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32 Capítulo II - O desenho de jóias no Rio de Janeiro Introdução ao Capítulo II Neste capítulo apresentaremos as entrevistas com designers atuantes no período da pesquisa, ou com pessoas que acompanharam de perto o trabalho destes, no caso dos já falecidos. O roteiro das entrevistas se baseava primeiramente na história pessoal do designer no período estudado, ou seja, sua formação profissional, seu trabalho dentro ou fora de uma empresa, seus materiais e técnicas de representação utilizados e os materiais mais utilizados nas jóias fabricadas no período. Quanto ao projeto da jóia, que nível era exigido de detalha- mento nos desenhos, se a produção era artesanal, semi-indus- trial ou industrial, como era o relacionamento do designer com os setores da produção/fabricação da empresa. Serão apresentados exemplos significativos de desenhos e suas técnicas de ilustração assim como os materiais e proces- sos utilizados. 2.1 Levantamento iconográfico e entrevistas 2.1.1 Amsterdam Sauer Segundo a diretora de criação da empresa Amsterdam Sauer, Débora Sauer, no período situado entre os anos 50 e 70, não haviam designers fixos trabalhando na empresa, e o pró- prio conceito de design de jóias era bem diverso do atual. No início dos anos 50, a produção de jóias era toda voltada para o público externo, notadamente o norte-americano, seja na forma de exportação de pedras brutas ou lapidadas ou na forma de jóias. Estas jóias eram manufaturadas no Brasil por ourives na sua maioria oriundos da Europa, principalmente portugueses e espanhóis, que emigraram em busca de melho- res condições de vida. Também é notável a presença de ouri- ves gregos e italianos. As jóias eram peças únicas criadas em função das próprias pedras e visando a sua valorização,os dia- mantes e outros materiais eram secundários ou meros coadju- vantes.. Os próprios ourives eram os criadores ou "designers"das peças e também eram os detentores do proces- so de fabricação, sendo suas particularidades na maioria das vezes preservadas do conhecimento de outros ourives. Havia dentro da empresa um especialização de funções na produção de modo que um determinado ourives com habilidade especí- fica para fazer anéis "chuveiro" por exemplo, ficava com esse encargo, produzindo apenas este tipo de peça. Posteriormente, já na década de 70, a empresa traba- lhou com o designer francês Abel Dubois, que desenvolvia

32 Capítulo II - O desenho de jóias no Rio de Janeiro · Figura 36 -Álbum de fotos de desenhos de Abel Dubois, cerca de 1960, Paris. Figura 37 - Desenho fotografa-do em preto e

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Capítulo II - O desenho de jóias no Rio deJaneiro

Introdução ao Capítulo II

Neste capítulo apresentaremos as entrevistas comdesigners atuantes no período da pesquisa, ou com pessoasque acompanharam de perto o trabalho destes, no caso dos jáfalecidos. O roteiro das entrevistas se baseava primeiramentena história pessoal do designer no período estudado, ou seja,sua formação profissional, seu trabalho dentro ou fora de umaempresa, seus materiais e técnicas de representação utilizadose os materiais mais utilizados nas jóias fabricadas no período.Quanto ao projeto da jóia, que nível era exigido de detalha-mento nos desenhos, se a produção era artesanal, semi-indus-trial ou industrial, como era o relacionamento do designer comos setores da produção/fabricação da empresa.Serão apresentados exemplos significativos de desenhos esuas técnicas de ilustração assim como os materiais e proces-sos utilizados.

2.1 Levantamento iconográfico e entrevistas

2.1.1 Amsterdam Sauer

Segundo a diretora de criação da empresa AmsterdamSauer, Débora Sauer, no período situado entre os anos 50 e 70,não haviam designers fixos trabalhando na empresa, e o pró-prio conceito de design de jóias era bem diverso do atual. Noinício dos anos 50, a produção de jóias era toda voltada para opúblico externo, notadamente o norte-americano, seja naforma de exportação de pedras brutas ou lapidadas ou naforma de jóias. Estas jóias eram manufaturadas no Brasil porourives na sua maioria oriundos da Europa, principalmenteportugueses e espanhóis, que emigraram em busca de melho-res condições de vida. Também é notável a presença de ouri-ves gregos e italianos. As jóias eram peças únicas criadas emfunção das próprias pedras e visando a sua valorização,os dia-mantes e outros materiais eram secundários ou meros coadju-vantes.. Os próprios ourives eram os criadores ou"designers"das peças e também eram os detentores do proces-so de fabricação, sendo suas particularidades na maioria dasvezes preservadas do conhecimento de outros ourives. Haviadentro da empresa um especialização de funções na produçãode modo que um determinado ourives com habilidade especí-fica para fazer anéis "chuveiro" por exemplo, ficava com esseencargo, produzindo apenas este tipo de peça.

Posteriormente, já na década de 70, a empresa traba-lhou com o designer francês Abel Dubois, que desenvolvia

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suas coleções na França sob as diretrizes de Zilda Sauer, dire-tora da empresa. Seus desenhos eram feitos com uma técnicaextremamente refinada, em guache sobre acetato, num proces-so desenvolvido por ele que utiliza varios overlays com varia-ções sobre a mesma peça, alterando por exemplo o centro docolar, ou a pedra central de um anel.

