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543 ARTIGO ORIGINAL Acta Med Port 2007; 20: 543-549 ETIOLOGIA DAS INFECÇÕES DO TRACTO URINÁRIO e sua Susceptibilidade aos Antimicrobianos CARLOS CORREIA, ELÍSIO COSTA, ANTÓNIO PERES, MADALENAALVES, GRAÇA POMBO, LETÍCIA ESTEVINHO Departamento de Diagnóstico e Terapêutica. Escola Superior de Saúde. Escola Superior Agrária. Instituto Politécnico de Bragança. Bragança Recebido para publicação:9 de Maio de 2007 Com o objectivo de conhecer os agentes etiológicos mais comuns na infecção urinária e comparar o seu padrão de susceptibilidade aos antimicrobianos, para o mesmo agen- te etiológico, quer em doentes internados, quer em regime de ambulatório, foram ana- lisados todos os exames bacteriológicos de urina que deram entrada no Serviço de Patologia Clínica do Centro Hospitalar do Nordeste, EPE - Unidade Hospitalar de Bragança, durante o período compreendido entre Abril 2004 a Março 2006. Deram entrada no serviço 4018 exames bacteriológicos. Destes, o exame cultural foi positivo em 572 amostras (144 de internamento e 428 de doentes externos). A Escherichia coli foi o microrganismo mais isolado (68,4%), seguido pelo género Klebsiella (7,9%), pela Pseudomonas aeruginosa (6,1%) e pelo Proteus mirabilis (5,2%). Em relação à susceptibilidade aos antimicrobianos, verificamos que a Escherichia coli e a Klebsiella spp apresentam elevada resistência aos antimicrobianos Amoxicilina, Piperacilina, Cefalotina, Ceftazidima e às Quinolonas. Para as Enterobactérias em estu- do, o Imipeneme, a Amicacina e a Netilmicina, são os antimicrobianos com maior grau de susceptibilidade. Em relação aos isolados de Pseudomonas aeruginosa, os antimicrobianos mais eficazes, são o Imipeneme e a Amicacina. Relativamente ao pa- drão de susceptibilidade, para o mesmo agente etiológico, quer em doentes interna- dos, quer em regime de ambulatório, encontramos diferenças estatisticamente signifi- cativas nos antimicrobianos Ticarcilina/Ácido clavulânico e Colistina, para a Pseudomonas aeruginosa e nos antimicrobianos do grupo das Quinolonas, para o Proteus mirabilis. Relativamente aos outros agentes não se verificaram diferenças estatisticamente significativas. Este estudo permite dispor de dados necessários para o conhecimento dos diferentes agentes etiológicos mais importantes nas infecções do trato Urinário no distrito de Bragança e disponibilizar a informação sobre os seus padrões de resistências, neces- sários para se iniciar um tratamento empírico adequado e elaborar guias de tratamento. ETIOLOGY OF URINARY TRACT INFECTIONS and Antimicrobial Susceptibility of Urinary Pathogens With the objective of knowing the common etiological agents in urinary infection and comparing its antimicrobial susceptibility in nosocomial and community-acquired urinary infections, we analyse all the urine bacteriological exams from the Serviço de Patologia Clínica do Centro Hospitalar do Nordeste, EPE - Unidade Hospitalar de Bragança, during a two years period (April 2004 to March 2006). R E S U M O S U M M A R Y

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○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ARTIGO ORIGINALActa Med Port 2007; 20: 543-549

ETIOLOGIA DAS INFECÇÕESDO TRACTO URINÁRIO

e sua Susceptibilidade aos Antimicrobianos

CARLOS CORREIA, ELÍSIO COSTA, ANTÓNIO PERES, MADALENA ALVES,GRAÇA POMBO, LETÍCIA ESTEVINHO

Departamento de Diagnóstico e Terapêutica. Escola Superior de Saúde. Escola Superior Agrária.Instituto Politécnico de Bragança. Bragança

