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11 3. Histórico do Bem 3.1. O Circulo dos Trabalhadores Cristãos de Uberlândia A Casa do Operário foi a idealizada na década de 1940, para sede da organização social então nomeada Círculo Operário de Uberlândia. Os Círculos Operários compõem um projeto originário de setores da Igreja Católica Apostólica Romana que desde meados do século XIX preocupam-se com o papel da instituição religiosa como um agente social. Em resposta aos dilemas sociais e políticos que envolviam sobretudo as relações entre trabalhadores e patrões, mediadas pelo Estado, o projeto traçou estratégias para conservar e ampliar a abrangência do ideário cristão sem incitar rompimentos com o Estado ou com a organização capitalista da sociedade. Na prática, isso foi feito com a difusão da ação católica entre os trabalhadores, diretamente por meio do movimento circulista, que tornou-se expressivo sobretudo no período entre as décadas de 1930 e 1970 e foi responsável pela criação de centenas de Círculos Operários, muitos deles ativos na atualidade. No Brasil, os Círculos Operários aparecem originalmente como uma mobilização que contempla necessidade de novas classes sociais emergentes, ligadas ao operariado urbano. O movimento se aproxima de tendências corporativistas adotadas como postura política pelo Estado em sua fase populista, como resposta à questão social. Soma-se ao combate a movimentos anticatólicos ou mesmo anticlericais que se proliferavam pelo mundo no início do século, a maior parte deles vinculada a ideologias socialistas, anarquistas, comunistas. Atualmente, o movimento organiza-se por meio de sedes locais, federações estaduais e a Confederação Brasileira de Trabalhadores Cristãos-CBTC. Para se compreender os significados da presença e atuação do Círculo Operário, inclusive em Uberlândia, é importante observar primeiramente alguns aspectos que podem ter motivado a Igreja a se voltar para a nova classe trabalhadora em ascensão. É importante também analisar a trajetória do Círculo Operário no Brasil no período que vai da década de 1930 até a de 1960, devido a suas relações com o fenômeno do populismo e as transformações decorrentes do golpe militar de 1964. Por fim, pode-se analisar os documentos sobre o Círculo Operário provenientes do acervo do núcleo de Uberlândia- MG, para buscar uma melhor compreensão sobre as novas formas de atuação que o circulismo incorporou e desenvolveu ao longo de sua trajetória e assim viabilizar uma melhor compreensão da abrangência e significados do circulismo nesta cidade. Neste breve histórico do bem a chamada Casa do Operário, sede do circulismo em Uberlândia busca-se primeiramente situar o projeto circulista e a importância dos

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3. Histórico do Bem

3.1. O Circulo dos Trabalhadores Cristãos de Uberlândia

A Casa do Operário foi a idealizada na década de 1940, para sede da

organização social então nomeada Círculo Operário de Uberlândia. Os Círculos

Operários compõem um projeto originário de setores da Igreja Católica Apostólica

Romana que desde meados do século XIX preocupam-se com o papel da instituição

religiosa como um agente social. Em resposta aos dilemas sociais e políticos que

envolviam sobretudo as relações entre trabalhadores e patrões, mediadas pelo Estado, o

projeto traçou estratégias para conservar e ampliar a abrangência do ideário cristão sem

incitar rompimentos com o Estado ou com a organização capitalista da sociedade. Na

prática, isso foi feito com a difusão da ação católica entre os trabalhadores, diretamente

por meio do movimento circulista, que tornou-se expressivo sobretudo no período entre

as décadas de 1930 e 1970 e foi responsável pela criação de centenas de Círculos

Operários, muitos deles ativos na atualidade.

No Brasil, os Círculos Operários aparecem originalmente como uma mobilização

que contempla necessidade de novas classes sociais emergentes, ligadas ao operariado

urbano. O movimento se aproxima de tendências corporativistas adotadas como postura

política pelo Estado em sua fase populista, como resposta à questão social. Soma-se ao

combate a movimentos anticatólicos ou mesmo anticlericais que se proliferavam pelo

mundo no início do século, a maior parte deles vinculada a ideologias socialistas,

anarquistas, comunistas. Atualmente, o movimento organiza-se por meio de sedes locais,

federações estaduais e a Confederação Brasileira de Trabalhadores Cristãos-CBTC.

Para se compreender os significados da presença e atuação do Círculo Operário,

inclusive em Uberlândia, é importante observar primeiramente alguns aspectos que

podem ter motivado a Igreja a se voltar para a nova classe trabalhadora em ascensão. É

importante também analisar a trajetória do Círculo Operário no Brasil no período que vai

da década de 1930 até a de 1960, devido a suas relações com o fenômeno do populismo

e as transformações decorrentes do golpe militar de 1964. Por fim, pode-se analisar os

documentos sobre o Círculo Operário provenientes do acervo do núcleo de Uberlândia-

MG, para buscar uma melhor compreensão sobre as novas formas de atuação que o

circulismo incorporou e desenvolveu ao longo de sua trajetória e assim viabilizar uma

melhor compreensão da abrangência e significados do circulismo nesta cidade.

Neste breve histórico do bem – a chamada Casa do Operário, sede do circulismo

em Uberlândia – busca-se primeiramente situar o projeto circulista e a importância dos

12

Círculos Operários no Brasil para, a partir disso, compreender a importância para a

cidade e para o movimento do núcleo circulista local – um dos Círculos mais antigos do

país.

3.2. O Circulo Operário na História

A estreita relação do circulismo com a Igreja exige uma aproximação com os

estudos acerca da instituição católica, bem como o contato com algumas especifidades

dessa bibliografia. De acordo com Jessé Jane Vieira de Sousa1, grande parte dos

trabalhos que surgiram sobre a história da Igreja até o fim da década de 1990 foram

direcionados à “história das ideias” e têm caráter mais abrangente ou, por outro lado,

remetem a estudos de caso ou de atuações de diversas pastorais em diferentes

movimentos. A análise do catálogo da Associação Nacional de História (ANPUH), por

exemplo, entre os anos 1965 a 1994, indica a existência de poucos estudos sobre a

história da Igreja ou sua ação social, embora entre eles alguns abordem aspectos do

circulismo2.

Um estudo acadêmico pioneiro sobre os Círculos Operários em Belo Horizonte e

no Rio de Janeiro, realizado nos Estados Unidos por Howard Wiarda3, focaliza a

resistência da Igreja frente à ditadura militar. Outro estudo, de Berenice Cavalcante

Brandão4, busca as diferenças entre católicos e comunistas, analisando a dinâmica

sindical no Brasil, para concluir que o Círculo Operário foi um movimento irrelevante para

o período. Diferente dessa avaliação, a dissertação de mestrado sobre os Círculos

Operários no Rio Grande do Sul, de Astor Antonio Diehl5, defendida no fim dos anos 1980

e posteriormente editada como livro, aponta o movimento circulista como a base para a

consolidação do corporativismo dos anos 1930 até a década de 1960. Posteriormente, o

autor publica um livro sobre o movimento no estado. Diehl faz um estudo sobre o

conteúdo doutrinário-ideológico dos círculos para compreender melhor o projeto sócio-

1 SOUSA, Jessie Jane Vieira de. Da transcendência à disciplina: os Círculos Operários e a intervenção da

Igreja Católica no mundo do trabalho no Brasil (1930-1964). Tese (Doutorado em História Social)-PPGH-

UFRJ, 1998. 2 No Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES é possível

localizar apenas quinze estudos sobre os Círculos Operários, sendo a maior parte deles sobre o movimento no

Rio Grande do Sul e o mais recente deles a dissertação de Carla Xavier dos Santos, concluída em 2008

(título: Nossa Senhora Medianeira rogai por nós: relação do Estado Novo com a Igreja Católica através dos

Círculos Operários no Rio Grande do Sul – 1937 a 1945). 3 WIARD, Howard. The brazilian catholic labor moviment. Amherst: University of Massachussetts, 1969.

