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Ministério Público do Estado de Pernambuco Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Capital. Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelos Promotores de Justiça que a presente subscrevem, no uso de suas atribuições legais em defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio público, diante do que consta das peças de informação em anexo (Procedimento de Investigação Preliminar nº 27/07), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e 129, III, da Constituição da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25, inciso IV, alínea a da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público); 1º e 4º, inciso IV, alínea a da Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 1994 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Pernambuco) e nos dispositivos legais adiante invocados, vem à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em desfavor de João Paulo Lima e Silva, ex-prefeito da Cidade do Recife, brasileiro, técnico em edificações, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 079.931.374-20; Marcus Tullius Bandeira de Menezes, ex-secretário Municipal de Saneamento, brasileiro, engenheiro, inscrito no Cadastro de Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7265 1 de 21

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Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Capital.

Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelos Promotores de Justiça que a presente subscrevem, no uso de suas atribuições legais em defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio público, diante do que consta das peças de informação em anexo (Procedimento de Investigação Preliminar nº 27/07), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e 129, III, da Constituição da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25, inciso IV, alínea a da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público); 1º e 4º, inciso IV, alínea a da Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 1994 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Pernambuco) e nos dispositivos legais adiante invocados, vem à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em desfavor de

João Paulo Lima e Silva, ex-prefeito da Cidade do Recife, brasileiro, técnico em edificações, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 079.931.374-20;

Marcus Tullius Bandeira de Menezes, ex-secretário Municipal de Saneamento, brasileiro, engenheiro, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 148.661.534-15;

Edgard Galvão Raposo Neto, ex- Diretor do Departamento de Administração Setorial da Secretaria de Saneamento, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 053.240.764-49;

Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, pessoa jurídica de Direito Privado, inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda sob o número 40.818.841/0001-25.

pelas razões de fato e de direito adiante aduzidas:

Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7265 1 de 18

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DOS FATOS

Em face da edição do Termo de Dispensa de Licitação publicado no Diário Oficial do Município em 24 de março de 2005 (Documento 01), a Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania – Defesa e Proteção do Patrimônio Público – instaurou o Protocolo Interno nº 270/05 (Documento 02), posteriormente convertido no Procedimento de Investigação Preliminar nº 27/07, através do qual buscou apurar a legalidade da contratação direta do Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para a realização de serviços de consultoria para desenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio.

Na instrução do citado procedimento, foi requisitada à Prefeitura da Cidade do Recife cópia do processo de Dispensa de Licitação, bem como foi requisitado ao Tribunal de Contas do Estado cópia do Relatório Preliminar (Documento 03), da Defesa (Documento 04)e do Voto relativos ao Processo TC nº 0403276-7(Documento 05).

Do conjunto probatório verifica-se que, no exercício financeiro de 2004, a Prefeitura da Cidade do Recife, através do Processo de Dispensa nº 03/2004 (Documento 06), contratou diretamente o Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para a realização dos serviços acima elencados com arrimo no disposto no artigo 24, XIII, da Lei de Licitações.

O Termo de Dispensa foi publicado no Diário Oficial do Município, em 19 de fevereiro março de 2004, pelo Diretor do Departamento de Administração Setorial da Secretaria de Saneamento – Edgard Galvão Raposo Neto – sendo ratificado pelo então secretário – Antonio da Costa Miranda Neto.

Tal contrato teve o valor global de R$ 2.199.000,00 (dois milhões cento e noventa e nove mil reais).

Posteriormente, no exercício financeiro de 2005, a Prefeitura da Cidade do Recife realizou o Processo de Dispensa de Licitação nº 02/05 (Documento 07), findando por contratar diretamente, mais uma vez, o Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para a realização dos serviços de consultoria para desenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio, ainda com arrimo no disposto no artigo 24, XIII, da Lei de Licitações.

Em 21 de março de 2005, a Prefeitura da Cidade do Recife, representado pelo então Prefeito – João Paulo Lima e Silva – e os Secretários de Assuntos Jurídicos, Finanças e Saneamento – respectivamente Bruno Ariosto Luna de Hollanda, Elísio Soares de Carvalho Júnior e Marcus Tullius Bandeira de Menezes – firmou o contrato nº 45/2005 (Documento 08), sendo a contraparte o dito Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas.

