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CLC7 Paulo Carvalhuço 2012

1.Leitura Portuguesa Contemporânea CLC7 TRVE acompanhamos as preparações para o lançamento de um novo livro de Natalie Mayer, “uma escritora emergente da ficção de Terror,

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CLC7  

Paulo Carvalhuço  

2012

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CLC7  –  Fundamentos  da  Cultura,  Língua  e  Comunicação    

Formando  Paulo  Carvalhuço                                                                                                                                                                                                                                                                                Formador  Nelson  Silva    

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Instituto de Emprego e Formação Profissional  Centro de Formação e Reabilitação Profissional de Alcoitão

 

 

 

 

 

 

   

 

 

 

 

 

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       I ND ICEIND ICE        

   

Pág.  

1. Introdução   3  

2. Entrevista   4  

3. “TRVE”   10  

4. “Exercício  de  Cidadania”   11  

5. Conclusão   12  

6. Biografia   12  

7. Discografia,  Bibliografia     13  

8. Webgrafia   13  

 

 

 

 

 

   

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S ENHORA  V INGANÇASENHORA  V INGANÇA      

 

"Se  nos  espetam,  nós  não  sangramos?  Se  nos  fazem  cócegas,  não  nos  rimos?  Se  nos  envenenam  não  morremos?  

E  se  nos  enganam  não  devemos  nós  nos  vingar?"    

William  Shakespeare  

 

 

“A  vingança  é  um  sentimento   inevitável  ao  ser  humano.  Às  vezes  temos  vergonha  de   falar   dele,  mas   no   fundo   a   vingança   serve   para   nos  manter   alerta.   Quanto   a  mim,  esse  pode  ser  um  sentimento  convertido  positivamente.”    Fernando  Ribeiro  

Senhora Vingança é resultado da imaginação de Fernando Ribeiro, vocalista e letrista da banda de Heavy Metal Portuguesa “Moonspell”, “Daemonarch” e em conjunto com Sónia Tavares e Paulo Praça do projeto “Hoje”, onde regravaram alguns clássicos de Amália Rodrigues e representaram o projecto “Amália Hoje”, com um enorme sucesso. Como sou um apreciador e conhecedor dos seus projetos musicais, resolvi escolher este livro como trabalho e tendo já feito incursões pela literatura, esta é a primeira vez que escreve um livro de contos. Insere-se numa nova colecção e num novo segmento de literatura, esta escrita é muito própria e focada num próprio estilo. Em cenários onde a vingança é rainha, entre Vampiros e Políticos, políticos vampiros e vampiros políticos, Fernando Ribeiro exerce um implacável acerto de contas com os mais diversos personagens em dois contos onde a ficção se aproxima perigosamente da realidade. Este livro é constituído por 2 contos distintos, TRVE e Exercício de Cidadania. Em TRVE acompanhamos as preparações para o lançamento de um novo livro de Natalie Mayer, “uma escritora emergente da ficção de Terror, light que até doía, que se tinha especializado em vampiros.” E à medida que assistimos a todos os preparativos, assistimos também à preparação de uma terrível vingança… No primeiro, na minha opinião, encontramos uma crítica ao mundo actual da literatura e à moda dos vampiros e aos seus hábitos modernos e estereótipos actuais, quase humanos, e do que em torno deste roda. No segundo, esboça o problema do poder do Homem e os seus deveres na sociedade, mais propriamente a nível político, onde um cidadão tenta lutar com as suas próprias mãos pelo justo, parece tão próximo do real que me fez

