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78ª Promotoria de Justiça de Goiânia – Defesa do Patrimônio Público______________________________________________________________
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA DA
FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO.
URGENTE
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, pela
Promotora de Justiça que a presente subscreve, com fundamento nos artigos 37,
caput e § 4º, e 129, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil, nas
Leis nº 7.347/85 e 8.625/93, vem ajuizar a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA declaratória de NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO c/c
DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE c/c pedido de
TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA
em desfavor de:
1. ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público
interno, representada pelo Procurador-Geral Alexandre
Eduardo Felipe Tocantins, domiciliado na Praça Dr. Pedro
Ludovico Teixeira, n.º 03, Centro, Goiânia/GO, CEP
74003-010;
pelas razões de fato e direito a seguir expostas:
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78ª Promotoria de Justiça de Goiânia – Defesa do Patrimônio Público______________________________________________________________
I – DOS FATOS:
O Ministério Público do Estado de Goiás instaurou o
Inquérito Civil Público nº 032/2017 para apurar a articulação ilegal do ESTADO DE
GOIÁS em utilizar-se maliciosamente do processo legislativo para descumprir
decisão judicial e prejudicar a combalida carreira do cargo público de agente de
segurança prisional.
Em dezembro/2015 o Ministério Público ajuizou em face
do ESTADO DE GOIÁS e da Fundação Universa a Ação Civil Pública c/c Pedido
Liminar nº 391327-46.2015.8.09.0051, em face do Estado de Goiás e da Fundação
Universa, por irregularidades no Edital nº 001/2014, publicado pela SEGPLAN –
Secretaria Estadual de Gestão e Planejamento, destinado a realização de concurso
público para provimento de 305 (trezentas e cinco) vagas e formação de cadastro de
reserva para o cargo de Agente de Segurança Prisional.
A referida ação civil pública questiona a ilegalidade do
subitem 1.3.1 “e” do Edital 001/2014, o qual estabeleceu como critério de avaliação
dos candidatos o exame psicotécnico, mesmo não havendo lei dispondo que o
provimento do cargo de agente prisional será submetido a tal exame, o que vai de
encontro ao disposto na Súmula Vinculante nº 44 que estabelece que “só por lei se
pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo
público”.
Também se questiona a ilegalidade do subitem 16.16 do
edital, que limitou o número de candidatos habilitados ao curso de formação em
apenas 461 (quatrocentos e sessenta e um), medida absolutamente desarrazoada,
vez que o Estado de Goiás possuía na data da propositura da ação 1.625 (mil
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seiscentos e vinte e cinco) contratos de vigilantes penitenciários temporários
em vigência.
O Juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual de
Goiânia deferiu integralmente o pedido liminar nos seguintes termos:
Diante do exposto, DEFIRO a liminar pleiteada, determinando:
— a suspensão da cláusula de barreira estabelecida nosubitem 16.6 do Edital n° 001/2014, permitindo que todos oscandidatos classificados nas fases anteriores façam o curso deformação, até o limite de 1.930 (mil novecentos e trinta) vagas;
— a suspensão da quinta fase da primeira etapa do concursoregido pelo Edital n 001/2014, consistente na avaliaçãopsicológica e na análise da vida pregressa dos candidatos,permitindo que todos os candidatos que tiverem sidoreprovados nesta fase façam o curso de formação;
— a suspensão o início do curso de formação consistente nasegunda etapa do concurso 001/2014, por, no mínimo, 15(quinze) dias, período necessário para análise dos documentosreferentes ao teste psicotécnico e da vida pregressa doscandidatos, ou seja, que o início do curso ocorra após ou nodia 18/11/2015, com a requisição da Comissão Organizadorado Concurso de cópia dos testes psicotécnicos e da vidapregressa dos candidatos reprovados nessas etapas, contendoas justificativas das reprovações, a qual deverá sr apresentadano prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa diária de R$50.000,00 (cinquenta mil reais);
— a comprovação de que o Estado de Goiás necessita de1.930 (mil novecentos e trinta) vagas no cargo de AgentePrisional, para que o número de vagas do Edital n° 001/2014seja ampliado para este quantitativo ou, caso inferior, para onúmero correspondente ao de candidatos aprovados, no prazode 15 (quinze ) dias, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00(cinquenta mil reais).