Abel Dubois abriu seu próprio estúdio após a SegundaGuerra Mundial em Paris no qual trabalhou por mais de trintaanos com a colaboração de sua esposa Marie-Josèphe e deseus assistentes. Criou o conceito de um "álbum de design dejóias".Usando este sistema de álbum de designs ele trabalhoupara empresas de todo o mundo. Seus desenhos eram inicial-mente feitos à lápis preto e lápis de cor. Posteriormente eramtraçados em folhas de acetato onde os " gouacheuses", seusassistentes aplicavam o guache.

O método de representação criado por Abel Duboisconsistia em desenhar uma peça básica ou inicial numa folhade acetato e as suas variações em folhas separadas de acetato, superpostas à de base. Estas folhas superpostas eram deno-minadas por ele de “appliqués”. Por exemplo, o aro de umanel em ouro amarelo seria o desenho básico, sendo comple-mentado por opções de cabeça do anel, com pedras de cor ediamantes. Nas folhas dos “appliqués” eram pintadas marcasem forma de L que ao serem posicionadas sobre outro “L”desenhado na folha da peça básica, se encaixavam perfeita-mente, mostrando então o anel completo.

Figura 35 - Desenho de brincos em ouro amarelo, diamantes, safiras eesmeraldas, de Abel Dubois, sistema de sobreposição com overlay de fol-has de acetato, sobre um desenho de base, no caso a estrutura de fios deouro amarelo.

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Geralmente Abel Dubois desenvolvia conjuntos dejóias desenhados numa mesma prancha, e havia uma folhaopaca por trás das folhas de acetato, na qual estas se fixavampela parte superior. Abel criava estas coleções a pedido dejoalheiros de acordo com temas específicos e no caso declientes antigos, desenvolvia as coleções sem uma consultaprévia, pois já antecipava que iriam satisfazer as expectativas.

De forma pioneira, Abel também criou álbuns dereproduções fotográficas de excelente qualidade de seus dese-nhos, que podemos verificar na Figura 36 ou no exemplo daFigura.37, um detalhe de um álbum fotográfico de desenhosde V.J.Gould, seu contemporâneo de Paris.

2.1.2 MetalNobre

O chefe da oficina, Sr. Batista, é o ourives-modelistamais antigo da empresa, lá trabalhando desde 1959, quandoentão se subdividia em Metalforte e Metalnobre. Somente apartir de 1983 a empresa passou a ter designers contratados.Os desenhos eram esboços a lápis que o ourives-modelistafazia e quando aprovados eram em seguida executados comomodelo em prata ou em cera. Muitas vezes ele era responsá-vel também pelo corte e lapidação da própria pedra que seriautilizada no modelo desenvolvido por ele. Eram peças comgrandes pedras que serviam de base para incrustrações demetal e outras pedras menores, diamantes etc. A empresacomprou desenhos de diversos designers free lancers nasdécadas de 50 e 60 e posteriormente trabalhou com o arqui-teto e designer Gilberto Zouaid. na década de 80.

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Figura 36 -Álbum de fotos de desenhos de Abel Dubois, cerca de 1960,Paris.

Figura 37 - Desenho fotografa-do em preto e branco de álbumde desenhos de V.J.Gould, pági-na E 16, cerca de 1960, Paris.

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Figura 39 - Desenho de colar deametista e ouro branco, cerca de1950, guache sobre papel preto,Haroldo Burle Marx, AcervoS.B.Marx.

2.1.3.Haroldo e Roberto Burle Marx

Sandra Burle Marx, neta de Haroldo Burle Marx, pos-sui, juntamente com sua mãe, todo o acervo iconográfico egemológico referente à sua produção joalheira de aproximada-mente quarenta anos. Pode-se constatar que inicialmenteHaroldo produziu jóias clássicas características da década de40 e posteriormente começou a desenvolver seu estilo, tendonum período inicial trabalhado em conjunto com seu irmãoRoberto Burle Marx. Segundo Sandra, Haroldo B.Marx traba-lhava com artistas que ilustravam mais detalhadamente suasidéias, trabalhando sempre em papel preto encorpado (seme-lhante ao cartão carmem ou Canson), desenhando a linha decontorno com lápis de cor branco e posteriormente ilustrando-o com guache. Cabe destacar que foram encontrados algunsdesenhos feitos em parceria com Bruno Guidi, seu ourives deorigem italiana (Florença), um mestre no seu ofício e queacompanhou muitos anos Burle Marx.

As jóias de Burle Marx se apresentam como uma cria-ção que abrange não apenas a forma que toma o metal, ascomposições orgânicas, como das notáveis pedras que sãosuas criações únicas e sua marca registrada. B.Marx valorizoude modo pioneiro no Brasil as gemas brasileiras, até entãoconsideradas pedras semi-preciosas (classificação hoje total-mente abolida), e garimpou incríveis coleções de pedras paraseu uso em jóias.

Há uma integração entre as gemas lapidadas de forma-tos únicos (sempre baseados numa lapidação intermediáriaentre o ocabochon e a escultura de formas orgânicas) e as for-mas que o metal assume e se combina com as gemas.

As formas orgânicas características das jóias deHaroldo Burle Marx estão presentes na obra arquitetônica epaisagística de seu irmão Roberto e podemos assim destacaresta dupla influência na obra de ambos, já que iniciaram seutrabalho em conjunto na década de 50 e este trabalho se esten-deu por aproximadamente uma década, quando então segui-ram de forma independente um do outro. Neste momentoH.Burle Marx já era conhecido internacionalmente por seuestilo assim como por suas pedras lapidadas de forma livre.

Sendo um estudioso e apreciador das pedras brasilei-ras, segundo ele tão belas quanto as chamadas (à época)pedras preciosas, fazia frequentemente viagens para MinasGerais para trazê-las, tendo reunido ao longo de quarenta anosde pesquisas uma vasta coleção de gemas.

