discursos e práticas veiculados no campo,
especificamente no que se refere à Educação Física Escolar. Dentre essas
indicações de teorias, destaca-se a importância de cada uma para a constituição dos
discursos existentes hoje na área, incluindo aí os estudos sobre e com a escola,
fundamentais em suas particularidades para uma forma de pensar a Educação
Física Escolar nestes últimos 30 anos da Educação Física brasileira.
180
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo, foi realizado um mapeamento do estado da arte da produção
científica da RBCE sobre a temática Educação Física Escolar, visando a
compreender as representações de autores e editores em termos de práticas de
pesquisa e saberes científicos que circularam nos últimos 30 anos no campo da
Educação Física. A tentativa foi compreender as representações do processo
histórico de constituição do pensamento científico do campo pelos recursos teórico-
metodológicos empregados pelos pesquisadores.
A RBCE, por meio de seus editores, vale-se, estrategicamente, de seu lugar
de poder como órgão de divulgação da produção científica do CBCE para fazer
circular suas representações de práticas de pesquisas e saberes científicos no
campo da Educação Física. Apropria-se, para tanto, de discursos de outros campos
do conhecimento, as chamadas “ciências-mãe”, buscando com isso ser conhecida e
reconhecida na luta pelo monopólio da autoridade científica, num campo permeado
por interesses e relações de poder.
Entendida como dispositivo de controle e de didatização do campo, esse
periódico apresenta-se tal qual uma Biblioteca Pedagógica com a dupla função de
normatizar práticas e impor saberes, numa lógica organizacional cuja pretensão é
fornecer fundamentos para subsidiar a prática docente com um repertório de
saberes autorizados. Assim, a revista tornou-se referência para a comunidade,
normatizando e didatizando a leitura no campo e prescrevendo o que é interessante
e/ou desinteressante para a comunidade de leitores.
A leitura realizada sobre o campo da Educação Física, envolvendo o contexto
de criação, circulação e apropriação da RBCE, abarcou o seu ritmo de produção ao
longo de sua trajetória de três décadas. Conhecendo a periodicidade da revista,
percebe-se que ela se manteve ininterrupta até os dias atuais, por vezes se valendo
de estratégias editoriais para cumprir esse objetivo.
Exemplo disso é que a veiculação dos exemplares não seguiu a periodicidade
anunciada pela própria revista, frequentemente apresentando números atrasados.
Além da periodicidade, outro elemento que marcou sua trajetória foi a temática como
prática de produção de sentidos, em que os editores forjam suas marcas, quando
definem quais assuntos devem circular no campo.
181
Essa estratégia dos editores está relacionada com o acúmulo de capital
simbólico, de maneira a deter o poder de legitimar o que se julga merecedor de ser
reconhecido, valendo-se de uma memória seletiva para definir o que deveria ser
“publicizado” e/ou preservado pela RBCE. Pensa-se que a temática edivenciada por
um periódico revela intencionalidades, por vezes, veladas, do que realmente uma
instituição pretende investigar.
É preciso ressaltar que, durante os 30 anos de circulação da revista, apenas
um exemplar temático apresentou a Educação Física escolar como tema central.
Além disso, destaca-se o lançamento do primeiro Cadernos de Formação RBCE,
voltados, especificamente, às questões escolares e à prática docente. Mediante
esse fato, são lançadas duas indagações: será que os professores da escola terão
acesso a esse novo dispositivo como suporte e fonte de informações para sua
prática docente? Ou, mais uma vez, a circulação desse conhecimento ficará restrita
à academia?
Os estudos sobre a temática Educação Física escolar aparecem pulverizados
em diversos exemplares, com temas centrais variados, utilizando a escola e seus
praticantes como campo fértil de investigação. Essas representações parecem
indicar que muito se publica, mas poucos são os estudos que se direcionam à
prática pedagógica, visando à sua ressignificação. O que se comunica nas
publicações é o reflexo daquilo que se acredita e daquilo que se faz num campo
científico. Nesse sentido, existe a necessidade de direcionar os estudos de
investigação escolar para um vínculo mais estreito com a escola buscando diminuir
a distância entre aquilo que se produz na academia e o contexto concreto onde
ocorre a ação educativa: a escola.
Ao mapear os artigos, foram identificados dois movimentos de pesquisa aqui
denominados de sobre e com a escola. Os estudos abarcados por ambos os
movimentos são as representações das artes de fazer ciência em distintos
momentos da trajetória da revista e, principalmente, do campo, num processo de
continuidades e descontinuidades, com contribuições dos estudos sobre a escola,
sobre aqueles denominados de com a escola, e vice-versa, visto que a teoria
emerge da prática e nela se constitui.
