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Prismas: Dir., Pol. Publ. e Mundial., Braslia, v. 4, n. 2, p. 43-54, jul./dez. 2007 43
A AplicAo do princpio dAeficinciA AdministrAo pblicA:
levAntAmento bibliogrfico e estudo dA
jurisprudnciA do tjrsLuciano Benetti Timm*
Giuliano Toniolo**
r
O princpio da eficincia foi inserido no caputdo artigo 37 da Constituio
Federal em 04/06/1998. O presente artigo trata de uma reviso bibliogrfica sobre o
tema produzido no Brasil desde ento (o chamado law on the books), alm de conter
um estudo de caso sobre como o Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul vem
interpretando este dispositivo, que consiste no verdadeiro mtodo anglo-americano do
common law de pesquisa, focalizando, essencialmente, o direito tal como praticado nas
cortes (law in action), o qual, muitas vezes, no coincide com o direito doutrinrio.
paaa-ha: Princpio da eficincia. Constituio Federal. Artigo 37. Servio
pblico.
1 i
A partir do advento da Emenda Constitucional 19/98, incumbncia do gestor
pblico atuar segundo o Princpio da Ecincia. No se trata de mero princpio agregado ao
texto constitucional. Em um pas com escassez de recursos econmicos para serem aplicados em
diversos setores e necessidades sociais, tratar, ecientemente, dos custos (evitando desperdcios)
questo de justia social.
O propsito deste artigo , de um lado, fazer levantamento bibliogrco de qualtem sido a interpretao doutrinria acerca do referido dispositivo constitucional. Como se
demonstrar no item 1, a doutrina especializada administrativa entende que ecincia , via
* Ps-doutor pela U.C. Berkeley; doutor em Direitos dos Negcios e da Integrao
Regional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS; Master of Laws
(LLM) pela University of Warwick; mestre em Direito Privado pela UFRGS; advogado
e professor do Programa de Ps-graduao em Direito da Universidade Luterana do
Brasil ULBRA**
Mestre em Direitos Fundamentais pela Universidade Luterana do Brasil ULBRA;especialista em Direito do Trabalho pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos -UNISINOS
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de regra, sinnimo de boa administrao em sentido empregado pela Cincia Econmica e
Administrativa, ou seja, o de obter o melhor resultado possvel com a menor despesa (medida
tpica da relao entre custo e benefcio).
Em segundo lugar, far-se- anlise da jurisprudncia do Tribunal de Justia do Estado
do Rio Grande do Sul (TJRS) a respeito dos sentidos que so atribudos ecincia pelos julgadores.
Foram pesquisados 100 acrdos no sitedo Tribunal (www.tj.rs.gov.br), prolatados durante o perodo
de 01/01/05 a 23/02/07 e relativos ao assunto, em que apareceram as palavras-chave ecinciae
princpio da ecincia, relacionadas gesto pblica. O resultado, como se demonstrar no item
2, foi que o Poder Judicirio gacho entende, majoritariamente, a ecincia ser sinnimo de boa
administrao, porm com conotao diversa daquela defendida pela majoritria doutrina jurdica.
O entendimento predominante no TJRS o de que a ecincia no seja o melhor resultado possvel
diante do contexto oramentrio (anlise de custo e benefcio), mas no sentido de qualidade do servio
pblico prestado.
2 c a
A ecincia adquiriu grande importncia no Direito, especialmente aps o advento da
Emenda Constitucional 19, de 4.6.1998, a qual a acrescentou como princpio que rege a Administrao
Pblica no caputdo artigo 37 da Constituio Federal. Sua origem a Mensagem Presidencial 886/95,
que restou convertida na Proposta de Emenda Constitucional 173/95, cuja concluso foi a EC 19/98.Apareceu tambm como princpio no caputdo artigo 2 da Lei 9.784, de 29.1.1999, que trata do
processo administrativo federal. A Lei 8.987, que de 1995, ou seja, anterior EC 19/98, j fazia
referncia ao mencionado princpio, por exemplo, no 1 do artigo 6.