Era particularmente um admirador das opalas e águas-marinhas e seus desenhos mostram muitas opções de uso paraelas. Suas pesquisas entretanto não se limitavam ao novo usode gemas e lapidações, mas também de outros materiais como

Figura 38 - Desenho de colarem ouro amarelo e águas-mar-inhas, guache sobre papel preto,década de 60, Haroldo BurleMarx, Acervo S.B.Marx.

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o jacarandá e o pau-brasil, usados em aros de anéis com deta-lhes em ouro, assim como também produziu jóias em pratanum estilo de desenho mais geométrico.

O auge de H. Burle Marx se deu na década de 70,quando pessoas importantes da sociedade brasileira e forma-doras de opinião compravam suas jóias. Neste período havi-am poucos joalheiros no Rio de Janeiro com um estilo tãopessoal e tão identificado coma cultura brasileira.Posteriormente outros joalheiros foram surgindo no mercado,neste momento já se conhecia o trabalho de Caio Mourão e deMárcio Mattar. Segundo Sandra Burle Marx, a partir destadécada ocorreu um declínio da produção de Haroldo que elajustifica com o surgimento de outros joalheiros e do fato deHaroldo manter seu estilo característico e não ter se renova-do, no sentido de se adaptar ao mercado, utilizando menosouro, pedras menores, mantendo-se fiel aos seus conceitosartísticos.

Ele não desenhava diretamente suas peças, tinha asidéias que ia explicando para um desenhista que então desen-volvia as suas formas, aprimorando-as. Todas as jóias de H.Burle Marx eram feitas à mão tratadas como peças únicas, àexceção de alguns colares nos quais se colocavam pendentesque podiam ser substituídos. Os desenhos eram numerados eninguém possuía uma peça igual à outra, apenas podiam seassemelhar no estilo mas eram jóias de estúdio.

Neste período, o Itamaraty adquiria jóias de BurleMarx para presentear chefes de estado porque as consideravarepresentativas da cultura brasileira. Desta forma, um colar deáguas-marinhas foi presenteado à Rainha da Inglaterra emocasião de sua visita ao Brasil, um crucifixo ao Papa, entreoutros. Haroldo possuía um livro de ouro com assinaturas ededicatórias de clientes famosos como Yolanda Costa e Silva,David Rockfeller e muitos artistas como Sérgio Mendes eatrizes americanas como Merle Oberon e Natalie Wood.

Com relação aos desenhos, Haroldo trabalhava emconjunto com seu desenhista estudando os detalhes de fabri-cação de suas jóias como encaixes e articulações. No exemplocitado anteriormente do colar no qual se acrescentavam pen-dentes, o encaixe foi sendo aperfeiçoado até um ponto máxi-mo de qualidade, quando a jóia se transformou numa peçamulti-uso, com várias opções de pendentes vendidas de acor-do com o desejo do cliente.

Além de seu desenhista, Haroldo trabalhava em con-junto com Bruno Guidi, ourives florentino que acompanhou-o durante muitos anos e que assinou alguns desenhos juntocom ele. Sua qualidade técnica era excelente tanto na execu-ção como no acabamento das peças, havendo tanto peças comacabamento polido como nas texturas escovadas ou em

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Figura 40 - Detalhe de conjuntode colar e brincos, ouro amareloe águas-marinhas, guache sobrepapel, década de 50, H. BurleMarx, Acervo S.B.Marx.

Figura 41 - Colar de águas-mar-inhas e ouro amarelo, guachesobre papel preto, década de60, Haroldo Burle Marx,Acervo S.B.Marx.

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peças com textura florentina.Haroldo se identificava com peças de grande volume,

pedras grandes, com uma jóia mais pesada e não era econômi-co nas suas criações. Suas últimas produções foram voltadaspara o mercado norte-americano, que valorizava as pedrasbrasileiras, porque no Brasil ele já não vendia como antes.Mesmo para os E.U.A. B.Marx precisou fazer adaptaçõesmais ao gosto do americano e colocar mais diamantes juntocom as pedras de cor. Segundo Sandra Burle Marx, estas últi-mas peças não seriam o melhor de sua obra por já estarem sobinfluência do estilo norte-americano.

A origem da produção de B.Marx coincide com a for-mação das principais casas joalheiras do Rio de Janeiro, deimportância nacional, como a Amsterdam Sauer e a H.Stern.Cabe destacar que após passar quatro anos na Alemanha nadécada de 30, B.Marx retornou ao Brasil para iniciar seunegócio e neste período deu asilo a Hans Stern, que veio parao Brasil fugido da Alemanha, porque ele era judeu, tendocomeçado a trabalhar com B.Marx e posteriormente passou atrabalhar também com pedras preciosas. Todas estas casasjoalheiras, embora de estilos diferentes, contribuíram para odescobrimento, desenvolvimento e valorização das pedrasbrasileiras no mercado internacional. O reconhecimento daesmeralda brasileira, em testes de laboratório, assim como odescobrimento das opalas em uma única mina no Piauí, e quenada tem a dever às opalas australianas, sem dúvida se deveàs estes pioneiros no Brasil.

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Figura 42 - Conjunto de colar ebrincos de águas-marinhas eouro amarelo, guache sobrepapel, década de 50, HaroldoBurle Marx, Acervo S.B.Marx.

Figura 44 - Detalhe de catálogo,Coleção Altomar, Colar emouro amarelo e rubilitas.Haroldo Burle Marx, década de80.

