4-Concepção Sobre Drogas Relatos Dos Usuários Do Caps-Ad

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    ArtculoArticle 4 SMAD, Revista Eletrnica Sade Mentallcool e Drogas

    CONCEPO SOBRE DROGAS:RELATOS DOS USURIOS DO CAPS-AD,DE CAMPINAGRANDE,PB

    Julliana Keith de S Vieira1; Rafael Nicolau Carvalho2; Elisngela Braga de Azevedo3;Priscilla Maria de Castro Silva4; Maria de Oliveira Ferreira Filha5

    Objetivou-se com este trabalho, de carter cientfico, analisar a concepo dos usurios doCAPS-ad de Campina Grande, PB, acerca das drogas, avaliando suas repercusses nadependncia qumica e o seu tratamento. Trata-se de pesquisa de abordagem qualitativa, decunho analtico, realizada com 15 usurios do servio. Para anlise dos dados, foi utilizadaa anlise de discurso. O trabalho obedeceu aos pr-requisitos ticos da Resoluo 196/96,

    do CNS, que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos. Constatou-se ainsipincia, por parte de alguns usurios do servio, acerca de informaes aprofundadassobre os danos causados pelas drogas sua sade e, ainda, que as drogas lcitas no eramvistas como drogas. Os CAPS-ad tm papel fundamental na construo de conhecimento, e necessrio que os profissionais redefinam estratgias e prticas de acordo com essarealidade, levando o usurio a ser responsvel pelo seu tratamento e reabilitao fsica,emocional e social.Descritores: Usurios de Drogas; Sade Mental; Usurios; Concepo Sobre Drogas.

    Este artigo um recorte do trabalho de concluso de curso: Concepo das drogas: um estudo junto aosusurios do Centro de Ateno Psicossocial lcool e outras drogas (CAPS-ad) de Campina Grande, PB,apresentado em junho de 2008 ao Departamento de Servio Social, do Centro de Cincias Sociais daUniversidade Estadual da Paraba (UEPB)1-Assistente Social. E-mail:[email protected] Social, Mestre pela Universidade Federal da Paraba. Professor Assistente I da UniversidadeFederal da Paraba (UFPB), Preceptor da Residncia Multiprofissional em Sade da Famlia. E-mail:[email protected] Sanitarista, Mestranda em enfermagem pela Universidade Federal da Paraba (UFPB).Pesquisadora do Grupo de estudos e pesquisas em sade mental comunitria. E-mail:[email protected], professora, especialista em Sade Mental do Departamento de Enfermagem da Faculdade deCincias Mdicas (FCM) de Campina Grande, PB. E-mail:[email protected], Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Cear; Professor Adjunto IV daUniversidade Federal da Paraba, atuao em Enfermagem Psiquitrica. E-mail: [email protected] Correspondente: Elisngela Brafa de Azevedo Endereo para Correspondncia:Rua Pedro Soaresda Silva, 55, Bairro Itarar, CEP 58411-150, Campina Grande, PB, Brasil.

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    Conceptions of Drugs: Reports by Users of the CAPS-ad in Campina Grande,Pernambuco, Brazil

    The purpose of this scientific study was to analyze the conceptions that users of thePsychosocial Care Centers-alcohol and drugs (CAPS-ad) in Campina Grande, Pernambucostate, have about drugs, and evaluate their repercussions on chemical dependence and itstreatment. This analytical study used a qualitative approach, and was performed with 15service users. Data analysis was performed using discourse analysis. The study compliedwith the ethical norms per resolution 196/96 of the National Health Council, whichregulates research involving human beings. It was found that some service users wereunaware about the health hazards caused by drugs and did not see licit drugs as drugs. TheCAPS-ad play a fundamental role in advancing knowledge and the professionals shouldredefine strategies and practices according to that situation, and help patients becomeresponsible for their own treatment and physical, emotional and social rehabilitation.Descriptors: Drug Users; Mental Health; Users; Design on Drugs.

    CONCEPCIN DE LAS DROGAS:RELATOS DE USUARIOS DEL CAPS-AD DE CAMPINAGRANDE,PB,BRAZIL

    Con este trabajo de carcter cientfico, se objetiv analizar la concepcin de los usuariosdel CAPS-ad de Campina Grande-PB acerca de las drogas, evaluando sus repercusiones en

    la dependencia qumica y en su tratamiento. Se trata de una investigacin de abordajecualitativo, de cuo analtico, realizada con 15 usuarios del servicio. Para el anlisis de losdatos se utiliz el anlisis de discurso. El trabajo obedeci los pre-requisitos ticos de laresolucin 196/96 del CNS, que reglamenta las investigaciones que involucran al serhumano. Constatamos el desconocimiento por parte de algunos usuarios del serviciorespecto de informaciones avanzadas sobre los daos causados por las drogas a su salud, yque las drogas lcitas no eran consideradas como drogas. Los CAPS-ad tienen un papelfundamental en la construccin de conocimiento, los profesionales necesitan redefinirestrategias y prcticas de acuerdo con dicha realidad para lograr que los usuarios semuestren responsables por su tratamiento y rehabilitacin fsica, emocional y social.Descriptores:Consumidores de Drogas; Salud Mental; Usuarios; Diseo Contra la Droga.

