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1 O SISTEMA MANDALA DE PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UMA ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR Renata Knychala Martins Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Nathália Salgado Silva Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Maiara Oliveira Fernandes Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Jaluza Maria Lima Silva Borsato Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Resumo O presente artigo tem por objetivo analisar como o Sistema Mandala de Produção de Alimentos pode ser uma estratégia para o desenvolvimento da agricultura familiar. Como metodologia realizou-se uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, por meio de um estudo de caso na Associação dos Mandaleiros de Uberlândia – MG. Os resultados mostraram que o Sistema Mandala na produção de alimentos em Uberlândia é um projeto inovador, que além de trabalhar com produção orgânica por meio da agricultura familiar, possibilita às famílias rurais da região uma melhor condição de vida, do ponto de vista econômico e social. Palavras-chave: Agricultura Familiar, Sistema Mandala, Desenvolvimento Rural. Introdução Segundo Wanderley (2001), a agricultura familiar caracteriza-se por ser uma forma de produção, na qual, a família, além de ser dona da terra, é responsável pelo trabalho desenvolvido em sua propriedade. Ela se baseia no cultivo de terras por pequenos proprietários rurais, sendo que a mão de obra é essencialmente proveniente do núcleo familiar, ao contrario da agricultura patronal que se utiliza de trabalhadores contratados em propriedades médias ou grandes.

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SISTEMA DE HORTA MANDALA E AGRICULTURA FAMILIAR

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O SISTEMA MANDALA DE PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: UMA ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA

FAMILIAR

Renata Knychala Martins Universidade Federal de Uberlândia – UFU

[email protected]

Nathália Salgado Silva Universidade Federal de Uberlândia – UFU

[email protected]

Maiara Oliveira Fernandes Universidade Federal de Uberlândia – UFU

[email protected]

Jaluza Maria Lima Silva Borsato Universidade Federal de Uberlândia – UFU

[email protected]

Resumo

O presente artigo tem por objetivo analisar como o Sistema Mandala de Produção de Alimentos pode ser uma estratégia para o desenvolvimento da agricultura familiar. Como metodologia realizou-se uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, por meio de um estudo de caso na Associação dos Mandaleiros de Uberlândia – MG. Os resultados mostraram que o Sistema Mandala na produção de alimentos em Uberlândia é um projeto inovador, que além de trabalhar com produção orgânica por meio da agricultura familiar, possibilita às famílias rurais da região uma melhor condição de vida, do ponto de vista econômico e social.

Palavras-chave: Agricultura Familiar, Sistema Mandala, Desenvolvimento Rural.

Introdução

Segundo Wanderley (2001), a agricultura familiar caracteriza-se por ser uma forma de

produção, na qual, a família, além de ser dona da terra, é responsável pelo trabalho

desenvolvido em sua propriedade. Ela se baseia no cultivo de terras por pequenos

proprietários rurais, sendo que a mão de obra é essencialmente proveniente do núcleo

familiar, ao contrario da agricultura patronal que se utiliza de trabalhadores contratados

em propriedades médias ou grandes.

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A prática da agricultura familiar atualmente encontra inúmeras dificuldades para

manter-se em uma sociedade capitalista, cujos modelos produtivos seguem um padrão,

que muitas vezes, o pequeno proprietário e sua família não possui condições de

acompanhar.

Dentre estas dificuldades estão a falta de regulamentação das pequenas propriedades

rurais, a insuficiência de meios de se produzir e comercializar os produtos cultivados

pelo pequeno produtor, a insuficiência da renda obtida através da comercialização dos

produtos, a falta de instrução dos agricultores com relação ao processo produtivo e

principalmente, a falta de espaço e oportunidade ao pequeno produtor de se manter

dignamente no campo, se mantendo fiel aos princípios herdados da agricultura familiar

(BASTOS, 2010).

Apesar das dificuldades, a partir da década de 1990 aumentou as discussões sobre a

importância social, econômica e cultural da agricultura familiar na sociedade

contemporânea, propiciando um ambiente favorável para o debate da importância

dessas unidades produtivas para a agricultura e para a sociedade.