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Este segundo contrato teve o valor global de R$ 1.657.000,00 (um milhão, seiscentos e cinqüenta e sete mil reais).

Em ambos os contratos, o objeto pactuado foi a prestação de serviços de consultoria para desenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio, conforme especificações constantes do Termo de Referência.

Segundo os elementos presentes no Termo de Referência suscitado, a dita consultoria consistiria em atividades nas áreas de Engenharia, Articulação Social e Planejamento e Apoio.

Na área de Engenharia seria realizado:

Levantamento topográfico; relatório técnico preliminar; projeto básico de engenharia; plano urbanístico; projeto executivo de engenharia; fiscalização de obras cadastro técnico; operação e manutenção de rede e ramais prediais e de esgoto; atendimento ao público nos escritórios locais.

Na área de Articulação Social as atividades realizadas seriam:

Articulação com as demais secretarias do município e empresas do setor público e privado; idem com os canais de participação da sociedade civil; planejamento e coordenação das ações integradas de mobilização comunitária, educação sanitária e ambiental; convocação e sensibilização da população através das lideranças, associações comunitárias e demais instituições através dos diversos canais e fóruns de comunicação para definição de um novo arranjo institucional para prestação dos serviços de saneamento na cidade do Recife; esse trabalho se desenvolve através da realização de visitas de campo, reuniões, oficinas e assembléias.

Na área de Planejamento e Apoio administrativo seriam:

A coordenação, planejamento e concepção geral dos planos, programas e projetos da SESAN; articulação de ações visando à captação de recursos; acompanhamento, avaliação e controle das ações, projetos e obras da secretaria; acompanhamento e controle orçamentário e financeiro; gestão e acompanhamento físico-financeiro dos contratos; gestão de informática no âmbito da SESAN; elaboração de relatórios mensais e da Gestão; execução orçamentária e financeira e apoio administrativo.

No entanto, o objetivo estatutário do Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas é diverso do contido nos ditos ajustes. Com efeito, o artigo 2º do seu Estatuto estabelece que:

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Art. 2º. O IPSA tem por objetivo a prestação de serviços técnicos nas áreas administrativa, contábil, social e econômica para o desenvolvimento da pesquisa científica, do ensino e da extensão através de:

I – Colaboração com as Universidades, Fundações, Associações, estabelecimentos isolados de ensino superior, ou quaisquer outros tipos de entidades, público ou privadas, nacionais ou estrangeiras, em programas de desenvolvimento científico ou tecnológico;II – Promoção e realização de seminários, assessorias, consultorias, simpósios, congressos, palestras, e estudos relacionados com os diversos ramos administrativo-sócio-econômico;III – Promoção da divulgação de conhecimentos científicos e a edição de publicações, didáticas, técnicas e científicas; IV – Promoção e realização de estudos referentes à defesa, preservação e conservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável;V – Capacitação de estudantes e professores universitários por meio da concessão de bolsas de estudo, de pesquisa e de estágio.

Ante tal incompatibilidade, a Técnica de Auditoria das Contas Públicas Patrícia Santoro de Mello, quando da elaboração do Relatório Preliminar do Processo TC nº 0403276-7, assinalou:

Confrontando o objeto estatutário do IPSA e o objeto contratual, observamos que:

A prestação dos serviços a serem contratados não compreendem a pesquisa, o ensino ou o desenvolvimento institucional, ou ainda, a recuperação social do preso;

A finalidade estatutária do IPSA não contempla qualquer parcela da prestação de serviço nos segmentos da engenharia, da articulação social, do planejamento e do apoio.

Na esteira de tal entendimento, a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, proferiu, nos autos do Processo TC nº 0403276-7, a Decisão nº 1.474/2006 (Documento 09), julgando irregular a Dispensa de Licitação nº 003/04, na qual consta:

Decidiu a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, em sessão ordinária realizada no dia 09 de novembro de 2006, considerando que o interessado não justificou as irregularidades apontadas no Relatório Preliminar, às fls. 76 a 82 dos autos, julgar IRREGULAR a Dispensa de Licitação nº 003/04 objeto da presente Auditoria Especial realizada na

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Secretaria de Saneamento da Prefeitura da Cidade do Recife, e determinar: 1-Que a Secretaria de Saneamento abstenha-se de proceder a qualquer contratação sem licitação com base no disposto no inciso XIII do artigo 24 da Lei nº 8.666/93, quando o objeto pretendido não for conexo com as atividades de pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional precipuamente desenvolvidas pela instituição que se pretenda contratar;

2-Que a dispensa de licitação só deverá ser adotada, em substituição ao procedimento licitatório, quando for para resguardar interesse público tão relevante quanto os que se busca proteger por meio da licitação.