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    Consideraes Iniciais

    Para se tecer consideraes iniciais, reportou-se, aqui, ao processo de Reforma

    Psiquitrica no Brasil, em 1978, que, mediante a ecloso de movimentos sociais, do

    Movimento dos Trabalhadores em Sade Mental (MTSM), juntamente com os

    trabalhadores do Movimento Sanitrio, associaes de familiares, entre outros, buscaram

    alcanar mudanas nos modelos de ateno e gesto das prticas de sade, defendendo a

    sade coletiva, a integrao da rede de atendimento sade psiquitrica, a equidade na

    oferta de servios, a reinsero social e familiar dos pacientes e, acima de tudo, a superao

    da violncia asilar, qual os pacientes das clnicas psiquitricas eram submetidos (1).

    A Reforma Psiquitrica brasileira iniciou a luta antimanicomial inspirada na

    experincia italiana de desinstitucionalizao, concatenada com as ideias do psiquiatra

    Franco Basaglia, pois esse considerava que apenas a psiquiatria no era capaz de responder

    pelo fenmeno complexo que a loucura(2). Trata-se de processo de questionamento e

    reviso dos vrios conceitos e dispositivos jurdicos e legais, que vo desde a legislao

    referente organizao dos servios at s legislaes profissionais, mas, principalmente,

    dos conceitos e instrumentos referentes aos direitos civis e polticos dos usurios, tanto nos

    servios quanto na sociedade como um todo, numa nova abordagem democrtica e

    participativa que tem como princpios a incluso, a solidariedade e a cidadania.

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    Em meio conjuntura pela busca de ampliao e efetivao de direitos sociais na

    dcada de 80, a luta antimanicomial encontra respaldo no campo legislativo e normativo,

    quando foi apresentado ao Congresso Nacional, no ano 1989, o Projeto de Lei do deputado

    Paulo Delgado (PT/MG), propondo a regulamentao dos direitos das pessoas com

    transtornos mentais e a extino progressiva dos manicmios no pas. diante da sano e

    promulgao da Lei 10.216 (Lei Paulo Delgado), em 2001, que a poltica da sade mental

    passa a ser redirecionada, ganhando maior sustentao e visibilidade(1).

    A Reforma Psiquitrica desencadeou o processo de criao dos Centros de Ateno

    Psicossocial (CAPS), instituies destinadas a acolher os usurios com transtornos mentais,

    estimular sua integrao social e familiar, apoi-los em iniciativas de busca pela autonomia,

    bem como oferecer-lhes atendimento mdico e psicolgico, cuja caracterstica fundamental

    (dos CAPS) desenvolver estratgias para integr-los ao ambiente social e cultural

    concreto(3).

    No Brasil, foi criado o primeiro Centro de Ateno Psicossocial (CAPS), na cidade

    de So Paulo, em 1987, que vivenciara processo de interveno da Secretaria Municipal de

    Sade em um dos seus hospitais psiquitricos, no municpio de Santos, em 1989, devido

    ocorrncia de maus-tratos e mortes de pacientes. Esse fato mostrou a necessidade de

    construo de rede de cuidados efetivos para os pacientes da psiquiatria e teve repercusso

    nacional como um marco no processo de Reforma Psiquitrica brasileira (1).

    Desde ento, o pas passou a investir na reestruturao de uma rede de servios

    substitutivos aos manicmios, composta pelos NAPS, Programa de Volta para Casa,

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    Residncias Teraputicas Hospital-dia e os CAPS, que so distribudos como: CAPS I,

    CAPS II, CAPS III, CAPS i e CAPS-ad, cada qual com sua atribuio. Dentre esses, o

    CAPS-ad se insere como servio especializado que atende pessoas com problemas

    decorrentes do uso ou abuso de lcool e outras drogas. Para o Ministrio da Sade, tal

    modelo se constitui em servio gratuito, que atende usurios jovens, adultos e idosos, de

    ambos os sexos, com transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de substncias

    psicoativas como lcool e outras drogas(4).

    O atendimento no CAPS-ad realizado por equipe interdisciplinar, composta por

    profissionais de diversas reas, sendo eles: assistentes sociais, enfermeiros, pedagogos,

    educadores fsicos, psiclogos, psiquiatras, arte educadores e tcnicos de enfermagem(4). O

    usurio, ao ser acolhido no servio, passa por atendimento mdico, psicolgico, aes do

    servio social, alm de outras atividades como trabalhos manuais, atividades fsicas, grupos

    de famlia, coral, oficinas informativas, palestras, grupos teraputicos, oficinas de

    adaptao, autocuidado, artes, momentos de lazer, alfabetizao, jogos e recreao, ainda,

    relaxamento e msica sob a perspectiva de minimizar os danos provocados pelo abuso das

    drogas.