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lembrar algo bem recente. O autor critica severamente toda a situação política e social que o nosso país atravessa. E pelo meio, “– Anda um gajo a matar políticos!” Apesar de exagerar nos estrangeirismos, Fernando Ribeiro revela grande competência na escrita. E a forma incisiva com que apresenta as duas críticas é deliciosa. “Se você não se lembrar do que aconteceu nas últimas horas, nós faremos com que sofra ainda mais, como se estivesse em um dos nove círculos do Inferno… Foi o que eles disseram antes do terceiro electrochoque. Essa nem foi uma das piores partes.” Ambos os contos podem ser interligados, ainda que os casos sejam desiguais, mas podem ser vistos como uma complementação dependente. O livro em si, sendo 2 contos, e que a início quando iniciei me deixou um pouco desmotivado, acabou por me conseguir levar numa leitura agradável com um certo humor negro característico à mistura. Se no primeiro conto criava imagens e me vinha à ideia nas primeiras páginas aquela autora que escreveu sobre vampiros e adaptou ao cinema as suas obras que até abafam o mercado dos restantes que escrevem do mesmo, por originalidade ou por imitação; já no segundo parecia em momentos do conto que estava a ler relatos de manifestações e confrontos em que a actualidade me ocorria na presença do meu olhar e me lembrava o que pode ocorrer no meu mundo actual e o que se passa neste contemporâneo instante.

Entrevista E foi numa tarde de explanada, junto há devota e mística serra, onde o Sol se esconde e a lua se eleva no seu “monte”, que estivemos à conversa com alguém do qual o seu parecer é característico. A roupa toda preta, o eyeliner também preto e o cabelo comprido não enganam: Fernando Ribeiro, de 37 anos, é o vocalista do grupo de metal português de maior sucesso, os Moonspell. Foi a propósito dos 20 anos da banda, do novo álbum duplo desta, Alpha Noir/Omega White (2012) que solicitámos esta entrevista. Ao contrário do que se poderá pensar, como se de uma espécie de mito vampírico se tratasse, Fernando Ribeiro, vocalista dos Moonspell, não morde. Nem tem um coração de pedra. Aos 37 anos realizou um desejo que, diz-nos, já o rondava há uns tempos: o de ser pai. Fausto, filho de Fernando e de Sónia Tavares, vocalista dos The Gift, nascido no dia 17 de Abril de 2012 e é o orgulho do pai, como percebemos durante a entrevista. Paulo Carvalhuço - Como têm sido estes 20 anos com os Moonspell? Fernando Ribeiro – Sinto que passou tudo muito rápido, porque os Moonspell são uma experiência diária e não de efemérides. Não estou nada farto, pois ainda fazemos as coisas com muito entusiasmo. Temos outra idade, é certo, mas a maturidade trouxe-nos uma maior auto-estima e assunção daquilo que somos. Nós gostamos mesmo de ser assim, de usar o eyeliner e das coisas mais ocultas, como eu fazer de lobisomem num

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videoclip. O nosso desafio é conseguir provar aos outros que somos e gostamos de ser assim. Têm sido anos muito bem passados. Paulo Carvalhuço - Imaginava que atingiriam este sucesso? Fernando Ribeiro – Nós estávamos no lugar certo na altura certa, mas os nossos sonhos eram coisas mais objetivas, como trabalhar com esta editora ou com aquele produtor. Nunca pensámos que passados 20 anos iríamos ser considerados os representantes portugueses do metal! Nós fomos para a estrada em 1995, e só quando parámos, em 1998, é que começámos a pensar no que estávamos a conquistar. Porque quando se está a viver o sonho há pouco tempo para pensar nele. E quando se pensa numa vida de rock stars sonha-se com belos hotéis, uma equipa técnica que faça tudo, e nem sempre é assim. Em Portugal, na Europa e na América Latina conseguimos ter uma boa vida, mas nos Estados Unidos, por exemplo, temos que meter mãos ao trabalho. Acho que é este equilíbrio que faz a solidez dos Moonspell, sabemos distinguir o que é fundamental na nossa música e na nossa vivência da música e o que é periférico. Paulo Carvalhuço - Para quem só conhece os Moonspell de nome e pelo vosso visual metaleiro e gótico, qual é a essência? Fernando Ribeiro – O heavy metal tem uma estética mais lunar, mas não é satânica; quando muito, luciferina ou prometeica, do mito de Prometeu. Queremos perceber a nossa humanidade de forma muito mais completa. Tenho tatuado abaixo da nuca Sapere Aude – ousa saber. O heavy metal e o gótico são músicas de desafio. Não somos só uma imagem, não servimos só para chocar as pessoas. Sempre tentámos ter conceitos inteligentes e profundidade nas nossas letras. Acabamos por ser uma banda honesta que não se foca só nas qualidades do homem. Temos esta negritude portuguesa que existe, por exemplo, no fado. Paulo Carvalhuço - É por isso que diz que Moonspell é das bandas mais portuguesas que há? Fernando Ribeiro – Acho que está na altura de marcarmos o nosso território com afirmações desse estilo. Levamos com os movimentos do “cantar em português” vindos de um país que abriu as portas a um acordo ortográfico opressivo, que vendeu a sua própria língua. Nada contra o português do Brasil, mas não vi Espanha fazer acordo ortográfico com a Venezuela, por exemplo, ou a Inglaterra com os EUA. Há aqui muito cinismo tipicamente lusitano que me incomoda. Dizem que a nossa fórmula musical é completamente estrangeira. Qual é a verdadeira fórmula portuguesa? Provavelmente o fado, que felizmente também já tem abertura a outras plásticas. Nesta guerra do quem quer ser mais português, ficamos um bocado a perder, o que é injusto. Somos uns óptimos representantes do país. Já tivemos fãs estrangeiros a trazer bandeiras de Portugal para os concertos e que aprenderam a falar português por nossa causa. E isso é das melhores recompensas que temos.

