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8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política AT01 - Comunicação Política e Opinião Pública Lideranças Políticas e Cinema: a filmografia de Oliver Stone Vera Chaia Gramado, Rio Grande do Sul 01 a 04 de agosto de 2012.

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8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política

AT01 - Comunicação Política e Opinião Pública

Lideranças Políticas e Cinema: a filmografia de Oliver Stone

Vera Chaia

Gramado, Rio Grande do Sul 01 a 04 de agosto de 2012.

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Lideranças Políticas e Cinema: a filmografia de Oliver Stone1

Vera Chaia2

Tendo por base a produção cinematográfica, o presente texto deverá focar a

construção e a disseminação da imagem do poder, por meio das personagens que

representam a figura do presidente dos Estados Unidos da América do Norte. A análise

será feita a partir dos filmes que apresentam ficcionalmente a figura do chefe do

Executivo norte-americano e, também, por aqueles que recriam documentalmente

históricos presidentes dos EUA. Supõe-se, dessa forma, ampliar os vínculos entre

imagem e política e expandir os limites da interpretação política.

Os filmes analisados são da autoria do diretor americano Oliver Stone,

conhecido por uma filmografia polêmica, questionadora e/ou enaltecedora de certas

autoridades políticas, crítico das guerras e de certas estruturas do poder. Oliver Stone é

um dos diretores americanos que possui uma filmografia voltada à revisão crítica da

política norte-americana, focando as lideranças políticas do país. Seus filmes que

retratam presidentes americanos são produzidos há longo tempo e objetivam não só

enaltecer essas lideranças políticas, mas também desconstruir certos mitos políticos. Sua

carreira é marcada pelos seguintes filmes: Wall Street – O Dinheiro Nunca Dorme

(2010), Ao Sul da Fronteira (2009), W. (2008), As torres gêmeas (2006), Procurando

Fidel (2006), Nixon (1995), JFK – A pergunta que não quer calar (1991), The Doors

(1991), Nascido em 4 de Julho (1989), Wall Street – Poder e cobiça (1987), Platoon

(1986), Salvador – O martírio de um povo (1986), dentre outros.

Para o presente trabalho analisaremos os filmes: W. – do gênero biográfico,

baseado na vida e carreira política do presidente dos Estados Unidos da

América George W. Bush; Nixon – também um filme do gênero drama biográfico,

1 Pesquisa financiada pelo CNPq – Bolsa Produtividade em Pesquisa (PQ). A pesquisa que estamos

realizando é ampla e abrange filmes nacionais e a filmografia dos Estados Unidos da América. Pesquisa em andamento.

2 Vera Chaia - Professora do Departamento de Política e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, pesquisadora do Neamp (Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pesquisadora do CNPq.

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baseado na vida do ex-presidente dos Estados Unidos Richard Nixon, a partir do

episódio W.atergate até sua renúncia; South of the Border – do

gênero documentário político, em que Stone analisa os líderes políticos latino-

americanos de esquerda, como Hugo Chávez, da Venezuela, Evo

Morales, da Bolívia, Fernando Lugo, do Paraguai, Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil,

Rafael Correa, do Equador, Raúl Castro, de Cuba, e Néstor e Cristina

Kirchner, da Argentina.

Nixon – 1995

A imagem construída por Oliver Stone no filme Nixon é contundente. Ele se

posiciona criticamente em relação ao presidente americano, começando pela frase que

abre o letreiro do filme: “O que lucra um homem ganhando um mundo inteiro e

perdendo a própria alma?” (Mateus, 16:26).

Não existe uma história linear. A narrativa de Stone é feita em flashback, com

imagens da vida de Nixon desde a infância até a sua morte, em 1994.

Uma nova campanha eleitoral estava sendo desencadeada, e Richard Nixon, que

havia sido eleito para o seu primeiro mandato em 1968, buscava um segundo mandato.

É nesse cenário político que o filme inicia, mostrando uma reunião de partidários de

Nixon planejando a invasão da sede do partido democrático em junho de 1972, cujo

comitê era alocado no Edifício Watergate. As eleições ocorreriam em novembro de

1972.

Além desta imagem acompanhamos, num aparelho de televisão, o filme de

propaganda do Ministério do Trabalho dos Estados Unidos da América (EUA). Um

vendedor conversa com seu supervisor e comenta que ele não havia conseguido realizar

nenhuma venda, apesar de seguir todos os ensinamentos do Manual de Vendas. O

supervisor afirma para o vendedor: “O seu produto é ótimo, mas lembre-se de que está

vendendo a própria imagem”. Segundo o supervisor: “A sinceridade é o que mais

vende”.

O grupo, que iria invadir a sede do Partido Democrático, leva consigo

identidades falsas, não portam relógios, chaves, nem carteiras. Um dos integrantes

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comenta para o grupo: “É o fim de uma vida limpa e decente”. Outro integrante do

grupo afirma: “Do meu lado, se algo der errado, ligarei para o presidente dos Estados

Unidos” – na época, Nixon, do Partido Republicano.

Logo depois desta cena ouvimos o noticiário de um telejornal dando a

informação de última hora de que cinco homens haviam sido presos no Hotel

Watergate, após invadirem a sede do Comitê Democrático Nacional em Washington.

O filme avança no tempo. Agora acompanhamos uma reunião realizada na Casa

Branca em dezembro de 1973, 18 meses depois da invasão. Um general chega de carro,

e todos os presentes ouvem a notícia de que os cinco homens haviam sido condenados

até 40 anos de prisão. Segundo o noticiário “A Casa Branca continua negando qualquer

participação”, “Nixon disse que não sabia” no Comitê que averiguava as denúncias do

escândalo Watergate.

Somos informados que havia um sistema de gravação secreta na Casa Branca e

que Nixon deveria entregar todas as fitas que envolvem conversas entre ele e seus

assessores. No decorrer do filme ficamos sabendo que a ideia de se criar um sistema de

gravação partiu de seu assessor para assuntos jurídicos, já que o presidente desconfiava

das informações produzidas pelo FBI e pela CIA.

A obsessão de Nixon por Abraão Lincoln e pelos Kennedy é uma constante. O

diretor nos apresenta retratos destes ex-presidentes e documentários produzidos no

período presidencial de John Kennedy. E também apresenta um político insatisfeito

consigo mesmo e com uma autoestima extremamente baixa. Nixon, numa das passagens

do filme, fala de seus feitos na política e comenta, sentado numa poltrona e bebendo,

que todos o odeiam: “Porque é Nixon. Sempre odiaram Nixon”. É o momento em que

está escutando as fitas que o incriminam.