    Sendo assim, tomou-se como ponto de partida, para discusso deste trabalho, as mais

    diversas civilizaes em que o uso de drogas sempre foi algo presente, uso esse associado a

    distintas finalidades, desde fatores culturais, como o caso de cerimnias religiosas, at

    usos medicinais no tratamento de doenas. Entretanto, na contemporaneidade, o uso de

    drogas lcitas ou ilcitas tem se caracterizado tambm como problema de sade pblica,

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    devido sua complexidade e amplitude, atingindo pessoas de qualquer classe social, sexo,

    idade ou cor, como tambm pelas vrias consequncias decorrentes desse uso.

    A preocupao em relao ao uso de drogas se expandiu por todo o mundo,

    entretanto, no Brasil, s na virada para o sculo XX que se percebe a problemtica das

    drogas como questo social, onde vrios atores, dos mais diferentes setores da sociedade,

    passam a se ocupar do problema(5)

    . importante destacar que, at o final da dcada de

    1990, no Brasil, as pessoas que sofriam transtornos mentais, decorrentes do uso de drogas,

    eram internadas em clnicas psiquitricas, sendo submetidas, junto aos doentes mentais, s

    mais diversas formas de violncia.

    O Centro de Ateno Psicossocial (CAPS), que tem, entre suas funes prestar

    atendimento clnico em regime de ateno diria, evitando desse modo as internaes em

    hospitais psiquitricos, promover a insero social das pessoas com transtornos mentais por

    meio das aes intersetoriais e regular a porta de entrada da rede assistncial em Sade

    Mental na sua rea de atuao(6).

    O primeiro contato dos pesquisadores com a instituio aconteceu no dia 13 de abril

    de 2007. A partir da, os pesquisadores passaram a frequentar o CAPS-ad duas vezes por

    semana, uma pela manh e outra tarde. De incio, a ateno foi direcionada para aprender

    a dinmica do funcionamento da Instituio, bem como observar as atividades que eram

    realizadas no servio. Perodo esse que teve a durao de seis meses. Nesse perodo de

    observao, tambm iniciou-se a caracterizao do campo de estgio, atravs de dados

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    coletados na instituio e por meio de pesquisa bibliogrfica, para melhor compreender a

    rede de sade mental em Campina Grande e o trabalho desenvolvido no CAPS-ad.

    Com a continuidade da insero nesse servio, um fato que chamou a ateno foi

    que a maioria dos usurios dependente de drogas lcitas como lcool e fumo, sem, no

    entanto, consider-los como drogas, antes, aderirem ao tratamento talvez pela deduo

    simplista que, por serem aceitas socialmente, no carregam o estigma das verdadeiras

    drogas, como assim expressam.

    Dessa forma, este estudo remeteu a alguns questionamentos: em que medida a

    concepo de droga para os usurios compromete adeso e qualidade do tratamento? O

    CAPS-ad consegue provocar mudanas estruturais no universo simblico, constitudo pelos

    usurios sobre as drogas?

    Considerando-se os avanos na sade mental, a partir da Reforma Psiquitrica, tem-se

    evidenciado mais ainda o debate sobre polticas pblicas voltadas sade mental,

    principalmente em relao questo das drogas, assim, a presente pesquisa prope a

    anlise sobre a concepo dos usurios do CAPS-ad, de Campina Grande, PB acerca das

    drogas, avaliando suas repercusses na dependncia qumica e tratamento desses.

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    Percurso Metodolgico

    O presente estudo caracterizou-se como pesquisa de cunho analtico, pois essa identifica

    os fatores que determinam, ou que contribuem, para a ocorrncia dos fenmenos(7). Assim,

    foi adotada a abordagem qualitativa uma vez que essa trabalha com universo de

    significados, motivos, aspiraes, crenas, valores e atitudes, a que corresponde a um

    espao mais profundo as relaes, dos processos e dos fenmenos que no podem ser

    reduzidos operacionalizao de variveis(8).

    Os sujeitos desta pesquisa foram os usurios do CAPS-ad. E o tipo de amostra

    utilizada foi a amostragem aleatria simples, onde se trabalhou, inicialmente, com o

    universo de pessoas que frequentaram o tratamento com mais assiduidade, definindo uma

    amostra de 27,8% dos usurios, correspondendo a 15 entrevistados. Entretanto, um dos

    fatores de incluso foi que os sujeitos da pesquisa tivessem idade acima de 18 anos, fossem

    cadastrados e acompanhados no CAPS-ad e que aceitassem participar da pesquisa.

    O instrumento utilizado foi entrevista semiestruturada, com nove questes

    norteadoras. Assim, atravs das informaes obtidas, as informaes foram relacionadas ao

    seu contexto social e realizada anlise crtica, onde encontraram respostas para os

    questionamentos, facilitando, assim, a anlise mais detalhada na construo do material

    emprico, j que foi empregada a tcnica de anlise de discurso.