A literatura jurdica faz distino entre ecincia e eccia1. Por exemplo, na viso de
Torres 2, eccia a concreo dos objetivos desejados por determinada ao do Estado, no sendo
levados em considerao os meios e os mecanismos utilizados para tanto. Assim, o Estado pode ser
ecaz em resolver o problema do analfabetismo no Brasil, mas pode estar fazendo isso com mais
recursos do que necessitaria. Na ecincia, por sua vez, h clara preocupao com os mecanismos
que foram usados para a obteno do xito na atividade do Estado. Assim, procura-se buscar os meios
mais econmicos e viveis, para maximizar os resultados e minimizar os custos. Em suma: atingir
o objetivo com o menor custo e o melhor resultado possveis.
1 No entraremos na distino kelseniana entre eccia jurdica e social, sendo a primeira a adequaodas normas jurdicas de acordo com os pressupostos legais e lgicos do sistema jurdico, e a segunda, a
adequao social s normas.2 TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo.Estado, democracia e administrao pblica no Brasil. Riode Janeiro: Fundao Getlio Vargas, 2004. p. 175.
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A aplicao do princpio da eficincia administrao pblica: levantamento bibliogrfico e estudo da jurisprudncia do tjrs
No mesmo diapaso, Sztajn3dene ecincia assim: Ecincia signica a aptido
para obter o mximo ou o melhor resultado ou rendimento, com a menor perda ou o menor dispndio
de esforos; associa-se noo de rendimento, de produtividade; de adequao funo. Ressalta,
por m, que a eccia, por sua vez, a aptido para produzir efeitos.
Esta mesma linha de raciocnio compartilhada por Dinor.Alm de distingui-
la da eccia, a jurista paulista faz um liame da ecincia com a qualidade na prestao do
servio pblico. Salienta desta forma:4
um conceito econmico, que introduz, no mundo jurdico, parmetrosrelativos de aproveitamento timo de recursos escassos disponveis para a
realizao mxima de resultados desejados. No se cuida apenas de exigirque o Estado alcance resultados com os meios que lhe so colocados disposio pela sociedade (eccia), mas de que os efetue o melhorpossvel (ecincia), tendo, assim, uma dimenso qualitativa.
[...]
A ecincia diz respeito ao cumprimento das nalidades do serviopblico, de molde a satisfazer necessidades dos usurios, do modo menosoneroso possvel, extraindo-se dos recursos empregados a maior qualidade
na sua prestao.
Nos posicionamentos expostos, percebe-se diferenciao entre eccia e
ecincia, sendo que a primeira se refere capacidade de produo de resultados, enquanto
a segunda a busca pelo melhor resultado possvel aliada ao menor gasto de foras possvel.
Preserva-se, desse modo, a origem econmica de ecincia constitucional, e, com isso, abre-seimportante espao de dilogo entre Direito e Economia.
Freitas5sustenta que [...] o administrador pblico est obrigado a obrar tendo
como parmetro o timo [...]. Cabe a ele procurar encontrar a soluo que seja a melhor
possvel sob o ponto de vista econmico.
No mesmo diapaso, Hrger6, nos casos em que o gestor pblico tenha certa
margem de discricionariedade, sua obrigao constitucional procurar encontrar a melhor
soluo possvel para que o interesse pblico seja corretamente atendido. Seria nos atosadministrativos discricionrios que o Princpio da Ecincia teria sido efetivamente
sobrevalorizado pelo constituinte, pois embasaria a atuao do administrador pblico. Alis,
3ZYLBERSZTAJN, Dcio; SZTAJN, Rachel (Org.).Direito e economia.Rio de Janeiro: Campus, 2005. p. 83.4 GROTTI, Dinor Adelaide Musetti. O Servio pblico e a constituio brasileira de 1988. So Paulo:
Malheiros, 2003. p. 298-299.5 FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princpios fundamentais. 2. ed. So Paulo:
Malheiros, 1999. p. 85.6 HRGER, Marcelo. Reexes iniciais sobre o princpio da ecincia. Disponvel em: . Acesso em: 29 mai. 2007. Disponvel tambm: HRGER, Marcelo. ReexesIniciais sobre o Princpio da Ecincia,Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 217, p.151-161, dez. 1999.