Com base nos artigos cujos pesquisadores vivenciaram de alguma forma o
espaço escolar, conforme a perspectiva de estudos denominada de com a escola –
que inclui as categorias arte de coletar dados e arte de produzir dados – foram
182
identificados alguns elementos importantes para compreender a tipologia de ciência
que tem circulado no campo, quais sejam: número de artigos e sua distribuição nas
três últimas décadas; natureza das pesquisas; sistemas e níveis de ensino
privilegiados; composição da autoria do estudo; titulação dos autores; procedência
territorial dos artigos; relação dos estudos com o sistema de pós-graduação; e o uso
de teorias. Em suma, essa tipologia de ciência na Educação Física escolar pode ser
entendida como práticas de pesquisa em termos de recursos teórico-metodológicos
que fomentam os estudos no campo.
Essas artes de fazer veiculadas pelo periódico demonstraram que a produção
científica, no campo da Educação Física escolar, nos últimos 30 anos, se
apresentou com a seguinte configuração: os artigos classificados como arte de
coletar dados concentraram-se na década de 1980, e aqueles classificados como
arte de produzir dados foram mais recorrentes nas décadas de 1990 e 2000.
Portanto, houve alta variabilidade quanto à natureza das pesquisas mobilizadas para
realizar os estudos, prevalecendo as pesquisas de tipo correlacional, pesquisas
descritivas e pesquisa-ação.
Quanto ao sistema de ensino, o público apresentou-se como o principal locus
de pesquisas na área escolar, em detrimento do sistema privado. O ensino
fundamental apareceu como alvo de investimentos privilegiados, se comparado com
a educação infantil e com o ensino médio. Além disso, identificou-se considerável
quantidade de artigos cuja autoria foi organizada em coletividade, em detrimento da
organização individual, e maior recorrência de autores com titulação em nível de
doutorado, quando comparado com as demais titulações. Constatou-se significativa
parcela dos estudos concentrados na Região Sudeste, especialmente no Estado de
São Paulo, com parte considerável dos artigos ignorando a indicação de uma
possível relação do trabalho com o sistema de pós-graduação.
Essas práticas de pesquisa representam as bases metodológicas dos estudos
da RBCE acerca da Educação Física escolar. Esses elementos compuseram, então,
as representações em termos de métodos e técnicas científicos existentes na
produção da revista, no período investigado como um todo e, especificamente, em
determinados momentos com maior ênfase. Além destas, outras representações
foram identificadas, desta vez no que se refere aos aspectos teóricos.
Tendo em vista que o objetivo do trabalho foi conhecer o já feito, no sentido
de compreender as representações de autores e editores dadas a ler na revista,
183
quanto ao que vem sendo praticado em relação à Educação Física escolar, é
possível afirmar que as práticas especulativas sobre e as práticas empíricas com a
escola apresentaram uma trajetória de influências recíprocas, tal qual postula a
circularidade cultural de Ginzbrug (1987).
Apesar de alguns autores demonstrem não reconhecer que, mesmo nos
estudos em que a prática ganha mais destaque, existe embutida uma concepção de
teoria, uma vez que prática e teoria se encontram intrinsecamente imbricadas, não é
razoável pensar numa prática de pesquisa que não seja cotejada por uma teoria de
fundo. Desse modo, as práticas de pesquisa e os saberes científicos que se
materializaram no campo da Educação Física o fizeram, também, teoricamente,
remontando a conhecimentos já postos desde o século XIX, e que foram reforçados
durante o século XX.
Dessa forma, é possível teorizar sobre a escola e também teorizar com a
escola, conclusão que levou a entender a importância do corpus documental geral
de 143 pesquisas a respeito da escola para a atual configuração dos estudos em
Educação Física escolar. Assim, escolher uma dessas artes de fazer em detrimento
da outra seria reconhecer que uma é mais importante que a outra e o objetivo aqui
foi exatamente o contrário, ou seja, reforçar suas imbricações.
Levando em consideração essas artes de fazer e suas relações, identificou-se
na revista o uso de diferentes representações de teorias fomentando o debate sobre
Educação Física escolar. Foram empregadas na revista desde as menores
hipóteses de trabalho, as amplas e desordenadas especulações, até os sistemas
axiomáticos de pensamento, daí a multiplicidade de teorias. Contudo, das
representações de teoria identificadas, destacaram-se as Teorias Críticas da
Educação e da Educação Física; Aptidão Física Relacionada com a Saúde; História
do Currículo e das Disciplinas Curriculares; Teoria do Desenvolvimento Humano e
Teoria das Representações Sociais.
Nesse sentido, Gauthier et al. (1998) reforçam a articulação entre as práticas
de pesquisa e os saberes sobre os fazeres, defendendo a necessidade de uma
posição empírica e especulativa ao mesmo tempo, esboçando o que poderia vir a
ser, eventualmente, uma teoria geral da pedagogia, interpretando-a como teoria da
educação que é assumida como área de referência que influencia a Educação
Física.
184
A compreensão dessa relação parece ser o caminho para a constituição de
uma teoria da Educação Física brasileira, que possua como alicerce saberes
empíricos e especulativos apropriados de outros campos do conhecimento,
considerando seu processo de continuidades e descontinuidades ao longo da
trajetória da revista e, por conseguinte, do próprio campo da Educação Física.