    Nesse nterim, a anlise de discurso problematiza as evidncias e explicita seu

    carter ideolgico, e denuncia o encobrimento das formas de dominao poltica nos

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    discursos. Sendo assim, a linguagem est marcada pelo conceito de social e histrico e deve

    ser considerada como interao inserida na relao necessria entre homem e realidade

    natural e social(9).

    Ainda, o referido autor(9)apresenta o quadro epistemolgico da anlise de discurso,

    fundamentado na articulao de trs regies do conhecimento cientfico:

    a) o materialismo histrico, como teoria das formaes sociais e suas

    transformaes;

    b) a lingustica, como teoria dos mecanismos sintticos e dos processos de

    enunciao;

    c) a teoria do discurso, como teoria da determinao histrica dos processos

    semnticos.

    Em relao Resoluo n 196/96, do Conselho Nacional de Sade, o presente

    projeto foi submetido anlise do Comit de tica em Pesquisa da UEPB e, assim, o

    entrevistador pde prestar os imprescindveis esclarecimentos aos entrevistados acerca do

    teor da pesquisa, de modo que esses puderam firmar o termo de consentimento livre e

    esclarecido, ficando uma via com o sujeito da pesquisa e outra arquivada pelos

    pesquisadores.

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    Anlise dos Resultados e Discusses

    Na anlise do material emprico, pode-se perceber que o conceito que os usurios do

    CAPS-ad tm sobre as drogas surgem de opinies diversificadas, porm, todos os

    entrevistados classificam as drogas como algo negativo, desorganizador de suas vidas,

    acarretando o afastamento de familiares, da religio, de amigos e perda de bens materiais.

    Esses fatos podem ser observados nas falas, a seguir.

    Droga, pra mim hoje em dia, realmente como o nome diz uma droga, nada,eu j abominei da minha vida. Espero que no tenha nenhuma recada e norecomendo pra ningum, porque eu sofri muito, eu cheguei ao fundo do poo;destru tudo que eu tinha, perdi meus amigos, tava sado do lbum de famlia,no perdi meu esposo, porque realmente ele me ama muito, tanto que ele tcomigo at agora, ele acreditou em mim, apostou a ltima ficha(ENTREVISTADO 1).

    Droga a destruio do mundo, destri todo mundo que consome ela, comeaaos pouquinhos depois vai se aprofundando, de repente t num hospital, numcemitrio ou numa cadeia. Ou perca de familiar, ou perca danos e objetos, at asade (ENTREVISTADO 4).

    Consideram como dependentes aqueles que apresentam os comportamentos dos

    drogadictos, pois eles so movidos pelo desejo poderoso, compulsivo, de utilizar uma

    substncia psicoativa, procura que invade, progressivamente, toda a sua existncia.

    Existncia essa que afeta famlia, trabalho, enfim, toda sua teia social. Tais autores

    consideram a dependncia uma patologia que tende a se cronificar(10).

    Um fato que chama a ateno nos depoimentos dos entrevistados(as), sobre sua

    concepo acerca das drogas, antes de frequentarem o tratamento no CAPS-ad, que a

    maioria no considerava lcool e cigarro como drogas, mas apenas maconha, crack(mais

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    citadas) etc.

    [...] droga pra mim era isso que o povo fuma, maconha, esses outros negciosque eu via o povo falar; crack eu vi falar j aqui dentro, nunca tinha ouvidofalar no. Pra mim droga era s essas coisas, lcool e cigarro no era no(ENTREVISTADO 2).

    Eu no conseguia mais estudar por causa da droga que foi o lcool. Achava quefazia bem, me divertia, porque eu era viciado, bebia desde os 6 anos de idade. Eno sabia que lcool e cigarro eram droga, s fui saber em 1990, quando entreinos alcolicos annimos (ENTREVISTADO 9).

    lcool eu no considerava, s a maconha. Eu comecei a usar o crackporque euusava e no conseguia mais parar, porque quanto mais usa quer mais, quermais (ENTREVISTADO 11).

    Sobre esse fato, pode-se deduzir, e isso foi verificado pela observao participante

    nas diversas atividades acompanhadas, junto aos usurios, que as drogas, muitas delas,

    entraram na vida dos entrevistados pela porta da frente, como relatam, nos espaos

    sociais, como clubes, festas, comemoraes e no prprio ambiente familiar, sendo que seu

    malefcio percebido apenas com a instalao de dependncia fsica e/ou psquica da

    substncia, desorganizando o tecido da sua vida social. A no compreenso do lcool como

    droga evidencia esse fcil acesso, dificultando a aceitao da doena (dependncia), bem

    como do seu devido tratamento. Vale destacar que o lcool, apesar de ter seu uso

    legalizado, tambm considerado uma droga psicoativa.

    De acordo com esse autor, seu efeito no crebro complexo, mas, de modo geral,

    classificado como depressor do sistema nervoso central. Aps beber aparecem efeitos

    estimulantes como euforia e desinibio, e, medida que se consome a bebida, passam a

    existir os efeitos depressores, como falta de coordenao motora, descontrole e sono.