Segundo a lei brasileira, de número 11.326 de 24 de julho de 2006, agricultor familiar é

aquele que pratica atividades no meio rural, não detenha área maior do que quatro

módulos fiscais predomine mão de obra da própria família, tenha a renda familiar

predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio

estabelecimento, e que a gerencia do empreendimento seja feita pela família.

Este tipo de agricultura é de grande importância para o Brasil, já que cerca de 60% dos

alimentos que os brasileiros consomem são originados por este setor familiar. É possível

verificar a importância da agricultura familiar em setores como a de produção de

mandioca, já que são responsáveis por 87% da produção brasileira, feijão, com 70%,

milho, com 46%, café, 38%, arroz 34%, trigo 21%, e na pecuária, 60% do leite (IBGE,

2006).

Segundo dados do Censo Agropecuário (2006), 84,4% do total de propriedade rurais

brasileiras pertencem a grupos familiares. Aproximadamente 4,4 milhões de unidades

produtivas, sendo que a metade esta na Região Nordeste.

O interesse na agricultura familiar e crescente a partir dos anos de 90. Este interesse foi

materializado na formação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

Familiar (PRONAF) e na criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

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Apesar da criação de programas e ministérios voltados para a agricultura familiar, não é

este setor que recebe intensos apoios do Governo Federal, visto que 70% dos incentivos

são destinados para a agricultura patronal.

A agricultura familiar gera mais de 80% da ocupação do setor rural. Ela utiliza-se de

praticas produtivas rurais ecológicas, como o não uso de produtos químicos e a

diversificação de cultivos.

Essa atenção às práticas ecologicamente corretas, segundo Wanderley (2001) mostrou

que o meio rural sempre visto como fonte de problemas, hoje parece como portador de

soluções, vinculadas à melhoria do emprego e da qualidade de vida.

Tendo em vista todos os benefícios que a agricultura família é capaz de fornecer tanto

para o meio ambiente, quando para o desenvolvimento econômico rural, é de se desejar

uma maior relevância por parte do governo para este setor, proporcionando subsídios

financeiros, assistência técnica e na comercialização dos produtos provenientes deste

setor.

O Sistema Mandala é uma forma de produção de alimentos, onde o plantio é feito de

forma circular. Neste sistema de produção, a horta é plantada em círculos concêntricos

que representam a natureza, onde tudo é arredondado. Os plantios em círculos,

diferentes dos desenvolvidos pela agricultura convencional, permitem às plantas se

ajudarem mutuamente, trabalhando com conceitos de cortinas quebra ventos, de plantas

repelentes a insetos, de plantas melíferas e uma série de segredos que a natureza nos

ensina e que também colaboram com a recuperação da biodiversidade e do controle

ecológico de insetos pragas assim como de doenças e plantas invasoras.

É um sistema simples que consiste da produção em vários canteiros em torno de uma

única fonte de água para irrigação, distribuída uniformemente para plantações

diferentes, permitindo um melhor aproveitamento de recursos como a água e o solo. É

possível realizar este método de produção em áreas pequenas, e com poucos recursos,

proporcionando assim a subsistência e até renda de quem o adota, sendo direcionado

para pequenos proprietários ou associações rurais.

De acordo com Ehlers (1994), o Projeto Mandala baseia-se em princípios ecológicos,

como a reciclagem de nutrientes, o reuso da água e a variedade de culturas produzidas.

Assim, o sistema mandala de produção de alimentos está intimamente relacionado com

o desenvolvimento rural da região, sendo considerado um estimulante para a agricultura

familiar.

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Atualmente o desenvolvimento rural sustentável é uma questão bastante discutida,

principalmente relacionado aos recursos naturais que encontram-se em escassez.

Para que haja um desenvolvimento rural é importante inserir novas técnicas que

atualizem os produtores de forma saudável e educativa, e assim entra o projeto mandala,

que possibilita aos pequenos produtores diferentes alternativas de produção de

alimentos, englobando aspectos ecológicos, econômico e social.

Neste contexto o presente estudo tem por objetivo analisar como o Sistema Mandala de

produção de alimentos pode ser uma estratégia para o desenvolvimento da agricultura

familiar em Uberlândia – MG.

Referencial teórico

Agricultura Familiar

De acordo com Wanderley (2001), a agricultura familiar é uma forma de produção, na

qual, a família, além de ser dona da terra, é responsável pelo trabalho desenvolvido em

sua propriedade. Caracteriza-se pela produção em pequenas áreas, em que a família é a

principal mão de obra e a renda familiar tenha origem predominante dessa produção.