Por fim, que cópias do Relatório Preliminar (fls. 76 a 82), da Defesa (fls. 95 a 107) e da Proposta de Voto nº 042/06 (fls. 403 a 407) sejam encaminhadas ao Ministério Público do Estado, para as providências cabíveis.

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DO DIREITO

O artigo 37, XXI, da Constituição da República, dispõe que as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.

O referido instituto, à luz do dispositivo constitucional, é regrado pela Lei nº 8.666/93; a qual, em seu artigo 3º dispõe que a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.

Conforme leciona Lucas Rocha Furtado, além da busca pela proposta mais vantajosa, a licitação deve realizar o princípio da isonomia. É evidente que a Administração deverá buscar nas propostas apresentadas pelos licitantes aquela que melhor realize seus interesses imediatos. Porém, a busca deste fim, isto é, a busca de maiores vantagens, não autoriza a violação das garantias individuais ou o tratamento mais favorecido à determinada empresa ou a particular em detrimento dos demais interessados em participar do processo. A lei, ao afirmar que a licitação visa igualmente à realização do princípio da isonomia, procura evitar tratamento discriminatório injustificado entre os possíveis interessados1.

Para Marçal Justen Filho2, não só o aspecto econômico deve ser considerado. E comenta que a licitação busca realizar dois fins, igualmente relevantes: o princípio da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa. Se prevalecesse exclusivamente a idéia ‘vantajosa’, a busca da ‘vantagem’ poderia conduzir a Administração Pública a opções arbitrárias ou abusivas. Deverá ser selecionada a proposta mais vantajosa, mas, além disso, tem-se de respeitar os princípios norteadores do sistema jurídico, em especial, o da isonomia.

Entrementes, ao se confrontar as contratações empreendidas pela Secretaria de Saneamento com as normas pertinentes contidas no Estatuto de Licitações, observa-se o acentuado desvio empreendido por aquele órgão nas referidas contratações.

Tal consideração decorre da elasticidade empregada pelos gestores municipais no manejo das hipóteses de dispensa previstas no artigo 24 da Lei nº 8.666/93.

1 Lucas Rocha Furtado, in Curso de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Fórum, 2007, página 31

2 Marçal Justen Filho, in Curso de Direito Administrativo, Editora Saraiva, página 311

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Com efeito, os casos de dispensa foram editados de forma taxativa pelo legislador (numerus clausus). Entretanto, em qualquer hipótese, o espectro da dispensa de licitação não passa de exceção à regra, sendo esta prevalecente e garantida a sua obrigatoriedade.

Cabe salientar que, consoante a boa hermenêutica, toda exceção deve ser interpretada de modo restrito. Não é cabível ampliá-la, alargando o seu campo de incidência.

Essa é a observação firmada por Adilson Abreu Dallari, no sentido de que é um princípio fundamental de hermenêutica que as exceções devem ser tratadas de maneira restrita. Quando houver alguma dúvida quanto à exigibilidade ou dispensa de licitação, é preciso não esquecer de que a regra geral é a exigibilidade, e de que a exceção é a dispensa3.

Com tais considerações, observa-se que o artigo 24, XIII, dispõe ser dispensável a licitação na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos; as compras, sempre que possível, deverão submeter-se às condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado.

Sobre a temática, segue, mui apropriadamente, o escólio de Marçal Justen Filho4:

“Um aspecto fundamental reside em que o inc. XIII não representa uma válvula de escape para a realização de qualquer contratação, sem necessidade de licitação. Seria um despropósito imaginar que a qualidade subjetiva do particular a ser contratado (instituição) seria suficiente para dispensar a licitação para qualquer contratação buscada pela Administração. Ou seja, somente se configuram os pressupostos do dispositivo quando o objeto da contratação inserir-se no âmbito de atividade inerente e próprio da instituição [...].

