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  • implantariam as povoaes, referindo-se aos aspectos da salubridade, topografia, existnciae proximidade de gua potvel, facilidade dos acessos e comunicaes. Elas indicavam alocalizao das cidades considerando os aspectos geomorfolgicos locais e a orientaocardeal, alm de definirem a composio do traado urbano, as dimenses das ruas, adisposio dos lotes, dos edificios, dos espaos pblicos e das casas.

    3. AS RECOMENDAES ESPANHOLAS

    Destacando alguns trechos das Leyes de Indias4, pode-se perceber claramente asintenes acima descritas:

    ... Na costa do Mar seja o sftio levantado so e forte, tendo considerao o abrigo,fundeamento e defesa do porto, e se for possfvel no tenha o Mar ao Sul (...) equando faam a planta do lugar, repartam-no por suas praas, ruas e solares cordae rgua, comeando da praa maior, e saindo dela as ruas nas portas e caminhosprincipais (...) Procurem ter gua perto, e que se possa conduzir ao povoado eherdades, derivando-a se for possfvel, para melhor aproveitar-se dela, e os materiaisnecessrios para ediffcios, terras de trabalho, cultivo e pasto, com que se evitarmuito trabalho e custos, que se produz com a distncia. No ergam sftios para povoarem lugares muito a"os, por causa do incmodo dos ventos e dificuldade dos serviose transportes, nem em lugares muito baixos, porque costumam ser enfermos:fundem-se nos medianamente levantados, que gozem descobertos os ventos do nortee sul: e se houver serras, ou costas, sejam por parte do Nascente (leste) e Poente(oeste): e caso no se puderem evitar os lugares a"os, fundem-se em parte onde noestejam sujeitas a nevoeiros, fazendo observaes do que mais convenha sade, eacidentes, que se possa oferecer: e em caso de edificar s margens de algum Rio,disponham a povoao de forma que saindo o Sol d primeiro no povoado que naguaS.

    O primeiro e o ltimo pargrafos do texto acima referem-se proximidade do mar oude rios. Primeiramente recomendado que o mar no esteja localizado ao sul (Mediodia) dacidade, enquanto o rio dever estar a oeste da povoao. Estas recomendaes certamenteesto relacionadas com a ao direta do sol sobre a gua que, alm de promover reflexo daradiao incidente, aumenta a umidade do ar pela evaporao.

    Verificam-se, tambm, no te.10 duas recomendaes relacionadas ventilao. Aprimeira delas refere-se altitude do local, no devendo ser este muito alto por causa daao dos ventos, que teriam muita presso, ou seja, velocidades muito altas, geralmente comtemperaturas baixas. Da mesma forma, sugerido que se evitem os baixios, onde o ar quasesempre estagnado, no havendo correntes de ventilao capazes de renov-Io. O segundQtrecho recomenda que, se houver serras, elas estejam a leste ou oeste da povoao, a fimde deixar a descoberto a ventilao norte e sul.

    Esta recomendao no seria adequada considerando-se vrias localidades naAmrica do Sul, onde a ventilao predominante no quadrante leste, pois as serras criariamsombra de ventos na cidade. Considere-se o que foi dito apenas como exemplo, pois necessria uma anlise mais detalhada das condies especficas do local para poder-sedeterminar a melhor situao em relao aos ventos.

    Sabe-se que a orientao da ventilao varia de lugar para lugar, de acordo com oentorno, a topografia, vegetao, a proximidade de gua, estando todos estes fatoresmacrorrelacionados com o movimento de rotao da terra. Os ventos funcionam como

  • correntes de conveco na atmosfera, tendendo a igualar o esquentamento diferenciado dasdiversas regies da terra, apresentando direes em sentidos opostos de acordo com cadahemisfrio. Como exemplo, os ventos a1isios, que no hemisfrio sul tm predominnciasudeste e, no hemisfrio norte, predominncia noroeste. Alm disso, para uma mesmalocalidade, os ventos mudam de direo ao longo do ano, de acordo com as estaesB.

    Outra diretriz das Leyes de Indias quanto ao desenho da povoao determinava que:

    A Praa Mior, onde se h de comear a povoao, sendo na costa do Mar, se devefazer ao desembarcadouro do povoado, e se for lugar MediterrAneo, no meio dapovoao: sua forma em retAngulo, que ao menos tenha de comprimento duas vezese meia de sua largura ... da praa saiam quatro ruas principais, uma na metade decada lado; e demais destas, duas por cada esquina: as quatro esquinas mirem aosquatro ventos principais, porque saindo assim as ruas da praa no estaro expostasaos quatro ventos, que seria muito inconveniente7.