No Brasil ela representa a maioria dos pequenos e médios produtores rurais do país,

sendo responsável pelo fornecimento de 60% dos alimentos que os brasileiros

consomem. Percebe-se a importância da agricultura familiar em setores como a de

produção de mandioca, já que são responsáveis por 87% da produção brasileira, feijão,

com 70%, milho, com 46%, café, 38%, arroz 34%, trigo 21%, e na pecuária, 60% do

leite (IBGE, 2006).

Um estudo da Organização das Nações Unidas para a Agricultura (FAO) e o Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 1994, define a agricultura

familiar baseada em três características: a) a gerência da propriedade rural é feita pela

família; b) o trabalho é desempenhado na sua maior parte pela família; e c) os fatores de

produção pertencem à família (exceção, às vezes, à terra) e são passíveis de sucessão em

caso de falecimento ou aposentadoria dos gerentes.

Uma grande dificuldade da agricultura familiar nos dias de hoje é o modelo de produção

do sistema capitalista. Acontece que, na maioria das vezes, os pequenos e médios

produtores não conseguem se adequar e acompanhar tal ritmo. Outra dificuldade é a

falta de assistência técnica, de regulamentação e meios para comercializar os produtos.

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Segundo Lamarche (1993),em estudo sobre a agricultura familiar, estabelece uma

comparação internacional entre cinco países: França, Canadá, Brasil, Tunísia e Polônia,

no qual ressalta que apesar das dificuldades econômicas e políticas que a exploração

familiar teve de enfrentar, ela está presente em toda parte do mundo, graças a sua

capacidade de adaptação. Desse modo, a agricultura familiar necessita de apoio do

governo e de outras instituições interessadas, conseguindo assim driblar essas

dificuldades.

No Brasil, a afirmação da agricultura familiar no cenário social e político ocorreu

quando o Estado criou o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(PRONAF) em 1996. O programa surgiu com a finalidade de prover crédito agrícola e

apoio institucional as categorias de pequenos produtores rurais que eram excluídos das

políticas públicas já existentes (SILVA, 2011).

No contexto de políticas públicas para o meio rural brasileiro nas últimas décadas, o

PRONAF foi um dos acontecimentos mais marcantes, pois segundo estudos de

Schneider, Mattei e Cazella (2004), o programa representa o reconhecimento e a

legitimação do Estado, em relação às especificidades de uma nova categoria social dos

agricultores familiares.

Além disso, o PRONAF também visa o fortalecimento da agricultura familiar, mediante

apoio técnico e financeiro, para promover o desenvolvimento rural sustentável.

Segundo Menegetti (2009), o desenvolvimento rural concebido como sinônimo de

modernização teve implicâncias sérias na questão da sustentabilidade, tanto

econômicas, como social e ambiental, dentro da agricultura de um modo geral, e

principalmente, dentro da agricultura familiar. Este conceito de desenvolvimento rural a

partir da modernização foi responsável pela marginalização de muitas famílias de

pequenos agricultores que não conseguiram se inserir nos mercados. Desta forma, este

desenvolvimento rural estruturado sobre o paradigma da modernização dá sinais de que

não é sustentável, e deixa uma série de consequências que fazem repensar o processo de

desenvolvimento rural.

Ainda segundo o autor, por uma questão de justiça social, e porque a organização dos

sistemas produtivos e a lógica econômica da agricultura familiar induzem a uma melhor

gestão dos recursos naturais, esta deve ser fortalecida e tida como base social no

processo de desenvolvimento rural dentro de um novo paradigma, fundamentado na

sustentabilidade socioeconômica, técnica e ambiental.

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Baseado neste novo paradigma, Almeida, Cordeiro e Petersen (1996) elencaram no

Quadro 1, algumas razões pelas quais a agricultura familiar possibilita melhores

condições de sustentabilidade, desde que lhe sejam dadas condições.