[...] não há cabimento de invocar o inc. XIII para produzir a execução de objeto que não é inerente à atividade própria da instituição, no âmbito daquelas funções explicitamente indicadas no texto legislativo. Muito menos cabível é desnaturar o fim da instituição para agregar outros objetivos, de exclusivo interesse da Administração, que são encampados pela entidade privada como forma de captar recursos para a sua manutenção.

Nesse sentido, o TCU tem proferido inúmeras decisões. Cabe lembrar passagem que se encontra no Acórdão nº. 1.616/2003 – Plenário, no sentido

3 Adilson Abreu Dallari, in Aspectos Jurídicos da Licitação, 3ª Edição, 1992.4 Marçal Justen Filho, in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos São Paulo,

Editora Dialética, 2005, páginas 254/255

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de que ‘a jurisprudência desta Corte já afirmou que, para a contratação direta com base na norma supra, não basta que a entidade contratada preencha os requisitos estatutários exigidos pelo dispositivo legal, é necessário, também, que o objeto a ser contratado guarde estreita correlação com as atividades de ensino, pesquisa ou desenvolvimento institucional’ (Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti).

As considerações acima efetuadas conduzem à necessidade de um vínculo de pertinência absoluta entre a função da instituição e o objeto da avença com a Administração. Isso equivale a afirmar que somente podem ser abrigadas no permissivo do inc. XIII contratações cujo objeto se enquadre no conceito de pesquisa, ensino, desenvolvimento institucional ou recuperação social de presos.[...]

Mas, ainda quando se configure uma atividade que se enquadre nos aludidos conceitos, é imperioso que o objeto específico da contratação se traduza numa atividade específica da instituição contratada. Assim, uma instituição voltada à pesquisa não pode ser contratada sem licitação para desempenhar atividades de recuperação social do preso. Mais ainda, deve ter-se em vista a vocação específica e delimitada de atuação da instituição no âmbito dos diversos objetos. O raciocínio é o de que não existem instituições de fins gerais. Uma instituição não se dedica à ‘pesquisa’, numa acepção ampla que pudesse abranger todos os setores do conhecimento humano.

Logo, uma instituição voltada ao ‘desenvolvimento institucional’ apenas poderá ser contratada, sem licitação, para atividade que se configure como desenvolvimento institucional. Mais ainda, seria imperioso verificar se a finalidade e o objetivo de desenvolvimento institucional buscados pela Administração se enquadram na específica atuação desempenhada por dita instituição.[...]

Assinale-se que a Decisão nº. 346/1999, proferida pelo Plenário do TCU e que tem sido seguidamente invocada pelo Tribunal, aponta a necessidade de existência de ‘nexo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição, e o objeto a ser contratado, além de comprovada razoabilidade do preço cotado’.[...]”.

Trata-se, conforme abalizada Doutrina, de hipótese de dispensa de licitação em razão da pessoa contratada.

A configuração da hipótese de contratação direta de instituições voltadas à pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional vincula-se obrigatoriamente aos seguintes requisitos:

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a) a instituição a ser contratada necessariamente será brasileira, ou seja, aquela constituída sob as leis brasileiras e com sede e administração no país, sendo, portanto vedada a contratação, sob esse fundamento legal, com instituições estrangeiras;

b) o ato constitutivo da instituição deve estipular como objetivo a pesquisa, o ensino ou o desenvolvimento institucional, ou, ainda, que a instituição seja dedicada à recuperação social do preso, esta última, representa da mesma maneira que as outras hipóteses, um incentivo a tais instituições que têm por escopo promover a ressocialização dos apenados, que estão sob tutela do Estado;

c) a instituição não poderá ter fins lucrativos, assim considerada se visar a obtenção de proveito financeiro em contrapartida ao desempenho de suas atividades fins. Com isso, evita-se a possibilidade de favorecimento de uns em detrimento de outros, a chamada concorrência desleal, ser promovida pelo próprio Estado;