185
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202
APÊNDICE A − Relação dos exemplares temáticos e não temáticos da RBCE
NÚMERO DE EXEMPLARES
REFERÊNCIA DA REVISTA
ANO Nº DE ARTIGOS
TEMÁTICA
1 v. 1, n.1 1979 1 -
2 v. 1, n. 2 1980 1 -
3 v. 1, n. 3 1980 7 -
4 v. 2, n. 1 1980 6 -
5 v. 2, n. 2 1981 5 -
6 v. 2, n. 3 1981 4 -
7 v. 3, n. 1 1981 3 -
8 v. 3, n. 2 1982 4 -
9 v. 3, n. 3 1982 4 -
10 v. 4, n. 1 1982 4 -
11 v. 4, n. 2 1983 5 -
12 v. 4, n. 3 1983 4 -
13 v. 5, n. 1 1983 Anais -
14 v. 5, n. 2 1984 4 -
15 v. 5, n. 3 1984 2 -
16 v. 6, n. 1 1984 4 -
17 v. 6, n. 2 1985 4 -
18 v. 6, n. 3 1985 5 -
19 v. 7, n.1 1985 Anais -
20 v. 7, n.2 1986 5 -
21 v. 7, n.3 1986 5 -
22 v. 8, n.1 1986 6 -
23 v. 8, n. 2 e 3 1987 7 O que é Motricidade Humana?
24 v. 9, n. 1 1987 Anais -
25 v. 9, n. 2 1988 6 Dirigente Esportivo
26 v. 9, n. 3 1988 4 O que é Deficiência?
27 v. 10, n. 1 1988 3 Dez Anos de CBCE
28 v. 10, n. 2 1989 2 -
203
29 v. 10, n. 3 1989 2 -
30 v. 11, n. 1 1989 Anais -
31 v. 11, n. 2 1990 9 -
32 v. 11, n. 3 1990 4 -
33 v. 12, n. 1, 2 e 3
1992 10 Lazer como Tema
34 v. 13, n.1 1991 Anais -
35 v. 13, n. 2 1992 2 Educação Física: Ensino
36 v. 13, n. 3 1992 3 Aprendizagem Motora
37 v. 14, n. 1 1992 3 -
38 v. 14, n. 2 1993 4 -
39 v. 14, n. 3 1993 7 -
40 v. 15, n. 1 1993 Anais -
41 v. 15, n. 2 1994 4 -
42 v. 15, n. 3 1994 6 Educação Física/Esportes e a questão do Gênero
43 v. 16, n. 1 1994 7 Metodologia em Educação Física /Esportes
44 v. 16, n. 2 1995 5 Legislação da Educação Física /Esportes
45 v. 16, n. 3 1995 5 Avaliação em Educação Física /Esportes
46 v. 17, n. 1 1995 Anais -
47 v. 17, n. 2 1996 7 Interdisciplinaridade, Ciência e Pedagogia
48 v. 17, n.3 1996 6 Esporte, Comunicação e Mídia
49 v. 18, n.1 1996 5 -
50 v. 18, n. 2 1997 6 Educação Física, Lazer e Meio Ambiente
51 v. 18, n. 3 1997 4 -
52 v. 19, n. 2 1998 4 -
53 v. 19, n. 3 1998 4 -
54 v. 20, n.1 1998 5 Pós-Graduação em Educação Física
55 Especial 20 anos CBCE
1998 9 -
56 v. 20, n. 2 e 3 1999 7 -
v. 21, n.1, cad. 1
1999 Programação - 57
v. 21, n.1, cad. 2
1999 110 -
204
v. 21, n.1, cad. 3
1999 116 -
58 v. 21, n. 2 e 3 2000 16 -
59 v. 22, n. 1 2000 8 Epistemologia e Educação Física
60 v. 22, n. 2 2001 12 Saúde e Qualidade de Vida
61 v. 22, n. 3 2001 9 Formação Profissional Docente e Prática Educativa em Educação Física
62 v. 23, n. 1 2001 9 As Cartas Brasileiras de Educação Física
63 v. 23, n. 2 2002 12 Educação Física Escolar
64 v. 23, n. 3 2002 10 Atividade Física e Envelhecimento
65 v. 24, n. 1 2002 14 Bases Biológicas da Educação Física e Esporte
66 v. 24, n. 2 2003 12 Pós-Graduação em Educação Física
67 v. 24, n. 3 2003 12 Políticas Públicas em Educação Física, Esporte e Lazer
68 v. 25, n.1 2003 14 História da Educação Física e Esporte
69 v. 25, n. 2 2004 10 História da Educação Física e Esporte
70 v. 25, n. 3 2004 10 Educação Física Adaptada
71 v. 26, n.1 2004 11 Treinamento em Educação Física/Ciências do Esporte
72 v. 26, n. 2 2005 11 Linguagem, Comunicação, Mídia e Educação Física/Ciências do Esporte
73 v. 26, n. 3 2005 11 Infância e Educação Física/Ciências do Esporte
74 v. 27, n. 1 2005 11 Doping, Desempenho e Vida
75 v. 27, n. 2 2006 11 Jogo e Educação Física/Ciências do Esporte
76 v. 27, n. 3 2006 12 Saúde, Sociedade e Educação Física/Ciências do Esporte
77 v. 28, n. 1 2006 12 O Local e o Global na Prática Cotidiana da Educação Física/Ciências do Esporte
78 v. 28, n. 2 2007 14 Didática, Educação Física/Ciências do Esporte
79 v. 28, n. 3 2007 12 Meio Ambiente
80 v. 29, n.1 2007 13 Avaliação da Produção Científica em Educação Física/Ciências do Esporte
81 v. 29, n. 2 2008 13 Biomecânica do Movimento Humano
82 v. 29, n. 3 2008 12 Marketing da Atividade Física e do Esporte
83 v.30, n.1 2008 12 Estatuto do Torcedor e o Espetáculo Esportivo
84 v.30, n. 2 2009 13 -
85 v.30, n. 3 2009 14 -
86 v.31, n. 1 2009 13 -
205