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em primeiro momento, o Princpio da Ecincia poderia ser confundido, inclusive, com os
Princpios da Moralidade e da Razoabilidade da Administrao. Hrger, todavia, descarta esta
hiptese no mesmo trecho:
Apesar disso, possui contedo prprio. Traduz o dever de administrar, no
s de modo razovel e conforme a moral, mas utilizando as melhores opesdisponveis. o dever de alcanar a soluo que seja tima ao atendimentodas nalidades pblicas. No basta que seja uma soluo possvel. Deve,isto sim, ser a melhor soluo. H um dever jurdico de boa administraopara o atendimento da nalidade legal.
Torres7explica que a ecincia era um dos objetivos do Plano Diretor da Reforma
do Estado, cuja implementao caberia ao recm-criado Ministrio da Administrao Federal
e Reforma do Estado - MARE. O plano foi apresentado pelo ento Presidente da Repblica,
Fernando Henrique Cardoso, sociedade em meados de novembro de 1995. Os principais nomes a
ser destacados so os do ex-ministro do MARE, Sr. Luiz Carlos Bresser Pereira, e da ex-secretriaexecutiva do MARE, Sra. Cludia Costin. Naquela poca, expresses, como choque de gesto
e qualidade no servio pblico, eram comuns e serviram de embasamento para a incluso do
Princpio da Ecincia no texto constitucional.
certo que a insero do Princpio da Ecincia no caputdo artigo 37 da CF pela EC
19/98 decorreu da clara inteno de reformar o Estado. De acordo com Egon Bockmann Moreira8, o
Princpio da Ecincia passou a constituir verdadeira diretriz para a Administrao Pblica. A incluso
no texto constitucional, segundo ele, resultou da reforma gerencial do Estado, a qual pretendia acabar
com a administrao burocrtica e instalar a Administrao Pblica Gerencial no Brasil. Lembra
o ex-consultor jurdico do MARE que o Princpio da Ecincia possui outros nomes na doutrina
estrangeira, tais como,Princpio da Eccia(art. 103, 1, da Constituio da Espanha) ePrincpio do
Bom Andamento ou da Boa Administrao(art. 97 da Constituio da Itlia).
A reforma do Estado buscava melhorar sua organizao, seus servidores, suas
nanas e seu sistema institucional-legal, proporcionando relao mais harmoniosa com a sociedade
civil. A partir do advento da Reforma, consoante Torres,9o ncleo estratgico do Estado tomaria
decises mais adequadas e ofereceria servios pblicos que operassem com maior ecincia. Nessediapaso, houve a idealizao de contratos de gesto, agncias autnomas e organizaes sociais
para que conferissem efetividade reforma estatal. Somado a isso houve a combinao de um
programa de desestatizao, pelo qual vrias empresas estatais foram vendidas e submetidas a
regras de mercado, assumindo o Estado um papel de agente regulador desses novos mercados.
7 TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo.Estado, democracia e administrao pblica no Brasil. Riode Janeiro: Fundao Getlio Vargas, 2004. p. 172.
8 MOREIRA, Egon Bockmann. O Princpio da Ecincia e a Lei 9.784/99.Revista da Procuradoria Geral
do INS, Braslia, v. 7. n. 3, p. 49-51, out./dez. 2000.9 TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo.Estado, democracia e administrao pblica no Brasil. Riode Janeiro: Fundao Getlio Vargas, 2004. p. 172-174.
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A aplicao do princpio da eficincia administrao pblica: levantamento bibliogrfico e estudo da jurisprudncia do tjrs
Houve, portanto, segundo este entendimento, a inteno de implantar, no pas, novo
modelo de Estado, o chamado Estado gestor ou, por outros, chamado de Estado regulador. Neste
aspecto, vale destacar o seguinte trecho de artigo de Steinmetz:10
Ainda que sem muita presso, j h referncias a um novo modelo (de Estado):
o Estado regulador. Bresser Pereira (1996, p. 285), por exemplo, prev queo Estado moderno do sculo XXI [...] dever ser um Estado regulador etransferidor de recursos, que garante o nanciamento a fundo perdido dasatividades que o mercado no tem condies de realizar. Um Estado que noser prximo do mnimo (sculo XIX) nem executor (sculo XX).
