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6º Encontro ABRI Perspectivas sobre o poder em um mundo em redefinição Área temática: Economia Política Internacional ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO: A INSERÇÃO EM CADEIAS GLOBAIS DE VALOR DE SINGAPURA Autora: Roberta Rosa Prata Instituição: Universidade Federal de Santa Catarina Belo Horizonte, 25 a 28 de julho de 2017.

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6º Encontro ABRI – Perspectivas sobre o poder em um mundo em redefinição

Área temática: Economia Política Internacional

ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO:

A INSERÇÃO EM CADEIAS GLOBAIS DE VALOR DE SINGAPURA

Autora: Roberta Rosa Prata

Instituição: Universidade Federal de Santa Catarina

Belo Horizonte, 25 a 28 de julho de 2017.

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RESUMO

No século XX, o modo de organização produtiva empresarial perpassou por algumas

mudanças, por razões que são atribuídas por vezes às inovações tecnológicas e por outras à

progressiva liberalização do comércio internacional. Não obstante tais razões, o novo padrão

de organização implicou na fragmentação das estruturas produtivas em diferentes regiões do

mundo. A dispersão regional das etapas da cadeia produtiva engendrou maior

interdependência entre as economias dos países e engendrou uma nova divisão internacional

do trabalho. Em tal divisão, os país desenvolvidos focam em atividades produtivas de maior

valor, concentradas principalmente no setor tecnológico e de serviços, enquanto os países

subdesenvolvidos e em desenvolvimento buscam se industrializar visando diminuir a lacuna

de desenvolvimento econômico. Em uma economia mundial cada vez mais integrada, o

desenvolvimento econômico depende de alto níveis de competitividade, sendo essencial

para os países em desenvolvimento a inserção nas cadeias globais de valor (CGVs) como

medida de ganho de competitividade. Essa perspectiva decorre das experiências de

crescimento econômico e rápida industrialização dos países do leste asiático, como, por

exemplo, Singapura. A cidade-estado tem sido apresentada internacionalmente como um

case de sucesso, em relação à superação de disparidades econômicas internacionais por

parte de países periféricos. O intuito do presente artigo é desenvolver uma perspectiva

analítica-descritiva do processo histórico das políticas implementadas pelo governo de

Singapura voltadas para inserção do país nas CGVs, de modo a aprofundar o conhecimento

sobre as estratégias governamentais que foram implementadas. Considerando que o principal

desafio dos países em desenvolvimento tem sido a implementação de políticas econômicas e

industriais que permitam a atração de investimento direto estrangeiro e a inserção das

empresas nacionais nas CGVs, visou-se, neste artigo, identificar o papel da interveniência do

governo de Singapura na inserção pragmática do país nas CGVs.

Palavras-chave: Desenvolvimento econômico. Políticas de desenvolvimento de Singapura.

Inserção nas cadeias globais de valor.

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1 INTRODUÇÃO

Após a primeira revolução industrial, o nível de tecnologia, comunicação e transportes

evoluiu de modo constante impulsionado pelo motor de inovação que sustenta a lucratividade

da economia mundial. A partir da década de 90, muitos autores se referem a esse fenômeno

como globalização, porém o presente artigo parte do pressuposto de Wallerstein (1995) de

que tal fenômeno não é algo novo, mas processos que, desde 1945, decorrem da economia

mundial capitalista1. Um ponto de concordância entre os estudiosos é que a incorporação dos

países na economia mundial capitalista tem gerado um processo de distribuição de riqueza

desigual, que se baseia nos princípios de competição. Assim, vale ressaltar alguns pontos de

como ocorreu o processo de distribuição de riqueza entre os diferentes países.

Os países do Norte, como pioneiros do sistema capitalista, haviam se destacado

economicamente por meio da revolução industrial ganhando uma vantagem competitiva em

relação aos países do Sul. Sendo que primeiros passaram a ser denominados como

desenvolvidos e os últimos como subdesenvolvidos tendo poucas chances de alteração desse

posicionamento na divisão internacional de trabalho. Os ganhos de inovação dos países

desenvolvidos mantiveram as plantas industriais no Norte até a década de 90, quando

segundo Baldwin (2012), o padrão de industrialização mudou ocorrendo a desindustrialização

dos países desenvolvidos enquanto alguns países em desenvolvimento experimentaram uma

rápida industrialização. Tais posições engendraram uma assimetria cada vez mais

desproporcional entre a renda dos referidos países.