APÊNDICE B −−−− Relação dos presidentes do CBCE e seus mandatos
BIÊNIO
PRESIDENTES DO CBCE
1978-1981 VICTOR KEIHAN RODRIGUES MATSUDO
1981-1983 CLÁUDIO GIL SOARES DE ARAÚJO
1983-1985 OSMAR PEREIRA SOARES DE OLIVEIRA
1985-1987 LAÉRCIO ELIAS PEREIRA
1987-1989 CELI NELZA ZULKE TAFFAREL
1989-1991 CELI NELZA ZULKE TAFFAREL
1991-1993 VALTER BRACHT
1993-1995 VALTER BRACHT
1995-1997 ELENOR KUNZ
1997-1999 ELENOR KUNZ
1999-2001 LINO CASTELLANI FILHO
2001-2003 LINO CASTELLANI FILHO
2003-2005 ANA MÁRCIA SILVA
2005-2007 FERNANDO MASCARENHAS
2007-2009 FERNANDO MASCARENHAS
2009-2011 LEONARDO ALEXANDRE PEYRÉ TARTARUGA
206
APÊNDICE C – Demonstrativo das edições dos CONBRACEs e de suas respectivas datas, locais e temas
EDIÇÃO
DATA
LOCAL
TEMA
I CONBRACE SET 1979 SÃO CAETANO DO SUL/SP
A CRIANÇA BRASILEIRA E A ATIVIDADE FÍSICA
II CONBRACE SET 1981 LONDRINA/PR
ESPORTE NO BRASIL
IIICONBRACE SET 1983 GUARULHOS/SP
TREINAMENTO DESPORTIVO
IV CONBRACE SET 1985 POÇOS DE CALDAS/MG
AS CIÊNCIAS DO ESPORTE NA NOVA REPÚBLICA
V CONBRACE SET 1987 OLINDA/PE
A CRIANÇA E O ESPORTE NO BRASIL
VI CONBRACE SET 1989 BRASÍLIA/DF
ESPORTE E MUDANÇA NA AMÉRICA LATINA: PERSPECTIVA DE INTEGRAÇÃO
VII CONBRACE SET 1991 UBERLÂNDIA/MG PRODUÇÃO E VEICULAÇÃO DO CONHECIMENTO NA EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTE E LAZER NO BRASIL: ANÁLISE CRÍTICA E PERSPECTIVAS
VIII CONBRACE SET 1993 BELÉM/PA
QUE CIÊNCIA É ESSA? MEMÓRIA E TENDÊNCIAS
IX CONBRACE SET 1995 VITÓRIA/ES INTERDISCIPLINARIDADE, CIÊNCIA E PEDAGOGIA
X CONBRACE OUT 1997 GOIÂNIA/GO EDUCAÇÃO FÍSICA/ESPORTES: RENOVAÇÕES, MODISMOS E INTERESSES
XI CONBRACE SET 1999 FLORIANÓPOLIS/SC EDUCAÇÃO FÍSICA/ESPORTE: INTERVENÇÃO E CONHECIMENTO
XII CONBRACE OUT 2001 CAXAMBU/MG SOCIEDADE, CIÊNCIA E ÉTICA: DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA/CIÊNCIAS DO ESPORTE
XIII CONBRACE SET 2003 CAXAMBU/MG 25 ANOS DE HISTÓRIA:O PERCURSO DO CBCE NA EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA
XIVCONBRACE SET 2005 PORTO ALEGRE/RS
CIÊNCIA PARA A VIDA
XV CONBRACE SET 2007
RECIFE/PE
POLÍTICA CIENTÍFICA E PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO EM EDUCAÇÃO FÍSICA
XVI CONBRACE SET 2009
SALVADOR/BA FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE: POLÍTICAS E COTIDIANO
207
APÊNDICE D – Ficha técnica da RBCE REFERÊNCIA FICHA TÉCNICA
N 1 1979
Presidente: Victor K. R. Matsudo Presidente Eleito: Cláudio Gil S. de Araújo Vice-presidente de Medicina: Plínio Montemor Vice-presidente de Educação: Laércio Elias Pereira Vice-presidente de Ciências Básicas: Paulo Sérgio Gomes
Secretário-executivo: Marco Antônio Vívolo Tesoureiro: Osmar P. S. de Oliveira Comitês: Cineantropometria: Cláudio Gil S. de Araújo Psicologia: Sandra Mara Cavasini Educação: Laércio Elias Pereira
N 2 1980
Diretor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Chefe: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Científico: Jorge Pinto Ribeiro Editor-Executivo: Carlos Roberto Duarte Editores de Seção: Avaliação: José Ney Ferraz Guimarães Cresc./ Desenv.: Ana Maria Tarapanoff
Educação: Lamartine Pereira da Costa Medicina: Plínio Montemór Psicologia e Sociedade: Sandra Maria Cavasini Treinamento Desportivo: Manoel José Gomes Tubino
VOL 1
N 3 1980
IDEM ANTERIOR
N 1 1980
IDEM ANTERIOR
N 2 1981
IDEM ANTERIOR
VOL 2
N 3 1981
IDEM ANTERIOR
N 1 1981
Diretor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Executivo: Carlos Roberto Duarte
N 2 1982
Diretor Responsável e Editor: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Executivo: Nelson Gomes Bittencourt
VOL 3
N 3 1982
Diretor Responsável e Editor: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Executivo: Nelson Gomes Bittencourt Editores-Científicos: Área Pedagógica: Alfredo Gomes Faria Junior Área Biomédica: Maurício Leal Rocha
N 1 1982