    Quando o consumo exagerado o efeito depressor pode levar ao coma (11).

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    Indagados se sua concepo sobre as drogas continua a mesma, aps o tratamento

    no CAPS-ad, os(as) entrevistados(as) foram enfticos ao afirmar que mudaram a forma de

    ver as drogas, pois, antes, acreditavam que essas serviam como diverso ou refgio para os

    problemas, baixa autoestima, assim como apontam nos discursos seguintes.

    No! Porque eu tive mais um entendimento, que pra voc se divertir ou qualquer

    coisa que voc v fazer no precisa de droga, porque isso a besteira. A gentepensa. Voc primeiro fuma por alegria, depois voc fuma por tristeza, ah eu ttriste vou fumar, a vou pra uma festa vou fumar. No dia em que minha memorreu ou algum morreu eu t deprimida eu vou fumar, vou fumar pra me dmais coragem, tudo isso iluso. Por isso que eu tenho essa concepo quedroga realmente uma droga (ENTREVISTADO 1).

    No. Porque afetou muito minha vida, tanto no trabalho, como na escola, comocom a pessoa com quem eu convivo, famlia tambm, minha me que eu perdiela porque ela ficou com desgosto de mim, antigamente eu no usava e comeceia usar, nisso ela faleceu de desgosto, eu ficava bbada, eu no estava gostandomuito de mim, no me ajeitava mais e ela via isso e ficava triste. [Sua conceposobre asdrogas mudou depois que voc veio para o CAPS?]mudou muito, muito

    mesmo, me ajudou muito; os funcionrios, os psiclogos, me ajudaram muito eainda esto me ajudando, [...] a tcnica, o doutor, os remdios tudo isso t meajudando (ENTREVISTADO 3.)

    No. Porque eu sei que a gente aqui a gente esquece das droga. Usava (lcool)porque entrava em festa acompanhado dos amigo e eles chamavam pra beber, edesse fim de semana fiquei alcolatra mesmo. E eu acho que pra o cara sedivertir no carece da droga no, a gente se diverte conversando com osamigos, brincando de domin, tem vrios tipos de divertimento fora das drogas(ENTREVISTADO 7).

    Pode-se verificar a relevncia do trabalho educativo realizado com os usurios, na

    medida em que se consegue ressignificar a concepo dos mesmos sobre as drogas, a

    mudana de paradigma remete ao reconhecimento de sua situao de vida, dos motivos

    explcitos e implcitos para seu consumo, fazendo com que, de posse dessa concepo, os

    usurios se percebam como responsveis pelo seu tratamento e reabilitao emocional,

    social e fsica.

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    Contemplando a ideia supracitada, nessas pesquisas os distrbios no uso de drogas

    psicoativas esto associados ao uso de drogas pelos indivduos com baixa autoestima,

    sintomas depressivos, eventos de vida estressantes, baixa coeso familiar e ligao com

    amigos que consomem drogas(12).

    Quando questionados sobre o que puderam conhecer a respeito das drogas, durante

    o tratamento, a questo dos danos causados sade foi muito citada, e todos os

    entrevistados mencionaram que, se soubessem desses males, certamente no a teriam

    usado.

    Que as drogas afeta vrias parte do corpo, sade, o corpo inteiro, s vezes osrins, os pulmo, s vezes o crebro. O cara pode ter emprego bom, de repenteperder aquele emprego devido s drogas, pode ter a esposa e os filhos e perderpor causa das drogas, pode ter casas boas, mais casas, carro bom, e vendertudo pra... e perder tudo (ENTREVISTADO .4).

    Conheci muitas coisa, j teve palestras com outras pessoas sobre a droga, umsistema que no tem como voc explicar sobre os benefcio dela e o mal, que nocaso o mal que h. No caso meu no quero mais isso pra minha vida e vou meajeitar porque do jeito que tava no pode mais ficar, tava perdendo tudo eagora t mudando (ENTREVISTADO 13).

    As concepes emitidas pelo conjunto de entrevistados revelam que esses

    consideram relevantes ter informaes, pois alguns passam a usar drogas por falta de

    informao. A questo do preconceito foi bastante mencionada tanto perante a sociedade

    como at entre eles tambm, devido ao fato de uns usarem drogas lcitas e outros fazerem

    uso de drogas ilcitas. Um dos entrevistados diz que ter informao importante at para se

    tomar a deciso se deve ou no fazer uso das drogas.

    Acho. Porque se tem pelo menos que ouvir as informaes se salvar j muitacoisa, porque muitos entram por falta de informao, como muitos jovens queno tm o conhecimento; tem gente que mais fcil criticar por no conhecer asinformaes, a voc tendo as informaes voc pode ajudar. Quem eu criticava,

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    hoje eu ajudo, quem me criticava hoje me ajuda; por ter o conhecimento. Entovoc acha importante tanto para as pessoas que usam, como pra quem est aoredor (ENTREVISTADO 1).