Recebido para publicação:9 de Maio de 2007

Com o objectivo de conhecer os agentes etiológicos mais comuns na infecção urináriae comparar o seu padrão de susceptibilidade aos antimicrobianos, para o mesmo agen-te etiológico, quer em doentes internados, quer em regime de ambulatório, foram ana-lisados todos os exames bacteriológicos de urina que deram entrada no Serviço dePatologia Clínica do Centro Hospitalar do Nordeste, EPE - Unidade Hospitalar deBragança, durante o período compreendido entre Abril 2004 a Março 2006.Deram entrada no serviço 4018 exames bacteriológicos. Destes, o exame cultural foipositivo em 572 amostras (144 de internamento e 428 de doentes externos). AEscherichia coli foi o microrganismo mais isolado (68,4%), seguido pelo géneroKlebsiella (7,9%), pela Pseudomonas aeruginosa (6,1%) e pelo Proteus mirabilis(5,2%). Em relação à susceptibilidade aos antimicrobianos, verificamos que a Escherichiacoli e a Klebsiella spp apresentam elevada resistência aos antimicrobianos Amoxicilina,Piperacilina, Cefalotina, Ceftazidima e às Quinolonas. Para as Enterobactérias em estu-do, o Imipeneme, a Amicacina e a Netilmicina, são os antimicrobianos com maior graude susceptibilidade. Em relação aos isolados de Pseudomonas aeruginosa, osantimicrobianos mais eficazes, são o Imipeneme e a Amicacina. Relativamente ao pa-drão de susceptibilidade, para o mesmo agente etiológico, quer em doentes interna-dos, quer em regime de ambulatório, encontramos diferenças estatisticamente signifi-cativas nos antimicrobianos Ticarcilina/Ácido clavulânico e Colistina, para aPseudomonas aeruginosa e nos antimicrobianos do grupo das Quinolonas, para oProteus mirabilis. Relativamente aos outros agentes não se verificaram diferençasestatisticamente significativas.Este estudo permite dispor de dados necessários para o conhecimento dos diferentesagentes etiológicos mais importantes nas infecções do trato Urinário no distrito deBragança e disponibilizar a informação sobre os seus padrões de resistências, neces-sários para se iniciar um tratamento empírico adequado e elaborar guias de tratamento.

ETIOLOGY OF URINARY TRACT INFECTIONSand Antimicrobial Susceptibility of Urinary Pathogens

With the objective of knowing the common etiological agents in urinary infection andcomparing its antimicrobial susceptibility in nosocomial and community-acquiredurinary infections, we analyse all the urine bacteriological exams from the Serviço dePatologia Clínica do Centro Hospitalar do Nordeste, EPE - Unidade Hospitalar deBragança, during a two years period (April 2004 to March 2006).

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INTRODUÇÃO

Considera-se como infecção das vias urinárias a pre-sença e multiplicação de microorganismos na urina do apa-relho urinário, com possível invasão e reacção das estru-turas tubulares ou parenquimatosas do aparelho urinárioou órgãos anexos1-3.

Do ponto de vista clínico, a infecção do trato urinário(ITU) pode ser dividida em dois grupos: ITU inferior, ondea presença de bactérias se limita à bexiga (cistite), e dotracto superior (pielonefrite), que se define como aquelaque afecta a pélvis e o parênquima renal1,3.

A contaminação do tracto urinário pode fazer-se portrês vias: a ascendente, a partir da flora fecal e uretral, ahematogénea, em que a bactéria contamina o sangue einfecta secundariamente o aparelho urinário e a linfática,que é uma via duvidosa de disseminação da infecçãourinária que poderá ter, contudo, algum papel nas infec-ções crónicas1,2,4,5.

A prevalência e a etiologia das ITUs dependem de fac-tores subjacentes, quer sejam do tipo epidemiológico ougeográfico, como a idade, o sexo, a existência de patologi-as de base, como diabetes, ou por manobras instrumen-tais, como a cateterização urinária1,5.