    Novamente a preocupao com os ventos, agora relacionando-os com o traado dasruas. O texto pressupe que os ventos dominantes seriam nos quatro quadrantes principais,para os quais as ruas secundrias seriam orientadas, evitando-se o "encanamento" daventilao no interior das ruas principais, originrias da praa central.

    Considera-se, portanto, que os ventos seriam iguais para todos os sitios, no havendodeterminantes locais capazes de modificar ou criar situaes prprias de clima e de direodos ventos.

    Na Amrica do Sul, com uma extenso territorial abrangendo desde a latitude de 1rfnorte at sSOde latitude sul, incluindo uma topografia bastante diferenciada e a existncia dacordilheira dos Andes, verificam-se vrios tipos de clima totalmente distintos e com regimesde ventos especificos. Tomando como exemplo a Colmbia, que tem uma extenso territorialrelativamente pequena na Amrica do Sul, pode-se identificar ai nove tipos diferentes declima com regimes de ventos prprios8.

    Uma outra recomendao das Leyes de Indias sobre a forma das ruas definia que...em lugares frios sejam as ruas largas, e nos quentes estreitas ...9

    Supe-se que a determinao de ruas largas em lugares frios permitiria maiorinsolao nas fachadas, enquanto que as ruas estreitas para os climas quentes poderiamamenizar a ao direta do sol, fazendo com que os prprios edificios criassem sombra unssobre os outros. Esta recomendao s se aplica satisfatoriamente em clima quente-seco oudesrtico, onde a amplitude trmica muito alta, com a temperatura do ar variando em maisde 1SOC,entre o dia e a noite, sendo necessrio que as ruas sejam estreitas para se evitarao mximo a radiao solar direta nas fachadas, alm de no permitir a livre entrada dovento quente durante () dia e do vento frio noite.

    As casas justapostas umas s outras formariam uma concentrada massa deconstrues, com poucos vazios, aumentando a inrcia trmica da massa urbana, permitindoque a mesma armazenasse calor nas suas superficies durante o dia, tendo noite umadissipao mais lenta, para a atmosfera mais fria, dessa carga trmica retida nos materiaisconstrutivos das edificaes. Durante o dia o processo seria inverso, pois o frio acumuladodurante a noite levaria mais tempo para ser dissipado para a atmosfera, proporcionandotemperaturas muito mais baixas no interior das edificaes do que no exterior na maior partedo dia.

  • As casas para esse tipo de clima deveriam ter paredes grossas e poucas aberturaspara o exterior, como se pode ver em algumas cidades da Espanha como Toledo, Crdoba etantas outras de origem rabe.

    Ao serem utilizadas essas recomendaes indiscriminadamente na Amrica do Sul,onde existem vrios tipos de clima, ocorreriam grandes distor8S na adaptao do traadourbano e da arquitetura ao clima. Estas recomendaes originaram desenhos urbanosextremamente montonos, como os das cidade de Mendoza (1561), Suenos Aires (1583),Mxico, Guadalajara e tantas outras.

    As preocupaes e recomendaes dos colonizadores espanhis, estabelecendonormas, possivelmente visando proporcionar nas suas colnias melhores condiesambientais, no encontram paralelo na colonizao portuguesa, que no definiu regrasgenricas com relao a estas questes.

    4. AS DETERMINAES PORTUGUESAS

    O traado das cidades portuguesas variava de uma para outra, de acordo com osinteresses partia,dares de cada uma delas, que se adaptavam muitas vezes s condiesgeomorfolgicas do lugar. As recomend~ e preceitos para fundao de de1enninada vilaou Cidade muitas vezes serviam para outras10, sem serem consideradas as especificidadesde cada local. Havia quase total omisso no que concemia ao clima e ao meio ambiente, demodo geral, e s condies dos sftios onde eram implantadas as cidades, vilas ou povoados.

    Nota-se, entretanto, muita similaridade no traado das cidades do reino, como Usboa,com o traado das cidades das coI6nias portuguesas de ultramar, desde o oriente aoocidente, a exemplo de Goa, Funchal, Angra dos Aores, Salvador e tantas outras que tmcon1orrnaAo geomor1oIgica semelhante s da metrpole e esto localizadas no fundo debaas.