Diretor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Executivo: Carlos Roberto Duarte Editores-Científicos: Área Pedagógica: Alfredo Gomes Faria Junior Área Biomédica: Maurício Leal Rocha
VOL 4
N 2 1983
Editor-Chefe: Carlos Roberto Duarte Editor-Científico: Marco Antônio Vívolo
208
Editora Executiva: Maria de Fátima da Silva Duarte Editor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira
N 3 1983
Editor-Chefe: Carlos Roberto Duarte Editor-Científico: Marco Antônio Vívolo Editora-Executiva: Maria de Fátima da Silva Duarte Editor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira
N 1 1983
Diretor Responsável e Editor: Osmar Pereira Soares de Oliveira Editor-Executivo: Carlos Roberto Duarte Editores-Científicos: Área Pedagógica: Alfredo Gomes Faria Junior Área Biomédica: Maurício Leal Rocha
N 2 1984
Editor-Chefe: Carlos Roberto Duarte Editor-Científico: Marco Antônio Vívolo Editora-Executiva: Maria de Fátima da Silva Duarte Editor Responsável: Osmar Pereira Soares de Oliveira
VOL 5
N 3 1984
IDEM ANTERIOR
N 1 1984
IDEM ANTERIOR
N 2 1985
IDEM ANTERIOR
VOL 6
N 3 1985
IDEM ANTERIOR
N 1 1985
IDEM ANTERIOR
N 2 1986
Comissão Científica: Ademir Gebara Ieda F. da Silveira Folegatti João Batista Freire da Silva Roseli Golfetti
Silvana Venâncio Freire Wagner Wey Moreira
VOL 7
N 3 1986
Comissão Científica: Ademir Gebara Asdrubal Ferreira batista Ieda F. da Silveira Folegatti Idico Luiz Pellegrinotti João Batista Freire da Silva
Roseli Golfetti Silvana Venâncio Freire Wagner Wey Moreira
N 1 1986
Editora Científica: Antonia Dalla Pria Bankoff Comissão Científica: Ademir Gebara Asdrubal Ferreira batista Ieda F. da Silveira Folegatti Idico Luiz Pellegrinotti
João Batista Freire da Silva Roseli Golfetti Silvana Venâncio Freire Wagner Wey Moreira
VOL 8
N 2 e 3 1987
IDEM ANTERIOR
VOL 9 N 1 1987
IDEM ANTERIOR
209
N 2 1988
Editora Científica: Antonia Dalla Pria Bankoff Comissão Científica: Asdrubal Ferreira batista Ieda F. da Silveira Folegatti Idico Luiz Pellegrinotti
João Batista Freire da Silva Silvana Venâncio Freire Wagner Wey Moreira
N 3 1988
Editora Científica: Antonia Dalla Pria Bankoff Organização: Apolonio Abadio do Carmo Comissão Científica: Asdrubal Ferreira Batista Ieda F. da Silveira Folegatti João Batista Freire da Silva Silvana Venâncio Freire Wagner Wey Moreira
N 1 1988
Responsável pela edição: Laércio Elias Pereira
N 2 1989
Editora Científica: Rossana Valéria de Souza e Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Alfredo Gomes de Faria Jr. Antônio Carlos Amadio Apolônio Abadio do Carmo Haimo H. Fensterseifer
VOL 10
N 3 1989
Editora Científica: Rossana Valéria de Souza e Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Alfredo Gomes de Faria Jr. Antônio Carlos Amadio
Apolônio Abadio do Carmo Haimo H. Fensterseifer Assessoria Técnica e Revisão: Iêda F. da Silveira Folegatti
N 1 1989
Editora Científica: Rossana Valéria de Souza e Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Alfredo Gomes de Faria Jr. Apolônio Abadio do Carmo
Haimo H. Fensterseifer Apoio Técnico: Iêda F. da Silveira Folegatti Revisão: Iara de Carvalho/ Micheli Ortega Escobar
N 2 1990
Presidente: Celi N. Z. Taffarel Vice-Presidente: Aguinaldo Gonçalves Diretor-Científico: Valter Bracht Diretor-Administrativo: Gabriel H. M. Palafox Diretor de Divulgação: Alfredo Gomes de Faria Jr. Diretor-Financeiro: Lino Castellani Filho Editor-Chefe: Aguinaldo Gonçalves Editoria Adjunta: Flávia Maria S. Guirotto Iêda Fonseca da S. Folegatti
Rossana Valéria de Souza e Silva Conselho Editorial: Alfredo Gomes de Faria Jr. Apolônio Abadio do Carmo José Guilmar Mariz de Oliveira Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Vilmar Baldissera Revisão: Yara de Carvalho Lino Castelani Filho
VOL 11
N 3 1990
Presidente: Celi N. Z. Taffarel Vice-Presidente: Aguinaldo Gonçalves Diretor-Científico: Valter Bracht Diretor-Administrativo: Gabriel H. M. Palafox Diretor de Divulgação: Alfredo Gomes de Faria Jr.