Quadro 1 – Razões de a agricultura familiar proporcionar melhores condições de sustentabilidade Por ser uma ocupação econômica que combina a exploração familiar e a organização de profissionais, ela incorpora uma estratégia de equilíbrio entre parâmetros econômicos, sociais e ambientais; O funcionamento econômico da agricultura familiar não se fundamenta na maximização da rentabilidade do capital e na geração de lucro no curto prazo, mas está orientado para o atendimento das necessidades das famílias e para a manutenção do potencial produtivo da terra, percebido como um patrimônio; A propriedade familiar é uma unidade de produção e consumo, por este motivo ela valoriza a diversidade, os policultivos, criações, distribuídos de forma equilibrada no espaço e no tempo; A unidade de produção familiar pela sua extensão, pela organização do trabalho, favorece os cuidados técnico nas operações de manejo, na medida em que é ela que toma as decisões e também as coloca em prática; A agricultura familiar mantém uma relação de simbiose com a terra que ela conhece e controla. Ela valoriza as potencialidades do meio implementando nele suas estratégias de reprodução econômica. Dentro da perspectiva ambiental, a agricultura familiar favorece uma maior e melhor distribuição territorial das atividades de exploração do meio, pela melhor possibilidade de adaptação e circunscrição das mesmas a unidades ecológicas mais definidas e homogêneas; A agricultura familiar é portadora de grande eficácia coletiva. Através da pluriatividade ela encoraja e favorece o planejamento, o desenvolvimento local e a gestão coletiva dos recursos naturais, sua distribuição eqüitativa e sua administração mais equilibrada e sustentada. Fonte: Adaptado de Almeida, Cordeiro e Petersen (1996)

A partir destes fatores, percebe-se que a agricultura familiar representa a

democratização do acesso aos recursos naturais, a terra, a água e outros, bem como o

fortalecimento da mesma, é uma necessidade social e um fator de melhor gestão,

conservação dos recursos naturais, além prover uma melhor organização econômica

daquele ambiente, sempre dentro de uma perspectiva de sustentabilidade

(MENEGETTI, 2009).

Produção Orgânica de Alimentos

Durante as últimas décadas, a agricultura tem mudado suas características pelo

desenvolvimento de novas tecnologias. Os agricultores, preocupados com o meio-

ambiente, desenvolveram métodos e processos agrícolas seguros e sustentáveis. Os

métodos de cultivo utilizados afetam diretamente a qualidade do solo, o equilíbrio do

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vegetal e a qualidade de vida do homem que dela se alimentam. Há duas formas

distintas de cultivo, chamados de “agricultura convencional” e “agricultura orgânica”,

que se diferenciam pelo rendimento da colheita e o uso de defensivos agrícolas e outros

insumos (LEORO, 2007; IFOAM, 1998).

Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), agricultura

orgânica visa o (a): i) oferta de produtos saudáveis e de elevado valor nutricional,

isentos de qualquer tipo de contaminantes que ponham em risco a saúde do consumidor,

do agricultor e do meio ambiente; ii) preservação e a ampliação da biodiversidade dos

ecossistemas, natural ou transformado, em que se insere o sistema produtivo; iii)

conservação das condições físicas, químicas e biológicas do solo, da água e do ar; iv)

fomento da integração efetiva entre agricultor e consumidor final de produtos orgânicos;

e v) incentivo à regionalização da produção dos produtos orgânicos para os mercados

locais.

O sistema de produção orgânica baseia-se no (a): i) produção de alimentos de boa

qualidade e em quantidade suficiente; ii) interação “sadia” com sistemas e ciclos

naturais; iii) consideração do impacto social e ecológico do sistema de produção e

processamento orgânicos; iv) melhoramento dos ciclos biológicos dentro do sistema de

produção, envolvendo microorganismos, flora, fauna do solo, plantas e animais; v)

desenvolvimento de um ecossistema sustentável; vi) manutenção e aumento da

fertilidade dos solos a longo prazo; vii) manutenção da diversidade genética do sistema

de produção e suas redondezas, incluindo proteção das plantas e habitat selvagem; viii)

promoção do uso apropriado dos recursos hídricos; ix) utilização de recursos renováveis

em sistemas de produção localmente organizados; x) criação de um equilíbrio

harmônico entre agricultura e pecuária; xi) minimização das formas de poluição; e xii)

processamento de produtos orgânicos com a utilização de recursos renováveis e

biodegradáveis (IFOAM, 1998).