4 BRANDÃO, Berenice Cavalcanti. O movimento leigo no Brasil (as relações entre Igreja e Estado: 1930-

1945). Dissertação (Mestrado em História)-PPGH-UFF. Rio de Janeiro, 1975. 5 DIEHL, Astor Antonio. Os Círculos Operários no Rio Grande do Sul: um projeto social político (1932-

1964). Porto Alegre: EDIPURS, 1990.

13

político da Igreja e dos mecanismos que orientaram os operários. Pela abrangência da

discussão e pela abordagem esclarecedora, trata-se de uma das principais obras sobre

esse tema e referência importante nos apontamentos deste dossiê.

Em geral, os estudos historiográficos tendem a conceber o Estado como

fortemente condicionante das classes e do projeto social. A partir de autores como Paul

Singer, Heloísa Martins, o Estado é apresentado como determinante de uma identidade

para os movimentos sociais, vistos assim como passivos nesse processo – abordagem

que desqualifica o trabalhador ao vê-lo como sujeito passivo e pouco apto a exercer

algum tipo de autonomia política. Outra especificidade da bibliografia sobre a temática,

importante para circunstanciar a relativa escassez de trabalhos sobre o circulismo ou

outros movimentos de caráter religioso, é a proximidade até mesmo ideológica dos

estudiosos com os temas sociais. Durante muito tempo, os historiadores e demais

cientistas sociais que trabalhavam com Estado e os movimentos sociais, em sua maioria,

também militavam nas fileiras de organizações ditas de esquerda, resultando em certa

dificuldade desses estudos em atribuir grande importância a um movimento quase

sempre de cunho conservador, como é o caso do Círculo Operário.

Há ainda análises que compreendem os Círculos Operários como a

materialização do projeto da Igreja Católica para os operários brasileiros, exemplo de

uma instituição católica e corporativista. De acordo com João Batista Marçal6, os Círculos

Operários foram fruto do engajamento de alguns padres e políticos para se projetarem e

controlarem as organizações operárias e de esquerda. Seriam, portanto, fruto de em um

momento de recrudescimento do poder da Igreja Católica na sociedade e consequente

direcionamento de suas ações de modo a aliar-se mais fortemente ao Estado,

especialmente no esforço para deter o avanço do comunismo. Autores como Hans

Fuchtner7, em seu estudo sobre o sindicalismo no Brasil, apontam o Círculo Operário

como a vanguarda do combate ao comunismo e da colaboração com o Estado Novo, por

exemplo.

Esse breve quadro dos estudos realizados sobre o Círculo Operário poderia ser

então classificado a partir de três eixos principais de entendimento do movimento: como

forma de trampolim político para organizações de trabalhadores, como palco imediato da

atuação da Igreja ao lado do Estado, ou ainda como uma reação da comunidade contra o

que se entendia como espectro do comunismo – sobretudo das comunidades cristãs. De

algum modo, essas três dimensões estão presentes no movimento em Uberlândia.

6 MARÇAL, João Batista. Primeiras Lutas Operárias no Rio Grande do Sul: origens do sindicalismo

riograndense. Porto Alegre: Globo, 1985. 7 FUCHTNER, Hans. Os sindicatos brasileiros: organização e função política. Rio de Janeiro: Graal, 1980.

14

3.3. Os Círculos Operários

O movimento operário católico surgiu com o propósito de suprir algumas

carências percebidas na sociedade, decorrentes de certa ineficiência ou de insuficiências

das políticas de Estado em relação à população, especialmente aos trabalhadores. Esse

aspecto assistencialista foi fundamental para a expansão do movimento. Por outro lado, a

perspectiva social e política do ideário difundido pela Igreja Católica, alimentada por uma

visão de totalidade e harmonia social, foi decisiva para a caracterização do movimento.

De acordo com Diehl, o projeto pontificial enfatizava a busca pela “harmoniosa

convivência das classes sociais, onde os conflitos sociais seriam abolidos via mutualismo

e na „cristianização da cultura brasileira‟. Esta fórmula envolvia tanto a educação da

burguesia como a do operariado.”8

Os Círculos Operários estruturam-se como organizações da sociedade civil de

composição mista, autoproclamadas interprofissionais e apolíticas. Recebem

trabalhadores de qualquer especialidade, idade, região ou crença, com o objetivo

expresso de atuar pelos direitos e interesses dos trabalhadores de forma solidária e

coordenada. Ao lado da preocupação com a assistência diante das questões mais

urgentes advindas da carestia de vida, a mais destacada finalidade dos Círculos

inicialmente era reconduzir os trabalhadores à Igreja Católica, por isso o empenho do

Pontificiado desde o final do século XIX em buscar a promoção da volta aqueles que

“vivem no desprezo da fé cristã ou nos hábitos que ela reprova”9. Uma ampla abordagem

da questão social na doutrina católica foi definida, sobretudo, pela encíclica Rerum

Novarum do Papa Leão XIII, em 189110. A desumanidade e a injustiça social

testemunhados nas relações dos trabalhadores na sociedade contemporânea foram

minuciosamente pautadas por esse documento, tomado a partir de então como referência

para as discussões sociais da Igreja.

De qualquer forma, nós estamos convictos, da urgente necessidade de

auxiliar os homens das classes inferiores com medidas prontas e eficazes,

8 DIEHL, op. cit., p. 10

9 Documento: Os Círculos Operários, a Ação Católica, a Ação Social. Rio de janeiro, 1949, p. 05. Acervo do

Círculo dos Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, doravante denominado: Acervo do CTCU. 10

Carta encíclica Rerum Novarum ou “das coisas novas”, divulgada em 15 de maio de 1891, tornou-se de

imediato referência para as discussões sobre os trabalhadores e suas condições de vida nas relações

capitalistas, tornando-se posteriormente documento referencial do circulismo. O texto integral está disponível

em: http://www.vatican.va/holy_father/leo_xiii/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-

novarum_po.html. Acesso em junho de 2009.

15

visto estarem eles em sua quase totalidade, numa injusta situação, de

infortúnio e miséria. [...] Princípios e sentimentos religiosos desapareceram

das leis e instituições públicas e assim, a pouco e pouco, os trabalhadores,

isolados e indefesos, viram-se, com o correr dos anos, a mercê de patrões

desumanos e entregues à cupidez de uma desenfreada concorrência. [...]

A tudo isso, acrescente-se a concentração nas mãos de alguns poucos, da

industria e do comércio, tornados monopólios de pequeno numero de ricos

e opulentos que assim impõem um jugo quase servil a infinita multidão dos

proletários.