Novamente o filme retroage no tempo e acompanhamos um dos participantes do

escândalo de Watergate, Howard Hunt, que trabalha na CIA. Ficamos sabendo que

Nixon o havia contratado para destruir carreiras políticas e plantar provas que poderiam

recriminar seus adversários. Como Hunt conhece todos os atos ilícitos de Nixon, o

presidente quer que paguem para que o funcionário suma dos bastidores da política.

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Para camuflar e neutralizar o caso Hunt, Nixon cria um código – Baía dos Porcos3 –,

para seus assessores mais próximos e para justificar a ação contra Hunt.

Ao ser indagado sobre o caso Hunt, Nixon pede para seu porta-voz falar com a

imprensa. Sobre o que falar, Nixon afirma que ele deve dizer: “O de sempre, tudo,

menos a verdade”.

Nixon aparece em outra cena totalmente descontrolado, tentando abrir um frasco

de remédios. Os comprimidos espalham-se pelo chão, e Nixon, sozinho, desabafa:

“Deixam-me nesta posição, assim exposto. Por que não me metem uma bala?”.

O filme volta para o ano de 1960, com imagens do debate entre Nixon e John

Kennedy, candidatos à presidência. O comitê de campanha de Nixon avalia

negativamente sua atuação no debate. Comentam que ele deveria ter usado maquiagem.

No debate assistimos a um Nixon fragilizado, sem argumentação para rebater as críticas

de Kennedy. Nixon, depois do debate e da derrota, comentou que parecia que ele não

tinha pulso.

Seus assessores leem notícias nos jornais do dia seguinte referentes ao debate:

“Sinto muito por Nixon, pois parece que ele não sabe quem é. A cada momento tenta

decidir qual Nixon ele será, o que deve ser exaustivo”, Jack Kennedy.

Outro comentário a respeito de Nixon: “Nixon é um mentiroso astuto. Se só

dissesse a verdade teria pouco a dizer. Vote em Nixon e vá parar no inferno”, Harry S.

Truman.

Imagem de Nixon exaurido, nervoso e irrequieto. Ele comenta que Kennedy teve

tudo na vida e ele, segundo a avaliação dos jornalistas: “Não uso a roupa certa, nem a

família certa” (sua mulher fica chocada com a fala de Nixon, ela escuta escondida). “Ele

(Kennedy) diz que eu não tenho classe, e o adoram por isso”.

Nixon afirma que não concorrerá a mais nenhuma eleição por pressões

familiares. E , num repente, afirma: “Eu aguento os insultos. Aguento me xingarem,

mas não aguento perder. Eu odeio”.

3 A Baía dos Porcos (em espanhol, Bahia de los Cochinos) é uma baía na costa meridional de Cuba, mais

conhecida em razão de uma tentativa de invasão mal sucedida por parte de mais de mil e duzentos exilados cubanos, ligados ao antigo regime de Fulgêncio Batista, apoiados pelos Estados Unidos e pela Máfia - que foram treinados e financiados pelos serviço secreto norte-americana CIA, em 1961 (http://pt.W.ikipedia.org/W.iki/Ba%C3%ADa_dos_Porcos).

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Novamente aparece o lado rancoroso de Nixon ao citar os Kennedy e os

jornalistas. O seu rosto e seu corpo se transfiguram ao falar deste político. O ódio está

estampado em seu rosto.

O passado é rememorado novamente pelo filme. O pai é dono de um armazém, a

mãe é dona de casa, e ele tem dois irmãos. Ele, Dick Nixon, relembra os dias difíceis da

infância. Seus irmãos morreram de tuberculose e, devido a essa tragédia, Nixon pôde

estudar Direito na Faculdade de Whittier, no período de 1930 a 1934. Ao jogar beisebol

na Faculdade, Nixon se destaca como “...o pior atleta que já vi”, segundo os treinadores,

mas destacam “...a sua força de vontade”.

Outra campanha eleitoral de Nixon é recordada. Agora o ano é de 1962 e a

disputa é pelo governo da Califórnia. Ele perde as eleições e culpa Fidel Castro pela sua

derrota, pois os americanos apoiaram o candidato de John Kennedy. Segundo Nixon: Os

americanos tiveram medo... as pessoas votam por medo”. No caso específico por medo

do comunismo representado pelo Fidel, combatido pelo presidente Kennedy.

A mulher de Nixon, Patty, quer se divorciar, caso ele não abandone a vida

política. Por causa desta ameaça Nixon resolve abandonar a política, mas por pouco

tempo. Ao comunicar a imprensa de sua decisão, Nixon fala: “Não terão mais Nixon

para apedrejar”. O ressentimento com a imprensa fica mais claro neste desabafo do

político.

O passado político de Nixon é retomado no filme, através de um documentário

na televisão mostrando o político como um homem duro, a favor da guerra, contra a

política do New Deal, contra o comunismo. Quando foi vice-presidente na chapa de

Eisenhower (1953-1961), Nixon teve que se defender de uma acusação de que era

corrupto. O documentário termina com uma avaliação de Nixon: “E assim termina uma

grande história política americana. A verdade é que nunca soubemos quem era Richard

Nixon e agora que ele se foi nunca saberemos”.

Agora a cena é em Nova York (1963) numa cerimônia política. A mulher de um

político critica Nixon e comenta, na frente do político: “De onde venho, Dick Nixon é

totalmente mal interpretado. E sabe por quê? Porque, querido, todos pensam que seu

sorriso e seu rosto nunca estão no mesmo lugar ao mesmo tempo”. Conclui-se, pela

frase, que Nixon é dissimulado, falso e traiçoeiro, não confiável.

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A cena mais emblemática é passada no ano de 1963, na cidade de Dallas, no dia

anterior à morte do então presidente John Kennedy. Nixon foi participar de uma feira de

automóveis e logo depois da cerimônia se encontrou com partidários republicanos, que

queriam que ele se candidatasse à presidência dos EUA, derrotando John Kennedy.

Nixon refutou que seria candidato: “Só se Kennedy largar de Johnson. Isso nunca

acontecerá”.

Um texano foi claro com Nixon ao expressar o seu posicionamento com relação

ao Kennedy: “Você não sabe quanta gente odeia Kennedy aqui. Eles chegarão amanhã,

e vão botar o cara pra correr! Nós lhe daremos um pote de dinheiro para se livrar dele.

Mais do que jamais imaginou”.

Nixon contra-argumenta: “Ninguém ganhará de Kennedy em 64 com todo o

dinheiro do mundo”.

Outro texano fala: “E se Kennedy não for candidato em 64?”.

Stone introduz, em várias passagens do filme, a imagem da Casa Branca com

nuvens carregadas e com sons de trovões e raios, simbolizando períodos sombrios na

história dos EUA.