Figura 43 - Desenho de colar com três pedras, lápis branco sobre papel,H.BurleMarx, década de 70,Acervo S.Burle Marx.

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Dados Históricos

“Atraído pela beleza das pedras e metais preciosos quea natureza oferece ao homem, Haroldo Burle Marx associou-se à um amigo, Dr. Walter Hugo Sandall, igualmente aprecia-dor destas maravilhas e que muito o influenciou, decidindoestabelecer uma firma para o comércio e exportação de pedraspreciosas lapidadas e em bruto. Pouco tempo depois embarca-ram para a Europa. Na Alemanha fez curso completo degemologia, estudando o assunto em todos os seus detalhesdurante quatro anos, após o que retornou ao Brasil para porem prática os valiosos conhecimentos adquiridos.

Foi assim que dando uma nova dimensão à primitivaidéia das pedras preciosas, Haroldo Burle Marx criou simul-taneamente com a oficina de lapidação, um artesanato dejóias, lançando então no mercado artístico, duas autênticasnovidades: a pedra lapidada em forma livre e as jóias moder-nas, rompendo totalmente com o convencionalismo clássicovigorante. Iniciou desta maneira uma outra era no setor daspedras lapidadas e jóias pela utilização de novas formasbaseadas na livre imaginação, graças à espontaneidade dogênio criador de seu irmão Roberto Burle Marx, consagradoartista e arquiteto paisagista de renome internacional, autordos desenhos que deram origem aos múltiplos modelos exe-cutados com absoluta originalidade, a cada um deles corres-pondendo uma única peça produzida, firmando desta maneirao seu conceito em joalheria artística moderna, veio a merecera honraria máxima no gênero, ao se consagrar vencedor dediversas exposições internacionais. Dentre as mais expressi-vas láureas com que foi contemplado, figura o PrimeiroPrêmio de Jóias da Sétima Bienal do MASP, em 1963, e oGrande Prêmio da Primeira Bienal Internacional de ArtesAplicadas de Punta del Leste, no Uruguai, em 1965. A convi-te do governo brasileiro, e sob o patrocínio direto doItamaraty, a firma H.Burle Marx forneceu em várias ocasiões,grupos de jóias representativas do seu artesanato para exposi-ções levadas à efeito, com grande sucesso nas cidades doMéxico, Montevidéo, Filadélfia, Munique, Paris e outrascidades da Europa. Ainda baseado no elevado conceito e valorartístico a que atingiram as jóias de Burle Marx, pela suaautêntica originalidade e beleza, como legítimas expressõesdo artesanato brasileiro, o governo adquiriu várias dessasjóias para presentear visitantes ilustres.

Apreciadas no mundo inteiro, onde já são bastanteconhecidas, as jóias H.Burle Marx representam pela razão desua origem e concepção, uma mensagem de ternura e belezaque o artesanato brasileiro oferece à todos os povos, expri-mindo uma idéia nova num mundo seleto e eterno das artesplásticas.”

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Figura .45 .- Desenho de brochede diamantes, início da produ-ção de Haroldo Burle Marx,cerca de 1945, guache sobrepapel vegetal, AcervoS.B.Marx.

Figura 46 - Desenho de brocheduplo-clip de diamantes, cercade 1945, H.Burle Marx, guachesobre papel vegetal, AcervoS.B.Marx.

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Texto traduzido de catálogo de jóias da ColeçãoAltomar, de Haroldo Burle Marx, lançada nosE.U.A.:

A vida de Haroldo Burle Marx documenta o desenvol-vimento do gênio e criatividade que resultou num dos maio-res artistas e designers de nosso tempo. Nascido em SãoPaulo, Brasil, em 1911, o filho de um proeminente exporta-dor, Haroldo foi educado no Colégio Resende, PitmanCollege em Londres, Rackow Hochhandelschule em Berlim ena Faculdade Nacional de Direito no Rio de Janeiro.Inicialmente trabalhou com seu pai no negócio de exportaçãoe posteriormente fundou sua própria firma de filatelia, se tor-nando uma autoridade em selos raros. Sua atração pelaspedras e o ouro o levou finalmente a Idar-Oberstein, naAlemanha, onde estudou por quatro anos gemologia e lapi-dação.

Em 1945 ele iniciou o novo negócio de exportação degemas no Brasil, e logo desenvolveu uma nova técnica delapidação que é única das jóias de Burle Marx. Sua lapidaçãoem forma livre nunca foi satisfatoriamente imitada. Já no iní-cio de sua carreira, Haroldo combinou esta nova técnica deformas livres com um design moderno, criando uma rupturacom o estilo clássico e convencional. Valor artístico e origina-lidade tem sido a marca registrada das jóias de Burle Marxpor quase quarenta anos e conquistou clientes da realeza ecelebridades de todo o mundo. Através dos anos, o governobrasileiro tem solicitado a criação e manufatura de jóias parapresentes oficiais a inúmeros visitantes e chefes de estado.

Recentemente, Burle Marx desenvolveu novas técni-cas de acabamento do ouro que dão às suas jóias ainda maisbeleza e distinção. Além do seu trabalho pioneiro em lapida-ção em formas livres de águas-marinhas, turmalinas e ametis-tas, ele também teve uma importante atuação no descobri-mento e desenvolvimento das belas opalas brasileiras. As opa-las brasileiras rivalizam em raridade e beleza com as opalasaustralianas, e os designs de Burle Marx para opalas são umaincrível contribuição ao mundo das jóias raras. Como outrosgrandes artistas, Burle Marx não obteve sucesso instantâneo,mas sua determinação em fazer seu próprio estilo gradual-mente conseguiu a aprovação em todo o mundo e seus designsagora incluem mais de 10.000 jóias em toda a sua carreira.