    O traado das ruas das primeiras povoaes portuguesas no Brasil apresentava !.maconfigwao notadamente medieval, sem ordenao prvia, com ruas pouco largas etortuosas, loteII estreitos e compridos, sendo suas dimenses determinadas mais pelomodelo praticado na matriz colonizadora - segundo Silveira 11, um modelo muitas vezes'mentaI" - e definidas de acordo com o prprio traado da metrpole, como se fossem suaextenso12, atendendo aos mtodos de defesa, ainda medievais, e aos meios de transportepouco desenvolvidos da poca .

    .. as cidades portuguesas de ultramar procuram, em princpio, e de modo geral, serrplicas das cidades de Portugal europeu; as condies ecolgicas, as heranas econtaminaes locais, os fatores particulares que lhe proporcionam vida, e oesplndido poder de adaptao de que sempre os Portugueses deram prova, aoestabelecerem-se em novas terras, do-/es, porm, caractersticas por assim dizerprovincial. que as diferenciam umas das outras, sem que, todavia, se deixe demanter indescutivel unidade nacional'3.No Regimento de Tom de Souza nota-se uma preocupao quanto ao local onde se

    fundaria a capital do Brasil, com as recomendaes restringindo-se.aos "bonsares"do stio e "abundAnciade gua~ sendo esta ltima uma condio fundamental para a existncia dequalquer povoao. Ele no se refere, entretanto, orientao do sol e dos ventos e suasrelaes com a implantao da cidade. O documento cita tambm "traas e amostras"a seremobedecidas, demonstrando que a cidade, ao ser implantada, deveria ter um determinadodesenho oriundo da matriz.

  • Funda-se a cidade do Salvador maneira das cidades portuguesas - Usboa e Porto14

    - dividida em duas partes, Cidade Baixa e Cidade Alta, seguindo um modelo de desenhourbano largamente utilizado pelos portugueses15. Esta diviso da cidade em duas,separadas pela escarpa, acarretou diferentes situaes microclimticas. A Cidade Altarecebe a ventilao predominante de todo o quadrante leste, desde o sudeste at o nordeste,enquanto a Cidade Baixa, por se encontrar no sop da encosta que corta o stio no sentidosudoeste/nordeste, no beneficiada por grande parte desta ventilao, pois a prpriaencosta cria sonibra de ventos nesta parte da cidade.

    Surpreende que os portugueses, sendo grandes navegadores e, portanto,conhecedores dos princpios de orientao do sol e do regime de ventos, no tenhamaplicado esses conhecimentos como recomendaes para a definio do traado de suascidades, ou mesmo para a localizao das casas em suas colnias. Esta atitude foi, talvez,ditada pelo prprio carter da colonizao portuguesa, visando muito mais a explorao daterra e a garantia da posse da mesma do que a fixao e adaptao do homem e oconseqOente desenvolvimento da colnia, ou talvez porque a ausncia de regras fixaspossibilitasse uma maior liberdade de ao e melhores condies de expanso. Com isso,poder-se-ia conseguir um traado urbano e uma arquitetura mais adequados s condiesclimticas de cada local, permitindo que as cidades se desenvolvessem organicamente, emconsonncia com as condies geomorfolgicase fsico-ambientais de cada stio.

    NOTAS( 1) Este trabalho foi apresentado originalmente no XIII Congresso Brasileiro de Arquitetos - Lcio Costa

    (1991).( 2) SANTOS, P. F. Formao de Cidades no Bresil Colonial Coimbra, V Colquio Internacional de

    Estudos Luso-Brasileiros, 1968, p. 76.( 3) As citaes das Leis das ndias foram feitas a partir de Santos, op. cit X, devido impossibilidade

    de acesso a publicaes ou compilaes diretas do original.( 4) As citaes so tradues livres da autora.( 5) ...En Ia Costa dei Mar sea el stio levantado, sano, y fuerte, teniendo consideracion ai abrigo,