O foco nos países da região leste asiática é interessante para o desenvolvimento

desse trabalho, pois oferecem uma nova perspectiva sobre a possibilidade de sucesso no

desenvolvimento econômico nessa nova divisão internacional. Conforme Castells (1999), a

referida região se tornou um importante centro de acumulação de capital, a maior em termos

de produção industrial, com alto nível de competitividade e inovação. Ademais, o sucesso dos

Tigres Asiáticos tem sido utilizado em apoio ao discurso ideológico pró-liberalismo. Não

obstante, de acordo com o autor, no processo de desenvolvimento do leste asiático houve

ampla intervenção estatal na economia, de modo a atingir certo nível de industrialização. De

uma maneira ou de outra, a região se transformou em um centro industrial competitivo por

meio da atração de investimento externo, que segundo Castells (idem), correspondeu na

década de 90 a um fluxo de aproximadamente 420 bilhões de dólares.

1 Utiliza-se o conceito de economia mundial capitalista desenvolvido por Wallerstein, no qual os objetivos de

maximização do lucro levam a uma divisão internacional do trabalho nos mercados mundiais.

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De qualquer modo, os debates sobre o desenvolvimento econômico2 e o modo como

o atingir, ganham força a partir da crescente industrialização dos países asiáticos. Nesse

sentido, aponta-se como pressuposto que apesar da desigualdade ter se comprovado como

parte integrante da economia mundial capitalista, também é possível observar que os níveis

de renda real em absoluto cresceram. No entanto, a riqueza foi distribuída de forma

assimétrica entre os países e dentro dos Estados gerando grande diferença na remuneração,

padrões de vida não igualitários e decorrente mal-estar internacional, ocasionando a busca

de maior bem-estar e desenvolvimento. Porém, nem todos os países conseguem atingir o

desenvolvimento econômico na economia mundial capitalista, conforme Wallerstein (1995) a

inabilidade de implementar políticas públicas de desenvolvimento traz críticas da população

perante os governos dos países em face da desilusão gerada pelo não desenvolvimento.

Vale ressaltar que o objetivo de atingir níveis elevados de desenvolvimento não é

tarefa fácil na economia mundial capitalista, que é um ambiente competitivo no qual se

desenvolver implica competir com outros países. De acordo com Wallerstein (1995),

“competição significa o desenvolvimento de um país ocorre em última instância as custas de

outro qualquer”. Destarte, para o autor a mobilidade dentro do sistema é um jogo de soma-

zero, no qual o desenvolvimento de todos é uma ilusão. Contudo, não é escopo do presente

artigo analisar se competitividade é um jogo de soma zero ou não, mas sim analisar, por meio

de uma perspectiva de longo prazo, como foi possível o desenvolvimento econômico

competitivo de Singapura3. O país que antes era um espaço geográfico com alto nível de

subdesenvolvimento e que, no século 21, torna-se a vitrine de um novo processo de

desenvolvimento direcionado por medidas estatais e apoiado por investimento externo.

Nesse sentido, o presente artigo expõe a estratégia de inserção competitiva de

Singapura nas cadeias globais de valor mediante a apresentação de uma perspectiva histórica

do desenvolvimento econômico do país e a análise das políticas governamentais empregadas

para tal fim. Parte-se do pressuposto de que a posição de Singapura no sistema internacional

foi melhorada mediante o emprego de políticas públicas direcionadas à incorporação

pragmática na economia mundial capitalista. Destarte, a partir de uma perspectiva analítica-

descritiva do processo de desenvolvimento econômico de Singapura e de uma breve

exposição de conceitos relativos a competição e cadeias globais de valor, objetivou-se

2 A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é a grande propulsora de textos e

dados relativos aos debates de desenvolvimento via inserção em cadeias globais de valor, disponíveis em:

<https://www.oecd.org/> 3 Após o Japão, em 1995, Singapura foi o segundo país da Ásia a ser qualificado como país desenvolvido pela

OECD.

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verificar o papel da interveniência do governo no desenvolvimento de uma inserção

pragmática nas redes produtivas internacionais.

Para tanto utilizar-se-á nesse artigo de análise de fontes secundárias e de dados

institucionais provenientes da Câmara de Desenvolvimento Econômico de Singapura (EDB)4,

do Banco Mundial5 e da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE), sendo o trabalho dividido em três partes. De início, serão desenvolvidas ideias sobre

competitividade e cadeias globais de valor, conforme diferentes perspectivas: a empresarial e

a do sistema-mundo. Já na segunda parte, será relatada de forma sucinta a trajetória histórica

do desenvolvimento de Singapura de 1965 a 2014, de modo a analisar o papel das políticas

públicas governamentais implementadas. Finalmente, na terceira parte será exposta a

inserção atual de Singapura nas cadeias globais de valor com intuito de obter melhor

entendimento sobre os efeitos decorrentes.