Quarenta anos depois, durante o papado de Pio XI, o mesmo documento foi

retomada com um caráter mais incisivo na encíclica Quadragesimo Anno. Estas cartas

ocupam-se especialmente da chamada “questão social” e, além do diagnóstico da

situação vivenciada naqueles anos, apontam uma solução para as relações entre o

Estado e o Capitalismo: uma possibilidade para a restauração e o aperfeiçoamento da

ordem social em conformidade com a doutrina cristã, a fim de harmonizar as lutas sociais

e revalorizar virtudes cristãs como o amor e a solidariedade. Ao sublinhar a crueldade do

capitalismo como origem das condições desumanas em que viviam os trabalhadores no

século XIX, a Rerum Novarum apontava como solução a religião. Segundo o Pio XI em

1931,

[a Rerum Novarum] não pediu auxílio nem ao liberalismo nem ao

socialismo, pois que o primeiro se tinha mostrado de todo incapaz de

resolver convenientemente a questão social, e o segundo propunha um

remédio muito pior que o mal, que lançaria a sociedade em perigos mais

funestos11.

Não se registra nesses documentos qualquer proposta de superação do

capitalismo, em pauta nos movimentos de trabalhadores pelo menos desde meados do

século XIX, mas sim a imperativa necessidade de se aniquilar os conflitos entre classes e

interesses, numa tentativa de harmonizar organicamente a pratica do sistema e do

trabalho. A estratégia, sobretudo a partir da orientação de Pio XI na década de 1930, era

manter o controle ideológico e cultural das classes dirigentes, e assim, organizar um

11

Carta encíclica Quadragesimo Anno, do Para Pio XI, 1931. Disponível em:

http://www.vatican.va/holy_father/pius_xi/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_19310515_quadragesimo-

anno_po.html. Acesso em junho de 2009.

16

sistema consensual entre capital e trabalho. O perigo maior, denunciado desde as

encíclicas de Pio IX, como a Qui Pluribus (1846), era a ameaça do comunismo ateu. Para

Pio IX a doutrina comunista, “uma vez aceita, seria a ruína completa de todos os direitos,

das instituições, da propriedade e da própria sociedade humana” – ideia reiterada com

vigor por Leão XIII, sobre o comunismo: “Peste mortífera, que invade a medula da

sociedade humana e a conduz a um perigo extremo.”12

Esses documentos orientaram a doutrina social da Igreja e formaram a base para

a Ação Católica, que orientava a participação de leigos no apostolado católico.

Incentivada veementemente na década de 1930 por Pio XI, teve entre as iniciativas de

maior êxito a Ação Católica Operária, na qual se insere o circulismo13. Essa doutrina

considerava tanto espectro do comunismo quanto as injustiças do capitalismo como

ameaças aos domínios da Igreja. Pode-se dizer que a doutrina social católica propõe

uma resposta para os malefícios do capitalismo diferente das correntes de esquerda, de

perfil mais conservador. O direito a propriedade privada é entendido como algo natural do

homem e considera-se pecado a violação desse direito. Porém, o sistema liberal é

acolhido com reservas, na medida em que corrompe o homem, condiciona-o apenas ao

consumo e ao lucro e reprime o trabalhador limitando suas condições de vida. Sobre o

sistema capitalista, o Papa Pio XI faz a seguinte consideração na encíclica

Quadragésimo Anno:

[...] é, pois, evidente que ele não é condenável em si mesmo. De fato, não

é sua estrutura intima que é má; há porem violação da Justiça, sempre que

o capitalista contrate trabalhadores ou a classe proletária visando

exclusivamente a explorar, em seu proveito pessoal e ao seu agrado, toda

a industria e o regime econômico, sem atender nem a dignidade humana

dos operários, nem ao caráter social da atividade econômica, e nem

mesmo a justiça social e ao bem comum14.

Nesse contexto, o objetivo central dos Círculos Operários estruturados com essa

base doutrinária é unir os trabalhadores em uma organização forte, capaz de promover a

12

Carta encíclica Divini Redemptoris, do Para Pio XI, 1937. Ele retoma pontífices anteriores para expressar

seu juizo sobre o tema: “o comunismo é intrinsecamente perverso... e não se pode tolerar colaboração com

ele, de quem quiser salvaguardar a civilização.” Disponível em:

http://www.vatican.va/holy_father/pius_xi/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_19370319_divini-

redemptoris_po.html. Acesso em agosto de 2009. 13

Verbetes: Ação Católica e Círculo Operário. ÁVILA, Fernando Bastos de. Pequena Enciclopédia da

doutrina social da Igreja. 2 ed. São Paulo: Ed. Loyola, 1993. 14

Carta encíclica Quadragesimo Anno, do Para Pio XI, 1931.Op. cit.

17

justiça e a harmonia na sociedade, além de prestar assistência em todos os níveis da

vida a seus sócios. Os circulistas participavam de reuniões de formação, cursos, tinham

acesso a material impresso que dizia respeito a diversos conteúdos de cunho cultural,

social, moral e, sobretudo, doutrinário. Parte significativa do acervo reunido na Casa do

Operário de Uberlândia testemunha esse cuidado teórico-ideológico. Neles, orienta-se a

formação dos Círculos a partir da participação de “operários de ambos os sexos,

pertencentes aos ramos de indústria, lavoura, comércio, artes, companhias, transportes e

trapiches; empregados públicos, domésticos pequenos trabalhadores por conta própria,

etc., que sejam respeitadores da família e da moral”15.

Os manuais dos Círculos evidenciam o caráter assistencialista do movimento,

mas jamais deixam de lado a questão organizacional e administrativa, mesmo que

apontem restrições ao envolvimento de clérigos em aspectos econômicos e gerenciais,

reservando-lhes a assistência ao campo da doutrina16. É interessante notar que uma das

primeiras ações do Círculo Operário de Uberlândia após sua fundação foi buscar o

referencial teórico e as orientações práticas junto ao movimento circulista, como garantia

de implementação da sociedade. Entre os primeiros documentos encontrados atualmente

nos acervos da Casa do Operário na cidade está o Manual do Círculo Operário,

publicado em 1939 pela Confederação Nacional de Operários Católicos, sediada no Rio

de Janeiro, e solicitado pela diretoria uberlandense ao Assistente Eclesiástico da

Confederação, pe. Leopoldo Brentano17. Além de apresentar-se como “guia seguro para

os circulistas”, a publicação buscava aprofundar o entendimento do ideário envolvido na

iniciativa, e buscava ser referência “aos estudiosos da organização cristã de caráter

econômico e social no Brasil”, pois fundamenta-se na premissa de que os Círculos

Operários surgiram do estudo de condições e necessidades sociais peculiares.

Além do assistencialismo e da fidelidade à doutrina social da Igreja, o circulismo

foi um movimento que procurou interagir com sindicatos, organizações trabalhistas e

sociedades beneficentes a fim de superar a desconfiança que algumas dessas

instituições tinham em relação ao papel social da Igreja e desfazer os preconceitos

15

Material gráfico dos Círculos Operários. Casa Gomes – Tipografia e Papelaria – 7 de setembro., Rio de

Janeiro,1953. Acervo do CTCU. 16

A Santa Sé recomenda com firmeza e o Direito Canônico preceitua que os Sacerdotes não

assumam responsabilidade direta de ordem técnica, financeira ou econômica. O mesmo vale para

a A.C (Ação Católica), a qual, no dizer de Pio XI, não deve assumir responsabilidade na parte

puramente técnica, financeira ou econômica que está fora de sua incumbência e finalidade. Documento: Os Círculos Operários, a Ação Católica, a Ação Social. Rio de janeiro, 1949, p. 09. 17

Manual do Círculo Operário-publicado pela Confederação Nacional de Operários Católicos. Petrópolis-

RJ: Ed. Vozes, 1939. Trata-se de uma extensa publicação, com prefácio de Alceu Amoroso Lima, abordando

aspectos da organização dos Círculos (histórico e perspectivas), das relações jurídico-sociais, das diretrizes e

métodos do circulismo, oferecendo ainda detalhados modelos de regimentos, regulamentos e outras diretrizes

de organização do movimento. Acervo do CTCU.