John Kennedy chega a Dallas no dia 22 de novembro de 1963, um pouco depois

da partida de Nixon. Acompanhamos pelas manchetes de jornais e por noticiários da

televisão que John Kennedy havia sido assassinato4. Nixon não vai ao enterro do

presidente, pois avalia que os Kennedy o odeiam. Nixon: “Se eu fosse presidente nunca

teriam me matado”.

O vice-presidente Lyndon Johnson assume a presidência e fica até 1968, ano de

término de seu mandato e de novas eleições presidenciais. A imprensa especula a

possibilidade de Nixon se candidatar novamente: “A saída de Johnson ressuscita

Richard Nixon como forte candidato republicano com um plano para acabar com a

guerra”. Aceitando as pressões de seu partido, Nixon aceita se candidatar, apesar das

resistências de sua mulher: “Eu posso vencer”.

4 JFK– a pergunta que não quer calar, de Oliver Stone, produzido em 1991 e que relata a história do

promotor Jim Garrison (Kevin Costner), que tenta provar a existência de uma conspiração, por não estar

convencido do parecer final da Comissão Warren, ao concluir ter sido o Presidente John F. Kennedy

assassinado por uma única pessoa.

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O candidato do Partido democrático é Bob Kennedy. Nixon se apresenta como o

candidato capaz de acabar com a Guerra do Vietnã (1959-1975). A campanha transcorre

dentro dos conformes, inclusive incluindo encontros com E. Hoover, diretor do FBI, e

um líder mafioso cubano chamado Johnny Roselli.

Segundo Nixon, o único empecilho a ser enfrentado é a candidatura de Bob

Kennedy. Segundo sua avaliação: “E Bobby tem o encanto de um artista de rock. Eles

se matam só para tocar nas roupas dele. Ele entrará na Casa Branca montado no cadáver

do irmão”.

Bobby Kennedy é assassinato. Na avaliação de Richard Nixon, o caminho está

livre para ele: “Quando eu vi Bobby jogado lá no chão com os braços abertos, olhos

estatelados (imagem de seu assassinato), soube que eu seria presidentes. A morte dele

me abriu caminho”. Nixon ainda comenta com um de seus assessores: “O Vietnã, os

Kennedy abriram uma trilha só para mim. Por sobre os cadáveres. Quatro corpos” (seus

dois irmãos, que morreram e possibilitaram que ele estudasse numa faculdade, e os

irmãos Kennedy, que foram assassinados).

O assessor ainda retruca: “Você quer dizer dois. Dois corpos”. Nixon frisa que

são quatro corpos. E ainda se pergunta: “Quem está nos ajudando? É Deus ou seria a

morte?”.

Na Convenção Nacional Republicana de 1968, realizada em Miami, Nixon é

aplaudido e discursa ressaltando sua plataforma política: “Uma nova voz está bradando

hoje e por toda a América. Ela não é a voz dos que protestam ou gritam. É a voz

silenciosa da maioria dos americanos esquecidos, os que não gritam nem protestam. São

pessoas boas. Trabalham arduamente e economizam e pagam impostos”. Nixon

continua: “Sim, nós podemos cortar a verba da defesa. Podemos reduzir as forças

convencionais na Europa. Podemos restaurar o sistema de saúde e disponibilizá-lo a

todos. Sim, podemos efetuar uma reforma total deste governo. Podemos realizar uma

nova revolução americana”. Nixon reforça o slogan de sua campanha eleitoral: “Yes,

We can!”, slogan utilizado em 2008 por Barack Obama, do Partido Democrata.

Para acabar com a guerra do Vietnã, Nixon adota uma tática de ataque com

armas experimentais e também ataca o Camboja. Setores da sociedade americana

protestam e organizam grandes manifestações contra Nixon. Lembremos que Henry

Kissinger era, naquela ocasião, Secretário de Estado dos Estados Unidos da América e

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aconselhava Nixon constantemente, mas nem sempre era atendido. Será neste momento

de confronto total que Nixon proporá negociar e reconhecer a China comunista, mesmo

contra a avaliação de sua equipe de governo: “Droga, sem riscos não há heroísmo nem

história. Nixon nasceu para realizar isto. Dar um empurrão na história. Isto mesmo. E se

for necessário, eu solto a bomba atômica... Não pode deixar que a política seja ditada

pelo sentimentalismo”.

As manifestações aumentam e o jornal New York Times recebe informações

sigilosas de que o governo de Nixon estava realizando experiências no Vietnã.

Enquanto estas denúncias acontecem, acompanhamos a reaproximação e o encontro de

Nixon com Mao Tsé Tung.

Apesar do escândalo do Watergate, Nixon consegue se reeleger. Ele fica

sabendo que quem vazou as informações para a imprensa foi Kissinger, que, segundo

seus assessores, trabalhava para os dois lados. Logo em seguida acompanhamos uma

entrevista coletiva de Nixon. Ele é pressionado pela imprensa, que questiona os

métodos utilizados pelo seu governo para acabar com a guerra do Vietnã. Irritado, sai

abruptamente, sem responder às questões dos jornalistas, e afirma para seus assessores

que desconfiava que as pressões viessem de uma imprensa identificada com a família

Kennedy: “Sabe quem está por trás disso? Teddy Kennedy. Ele afoga uma guria no

carro e não pode concorrer à presidência5. Os malditos Kennedys se safam de qualquer

coisa! Malditos! Eu fiz o que o editorial do New York Times me disse para fazer! Eu

acabei com a guerra! Então por que estes imbecis estão se virando contra mim? Por que

não gostam da minha aparência nem da escola que frequentei?”.

Novamente a referência à família Kennedy é citada e cada vez com maior

rancor. Seu complexo de inferioridade é ressaltado e sua aversão à imprensa também.

Os assessores, já desgostosos do governo Nixon e críticos à política adotada pelo

presidente, comentam entre si: “Você acha que isso é política?”. “Tudo isto é coisa de

Richard Nixon. Pessoas estão morrendo porque ele não entrou para o time de futebol. A

Constituição está por um fio porque ele frequentou Whittier e não Yale”. Os assessores

5 Contribuiu também para frear suas pretensões políticas a morte, em julho de 1969, de uma ex-secretária,

devido a um acidente automobilístico em que Ted dirigia um carro que caiu na água, mas conseguiu salvar-se, embora não tenha prestado nem pedido socorro para sua acompanhante, que teria morrido horas depois afogada. Ted assumiu a culpa, mas declarou-se em estado de choque, sendo condenado a dois meses de prisão condicional, ao mesmo tempo em que nunca houve maiores investigações sobre a veracidade de sua versão. (http://pt.W.ikipedia.org/W.iki/EdW.ard_Kennedy).

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comentam que falharam no episódio de Watergate. Segundo a avaliação desta equipe,

Nixon deveria ter vindo a público e pedido perdão. Outro assessor comenta: “Dick

Nixon dizendo ‘sinto muito’? Seria um dia e tanto. A sua armadura desmontaria”.