[...]
Ainda, segundo Puceiro, para que o Estado exera com sucesso seu poderregulador, so necessrios quadros regulatrios claros que estabeleamas regras que iro reger as relaes entre o Estado e as empresas prestadorasde servios pblicos e entre estas e os usurios e poder de polcia que
garanta aos benecirios e aos usurios a prestao dos servios.
Gabardo11parece destoar ligeiramente desse quase consenso que se forma entre
juristas, quanto ao inuxo da Economia sobre o Direito Administrativo, mediante o Princpio da
Ecincia. Parece preferir a anlise tradicional dos juristas constitucionalistas, de carter mais
dogmtico (e de inuncia alem), buscando analisar a fora constitucional da nova redao
ao artigo 37 da Constituio Federal, muito embora no parea rejeitar, peremptoriamente,
a inuncia das categorias econmicas na denio de ecincia. Em todo caso, a literatura
jurdica especializada defende a clara inuncia da racionalidade econmico-gerencial
mquina governamental, portanto, ao Direito Pblico, abrindo espao para o dilogo entre
o Direito e a Economia (ou a interconexo sistmica para os que gostam da anlise de
Luhmann).12
Sztajn13observa que a relao entre Direito e Economia muito antiga, mas
que no lhe foi dada a importncia necessria, ainda que possa oferecer solues para
questes atuais. Iniciou-se a percepo da necessidade de recorrer-se avaliao econmica
na formulao de normas jurdicas, a m de torn-las mais ecientes e mais ecazes. Foi a
partir dos anos 60 do sculo passado que se iniciou o desenvolvimento da chamada de AnliseEconmica do Direito (Law and Economics). Acrescenta a autora na mesma passagem:
O movimento comea a ganhar corpo com a publicao de The Problem ofSocial Cost, de Ronald H. Coase, professor da Universidade de Chicago,
10STEINMETZ, Wilson. Premissas para uma Adequada Reforma do Estado.Revista Direito e Democracia,Canoas, v. 5, p. 81-82. 2004.
11 GABARDO, merson.Princpio constitucional da ecincia administrativa. So Paulo: Dialtica, 2002.p. 86-88.
12 A literatura norte-americana farta sobre o assunto, mas nesse artigo estamos preocupados com a
literatura jurdica nacional. Para referncias ulteriores, ver o nosso TIMM, Luciano (Org.). Direito eEconomia. So Paulo: THOMSON-IOB, 2005.13SZTAJN, op. cit., p. 74-75.
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passa por Richard Posner, com Economic Analysis of Law, ambosprofessores da Universidade de Chicago, por The Cost of Accidents deGuido Calabresi, de Yale. Alm deles, Henry Manne, George Stigler,Armen Alchian, Steven Medema, Oliver Wiliamson, entre outros,aprofundam o dilogo.
Fonseca14menciona que foi Posner o principal propulsor da Anlise Econmica doDireito e quem deu abordagem ampla e profunda ao Princpio da Ecincia. Segundo Fonseca,
Posner defendia que a economia normativa ditaria a lei para o legislador, para o juiz e para
o intrprete. Logo, no estaria destituda de escala de valores, contaminando-se pelos valores
xados pela poltica, pela moral e pelo direito. A ecincia seria o fundamento dessa escala de
valores e um dos sentidos da justia, na medida em que o homem um maximizador racional de
seus objetivos de vida. Continua Fonseca, ao explicar o pensamento de Posner:
Os instrumentos de que se serve nessa avaliao so as noes de preo,
custo, custo das oportunidades, de gravitao dos recursos em direo aum uso mais vantajoso. Para Posner, a ecincia a utilizao dos recursoseconmicos de modo que o valor, ou seja, a satisfao humana, em confrontocom a vontade de pagar por produtos ou servios, alcance o nvel mximo,atravs da maximizao entre os custos e as vantagens.