Apesar de Burle Marx falar e escrever fluentementecinco idiomas e sua educação em todos os campos, do direitoà contabilidade, seu primeiro amor permaneceu os recursosdo Brasil e sua riqueza cultural. Sua convicção e herança érefletida nos seus avançados designs e nas suas gemas de qua-lidade, que fazem da sua jóia um investimento numa

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arte rara, assim como nas gemas preciosas e ouro. Agora, pelaprimeira vez na sua ilustre carreira, as jóias de Burle Marxestão disponíveis nos Estados Unidos, exclusivamente naColeção Altomar.(Catálogo da Coleção Altomar, lançada nos E.U.A.)

A produção inicial de jóias de B.Marx se enquadravaperfeitamente no estilo das décadas de 40 e 50, com brochestípicos de diamantes em platina, na forma de animais, flores,laços, e o chamado duplo clip, que se separava em duas par-tes, podendo ser usado preso em cada lado do decote ou dovestido, ou inteiro. Conjuntos de pulseira e anel com pedrasde cor de grandes tamanhos, como as águas-marinhas, citri-nos e ametistas.

A aproximação de Haroldo com a obra de RobertoB.Marx resultou em jóias de formas mais orgânicas, que porprivilegiarem este aspecto formal, o seu desenho, têm emcomum o embutimento de fechos, articulações e elos e a inte-gração entre as pedras cravadas e o resto da peça A próprialapidação de suas pedras mostra esta preocupação com a pre-paração para a cravação, porque todas possuem uma espéciede cintura na parte lateral para receber a virola de metal.

O exemplo abaixo é composto por um colar em módu-los crescentes até o centro onde se fixam 15 pendentes deáguas-marinhas, também de tamanhos crescentes até o centro.O fecho e as articulações não são visíveis, sendo necessárioum acabamento de qualidade nas peças que compõem o colar.

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Figura 47 - Ilustração de colar de águas-marinhas e ouro amarelo, guachesobre papel preto, Haroldo Burle Marx, década de 60, Acervo S.B.Marx.Na página seguinte, dois colares também com águas-marinhas.

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Figura 48 e 49 - Desenhos de colares em ouro amarelo e águas-marinhas,guache sobre papel preto, B.Marx,década de 60, Acervo S.B. Marx.

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2.1.4.Marcos Cruz e Marcel Küng (H.Stern)

Os designers Marcos Cruz e Marcel Küng foram con-temporâneos no setor de criação da empresa H.Stern, sendoMarcel Küng inicialmente o diretor do departamento, e poste-riormente Marcos Cruz assumiu a mesma função, a partir dasub-divisão em dois setores distintos de criação.

Ambos receberam o Diamonds International Awards,sendo estes os primeiros designers do Brasil e América Latinaa receberem o prêmio máximo da joalheria mundial, MarcelKüng em 1966 com um design de anel e Marcos Cruz em1969 também com um anel.

O designer de jóias Marcos Cruz possui formação emBelas Artes na Escola Industrial de Pernambuco, tendo inicia-do seu trabalho como designer de jóias da H.Stern em 1958 etrabalhado lá até 1975, 17 anos dos quais 15 como chefe doDepartamento de Arte da empresa citada. Posteriormente tra-balhou na Moreno Joalheiros e atualmente é o responsávelpelo setor de criação da Anvers, no Rio de Janeiro. Em 1968desenhou a pulseira que foi dada de presente à Rainha daInglaterra na forma de um golfinho em ouro, diamantes, rubise esmeraldas. Em 1969 recebeu o Diamonds InternationalAwards, considerado o prêmio máximo do design de jóias,com um anel inspirado nos fogos de artifício de Copacabana,com diamantes coloridos e esmalte. Em 1970 criou o GrandeColar do Mérito Naval para a Marinha de Guerra do Brasil, emouro, prata e esmalte, sendo agraciado com a Comenda doPrimeiro Distrito Naval.

Marcos Cruz é um designer altamente técnico. Quandodesenha um brinco como da Figura está mostrando que eletem uma cintura, a cabeça do brinco se desloca para trás e odesenho do verso possui os detalhes para o ourives poder exe-cutar a peça. Um dos chatões vai ser o calcanhar de aquilespara que a peça tenha um caimento vertical. Seu processo detrabalho atualmente se baseia no uso de caneta esferográficapreta e hidrocor sobre papel. Numa peça como o brinco dafigura são feitas repetições com o uso de papel vegetal. Nestecaso, ele poderia utilizar cores diferentes para cada tamanhode pedra. Muitos de seus desenhos utilizam esta codificaçãocom cores, principalmente quando se trata de uma jóia cara dediamantes, que tem diamantes de muitos tamanhos, então cadadiamante é pintado de uma cor de acordo com o seu tamanhoe depois o código é colocado do lado com as cores correspon-dentes.