Outra cena emblemática apresenta o encontro entre o assessor jurídico de Nixon

e Hunt, o chefe que comandou a invasão do escritório no edifício Watergate. John está

levando dinheiro para que Hunt fique quieto e não conta que Nixon também estava

envolvido neste episódio. John comenta que Nixon “não sabia. Isto se descontrolou”, o

que é contestado por Hunt: “Acha que um homem controlado como Nixon permitiria o

arrombamento da sede do partido democrático sem saber de nada?... Ele é a escuridão,

buscando a escuridão”.

John Dean resolve falar para a Comissão do senado que investiga o escândalo,

após ter recebido pressões de Nixon para que assumisse toda a responsabilidade do

Watergate. A Comissão exige que Nixon entregue as fitas gravadas pelo seu governo.

Nixon reluta, corta um trecho de uma das fitas. Quer que o promotor do caso seja

demitido. Como repúdio à essa exigência, o procurador da República renuncia.

O cenário está montado: assessores se demitem ou são demitidos. Seu vice

renuncia. Nixon sofre um mal-estar, vai para o hospital e é diagnosticado com

pneumonia e flebite. Pedidos de impeachment são abertos por várias causas: abuso do

poder, obstrução da justiça, falta de cooperação com o Congresso e o bombardeio do

Camboja. Nixon reluta e fala que não renunciará. Imagem da Casa Branca cercada de

trovões e relâmpagos. Nixon libera a transcrição de algumas fitas: “O mundo só verá o

que eu quiser mostrar”.

Imagem de Nixon sentado em uma poltrona bebendo e ouvindo música.

Kissinger e seu advogado entram na sala e o pressionam para que assine a carta de

renúncia, com esta ação ele escaparia de processos e preservaria o conteúdo das fitas

gravadas. Após relutar, ele assina a carta.

Nixon chora e pede para que Kissinger reze com ele, dizendo: “Como é possível,

como um país pode desmoronar dessa forma? O que fiz de errado? Eu abri a China.

Assinei a paz com a Rússia. Acabei com a guerra. Eu fiz o que achava certo. Por que me

odeiam tanto? É inacreditável. É uma loucura”. Prosseguindo em sua lamentação:

“Todos os líderes devem ser sacrificados no final”.

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No salão posterior à sala, Nixon observa o retrato de John Kennedy de braços

cruzados e cabeça baixa. Ele olha e fala: “Quando olham para você, eles veem o que

querem ser. Mas quando olham para mim, eles veem o que são”.

Sendo amparado pela mulher, Nixon comenta: “Estou com tanto medo. A

escuridão lá fora. Eu sempre vi para onde me encaminhava. Mas está escuro agora.

Sempre tive medo do escuro”.

Acompanhamos o discurso de despedida de Nixon. Gerald Ford assume a

presidência.

Nixon morre no dia 26 de abril de 1994 e é homenageado por cinco presidentes

americanos. Somente algumas fitas vieram a público depois de sua morte, graças ao

trabalho do Arquivo Nacional americano.

Oliver Stone constrói uma imagem de Nixon como homem e presidente

ressentido, com uma baixa autoestima, rancoroso, vingativo e com complexo de

inferioridade. Em vários momentos do filme, Stone relembra a infância de Nixon e sua

família. Seu pai era dono de uma mercearia e também tinha um açougue. Só pôde

estudar porque seus dois irmãos morreram de tuberculose e sobrou dinheiro da família

para investir em sua educação, tanto que Nixon se formou na Faculdade de Whittier, na

Califórnia. Em vários momentos do filme, Nixon relembra sua origem familiar humilde

e a compara à da família Kennedy. Em alguns diálogos Nixon procura compreender por

que certos setores do povo americano e da imprensa manifestaram restrições ao seu

comportamento e à sua origem. Justifica todos os seus atos ilícitos e ilegais, porque

necessários para a preservação da segurança nacional. No final do filme e de sua

carreira política, Nixon termina só, sem amigos e sem correligionários.

No filme Frost/Nixon6, Richard Nixon concorda em dar uma entrevista

detalhada dos erros que cometeu enquanto era presidente e sobre o escândalo de

Watergate, após três anos de sua saída da Presidência dos Estados Unidos. Após

exaustivas negociações, inclusive monetárias, Nixon aceita ser entrevistado por David

Frost, pensando ser perguntas fáceis e, assim, conseguir novamente ser uma pessoa

honrada para os americanos. A entrevista foi realizada em três dias – 23 a 25 de março

de 1977.

6 Direção: Ron Howard; ano: 2008; país de origem: EUA/INGLATERRA/FRANÇA.

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A cena final do filme é fantástica, pois o apresentador se transforma em

inquisidor de Nixon, ao fazer as seguintes perguntas:

FROST – “Já que me perguntou, há três coisas que as pessoas gostariam de vê-lo dizer:

1ª) Que foram mais que erros, que foram delitos e que deve ter havido crime (com

relação ao caso Watergate)”;

2ª) “Eu (Nixon) abusei do poder que tinha como presidente”;

3ª) “Permiti que o povo americano tivesse dois anos de agonia desnecessária e me

desculpo por isso”.

FROST – “Sei que é difícil, para qualquer um, especialmente para o senhor (fala sobre o

caso e se desculpar), mas acho que as pessoas precisam ouvir. E acho que, a menos que

diga, será assombrado pelo resto da vida”.

NIXON – “Bem, é verdade. Cometi erros, erros terríveis, erros que não são dignos de

um presidente, erros que não atingem o padrão de excelência que sonhei quando era

menino, mas, você se lembra, foi uma época difícil. Estava em meio a uma guerra de

cinco anos contra a mídia partidária, um Congresso partidário, um Comitê Ervin

partidário. Mas admito que teve momentos em que não cumpri a responsabilidade e me

envolvi em uma cobertura. Por todos esses erros, eu lamento muito. Ninguém sabe

como é renunciar à Presidência. Agora, se (você) quer que eu me jogue no chão e me

humilhe..., não! Nunca!

Continuo insistindo que foram erros do coração. Não foram erros da cabeça, mas foram

meus erros. Não culpo a ninguém. Eu derrubei a mim mesmo. Dei a eles uma espada e

eles enfiaram e giraram com deleite. Acho que se eu tivesse no lugar deles, teria feito o

mesmo”.

FROST – “E o povo americano?”

NIXON – “Eu o decepcionei. Eu decepcionei meus amigos. Eu decepcionei meu país.

Pior ainda, decepcionei nosso sistema de governo. Todos os sonhos dos jovens que

querem estar no governo, mas agora pensam: ‘É tudo corrupto’. Decepcionei o povo

americano e carreguei este fardo até o fim da vida. Minha vida política acabou”.