O agente etiológico mais frequente nas ITUs é E.coli1-

10, sendo que outras bactérias são frequentemente isola-das, como Klebsiella spp., outras Enterobacteriaceae eStaphylococcus saprofiticus1. A ITU é a infecçãobacteriana mais comum no âmbito comunitário, a seguir àsinfecções respiratórias. São mais frequentes na mulher queno homem1,3,6,7.

During this period, 4018 urine bacteriological exams were made. The cultural exam waspositive in 572 samples (144 from nosocomial infections and 428 from community-acquired urinary infections). The Escherichia coli was the more isolated strain (68,4%), followed by Klebsiella spp (7,9%), Pseudomonas aeruginosa (6,1%) and Proteusmirabilis (5,2%). Concerning to antimicrobial susceptibility, Escherichia coli andKlebsiella spp showed a high resistance to the antimicrobials Amoxicillin, Piperacillin,Cephalothin, Ceftazidim and Quinolones. For Enterobacteriaceae Imipenem, Amikacinand Netilmicin were the antimicrobials with more level of susceptibility. Imipenem andAmikacin were the more efficient antimicrobials against Pseudomonas aeruginosa.Concerning to the susceptibility for the same etiological agent, in nosocomial andcommunity-acquired urinary infections, we founded statistical significant differencesin the antimicrobials Ticarcillin-clavulanic acid and Collistin for Pseudomonasaeruginosa and in the group of antimicrobials from Quinolones for the Proteus mirabilis.In the other identified agents there were no statistical significant differences forantimicrobials.This study it allows making use of data necessary for the knowledge of etiologicurinary infection agents in Bragança and provides the information about theantimicrobials resistance, which were necessary to initiate an adequate empiricaltreatment and to elaborate treatment guides.

Para além da importância de conhecer os dadosepidemiológicos associados com as ITUs é também extre-mamente importante conhecer o padrão de susceptibilida-de aos antimicrobianos dos agentes responsáveis por estetipo de infecção. Nos últimos anos, tem-se detectado umaprogressiva diminuição na susceptibilidade dos uropató-genos aos antimicrobianos utilizados habitualmente parao tratamento das ITUs. Este é um problema crescente, queafecta todas as populações, sendo mais significativo emtermos de cuidados primários de saúde, onde a maioriadas ITUs são tratadas empiricamente10-12. Por este motivo,é importante conhecer quais são e como evoluem no tem-po os padrões de susceptibilidade aos antimicrobianos,dos agentes causais mais frequentemente isolados em cadazona geográfica9-13.

Existem importantes diferenças no perfil etiológico eno padrão de susceptibilidade dos uropatógenos isola-dos de doentes hospitalizados relativamente aos isoladosde doentes em regime de ambulatório8,14. Estas diferençaspodem dever-se ao facto de que os uropatógenos noso-comiais estão, frequentemente, sujeitos à pressão de anti-microbianos e a infecções cruzadas. A influência destesparâmetros pode variar entre regiões e especialidades mé-dicas15. Assim, o padrão de resistência encontra-se afec-tado, apresentando uma diminuição da susceptibilidadeaos antimicrobianos em geral8,16.

A solicitação de uroculturas e antibiogramas de amostrasde urina, provenientes de doentes com suspeita de ITU e oseu estudo periódico, permitem dispor dos dados necessári-os para o conhecimento dos diferentes agentes uropatógenosmais importantes numa determinada região e dispor de infor-

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ETIOLOGIA DAS INFECÇÕES DO TRACTO URINÁRIO

mação sobre o seus padrões de resistências, necessáriospara poder iniciar o tratamento empírico adequado e minimizaro aparecimento de resistências bacterianas3.

O aparecimento e disseminação de resistências, entreoutros factores, contribuem, para que o tratamento dasITUs constitua, em alguns casos, um importante proble-ma terapêutico10.