    fondo y defesa dei Puerto, y si fuere posible no tenga el Mar al Mediodia, no Poniente ... y quandohagan Ia planta dei Lugar, reprtanlo por sus plazas, calles, y solares cordel y regia, comenzandodesde Ia plaza mayor, y sacando desde ella Ias calles Ias puertas y caminos principales, ...Procuren tener el agua cerca, y que se pueda conducir ai Pueblo y heredades, derivndola si fuereposible, para major aprovecharse de ella, y los materiales necesarios para edificios, tierras de labor,cultura y pasto, con que execusarn el mucho trabajo y costas, que se siguen de Ia distancia. Noelijan sitios para poblar en lugares mui altos, por Ia molestia de los vientos y dificultad dei servicio yacarreto, ni en lugares muy baxos, porque suelen ser enfermos: Fndense en Ios medianamentelevantados, que gocen descubiertos Ios vientos dei Norte y Mediodia: y si hubieren de tener sierras, cuestas, sean por Ia parte de Levante y Poniente: Y si no se pudieren excusar de !os lugares altos,funden en parte donde no estn sujetos nieblas, haciendo observacion de 10 que mas convenga Ia salud, y accidentes. que se pueden ofrecer: y en caso de edificar Ia" ribera de algun Rio,dispongan Ia poblacion de forma que saliendo el Sol d primero en eI Pueblo. que en el agua.(Santos. op. cito p. 36.)

    ( 6) KOENIGSBERGER, O. H. et alH. VlViendaS Y Edifcios en Zonas Clidas y Tropica/es. Madrid,Paraninfo SA. 19n, pp. 26 e 27.

    ( 7) "La Plaza mayor donde sa ha de comenzar Ia poblacion, siendo en Costa de Mar. se debe hacer aidesembarcadero de el Pueblo. y si fuere lugar Mediterrneo. en medio de Ia poblacion: su forma enquadro prolongada, que por 10 mnos, tenga de largo una vez y media de su ancho ... de Ia plazasalgan quatro calles principales, una por medio de cada costado; y demas de estas. los quatro

  • viemos principales, porque saliendo asi Ias cales de Ia p1aza no estarn expostas Ios quatroviemos, que ser de mucho Inconveniente ... (Santos, op cito p. 37).

    ( 8) OLGYAY, V. Clima y Arquitetura en Colombia Universidad dei Valle, Fa'cultad de Arquitectura, Cali,1968, pp.122-125.

    ( 9) . en lugSft!ls frios sesn Ias cal/es anchas, yen tos calientes angostss; .... (Santos, op cit., p.37).(10) SANTOS, op cit., p.39.(11) SILVEIRA, Luis. Ensaio de Iconografia das Cidades Portuguesas do Ultramar. Lisboa, Ministrio do

    Ultramar, s/d, 4 vols.(12) As cidades portuguesas de ultramar foram, desde o incio da expanso e sempre, cidades do

    'reino' nos 1ugares de alm' fazia com ela corpo ticamente indivisvel (Silve ira, s/d), justificando-seda, inclusive, a similitude do traado.

    (13) Idem, p. 11.(14) Este aspecto largamente comentado por vrios autores entre eles: Brs do Amaral, Pedro

    Calmon, Mrio Chic6 e Paulo Santos afirmando este ltimo: pela sua disposio no alto de umaacidentada e escarpada aba de morro, a cidade no nega em suas razes histricas uma estreitaaproximao com Usboa e Porto (1968:85).

    (15) ... a soluo tipo Acrpole, sempre de preferBncia dos lusos, vendo-se a a inegvel influBncia dospovos que os precederam no desenvolvimento da Civilizao Helnica - Grcia e Roma - e dasCivilizaes Medievais atuantes no ocidente - Crist e Muulmana todas seguindo a norma antigade localizao das cidades nas margens do mar e dos rios, em pontos elevados com um porto(CEAB, 1980:21, v.. 1).

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICASBENEVOLO, Leonardo. Diseflo de Ia Ciudad. Mxico: Gustavo GiIi, 1978, 5 vol.CEAB Centro de Estudos da Arquitetura na Bahia, Evoluo Fsica de Sslvador. Salvador: CED/UFBa,

    1979, 2 vol. (Col. Estudos Balanos, 12.)KOENIGSBERGER, O. H. et alii. Viviendas y Edificios en Zonas Clidas y Tropica/es. Madrid: Paraninfo,

    19n.OLGYAY, Victor. Clima y Arquitetura en Colombia. Cali: Universidad dei Valle/Facultad de Arquitectura,

    1968.SANTOS, Paulo F. Formao de Cidades no Brasil Colonial. Coimbra: V Colquio Internacional de

    Estudos Luso-Brasileiros, 1968.SILVEIRA, Luis. Ensaio de lconografia das Cidades Portuguesas do Ultramar. Lisboa: Ministrio do

    Ultramar, sido 4 vol.VILHENA, Luis dos S. A Bahia no Sculo XVIII. Salvador: Itapu, 1969, vol. I (Col. Baiana).