Conforme o jurista brasileiro,15a atuao do Estado deve ser pautada pelo Princpio
da Ecincia e, ao faz-lo, deve observar trs planos: a) aquele em que ele prprio exerce
atividade econmica denida pela CF; b) aquele em que adota atitude normativa da atividade
econmica; c) aquele em que estimula, ou favorece, ou planeja a atividade econmica. Completa
o autor: bvio que o mesmo princpio dever informar a atividade das empresas, que, ao
exercerem a atividade econmica, devem estar imbudas da idia de que o seu sucesso depende
exatamente da ecincia das posturas adotadas.
No jargo dos economistas, um dos modelos de ecincia social est vinculado ao
chamado timo de Pareto (ou a Ecincia de Pareto), ou seja, aquela situao em que algum
melhora a sua utilidade, sem prejudicar a utilidade de terceiro. Portanto, a gesto eciente seria
a que melhor gastaria os recursos, isto , aquele gasto que no poderia alternativamente trazer
maior benefcio ou utilidade para a sociedade, j que no faria algum melhor, sem prejudicaroutrem. Alvarez1616 explica o timo de Pareto desse modo: Uma deciso tima, segundo
Pareto, se no existe outra situao diferente que se prera unanimemente, o que implica que
devem rejeitar todas as situaes que todos declaram unanimemente como piores.
nesse sentido que a melhor literatura jurdica se refere ao princpio da ecincia no
mbito do Direito Administrativo. O Estado deve abster-se de fazer opes de gastos que no tragam
14 FONSECA, Joo Bosco Leopoldino da.Direito econmico. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 36-37.15
Ibidem, p. 35-36.16ALVAREZ, Alejandro Bugallo. Anlise econmica do direito: contribuies e desmisticaes.DireitoEstado e Sociedade,v. 9, n. 29, jul./dez. 2006. p. 63.
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benefcio maioria da coletividade. Isso aconteceria ainda que no houvesse um servio pblico
de qualidade. Qualidade e ecincia so conceitos distintos na Economia e, conseqentemente, no
Direito, quanto importa estas categorias econmico-gerenciais e dota-os de carter normativo.
Exemplicativamente, um hospital ou uma escola pblica podem ser ecientes,
ao receber poucos recursos governamentais, mas atender o mximo nmero vivel de pessoas
(relao entre custo e benefcio). No entanto, o servio (educao ou atendimento) podem no
ser de qualidade e satisfazer os consumidores. Ou, em outras situaes, determinado servio
pode ser prestado com qualidade (como universidades pblicas gratuitas), mas no signica
ecincia no emprego dos recursos pode ser que a relao entre professor e aluno seja baixa,
ou que o nvel de produo cientca seja insuciente frente aos investimentos feitos.
Na opinio da maioria dos juristas, portanto, o Princpio Constitucional da Ecincia
Administrativa no deixa dvidas de que cabe Administrao Pblica e aos particulares queprestam servios pblicos concedidos fazer o melhor possvel na equao custo-benefcio, para
cumprir com a sua atribuio de acordo com os critrios dados pela Cincia Econmica. Sintetiza
bem isso em favor da interpretao econmica da ecincia a opinio de Galdino:1717
De outro lado, abriu-se a possibilidade de utilizao de fundamentos ejusticativas antes atreladas aos princpios da proporcionalidade [...], damoralidade, da impessoalidade ou ao prprio dever de boa administraopara referi-los ecinciauma espcie de migrao de fundamentos antes
atrelados a outros princpios constitucionais e agora referidos ecincia.Essa correlao e construo devem representar uma delimitao tantoquanto possvel precisa dos limites de atuao de cada princpio.
Prima facie, parece acertada a assertiva de que o princpio da ecinciarepresenta acentuada relao com a idia de proporcionalidade ou mesmocom idia de razoabilidade.
Com efeito, assim como a razoabilidade importa na aferio da relaoentre os meios e os ns resultantes de determinada medida, a ecinciaimplica a vericao de que os resultados alcanados por uma medida sorepresentativos de uma relao custo-benefcio favorvel em relao aos
meios empregados e aos sacrifcios impostosessa , inclusive, a noocorrente de ecincia, que deve ser juridicamente temperada atravs de
parmetros ticos.