O objectivo deste estudo é o de conhecer, de formaabrangente, os agentes etiológicos mais comuns na infec-ção urinária, quer em doentes internados quer em doentesem regime de ambulatório, na região de Bragança, assimcomo o padrão de susceptibilidade aos antimicrobianosem ambos os tipos de doentes e comparar esse mesmopadrão, para o mesmo agente etiológico isolado.

MATERIAL E MÉTODOS

Neste estudo, foram incluídos todos os exames bacte-riológicos de urina que deram entrada no Serviço de Patolo-gia Clínica do Centro Hospitalar do Nordeste, Unidade Hos-pitalar de Bragança, oriundos dos serviços de Internamento,Urgência e Consulta Externa, durante o pe-ríodo compreen-dido entre Abril de 2004 e Março de 2006. Em todos oscasos registou-se: idade, sexo, proveniência, resultado doexame cultural, identificação da estirpe bacteriana e o pa-drão de susceptibilidade aos antimicrobianos.

Procedimentos laboratoriaisAs amostras de urina foram semeadas, simultaneamen-

te, em meio de cultura agar CLED (Cisteína-Lactose-Defi-ciente em Electrólitos) e na lâmina de cultura URICULT®

Plus (Orion Diagnóstica – Izasa, Espanha) – lâmina espe-cial em plástico com duas faces cobertas por uma camadade meio de cultura, face 1 (meio CLED) eface 2 (meio MacConkey e de Entero-coccus). Neste caso, a urina foi semeada se-gundo as instruções do fabricante. Ambosforam acondicionados numa estufa de 37ºCdurante 24 horas. Após este período, ava-liou-se o crescimento bacteriano nos meios,estendendo-se para 48 horas de incubaçãoem casos de dúvidas quanto a este cresci-mento bacteriano. A interpretação dos resul-tados de cultivo na lâmina URICULT® Plus foiefectuada deacordo com asinstruções dofabricante. Con-siderou-se umabacteriúria sig-

nificativa, nas sementeiras em meio CLED, quando o valorde unidades formadoras de colónias (UFC) era ≥105/mL.Foi considerada contaminação bacteriana quando as UFCeram ≤104/mL ou quando se observava o crescimento dedois ou mais tipos de colónias. Para a identificação bac-teriana e para as provas de susceptibilidade aos antimicro-bianos utilizaram-se provas comerciais ID® e API® (Bio-Merieux, Marcy, L’Etoile, França) e ATB® (BioMerieux,Marcy, L’Etoile, França), respectivamente.

Estudou-se a susceptibilidade dos microorganismosisolados aos seguintes antimicrobianos: Amoxicilina,Amoxicilina-Ácido Clavulânico, Piperacilina, Cefalotina,Acetil ceferoxim, Imipeneme, Cefotaxima, Ceftazidima, Áci-do Nalidíxico, Tobramicina, Amicacina, Gentamicina,Netilmicina, Nitrofurantoína, Ciprofloxacina, Ampicilina-Sulbactam, Ticarcilina, Ticarcilina-Ácido Clavulânico,Piperacilina-Tazobactam, Cefepime, Meropeneme,norfofloxacina, cotrimoxazol e Colistina.

Estudo EstatísticoA análise estatística efectuou-se com o programa SPSS

(Statistical Package for the Social Sciences) para Win-dows v. 15.0. Para a comparação das percentagens de sus-ceptibilidade, entre doentes internados e doentes em regi-me de ambulatório, utilizou-se o teste do χ2. Quando osdados não respeitavam os critérios de utilização do testedo χ2, utilizou-se o teste de Fisher. O nível de significânciaestabelecido foi de 5%.

RESULTADOS

Durante o período do estudo, deram entrada no servi-ço de Patologia Clínica, 4018 amostras de urina para exame

0300600900120015001800210024002700300033003600

Fig.1- Distribuição, por serviço de origem, do resultado do exame cultural.