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Em grau de recurso, nos autos do Agravo de
Instrumento nº 3272-20.2016.8.09.0000, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
confirmou à unanimidade a decisão liminar concedida pela Juíza da 1ª Vara da
Fazenda Pública Estadual de Goiás, cujo Acórdão foi assim ementado:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVILPÚBLICA. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE DESEGURANÇA PRISIONAL. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA.IRREGULARIDADES NO PROCESSO SELETIVO PARACONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. CLÁUSULA DE BARREIRA.AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NALEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTA A CARREIRA. 1 – Oagravo de instrumento é um recurso secundum eventum litis,ou seja, por meio do qual se aprecia o acerto ou desacerto dadecisão agravada, sendo vedada a análise, por esta instânciaderivada, de matéria que não tenha sido apreciada pelojulgador singular, sob pena de supressão de um grau dejurisdição. 2 – Diante da presença dos requisitos necessários,revela-se correto o deferimento do pedido de antecipação dosefeitos da tutela na presente ação civil pública, no sentido desuspender a cláusula de barreira prevista no concurso para ocargo efetivo de Agente Prisional – Edital 001/2014, haja vistaas supostas irregularidades no processo seletivo paracontratação temporária – Edital 002/2015 (SIMVE) –. 3 – Alegalidade do exame psicotécnico pressupõe a observância dealguns pressupostos: previsão legal e editalícia, emprego decritérios objetivos e decisão fundamentada, contra a qual ocandidato possa interpor recurso, o que não se verifica nahipótese. 4 – In casu, restando demonstrado que a magistradaa quo sopesou corretamente os pressupostos autorizadorespara a concessão da tutela, utilizando-se do seu livreconvencimento motivado, não merecendo reforma a decisãoobjurgada, eis que revestida de legalidade. AGRAVOCONHECIDO E DESPROVIDO.
Posteriormente, no dia 22.02.2017, o Juízo da 1ª Vara
Pública Estadual de Goiânia julgou procedente a mencionada ação civil pública, cujo
dispositivo da sentença foi assim redigido:
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“Pelo exposto, e por tudo mais que consta dos autos, JULGOPROCEDENTE os pedidos verberados na inicial, para declarara nulidade do subitem 16.16 do Edital nº 001/2014, estereferente a cláusula de barreira, bem como do subitem 1.3.1quanto à avaliação psicológica, permitindo que todos oscandidatos aprovados nas fases anteriores e consideradosdentro do número de vagas até o limite de 1.930 (milnovecentos e trinta) sejam aptos ao cadastro de reserva,conformando os termos da liminar concedida no evento nº 03,item nº 23”.
Todavia, após o TJGO confirmar a medida liminar
concedida pelo Juízo de primeiro grau, precisamente no dia 18.11.2016, o ESTADO
DE GOIÁS sancionou a Lei nº 19.502/2016, que criou a Classe Inicial nas carreiras
de Assistente de Gestão Prisional e de Agente de Segurança Prisional, integrantes
do Grupo Ocupacional Assistente Prisional, da Secretaria de Estado de Segurança
Pública e Administração Penitenciária.
Com a criação da referida lei, o ESTADO DE GOIÁS
reduziu a remuneração dos agentes de segurança prisional que ingressam na
carreira de R$ 3.450,90 para apenas R$ 1.500,00, com o objetivo único e distorcido
de tornar o cargo pouco atrativo, reduzindo ao máximo o número de nomeações e
posse dos candidatos aprovados no concurso público.
Na sequência, a Superintendência Central de
Administração de Pessoal da Secretaria Estadual de Gestão e Planejamento
expediu o Memorando nº 547/2017-SCAP, informando que por orientação da PGE
as modificações legislativas da Lei 19.502/2016 aplicam-se ao certame 001/2014.