Na Figura ...,ao mostrar o verso do brinco, ele se utili-za do hidrocor cinza para mostrar o seu movimento na orelhae a inclinação das pedras. Esse código muitas vezes fica a cri-tério de quem está executando os desenhos, mas também podeser um código interno de uma determinada empresa, com o

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qual as pessoas já estejam habituadas a trabalhar.Há muitos anos atrás, Marcos Cruz já desenhava com

a preocupação de representar o brinco tridimensionalmente,não apenas fazendo uma vista superior. Segundo ele, sua visãoé de como se a jóia estivesse sendo fotografada na sua frentee com essa habilidade ele a representa no papel. Seus anéis sãodesenhados sempre na medida 17 ou 18(medida consideradapadrão para anéis femininos), a pedra está em tamanho real,para que o ourives não possa justificar uma eventual modifi-cação do desenho solicitado .Seu trabalho em conjunto comum pequeno número de profissionais funciona num sistematotalmente artesanal, sem possuir até o momento uma oficinana empresa. Marcos acredita que deve-se exigir fidelidade aodesenho de quem fabrica para que a peça seja produzida comoo fabricante (ou designer) quer.

Ele não cria seus desenhos sem uma pedra, seu pontode partida é sempre uma pedra, porque existe muita dificulda-de de se encontrar uma pedra na medida exata para o modelocriado. Segundo Marcos, não se pode estar relapidando uma

Figura 50 - Desenho de brincos, hidrocor e caneta esferográfica. A ilus-tra;ão vem acompanhada do detalhamento técnico de fabricação. Trabalhorecente, de 2000, que exemplifica o método de trabalho do designerMarcos Cruz.

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pedra cara, nem mandando fazer outra do tamanho que sequer; avaliando que a maioria dos designers faz isso e depoisfica fora da realidade.

O estilo próprio de Marcos Cruz reflete sua experiên-cia no trato direto com os clientes, por exemplo: a aquarelapossui um tempo de execução mais demorado, tornando o tra-balho de criação na presença do cliente mais complicado,então ele utiliza uma caixa de 30 cores de hidrocor FaberCastell e para cada cor da caixa ele acrescenta água e faz setetons

No período em que trabalhou na H. Stern, as criações-mais solicitadas eram brincos e anéis, que geralmente são aspeças mais vendidas, depois colares e pulseiras. Normalmentehavia um critério de exclusividade, não havendo a massifica-ção dos seus modelos. Para valer a pena a criatividade, segun-do ele, a peça deve ser única ou no máximo duas ou três.

Como exemplo de outras formas de trabalho, Marcoscitou a Cartier, que tem mais de 50 designers espalhados pelomundo, sendo que posteriormente selecionam o material querecebem para a produção. Marcos fez algumas críticas ao tra-balho de um jovem que está na Anvers como seu assistente,passando seus desenhos para o computador, que esquece queas pedras tem grifas, fundo, ou seja, volume.

Marcel Küng

Marcel Kung é ourives de formação, sendo que naSuíça, segundo ele, o ourives tem a formação paralela dedesigner, é uma opção que cada pessoa faz de acordo com asinclinações que possui. Dentro do período de aprendizado dequatro anos, a disciplina de desenho é obrigatória. Em 1951,movido pela curiosidade, chegou ao Brasil e trabalhou comoourives na oficina de Bernardino Lopes até 1953/54, quando aH. Stern o contratou como designer e lá trabalhou durante dezanos.

Em 1963/64, com os distúrbios políticos no Brasil,houve uma mudança na empresa e então Marcel saiu e passoua trabalhar por conta própria, durante três anos como free-lancer para a H.Stern e Amsterdam Sauer, entre outras empre-sas que não existem mais, como por exemplo a Zitrin e aRoditi. Em 1966 recebeu o Diamonds International Awardscom um desenho de anel que foi executado pela AmsterdamSauer. Os desenhos vencedores deste concurso deviam ter umpatrocinador que se responsabilizasse pela execução daspeças, e na época o Sr. Francisco Vaks, diretor de produção daAmsterdam Sauer, viabilizou este patrocínio. Posteriormente,Marcel recebeu uma proposta de trabalho da firma Maximino,dez anos depois, e entrou na filial de Copacabana.

Há quatro anos trabalha na Maximino do Centro, já

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estando aposentado desde 1993, mas continua ativo porqueacha a profissão uma profissão bonita, pela atividade de cria-ção, o contato humano e a parte comercial, que considera parteda atividade profissional do designer. Eventualmente ainda fazalguns trabalhos como freelancer pois possui liberdade artísti-ca para isso na empresa.

Alguns desenhos feitos por Marcel quando ainda erasolteiro.são peças clássicas, em ouro amarelo, brilhantes eesmeraldas, de 1962. Outros são peças de alta joalheria, comnavetes e baguetes de diamantes, rubis e safiras. Hoje em diapoucas pessoas fazem este tipo de montagem,. sendo umdesign clássico como hoje ainda se usa peças de estilo Artdeco ou do início do Século XX.

A técnica de pintura usada é a aquarela com o guache,sendo que, para os brilhantes é feita a mistura com um poucode guache porque aumenta a consistência da tinta.

Algumas peças como gargantilhas tem um estilo maismoderno, com o uso da pedra de cor, o Brasil é famoso no usoda pedra de cor, segundo Marcel, ninguém oferece uma palhe-ta de pedras de cor como o Brasil, topázio imperial, água mar-inha, etc.

Alguns desenhos são de peças que foram feitas sobencomenda, outros para estoque.

Antigamente, neste período a clientela nacional tinha,um preconceito, talvez seja por falta de uma devida difusão,de uma devida propaganda, promoção das pedras. Hoje em diaa água-marinha está sendo aceita, sendo montada, turmalina,citrino, ametista. Houve uma certa promoção, qualquer coisaque se quer divulgar precisa de uma força no campo da prop-aganda. Nas palavras de Marcel, a gente tem que dizer quema gente é, o que se faz e aonde a gente está, senão a gente ficaparado no tempo.