2 Competitividade e Cadeias Globais de Valor

No século 21, o novo padrão de industrialização da economia mundial capitalista

passou a organizar os países em redes de produção globalmente dispersas, com os país

desenvolvidos focando em atividades produtivas de maior valor concentradas principalmente

no setor tecnológico e de serviços, enquanto os países subdesenvolvidos e em

desenvolvimento buscavam se industrializar. Alguns autores, como Gereffi e Stark (1990),

sugerem que para muitos países a inserção nas cadeias globais de valor é essencial ao

desenvolvimento econômico. Ainda sobre a formação de redes ou cadeias globais produtivas,

Baldwin (2012) afirma que não há nada novo sobre o conceito, pois antes mesmo da

globalização já havia o uso de redes internacionais de suprimento entre países desenvolvidos.

Não obstante a origem temporal, é interessante analisar o conceito das cadeias de

suprimento e produtivas, que se multiplicam hoje na economia capitalista mundial. Conforme

Porter (1989), as cadeias produtivas se constituem em operações de produção e de apoio nas

empresas, o que permitiu a contemplação das vantagens na especialização e no foco na

adição de valor. Ainda segundo Porter (idem), as empresas deveriam se concentrar nas partes

4 A EDB é a principal instituição governamental relacionada ao planejamento e execução de estratégias para

melhoria da posição global de Singapura. Cujos objetivos segundo o site <https://www.edb.gov.sg/> são a

atração de investimentos, favorecimento do ambiente de negócios e verticalização industrial em Singapura. 5 O Banco Mundial dispõe de dados e relátorios sobre o desenvolvimento econômico de Singapura, assim como

ranking Doing Business a respeito do posicionamento dos países em relação ao ambiente de negócios mundial,

disponível em: <http://www.worldbank.org/>.

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da cadeia produtiva que têm maior vantagem competitiva e terceirizar o restante das

atividades. Com a crescente multinacionalização das empresas, o conceito de Porter passou

a ser aplicado internacionalmente sob a denominação de Cadeia Global de Valor. Para Gereffi

e Stark (1990), o termo se refere à capacidade das empresas internacionais de se

concentrarem nas operações da cadeia produtiva que adicionam maior valor e detêm maior

lucratividade.

O conceito de cadeia global de valor de Gereffi e Stark (1990), pressupõe a ideia de

que as atividades da cadeia produtiva são divididas entre empresas e lugares. Isso ocorre,

conforme Baldwin (2012), porque com a revolução da tecnologia, comunicação e transportes

tornou-se possível para as empresas a coordenação à distância da produção alocada em

países com menor nível de remuneração salarial. Na mesma lógica, Wallerstein (1995) afirma

que as diferenças nos níveis salariais entre os países centrais (desenvolvidos) e os países

periféricos (subdesenvolvidos ou em desenvolvimento) provocou o deslocamento dos setores

produtivos para esses últimos em razão da rentabilidade proveniente do corte de custos

salariais. Entretanto, embora as empresas multinacionais instalam sua produção em

diferentes regiões do mundo principalmente para buscar maior rentabilidade, esse não é o

único motivo dessa alocação.

Segundo Porter (1989), as empresas buscam as vantagens competitivas de

determinado espaço geográfico em relação comparativa com base em diversos fatores como:

mão de obra, recursos naturais e capital financeiro. De modo complementar a essa

perspectiva, Siddiqui (2016), afirma que as empresas multinacionais deslocam e fragmentam

suas cadeias de produção não só em virtude de fatores de produção, como também em

virtude de infraestrutura, benefícios fiscais e para captação de mercados. Ainda conforme o

autor, as possibilidades de investimento em diversas partes do mundo permitem a distribuição

racional de recursos e a busca por condições favoráveis ao ambiente de negócios.

Destarte, considera-se que as empresas tendem a alocar suas operações e seu capital

em lugares com políticas públicas que lhes são favoráveis, e pelos motivos elencados acima

de forma não exaustiva. A despeito do que causa a fragmentação das cadeias produtivas, o

presente artigo integra o debate acerca das implicações da inserção nas cadeias globais de

valor por meio da formulação de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento. Neste

debate, a perspectiva principal é de que os países em desenvolvimento devem adaptar suas

políticas públicas ao modelo global de organização da produção em cadeias para o sucesso

de seu desenvolvimento, tal perspectiva tem sido apoiada pelos organismos do Banco

Mundial, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e da

Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).

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Segundo Baldwin (2013), com o surgimento das cadeias produtivas globais, o caminho

do desenvolvimento para os países passa a ser a integração em tais cadeias, e não mais a

construção de uma base industrial ampla. Ainda, conforme o autor essa estratégia de adesão

às cadeias produtivas globais é mais rápida e segura do que adoção de políticas de

substituição de importações. Contudo, na perspectiva de Wallerstein (1995), o processo de

incorporação dos países nas cadeias de mercadorias globais tende a distribuição geográfica

desproporcional de valor, assim os países periféricos ficam sujeitos a porções menores de

valor por causa da prévia diferença de desenvolvimento mundial. Do contrário, é possível

perceber pelo desempenho econômico de Singapura que é possível o desenvolvimento via

integração pragmática às cadeias globais de valor.