Eis o teor do mencionado memorando:
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Posteriormente, na data de 12.04.2017 o Estado de Goiás
publicou no Diário Oficial nº 22.548 a nomeação de 425 (quatrocentos e vinte e
cinco) candidatos aprovados no concurso público para provimento de cargos de
agente de segurança prisional, cujo quantitativo corresponde apenas ao número de
vagas e de cadastro de reserva previstos no edital.
Chama a atenção no caso o fato do Edital do concurso
público nº 001/2014 consagrar o salário de agente prisional 2.847,23 (dois mil
oitocentos e quarenta e sete reais e vinte e três centavos), ou seja, os candidatos
prestaram concurso sob a égide da Lei nº 18.300/2013 que estabelecia que o
ingresso na carreira se dava na 3ª Classe, no entanto, sorrateiramente e no intento
de prejudicar os candidatos aprovados, optou por aplicar a Lei nº 19.502/2016 a um
concurso que foi realizado e concluído sob os ditames da Lei nº 18.300/2013.
Diante da clara constatação de que a criação da Classe
Inicial nas mencionadas carreiras, sobretudo de agente prisional, está eivada de
irregularidade, ilegalidade e inconstitucionalidade, por ser uma forma articulosa
de o ESTADO DE GOIÁS descumprir, obliquamente, a mencionada decisão
proferida pela 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia, é que o Ministério
Público se socorre ao Poder Judiciário.
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II – DO DIREITO:
II.1 – DA INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI ESTADUAL N.º 19.502, DE 18 DE
NOVEMBRO DE 2016
Como é cediço, o controle de constitucionalidade é o
instrumento de verificação, fiscalização e monitoramento das normas
infraconstitucionais para que estas não venham a ingressar no mundo jurídico
afrontando qualquer disposição contida na Magna Carta.
Neste desiderato, existe o controle de constitucionalidade
difuso e o abstrato, de tal sorte que naquele é permitido a qualquer componente do
Poder Judiciário declarar a inconstitucionalidade de uma norma no caso concreto,
deixando de aplicá-la; neste, por seu turno, só é permitido agir entes legitimados
para tal mister, com rol previsto na Constituição Federal (art. 103) e Constituição
Estadual (art. 60).
Nesta esteira, discorrem os doutrinadores Vicente Paulo e
Marcelo Alexandrino, in litteris:
(...) Por outras palavras, na discussão de uma relação jurídicaqualquer, submetida à apreciação do Poder Judiciário, suscita-se a dúvida sobre a constitucionalidade de um ato normativorelacionado com a lide. Surge, então, a necessidade de oPoder Judiciário apreciar a constitucionalidade de tal atonormativo para proferir a sua decisão no processo. Ao apreciara questão constitucional, como antecedente necessário eindispensável ao julgamento do mérito do caso em exame, ojuiz u tribunal estará realizando o denominado controle difuso.1
1 Direito Constitucional descomplicado / Vicente Paulo, Marcelo Alexandrino. – 11. ed. – Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: MÉTODO: 2013. Pág. 803.
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Desta forma, perfeitamente possível o presente incidente
de inconstitucionalidade da Lei Estadual n.º 19.502/16, para que seja declarada sua
inconstitucionalidade.
O presente incidente de inconstitucionalidade tem como
principal fundamento a manifesta ilegalidade contida nas determinações do texto da
Lei Estadual nº 19.502/2016, que ao criar a graduação de Classe Inicial nas
carreiras de Assistente de Gestão Prisional e de Agente de Segurança Prisional,
integrantes do Grupo Ocupacional Assistente Prisional, impõe indevido desvio de
finalidade da norma, e ainda por ferir:
a) os princípios constitucionais da razoabilidade, da
proporcionalidade e da motivação;
b) o princípio da isonomia, uma vez que cria cargos na
carreira da Agente de Segurança Prisional, sem identificar
sua função específica, o que levaria a situação de
servidores desenvolvendo a mesma função, mas com
remuneração distinta, sendo uma muita aquém da outra;
c) os critérios de remuneração estabelecidos no artigo 39,
§ 1º, incisos I, II e III, da Constituição Federal.