    . Porque conforme voc conhecendo ela, voc vai conhecer o mal que ela faz,voc sabendo o mal que ela faz s vai se for idiota. Que a onde t voc buscardentro de si aquela fora de vontade, que ajuda voc tem, com psiclogo, comtudo, de familiares, de amigos. [...] Mas voc sabendo daquele mal ali... vocvai pisar num xiquexique com um mi de espinho, de p descalo? S se forbesta. A informao importante. Se voc saber o que , se conscientizar, tudodireitinho, saber o que tudinho, e botar na cabea, ter aquela fora de vontadevoc no entra. De maneira nenhuma, nem por ensinao de amigos, nem por

    influncia, nem de nada. (Ter informao importante pra voc decidir se vaientrar ou no?).Sim, e tambm fortalecer o apoio que seus parceiros esto lhedando, ali voc fortalece mais; como se fosse o espinafre de Popeye, prafortalecer, pra voc botar na cabea e dizer: realmente ! (Voc j sofreu algumpreconceito?).Muitos! (Voc acha que se as pessoas tivessem informaes sobreas drogas, voc sofreria esse preconceito?). No, porque saberia que umadoena, um vcio. No iriam fazer o preconceito, tentariam ajudar(ENTREVISTADO 5).

    Eu acho muito importante, porque a gente v muito em televiso, mas a gentefalando pessoalmente t vendo que verdade mesmo. Acho diferente porque porteleviso eu posso pensar que um teatro que a pessoa t falando, mas ouvindoassim a pessoa falando voc v que verdade, a gente t no CAPS e a moa

    falou essa coisa! No meu modo de entender, na televiso como um teatro queas pessoas t mostrando como pode acontecer, mas no passou isso, no realidade, acho que apenas mais um teatro (ENTREVISTADO 7).

    Acho muito importante, porque eu procuro me afastar. No usaria se soubessedos efeitos, eu comecei a usar na inocncia, desde 1954, s vim saber que eradroga quando entrei em alcolicos annimos, foi quando eu vim compreender,entender o que era o lcool, que era uma droga igual as outras. Eudescriminava quem usava maconha,crack, cocana, mas agora no descriminomais porque vi que as drogas so tudo igual, embora nunca ter usado, maconha,crack, cocana, LDS, somente o lcool, a cachaa (ENTREVISTADO 9).

    Com certeza. Porque se voc tiver a informao fica mais fcil de sair se vocentrar, e voc tendo a informao fica mais fcil de voc no querer entrar. Sema informao voc vai ter a curiosidade, mas, se voc tiver a informao no vaiter a curiosidade de querer saber como que funciona. Se tivesse a informaoque eu tenho hoje, no meu caso o crackeu nunca teria usado. E posso passarinformao pra outras pessoas, e tambm do que eu passei, agora eu tenho oque dizer, antes eu no tinha, achava aquilo o mximo, ficava me sentindo omximo, hoje em dia a gente v que totalmente diferente daquilo, o opostodaquilo que a gente pensava (ENTREVISTADO 13).

    visvel, nos relatos acima, certo preconceito quanto ao tipo de droga utilizada

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    (licitas e ilcitas) o que expressa a prpria forma como a sociedade estruturou

    historicamente seu tratamento s drogas, tornando as drogas ilcitas em caso de polcia,

    marginalizado e/ou estigmatizando quem as consome. Mais uma vez se v a importncia da

    informao, o que leva a induzir que, mesmo com uma poltica nacional de lcool e outras

    drogas, as aes educativas so insuficientes ou insatisfatrias na medida em que no

    conseguem penetrar na vida social dos sujeitos.

    Contextualizando a ideia, pode-se dizer que o tratamento do dependente de

    substncias psicoativas bastante complexo e os estudos sobre os tratamentos para a

    populao adulta mostra que tratar melhor que no tratar, mas no existe nenhum

    tratamento mais efetivo at o momento. A recada, o desejo pela droga, representada pela

    fase de fissura, o pouco envolvimento nas tarefas escolares ou no trabalho, o lazer

    insatisfatrio, a polidependncia, o incio de uso do lcool muito cedo na vida, as alteraes

    de comportamento e o envolvimento criminal so fatores que contribuem para tornar o

    tratamento menos efetivo(13).

    Ao se analisar a opinio dos usurios sobre a repercusso que o seu entendimento

    atual sobre as drogas tem no seu tratamento, a maioria relatou que deixou de usar drogas,

    ou pelo menos reduziu bastante o consumo, e que estando no CAPS-ad est afastado das

    drogas, evitando assim o fcil acesso a essas. Foi citado tambm o amor prprio e a fora

    de vontade para continuar na abstinncia e o medo de recada.