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A reconstrução do documentário Frost/Nixon permite-nos compreender o contexto

histórico de produção desta entrevista, as resistências em relação à figura de Richard

Nixon, presidente dos EUA, que renunciou ao cargo, a estruturação do cenário do

documentário e o posicionamento político de Nixon que, após sofrer pressões do

entrevistador, confessa que errou no caso Watergate e chega a pedir perdão de seus atos

ao povo americano.

W.. (2008)

W., produzido em 2008, aborda a vida do presidente George W. Bush entre 2001

e 2009. O filme começa com W. como presidente dos EUA, num estádio de beisebol

vazio. Ouvem-se aplausos, e a imagem que aparece é de um homem só, jovem, com

roupas esportivas.

A cena a que assistimos é de um W., já na presidência dos EUA no ano de

20027, participando de uma reunião numa sala da Casa Branca, ocasião em que discute

com sua equipe de governo o nome que dariam à operação de invasão do Iraque. A

opção escolhida foi “Eixo do Mal”. A única voz dissonante, pelo menos naquele

momento de preparação da guerra contra o Iraque, é de Colin Power, seu assessor

militar, que já havia participado do governo de George Bush pai. Ele comenta que não

foi o Iraque nem o Irã que atacaram os EUA, e sim Osama Bin Laden. Sua opinião é

vencida. W. pede que todos rezem com ele, após a reunião.

Stone volta no tempo e presenciamos o ano em que W. é estudante, em 1966.

Estava ocorrendo um trote de estudantes que participavam de uma atividade proposta

pela Fraternidade Delta Kappa, da Universidade Yale. Garrafas de vodka circulavam

pela festa. O calouro W. é pressionado para dizer todos os nomes dos membros

presentes desta comunidade. Após citar todos os presentes, o colega veterano comenta:

“ele pode ser do Texas, mas será um grande delta Kappa”. E W. responde: “estou me

esforçando”.

7 Os atentados de 11 de setembro de 2001 atingiram as Torres Gêmeas do World Trade Center em Nova

Iorque, matando 2.996 pessoas.

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A festa nesta fraternidade termina com todos os estudantes presos, inclusive W.,

que liga para o pai George Bush (deputado federal), que consegue soltá-lo.

Bush Junior trabalha numa plataforma de petróleo. Fica pouco tempo no

emprego, pois após ter sido repreendido por seu chefe, BJ responde: “Minha bunda

pediu demissão”.

Em várias cenas do filme, Stone apresenta a imagem de um BJ beberrão, viciado

e pouco afeito aos estudos e ao trabalho. Será neste contexo de vida desrregrada que BJ

visita seu pai no ano de 1971. O diálogo que se segue retrata os confrontos entre pai e

filho:

BUSH: “Se entendi bem, não gostou da loja de esportes. Nem da plataforma de

petróleo. Trabalhar com investimentos também não era bom. O rancho no Arizona

também não durou muito. Não se formou na Aeronáutica com muita facilidade, Júnior.

Ainda não resolvemos isso. E agora essa garota, Suzy, está dizendo que você a

engravidou? (referência a uma namorada de BJ)”.

W.: “É uma mentira, pai. Uso camisinha. Não sou burro”.

BUSH: “Qual é a sua vocação? Festejar, paquerar e dirigir bêbado? Quem você acha

que é? Um Kennedy? É um Bush. Aja como um. Nem consegue manter um emprego.

Sempre trabalhamos. Já é hora de se juntar a nós e decidir o que vai fazer com a sua

vida”.

W.: “Sabe, pai, estou tendo muita dificuldade para descobrir”.

Bush pai compara W. com JEB, seu irmão, que sempre foi brilhante na

universidade, diferente de W., que sempre foi um aluno medíocre. W. comenta que quer

trabalhar com beisebol, porém seu pai argumenta que ele não sabe jogar e que também

não pode ser treinador. Bush, encerrando a conversa, fala: “Você me decepcionou,

Júnior”.

Este diálogo é muito elucidativo para compreendermos, na visão de Stone, a carreira

política de George W.. Bush, que sempre entrou em confrontos com seu pai. O

sentimento de inferioridade também é destacado nesta relação pai e filho. A

desconfiança, o desprezo do pai por BJ, faz com que este político procure caminhos

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outros para vencer na vida e conquistar o amor e o respeito do pai. A questão familiar é

destacada pelo diretor para construir a imagem de BJ.

W. aparece agora como presidente, conversando com o seu vice Dick Cheney, e

comenta que depois do 11 de setembro ele implementou o Ato Patriótico como forma

de controlar as informações; e também: ”Controlamos bancos, empresas de

comunicação, bancos de dados, servidores de Internet. Rastreamos 1 bilhão de ligações

por dia. Abrimos ‘Guantanamera’”8. O vice o corrige: “Guantánamo9”.

Ao sentir a pressão do vice, o presidente George W. Bush dialoga com Dick

Cheney:

W.: “Quando estivermos em reunião, quero que fique quieto”.

VICE: “Achei que fizesse isso.”

W.: “Guarde seu ego para você. Lembre-se de que sou o presidente. Sou eu que

decido”.

A todo momento Oliver Stone mostra um George W.. Bush inseguro e que busca

convencer sua equipe que quem manda é ele e que ele, como presidente, sabe o que faz

e não precisa ouvir conselhos de ninguém.

A cena que se segue é de W. em sua fazenda, andando com o seu staff

administrativo e discutindo questões relacionadas aos preparativos para a invasão do

Iraque. Sempre aparece a referência à Guerra do Golfo, enfrentada por seu pai, George

Bush, quando na presidência dos EUA.

Depois da invasão do Iraque, W., conjecturando o que seria para ele o fim da

guerra, afirma em uma entrevista coletiva: “No fim, o importante é a liberdade. Um país

livre é um país pacífico. Meu sonho é ver a paz em todo Oriente Médio.” São frases

prontas e que são pronunciadas em vários momentos do filme.

A cena volta a 1972. George W.. Bush chega a sua casa bêbado e acompanhado

de seu irmão de 15 anos. Ao deparar com esta situação, Bush pai fala para o filho entrar

8 Música cubana de autoria de José Fernández Diaz.

9 Guantánamo – campo de prisioneiros controlado pelos EUA, instalado numa região de Cuba.

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no Alcoóatras Anônimos (A.A.) e começa um confronto físico entre eles. O irmão Jeb

aparta a briga. W. comenta que estava comemorando a sua entrada na Universidade de

Harvard e pergunta para os pais: “Agora vocês me amam?”. Barbara ameniza a situação

conflituosa e comenta: “Bom, ele entrou em Harvar. Pode dar crédito a ele?”, se

dirigindo ao Bush pai, que responde: “Claro que ele entrou. Quem mexeu os

pauzinhos?”.