Outrossim, não há dúvidas de que a promulgação da
referida Lei nº 19.502/2016 foi uma reação legislativa ilegal e inconstitucional, eis
que é uma forma de descumprir de forma oblíqua a decisão proferida pela 1ª Vara
da Fazenda Pública Estadual de Goiânia.
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II.2 – DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS:
De acordo com o artigo 92, caput, da Constituição do
Estado de Goiás:
Art. 92. A administração pública direta e indireta de qualquerdos Poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aosprincípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,publicidade, eficiência, razoabilidade, proporcionalidade emotivação e, também, ao seguinte: (...)
Apesar da menção expressa aos princípios que devem
guiar a atuação administrativa, certo é que a instituição da graduação de Agente de
Segurança Prisional de Classe Inicial viola os princípios constitucionais da
proporcionalidade, da razoabilidade e da isonomia eis que há grande disparidade
entre o valor pago como subsídio para os ocupantes deste cargo e o valor pago ao
agente da Classe Inicial.
Nos termos do artigo 39, § 1º, da Constituição Federal:
Art. 39 - (…)§ 1º - a fixação dos padrões de vencimento e dos demaiscomponentes do sistema remuneratório observará:I - a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidadedos cargos componentes de cada carreira;II - os requisitos para a investidura;III - as peculiaridades dos cargos.
Ora, todos os integrantes do cargo de Agente de
Segurança Prisional, seja de Classe Inicial, ou de 3ª, 2ª ou 1ª classe, possuem as
mesmas atribuições. Ademais, os requisitos para a investidura e as peculiaridades
dos cargos são as mesmas. Dessa forma, não deveria haver discrepância
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significativa entre os valores pagos como subsídios aos integrantes de cada
graduação, mas apenas uma pequena diferença salarial com fim de “motivar” a
evolução na carreira.
Por exemplo, de acordo com a Lei nº 19.502/2016, os
subsídios pagos aos cargos de Agente de Segurança Prisional de 3ª Classe e de 2ª
Classe são, respectivamente, nos valores de R$ 3.450,00 e R$ 4.789,26. Por sua
vez, o subsídio pago ao Agente de Classe Inicial é de R$ 1.500,00. Há aqui grande
disparidade nos subsídios, em violação aos princípios da proporcionalidade e da
isonomia.
Dessa forma, não há razoabilidade na fixação de tão
baixo subsídio para a graduação de Agente de Segurança Prisional de Classe Inicial,
tão díspar ao montante pago ao agente de 3ª Classe e em desacordo com os
percentuais das demais remunerações.
Outro princípio violado pelo ESTADO DE GOIÁS ao
promulgar a Lei nº 19.502/2016 é o da motivação, eis que não esclareceu as razões
que o levaram a propor o projeto de lei que a ela deu origem.
Ora, a criação da graduação Classe Inicial e o valor do
subsídio a ele fixado vai de encontro com a vedação ao retrocesso social,
prejudicando, na realidade, os interesses da categoria.
É público e notório que frequentemente é motivo de
discussão na sociedade os baixos valores pagos aos servidores da segurança
pública a título de subsídio. São servidores que arriscam suas vidas diariamente, em
prol da segurança pública e da coletividade, laborando 40 (quarenta) horas
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semanais em regime integral, e recebem subsídios que não correspondem à
complexidade, seriedade e insegurança características do cargo.
Assim, há muito a categoria pleiteia um salário condizente
às suas funções.
A criação de uma nova classe na Carreira dos Agentes de
Segurança Prisional, com subsídio de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), vai na
contramão do interesse social e da luta da classe, mitigando a importância dos
componentes desta na árdua luta contra a criminalidade, significando, assim, um
retrocesso.