d) a instituição terá necessariamente que deter reputação ético-profissional, que equivaleria ao reconhecimento, pelo mercado, de sua capacitação técnica para execução do objeto do contrato e sua idoneidade, não se confundindo com a notória especialização, mencionada na hipótese de inexigibilidade do art. 25, da Lei de Licitações;

e) existência de nexo entre a especialidade de pesquisa, ensino ou finalidade da instituição com o objeto que a Administração pretende contratar;

f) vinculação personalíssima da instituição contratada com a execução direta do objeto do contrato, vedada a terceirização ou a subcontratação;

g) na hipótese da finalidade de desenvolvimento institucional, este não pode ser interpretado de maneira genérica, mas, sim, de interesse público, que promova o bem estar social tutelado pelo Estado, não se prestando ao atendimento da satisfação de apenas um grupo a ser beneficiado, isto é, deve ser indissociável do interesse público sob responsabilidade e dever do Estado, constitucionalmente estabelecido.

Conforme consta também entre os fundamentos da Decisão nº 1.474/2006 do Tribunal de Contas do Estado, as contratações diretas empreendidas pela Secretaria de Saneamento não possuem o requisito do nexo entre a especialidade de pesquisa da instituição e o objeto pretendido pela Administração.

Nesse sentido, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes registra, quanto à aplicabilidade da norma em destaque, a necessidade de buscar-se "uma

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correlação entre as instituições e o objeto do futuro contrato, embora a Lei expressamente não o exija (...)"5.

Sobre o tema, a orientação jurisprudencial do Tribunal de Contas da União é no sentido contrário à contratação direta fundada no artigo 24, inciso XIII, quando o objeto pretendido não for conexo com as atividades de pesquisas, ensino e desenvolvimento institucional precipuamente desenvolvidas pela instituição que se pretenda contratar.

Com efeito, temos as seguintes Decisões:

Decisão nº 30/2000Processo nº 000.728/1998-5

O Tribunal Pleno, ante as razões expostas pelo Relator, DECIDE:8.2. determinar ao INSS que:8.2.1. limite-se a efetuar contratações com dispensa de licitação fundamentada no art. 24, inciso XIII, da Lei nº 8.666/93 quando, comprovadamente, houver nexo entre esse dispositivo, a natureza da instituição contratada e o objeto contratual, este necessariamente relativo a ensino, a pesquisa ou a desenvolvimento institucional, o que não é o caso de serviços de consultoria organizacional;

Decisão nº 346/19998. Decisão: O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, decide:8.3 – determinar ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis –IBAMA que somente proceda à contratação direta mediante a dispensa de licitação, com base no inciso XIII, do art. 24, da Lei nº 8.666/93, nas hipóteses em que houver nexo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto a ser contratado, além de comprovada a razoabilidade do preço cotado;

Decisão nº 830/1998Processo nº: 001.198/1997-1O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE,com fundamento nos arts. 1º, incisos II e XVI, 41,43 e 45 da Lei nº 8.443/92 e no art. 234 do Regimento Interno/TCU: c.1) proceda ao devido processo licitatório nas contratações de serviços de informática, preservando a dispensa nos termos do inciso XIII do art. 24 da Lei 8.666/93 para quando, excepcionalmente, houver nexo entre este dispositivo, a natureza da instituição e o objeto a ser contratado;

5 Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, in Contratação Direta sem Licitação, Brasília Jurídica, 1ª ed., p. 225

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Acórdão nº 1549/2003Processo nº 004.296/2003-5ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão Plenária, diante das razões expostas pelo Relator e com fundamento nos arts. 1º, II, 43, II, 45 da Lei 8.443/92 e 246 do Regimento Interno, em:9.4. determinar à CPRM que:9.4.2. restrinja as contratações por dispensa de licitação com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei 8.666/93, aos específicos casos em que esteja comprovado o nexo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto a ser contratado, observando sempre a razoabilidade do preço cotado;

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes observa que mais do que isso, é preciso que o objeto que será contratado seja a causa da reputação da instituição pelo modo diferenciado qualitativamente que executa. Por isso não se concebe – e é irregular – que uma instituição seja contratada para objetos distintos, diferentes. Há que ser sempre objeto da mesma natureza em todas as contratações fundadas no art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/93. Se uma instituição ora é contratada para realizar serviço de informática, noutra de pesquisa médica, noutra de treinamento, fica evidenciado que sua múltipla funcionalidade não é pertinente à reputação ético-profissional.6