Apolônio Abadio do Carmo Jorge Pinto Ribeiro José Guilmar Mariz de Oliveira Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino
210
Diretor-Financeiro: Lino Castellani Filho Editor-Chefe: Aguinaldo Gonçalves Editoria Adjunta: Flávia Maria S. Guirotto Iêda Fonseca da S. Folegatti Conselho Editorial: Alfredo Gomes de Faria Jr.
Vilmar Baldissera Revisão: Yara de Carvalho Flávia Maria S. Guirotto
VOL 12 N 1, 2, 3 1992
Presidente: Celi N. Z. Taffarel Vice-Presidente: Aguinaldo Gonçalves Diretor-Científico: Valter Bracht Diretor-Administrativo: Gabriel H. M. Palafox Diretor de Divulgação: Alfredo Gomes de Faria Jr. Diretor-Financeiro: Lino Castellani Filho Editor-Chefe: Aguinaldo Gonçalves Editoria Adjunta: Flávia Maria S. Guirotto
Iêda Fonseca da S. Folegatti Conselho Editorial: Alfredo Gomes de Faria Jr. Apolônio Abadio do Carmo Jorge Pinto Ribeiro José Guilmar Mariz de Oliveira Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Vilmar Baldissera
N 1 1991
Editora Científica: Rossana Valéria de Souza e Silva Comissão Editorial:Alberto Martins da Costa Apolônio Abadio do Carmo Geni de Araújo Costa
Marina Borges Forti Rossana Valéria de Souza e Silva Revisão: Marina Borges Forti Jussara Martins da Costa
N 2 1992
Presidente: Valter Bracht Vice-Presidente: João Paulo S. Medina Diretor-Científico: Aguinaldo Gonçalves Diretor-Administrativo: Amauri Bássoli de Oliveira Diretor de Divulgação: Maurício Roberto da Silva Diretor-Financeiro: Wenceslau Leães Filho Editor-Chefe: Elenor kunz Editoria Adjunta: Ana Márcia de Souza Carlos Luiz Cardoso Iara Regina Damiani de Oliveira Julio Cesar Schmidt Rocha
Maria Cecília de Miranda Mocker Maria do Carmo Saraiva Kunz Raquel Stela de Sá Siebert Conselho Editorial: Aloísio Avila Apolônio Abadio do Carmo Marcos Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Vilmar Baldissera
VOL 13
N 3 1992
IDEM ANTERIOR
N 1 1992
IDEM ANTERIOR
N 2 1993
IDEM ANTERIOR
VOL 14
N 3 1993
IDEM ANTERIOR
N 1 1993
IDEM ANTERIOR VOL 15
N 2 1994
Presidente: Valter Bracht Vice-Presidente: João Paulo S. Medina Diretor-Científico: Aguinaldo Gonçalves Diretor-Administrativo: Amauri Bássoli de Oliveira
Maria Cecília de Miranda Mocker Maria do Carmo Saraiva Kunz Paulo R. C. Capela Raquel Stela de Sá Siebert
211
Diretor de Divulgação: Maurício Roberto da Silva Diretor Financeiro: Wenceslau Leães Filho Editor Chefe: Elenor kunz Editoria Adjunta: Ana Márcia de Souza Carlos Luiz Cardoso Giovani Pires Iara Regina Damiani de Oliveira Julio Cesar Schmidt Rocha
Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio do Carmo Celi Taffarel Elaine Romero Marcos Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
N 3 1994
Presidente: Valter Bracht Vice-Presidente: Elenor Kunz Diretor-Científico: Silvana Goellner Diretor-Administrativo: Iracema Soares Diretor de Divulgação: Sérgio Carvalho Diretor-Financeiro: Wilton Trapp Editor-Chefe: Elenor kunz Editoria-Adjunta: Ana Márcia de Souza Carlos Luiz Cardoso Giovani Pires Iara Regina Damiani de Oliveira Julio Cesar Schmidt Rocha
Maria Cecília de Miranda Mocker Maria do Carmo Saraiva Kunz Paulo R. C. Capela Raquel Stela de Sá Siebert Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio do Carmo Celi Taffarel Elaine Romero Marcos Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
N 1 1994
IDEM ANTERIOR
N 2 1995
Presidente: Valter Bracht Vice-Presidente: Elenor Kunz Diretor-Científico: Silvana Goellner Diretor-Administrativo: Iracema Soares Diretor de Divulgação: Sérgio Carvalho Diretor-Financeiro: Wilton Trapp Editor-Chefe: Elenor kunz Editoria-Adjunta: Ana Márcia de Souza Carlos Luiz Cardoso Giovani Pires Iara Regina Damiani de Oliveira Ingrid Dietrich Wiggers Iracema Soares Juarez Muller Dias
Julio Cesar Schmidt Rocha Maria Cecília de Miranda Mocker Maria do Carmo Saraiva Kunz Maurício Roberto da Silva Paulo R. C. Capela Raquel Stela de Sá Siebert Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio do Carmo Celi Taffarel Elaine Romero Marcos Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