    Sim, foi fundamental pra conhecer o mal que ele me fez e faz, tanto a mimsocialmente, mentalmente, fisicamente, psicologicamente, tudo! Hoje em dia euestou voltando a ser o que eu era, porque se voc me visse h alguns anos

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    atrs... Ave Maria! Eu tinha medo, eu tive medo de mim, porque eu tenteisuicdio, porque eu vendi tudo e chegou ao ponto de eu no ter mais onde euarrumar dinheiro pra me drogar, ao no ser que eu roubasse. E isso eu noqueria, mas assim mesmo ainda roubei muito do meu marido, que tambm roubo, porque no tem diferena nenhuma de voc pegar uma coisa que no sua de algum de casa ou de algum na rua, o mesmo roubo. E por isso queera matar ele e depois me matar, meu pensamento era esse; foi quando eu tiveuma crise, uma depresso, e pedi discernimento a Jesus e ele me mostrou o meumarido, e foi a que eu falei com ele e ele disse: eu j sabia h muito tempo sque pra mim lhe ajudar voc tem que querer, voc no tava querendo. Dois diasdepois, que foi final de semana, ele me trouxe pra c, aqui estou, no falteinenhum dia, nem consumi mais droga a no ser o tabaco, o cigarro e nem quero

    mais consumir, no critico quem usa, s no quero pra mim; se eu puder ajudartudo bem, mas tambm criticar eu no critico no porque tambm eu sei que aprimeira vez voc prova por curiosidade, da segunda, ento, voc j se tornaviciado. E o crackele veio pra destruir realmente, porque as outras drogas, svezes, dependendo do psicolgico de cada um voc pode ter um certo controle,mas ocrackno, voc no se controla, voc no tem controle de forma alguma, meu ponto de vista (ENTREVISTADO 1).

    Ajuda e muito. Vindo pra c todo dia sa do meio da tentao de l, que l noPedregal muita tentao. Se eu tivesse em casa antes eu tava fumando, hoje seeu ficar em casa eu no fumo (ENTREVISTADO 10).

    No conjunto das falas, ora analisadas, pode-se identificar alguns eixos norteadores

    de anlises para essa pesquisa. Primeiro, a importncia da concepo das drogas para os

    usurios atendidos, na medida em que essas impresses podem refletir em sua adeso ao

    tratamento, dificultando ou facilitando o processo, implicando que mexer nesse universo de

    significados exige competncia tcnica e terica para respeitar os valores dos usurios,

    includos num processo participativo de construo de novos conceitos para a busca de sua

    ressignificao. Segundo, a valorizao das prticas educativas como espaos pedaggicos

    e democrticos para o processo de aprendizagem e de construo de conhecimentos, acerca

    das drogas, como forte fator de adeso ao tratamento e o reconhecimentos do abuso das

    drogas visto como algo prejudicial s suas vidas. Terceiro, o reconhecimento do espao

    institucional do CAPS-ad como ambiente de apoio e aprendizagem, onde muitas vezes

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    visto como alternativa de se manter longe do ambiente propcio ao uso das drogas.

    Diante dessas anlises, a pesquisa cumpre seu objetivo principal, reafirmando a

    relevncia e trazendo novos elementos para a prtica institucional e profissional dos

    diversos profissionais, inseridos no atendimento desses usurios, bem como o

    conhecimento de suas vidas, seus valores e concepes, como substrato material e imaterial

    na busca da construo de novos conhecimentos acerca dessa problemtica que aflige a

    sociedade e se torna problema de sade pblica, na medida em que grande parcela da

    populao est sujeita ao consumo abusivo de drogas.

    Consideraes Finais

    O uso de drogas datado de pocas antiqussimas. Foram utilizadas das mais distintas

    maneiras, encaradas pela sociedade como algo natural, ou comum, at os dias em que se

    transformaram em caso de polcia e/ou questo de sade pblica. Portanto, a forma como o

    uso de drogas tem sido visto, atualmente, difere de pocas anteriores, onde a sade pblica

    brasileira no vinha se ocupando devidamente com o grave problema da preveno e

    tratamento de transtornos associados ao consumo de lcool e outras drogas.

    Pela complexidade do problema, o Estado se mostrou ausente, e as alternativas de

    ateno eram baseadas em prticas mdicas ou psiquitricas, tendo como principal objetivo

    a ser alcanado a abstinncia. As ofertas de tratamento eram inspiradas em modelos de

    excluso/separao dos usurios do convvio social. Inmeros so os comprometimentos

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    individuais e sociais relacionados s drogas, o que permite que, com frequncia, se fale na

    problemtica das drogas.

    Houve demora do poder pblico em reconhecer o uso/abuso das drogas e problemas

    associados como questo de sade. Somente a partir de 2002, o Ministrio da Sade

    publicou portarias definindo, de modo consciente, as diretrizes de poltica pblica de

    ateno voltada para o usurio de lcool e outras drogas.

    Como dispositivos estratgicos, criados pelo Ministrio da Sade, pode-se destacar os

    Centros de Ateno Psicossocial (CAPS-ad), nos quais, como forma de tratamento, so

    propostas a reinsero social, melhor qualidade de vida por programas de reduo de danos

    e apoio familiar no tratamento dos usurios.