Assim, no direcionamento das políticas públicas dos países em desenvolvimento deve-

se primeiramente identificar quais elos da cadeia detêm maior valor. Veiga e Rios (2014)

relatam que as atividades mais rentáveis da cadeia global de valor estão na inovação, no

desenho e na construção de marcas. Já de acordo com Wallerstein (1995), a obtenção de

maior valor ocorre por meio de vantagem tecnológica ou organizacional concominada com a

monopolização de algum segmento da cadeia de mercadorias, sendo que a inovação cria a

necessidade de constante reorganização das cadeias para manutenção da rentabilidade.

Nesse sentido, na seguinte sessão visamos apresentar as políticas empregadas no processo

de desenvolvimento econômico de Singapura que se deram no sentido de inserção nos elos

de maior valor das cadeias produtivas globais mediante a aplicação dos preceitos de

competitividade empresarial.

3 Estratégias do governo de Singapura para o desenvolvimento econômico (1960-84)

A história de Singapura se vincula a um passado colonial. No século 18, seu espaço

geográfico foi um entreposto de especiarias e de promoção de interesses do Império Britânico.

De acordo com Siddiqui (2016), naquela época o comércio de entreposto correspondia à

maior parte da renda do país. Após o período colonial, a cidade-estado, que até então

pertencia a Malásia, teve que se integrar a um sistema econômico mundial com uma nova

hegemonia norte americana cujos interesses eram a liberalização comercial e financeira.

Segundo Arrighi (1996), Singapura exerce no leste asiático função de entreposto comercial e

industrial semelhante à desempenhada por Gênova ou Veneza em relação a Europa, detendo

a peculiaridade de não ser um Estado-nação e sim uma cidade-estado, o que lhe daria uma

vantagem em termos de eficiência de organização e governo.

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Contudo, não havia na década de 60 para Singapura grandes diferenciais de vantagem

competitiva, a não ser a localização geográfica de seu porto. Assim, quando da independência

do país, houve grandes dúvidas sobre a capacidade real de sobrevivência do Estado. Como

aponta Menon (2015), a ilha não tinha recursos nacionais, tampouco uma indústria ou uma

economia que se sustentasse. Desse modo, o imperativo do direcionamento das políticas

públicas era a sobrevivência pelo crescimento econômico. Na época, o governo de Singapura

não tinha mercado interno, recursos financeiros ou primários suficientes para o

desenvolvimento econômico, sua população detinha uma renda per capita de somente 320

dólares. Assim, conforme Menon (2015), foi traçada uma estratégia de dois pontos focada na

atração de investimento estrangeiro direto e na industrialização orientada para exportações.

A estratégia de industrialização voltada para exportações divergia da praxe das

políticas públicas dos demais países em desenvolvimento, como o Brasil, que na época se

focava na industrialização por meio da substituição de importações. A prioridade em todos os

casos estava na promoção da industrialização, mas perante o investimento estrangeiro

Singapura tinha algumas vantagens decorrentes dessa diferença estratégica de

posicionamento pouco restritiva ao capital estrangeiro. Antes de 1965, a maior parte dos

investimentos em Singapura eram provenientes da Inglaterra e se concentravam no comércio

em virtude do porto. Entretanto, no período de distensão da Guerra Fria, o destino dos

investimentos estrangeiros diretos na Ásia se concentrava mais em Taiwan e na Coreia do

Sul, sendo que a conjuntura favorecia esses países, enquanto Singapura tinha problemas de

infraestrutura para atração do investimento.

Em 1968, segundo Siddiqui (2016), com o intuito de exercer maior atratividade ao fluxo

de capital, o governo de Singapura criou a instituição Jurong Town Corporation (JTC) para

criar espaços de baixo custo para os investidores estrangeiros. Outra medida foi a criação do

Conselho de Desenvolvimento Econômico (EDB), cuja função era atrair investidores e facilitar

a industrialização voltada para a exportação. Alguns autores, como Castells (1999),

consideram que a criação dessas instituições foram elemento crucial ao desenvolvimento

econômico, pois garantiram o estabelecimento de regras e políticas públicas favoráveis ao

ambiente de negócios. O governo de Singapura exerceu grande função na disponibilização

de terras para instalações produtivas aos investidores, subsídio estatal à moradia e saúde,

flexibilidade fiscal, estabilidade política, baixa inflação e leis trabalhistas reformadas, que

permitiam a atuação sem muita restrição das empresas estrangeiras nos setores de

manufatura voltada para exportação.

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Assim, o objetivo do governo de Singapura era de atrair o investimento em indústrias

de manufatura intensiva em mão-de-obra, pois, na década de 60, a taxa de desemprego era

de aproximadamente 9% da população e a força laboral era tecnicamente desqualificada.