18

cristalizados, sobretudo em decorrência da propaganda entendida como de esquerda.

Porém, ao longo da trajetória do circulismo, as tensões e divergências entre os preceitos

do movimento e as tendências socialistas de outras mobilizações de trabalhadores

manteve-se como um forte traço, inclusive no Brasil e em Uberlândia.

Os primeiros núcleos brasileiros foram criados no Rio Grande do Sul, nas cidades

de Pelotas, Porto Alegre, Rio Grande, Santa Maria e Caxias, em 1932. Esses foram os

mais atuantes e tiveram como um de seus referenciais inspiradores as chamadas greves

operárias da Primeira República, a partir dos anos 1910. O primeiro congresso do

movimento é realizado em 1935, no Rio Grande do Sul, e no Congresso Eucarístico de

Belo Horizonte, em 1937, há uma resolução que determina a fundação de Círculos

Operários em todos os centros urbanos, além da indicação para que se organizasse o

primeiro congresso operário católico nacional no Rio de Janeiro, no mesmo ano – evento

que registra a presença de quarenta entidades católicas, sendo trinta e quatro do

movimento circulista18.

O primeiro Congresso dos Círculos Operários de 1935 organizou a Federação dos

Círculos Operários do Rio Grande do Sul, que contou com a participação de 21

municípios, tirou como estratégia, a expansão do Circulo fazendo um debate sobre o

sindicalismo para neutralizar o avanço das forças de esquerda tendo na época, a Aliança

Nacional Libertadora como principal força.

Em 1937 fundou-se a Confederação Nacional dos Círculos Operários, que

posteriormente, transformou-se na CBTC (Confederação Brasileira de Trabalhadores

Cristãos), com sede em Brasília. Já na fundação havia 34 CO filiados, totalizando 31.000

associados.

De 1932 a 3945 a expansão foi favorecida pela legislação trabalhista posta em

prática durante o governo de Getúlio Vargas e pela ilegalidade das organizações de

esquerda. O quadro abaixo extraído do livro de Diehl demonstra que o numero de circulo

e de associados cresce vertiginosamente entre as décadas de 30 a 50. Com a

redemocratização a relação dos CO com outras organizações trabalhistas tornou-se mais

competitiva, até a década de 60 quando iniciou-se a sua decadência.

18

Informações baseadas em Manual..., op. cit., 1939, p.25-32.

Ano 1937 1942 1950 Anos 60

Nº de Sindicatos Filiados

Associados

Federações filiadas

34

31.000

-

142

150.000

4

275

300.000

11 88

415

450.000

17

19

Os círculos são entidades municipais, de acordo com o tamanho da cidade, ela

pode ter núcleos divididos por zonas, e finalmente, cada zona pode ser dividida em

grupos, como orientam minuciosamente os manuais do circulismo.

Reprodução do esquema organizacional editado em: Manual do Círculo Operário-

publicado pela Confederação Nacional de Operários Católicos. Petrópolis-RJ: Ed.

Vozes, 1939

3.4. O Círculo Operário em Uberlândia

O núcleo de Uberlândia do Círculo Operário foi fundado em 17 de dezembro de

1942, dez anos depois da fundação do primeiro círculo no país e quase simultaneamente

a outros núcleos próximos, de Ribeirão Preto e Araguari19. Mas, a cerimônia de fundação

do Circulo foi realizada no dia 1 de maio de 1943, dia do trabalho, com a presença de

autoridades locais e lideranças de outros Círculos.

A despeito das mudanças ocorridas ao longo da trajetória, inclusive na

denominação da entidade – que passou a chamar-se Círculo dos Trabalhadores Cristãos

de Uberlândia, em 1964 a iniciativa já atravessa mais de seis décadas. Entre os primeiros

registros de atividades do núcleo está um chamado expressamente dirigido aos operários

uberlandenses, a fim de participarem de reuniões aos sábados, no salão de festas do

Colégio Nossa Senhora, para esclarecimentos e melhor compreensão sobre as

finalidades dos Círculos Operários.

19

O núcleo de Araguari foi instalado em 3 de março de 1943, com a presença de trinta representantes do

núcleo uberlandense, conforme correspondência de 3 e 15 de março de 1943; o núcleo de Ribeirão Preto foi

fundado em 6 de dezembro de 1942.

20

O extenso registro da correspondência enviada e recebida pelo núcleo deixa

sinais claros de que os quatro primeiros meses do Círculo Operário de Uberlândia foram

intensamente dedicados a três ações principais: busca articulações e contatos com

trabalhadores e com as organizações sociais existentes na cidade; busca de

reconhecimento e respaldo entre autoridades na região, além do constante contato com o

movimento fora da cidade, para pautar seus referenciais teóricos, para solicitar material

de formação e de divulgação do circulismo (inclusive bandeiras, brasões, distintivos,

carteiras de filiação, material administrativo etc.), para informar e manter-se informado

sobre as atividades dos outros núcleos.

São atividades que se estendem ao longo de pelo menos duas décadas com

significativa intensidade, mas nesses primeiros meses, entre a fundação e a instalação

Fig. 1. Cópia do Jornal “O Repórter” de 5 de maio de 1943. Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU

21

oficial do núcleo, nota-se a articulação das ações em torno da constituição de um lugar

expressivo para o Círculo na sociedade, logo de início. São feitos contatos com a Rádio

Difusora Brasileira SA (sede uberlandense), com jornais e representantes de

trabalhadores, para garantir a ampla divulgação da proposta que se inaugurava. Chama

atenção o contato com a Companhia de Força e Luz explicitando as motivações do

Círculo e pedindo permissão para se colar nos postes de iluminação da cidade “os

boletins que conclamam os operários a se organizarem”20. Há também uma

correspondência enviada a prefeitura municipal solicitando serviço de esgoto para

atender ao novo barracão construído para sediar o CO de Uberlândia.Em toda

correspondência inicial de divulgação repete-se a importância declarada para a iniciativa:

contribuir para “a boa solução da questão social e para o progresso da cidade” –

argumento inteiramente filiado aos princípios do movimento circulista originado na Ação

Católica. Na lista de convites enviados, identifica-se entidades e autoridades numerosas,

entre as quais: o prefeito Vasconcelos Costa, juízes de direito, delegado regional,

promotor de justiça, Associação de Chauferes, Associação Comercial, Associação de

Empregados do Comércio, Associação Operária Uberlândia, União dos Transportadores

Rodoviários do Brasil Central, além de jornais e outros convites nominais21.

Na ata de instalação do Círculo, dia primeiro de maio de 1943, registra-se a

presença de representantes enviados por grande parte dos convidados. Uma missa na

Igreja Matriz de Santa Therezinha, às 8h., e uma sessão solene de instalação, no salão

de festas do Colégio Nossa Senhora marcam oficialmente a posse da diretoria e o início

das ações do Círculo Operário de Uberlândia. Além de informar imediatamente a

instalação à hierarquia superior do movimento – confederação nacional e federação

estadual –, a diretoria recém instalada responde prontamente a solicitação do Ministério

do Trabalho sobre a composição da entidade. Em correspondência de agosto de 1943,

informa oficialmente o nome (Círculo Operário de Uberlândia), a sede (Salão de Festas

do Colégio Nossa Senhora), diretores (Ruy Barbosa Horta, presidente; Ruy Miranda,

vice-presidente; Mário de Andrade; Geraldo Gomes; João Rodrigues Rocha; Angelo

Cunha; Cônego Eduardo A. dos Santos, assistente eclesiástico; Caio Lima Santa Cecília,

delegado geral), número de sócios (cento e oitenta), além de um estrato dos estatutos22.