Logo, vislumbra-se com clareza a manobra do ESTADO
DE GOIÁS com a substituição de servidores de uma classe, por outra pior
remunerada, em flagrante afronta ao princípio da irredutibilidade de subsídio,
que abrange não somente os servidores já na ativa, mas também tem como
natureza a proteção aos que ingressarão na carreira pública, vedando a utilização
de mecanismos como este para reduzir o subsídio dos servidores, afrontando
também o princípio da eficiência.
Sobre a violação aos princípios que devem reger todas as
atividades administrativas, discorre Bonavides:
As regras vigem, os princípios valem; o valor que neles seinsere se exprime em graus distintos. Os princípios, enquantovalores fundamentais, governam a Constituição, o regímen, aordem jurídica. Não são apenas a lei, mas o Direito em todaa sua extensão, substancialidade, plenitude e abrangência.(BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed.São Paulo: Malheiros, 1999, p. 260.)
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Para Celso Antônio Bandeira de Melo:
Violar um princípio é muito mais grave que transgrediruma norma qualquer . A desatenção ao princípio implicaofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório,mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma deilegalidade ou de inconstitucionalidade , conforme o escalãodo princípio atingido, porque representa insurgência contratodo o sistema, subversão de seus valores fundamentais,contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão desua estrutura mestra. Isso porque, com ofendê-lo, abatem-seas vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelasesforçada.(MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de DireitoAdministrativo. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 451.)
Segundo Emerson Garcia2, “concebidos os princípios
como espécies das normas jurídicas, a análise da deontologia dos agentes públicos
pressupõe, necessariamente, que todos os seus atos sejam valorados em
conformidade com as regras e os princípios que os informam”.
Ainda segundo Garcia, a moral administrativa é extraída
do próprio ambiente institucional e condiciona a utilização dos meios previstos em lei
para o cumprimento das funções estatais e a realização do bem comum. A moral
administrativa pauta a conduta dos agentes públicos, no âmbito institucional, a partir
da ideia de boa administração, conforme os princípios regentes da atividade estatal.
2 GARCIA, Emerson. ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 5. ed. Rio de Janeiro: LumenJuris, 2010.
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Por tudo o que foi exposto, verifica-se que, por franca
violação aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, da isonomia e da
motivação, a graduação de Classe Inicial do cargo de Agente de Segurança Pública
é inconstitucional e sua manutenção causará grandes prejuízos à segurança
pública e ao interesse da sociedade.
II.3 – DO DESVIO DE FINALIDADE DA LEI nº 19.502/2016:
Os integrantes da carreira de agente de segurança
prisional, ao lado da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar, exercem um
mister fundamental para garantia da segurança pública e da paz social, prezando
sempre pela boa e fiel aplicação da Lei penal ao caso concreto, visando sempre
reprimir o infrator e dar segurança ao sujeito de bem, trabalhador.
Assim, a criação desta nova graduação de agente de
segurança prisional com a previsão de subsídio no montante de R$ 1.500,00 (mil e
quinhentos) reais não guardam qualquer proporcionalidade com a natureza do
cargo.
O regime jurídico dos servidores públicos até pode ser
alterado, desde que preservado o valor global da sua remuneração, o que significa
dizer que não cabe ao administrador público simplesmente elaborar uma Lei com o
fim específico de diminuir o quantitativo de um determinado cargo com remuneração
já prevista, para a incorporação em outro cargo, criado para exercer as mesmas
atribuições funcionais, percebendo subsídio ínfimo.
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O que deixa claro e evidente a desvirtuação da Lei e, via
de consequência, a infração ao valor global da remuneração do servidor, lesionando
frontalmente os preceitos da Constituição Estadual, é o fato de não ser
incrementado um único servidor para a administração pública, sendo tão somente
um remanejamento de vagas para um cargo de subsídio vergonhoso e
desproporcional.
Ressalta-se, conforme já mencionado acima, a malfada
Lei Estadual, não acrescenta um único novo cargo ao efetivo dos agentes de
segurança prisional, se limitando, tão somente, a um manejo legislativo, com o
único objetivo de diminuir a remuneração dos servidores daquela carreira e, assim,
reduzir os gastos do Governo do Estado de Goiás com a Segurança Pública.