Em relação aos alimentos orgânicos, Buainain e Batalha (2007) afirmam que estes são

produtos, de origem animal ou vegetal, livres de agrotóxicos ou qualquer outro tipo de

produto químico. Sendo que o seu cultivo e suas práticas devem ser preservacionistas,

estabelecendo o equilíbrio ecológico do sistema agrícola.

No Brasil, as informações sobre produção da agropecuária orgânica são escassas, e

estão dispersas nas organizações certificadoras, nas associações de agricultores e nas

ONGs, não existindo órgão federal que faça um controle sistemático. Em alguns

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Estados o controle está sendo iniciado por meio das Secretarias Estaduais de

Agricultura, como é o caso do Paraná que há seis anos realiza levantamento anual

(MAPA/ACS, 2009).

Segundo Buainain e Batalha (2007), a produção orgânica utiliza grandes extensões de

área na atividade de pecuária, porém excluindo esta atividade, a agricultura orgânica no

Brasil é uma atividade conduzida por pequenos produtores, de caráter familiar. Por esta

característica, é importante direcionar esforços para que esses empreendimentos tenham

condições de absorver e incorporar as inovações técnicas de produção e gestão

associadas ao modelo de produção familiar. Mesmo que a produção orgânica seja mais

adequada à realidade de sistemas de produção familiares, os custos de conversão e

certificação representam barreira importante para o ingresso de pequenos produtores na

atividade e ainda um entrave para a sua permanência, enquanto produtor, neste setor.

Beltrão (2009) afirma que os agricultores familiares, por necessitarem de diversificação

da produção, têm maior facilidade de adaptação aos princípios da agricultura orgânica,

cujos princípios são: diversificação, integração da propriedade, indução do equilíbrio

ecológico, reciclagem de nutrientes, insumos caseiros, conservação do solo e o controle

de pragas e doenças na maneira ecológica.

Para Campanhola & Valarini (2001). a agricultura orgânica, para o pequeno produtor,

oferece diversas vantagens, destacando-se: a viabilidade em pequenas áreas, o

favorecimento à diversificação produtiva no estabelecimento, a geração de um maior

número de empregos do que a convencional, a menor dependência dos insumos

externos, a eliminação do uso de agrotóxicos, o fato de que os produtos são mais

valorizados e a adoção é mais fácil.

Aroeira e Fernandes (2009) reforçam os argumentos de que para a agricultura familiar a

produção orgânica poderia ser uma boa alternativa. Os argumentos utilizados pelos

autores são a baixa dependência em relação a insumos externos, o maior valor agregado

ao produto, permitindo um aumento da renda para o agricultor, permitindo ainda a

conservação dos recursos naturais. Os autores também apontam para o fato de que uma

das principais vantagens para a agricultura familiar é o fato de que a produção orgânica

demanda grande quantidade de mão de obra, recurso que normalmente é disponível na

propriedade familiar.

Sistema Mandala de Produção de Alimentos

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O Sistema Mandala consiste no consórcio de produção agrícola bastante difundido em

pequenas comunidades rurais, cujo objetivo principal é diversificar as atividades

agrícolas com a finalidade de melhorar o padrão alimentar das famílias e aumentar a

renda através da introdução de tecnologia apropriada de baixo custo de produção

(ABREU et al, 2010).

Foi desenvolvido pelo Dr. Willy Pessoa Rodrigues com o propósito de viabilizar a

produção de alimentos de maneira sustentável em regiões semi-aridas, visando garantir

o sustento das famílias de pequenos produtores, em uma área pequena e com poucos

recursos, conseguindo assim assegurar comida e renda para o agricultor.

O Sistema Mandala ou Projeto Holístico de Produção e Sustentabilidade Ambiental

Mandala é baseado na filosofia indiana, e caracteriza-se por ser um sistema de irrigação

comunitária baseado em canteiros ao redor de uma fonte de água.

Este sistema reproduz a estrutura do Sistema Solar. No centro, representando o sol,

existe um reservatório de água com dimensionamento circular e em forma de funil,

rodeado de nove círculos. Este reservatório, além do fornecimento de água, serve para a

criação de peixes, patos e marrecos, que enriquecem organicamente a água do

reservatório. Trata-se de um processo modular onde, com baixo custo, inicia a produção

no primeiro círculo, e somente quando ele estiver produzindo, inicia o processo nos

outros círculos até chegar ao último.