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Paulo Carvalhuço - Porquê a decisão de fazer deste um disco duplo? Fernando Ribeiro – Foi uma decisão artística. Hoje em dia, uma banda é relembrada todos os dias da crise, do facto de as pessoas não comprarem discos, de sermos um país em falência no que toca à indústria musical. Mas nestes 20 anos que os Moonspell percorreram, sempre vivemos um bocadinho em crise. Os músicos estão numa espécie de fogo cruzado entre as pessoas que não querem comprar discos porque são caros e as editoras ou agentes que sempre carregaram no preço dos discos, tendo margens de lucro fenomenais. Decidimos isolar-nos dessa realidade. A nível criativo foi muito fácil fazer uma música dura para depois fazer uma música bela, porque não tínhamos de as misturar no mesmo disco. Foi isto que quisemos partilhar com o público. Paulo Carvalhuço - É um homem profundo? Fernando Ribeiro – Acho que tenho esse lado, sim, e daí ter estudado Filosofia. Mas, sobretudo, tenho um lado curioso e até intelectual. Tenho curiosidade pela humanidade e esse é o grande tema dos Moonspell: a ambiguidade do ser humano, como evoluímos, como pensamos, como nos juntamos. Sempre me fascinou a capacidade do homem construir e destruir. Mas, mais do que uma aproximação à profundidade, acho que eu e os Moonspell temos uma postura que as pessoas estranham, mas que para mim é a única que podemos ter: tentamos ver as coisas na sua plenitude. Muitas vezes a música é encarada como entretenimento e as pessoas evitam abordar o lado lunar das coisas, o que fizemos de mal, os nossos desejos não realizados, os monstros que vivem dentro de nós. Ao abordarmos isso nas nossas músicas, temos uma convivência muito mais pacífica quer com o terror quer com a beleza. Acho que é isso que nos define enquanto banda e a mim enquanto homem e músico. Paulo Carvalhuço - Sempre quis ser músico? Fernando Ribeiro – Não, a coisa mais consistente que quis ser foi professor. Estudei filosofia na faculdade, apesar de não ter terminado o curso, porque quando cheguei ao 10.º, 12.º, gostei muito da disciplina e da forma como era dada. Então queria ser professor do secundário, de filosofia ou literatura. Nestes últimos anos comecei a interessar-me pela psicoterapia, que acho que é uma carreira excelente, mas já vou tarde para isso. Bom, já vou tarde para a maior parte das coisas. Paulo Carvalhuço - Como é que a música aparece? Fernando Ribeiro – Nasci em 74 e rapidamente aprendi que o bom dos anos 60 e 70 só era acessível a quem tinha dinheiro para ir a Londres comprar discos. Mas nos anos 80 começaram a aparecer lojas de discos em todo o lado. Lembro-me de na Brandoa, onde cresci, abrirem três lojas de discos todas de uma vez. Passámos do não ter nada ao ter tudo. Paulo Carvalhuço - De onde veio o interesse pelo metal?