A documentação referente aos primeiros dez anos de atividade do Círculo

denotam sua expressiva atuação na sociedade uberlandense, nas mais diversas

atividades. Nota-se em 1943 a criação de uma escola para favorecer os filhos dos

20

Correspondência de 19/3/1943 ao gerente da Companhia de Força e Luz de Uberlândia. Acervo do CTCU. 21

Correspondências de abril de 1943. Entre os nomes convidados individualmente: Alexandre Santos, José

Paniago, Jacy de Assis, Lourival de Queiroz, Arnald Godoy de Souza, Luiz Abinades. Acervo do CTCU. 22

Correspondência de 31/8/1943, ao Ministro do Trabalho. Acervo do CTCU.

22

operários, a mobilização constante na campanha anticomunista e anti-integralista23

(solicitam da confederação, “por caridade”, o envio urgente do material anticomunista ao

núcleo, além de denunciarem à Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais a

ocorrência de reuniões de comunistas nas escolas da região), a realização de

assembléias gerais de trabalhadores (em grande parte no Eden Cinema), a criação em

1947 da Cooperativa Circulista de Consumo Ltda. (presidida pelo guarda-livros Antonio

Maria Zukanovich), a orientação sistemática para a formação de sindicatos específicos

para as categorias profissionais, além da assistência constante aos sócios24.

A orientação para os sindicatos seguia rigorosamente os subsídios

constantemente solicitados à Comissão de Orientação Sindical do movimento circulista, e

buscava diferenciar a natureza dos dois modelos de organização de trabalhadores,

conforme definia a doutrina do circulismo. A orientação interprofissional deveria

caracterizar as ações circulistas, entendida como “obras das obras”, enquanto a ação

sindical deveria ser própria de cada categoria profissional, como “obra dos homens”.

Nota-se, inclusive, uma preocupação marcante do Círculo Operário de Uberlândia em

seus primeiros anos com a formação dos filhos dos operários – algo que responde de

forma direta à orientação da doutrina circulista que priorizava a família como núcleo

formativo de valores. Há registros de várias guias de encaminhamento de filhos de

associados para matrícula em escolas da cidade, sobretudo nos chamados “cursos de

madureza” ao longo da primeira década do Círculo.

Afinal, quem eram os sócios do Círculo? A abrangência dos circulistas era então

bastante plural. Ao se observar a composição da diretoria que toma posse em 1947, por

exemplo, sob a presidência do bancário Caio Lima de Santa Cecília, nota-se a presença

de comerciários, carroceiros, graniteiros, marceneiros, guarda-livros e carpinteiros entre

os diretores e secretários. Uma análise do livro de matrícula dos associados da primeira

cooperativa de consumo montada no COU de 1947 a 1955 testemunha uma variedade

ainda maior de profissões representadas no Círculo: industriais, bancários, comerciantes,

serventes, pintores, pedreiros, marceneiros, pequenos e médios comerciantes, altos

membros do clero como Monsenhor Eduardo, etc.. Ou seja, composição do núcleo era

desde pequenos trabalhadores, até autoridades religiosas, políticas e até industriais.

23

Muitas Atas de 1946 e 1947 trazem que as reuniões eram iniciadas com esclarecimentos do presidente

sobre calúnias proferidas contra o CO principalmente por membros do PCB de Uberlândia. Há também uma

denuncia de reuniões de integralistas (na época o Integralismo já era considerado ilegal) no colégio Bueno

Brandão. 24

Informações colhidas no conjunto das correspondências entre 1943 e 1952. Acervo do CTCU.

23

Fig. 2. Passeata de comemoração do Dia do Trabalho em 1º de maio de 1946.

Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU.

Percebe-se o esforço do CO em instruir seus associados. Além da escola de

alfabetização, há na biblioteca do Circulo vários livros sobre filosofia, literatura e arte. O

Circulo promovia atividades de lazer e artísticas para seus associados, freqüentemente

havia apresentações teatrais e outras atividades culturais. Algumas festividades eram

realizadas com o intuito de levantar fundos para financiar ações do Circulo.

Fig. 3. Primeira turma de formandos do primário da escola do Circulo em 1971.

Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU.

Fora os títulos dessa natureza, há um imenso material de estudo da Doutrina

Social da Igreja e escritos anticomunistas além de manuais de formação de lideranças

24

para o Circulo e os sindicatos parceiro. Esses manuais tinham prerrogativas que vão

desde como deve ser a conduta de um circulista militante, até os delegados, diretores e

presidentes de Círculos.

Fig. 4. Curso de formação de lideranças operárias na sede do Circulo em 19 de dezembro de 1976. Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU.

Fig. 5. Curso de formação de lideranças operárias na sede do Circulo em 1º de dezembro de 1990. Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU.

As correspondências do Círculo mostram um movimento muito bem articulado,

com participação em vários eventos de caráter regional e nacional e um contato próximo

com a organização nacional do movimento circulista, bem como com a classe política

25

dirigente no momento. Porém, o golpe militar de 1964 reprimiu severamente as

instituições que tinham práticas de auxílio mútuo ou que poderiam ser identificadas com

opositores ao regime, sobretudo aquelas formadas por trabalhadores e estudantes. Os

Círculos não escaparam à regra. Durante o período da ditadura militar, os Círculos

Operários se alteraram, núcleos foram fechados, o número de sócios diminuiu

gradativamente e a forma de atuação dos circulistas foi se adaptando a novas demandas.

Paradoxalmente, o fortalecimento de sindicatos de várias categorias profissionais ao

longo da década de 1970 – alguns deles formados com o apoio dos círculos, inclusive em

Uberlândia – tornou-se aos poucos um fator de desagregação do circulismo em muitas

localidades.

Nas últimas décadas o Círculo Operário acentuou seu perfil assistencialista,

promovendo uma série de ações para capacitar as pessoas para o mercado de trabalho,

além de associar-se a outras organizações sociais de caráter comunitário ou mesmo

filantrópicas, oferecendo seu espaço para cursos ligados às artes, à dança, bem como

atividades direcionadas a chamada terceira idade. O movimento circulista nacional

continua ativo, articulado, com encontros regionais e nacionais periódicos e ações

voltadas à divulgação de seus princípios e ideário, em grande parte pautados na doutrina

católica dos primeiros momentos da Ação Católica Operária, embora a preocupação

central com as tensões entre capital e trabalho tenham assumido cada vez mais um

papel secundários entre as novas bandeiras de luta e identificação do movimento.