Nesse sentido, conforme relato de Siddiqui (2016), o governo restringiu a força dos sindicatos

trabalhistas6 centralizando o controle dos mesmos, mantendo o nível de salário baixo para

atrair investimentos e investindo em educação da população em conformidade com as

vantagens competitivas que setores de mão de obra intensiva tinham para Singapura. A

adoção de tal estratégia obteve efeito. Até a década de 80, a taxa de desemprego sairia de

6% com a inclusão das mulheres na força de trabalho, para 2% em 2016.

Na década de 70, o desenvolvimento da indústria voltada para exportação coincidiu

com a procura de empresas estrangeiras pela redução dos custos de produção, por meio da

descentralização das cadeias produtivas para locais com mão-de-obra de baixa remuneração.

Assim, houve grande entrada de investimento estrangeiro auxiliada tanto pela conjuntura

quanto pela ação governamental e o marketing da EDB. Em 1975, de acordo com Menon

(2015), a economia de Singapura estava em pleno emprego e dispunha de mão-de-obra

qualificada, o desenvolvimento econômico em resultado ao investimento estrangeiro

estabeleceu uma base industrial manufatureira que produzia bens de baixo valor agregado.

No entanto, os recursos humanos eram escassos, sendo estimado pelos analistas de governo

que haveria a falta de mão-de-obra qualificada. Isto somado ao aumento da competitividade

de outros países asiáticos de baixa remuneração de trabalho tornava perceptível que a

vantagem competitiva de Singapura diminuía.

Nesse momento de diminuição da competitividade relacionada aos recursos de

trabalho intensivos e não qualificados é que surge um novo direcionamento da política pública

de desenvolvimento em Singapura voltado às indústrias mais técnicas que exigiam melhor

qualificação. Nesse sentido, Siddiqui (2016), aponta que a estratégia do governo de Singapura

foi de ascender na cadeia global de valor, saindo da posição de uma economia intensiva em

trabalho para uma economia mais intensiva em capital e em atividades laborais mais

qualificadas. Para tanto houve o aumento deliberado de salários com o intuito de afugentar

empresas que procuravam mão de obra não qualificada e barata. Houve também o

direcionamento da EDB em direção às indústrias mais sofisticadas em termos tecnológicos, e

o estabelecimento de centros de treinamento internacionais dos trabalhadores de Singapura.

6 Segundo castells (1999) não houve apenas a centralização, mas sim o desmantelamento dos sindicatos

trabalhistas. A disponibilidade de mão de obra barata sem regulações trabalhistas restritivas, que criava o ambiente

favorável aos negócios.

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No final da década de 70, a restruturação do nível educacional e o estabelecimento de

parcerias da EDB com países desenvolvidos e indústrias de alta tecnologia geraram o avanço

para atividades industriais mais tecnologicamente elevadas. Internacionalmente a segunda

revolução industrial, ocorrida no início da década de 80, seria determinada por alto nível

tecnológico, investimento em pesquisa e inovação. E, conforme Menon (2015), para a

instalação de conglomerados de mais alto valor, o governo de Singapura investiu no

desenvolvimento de pesquisa e também na montagem de um parque industrial de ciência.

Assim sendo, o parque em Singapura, que foi o primeiro estabelecido no Leste Asiático,

ofereceu novamente uma vantagem competitiva para o país na atração de investimentos

externos. Como resultado, em 1981, foi inaugurada a Apple Computer, uma das primeiras

dentre muitas fábricas do vale do silício a se instalar em Singapura.

É perceptível, perante a análise do período de 1960 a 1985, que o governo de

Singapura exerceu papel fundamental na movimentação do país para uma melhor posição na

cadeia global de valor. Nesse sentido, Castells (1999) expõe que o governo foi responsável

pelo aumento do valor agregado dos produtos produzidos em Singapura por meio da criação

de infraestrutura tecnológica e educacional técnica necessária às operações produtivas feitas

por investimento estrangeiro direto. No entanto, em meados da década de 80, Singapura

estava entrando em recessão econômica, em parte devido à adoção pelo governo de uma

política pública de valorização dos salários e também pelo enxugamento da liquidez externa

mundial devido à crise financeira decorrente do segundo choque de petróleo7. Nos países em

desenvolvimento, tanto na Ásia, quanto na América Latina, a crise representou não só o

desequilíbrio nas balanças de pagamentos, como também a dificuldade de pagamento das

dívidas externas.

4. Estratégias do governo de Singapura para o desenvolvimento econômico

(1985-2010)

Na década de 80, Singapura se tornava um importante centro financeiro ao mesmo

tempo que sua economia entrava em recessão, o que conforme Menon (2015), favoreceu

para expor problemas estruturais econômicos não percebidos anteriormente devido ao alto

crescimento. A crescente diminuição das taxas de retorno ao investimento e as restrições na

disponibilidade de recursos ao investimento dificultavam a situação de dependência ao fluxo

de investimentos externo. O mercado interno era pequeno, não havia empreendedorismo ou

7 O segundo choque petróleo ocorre em 1979 em decorrência da crise política do Irã, e eleva os preços do petróleo

e o nível geral de preços mundial.