A questão é que a Lei nº 19.502/2016 somente foi
promulgada após o Poder Judiciário, nos autos da Ação Civil Pública nº 391327-
46.2015.8.09.0051, conceder liminar suspendendo cláusulas ilegais do edital do
concurso público que estava sendo realizado para provimento de cargos de agente
de segurança prisional, permitindo acréscimo no número de vagas no cadastro de
reserva para mais de 1.900 vagas, enquanto o Edital previa apenas o número de
305 vagas.
A liminar foi confirmada a unanimidade pelo TJGO e,
posteriormente, pelo juízo singular no julgamento do mérito da ação que julgou
procedente os pedidos.
Vendo que não conseguiria reverter o aumento do número
de vagas no mencionado concurso público no Poder Judiciário, o Estado de Goiás
resolveu, com claro desvio de finalidade, editar a objurgada Lei nº 19.502/16,
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tornando o cargo altamente desinteressante devido a baixa remuneração,
consequentemente, reduzindo o número de candidatos interessados em tomar
posse.
Toda essa “aventura” do Estado de Goiás tem por único
objetivo permitir/justificar as contratações temporárias de vigilantes penitenciários,
que atualmente são mais de 1.600, pois, se não tem servidores concursados
interessados em tomar posse, a única saída é a contratação temporária.
O Estado de Goiás abusou no uso do processo legislativo
para justificar um ato absurdo, flagrantemente inconstitucional.
II.4 – VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. IRREDUTIBILIDADE
DE SUBSÍDIOS
O Edital nº 001/2014 regulamenta o concurso público para
ingresso na carreira de agente de segurança prisional, que se dava na 3ª Classe.
O item 2.1.3 do Edital 001/2014 estabelece o valor da
remuneração para o cargo de agente de segurança prisional. Confira-se:
No entanto, com a entrada em vigor da Lei nº
19.502/2016, o Governador do Estado publicou o Decreto de 11 de abril de 2017
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convocando os candidatos aprovados no concurso público para tomarem posse não
na 3ª Classe do cargo de agente prisional como previa o Edital, mas sim na recém-
criada Classe Inicial. Veja-se o teor do referido decreto:
Observa-se que a administração pública publicou Edital
para provimento de vagas na 3ª classe do cargo de agente de segurança prisional,
não podendo alterar as regras somente no momento de nomear os aprovados, como
foi feito.
Ressalta-se que o Estado de Goiás, para atingir o
desiderato de em reduzir o número de nomeações dos candidatos aprovados,
retardou a homologação do resultado do concurso e consequentemente nomeação
dos aprovados, para que fosse dado tempo em aprovar a Lei 19.502/2016.
A nova lei serviu para burlar os princípios constitucionais
que regem o concurso público, nomeando candidatos aprovados dentro do número
de vagas ofertadas no edital, não na TERCEIRA CLASSE como previsto na Lei
18.300/2013, mas na CLASSE INICIAL prevista na recém-aprovada Lei nº
19.502/2016.
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Por tudo isso, não há dúvidas que o Estado de Goiás agiu
com extrema má-fé, modificando regras anteriormente impostas, prejudicando
direitos de candidatos aprovados em concurso público, com abuso do processo
legislativo.
III – DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA
Para concretização da providência jurisdicional pedida,
afigura-se imperiosa a concessão de tutela provisória de urgência consistente na
suspensão da Lei Estadual nº 19.502/2016, que cria a Classe Inicial da carreira
de agente de segurança prisional, com base no que dispõem os artigos 294,
caput, 297, 300 e 301todos do Código de Processo Civil.
Nos termos dos artigos 300, caput, e 301, do CPC:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houverelementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigode dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode serefetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens,registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outramedida idônea para asseguração do direito.
Pois bem. O Edital 001/2014, que regulamenta o concurso
público para provimento de cargos no quadro de agente de segurança prisional não
previa a classe inicial da carreira, o que só foi previsto no ano de 2016, com a edição
da Lei nº 19.502/2016, quando ainda não havia sido nomeado nenhum candidato
aprovado no certame.