Os três primeiros círculos são denominados “Círculo de Melhoria da Qualidade de Vida

Ambiental”, e destina-se ao cultivo de hortaliças e plantas medicinais, atendendo às

necessidades de subsistência da família. Os cinco anéis seguintes formam os “Círculos

da Produtividade Econômica”, e se destinam a culturas complementares diversas, como

milho, feijão verde, abóbora e frutíferas, cuja produção em maior escala permite criar

excedente para comercialização, gerando renda para o agricultor. O último anel da

Mandala é denominado “Círculo do Equilíbrio Ambiental” e destina-se à proteção do

sistema, com cercas vivas e quebra-ventos, como forma de melhorar a produtividade e

prover parte da alimentação animal, além da oferta dos nutrientes necessários à

recuperação do solo (ABREU et al, 2010).

Quanto ao controle de pragas, galinhas podem ficar soltas no meio dos canteiros. Elas

ciscam e se alimentam de insetos que atacam as plantas.

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Conforme publicado na Revista Globo Rural, em junho de 2010, em relação ao sistema

Mandala, Willy, um administrador de empresas com formação holística, que estuda o

assunto há 30 anos diz não se trata apenas de abrir buracos no chão e formar canteiros

em volta. "O objetivo é resgatar a dignidade do homem do campo a partir da injeção de

informações e viabilizar a pequena propriedade com soluções simples, de baixo custo".

Segundo Rodrigues (2005), a agricultura baseada na tecnologia de Mandalas tem-se

revelado um excelente meio de geração de emprego e renda na agricultura familiar,

especialmente em assentamentos rurais, com excelentes resultados econômicos,

financeiros e sociais para as comunidades rurais e para a economia do município como

um todo. A Mandala é uma estrutura de produção consorciada de plantas e animais que

garantem a subsistência familiar, além de favorecer a produção de excedentes e a

inserção da família em empreendimentos sociais que consiste num método participativo

para o planejamento e a organização da produção, que se expande em círculos

concêntricos para promover a melhoria da qualidade de vida, da produtividade

econômica e das condições ambientais do campo e das cidades a partir de unidades

rurais de produção familiar

Aspectos metodológicos

Em termos de metodologia, as pesquisas são classificadas em três grandes grupos:

exploratórias, descritivas e causais. De acordo com Selltiz et al (1975), os estudos

formuladores ou exploratórios têm como objetivos de pesquisa a familiarização com o

fenômeno ou conseguir nova compreensão deste, frequentemente para poder criar um

problema mais preciso de pesquisa ou criar novas hipóteses, sendo a principal

acentuação à descoberta de ideias e intuições. Os estudos descritivos são aqueles que

apresentam precisamente as características de uma situação, um grupo ou um indivíduo

específico. Os estudos causais são aqueles que verificam uma hipótese de relação causal

entre variáveis.

Para o desenvolvimento deste estudo realizou-se uma Pesquisa Descritiva com

abordagem qualitativa, utilizando como método de procedimento o estudo de caso em

uma propriedade rural na cidade de Uberlândia.

Para Beuren (2004), na pesquisa qualitativa concebem-se análises mais profundas em

relação ao fenômeno que está sendo estudado. Além disso, abordar um problema

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qualitativamente pode ser uma forma adequada para conhecer a natureza de um

fenômeno social. Este estudo é preferido pelos pesquisadores que desejam aprofundar

seus conhecimentos a respeito de um determinado caso específico.

Para Yin (2005), os estudos de caso representam a estratégia preferida quando se

colocam questões do tipo “como” e “por que”, quando o pesquisador tem pouco

controle sobre os acontecimentos e quando o foco se encontra em fenômenos

contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real.

Análise de resultados

Apresentação do Projeto

O Sistema Mandala de Produção de Alimentos em Uberlândia teve início em 2007. Até

o ano de 2009 o projeto direcionou seus esforços na captação de recursos, sendo a

montagem das Mandalas iniciadas em 2010, quando começou a produzir.