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Fernando Ribeiro – Passava férias na lagoa de Albufeira com os meus pais. E um dia, tinha uns 12, 13 anos, tive uma visão quase mística de um casal de metaleiros. Tinham um casaco com uma estampa do vocalista dos Black Sabbath, depois de o Ozzy Osbourne ter saído, e achei aquilo uma coisa... parecia que tinha visto uma aparição. E foi naquela altura de definição, de descobrir em que tribo é que nos inserimos. Comecei a ouvir hard rock, como Metallica, Slayer, Iron Maiden, como uma iniciação, mas depressa percebi que havia um lado negro da força, uma série de bandas mais underground a crescer. E até nos armámos em jornalistas, fizemos uma fanzine, contactámos bandas com as quais, mais tarde, viemos a tocar. Quando voltei à escola nesse ano, vinha completamente transformado, dentro da medida do possível, porque é uma estética que traz alguns problemas com os pais. Paulo Carvalhuço - Os seus pais não acharam muita graça? Fernando Ribeiro – Não reagiram muito bem. Hoje estão entre os fãs mais fervorosos e eu gosto muito deles. Mas sei que Moonspell não é uma banda pop. A minha mãe tinha muito mais orgulho em mostrar às vizinhas os Amália Hoje. Mas nunca hei-de censurá-los por me terem criado essas dificuldades. Os meus pais são como qualquer outro pai que quer o melhor para os filhos. Paulo Carvalhuço - Além da estética, o que o atraiu no metal? Fernando Ribeiro – Foi a inteligência. Não é uma música superficial. Vi que exigia compromisso, provavelmente de vida, que em algumas pessoas desaparece e noutras agrava-se. No meu caso agravou-se a partir dos 30, tornei-me muito mais afirmativo no heavy metal. Lembro-me de ir à Bimotor, em Benfica, a pé da Brandoa, com os meus amigos, e voltar a pé, porque o dinheiro dos transportes, e muitas vezes do almoço, servia para comprar discos. Chegava a casa cansado mas feliz e ouvia o disco até gastar. E foi esse entusiasmo, essa inteligência que me atraiu no heavy metal. Através dele descobri poetas como Baudelaire e Oscar Wilde. Paulo Carvalhuço - Já em pequeno lia muito? Fernando Ribeiro – Em miúdo lia muitos livros de aventuras, como o Robinson Crusoé ou as aventuras do Júlio Verne. Aos cinco anos comecei sozinho a ler “A Bola”, num barbeiro. Parecia que estava numa experiência de Pentecostes. O meu pai exibia-me como um freak que já sabe ler. Tenho dois irmãos, uma mais velha e um mais novo, que são o contrário, muito mais dados ao desporto e ao associativismo. Eu sempre fui a carta fora do baralho da família. Como dava explicações, tinha algum dinheiro meu e usava-o para orientar a biblioteca lá de casa com os livros do Círculo de Leitores. Criei a minha minibiblioteca. Paulo Carvalhuço - E a literatura, tal como o cinema de horror, são uma grande influência na banda. Porquê esse gosto pelo horror? Fernando Ribeiro – As pessoas olham para um monstro e esquecem-se da