Por esta razão que Lucas Rocha Furtado assevera que o entendimento não pode ser outro. Na hipótese de desconsideração do objeto a ser contratado (...) estar-se-ia concedendo às entidades em questão privilégios totalmente desarrazoados. Ademais, tal prática provocaria completo desvirtuamento do instituto da licitação, pois qualquer tipo de serviço poderia ser contratado sem licitação, bastando que a contratada possua os requisitos estabelecidos na lei.7

À guisa de arremate, observa-se que, no caso ora em análise, o descumprimento dos comandos do artigo 24, XIII, foi flagrante. O demando Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas possui expertise na área administrativa, contábil, social e econômica. Tais ramos do conhecimento não correspondem ao objeto dos contratos firmados: engenharia e articulação social. Deste modo, é de todo inconcebível a sua contratação direta com suporte no permissivo de dispensa da Lei de Licitações. Tal conduta evidencia descumprimento e desrespeito aos preceitos constitucionais e legais atinentes às licitações e contratações pela Administração Pública.

Da Improbidade Administrativa

6 Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, in Contratação Direta sem Licitação, 6ª Edição, Editora Fórum, Belo Horizonte, 2007, página 500

7 Lucas Rocha Furtado, in Curso de Direito Administrativo, Editora Fórum, 2007, página 439

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O artigo 37, da Constituição Federal dispõe que a administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos poderes da União, dos Estados e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e também que (...) § 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Regulamentando citado dispositivo constitucional, foi promulgada em 02 de junho de 1992, a Lei nº 8.429/92, que, em seu artigo 11 afirma que constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência.

O ato de improbidade administrativa previsto no artigo 11, I, da citada lei deve ser interpretado em consonância com o disposto no artigo 24 e seus incisos da Lei nº 8.666/93.

Vale reiterar, que as hipóteses nele inseridas são taxativas, não sendo possível que a Administração Pública dispense o processo licitatório além daqueles casos, sob pena de se configurar uma dispensa indevida e, conseqüentemente, ato de improbidade administrativa.

O Superior Tribunal de Justiça, examinando a dita questão através do Recurso Especial nº 685.325 PR, firmou a seguinte decisão:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. COMPRA DE MATERIAIS. FRACIONAMENTO DE NOTAS FISCAIS. IMPROBIDADE.I - A Lei de Improbidade Administrativa considera ato de improbidade aquele tendente a frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente . Foi exatamente o que ocorreu na hipótese dos autos quando restou comprovado, de acordo com o circunlóquio fático apresentado no acórdão recorrido, que houve burla ao procedimento licitatório, atingindo com isso os princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade.II - O artigo 11 da Lei 8.429⁄92 explicita que constitui ato de improbidade o que atenta contra os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições. Na hipótese presente também se tratou de atentado, ao menos, contra os deveres de imparcialidade e legalidade, em face do afastamento da norma de regência, in casu, a Lei nº 8.666⁄93.III - Recurso especial improvido.

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ACÓRDÃO: Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Os Srs. Ministros LUIZ FUX, TEORI ALBINO ZAVASCKI (voto-vista) e DENISE ARRUDA votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Relator e JOSÉ DELGADO. Custas, como de lei. Brasília(DF), 13 de dezembro de 2005 (data do julgamento). MINISTRO FRANCISCO FALCÃO Relator

No presente caso, observamos que as dispensas indevidas redundaram na realização de serviços de consultoria no montante de R$ 3.856.000,00 (três milhões, oitocentos e cinqüenta e seis mil reais).

A realização, por parte dos demandados, das dispensas de licitação, ora questionadas, atentaram contra os princípios norteadores da Administração Pública, quais sejam, o da legalidade, e impessoalidade, inobservando, desta feita, o art. 4º da Lei nº 8.429/92.

Quanto à legalidade, resume-se ao dever do agente público de atuar em conformidade com os ditames legais, ou seja, respeitando o ordenamento jurídico vigente, constatando-se sua violação no caso em comento no preciso instante em que foram feitas dispensas de licitação por parte da Secretaria de Saneamento, em desobediência as exceções ao dever de licitar previsto na Lei de Licitações, conforme acima demonstrado.

Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, o princípio da legalidade explicita a subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural da indisponibilidade do interesse público, noção esta que, conforme foi visto, informa o caráter da relação de administração.

Em outra oportunidade, obtempera: fora da lei, portanto, não há espaço para atuação regular da Administração. Donde, todos os agentes do Executivo, desde o que lhe ocupa a cúspede até o mais modesto dos servidores que detenha algum poder decisório, hão de ter perante a lei - para cumprirem corretamente seus misteres - a mesma humildade e a mesma obsequiosa reverência para com os desígnios normativos. É que todos exercem função administrativa, a dizer, função subalterna à lei, ancilar - que vem de ancilla, serva, escrava8.

Da mesma forma, também restou violado o princípio da impessoalidade em face da não deflagração do processo licitatório, permitindo assim que a Administração escolhesse diretamente a empresa contratada, sem que fosse dada a oportunidade para que fossem oferecidas diferentes propostas

8 Celso Antonio Bandeira de Mello, in “Desvio de Poder”, in RDP 89/24, p. 24. e “Discricionariedade e Controle Jurisdicional”, Malheiros Editores, 2ª ed., 1993, p. 50.

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de preços e dos serviços adquiridos, inviabilizando a concorrência entre os pretensos licitantes e possibilitando a atuação imparcial da Administração.

À vista do relatado, a contratação direta de serviços de e consultoria para desenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio, através dos Processos de Dispensa de Licitação nº 03/04 e 02/05, configuram atos de improbidade administrativa, previsto no artigo 11, Inciso I, da Lei 8.429/92.

A punição para aqueles que cometem atos de improbidade administrativa como os mencionados acima está definida no artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:

III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Da Responsabilidade dos Réus

Os três primeiros demandados, na qualidade de agentes públicos, respondem por todos os atos de improbidades administrativas praticados por força dos artigos 1º e 2º da Lei nº 8.429/92.

Sem embargo, cabe ao administrador público ter o controle de sua própria gestão, seja por meio de sua equipe técnica ou de sistemas automatizados que lhe desenhe a ocorrência dos fatos. Esse controle caracteriza maior zelo com a coisa pública e, principalmente, possibilita a busca imposta ao agente público pela eficiência, economicidade e eficácia.

Na vertente situação, os gestores signatários do contrato tiveram a responsabilidade sob o procedimento licitatório, vez que, muito antes de firmado, caberia ter examinado os atos praticados, objetivando verificar a conformidade com a lei, para então adotar o que se costuma chamar de juízo de legalidade, onde a autoridade não dispõe de competência discricionária.

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Assim e considerando tudo que foi apurado, os demandados são responsáveis por todas as ilegalidades cometidas na contratação direta do Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas.

O demandado João Paulo Lima e Silva, na qualidade de ordenador de despesa e representante da Edilidade, de modo livre e consciente, firmou contratação direta do referido Instituto, mediante os Processos de Dispensa de Licitação nº 03/04 e 02/05.

O demandado Marcus Tullius Bandeira de Menezes, na qualidade de ordenador de despesa, de modo livre e consciente, ratificou o Processo de Dispensa de Licitação nº 02/05 e firmou o referido contrato.

O demandado Edgard Galvão Raposo Neto, na condição de Diretor do Departamento de Administração Setorial da Secretaria de Saneamento, de modo livre e consciente, conduziu os Processos de Dispensa de Licitação nº 03/04 e 02/05.

O Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas também responde por ato de improbidade administrativa ex vi o disposto no artigo 3º da Lei nº 8.429/929, vez que foi beneficiado diretamente através das contratações empreendidas pela Secretaria de Saneamento.

A responsabilização desse terceiro não é automática. É imperioso que seja demonstrado que este agiu com dolo ou culpa, posto ser necessário proteger do alcance das sanções previstas na Lei de Improbidade, àquele que se beneficiou do ato ímprobo, que estivesse de boa-fé.