W., conversando com os amigos, comenta que iria entrar no negócio da família,

ao que o amigo fala: “Está falando de petróleo?”. W. retruca: “Não. Quero me arriscar

porque recebi um sinal. No dia 06 de julho, o que aconteceu aqui no oeste do Texas?...

George Mahon anunciou a aposentadoria depois de 44 anos... Agora que ele foi embora,

o distrito 19 está procurando um republicano”. Os amigos comemoram: “Vamos

mandar W. para Washington”.

George Bush pai convida W. para integrar a equipe da campanha presidencial a

que irá concorrer. Laura, mulher de W., comenta sobre o convite do pai: “É tão bom que

mostre confiança em você, não poderia ter dado presente melhor (Junior comemorava o

seu aniversário de 40 anos)”. Ele retruca: “Ele só me ligou porque Jeb não pôde ir”.

Depois desse episódio, em que se encontrava bêbado e sem condições físicas,

George W. Bush se converte a uma religião e reza com o reverendo: “Sempre sinto que

carrego um peso. Um sofrimento. E não importa quantas vezes vá à igreja, o peso não

vai embora”. O reverendo responde: “W., a vida cristã não é feita só de altos. Também

tenho momentos de aborrecimento. E tenho que pedir ajuda a Deus como você”. Ao que

W. retruca: “Eu só sou um nome. Só sou um nome. As pessoas dizem que nasci

privilegiado, mas não sabem como é difícil”. Segundo o reverendo Billy Grahan,

membro ativo da Convenção Batista Sulista dos EUA e conselheiro espiritual de George

W. Bush, ocorreu um “renascimento em Cristo”.

Após a vitória de George Bush, W. conversa com um dos assessores: “Estou sob

a sombra do papai. Quem se lembra do filho do presidente?”.

Agora a cena se desenrola com George W. Bush conversando com seu staff

administrativo sobre o Iraque. Querem convencer o presidente que os iraquianos

possuem armas químicas e biológicas e que os EUA precisam invadir o Iraque para

combater Saddam Hussein. A única voz dissidente e cautelosa é de seu chefe militar

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Colin Power, que diz que George pai, ao enfrentar o Iraque na Guerra do Golfo,

consultou a ONU: “Seu pai consultou a ONU. Levou 6 meses, mas ele conseguiu a

aprovação. A do Congresso também”. Seu Secretário da Defesa, Donald Rumsfeld,

cometa a fala de Colin Power: “Meu Deus, Colin. É o melhor militar desta sala. Todos

sabem disso, mas não acha que a época da Guerra do Golfo passou? Precisamos de 6

meses e de 500 mil homens para derrubar um ditador fajuto com um exército

despedaçado?”. Colin responde: “Está certo, Donald. Sou um militar”. Rumsfeld eleva

seu tom de voz e diz: “Acabem com os caras maus em um grande ataque. Estejam eles

envolvidos ou não. Senão eles vão voltar”.

As ponderações de outros componentes de seu staff corroboram a mesma

opinião de Rumsfeld e argumentam que o Iraque é rico em petróleo e que os EUA

precisam “fincar pé” no Oriente Médio. W. critica seu vice, que defende a invasão para

obter petróleo, e contra-argumenta: “Os trabalhadores não pensam no petróleo. Estamos

falando de terroristas, de armas biológicas. De liberdade e democracia. De um Eixo do

Mal”.

W. divaga e chega a uma proposta: “Na época em que cresci, o mundo era

perigoso. Nós sabíamos exatamente quem ‘eles’ eram. Éramos nós contra eles, e

sabíamos quem eles eram. Hoje, não temos certeza de quem eles são, mas sabemos que

existem. Não vou discutir comigo mesmo. Sigo meu instinto. Sempre segui. E estou

cansado desse Saddam. Ele sempre me subestimou. Não quero que os soldados sofram

com o calor. Vamos começar a guerra antes do verão”. Colin retruca: “Só para constar,

isso vai contra a resolução da ONU”. W. cometa: “Concordem com a ONU, mas o que

quer que digam, no fim, a decisão é minha”.

George Bush perde a reeleição disputada com Bill Clinton, do Partido dos

Democratas, em 1992. Ele se encontra estarrecido e assiste à proclamação do resultado

pela televisão, com a família:

LOCUTOR: “Apesar da vitória arrasadora no Iraque, o povo não quis mais George

Bush na Casa Branca. Uma derrota incrível para um aristocrata da política cuja carreira

foi ofuscada pela crise econômica, por um terceiro candidato, Ross Perot, e uma guerra

secreta na Nicarágua”.

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W., inconformado, comenta: “Você foi um grande presidente”. Bush: “Achei

que a guerra nos levaria à vitória”. W.: “Bom, se tivesse acabado com aquele filho da

puta”. Bush: “O quê?”. W.: “Ido até o fim de Bagdá. Acabado com ele”.

Em outro momento George W. Bush comenta com sua família que quer se candidatar ao

cargo de governador do Texas. Sua proposta não é bem aceita pelos pais: “O problema é

que não é justo com o Jeb. Ele vai concorrer ao governo da Flórida. Um Bush de cada

vez”, comenta seu pai, ao que W. retruca: “Não vou atrapalhá-lo”. Barbara, sua mãe

pondera: “Como vamos participar da campanha dos dois?”. W.: “Não vou atrapalhá-lo”.

Barbara: “Você não vai vencer”. W.: “Por que diz isso?”. Barbara: “É parecido demais

comigo. Fala alto e tem pavio curto. O Jeb é igual ao seu pai. Ele pensa antes de falar.

Tem os pés no chão”. W.: “Não vou dizer nada para não me arrepender. Quer que o Jeb

seja eleito antes de mim”. Bush: “Pare. É uma questão de praticidade, de timing. Quero

que os dois consigam o que querem, o que merecem”. W.: “Bom, vou me candidatar

agora, pai”.

Na campanha eleitoral George W. Bush é treinado por assessores para responder

corretamente às questões, dentre as quais sobre seu passado de bebidas e drogas, ao que

responde: “Foi um erro. Eu era jovem e é tudo que vou dizer sobre isso, porque não

quero dar desculpa para um adolescente dizer que, se Bush fazia, ele também pode”.

W. é eleito governador pelo Texas, enquanto seu irmão sai derrotado.

Junto com seu conselheiro espiritual, W. comenta que recebeu um chamado “... e

acho que Deus quer que me candidate à presidência... sinto que Deus quer que eu faça

isso. E tenho que fazê-lo. Tenho”.

Em plena campanha para invadir o Iraque, George W. Bush faz um

pronunciamento no Congresso. Numa das falas, W. afirma: “A liberdade que

valorizamos não é um presente dos EUA. É um presente de Deus para a humanidade.