O núcleo de Uberlândia seguramente acompanha esse percurso. Se a sede do

Círculo, a Casa do Operário, não se organiza mais para as grandes assembléias de

trabalhadores da década de 1950, hoje ela permanece uma referência importante do

ponto de vista da assistência e do apoio àqueles que a procuram. Desde 1949, a Casa

conta com o reconhecimento de seu status como entidade de utilidade pública

(reconhecida em nível municipal pela lei n. 68 de 28 de maio de 1949), e desfruta

anualmente de subsídios ou incentivos fiscais municipais25 que auxiliam a manutenção de

suas atividades. Merece destaque, nesse sentido, o apoio da prefeitura municipal para a

construção, assinada pelo construtor Luciano do Amaral, da “sede definitiva do Círculo

Operário” – a Casa do Operário , conforme pedido feito em 195126. O edifício que

25 Lei Municipal nº XII, de 27 de fevereiro de 1948, sancionada pelo prefeito José Fonseca e Silva. Art: 1º

Concede isenção de impostos para imóveis de propriedade das associações de classe, que sejam ou venham a

ser consideradas de utilidade pública por lei federal, estadual ou municipal. Art: 2º A isenção somente

concedida se os prédios forem usados exclusivamente dentro das finalidades da associação. 26

Solicita isenção de imposto predial com base na lei de 27 de fevereiro de 1948, que isenta as associações

de classe consideradas de utilidade pública. A julgar-se pela correspondência do núcleo, o pedido é atendido,

pois há várias cobranças de impostos arquivadas com indicação de isenção anotadas e reconhecidas. Acervo

do C.T.C.U.

26

atualmente abriga o Círculo dos Trabalhadores Cristãos de Uberlândia foi inaugurado em

1 de maio de 1952, que contou com uma série de festividades em comemoração ao dia

do trabalho.

Sedes do Círculo Operário de Uberlândia:

1942: Salão de Festas do Colégio Nossa Senhora (praça Coronel Carneiro,11);

1946: imóvel à rua Arthur Bernardes, n.8,

1947: imóvel para sede social à Rua Bernardo Guimarães, n. 319,

1948: Ata da 63ª reunião do Círculo no dia 18 de março anuncia a compra do barracão

na rua Bernardo Guimarães, n 344, no valor de R$ 200.000 (duzentos mil) cruzeiros de

posse do senhor Joaquim Marques.

1951: pedido de licença à Prefeitura para construção da sede definitiva a ser denominada

Casa do Operário, reivindicando isenção de impostos por tratar-se de entidade de

utilidade pública;

1952: bênção solene das obras da sede definitiva

1952: os vereadores da câmara municipal aprovam o auxílio de R$30.000 cruzeiros para

a cobertura de parte dos débitos da construção da sede do Círculo.

1952: Inauguração da sede definitiva – Casa do Operário

3.5. A sede do Círculo Operário de Uberlândia

A Sede do Círculo dos Trabalhadores Cristãos de Uberlândia compreende um

conjunto de edifícios que foram construídos em distintos momentos ao longo do tempo,

com diferentes graus de qualidade técnica e construtiva.

O imóvel - compreendendo o terreno, um barracão e uma casa - foi adquirido em

1948, conforme registrado em Escritura datada de 15 de maio deste mesmo ano, sendo

vendedor o Sr. Joaquim Marques Povoa27, pelo valor de CR 35.000,0028 (trinta e cinco mil

cruzeiros), e o adquirente representante do Círculo Operário, o Sr. Caio Lima Santa

Cecília. Segundo a escritura de compra, o barracão era coberto de telha comuns e

27

A escritura registra que o terreno havia sido adquirido pelo Sr. Joaquim Marques Povoa, em parte do Sr.

Joaquim Avelino de Lima e sua mulher (Escritura pública registrada no Cartório de Registro de Imóveis

desta Comarca sob no. 442, em 24 de maio de 1923) e, em parte, por arrematação no inventário do Sr. Ozório

José Dias, conforme registro no mesmo Cartório sob o no. 5.124, de 17 de junho de 1920) e que as

benfeitorias existentes no terreno foram feitas pelo Sr. Joaquim Marques Povoa. 28

A Ata do dia 18/05/1948 traz valores diferentes dos que constam na escritura da compra do imóvel. De

acordo com esse documento, o valor do terreno é de CR 80.000,00 (oitenta mil cruzeiros) com um acréscimo

de 10.000,00 (dez mil cruzeiros) de juros. O pagamento foi feito com uma entrada de 20.000,00 (vinte mil) e

60 notas promissórias de 1.000 (mil) e uma última de 10.000 (dez mil).

27

entijolado e a casa possuía cobertura de telhas francesas, com quatro cômodos

assoalhados e três entijolados, existindo ainda, junto à casa, duas pequenas cobertas de

telhas, uma protegendo o tanque e outra para guardar lenha. O terreno, de formato

irregular, possuía uma área total de 1.050 metros quadrados e era todo murado29.

Fig. 6.Vista frontal do antigo barracão. Fonte: PEIXOTO, Ana Paula et al. Casa do Operário – Dossiê de Tombamento, 2003.

Logo após a aquisição desse imóvel, teve início uma mobilização para a

construção da sede. Para angariar fundos para a construção, foram feitas uma série de

festividades e rifas e a Prefeitura Municipal de Uberlândia também contribuiu concedento

verba e isenção de tributos por ser de utilidade pública e uma ajuda de custo concedida

pela câmara dos vereadores30.

Não foram encontrados registros oficiais quanto às datas de construções e a

reformas dos diversos imóveis. Algumas informações orais indicam que as obras de

construção do novo edifício no alinhamento frontal do terreno, que recebeu o nome de

29

A escritura oferece a seguinte descrição dos limites do terreno: “O terreno de forma irregular, mede 112,60

m. de frente à R. Bernardo Guimarães, lado extrema esquerda, em linha reta, em direção ao fundo, outra reta

de 66,70 m., dos quais 44,50 cm. Confrontando com Antônio Marques Povoa, e 22,20 m. com Joaquim

Marques Povoa; tendo ao fundo, tomando-se a esquerda, uma linha reta de 14,50 m. confrontando com João

Rodrigues de Castro; ao fim desta linha, tomando-se a esquerda, uma linha reta de 22,20 cm., confrontando

com Pascoal Bruno; no final desta última linha, tomando-se a direita em ângulo reto, uma nova linha reta de

1,50m., em confrontação com o mesmo Sr. Bruno; dai tomando-se à esquerda, uma nova reta, pendendo para

a esquerda, até atingir o alinhamento da rua e em confrontação com Rubens Pereira, Bolívar Ribeiro,

Joaquim Teodoro dos Santos e Wilson Testa”. 30

Ver documentos em anexo.

28

“Casa do Operário”, teriam começado em 1948. Entretanto, os dois projetos encontrados

no arquivo da Instituição referentes a este imóvel trazem datas de aprovação junto ao

Município no mesmo ano de 1951. Como o segundo projeto é uma alteração do primeiro,

e ambos são datados do mesmo ano, é pouco provável que neste caso tenha ocorrido

uma situação bastante freqüente do projeto ser aprovado após o início ou mesmo

finalização da obra. O pedido de licença para construção e isenção de impostos por se

tratar de entidade de utilidade pública encaminhado à Prefeitura Municipal também é

datado 1951 o que reforça a compreensão de que esta seja a data do real início das

obras.

Fig. 7. Bilhete de rifa utilizado na campanha para angariar fundos para a construção da sede do Círculo.

Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia, CDHIS-UFU.

Fig. 8. Confraternização dos Circulistas, s/d.

Fonte: Arquivo do Circulo de Trabalhadores Cristãos de Uberlândia.