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competição em relação às grandes empresas estrangeiras que atuavam no mercado. Ao

mesmo tempo, as políticas de valorização salarial diminuíam a vantagem competitiva de

Singapura quanto aos custos de produção, o que poderia acarretar a fuga de investimento

para outras regiões do leste asiático. Todos esses fatores criavam a necessidade de revisão

das estratégias do governo de Singapura perante o seu desenvolvimento e inserção na cadeia

global de valor.

No patamar global, com o fim da Guerra Fria, o discurso liberal ganhava força

sobretudo mediante a percepção de insucesso do desenvolvimento econômico da América

Latina e da falência da industrialização via substituição de importações. Segundo Siddiqui

(2015), a estagnação econômica parecia minar a possibilidade de um projeto de

desenvolvimento nacional, enquanto os defensores do livre-mercado ressaltavam o

crescimento econômico do Leste Asiático voltado para a exportação e alinhado à iniciativa

privada. Contudo, ainda conforme Siddiqui (idem), e com base na análise da trajetória do

desenvolvimento de Singapura, é possível afirmar que ao contrário do que prega o liberalismo,

a intervenção estatal foi essencial para dar direcionamento a essa economia. Destarte, em

face à recessão, o governo de Singapura teve novamente importante papel no

redirecionamento da economia.

Nesse sentido, o governo de Singapura continuou subsidiando a qualidade da

infraestrutura e da mão de obra técnica de modo a incentivar determinadas indústrias que

considerava estratégicas. Em 1985, o governo começou uma nova política de

desenvolvimento voltada para Integração Econômica Regional, que segundo Siddiqui (2015),

visava o desenvolvimento de indústrias especializadas e o aumento da produtividade. O

objetivo era aumentar as relações econômicas com os vizinhos regionais por meio de

investimento, de modo a promover Singapura enquanto um hub de investimento regional e

conhecimento técnico.

A implementação da política de atração de investimento também coincidiu com a

necessidade de corte de custos no sistema produtivo capitalista. De modo que, o investimento

foi de suma importância para o desenvolvimento econômico do país entre 1980 e 2010, com

variação entre 5 a 25% do PIB, conforme figura 01 a seguir, o que demonstra que o

investimento estrangeiro em Singapura foi muito maior do que no restante do Leste Asiático.

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Figura 01 –Fluxo do Investimento Estrangeiro Direto em Singapura (% do PIB). Fonte: Banco Mundial,

2016.

Na década de 90, as estratégias de Singapura de atração de investimento direcionado

demonstravam resultado, o país produzia produtos de alto valor e começava a se destacar no

setor de serviços financeiros. A diversificação da estrutura produtiva e a especialização da

mão de obra fez com que a cidade-estado subisse aos espaços mais altos da cadeia global

de valor, tornando-a um centro de recebimento das sedes de empresas multinacionais no

Leste Asiático. A aposta no sistema educacional fornecia vantagens com o advento de uma

economia internacional, na qual o conhecimento e inovação são primordiais. Enquanto o país

se concentrava na obtenção e retenção de indústrias de produtos de maior valor agregado,

também investia na região asiática por intermédio da Associação de Nações do Sudeste

Asiático (ASEAN).

Aos poucos Singapura foi transferindo aos seus vizinhos as indústrias de manufatura

e os empregos de baixa remuneração, enquanto se concentrava em setores de maior

lucratividade. Na verdade, tal ação acompanhava o fluxo internacional de capital que naquela

época se direcionavam a países como China e Malásia, que detinham menor custo de

produção e possibilidade de maior lucratividade. Segundo Castells (1999), embora as linhas

de produção que exigiam um nível médio de mão de obra passaram a ser transferidas para

lugares com custos de produção mais baixos, o governo promoveu um esforço no sentido de

garantir que as contribuições dessas indústrias não fossem menores do que 25% do PIB. O

mesmo autor ainda ressalta que a prioridade de Singapura era manter a indústria de alto valor,

e que, em 1997, a renda per capita de Singapura era maior do que a britânica.

É notável, em face ao exposto até então, que a integração pragmática do país às

cadeias de valor global decorria e ainda decorre de políticas de desenvolvimento de caráter

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flexível e dinâmico. Contudo, com o advento da crise asiática de 1998, houve alterações nas

políticas econômicas conforme reformas sugeridas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI),

que visavam maior transparência no balanço de pagamentos de modo a promover a confiança

dos credores. De acordo com Castells (1999), a crise asiática foi decorrente em parte da

desvalorização das moedas da região, o que dificultou o pagamento das dívidas de curto

prazo pelos Bancos Centrais junto aos credores estrangeiros. Era necessário reconstruir a

confiança dos investidores.