VOL 16
N 3 1995
Presidente: Valter Bracht Vice-Presidente: Elenor Kunz Diretor-Científico: Silvana Goellner Diretor-Administrativo: Iracema Soares Diretor de Divulgação: Sérgio Carvalho Diretor-Financeiro: Wilton Trapp
Julio Cesar Schmidt Rocha Maria Cecília de Miranda Mocker Maria do Carmo Saraiva Kunz Maurício Roberto da Silva Paulo R. C. Capela Raquel Stela de Sá Siebert
212
Editor-Chefe: Elenor kunz Editoria Adjunta: Ana Márcia de Souza Carlos Luiz Cardoso Giovani Pires Iara Regina Damiani de Oliveira Ingrid Dietrich Wiggers Iracema Soares Janice Zarperllon Mazo Juarez Muller Dias
Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio do Carmo Celi Taffarel Elaine Romero Marcos Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
N 1 1995
Supervisão e Edição: Silvana V. Goellner
N 2 1996
Diretor-Executivo: Giovani De Lorenzi Pires Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Elaine Romero
Markus Vinícius Nahas Maria Gláucia Costa Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
VOL 17
N 3 1996
IDEM ANTERIOR
N 1 1996
IDEM ANTERIOR
N 2 1997
IDEM ANTERIOR
VOL 18
N 3 1997
IDEM ANTERIOR
N 1 1997
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edson Claro Elaine Romero Luiz Osório Cruz Portela Maria Gláucia Costa
Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Suraya Darido Valter Bracht Vicente Molina Neto
N 2 1998
IDEM ANTERIOR
VOL 19
N 3 1998
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia S. de Souza
Maria Gláucia Costa Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Rossana Valéria de S. e Silva Suraya Darido Valter Bracht
213
Francisco da Rosa Neto Go Tani Luiz Osório Cruz Portela
Vitor Marinho de Oliveira
N 1 1998
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia S. de Souza Francisco da Rosa Neto Go Tani Luiz Osório Cruz Portela Maria Gláucia Costa
Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Rossana Valéria de S. e Silva Sebastião Iberes Suraya Darido Valter Bracht Vicente Molina Neto Vitor Marinho de Oliveira
Especial 20 anos
1999
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia S. de Souza Francisco da Rosa Neto Go Tani Luiz Osório Cruz Portela
Maria Gláucia Costa Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Rossana Valéria de S. e Silva Suraya Darido Valter Bracht Vitor Marinho de Oliveira
VOL 20
N 2 e 3 1999
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia As.de Souza Francisco da Rosa Neto Go Tani Ingrid Marianne Baecker Luiz Osório Cruz Portela
Maria Gláucia Costa Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Rossana Valéria de S. e Silva Sebastião Iberes Suraya Darido Valter Bracht Vicente Molina Neto Vitor Marinho de Oliveira
VOL 21 N 1 CAD. 1,
2, 3 1999
Diretor-Executivo: Osni Jacó da Silva Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel
Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen
214
Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia S. de Souza Francisco da Rosa Neto Go Tani Luiz Osório Cruz Portela
Maria Gláucia Costa Rossana Valéria de S. e Silva Sebastião Iberes Suraya Darido Valter Bracht Vicente Molina Neto Vitor Marinho de Oliveira
N 2 e 3 2000
Editor-Executivo: Amarílio Ferreira Neto Apoio ao Editor: Omar Schneider Conselho Editorial: Aguinaldo Gonçalves Apolônio Abadio Celi Neuza Zulke Taffarel Edio L. Petroski Edson Claro Elaine Romero Eustáquia S. de Souza Francisco da Rosa Neto Go Tani Ingrid Marianne Baecker Maria Gláucia Costa
Markus Vinícius Nahas Mauro Betti Nelson Carvalho Marcellino Ricardo Demétrio Petersen Rossana Valéria de S. e Silva Sebastião Iberes Suraya Darido Valter Bracht Vicente Molina Neto Vitor Marinho de Oliveira Luiz Osório Cruz Portela
N 1 2000
Editor-Executivo: Amarílio Ferreira Neto Apoio ao Editor: Omar Schneider Conselho Editorial: Antonio Carlos Bramante Celi Neuza Zulke Taffarel Dartagnan Pinto Guedes Eduardo Kokubun Elenor Kunz