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Após o juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual
prolatar a sentença procedente nos autos da ação civil pública nº 391327-
46.2015.8.09.0051, o Estado de Goiás passou a nomear os candidatos aprovados,
já sob a égide da Lei nº 19.502/2016, ou seja, com remuneração de apenas R$
1.500,00 (mil e quinhentos reais).
Por mais de dois anos, os candidatos que se inscreveram
no referido concurso público acreditaram que receberiam salário de R$ 3.450,00
(três mil quatrocentos e cinquenta reais), porém, após terem sido submetidos a
todas as avaliações, o Estado de Goiás mudou as regras do jogo, reduzindo a
remuneração para apenas R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais).
A probabilidade do direito repousa nos graves indícios
de desvio de finalidade da Lei nº 19.502/2016, bem como de violação dos princípios
da legalidade, moralidade, eficiência, motivação, decorrentes do abuso no exercício
do poder legislativo, em que o Estado de Goiás valeu-se desse poder para
descumprir determinação judicial.
O risco de dano ao resultado útil do processo decorre
simplesmente do fato de que se nesse momento os efeitos da Lei nº 19.502/2016
não forem suspensos e o Estado de Goiás prosseguir com as nomeações,
certamente diversos candidatos aprovados no concurso público deixaram de tomar
posse no cargo, prejudicando a prestação do serviço público.
Além disso, deve ser considerado o fato de que os
candidatos que assumirem o cargo poderão prestar um serviço ineficiente, pelo
sentimento de injustiça, o que poderá acarretar ou incentivar até mesmo condutas
escusas e vedadas pela lei, ou seja, essa lei poderá simplesmente decretar o caos
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na segurança pública que já encontra-se bastante combalida pelos descasos dos
gestores em combater a violência com a implantação de política séria e responsável
e embasada em ideias e projetos que atendam efetivamente a realidade do Estado
de Goiás, que tem em Goiânia, sua capital, uma das cidades mais violentas do
mundo.
Isso posto, verifica-se que estão preenchidos os requisitos
previstos no artigo 300 do CPC para suspensão da Lei nº 19.502/2016.
Por fim, quanto a possibilidade de concessão de tutela
provisória de urgência inaudita altera pars, tem-se que esta foi consagrada no artigo
9º, parágrafo único, inciso I, e no artigo 300, § 2º, ambos do CPC, razão por que não
há nenhum óbice para o deferimento da medida pleiteada pelo autor sem a ouvida
do Requerido.
IV - DO PEDIDO
Ante todo o exposto, o Ministério Público requer:
1. seja a tutela de urgência deferida para suspender os
efeitos da Lei Estadual nº 19.502/2016, que criou a classe
inicial da carreira de agente de segurança prisional no
Estado de Goiás;
2. seja o Requerido ESTADO DE GOIÁS citado para,
querendo, oferecer contestação, no prazo legal;
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3. a produção de todas as provas admitidas em direito;
4. a procedência do pedido para:
4.1. declarar a inconstitucionalidade da Lei
Estadual nº 19.502/2016, que criou a classe
inicial na carreira de agente de segurança
prisional do Estado de Goiás aos aprovados no
concurso público regido pelo Edital nº
001/2014;
4.2. efeito repristinatório a norma
“aparentemente” revogada pela Lei nº
19.502/2016;
4.3. determinar ao Estado de Goiás que
proceda as convocações e nomeações dos
candidatos aprovados no concurso público
regido pelo Edital 001/2014 de acordo com a
legislação “revogada” pela Lei nº 19.502/2016 e
que corrija as nomeações já realizadas que
tiveram por fundamento esta mesma lei,
devendo a posse ocorrer para o Grupo
Ocupacional Assistente Prisional, de 3ª Classe,
padrão I, com direito a remuneração e demais
benefícios.
5. a juntada do Inquérito Civil Público nº 032/2017;
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6. Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).
Goiânia, 29 de maio de 2017.
VILLIS MARRA
Promotora de Justiça
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