Exames Bacteriológicos de Urina

Proveniência InternamentoRegime de AmbulatórioNúmero de exames bactériologicosde urinaResultados negativos

ContaminaçõesResultados positivos

3443

295742858

575

36114470

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bacteriológico. Destas, o exame cultural foi negativo em3318 (82,6%), 361 de internamento e 2957 de regime deambulatório. Foi encontrada positividade em 572 amos-tras (14,2%), 144 de internamento e 428 de regime de am-bulatório. A percentagem de exames contaminados foi de3,2%. A distribuição, por proveniência, está representadana figura 1.

Na totalidade das uroculturas positivas, 65,1% eramprovenientes de indivíduos do sexo feminino e 34,9% deindivíduos do sexo masculino. Nos exames bacteriológi-cos positivos, foram identificadas 27 estirpes diferentes,sendo a Escherichia coli o microrganismo mais frequen-temente isolado (68,4%), seguindo-se o género Klebsiella(7,9%), a Pseudomonas aeruginosa (6,1%) e o Proteusmirabilis (5,2%). Outras estirpes foram encontradas em12,4% das amostras com exame cultural positivo. A distri-buição, por origem, de todas as estirpes identificadas éapresentada no quadro I.

O padrão de susceptibilidades aos antimicrobianos dosquatro agentes causais mais frequentemente isolados, quer

em doentes internados quer em regime de ambulatório,está representado no quadro II. Os isolados de E.coli apre-sentam uma baixa susceptibilidade ao grupo dasQuinolonas, à Piperacilina (60,7% internos e 63,6% exter-nos), à Cefalotina (58,4% internos e 66,0% externos), àCeftazidima (57,3% internos e 58,9% externos) e àAmoxicilina (53,9% internos e 53,6 % externos). Dos anti-microbianos testados na E.coli, aqueles que apresenta-ram maior susceptibilidade foram o Imipeneme (97,8% in-ternos e 98,7% externos), o Cefotaxime (98,9% internos e90,4% externos), a Amicacina (93,3% internos e 97,0% ex-ternos), a Nitrofurantoína (98,9% internos e 97,7% exter-nos) e a Netilmicina (91,0% internos e 91,1% externos).Quanto à Pseudomonas aeruginosa, dos antimicrobianostestados, apenas obtivemos uma alta percentagem de sus-ceptibilidade ao Imipeneme (87,5% internos e 84,2% exter-nos). Relativamente aos restantes antimicrobianos a sus-ceptibilidade ou é muito reduzida ou intermédia. Contra ogénero Klebsiella obtivemos uma alta susceptibilidadeao Imipeneme (100% em ambas as origens) e uma boa sus-ceptibilidade, nos doentes externos, à Amicacina (83,8%).Obtiveram-se susceptibilidades extremamente reduzidasaos antimicrobianos Amoxicilina, Piperacilina e Cefalotina.Relativamente ao Proteus mirabilis, obteve-se alta sus-ceptibilidade ao Imipeneme, à Amicacina e à Netilmicina.Este apresentou uma susceptibilidade extremamente re-duzida à Nitrofurantoína e ao Ácido Nalidíxico.

Em relação ao padrão de susceptibilidade, para o mes-mo agente etiológico, quer em doentes internados, querem regime de ambulatório, encontramos diferenças esta-tisticamente significativas na Pseudomonas aeruginosano que respeita aos antimicrobianos Ticarcilina-ÁcidoClavulânico, que apresentava uma maior susceptibilidadeem doentes internos, e à Colistina, que apresentava umamaior susceptibilidade em doentes externos. Também seencontrou diferenças estatisticamente significativas nosantibióticos do grupo das Quinolonas (Ácido Nalidíxico,Norfloxacina e Ciprofloxacina), sendo maior a susceptibi-lidade em doentes em regime de ambulatório, para o Proteusmirabilis. Relativamente aos outros agentes não se verifi-caram diferenças estatisticamente significativas.