Todas as nações têm uma decisão a tomar: ou estão conosco, ou estão com os

terroristas”. Ele é aplaudido por todos os setores do Congresso. Stone recupera imagens

daquela época em que estão presentes Hillary Clinton, Ted Kennedy e outros

democratas que engrossam o apoio ao presidente para invadir o Iraque. Terminando seu

discurso, W. fala: “Que Ele nos guie e que Deus continue a abençoar os EUA”.

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W. é criticado por invadir o Iraque, inclusive por alguns setores dos

republicanos, dentre os quais se destaca o próprio pai, que comenta com Barbara estar

preocupado com o filho. W. não ouve nenhum conselho de assessores que se

posicionam contra a guerra e comenta que: “é minha guerra, não a dele. Não vou mudar

de opinião”. Assessor rebate: “Presidente, seu pai já ofereceu algum tipo de conselho

sobre o Iraque?”. W.: “Não, eu não pedi. Não preciso. É o pai errado a quem recorrer.

Existe um Pai maior”.

Cenas de protestos ocorrendo em várias partes do mundo, contra a invasão do

Iraque. Cenas de guerra no Iraque. Derrubada da estátua de Saddam Hussein e

comemoração da equipe de George W. Bush, que, ao discursar a vitória dos EUA contra

o Iraque, fala: “Sempre que a liberdade surge, os tiranos temem. É o presente de Deus

para todos os homens e mulheres deste mundo. Deus abençoe vocês e que Deus

continue a abençoar os EUA”.

As armas biológicas não foram encontradas e W. pergunta aos seus assessores

quem era responsável por esta ação de encontrar as armas no Iraque. A equipe se

desconcerta e todos se entreolham sem dar uma resposta ao presidente.

A mídia é criticada pelo presidente pelo seu posicionamento crítico contra a

guerra, posicionamento mudado após a morte de soldados americanos: “Não entendo.

Toda essa besteirada na mídia. Eu só queria tornar o mundo melhor e mais seguro. Para

todos. O Bem e o Mal existem. Você (mulher) e eu e os americanos sabemos qual é a

diferença. O Bem sempre ganha no fim. Mas é preciso lutar por ele. Temos que lutar

por ele”.

O presidente sonha com seu pai. Eles se atracam fisicamente. W. acorda do

pesadelo sobressaltado.

Em entrevista coletiva, W. estabelece um prazo para que as tropas americanas

saiam do Iraque no dia 30 de junho de 2004. Ao ser perguntado sobre os erros e acertos

depois do 11 de setembro de 2001, Bush Junior fica parado, sem conseguir responder, e

sai da sala, totalmente desconcertado.

O filme termina com W. no estádio de beisebol, vestido de terno e tentando

pegar a bola, que some. Seu olhar fica perdido, não se fixando em nada.

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A imagem do estádio de beisebol vazio é recorrente e acompanha as várias fases

de George W. Bush. Oliver Stone também reitera em vários momentos do filme a

competição que Junior estabelece com o seu pai. A guerra contra o Iraque é o apogeu

destes confrontos. W. não quer ouvir os conselhos do pai, e o pai considera que W. não

irá ouvi-lo e não interfere, por considerar que aquela guerra era do filho! A relação

conflituosa e de desprezo por W. aparece em várias passagens do filme. A luta política

que George W. Bush trava é uma luta pela conquista do amor, da afeição, do respeito e

da admiração dos pais para com ele. A questão familiar prevalece na construção da

imagem de George W. Bush. Pela imagem construída por Stone, W. sempre foi um

homem fraco, despreparado para assumir os cargos políticos, mas era um obstinado para

alcançar o poder e ser admirado pelos seus feitos. A religião norteia a vida de W. Ele

apela em vários momentos cruciais do filme ao Pai, ao Deus, que o guiará para os

caminhos mais adequados. Seus discursos são vazios, cheios de retóricas que destacam

a liberdade, a democracia e a fé.

Ao Sul da Fronteira (2011)

No filme Ao Sul da Fronteira, Oliver Stone tem como preocupação compreender

os governantes de alguns países da América do Sul que assumiram o poder por via

democrática, na primeira década do século XXI. São entrevistados os presidentes Hugo

Chávez, da Venezuela, Cristina Kirchner e Nestor Kirchner, da Argentina, Evo Morales,

da Bolívia, Rafael Correa, do Equador, Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil e, como

exceção, entrevista Raul Castro, de Cuba. O diretor objetiva analisar o papel da mídia

americana e dos órgãos mundiais, como o FMI, e qual o relacionamento destes com os

governantes citados.

Stone visita estes diferentes países, bem como acompanha encontros políticos

realizados por estes governantes. Relembra a viagem que realizou a Cuba, no ano de

2004, quando entrevistou Fidel Castro.

O enquadramento do filme privilegia o reconhecimento destas lideranças

políticas e ressalta a figura política de Hugo Chávez como o novo Fidel Castro, capaz de

mudar a política na América do Sul e questionar a hegemonia norte-americana nesta

região.

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O diretor, em todas as partes do filme, conversa com as lideranças, e o

importante são as ideias e as conversas presentes no diálogo que estabelece com os

governantes. As imagens se destacam como esclarecedores de certas conversas e

ilustram as falas destas lideranças.

O filme começa com o comentário de uma jornalista da Fox News – canal de

televisão conservador –, que, olhando para a câmera de TV, pergunta para os

telespectadores:“Eu sabia que há ditadores ao redor do mundo, mas você sabia que

alguns dos ditadores, hoje, aparentemente, supõe-se que são viciados em drogas? Isso

explica muito. Hugo Chávez admitiu em um discurso o que, aliás, foi muito pouco

divulgado, que ele masca ‘cacau’ todo dia, pela manhã. Ele também come algo que

chama pasta de ‘cacau’. Que é algo que vicia. E o ditador da Bolívia é seu fornecedor”.

Um dos jornalistas da emissora corrige a colega e fala: “É ‘coca’”... “cacau não

seria problema”.

Oliver Stone comenta in off: “Milhões de pessoas assistem a este programa (Fox

News), regularmente. Dia e noite. Em todos os Estados Unidos. Elas acreditam no que

veem? Espero que não. Mas as emissoras e imprensa mais sérias, nos EUA e na Europa,

seguiram a orientação de Bush e dividiram o mundo em amigos (imagem de Bush com

alguns líderes políticos, como Tony Blair e Álvaro Uribe) – ou seja, líderes que fazem o

que queremos que façam – e inimigos (imagem de Hugo Chávez, Mahmoud

Ahmadinejad e Fidel Castro) – líderes que tendem a discordar de nós”.