Marcel sempre tem uma tendência para o design avan-çado, moderno, mas acha que às vezes o desenhista tem quese controlar, porque para se criar para o mercado tem que res-peitar o mercado e as tendências de moda. Não adianta fazerdesign avançado que depois fica na vitrine ou na exposição enão há retorno material.Qualquer coisa nova tem que ser exe-cutada, tem que ser testada.- No período em que trabalhou na H. Stern, foram soli-citados desenhos que utilizassem pedras de cor, já que elesforam os precursores, os pioneiros no lançamento da pedrabrasileira, isso tudo de verdade deve ser dito, porque conside-ra que a H.Stern promoveu a difusão da pedra de cor noBrasil,citando uma entrevista que assistiu recentemente do Sr.Stern na televisão alemã na qual ele dizia que quer fazer doBrasil o que os irlandeses fizeram com o uísque, e os france-ses com o perfume.

Marcel Küng desenhou um diadema em 1962 parauma exposição em Londres, no Albert Museum. Este diadema

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Figura 51 - Desenho de anel de M.Küng - aquarela e guache sobre papel,1963, Acervo L. Preuss.

Figura 52 - Desenho de centros de colar - M.Küng, aquarela e guachesobre papel, cerca de 1965, Acervo Marcel Küng.

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foi desmontado posteriormente, porque foi concebido comopulseiras, brincos e anéis que se separavam, já que vender umdiadema é muito difícil.Desenhou também uma peça que éuma rosa que abre e fecha, para Londres, na mesma época.

Para Marcel, existem algumas peças que podem tersido feitas na década de 50, 60 ou 70, não sendo identificadoo período de sua fabricação, já outras peças são característicasde um determinado período, que se reconhece, como a facha-da de um edifício, se reconhece a época de construção, odesign do arquiteto.

No período em que trabalhou como ourives na oficinade Bernardino Pereira Lopes, fazia peças com baguetes enavetes de diamantes semelhantes aos desenhos característi-cos da década de 50. Atualmente no Brasil, segundo Marcel,já existem cursos, cabendo ao ourives se aperfeiçoar, se desen-volver e procurar melhorar na profissão.

2.1.5. Bernardino Lopes/ Helmut Odenbreit e Arlé

Bernardino Lopes foi entrevistado sobre sua produçãojoalheira de 73 anos e sobre o designer de jóias HelmutOdenbreit, já falecido e que foi seu funcionário durante qua-renta anos. Segundo Sr. Bernardino, Helmut Odenbreit come-çou a trabalhar para ele após a Segunda Guerra Mundial e pro-vavelmente foi o primeiro designer de jóias atuando no Rio deJaneiro. Bernardino Lopes faz jóias desde 1931 e no períodode 1950 a 1963 fabricou jóias para a joalheria francesa Marc,que se estabeleceu no Brasil após a Guerra. Helmut Odenbreittrabalhava no Serviço Geográfico do Exército e quando aguerra começou ele foi mandado embora. Seu irmão Fritz eralapidador de diamantes para Sr. Bernardino e lhe pediu umemprego para o irmão. Helmut então começou a desenharjóias como autodidata, mas tanto o seu estilo de jóia como seudesenho pode-se notar hoje como semelhante ao francêsdaquele período.- Helmut Odenbreit morava na Alemanha em Idar-Oberstein, cidade famosa pelo trabalho com pedras. No Brasiltrabalhava inicialmente como desenhista topográfico doExército. Começou a trabalhar sem experiência nenhuma comjóias sendo que não há registro desta sua fase inicial.

Bernardino Lopes fabricou jóias para a Joalheira Marcdurante treze anos, a partir do final da Segunda GuerraMundial, quando Helmut se estabeleceu no Rio de Janeiro.

Helmut trabalhava com a influência francesa de dese-nho de jóias, que, nas palavras de Bernardino, é a que ele cul-tua. Primeiro Helmut fazia os esboços a grafite e depoisBernardino analisava o que seria aprovado e finalizado então,com aquarela e guache. Seu desenho era extremamente realis-ta, o cliente tinha noção exata do que ele ia receber.

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Bernardino citou como exemplo o caso recente de uma clien-te sua que lhe encomendou um anel com dois brilhantes e elefez um anel em papel só para que ela colocasse no dedo etivesse noção da peça já finalizada, ressaltando a importânciado realismo na representação de uma jóia, inclusive em termosde orçamento.

No auge de sua produção, Bernardino chegou a terquarenta e seis empregados em sua empresa, inclusive MarcelKüng, que trabalhou como joalheiro durante três anos.

Segundo Bernardino, como joalheiro de alto nível elesó tem uma pessoa no Brasil que admira e considera que tema mesma capacidade, mas que hoje em dia não esta mais tra-balhando, que é Sigimundo Dantas, de São Paulo.

As pulseiras de diamantes desenhadas por Helmut têmmecânica, tem engenharia, atualmente mesmo um ourivescom alguma experiência não sabe fazê-las. Um ourives paraser considerado meio-oficial precisa ter cinco anos comprova-dos em carteira, e um oficial dez anos. Atualmente o processode trabalho se modificou, fazendo-se um modelo da jóia emfunção da fundição.Havia naquela época uma valorização dotrabalho feito à mão e no caso das pulseiras isso era essencialporque os diamantes possuíam formatos e tamanhos muitodiversos, assim como as articulações entre as muitas vezes-centenas de chatões exigiam um pré-estudo e uma pré-mon-tagem destas pequenas peças em gesso para depois sereminterligadas e articuladas. Uma característica das jóias desteperíodo (década de 50) era o movimento ou jogo entre algu-mas partes do broche, brinco, pulseira ou gargantilha.