Para o desenvolvimento do projeto, o requisito básico para ter o apoio da prefeitura

local, era que o perfil do produtor enquadrasse nos conceitos da agricultura familiar

regulamentados na Lei 11.326 de 24 de Julho de 2006.

O processo de construção das Mandalas dividiu-se em quatro etapas, sendo que nas três

primeiras fases foram construídas 13 Mandadas em cada uma, e na última fase,

concluída em 2012, foram montadas 7, totalizando 46 Mandalas em todo o processo.

Com este volume de Mandalas, a prefeitura de Uberlândia, visando facilitar a gestão do

processo com 46 Cadastros de Pessoas Físicas (CPF), incentiva a formação da

Associação dos Mandaleiros de Uberlândia, cujas atividades tiveram início em 28 de

maio de 2009, e seu presidente é o Sr. Ismael, proprietário da Fazenda Tangará, objeto

de estudo desta pesquisa.

A Fazenda Tangará é uma propriedade de 15 hectares, e seu proprietário conheceu o

Sistema de Mandala no Nordeste, e quando veio para Uberlândia deparou-se com o

projeto na prefeitura de produção de mandalas na região. Interessado na proposta

vislumbrou na cidade uma oportunidade de investimento, estimulado pelo fato da

cidade e região não ter produção orgânica, e todos os hortigranjeiros serem

convencionais plantados com adubo químico e defensivos agrícolas. Além disso, o

produtor já tinha experiência na área rural com gado e galinhas, e tem uma tradição de

não usar agrotóxicos desde o inicio de sua propriedade.

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Atualmente, com todas as mandalas em plena produção, a sua capacidade produtiva é de

100kg/dia, mas ocorre uma grande variação desse valor para baixo. Essa oscilação

ocorre por fatores adversos como o solo, o clima, época do ano, variedades plantadas

entre outros.

Os mandaleiros de Uberlândia atuam como hortifrutigranjeiros, pois a criação de

animais ainda não iniciada. Os peixes criados são apenas para consumo. Eles trabalham

mais com hortaliças do tipo folhas (90%) e tubérculos (batatinhas, cenouras,

beterrabas), e alguns frutos como jiló, tomate e quiabo. Esta alta produção de hortaliças

folhosas torna-se bastante delicada já que elas são altamente perecíveis.

Os produtos mais rentáveis da produção são a alface, a couve, o cheiro verde e a rúcula.

Antes de iniciar a produção animal, os produtores devem focar realmente nas hortaliças,

pois há ainda muitos fatores a serem vencidos para seus produtos serem diferenciados e

chamativos para as donas de casa, que são seu público alvo.

As expectativas são de que os produtos consigam ser remunerados porque sem um

retorno financeiro há um desanimo generalizado, e o projeto torna se economicamente

inviável.

Resultados do Projeto

O projeto da Associação de Mandaleiros de Uberlândia juntamente com a prefeitura da

cidade, por meio do Sistema Mandala de Produção de Alimentos proporcionou uma

melhor condição de vida para os produtores, além de estimular o desenvolvimento rural

sustentável da região através da agricultura familiar.

A partir do desenvolvimento do projeto, a associação obteve várias conquistas para os

produtores e para a região.

Desde o início do projeto de instalação das mandalas, foi prometida uma banca para a

comercialização dos produtos no Mercado Municipal de Uberlândia, mas por mudanças

nas políticas públicas impossibilitou que isso ocorresse até no ano de 2012, quando os

mandaleiros conseguiram se estabelecer no local, pagando aluguel. Esta conquista,

apesar do pagamento de aluguel do espaço, proporcionou um aumento nas vendas, por

se tratar de um ponto com localização privilegiada na cidade.

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Além da loja no Mercado Municipal, eles também vendem cestas com um mix de

hortaliças para mais ou menos 10 pessoas, e afirmam que a renda proveniente destas

venda, é o que proporciona maior retorno financeiro.

A produção do ponto de vista agronômico é considerada alta, pois produtos orgânicos

são bem mais exigentes do que os convencionais. A área de produção, que não é muito

grande, apenas 15 hectares, produz em torno de 100kg/dia de hortaliças.

Outro ponto positivo do projeto de mandalas em Uberlândia é a produção orgânica.