Em face da não credibilidade de sua moeda, o governo de Singapura elevou as taxas

de juros o que diminuiu as fontes de capital e desacelerou o crescimento levando o país a

recessão, embora em menor nível do que o restante do Leste Asiático. Em congruência com

os ideais neoliberais vigentes no âmbito internacional, o governo também efetuou medidas de

desregulação do setor financeiro, bancário e de seguros, abrindo-os para competição e

expondo as empresas nacionais às pressões competitivas internacionais. A crise provocou

menor crescimento econômico e um aumento no nível de desemprego em Singapura, no

entanto, já em 2004, a recessão dava sinais de ter sido superada com o aumento dos fluxos

de investimento estrangeiro conforme visto na figura 01, e com o crescimento do Produto

Interno Bruto, conforme figura 02 abaixo.

Figura 02 – PIB de Singapura (USD). Fonte: Trading Economics, 2016.

Ainda em relação a figura 02, percebe-se que o PIB de Singapura aumentou

exponencialmente de 1960 a 2013, havendo um curto declínio em 2008 devido à crise

financeira global, que reduziu o crescimento da economia do país. No entanto, de acordo com

Siddiqui (2016), o governo parecia estar se alinhando ao neoliberalismo e se afastando de

uma orientação de mercado. Uma prova disso para o autor, é a privatização do Banco de

Desenvolvimento da Cingapura (DBS). No sentido oposto, o presente artigo considera que,

apesar dos movimentos de privatização, o governo de Singapura ainda mantém políticas

públicas voltadas para o desenvolvimento por meio de fortes instituições como a EDB, dentre

outras. Em 2006, os investimentos governamentais direcionados se focam mais na promoção

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de inovação por meio de pesquisa e desenvolvimento, como também na preservação da

propriedade intelectual.

O fato é que a economia de Singapura não é autônoma e sim dependente do capital

estrangeiro, o que a torna suscetível às crises internacionais. A crise de 2008, por exemplo,

gerou desemprego no país em decorrência da diminuição do consumo estrangeiro em relação

aos produtos exportados por Singapura. Contudo, podemos perceber que em 2010, o último

ponto dessa trajetória histórica de desenvolvimento, apesar das recorrentes crises, a

economia de Singapura cresceu de forma pragmática se inserindo nas cadeias globais de

valor. Desse modo, superando os entraves das crises econômicas com políticas públicas de

governo bem direcionadas.

5. Análise do desenvolvimento de Singapura e seus reflexos na atualidade

Antes de sua independência, Singapura era um país com alto nível de pobreza, alto

desemprego, conflitos étnicos, economicamente subdesenvolvido e com poucas chances de

sobrevivência. Não obstante, após uma trajetória de desenvolvimento econômico de cinco

décadas guiada por políticas estatais pragmáticas, a cidade-estado conseguiu integrar de

modo competitivo sua economia às cadeias globais de valor. Segundo dados do Banco

Mundial, o país é atualmente um grande centro financeiro e comercial, figurando como porta

de entrada, tanto para os mercados asiáticos quanto para o mercado global. No presente

artigo se argumenta que o sucesso do desenvolvimento de Singapura dependeu em grande

parte das políticas de atração de investimento estrangeiro e das instituições criadas para

favorecer o ambiente de negócios.

O foco em atração de investimento externo resultou no alcance da primeira posição do

país na lista do site doing business, que examina indicadores relativos ao ambiente de

negócios determinando quais países são mais favoráveis ao desenvolvimento de negócios.

De acordo com Siddiqui (2016), a atitude pró investimento externo facilitou subsídios à criação

de infraestrutura em determinados setores, que foi efetuada de forma conjunta pelo capital

estrangeiro e pelo governo de Singapura. Ademais, a seleção dos setores nos quais havia

interesse do país era determinada pelo governo, mediante o oferecimento de isenção de

impostos e outros benefícios como disponibilização de terras. Assim, ainda conforme Siddiqui

(idem), tais ações intervencionistas visando a industrialização via capital externo foram

possíveis em Singapura, pois a classe capitalista interna era fraca e a classe trabalhadora

permanecia submetida ao governo autoritário.