Nesse caso, entretanto, a boa-fé deve ser evidente. Isso porque, como adverte Fábio Medina Osório, in Improbidade Administrativa, Edit. Síntese, 1997, p. 73, nesta seara a culpa daqueles que se relacionam com a administração pública e se beneficiam de improbidade administrativa, todavia, há de ser analisada com o máximo rigor, adotando-se redobradas cautelas quando se analisam as exigências de preparo e conhecimento de quem lida com interesses públicos e desfruta de efeitos da desonestidade ou incompetência dos agentes públicos10.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, esclarece Wallace Paiva Martins Júnior11 que o direito protege a boa-fé, mas não tolera a posição daquele que se aproveita de ato ilegal ou imoral justamente para angariar vantagem. Quem age assim, movido por dolo ou por falta de diligência, não exerce direito regularmente, senão pratica abuso de direito, pois tira dividendos de situação jurídica ilegítima. Não é só o administrador público

9 Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

10 Fábio Medina Osório, in Improbidade Administrativa, Editora Síntese, 1997, página 7311 Wallace Paiva Martins Júnior, in Probidade Administrativa, São Paulo, Editora Saraiva, 2ª edição,

página 291

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que tem o deve de velar pela estrita legalidade dos atos administrativos em geral. Fechando a questão, arremata o citado autor exemplificando que o particular quando contrata com o Poder Público deve sempre (e assim a prudência recomenda) verificar se o ato preenche as formalidades legais, até porque o procedimento pré-contratual (a licitação) é público e conta com sua participação e controle, além do controle público em geral. Esse é um comportamento jurídico.

No evento em exame, cabia ao Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, ter se cercado de todos os cuidados objetivos antes de aceitar a contratação, com dispensa de licitação (e, até mesmo se resguardando de apresentar proposta), para a realização de serviços que sabia não guardar nexo de causalidade com o dispositivo legal invocado pela Administração. Esse comportamento então, expõe a suportar o ônus da ilegalidade cometida pelos agentes públicos ora demandados, como é o caso em questão.

DOS PEDIDOS

1. Do Pedido de Mérito

Ante todo o exposto, depois de autuada e recebida a presente petição inicial com os documentos que a instruem (arts. 282/283 do Código de Processo Civil), requer o Ministério Público a Vossa Excelência seja julgada procedente a presente ação para:

i. Nos termos do art. 12, inciso III, da Lei n. 8.429/92, para condenar:

1. Os demandados João Paulo Lima e Silva, Marcus Tullius Bandeira de Menezes e Edgard Galvão Raposo Neto na suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil equivalente a cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

2. O demandado Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas ao pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

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ii. Sejam os valores relativos às multas civis destinados aos cofres da Fazenda do Município do Recife.

2. Dos Requerimentos Finais

Como medida de ordem processual, requer a notificação e posterior citação para que, querendo, apresentem respostas, no prazo legal, sob pena de presumirem-se verdadeiros os fatos ora alegados (art. 17 da Lei n. 8.429/1992) dos demandados:

João Paulo Lima e Silva, com endereço na Rua Adalberto Camargo, 47, apartamento 401, Aflitos, Recife, PE;

Marcus Tullius Bandeira de Menezes, com endereço na Rua Dom José Lopes, 1136, apartamento 201, Boa Viagem, Recife, PE;

Edgard Galvão Raposo Neto, com endereço na rua São Mateus, 1160, Bloco Q, Apartamento 203, Iputinga, Recife, PE ou rua Antonio Valdevino da Costa, 280, Bloco 9, apartamento 501, Cordeiro, Recife, PE;

Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, com endereço na Rua da Aurora, 295, sala 502, Boa Vista, Recife, PE;

A intimação do Município do Recife, com sede no Cais do Apolo, 925, Bairro do Recife, nesta cidade, na pessoa do seu Procurador-Chefe, para que, querendo, intervenha nos autos no pólo ativo ou passivo desta ação;

Requer, por derradeiro:

1. O recebimento da presente ação sob o rito ordinário;

2. Isenção de custas, emolumentos, honorários e outras despesas na conformidade do que dispõe o artigo 18 da LACP;

3. A produção de todos os meios de prova em direito permitidos.

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos fiscais.

Nestes Termos P. Deferimento

Recife, 28 de janeiro de 2010.

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Charles Hamilton Santos Lima26º Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital

Eduardo Luiz Silva Cajueiro27º Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital

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