29

O primeiro projeto encontrado é de autoria do engenheiro civil Vinicius

Vasconcelos – Carteira 971 CREA 4ª. R -, datado de 1951, apresenta uma construção de

pavimento único no alinhamento frontal do lote indicando uma ampla entrada na lateral

esquerda do terreno para veículos; um armazém com uma ampla porta ao centro ladeada

por duas esquadrias abertas para a rua e outra, de menores dimensões, aberta voltada

para a entrada de veículos; duas instalações sanitárias na lateral direita do armazém

sendo que a porta de uma das instalações se abre para o salão e outra para os fundos;

apresenta ainda uma porta de entrada, de duas folhas, localizada na extremidade da

lateral direita da elevação frontal, que se abre para um espaço da mesma largura das

instalações sanitárias ao fundo, que é identificado por “depósito” mas que também traz a

indicação de uma escada tracejada com a indicação de “futura escada” . O projeto,

constituído de uma única folha apresenta o desenho da planta, a elevação frontal e dois

cortes na escala 1:50; a planta de cobertura na escala 1:100 e a implantação na escala

1:1000. O projeto traz a assinatura de Luciano do Amaral como construtor e Caio Lima

Santa Cecília como proprietário, além de um carimbo parcialmente ilegível do Centro de

Saúde de Uberlândia, datado de 26 de março de 1951 e uma assinatura á parte, também

ilegível, com a anotação: A= 232 m2, datada de 31 de março de 1951. A planta de

situação indica que o edifício seria construído colado a um imóvel nos fundos que

corresponde à localização do antigo barracão.

A presença da indicação de uma futura escada neste projeto indica claramente a

intenção de construção de um segundo pavimento, que foi concretizada logo após, no

segundo projeto datado de junho de 1957.

O projeto identificado como “PROJETO PARA AUMENTO D´UM PRÉDIO EM

CONSTRUÇÃO – PROP. “CÍRCULO OPERÁRIO DE UBERLÄNDIA”, também é de

autoria do engenheiro Vinicius Vasconcelos e traz o carimbo de aprovação do Centro de

Saúde de Uberlândia datado de 26 de junho de 1951 Apresenta as plantas do pavimento

térreo e superior na escala 1:00; dois cortes e elevação frontal na escala 1:50; a planta

da cobertura na escala 1:200 e planta de situação na escala 1:1000. Traz também as

assinaturas de Luciano do Amaral como construtor e Caio Lima de Santa Cecília como

proprietário, além da anotação de A= 131,6 m2, datada de 4 de julho de 1951. Não se

verificam alterações neste projeto em relação ao pavimento térreo, que apenas

acrescenta o desenho da escada com a indicação de um lavatório no final da escada,

anexo ás duas instalações sanitárias já previstas; o antigo armazém aparece indicado

como “comércio”. O pavimento superior apresenta um amplo salão separado do hall de

chegada da escada por uma parede de alvenaria; neste hall, em frente à escada, verifica-

se a presença de um lavatório que dá acesso a uma instalação sanitária,

30

A comparação deste projeto com o imóvel existente atualmente indica que o

projeto foi executado conforme planejado, com exceção da cobertura que previa

platibanda apenas na elevação frontal e nas laterais e beiral na elevação posterior; a

construção atual apresenta platibanda nas quatro elevações.

A construção deste imóvel foi averbada junto á escritura de compra e venda em 8

de setembro de 1951 e apresenta a seguinte descrição:

“prédio de dois pavimentos com base para três, com costeamento de

cimento armado, sendo a parte inferior própria para armazém, com ampla

entrada para os fundos e ótima instalação sanitária e a parte superior, conta

com amplo salão, uma sala para secretaria, sala de toalete e instalação

sanitária com possibilidade de futura transformação em apartamentos”31.

Segundo o mesmo documento o valor da obra citado é de CR 250.000,00

(duzentos e cinqüenta mil cruzeiros) e que a maior parte da mão de obra

será feita pelos associados do referido Círculo Operário 32“.

Não foi possível confirmar essa forma de participação dos associados operários

na construção do imóvel. Em 1952 houve uma bênção solene das obras da sede

definitiva, porém não foram identificados registros quanto a data de inauguração.

Conforme previsto no projeto, o edifício construído na testada do terreno ficou

unido ao barracão, que perdeu sua fachada principal e cujo acesso passou a ser feito por

uma porta aberta em sua lateral esquerda, voltada para a entrada de automóveis; um dos

banheiros do prédio frontal se abre diretamente para dentro do barracão, situação que

permanece até os dias atuais.

Ao longo dos anos, o terreno foi sendo ocupado por diversas construções e o

antigo barracão sofreu diversas intervenções que deram continuidade á sua

descaracterização, iniciada com a perda de sua fachada frontal. Já na década de 1940,

foi construído um palco na parte dos fundos do galpão visando sua melhor adequação

para a realização de palestras e apresentações culturais. Na década de 1970, foi aberta

uma porta na parede lateral direita do palco para criar uma alternativa de acesso ao

palco, além da boca de cena. A cobertura de telhas francesas foi substituída por telhas

de fibrocimento e todo o engradamento foi refeito, permanecendo apenas as tesouras

principais. O piso do teatro recebeu um revestimento de cimento com pigmentação

31

Certidão do Cartório do 1º. Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Uberlândia, Avenida João

Naves de Ávila, no. 322, passada em 8 de setembro de 1951. 32

Cartório do 1º. Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Uberlândia, em 8 de setembro de 1951;

Av. João Pinheiro, 332.

31

vermelha. Nesta ocasião foi instalado um nicho na parede frontal para instalação de um

projetor de filmes.

A residência que existia por ocasião da compra do imóvel, foi demolida em época

indeterminada e houve a construção de uma nova residência nos fundos do terreno. O

espaço era delimitado por um muro que se localizava no limite da garagem da lateral

direita. Uma fotografia aérea do conjunto datada de 2003 permite observar o muro e que,

além da casa havia vários anexos de meia água colados nos muros da lateral direita e

dos fundos do terreno.

Fig. 9. À esquerda, vista aérea do bem, observando-se ao fundo o terreno ocupado pela residência; à direita, vista parcial da residência que foi totalmente descaracterizada. Fonte: PEIXOTO, Ana Paula et Al, 2003.

Na década de 1980, houve a construção um anexo na lateral esquerda do terreno,

após a entrada de automóveis, com copa, duas instalações sanitárias e uma cozinha,

além de duas garagens, uma contígua a este anexo e a outra, contígua á parede de

fundos do barracão. Os cômodos foram construídos com alvenaria estrutural simples de

tijolos e as garagens apresentam estrutura de madeira que sustentam a cobertura de

meia água, apoiadas nas laterais dos muros de divisa. Não há indicações da data de

construção de um pequeno depósito construído entre o muro de separação da residência

e a garagem da lateral esquerda. Este depósito foi posteriormente reformado e adaptado

para salas de aula e outro depósito foi construído no lado oposto, junto à garagem da

lateral direita.

32

Fig.10. Vista do depósito antes da reforma: a porta e as janelas voltadas para a garagem foi foram fechadas e uma nova porta e janela foram abertas voltadas para o pátio; o pé direito foi aumentado. Ao fundo, observa-se o portão de entrada para a residência dos fundos.

Fonte: PEIXOTO, Ana Paula et Al, 2003.

Em 2009, a residência dos fundos foi desocupada e totalmente reformada, com

alterações no seu interior para adequação de uma copa e banheiros e a construção de

um salão na lateral direita; todas as esquadrias foram substituídas assim como o piso.