    As relaes estabelecidas com as drogas se tornam cada vez mais complexas, e essas

    passaram a ser associadas a diversos problemas de ordem pessoal e social. Presencia-se

    grande crescimento da oferta, como tambm do consumo das drogas, propiciando a

    estruturao de mercado ilegal e lucrativo, distribuio e venda das drogas, sustentado

    muitas vezes pela utilizao de prticas violentas.

    O uso das drogas leva perda de empregos e bens materiais, rupturas familiares,

    afastamento da religio, instabilidade financeira, abuso fsico e psicolgico no sentido de

    que alguns dos usurios chegam a um grau de depresso to forte que pensam at em

    suicdio.

    Ao longo desta pesquisa, pde-se constatar que os usurios do CAPS-ad no tinham

    informaes aprofundadas sobre os danos que as drogas causam sade e convivncia. E

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    que as drogas lcitas, na grande maioria das vezes, no eram ou no so vistas como

    drogas, isso se deve ao fato como foi construdo histrica e culturalmente o imaginrio

    social a respeito das drogas, ou seja, cigarro e lcool podem ser utilizados livremente,

    portanto, no trazem nenhuma consequncia maior ao indivduo (isso est to fortemente

    construdo que at alguns dos usurios que frequentam o CAPS ainda no se reconhecem

    como usurios de drogas, mesmo essas sendo licitas), enquanto que as drogas ilcitas, tidas

    como casos de polcia, levam seus usurios priso e discriminao tanto no meio social,

    como tambm pelos usurios de drogas lcitas.

    O preconceito existe em meio aos usurios do CAPS-ad pelo no reconhecimento

    que, apesar de lcitas, tambm so drogas. Enquanto que a sociedade tambm no tem o

    conhecimento de que a dependncia qumica uma doena, e, portanto, acaba

    estigmatizando e excluindo o usurio de drogas. Dentre outros fatores importantes,

    percebe-se que a baixa autoestima, dentre outros fatores psicolgicos, como, por exemplo,

    a depresso, pode fazer com que os usurios de drogas cheguem ao ponto de querer ou at

    tentar suicdio, algo que foi bastante citado pelos usurios e que pde ser constatado na

    observao participante. Destarte, a religio pode surgir como busca de tratamento

    alternativo, quando os tratamentos formais no oferecem respostas imediatas.

    A informao, sob a perspectiva dos autores, algo de fundamental relevncia para

    que essas pessoas possam entender de fato que as drogas trazem inmeros maleficios tanto

    para sade quanto para a vida como um todo. Essas informaes devem ser mais bem

    esmiuadas, e no apenas anunciadas em propagandas de forma rpida, como aquelas

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    conhecidas campanhas: drogas, no use!, droga mata.

    Acredita-se que os meios de divulgao de informaes sobre as drogas ainda esto

    bastante fragilizados. As pessoas devem conhecer a fundo todas as implicaes que as

    drogas podem trazer s suas vidas, para que, assim, possam escolher de forma consciente

    se querem ou no fazer uso das mesmas.

    E o CAPS-ad tem papel fundamental nesse processo de construo de

    conhecimento. Sendo assim, cabe aos profissionais que atuam no CAPS-ad buscarem

    redefinio de estratgias e prticas, de acordo com essa realidade, j que o trabalho

    educativo, realizado com os usurios, na medida em que consegue ressignificar a

    concepo dos mesmos sobre as drogas, a mudana de paradigma (droga para no droga)

    remete ao reconhecimento de sua situao de vida, dos motivos explcitos e implcitos para

    seu consumo, fazendo com que, de posse dessa concepo, os usurios se percebam como

    responsveis pelo seu tratamento e reabilitao emocional, social e fsica.

    Por fim, podese colocar que as experincias vividas junto ao CAPS-ad e usurios

    foram de extrema importncia para este estudo e, principalmente, para a formao

    profissional dos autores. Almeja-se, aqui, que este trabalho possa contribuir para a

    identificao das dificuldades e limites encontrados pelos usurios do CAPS-ad, no que

    tange ao entendimento sobre as drogas a fim de se informarem mais a respeito, visando,

    consequentemente, melhor adeso ao tratamento, bem como a socializao dessas

    informaes aos que os rodeiam, para que consigam efetivar seus direitos de cidados,

    buscando sua insero social.

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    Recebido em: 15/11/2009Aprovado em: 12/04/2010

    Como citar este artigo:

    Vieira JKS, Carvalho RN, Azevedo EB, Silva PMC, Ferreira Filha MO.Concepo das drogas: Relatos de usurios do CAPS-ad de CampinaGrande, PB. SMAD, Rev. Eletrnica Sade Mental lcool Drog. (Ed.port.) [Internet]. 2010 [acesso em: dia ms abreviado com ponto ano] ;6(2):274-95. Disponvel em: Endereo Eletrnico Visitado.