Go Tani Valter Bracht Consultores: sócios pesquisadores doutores do CBCE Revisão Bibliográfica: Dulce Inês L. dos S. Augusto Traduções: Inglês: Priscila Favalessa/ Marco Vinício S. Franco
Espanhol: Elizabeth B. de Araújo Coedição: CBCE-Editora Autores Associados
N 2 2001
IDEM ANTERIOR
VOL 22
N 3 2001
IDEM ANTERIOR
N 1 2001
IDEM ANTERIOR
N 2 2002
Editor-Executivo: Amarílio Ferreira Neto Apoio ao Editor: Ana Cláudia S.Nascimento Conselho Editorial: Antonio Carlos Bramante Celi Neuza Zulke Taffarel Dartagnan Pinto Guedes Eduardo Kokubun
Elenor Kunz Go Tani Valter Bracht Consultores: sócios pesquisadores doutores do CBCE Revisão Bibliográfica: Dulce Inês L. dos S. Augusto Coedição: CBCE-Editora Autores Associados
VOL 23
N 3 2002
IDEM ANTERIOR
215
N 1 2002
IDEM ANTERIOR
N 2 2003
IDEM ANTERIOR
VOL 24
N 3 2003
IDEM ANTERIOR
N 1 2003
IDEM ANTERIOR
N 2 2004
Editor-Executivo: Jocimar Daolio Editora Adjunta: Carmem Lúcia Soares Apoio ao Editor: Ana Cláudia Silvério Nascimento Conselho Editorial: Antonio Carlos Bramante Celi Neuza Zulke Taffarel Dartagnan Pinto Guedes Eduardo Kokubun
Elenor Kunz Go Tani Valter Bracht Consultores: sócios pesquisadores doutores do CBCE Revisão Bibliográfica: Dulce Inês L. dos S. Augusto Coedição: CBCE-Editora Autores Associados
VOL 25
N 3 2004
Editores: Jocimar Daolio Carmem Lúcia Soares Apoio ao Editor: Ana Cláudia Silvério Nascimento Consultores: sócios pesquisadores doutores do CBCE Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Alexandre Fernandez Vaz Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
N 1 2004
Editores: Jocimar Daolio Carmem Lúcia Soares Apoio ao Editor: Dulce Inês L. dos S. Augusto Romildo Sotério de Magalhães Consultores: pesquisadores doutores da Educação Física/Ciências do Esporte e áreas afins Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Alexandre Fernandez Vaz Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
N 2 2005
IDEM ANTERIOR
VOL 26
N 3 2005
IDEM ANTERIOR
N 1 2005
IDEM ANTERIOR VOL 27
N 2 IDEM ANTERIOR
216
2006
N 3 2006
Editores: Alex Branco Farga Silvana Vilodre Goellner Apoio ao Editor: Dulce Inês L. dos S. Augusto Renato Machado Saldanha Consultores: pesquisadores doutores da Educação Física/Ciências do Esporte e áreas afins Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Alexandre Fernandez Vaz Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
N 1 2006
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N 2 2007
Editores: Alex Branco Farga Silvana Vilodre Goellner Apoio ao Editor: Renato Machado Saldanha Consultores: pesquisadores doutores da Educação Física/Ciências do Esporte e áreas afins Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Alexandre Fernandez Vaz Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
VOL 28
N 3 2007
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N 1 2007
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N 2 2008
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VOL 29
N 3 2008
Editor: Alexandre Fernandez Vaz Editor Adjunto: Marcus Aurélio T. de Oliveira Apoio aos Editores: Ana Cristina Richter Felipe Q. de Almeida Jaison José Bassani Consultores: pesquisadores doutores da Educação Física/Ciências do Esporte e áreas afins Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
N 1 IDEM ANTERIOR
217
2008
N 2 2009
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VOL 30
N 3 2009
Editor: Alexandre Fernandez Vaz Editor Adjunto: Marcus Aurélio T. de Oliveira Apoio aos Editores: Ana Cristina Richter Felipe Q. de Almeida Jaison José Bassani Michelle Carreirão Gonçalves Consultores: pesquisadores doutores da Educação Física/Ciências do Esporte e áreas afins Coedição: CBCE-Editora Autores Associados Conselho Editorial: Andreas H. Trebels Christopher Rojek David W. Hill
Eduardo Kokubun Georges Vigarello Hugo Rodolfo Lovisolo Go Tani Manuela Hasse Mauro Betti Pietro Cerveri Ricardo M. L. de Barros Valter Bracht
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