Atualmente os produtos orgânicos são bem vistos pela população, já que não utiliza

defensivos agrícolas no controle de pragas e doenças. Além disso, o fato de não haver

produção orgânica na região de Uberlândia faz com que o projeto seja inovador e

diferenciado.

Os produtos agrícolas originados dos mandaleiros são vendidos com preços inferiores

ao preço dos produtos convencionais comercializados nas feiras livres da cidade, isso

porque os mandaleiros ainda não tem certificação de produto orgânico. Por um lado isso

é positivo pois os consumidores dão preferência aos produtos orgânicos, especialmente

se esses forem mais baratos do que os convencionais. Por outro lado a falta de

certificação dos produtos orgânicos não dá o valor merecido aos produtos, isto é, os

produtos poderiam ter maior valor agregado com a certificação.

Por ser um processo que depende de fatores ambientais, e por não se utilizar de recursos

alternativos como herbicidas e inseticidas, a produção torna-se mais vulnerável, já que

não se pode controlar a natureza.

O fato de não existir um manual com instruções que auxiliem na produção de orgânicos

dificulta o trabalho, fazendo-se necessário adquirir conhecimentos e estudo sobre o solo,

a região, e das hortaliças por parte do produtor.

Outro fator que dificulta a produção é a falta de apoio técnico, pois não há instituição do

governo de apoio ao produtor rural que seja especialista em agricultura orgânica. Além

disso, este tipo de agricultura na região não é explorado.

Existem outras dificuldades a se enfrentar depois do processo da produção em si, como

a logística, a comercialização e o mercado de vendas devido a concorrência.

A necessidade em termos financeiros é muito grande. Há muita dificuldade, não há

capital para transporte, para processamento mínimo, infra estrutura de higienização e

sanitização, e para aquisição de esterco, pois utiliza se de adubo orgânico que é mais

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caro e não há recursos para investir na compostagem. Isso influencia diretamente na

qualidade de produção.

Do ponto de visa do tripé da sustentabilidade, este sistema atende as necessidades

sociais por envolver os agricultores familiares. A questão ambiental por se tratar de uma

produção orgânica, e fica pendente a questão econômica, para que este tipo de produção

seja capaz de garantir não só a sustentabilidade e a subsistência é necessário também a

geração de lucros para esses pequenos produtores.

Para proporcionar a estes produtores um maior retorno financeiro de sua produção, é

importante investir em cursos de capacitação, voltados para a comunidade e aos

pequenos produtores, em agroecologia como há em outros estados. E também tornar a

banca do mercado mais competitiva a partir de investimentos em divulgação de seus

produtos para a população uberlandense.

Considerações finais

O presente trabalho procurou analisar como o Sistema Mandala de produção de

alimentos pode ser uma estratégia para o desenvolvimento da agricultura familiar em

Uberlândia – MG.

O Projeto Mandalla é um projeto de agricultura sustentável e consiste em desenvolver

na agricultura familiar, o lado social, econômico e ambiental de forma integrada.

Raramente encontram-se projetos que abordem todos estes valores. É um processo

inovador de desenvolvimento sustentável amparado na filosofia de harmonia holística e

sistêmica ambiental. Sugere diversas soluções viáveis e sustentáveis para a diminuição

da miséria, da fome e da exclusão social em nosso país e no mundo.

Em Uberlândia, o projeto do sistema mandala de produção de alimentos, com a parceria

da Associação dos Mandaleiros de Uberlândia e da Prefeitura Municipal, proporcionou

aos produtores rurais uma possibilidade de produção que atendesse as necessidades de

subsistência e com seu excedente gerar retorno financeiro para o sustento de suas

famílias.

Percebem-se também algumas deficiências no projeto de sistema de mandalas, como a

falta de assistência técnica. Como não há um histórico de produção orgânica na região

de Uberlândia, falta apoio do governo nesse quesito, de promover cursos de capacitação

para os produtores, bem como estrutura administrativa, financeira e operacional para

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que os mandaleiros possam competir no mercado. Os agricultores do projeto são de

pequeno porte, o que dificulta a questão financeira. É necessário capital para transporte,

insumos e outros gastos.

Portanto, o sistema mandala de produção de alimentos em Uberlândia é um projeto

inovador, o qual possibilita às famílias rurais uma melhor condição de vida, do ponto de

vista econômico e social.

Referências

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