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sua dimensão humana. Não estou a falar de humanidade positiva, não vejo nenhuma humanidade no Breivik, por exemplo, não vejo humanidade nenhuma nesse tipo de pessoas. Mas a verdade é que ele não deixa de ser um homem e isso sempre me fascinou. E depois tudo isso se colava. O subtítulo do “Frankenstein” da Mary Shelley, que é um dos meus livros preferidos, é “O Prometeu Moderno”. Foi fazendo sentido. Claro que com 12 ou 13 anos não sabia tudo isso. Foi-se tudo encaixando. Este mundo de fantasia sempre me serviu de conforto, de alguma maneira. Tenho mais medo deste mundo, das pessoas que me lançam olhares na estrada só porque sou um bocadinho nabo a conduzir, do que dos monstros da literatura e do heavy metal. Paulo Carvalhuço - Disse numa entrevista que todos os metaleiros são muito agarrados aos seus objectos e que todos têm acessórios de estimação. Porquê? Fernando Ribeiro – O metaleiro é um coleccionador por excelência e alguns são estetas ao ponto da vaidade. O símbolo é muito importante no heavy metal, o gostarmos de ser identificados. Eu, pelo menos, não saio de casa, mesmo que vá de fato de treino ao supermercado, sem os meus anéis. Este [mostra anel com caveiras] deu-me uma fã em São Francisco. Acho que até é de prata. Este, com um pentagrama, fui eu que comprei. Algumas pessoas associam isto à magia negra, mas para mim significa a inversão do homem, que já não é o centro do mundo. E enquanto isto não melhorar, não o tiro. Tenho também uma obsessão por t-shirts de filmes, de séries. Resumindo, é vaidade. Paulo Carvalhuço - Lá fora têm bastante sucesso e fazem muitos concertos. E em Portugal? Fernando Ribeiro – As coisas têm melhorado para nós. Por exemplo, fomos escolhidos para ser selo dos CTT na colecção rock em Portugal. Delirei com isso. Mas temos tido algum reconhecimento em Portugal, quanto mais não seja do público, e acho que é isso que interessa. Há músicos que podem sair nos media todas as semanas e que depois não têm público. Não nos podemos queixar absolutamente nada do nosso. O resto, não podemos controlar. Estamos cá, não mordemos, falamos com as pessoas e normalmente até gostam de falar connosco. E estar na música é perceber que há pessoas que vão gostar de nós e outras que não. Paulo Carvalhuço - Como é que se conheceram? Fernando Ribeiro – Morávamos todos na Brandoa, na Amadora, e conhecemo-nos na escola e através de familiares. A banda, tal como é hoje, está junta desde 1995, data do primeiro álbum. Éramos jovens e não queríamos ir ao bailarico nem à missa ou grupos de jovens, não queríamos nada disso. Mantínhamos contacto, através de revistas e de classificados, e sabíamos que havia um mundo novo à nossa espera e, dentro do heavy metal, havia uma coisa em ebulição da qual queríamos fazer parte. E fizemos. As nossas editoras nasceram ao mesmo tempo que nós. Tudo