3 e a a tjrs
Mais importante que a opinio dos juristas (law on the books) o direito vivo da
jurisprudncia (law in action). No item 1 deste artigo, foram apresentadas algumas denies de
17GALDINO, FLVIO.Introduo teoria dos custos dos direitos: direitos no nascem em rvores. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 258-259.
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ecincia defendidas pela doutrina jurdica, mostrando a necessidade do dilogo entre as cincias
jurdicas e econmicas. Nesse ponto, cabe ressaltar qual o sentido de ecincia comumente
atribudo pelo Poder Judicirio do Rio Grade do Sul.
Para chegar-se a uma concluso satisfatria (ainda que no perfeitamente cientca se
consideradas as regras estatsticas, que exigiriam maior controle de variveis e de outros elementos
que fogem ao escopo da discusso), a pesquisa foi realizada no siteocial do Tribunal de Justia do
Estado do Rio Grande do Sul (www.tj.rs.gov.br). Foram pesquisados 100 acrdos prolatados durante
o perodo compreendido entre 01/01/05 e 23/02/07, os quais foram localizados por meio das palavras-
chave ecinciae princpio da efetividadee que guardavam relao com a administrao pblica.
Desse total, 88 acrdos atribuam ecincia o sentido de boa administrao, mas entendida como
qualidade na prestao do servio pblico e no no sentido empregado pela cincia econmica
vista na primeira parte do artigo. A ttulo ilustrativo, pode ser citada a apelao cvel n 70018350967,
apreciada pela 18 Cmara Cvel em 08 de fevereiro de 2007:
APELAO CVEL. AO DECLARATRIA DE NULIDADE.TELEFONIA FIXA. BRASIL TELECOM. TARIFA BSICA MENSAL.COBRANA. POSSIBILIDADE. PRELIMINAR SUSCITADA EMCONTRA-RAZES DE APELAO REJEITADA. SENTENA DEIMPROCEDNCIA CONFIRMADA. CHAMAMENTO DA ANATELAO FEITO. Falece interesse ao poder concedente em integrar o plo passivode lide onde se discute questo pertinente validade da tarifa cobrada pelaconcessionria. MRITO. No h ilegalidade ou abusividade na cobrana dadenominada tarifa bsica mensal, a qual encontra previso na Lei 9.472/97, na
resoluo 85/98 da ANATEL e nas Portarias 217/97 e 226/97 do Ministrio dasComunicaes. Tarifa que se destina ao ressarcimento dos custos operacionaisde manuteno, atualizao e modernizao da infra-estrutura da rede detelefonia, indispensvel continuidade, qualidade e ecincia do servio.PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO IMPROVIDO. UNNIME.(Apelao Cvel N 70018350967, Dcima Oitava Cmara Cvel, Tribunalde Justia do RS, Relator: Cludio Augusto Rosa Lopes Nunes, Julgado em08/02/2007)
Trata-se de ao declaratria de nulidade de cobrana cumulada com repetio de
indbito ajuizada por uma consumidora contra a Brasil Telecom S.A., na comarca de Passo Fundo. A
julgadora a quoconsiderou a ao improcedente, pois entendeu que haveria legalidade na cobrana
da tarifa bsica mensal. Irresignada, a autora recorreu. O relator, desembargador Cludio Augusto
Rosa Lopes Nunes, rejeitou o apelo da demandante aduzindo que a cobrana da tarifa bsica mensal,
alm de possuir amparo normativo, tem como objetivo o ressarcimento dos custos operacionais da
rede de telefonia. Pensar diferente, segundo se conclui do julgado, signicaria prejudicar a qualidade
e a ecincia da prestao do servio pblico concedido. Percebe-se que a Cmara claramente
atribuiu ecincia o sentido de boa qualidade na prestao do servio pblico. No seu entender,
deciso divergente causaria prejuzos prestao do servio pblico. A deciso confunde, como dito,
qualidade com ecincia.