Todo o aprendizado de Helmut foi profundamenteinfluenciado por Bernardino, que com sua experiência na

Figura 54 - Desenho de broche de diamantes, técnica de guache sobrepapel preto, Helmut Odenbreit, cerca de 1950, Acervo Bernardino Lopes.

Figura 53 - Desenho de brochede esmeralda e diamantes,Helmut Odenbreit, cerca de1950, AcervoBernardinoLopes.

Figura 55 - Desenho de brochede esmeralda e diamantes, téc-nica de guache e aquarela sobrepapel preto, Helmut Odenbreit,cerca de 1950, Acervo B.Lopes.

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Figura 56 - Esboço de mão com anéis e pulseira a grafiti sobre papel,Helmut Odenbreit, cerca de 1950, Acervo Bernardino Lopes.

Figura 57- Desenho de anel de diamantes, lápis preto e guache sobre papelvegetal, Helmut Odenbreit, cerca de 1950, Acervo Luciana Preuss.

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Figura 58 - Broches em ouro amarelo com rosas de coral nos quais pode-se observar a texturização do metal, guache sobre papel vegetal coladosobre cartão preto. Helmut Odenbreit, cerca de 1950, Acervo B. Lopes.

Figura.59 - Desenho de broche em ouro branco, diamantes e safiras, empapel preto com verniz sobre as pedras. Provavelmente um dos últimosdesenhos de Helmut, da década de 80, sendo notável o estilo clássico dapeça, ainda muito utilizado na alta joalheria para a maior valorização desuas pedras.

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época de quarenta e cinco anos de trabalho como ourives,soube lhe transmitir os processos de fabricação e ao mesmotempo caminhar junto com o processo de criação artística deuma jóia, seguindo o estilo francês vigente na época. Muitosanos depois, na década de 70, já com problemas de saúde, foitrabalhar em Belém do Pará, no Museu Emílio Goeldi, catalo-gando borboletas e outros insetos.

Helmut, assim como Marcos Cruz e Marcel Küng,também foi vencedor do Diamonds International Awards,sendo que é o único designer latino-americano premiado porduas vezes, a primeira em 1986 com uma pulseira e a segun-da em 1988 com um broche executado pela H.Stern.

Bernardino Lopes, então com oitenta e sete anos foi oresponsável pela identificação dos desenhos atribuídos a Arlé,que apesar de trabalhar também em papel vegetal e utilizar aaquarela e o guache como Helmut, tinha uma técnica de pin-tura mais livre, mais pictórica e menos técnica no sentido darepresentação realista de uma jóia.

Bernardino Lopes começou seu ofício de ourives tra-balhando para Rafael Perroni, um joalheiro italiano que haviatrabalhado 15 anos em Paris e com ele aprendeu os aspectosmais refinados de seu trabalho. Depois trabalhou como ouri-ves para Marcel Levy, joalheiro francês de origem judaica quepossuía escritório na Rua do Ouvidor, no Centro do Rio deJaneiro. Marcel Levy administrava uma oficina com aproxi-madamente 20 ourives e o designer francês Arlé prestava ser-viços como free-lancer para ele. Foi neste período queBernardino Lopes manteve contato com Arlé.

O designer francês Arlé trabalhou na década de 40 e 50no Rio de Janeiro como free-lancer para alguns joalheiros,como Marcel Levy, e são muito poucas as informações biográ-ficas sobre ele, a não ser o relato de Bernardino Lopes e o res-pectivo reconhecimento de seus desenhos, principalmente noque diz respeito às suas técnicas de pintura, segundo Sr.Bernardino, menos realistas se comparadas às de HelmutOdenbreit, e mais livres na forma e no fato de deixarem bemvisíveis seu caráter de pintura, sendo muitos dos desenhosencontrados, de jóias com a técnica de esmaltação, havendo anecessidade de um maior uso de superfícies de cor para repre-sentá-la. Seus trabalhos são ilustrados com guache sobre papelvegetal, com um esboço prévio da forma em grafite, mais evi-dente nos desenhos de colares e pulseiras, e em algumas repre-sentações de sombras.

Figura.60..- Desenho de brocheem ouro branco, diamantes eesmalte azul, Arlé, cerca de1950.

Figura.61.-Detalhe de desenhode módulos de pulseira em ouroamarelo e esmalte azul, Arlé,cerca de 1950.

Figura.62.- Desenho de módu-los de pulseira em ouro amareloe esmalte vermelho, Arlé, cercade 1950.

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Figura.63 - Desenho de colar em ouro amarelo e esmalte vermelho, no qualpode-se notar a sombra abaixo e à esquerda dos módulos em forma decoração, Arlé, cerca de 1950.

Figura.64 - Desenho de colar em ouro amarelo e esmalte verde. Observe-se que a linha divisória no centro do colar separa as duas opções de módu-los de trevos: à esquerda trevos de três folhas e à direita trevos de quatrofolhas, Arlé, cerca de 1950.

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Conclusão

Vimos no presente capítulo os processos de trabalhodos principais designers de jóias atuantes no período dapesquisa, a partir das mais diversas formações profissionais, esuas contribuições para o desenvolvimento do design de jóiasno Rio de Janeiro. Descrevemos estes processos de trabalho,ressaltando os seus diferentes métodos e materiais, assimcomo de que forma estes desenhos foram posteriormente pro-duzidos.

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