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começou no quarto de um fã de heavy metal, como nós. Eu comecei a cantar no quarto. Paulo Carvalhuço - E porquê cantar e não tocar um instrumento qualquer? Fernando Ribeiro – Porque sou péssimo em coordenação. Era para ser o baterista, na altura, mas – e isto não é muito romântico – não tinha dinheiro para comprar uma bateria. O nosso baterista na altura, dos Morbid God, que foi a minha banda antes dos Moonspell, comprou uma a prestações, numa papelaria, em frente ao mítico Centro Comercial Babilónia. Eu andava a estudar e não tinha dinheiro. Tinha era outras coisas que hoje parecem parvas, mas que me conseguiram o lugar de vocalista. Paulo Carvalhuço - Por exemplo? Fernando Ribeiro – Ser alto. Ninguém queria um vocalista muito pequenino, apesar de haver muitos e excelentes, como o Prince. E porque tinha alguma queda para a escrita. Dentro daquela raiva teenager, as minhas letras eram as melhores. No heavy metal há sempre esta regra não escrita de que a pessoa que escreve as letras é a melhor para as expressar, como se fosse um bardo. Paulo Carvalhuço - E nunca tinha cantado na vida. Como foi a primeira vez? Fernando Ribeiro – Nunca. Tinha ouvido só. Não tinha qualquer espécie de formação nem interesse em ser músico. Calhou. Gosto muito, mas não procurei. Tinha interesse na banda e em fazer discos, e quando dei por mim estava a ser uma espécie de músico profissional. Mas querias saber como é que foi a primeira vez que cantei. Tinha umas letras comigo, mandei toda a gente sair do quarto. Os meus amigos ficaram danados: “Vais ser vocalista e não consegues cantar à nossa frente?” Mas aquilo era um momento iniciático, quase, eu ia fazer uma coisa que ia marcar a minha vida toda. Mal sabia eu, mas pronto. Foi num gravadorzinho destes [aponta para o gravador da jornalista], fiz para lá uns sons, uma coisa muito gutural que depois fui aperfeiçoando. Paulo Carvalhuço - Quando ouviu a gravação, gostou? Fernando Ribeiro – Não achei assim terrível, para o estilo. Estava envergonhado, mas não me pareceu mau de todo e a eles também não. Dentro do registo e do estilo, claro. A minha voz é feita, ou seja, não canto com a minha voz verdadeira, o resultado não seria muito bom. Paulo Carvalhuço - É um tipo de canto que esforça muito as cordas vocais. Tem muitos cuidados, é paranóico com a voz? Fernando Ribeiro – Não sou nada paranóico. Trabalhei com cantores líricos, numa ópera em que participei, e eles simplesmente não cantavam. Eu dizia-

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lhes: “Vocês são cantores e não cantam.” Eles diziam que tinham de poupar a voz. Mas poupar para quê? A voz é um instrumento e tem de ser utilizada. O tipo de vocalização que faço em Moonspell tem muito a ver com endurance. Não tenho nenhum cuidado especial com a voz, tenho é cuidado com a minha vida, que agora está um bocado... mas é muito importante dormir. E a hidratação, numa parte mais “Marie Claire”... Ando sempre com uma garrafa de água. Isso é o mais importante, principalmente numa voz gutural que é uma voz de contrição. E claro, às vezes, quando estou em digressão, no final dos concertos apetece-me beber um Jack Daniel’s ou fumar, não digo cigarros, mas umas ganzas, mas penso que o público não pagou bilhete para me ver sem voz ou para ver as minhas ressacas. E isso permite-me andar sempre na linha. Paulo Carvalhuço - Apesar de ser importante, dormir é coisa que agora não acontece muito, com o nascimento do Fausto. Como está a ser a experiência da paternidade? Fernando Ribeiro – Os pais afinam todos pelo mesmo diapasão, mas é uma experiência maravilhosa. E quando digo maravilhosa é desde limpar o rabinho até estar a adorar o menino, a contemplá-lo. Ainda estamos a conhecer-nos os três, mas sem dúvida que era uma coisa para a qual estava preparado. O relógio biológico já estava a dar horas há alguns anos. Há um episódio do Seinfeld, que também adoro, que diz que as pessoas que têm filhos criam o seu próprio povo! [risos] Não sou daqueles fundamentalistas de “tudo faz sentido e agora é que a minha vida...” Claro que gostava de ter mais tempo, até porque a minha licença de paternidade foi uma vergonha. Na maternidade, eu estava no computador e ao telemóvel porque havia coisas para tratar. Mas estamos habituados a este caos. E quando temos o Fausto nos braços, todas essas coisas se desvanecem.

““TRVETRVE””

“E eis que exercemos as nossas pequenas vinganças.” “TRVE” é um conto que se inicia a Maio de 2011, nas latitudes de 48º 51 N 2º 2’ E, em Paris na suite presidencial do Hotel Hyatt Regency Madeleine. Demonstrando uma sátira à banalidade que o vampirismo e o ser vampírico se tornou, ele apresenta uma história centrada no crescente interesse, por parte de um público mais teen, perante uma modernização do conceito de homem vampiro. Caracterizando este ser sobrenatural como um adolescente ou jovem adulto que usa ganga e blazers e que se recusa a alimentar-se de sangue humano, Fernando Ribeiro pega numa autora mundialmente conhecida (e pelo sobrenome qualquer leitor chegará lá) cuja vida mudou radicalmente dado a um sucesso literário estrondoso. O que essa senhora de pouca habilidade escrita não sabe é que um grupo de jovens verdadeiramente puros de sangue procuram concretizar uma vingança que abalará o ínfimo mundo de todos os presentes...