DISCUSSÃO

A percentagem de amostras negativas é muito elevada(82,6%), provavelmente devido à grande quantidade deuroculturas que se realizam como controlo pós-tratamen-to e nas grávidas, assim como pelo grande número desíndromes uretrais que podem apresentar uma etiologianão bacteriana3. Observou-se ainda uma baixa taxa de

)%(sodalosIsomsinagrOedoremúN

omsinagrO )441(sonretnI )824(sonretxE

iloc.E )8.16(98 )6.07(203

asonigureasanomoduesP )1.11(61 )4.4(91

ppsalleisbelK a )6.5(8 )6.8(73

silibarimsuetorP )3.6(9 )9.4(12

ppseaecairetcaboretnE b )4.1(2 )9.1(8

ppssuccocolyhpatS c )6.5(8 )5.3(51

ppsretabortiC d )7.0(1 )4.1(6

ppssuccocoretnE e )7.2(4 )5.3(51

seicépsesartuO f )8.4(7 )2.1(5

Quadro I – Frequência dos agentes causadores de ITU emdoentes internados e em regime de ambulatório.

a Klebsiella pneumoniae (34 amostras); Klebsiella terrigena (1amostra); Klebsiella oxytoca (8 amostras); Klebsiellaornithinolytica (2 amostras); b Serratia marcescens (1 amostra),Morganella morganii (4 amostras), Enterobacter cloacae (5amostras); c Staphylococcus epidermidis (5 amostras),Staphylococcus xylosus (2 amostra), Staphylococcus aureus (12amostras), Staphylococcus simulans (2 amostra), Staphylococcuschromogenes (1 amostra), Staphylococcus lentus (1 amostra);d Citrobacter freundii (4 amostras), Citrobacter amalonaticus(1amostra), Citrobacter koseri (2 amostra); e Enterococcusfaecalis (11 amostras), Enterococcus faecium (8 amostras);f Pseudomonas maltophilia (2 amostras), Streptococcus viridans(1 amostra), Aeromonas sobria (3 amostras), Aeromonasviridans, (2 amostras) Xantomonas campophilis (1 amostra),Sphingomonas paucimobilis (3 amostras).

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contaminação das amostras (3,2%), reflectindo isto o com-primento correcto do protocolo de colheita e ao seu trans-porte adequado.

A distribuição percentual de microrganismos obtidosneste estudo, apresenta uma certa similaridade com o re-gistado por outros autores3, ou seja, a E. coli é o micror-ganismo mais frequentemente isolado, seguido de outrospertencentes à família das Enterobacteriaceae. Em rela-ção à Pseudomonas aeruginosa, apesar de esta só ter sidoisolada apenas em 4,4% de uroculturas de doentes exter-nos, a sua importância não deve ser desprezada, já quediversos autores a têm referido como uma emergente pro-tagonista das ITUs comunitárias3,8.

A aplicação de um tratamento adequado nas ITUs deveestar sempre relacionado com o padrão de susceptibilida-de aos diferentes agentes etiológicos de uma dada regiãogeográfica e aos antimicrobianos mais comummente usa-dos nos cuidados primários de saúde3,7,8. Do conjunto deantimicrobianos estudados, os que apresentavam menoracção frente à E. coli foram, tanto de origem interna comoexterna, o grupo das Penicilinas (Amoxicilina e Piperacili-na), das Cefalosporinas (Cefalotina e Ceftazidima) e dasQuinolonas (Ácido Nalidíxico, Norfloxacina e Ciprofloxa-cina). A fraca acção das Penicilinas frente à E. coli podeestar relacionada com a alta prevalência de β -lactamases,facto este que desaconselha o seu uso quando não asso-ciados com um inibidor destas enzimas, como por exemploa associação Amoxicilina-Ácido clavulânico. Este factofoi constatado neste estudo, onde se obteve maior sus-ceptibilidade nesta associação do que na utilização doantimicrobianos isoladamente. Apesar da sua elevada ac-tividade in vitro, cada vez mais aparecem estudos quemostram que os betalactâmicos apresentam como desvan-tagem o maior número de dias de tratamento para se con-seguir taxas de erradicação, podendo ter mais efeitos se-cundários e maior frequência de recidiva que outros gru-pos de antimicrobianos17.