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Assim sendo, Singapura se beneficiou da ausência de uma classe dominante forte

para instalação do estado desenvolvimentista que livremente investia em educação e

capacidade inovativa. O planejamento do treinamento da força de trabalho em Singapura se

vinculava aos objetivos da política de desenvolvimento em determinados setores de maior

valor dentro da cadeia produtiva global. Contudo, treinamento e inovação não são os únicos

fatores que beneficiaram o sucesso do desenvolvimento econômico daquele país. Outros

fatores de contribuição incluem a estabilidade política, o tamanho da cidade-estado, a posição

geográfica estratégica e a disponibilização de infraestrutura. De acordo com dados do Banco

Mundial e da OECD, a economia do país é hoje qualificada como a primeira mais favorável a

negócios e a segunda mais competitiva do mundo, tendo figurado nos últimos anos

constantemente nessa posição. Em 2015, com um PIB de 292.73 bilhões de dólares e um PIB

per capita em torno de 55.150 dólares, a inserção pragmática na economia capitalista permitiu

a redução da pobreza na cidade-estado e a colocou dentre o ranking de países desenvolvidos.

Ademais, em 2014, Singapura exportou 272 bilhões de dólares, tornando-se um dos

maiores exportadores do mundo. Conforme dados da Trading Economics (2016), a maior

parte das exportações se constituiu de petrolíferos refinados, que corresponderam a 22,7%

do total de produtos exportados, e de circuitos integrados que corresponderam a 19%. Já

em relação à importação, Singapura importou 352 bilhões de dólares, cujos principais

produtos foram também petrolíferos refinados e circuitos integrados. Nesse sentido, vale

mencionar a perspectiva de Sibbiqui (2016), de que a globalização e a crescente integração

econômica alteram o papel dos Estados no desenvolvimento de políticas econômicas.

Sendo que, para o autor, a integração presume certa perda de soberania que prejudica a

autonomia das políticas nacionais. Porém, o fato é que mesmo com um alto nível de

integração regional, Singapura tem permanecido como um estado intervencionista, que não

hesita na criação de estratégias para expandir sua capacidade tecnológica e de atração de

investimentos estrangeiros, sendo o país um centro de referência regional para finanças,

logística e comércio.

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6. CONCLUSÃO

Frente ao exposto foi possível observar que a fragmentação da cadeia produtiva em

diversos locais do mundo não só gera ganhos de maximização de lucros para empresas

multinacionais, como também pode gerar o crescimento econômico nos países a exemplo de

Singapura. Embora o desenvolvimento não seja para todos, ainda em conformidade com

Wallerstein (1995), a maior parte dos países foi beneficiado em termos das medidas absolutas

de melhoria de bem-estar, ou seja, apesar da concentração do capital houve ganhos para

grande parte da população global. No entanto, os processos que envolvem a crescente

interdependência das economias capitalistas mundiais criaram a necessidade de

reorganização constante das cadeias produtivas.

Considerando a perspectiva de que para gerar melhores níveis de desenvolvimento, a

integração dos países às cadeias produtivas globais deve levar em conta a competitividade

setorial e o valor que é adicionado em cada elo do processo, foi possível identificar, pela

análise da trajetória histórica do desenvolvimento econômico de Singapura, a importância da

inovação e do papel das políticas estatais e do Estado como guias do desenvolvimento

econômico frente à dinâmica de globalização das cadeias produtivas. Identificou-se que a

cidade-estado traçou políticas públicas de construção de capacidades semelhantes ao

processo empresarial de upgrading visando captar setores de maior valor agregado na cadeia

global.

Restou observado que o emprego das políticas do governo foram hábeis a transformar

Singapura de um país periférico, com alto nível de pobreza e desemprego, em um centro

global de comércio, logística e finanças com baixos níveis de desemprego. Hodiernamente,

Singapura é um país desenvolvido com um dos maiores PIB per capita do mundo, um ‘case’

de sucesso do emprego de medidas de governo intervencionistas para guiar o

desenvolvimento econômico de um país. Passando de políticas públicas de atração de

investimento direto estrangeiro até a montagem de cadeias globais de valor regionais no leste

asiático, Singapura cresceu rapidamente e se tornou uma das economias mais competitivas

do mundo. Vale ressaltar que o direcionamento e apoio dado a educação, pesquisa e inovação

é um dos grandes fatores de sucesso do desenvolvimento econômico, mas não o único.

Em conclusão ao relato, pôde-se perceber ao longo do artigo que a estratégia para o

desenvolvimento econômico de Singapura se focou principalmente na atração de

investimento estrangeiro externo por meio da construção de um ambiente favorável aos

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negócios com baixa burocracia, incentivos fiscais e instituições confiáveis como EDB. A

construção de um ambiente adequado com estabilidade política e adaptado as necessidades

da economia capitalista global foi crucial para o crescimento das empresas multinacionais na

região. Contudo, a economia de Singapura se tornou altamente dependente do investimento

estrangeiro, e embora a maior parte das empresas escolham a cidade-estado como base de

suas operações na Ásia, a dependência a torna mais suscetível às crises financeiras globais.

Nesse sentido, o governo de Singapura promoveu ao longo do seu desenvolvimento

econômico medidas para diversificação de investimento em setores de serviço e de maior

valor agregado, promovendo, desde 90, fontes regionais alternativas de competitividade.

REFERÊNCIAS

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