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Formando  Paulo  Carvalhuço                                                                                                                                                                                                                                                                                Formador  Nelson  Silva    

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Maeva elaborava nesta teoria da mortal profundidade com os seus amigos na bistro da família de, nunca se percebia de onde, nesta teoria de que eles e quem se juntava a eles eram apenas a tal concha, o tal invólucro mortal, como a banda, uma espécie de organismo, de corpo que transportaria o sangue, a mensagem, a informação e executaria o plano conforme ela e Nobby, que reclamavam para si o estatuto metafísico de alma, uma coisa entre corpo, coração, cérebro. O núcleo duro ali sentado seriam as pernas, as tetas, a massa cinzenta, os braços, os dedos. Teriam de se desresponsabilizar do mundo, das terras, dos amores e concentrarem-se na vingança sobre quem tinha vestido à sua raça milenar pólos da Lacoste, sapatos da Diesel, calças da Levis. Até agora o plano tinha corrido às mil maravilhas. O concurso, o desenho da estrutura, a sua montagem, as identificações falsas. Maeva trabalhava, sobre o jocoso aliás de Madeleine Crouton, já há mais de dois meses no pavilhão 1 do Salão do Livro. Este primeiro conto fala-nos de uma revolta de um grupo de amigos de raça vampira, que, revoltados com a intensidade e futilidade que deram à sua raça por parte de uma escritora da época e decidem vingarem-se no lançamento do seu ultimo livro. Acompanhamos assim as preparações para o lançamento de um novo livro de Natalie Mayer, “uma escritora emergente da ficção de Terror, light que até doía, que se tinha especializado em vampiros.” E à medida que assistimos a todos os preparativos, assistimos também à preparação de uma terrível vingança…

““EXERCÍCIO DE CIDADANEXERCÍCIO DE CIDADANIAIA”” O segundo conto, “Exercício de Cidadania”, aborda um tema que já é, possivelmente, debatido à centenas de anos, homens de poder e o seu papel (ou falta dele) na sociedade, mas que no entanto não deixa de ser sempre actual. Neste o autor esboça o problema do poder do Homem e os seus deveres na sociedade, mais propriamente a nível político, onde um cidadão tenta lutar com as suas próprias mãos pelo justo, parece tão próximo do real que me fez lembrar algo bem recente. O autor critica severamente toda a situação política e social que o nosso país atravessa. Mostrando um profundo olhar interno perante uma sociedade política falsa e vazia.   Criticando a actualidade de um Portugal à beira de um inabalável colapso, o autor expõe os seus pensamentos sociais e políticos em personagens que procuram a sua justiça através da aniquilação daqueles que nada de bom fazem a um país fragilizado. Anualizando o momento em que atravessamos não podia ser mais atual com a revolta sentida pelos portugueses. Tudo começa com alguém que se cansou de promessas e dizeres de políticos e, juntamente com um grupo de amigos resolve fazer justiça e inicia várias marchas de revolta através do mundo da internet e das redes sociais tal como o “Facebook”. Enquanto os amigos organizavam “manifs” contra as politicas que roubavam e deitavam o país na “lama”, ele começou por ser um género de vingador, onde não se considerava um assassino, mas um género de justiceiro. ZP é o seu nome, e desde os pequenos ladrões, pedófilos até aos grandes políticos na Assembleia da República foi um pequeno passo mas um grande salto para o país, talvez uma lição a seguir neste momento de angústia em que atravessamos...