Ao longo dos anos, o edifício frontal teve distintos usos. Inicialmente foi ocupado

pela Cooperativa Circulista de Consumo Ltda mas não há informações de até quando

manteve este uso. Tampouco há informações sobre a época em que houve a construção

de uma parede na parte dos fundos do salão do pavimento térreo que delimitou a sala

que passou a ser utilizada como a secretaria da Instituição; esta parede foi construída no

alinhamento das duas instalações sanitárias da lateral direita de tal modo que a primeira

I.S. ficou voltada para esta sala e a outra permaneceu voltada para o teatro.

Por muitos anos o prédio foi ocupado pela Radio Educadora, de grande

importância para a cidade e que, nesta época tornou-se a referência principal para

indicação da construção. Posteriormente, este pavimento foi ocupado por uma escola de

dança de salão e, desde 2003, todo o edifício foi alocado pelo Curso Exato, que prepara

alunos para vestibulares e outros concursos, com exceção da sala dos fundos que

manteve seu uso como secretaria do Círculo de Trabalhadores.

33

Fig.10. Vista da Casa do Operário na época em que foi ocupada para a Rádio Educadora, s/d

Fonte: PEIXOTO, Ana Paula et Al, 2003

3.6. Contextualização: a Casa do Operário e o Art Déco em Uberlândia.

A arquitetura Art Déco ainda é tema pouco pesquisado no contexto da história da

arquitetura brasileira. Sem que possa ser - segundo a historiografia tradicional - definido

como um movimento artístico pela falta de manifesto ou documentos, associações ou

publicações que ordenasse a sua produção segundo conceitos e paradigmas bem

definidos e consensuais - não deixa dúvida sobre sua importância na produção artística

do início do Século XX. Segundo CONDE (1997), se não é um movimento, certamente é

um estilo, com estilemas claramente identificáveis e intrinsecamente associados à vida

cotidiana abrangendo a arquitetura, o urbanismo, o paisagismo, a arquitetura de

interiores, o design de objetos, o cinema, a publicidade, as artes gráficas, a moda e o

vestuário. No Brasil, a produção Art Déco se localiza entre o ecletismo e o modernismo

propriamente dito, convivendo, entretanto, com ambos por longos períodos, sem um

limite divisor preciso.

A identificação e os estudos desta produção, no entanto, tem aumentado nos

últimos anos, em parte estimulados pelas preocupações com a preservação e valorização

34

do patrimônio arquitetônico de inúmeras cidades brasileiras que tiveram um expressivo

desenvolvimento nas décadas de trinta e quarenta do Século XX - como Uberlândia - cujo

crescimento se vincula a um processo de substituição de seu patrimônio construído e a

conseqüente perda de seus valores.

Para alguns estudiosos, o Art Déco pode ser considerado como um proto-

modernismo; sua imagem frequentemente se relaciona com todos os avanços

tecnológicos da época: o rádio, o cinema, a gravação elétrica (disco), os automóveis, os

aviões, os transatlânticos e os arranha-céus. Não é por acaso que as primeiras bombas

de gasolina, concessionárias e oficinas de automóveis, assim como os cinemas,

empregaram, quase sistematicamente, esta linguagem, como se verifica em Uberlândia.

Em nome da higiene, da economia e da modernidade, as fachadas dos imóveis foram

purificadas dos excessos ornamentais do ecletismo e do art nouveau, passando a

predominar uma composição volumétrica com formas definidas e simplificadas com

superfícies planas e ornamentos de tendência abstrata ou geometrizados. Embora o

cimento tenha sido utilizado já na arquitetura eclética, com o art déco seu uso se tornou

mais freqüente, mesclando técnicas construtivas industriais/modernas e decorativas

artesanais/tradicionais. O desenvolvimento das técnicas que empregam o cimento

possibilitou a realização de construções verticalizadas com maior segurança. Tornou-se

também comum o uso de esquadrias metálicas industrializadas - sobretudo as janelas do

tipo basculantes – com vidros fantasias. As plantas incorporaram a idéia de espaços

flexíveis e intercambiáveis, refletindo a dinâmica da vida.

Fig. 11. Posto Brasil Central, construído em 1935, foi a primeira Agência Concessionária da Chevrolet na cidade; em 1999 foi adaptado para uma loja de calçados. Av. João Pinheiro, 775, Centro. Fonte: Ficha de Inventário, 2002.

35

Em geral, o embasamento e a estrutura do primeiro pavimento com pilares, vigas

e lajes empregam o cimento, podendo combinar com pavimento(s) superior(es) de

estrutura convencional. É neste período que Uberlândia passa a contar maior número de

construções com dois ou mais pavimentos que adotam a nova linguagem que

amplamente utilizada nas construções oficiais, comerciais, de serviços e mesmo

residenciais. Nas avenidas Afonso Penas e Floriano Peixoto e nas imediações da

Estação Ferroviária, que concentravam as atividades comerciais a partir das décadas de

1930, o art déco teve papel relevante na renovação da imagem da cidade,

frequentemente com construções de uso misto que apresentavam espaços para lojas no

pavimento térreo e, no(s) pavimento(s) superior(es), apartamentos residências - alguns

para aluguel - ou outro usos como hotéis.

Fig. 12. Posto Mineirinho e Concessionária, construído em 1945; atualmente encontra-se parcialmente descaracterizado. Av. Floriano Peixoto, 500/570, Centro. Fonte: Ficha de Inventário, 2002.

Fig. 13. Cine Regente, inaugurado em 1952; era o segundo maior cinema da cidade, com 1.434 lugares; foi demolido em 2004. Rua Machado de Assis, 350, Centro Fonte: Ficha de Inventário, 2001.

36

Embora os mestres de obras e construtores autodidatas predominassem no

cenário da produção da arquitetura no cenário local, verifica-se o aumento de

engenheiros civis - portadores de conhecimentos técnicos especializados -

responsabilizando-se por muitos projetos – especialmente os oficiais, como o Mercado

Municipal, inaugurado em 1944 - ou como no caso da Casa do Operário.

Em Uberlândia, embora ainda não tenha sido realizado um inventário específico

sobre esta arquitetura, os registros iconográficos dos anos 30 aos anos 60 do Século XX,

indicam a ampla adoção do Art Déco. Entretanto, grande parte desta produção já se

perdeu, tendo sido totalmente substituída ou descaracterizada. Algumas construções

ainda preservadas não são protegidas e correm grave risco de perda. A única obra Art

Déco da cidade protegida por tombamento municipal é o Mercado Municipal.

Fig. 14. Armazéns do entorno da antiga Estação Ferroviária Mogiana, atual Praça Sérgio Pacheco. Foto da década de 1951. Atualmente alguns imóveis ainda preservam a volumetria mas as elevações foram totalmente descaracterizadas. Fonte: Ficha de Inventário, 2002

37

Fig. 15. Mercado Municipal de Uberlândia, inaugurado em 1944, tombado por lei municipal. Rua Olegário Maciel, 255, Centro. Fonte: Ficha de Inventário, 2002.

Fig. 17. Antiga Pensão Guanabara, construída em na década de 1940, nas proximidades da Estação Ferroviária Mogiana. Av. João Pessoa, 15, Centro. Fonte: Ficha de Inventário, 2002.

Fig. 18. Hotel Zardo, atual Hotel da Praça, construído em 1948/1950; o edifício possui três pavimentos e o térreo que é ocupado com lojas. Praça Tubal Vilela, 30, Centro. Fonte: Ficha de Inventário, 2002.