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A aplicao do princpio da eficincia administrao pblica: levantamento bibliogrfico e estudo da jurisprudncia do tjrs
Na mesma linha de entendimento, a 3 Cmara Cvel negou provimento
apelao n 70014119440 do Departamento Estadual de Estradas de Rodagem DAER numa
ao anulatria de penalidade por infrao de trnsito interposta pelo proprietrio do veculo na
comarca de Espumoso. O julgador a quoj havia decidido pela procedncia da ao, anulando
tanto o auto de infrao quanto a multa aplicada e condenando o DAER ao pagamento deindenizao por danos morais, no valor de 5 salrios mnimos. A autarquia estadual recorreu,
aduzindo que o veculo do demandante fora multado por engano, em razo da existncia de
problemas tcnicos no controlador eletrnico de velocidade, que j tinham sido corrigidos de
imediato, caracterizando a carncia de ao do autor por ausncia de pretenso resistida. No
entendimento da desembargadora, relatora Matilde Chabar Maia, a conduta administrativa
mostrou-se equivocada desde o incio, ao identicar, erroneamente, a placa do veculo, fato que
caracterizou falta de inecincia. O vocbulo ecinciafoi utilizado novamente como sinnimo
de boa administrao ou de prestao do servio pblico com qualidade. Eis a ementa do aludidoacrdo:
APELAO CVEL. AO ANULATRIA DE PENALIDADEPOR INFRAO DE TRNSITO. Equvoco do DAER ao identicar aplaca do veculo infrator. Recurso administrativo do autor indeferido.Reconhecimento do erro somente depois de deferida a liminar e apresentadarplica. Carncia de ao afastada. Dano moral caracterizado. Condutaadministrativa desde o incio viciada pela desdia. Inobservncia do deverde ecincia. Paz jurdica violada a merecer compensao. Fixao emquantia equivalente a cinco salrios mnimos. Verba honorria mantida
em 15% sobre o valor atribudo causa - valor de alada -. Negaramprovimento apelao. (Apelao Cvel N 70014119440, Terceira CmaraCvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgadoem 26/10/2006)
A terceira deciso relativa a uma empresa do ramo de celulares que moveu
ao contra o municpio de Porto Alegre, com o intuito de obrig-lo a manifestar-se sobre o
pedido de licenciamento para a instalao e a operao de estao de rdio-base, abstendo-se
de cominar penalidade enquanto estivesse pendente a situao. A demanda continha pedido de
antecipao de tutela, o qual foi negado pelo julgador a quo. Da deciso foi interposto agravo
de instrumento n 70016905168 pela empresa. A 21 Cmara Cvel entendeu por prov-lo,
por maioria. O administrado havia feito pedido de licenciamento. Adotando posio inerte, a
Administrao Pblica no se manifestou sobre o requerimento, levando o autor a ingressar
com ao de obrigao de fazer. O desembargador Genaro Jos Baroni Borges entendeu que
no teria sido prestado servio pblico de forma eciente. A ecincia foi utilizada, novamente,
como sinnimo de boa administrao ou de prestao de servio pblico de qualidade. Esta a
sua ementa:
AGRAVO. DIREITO PBLICO. AO DE OBRIGAO DE FAZER.
MANIFESTAO DA ADMINISTRAO ACERCA DE PEDIDO DELICENCIAMENTO. Ostenta-se ilegal a conduta omissiva da Administrao
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que se recusa conceder ou negar licena. O dever de ecincia, erigido categoria de princpio norteador da atividade administrativa (CF- art. 37),impe seja exercida com presteza, exigindo no s resultados positivos parao prprio servio, mas satisfatrio atendimento ao administrado, que por issono pode aguardar ad aeternum a manifestao do Poder Pblico, por maiscomplexas as vrias etapas administrativas a vencer, com vistas, para carno caso, concesso da licena. Agravo provido, por maioria. (Agravo deInstrumento N 70016905168, Vigsima Primeira Cmara Cvel, Tribunal deJustia do RS, Relator: Genaro Jos Baroni Borges, Julgado em 08/11/2006)
Resta evidenciado que o sentido atribudo ecincia pela jurisprudncia do TJRS
est um pouco distante do que a Economia estipula, portanto aqum da doutrina administrativa.
Talvez, se a jurisprudncia atribusse ecincia o sentido que a Economia props originalmente
(obteno do melhor resultado possvel com o menor custo possvel), o princpio acrescentado
Carta Maior pela Emenda Constitucional n 19/98 teria a sua efetividade plena.