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Com uma nova dinâmica, Fernando Ribeiro opta, nesta segunda parte, por abordar conceitos cívicos e sociais muito proeminentes nos dias de hoje e que merecem um pouco mais de introspecção por parte do leitor. Numa vertente mais direccionada para a política, seguiremos passo a passo um assassino que exerce pelas próprias mãos o seu contributo para um país mais “leve”… É extremamente interessante a forma como o autor expõe a sua opinião.

CONCLUSÃOCONCLUSÃO    

O livro em si, sendo dois contos, e que a início quando iniciei me deixou um pouco desmotivado, acabou por me conseguir levar numa leitura agradável. Esta é uma pequena obra de suspense e mistério que aborda ambas as essências com uma narrativa lírica e rica, tipicamente lusa, oferecendo ao leitor criatividade e uma dose de humor negro muito característica à mistura do qual eu gostei imenso de ler e me levou a interessar imenso desde o inicio de cada conto. Senhora Vingança é um título que se adequa plenamente a ambos os contos pois em ambas as histórias está presente uma punição por actos, mais ou menos graves, sendo o segundo conto “Exercício de Cidadania”, um conto mais a ter em ponderação derivado aos dias de hoje. Embora se possa dizer que estamos perante um mito urbano em última instância social e moderno, que interpreta a utopia que ainda hoje se tenta alcançar, de uma literatura sem horrores e uma sociedade perfeita, continuo a crer que, finda a leitura, Senhora Vingança é um pequeno grande livro.

Biografia Fernando Ribeiro

Fernando Ribeiro (Lisboa, 26 de Agosto de 1974) é um cantor português vocalista e letrista da banda portuguesa de heavy metal Moonspel.

Biografia Fernando Ribeiro forma em 1989 os Morbid God, que mais tarde, em 1992, mudam o nome para Moonspell. Fernando Ribeiro estudou Filosofia na Faculdade de Letras de Lisboa. Publicou três livros de poesia, Como Escavar um Abismo (2001), As Feridas Essenciais (2004), e o Diálogo de Vultos (2007). Escreveu as introduções para Os Melhores Contos de Howard Phillips Lovecraft, editado em 2005, e traduziu para português a biografia em BD Lovecraft. Escrevia regularmente para a revista de metal portuguesa LOUD! na coluna mensal intitulada The Eternal Spectator. Em 2009 fez parte do projecto Amália Hoje, que juntamente com Sónia Tavares e Paulo Praça regrava alguns clássicos de Amália Rodrigues. Ainda no mesmo ano participa num tema da banda Bizarra locomotiva, chamado "Anjo Exilado" do álbum Álbum Negro.

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Discografia Álbuns de estúdio com Moonspell ▪ Demos - Morbid God · Anno Satanae (1993) ▪ EP- Under the Moonspell (1994) ▪ Wolfheart (1995) ▪ Irreligious (1996) ▪ 2econd Skin (1997) ▪ Sin/Pecado (1998) ▪ The Butterfly Effect (1999) ▪ Darkness and Hope (2001) ▪ The Antidote (2003) ▪ Memorial (2006) ▪ Under Satanæ (2007) ▪ Night Eternal (2008)

Outros projectos ▪ Daemonarch - Hermeticum (1998) ▪ Hoje - Amália Hoje (2009) ▪ Orfeu Rebelde - Cada Som Com Um Grito

Bibliografia ▪ 2001- Como Escavar um Abismo ▪ 2004- As Feridas Essenciais ▪ 2007- Diálogo de Vultos ▪ 2011- Senhora Vingança

Webgrafia http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Ribeiro

http://www.ionline.pt/boa-­vida/fernando-­ribeiro-­nao-­somos-­so-­uma-­imagem-­nao-­servimos-­so-­chocar-­pessoas  

http://caras.sapo.pt/famosos/2012/05/16/fernando-­ribeiro-­sempre-­me-­fascinou-­a-­capacidade-­do-­homem-­construir-­e-­destruir  

http://belalugosiisdead.blogspot.pt/2011/05/critica-­senhora-­vingancaespiritos-­de.html  

http://triplicarte.wordpress.com/2011/06/01/senhora-­vinganca/