Os antimicrobianos pertencentes ao grupo das Quino-lonas (Ácido Nalidíxico, Norfloxacina e Ciprofloxacina)apresentam uma baixa percentagem de susceptibilidadepara a E. coli, género Klebsiella e Proteus mirabilis. Estabaixa susceptibilidade pode atribuir-se à sua utilizaçãomassiva e incontrolada na prática clínica e veterinária des-de a sua introdução comercial, facto este comprovado porum estudo de 2001, onde Portugal era o país europeu coma maior taxa de utilização destes antimicrobianos4,18. Dadaa alta resistência destes microrganismos frente às Quino-lonas, tanto no meio hospitalar como na comunidade, es-tes não se deveriam utilizar como antimicrobianos de pri-meira linha no tratamento das ITUs3,4.

O Imipeneme e a Amicacina apresentam um amplo es-pectro e uma boa a óptima actividade frente a estes trêsmicrorganismos, quer em doentes hospitalares quer dacomunidade. Por este facto, são antimicrobianos que po-dem ser usados no tratamento empírico da ITU, já que sedeve utilizar nestas circunstâncias um antimicrobiano comuma susceptibilidade que deve rondar, no mínimo, 80 a90%4.

De referir também que, para a E. coli se obteve umaelevada susceptibilidade à Nitrofurantoína, quer em do-entes internados quer em doentes de regime ambulatório.Apesar desta elevada susceptibilidade, devemos ter emconta que este antimicrobiano requer um tratamento pro-longado, quatro vezes ao dia, durante pelo menos setedias, e que juntamente com a sua toxicidade, torna neces-sário avaliar cuidadosamente o seu uso no tratamento deinfecções comunitárias3.

Nos isolados de Pseudomonas aeruginosa, os antimi-crobianos mais activos são o Imipeneme, o Meropeneme ea Amicacina, quer em doentes internos como externos.Contudo, estas percentagens, nomeadamente as referen-tes ao Meropeneme, são baixas. A produção de beta-lactamases, juntamente com a perda das purinas específi-cas dos Carbapenemas, pode ser um mecanismo envolvi-do na resistência a estes, por parte da Pseudomonasaeruginosa5.

Comparando as diferenças de susceptibilidade aosantimicrobianos, entre os isolados de origem interna e ex-terna, observa-se, em geral, que não existem diferençasestatisticamente significativas, com a excepção daPseudomonas aeruginosa e do Proteus mirabilis. Estesresultados podem alertar para um incorrecto emprego dosantimicrobianos na comunidade.

CONCLUSÃO

Em resumo, a prescrição de terapêutica empírica ade-quada bem como a profilaxia, requerem uma análise perió-dica das susceptibilidades dos principais agentes causaise a sua difusão em cada área sanitária. O pedido deuroculturas e respectivos antibiogramas oriundos de do-entes com suspeita de ITU e o seu estudo periódico, per-mitem dispor dos dados necessários para o conhecimentodos diversos agentes causais mais importantes no nossomeio e dispor da informação acerca dos seus padrões desusceptibilidade, necessários para se poder iniciar um tra-tamento empírico adequado. Para além disso, no caso defracasso terapêutico, permitirá recorrer a outro tratamen-to, um facto que ocorre em 11% dos casos4. Para alémdeste tipo de estudo devem ser feitos outros onde se con-

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temple a distribuição dos microrganismos em função dosexo, idade e nível socio-económico. É também importan-te realizar estudos que contemplem o maior número deanos possível, de forma a se poder estudar a evolução dassusceptibilidades aos antimicrobianos, por parte dos prin-cipais agentes etiológicos, ao longo do tempo.

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