Exemplicamos: o Poder Judicirio, ao realizar o julgamento de ao relativa a
servio pblico licitado, vericaria se, quando da realizao da licitao, o assunto debatido no
processo foi objeto de contratao com o particular (pense-se em acidentes em estradas exploradas
por concessionrias em que determinados tipos de danos podem no ter sido contratados, como
aqueles derivados de assaltos em praas de pedgio). O fato de algum ser assaltado no signica
que houve inecincia na prestao do servio da concessionria.
Ecincia o melhor resultado possvel para a coletividade, diante de uma equao
de custo e benefcio. Inclusive, pode ser que este tipo de dano fosse coberto no contrato, gerariacusto adicional ao usurio no pedgio (para pagar a aplice de seguros para este tipo de sinistro)
que poderia inviabilizar algumas atividades comerciais dependentes do transporte virio ou
poderia dicultar o trnsito de pessoas de menor baixa renda, menos expostas aos riscos daquele
tipo de sinistro.
Esse guia interpretativo particularmente importante no controle ex ante de
licitaes de obras e de servios pblicos. Ou seja, antes da contratao da concessionria ou da
empreiteira, vericar-se-ia se o custo da obra ou do servio adequado para os ns a que o ato
se prope a atingir. Por exemplo, freqentemente comentado pelos paulistanos que um tnelde So Paulo teve o custo por metro quadrado superior ao custo do tnel do Canal da Mancha.
Verdadeira ou no a anedota, no passaria no teste da ecincia j quando da fase da licitao.
Portanto, ao discutir ecincia, no se ingressaria no mrito propriamente dito do ato
administrativo (construir ou no uma ponte sobre um rio, por exemplo), o qual caberia, exclusivamente,
ao Poder Executivo, mas sim seria vericado se a deciso foi a que alcanou a melhor relao de custo
e benefcio possvel (a ponte foi construda de acordo com parmetros satisfatrios do ponto de vista
da engenharia, e o seu custo estava pouco abaixo da mdia de mercado, por exemplo). Acreditamos
que, sob esse prisma, seria conferido o sentido econmico ecincia, fato que favoreceria o melhor
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A aplicao do princpio da eficincia administrao pblica: levantamento bibliogrfico e estudo da jurisprudncia do tjrs
aproveitamento dos recursos pblicos, que so, por denio, escassos. Isso, no pas dos desperdcios,
acarretaria justia com os que mais necessitam da ao do Estado.
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A ecincia, consoante o sentido econmico, consiste em obter o melhor resultado
possvel com o menor custo possvel, com o que parecem concordar os administrativistas pesquisados,
pelo menos no plano terico. No plano prtico de aplicao dos conceitos aos casos concretos, a
jurisprudncia majoritria do TJRS parece ter atribudo ao princpio da ecincia conotao diversa.
A idia corrente a de que a ecincia est vinculada boa administrao no sentido de qualidade na
prestao do servio pblico.
A ecincia, no entanto, no signica necessariamente qualidade. Se, por exemplo,os recursos sade forem escassos, mas, mesmo assim, houver nmero grande de atendimentos com
poucos erros na execuo dos servios (boa relao de custo e benefcio), haver ecincia, todavia no
haver necessariamente qualidade do servio pblico. Para a correta aplicao do princpio da ecincia,
h a necessidade de os juzes receberem treinamento sobre nanas e economia (assim como obterem
assessores especializados, como se v hoje, por exemplo, no Ministrio Pblico). Desse modo, podero
aferir a relao de custo e benefcio do gasto pblico quando surgir, em juzo, a discusso da ecincia
administrativa, evitando a analogia com qualidade no servio.
Aa
The principle of efciency wasadded to the text of Section 37 of the Brazilian Federal
Constitutional of 1988 in amendments made on 1998s reforms. The paper deals with a survey on legal
scholarship that face this subject (law on the books) and also a case study onprecedents of the Court of
Appeals from the State of Rio Grande do Sul (law in action). The conclusion was that the legal scholars
are closer than courts to the concept of efciency as used by economists (i.e., cost benet analysis).
Key words:Efciency. Brazilian FederalConstitution, Section 37. Public service.
ra
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