O diretor relembra a guerra contra o Iraque e cita os erros cometidos pela

imprensa e pelo governo Bush. In off – recurso largamente utilizado por Stone –

comenta que: “com a ajuda da mídia, repetindo depoimentos da administração Bush,

mais de 70% dos americanos estão convencidos de que Saddam Hussein está envolvido

no massacre do dia 11 de setembro”.

A mesma estratégia de questionar a legitimidade de outros governantes foi

utilizada pela imprensa americana, na avaliação de Stone: “A vitória eleitoral de Hugo

Chávez, apesar de muita oposição, foi um triunfo para a democracia venezuelana. Mas

há um problema com a democracia. Do modo como é praticada no sul, pode derrubar

políticos que se recusam a aceitar as regras de Washington. Segundo nossos líderes, o

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presidente eleito da Venezuela, Hugo Chávez, era e continua sendo um ditador”

(imagens do povo venezuelano comemorando a vitória de Chávez nas ruas).

Também assistimos pela CNN a fala do candidato pelo Partido Republicano em

2008, John McCain: “Os piores ditadores do Mundo: Hugo Chávez...”

Oliver Stone, com sua voz in off, se propõe a realizar uma retrospectiva da vida

de Hugo Chávez. Para tanto, introduz imagens da queda do Muro de Berlim, das

mudanças ocorridas na URSS e como os EUA pensavam em dominar o mundo após

estes episódios históricos.

O ano é 1988, e as imagens selecionadas são de confrontos nas ruas da

Venezuela, cenas de pobreza e imagens de agressões executadas por policiais

venezuelanos que tentavam conter os ânimos exaltados do povo, por conta de sua

revolta contra o aumento das taxas dos ônibus. Naquela ocasião, morreram mais de 200

pessoas. O então tenente Chávez condenou o massacre. Em 1992 Chávez tentou um

golpe para derrubar o governo de Carlos Andres-Pérez, porém fracassou. Por conta

desta ação, ficou preso por 2 anos e assumiu publicamente toda a responsabilidade pela

tentativa de golpe.

Hugo Chávez foi considerado um herói pela população venezuelana, na

avaliação de Stone.

Em 1997 Chávez decide concorrer à presidência. A candidata da situação, que

acabou derrotada, era Irene S. Conde, ex-Miss Universo.

Chávez, ao ser empossado, discursa: “Este poder que vocês me deram não

pertence a mim. Este poder é de vocês. Vocês elegeram o governo que não será o

governo de Chávez. Porque Chávez é o povo. Vai ser o governo do povo!”. Chávez

muda o nome do país: Republica Bolivariana da Venezuela. No filme, Chávez relembra

quem foi Simon Bolívar e sua importância para a libertação de vários países latino-

americanos.

As cenas de Hugo Chávez andando de carro pelas ruas de Caracas se repetem, e

as manifestações populares em apoio ao presidente são amplamente utilizadas por

Oliver Stone.

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Em 2002, ano em que ocorreu uma tentativa de golpe frustrada na Venezuela, as

autoridades e a mídia norte-americanas comentaram que Hugo Chávez era perigo para

os EUA. Um jornalista da emissora de televisão CNN comenta: “Por dois dias

consecutivos, funcionários do governo Bush declaram sua preocupação com a situação

política na Venezuela”. Na emissora C-span 2, Colin Power, secretário de Estado dos

EUA, fala: “Estamos preocupados com algumas das ações do presidente venezuelano,

Chávez, e seu entendimento do que é, realmente, o sistema democrático”.

Estas manifestações são reflexos das reformas empreendidas pelo presidente

Hugo Chávez. A oposição consegue apoio para derrubar Chávez e coloca em seu lugar

o empresário Pedro Carmona, que havia estado na Espanha para tomar medidas para a

faixa presidencial. Ocorre um contragolpe e Chávez volta ao poder pelas mãos do povo

e de militares identificados com sua causa10.

Na avaliação de Hugo Chávez: “O golpe contra Chávez tinha apenas um motivo:

petróleo. Bush fez o plano. Primeiro Chávez. Segundo Saddam, do Iraque. A causa do

golpe na Venezuela e da invasão do Iraque é a mesma: petróleo”. A conversa entre

Oliver Stone e Chávez é filmada de dentro do avião presidencial.

Outro aspecto levantado pelo filme e destacado pelo diretor é que ocorreu uma

manipulação de imagens e de informações. Para confirmar sua posição, Stone entrevista

Gregory Wilpert, professor de Ciência Política da Faculdade do Brooklin: “A imprensa

da Venezuela tornou-se parte da oposição nos meses antecedentes ao golpe. Ou seja,

estava participando e apoiando a oposição. Claro, estou falando da imprensa privada,

que compõe a maior parte da imprensa venezuelana. E, basicamente, o que faziam era

divulgar todo depoimento da oposição que era feito. Muitos analistas disseram que esse

foi o primeiro golpe da imprensa. Um dos participantes do golpe disse: ‘Agradecemos à

imprensa por este golpe’”.

Também foi selecionada a fala de um golpista, declarando a uma rede de

televisão: “Obrigado, Televen. Obrigado, CNT. Obrigado, Globovisión. Obrigado aos

meios de comunicação”.

10 Naquela ocasião estava sendo rodado na Venezuela o documentário A Revolução não será Televisionada, dirigido por uma equipe da Irlanda - Kim Bartley e Donnacha O’Briain, 2003. O documentário teve oportunidade de acompanhar todos os acontecimentos ocorridos naquele momento.

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Os atritos entre Chávez e o governo Bush se acentuam após o controle do

governo de Chávez da indústria petrolífera.

Por conta destas ações, a imprensa americana, liderada pela Fox News, comenta

que: “a administração Bush o comparou a Hittler”. Também aparecem imagens de

Chávez com outras lideranças políticas desafetas de Bush: “Chávez tem feito questão de

aparecer em público com tiranos que Washington adora odiar”.

Hugo Chávez, sem papas na língua, chama George W. Bush de besta. No

pronunciamento que Chávez faz na ONU (imagem dele discursando), comenta irônica e

agressivamente: “Ontem o Diabo esteve aqui”. Ele faz o gesto do Pai Nosso e provoca

risos na plateia: “E este lugar ainda cheira a enxofre”.

Oliver Stone acompanha todos os passos de Chávez e filma o presidente em seu

escritório:

Stone: “Esta é sua escrivaninha, é onde trabalha?”. Chávez comenta: “Este é um de

meus lugares preferidos para trabalhar”. Stone: “nunca vi tanta energia, nunca”.

Reforçando a admiração que sente por Chávez, Stone comenta que “os outros Estados

sul-americanos, ao se associarem à revolução bolivariana”, poderão mudar e se

encaminhar para o socialismo.

Oliver Stone novamente recorre aos telejornais americanos para reforçar a

aversão e o preconceito que estes possuem em relação aos governantes latino-

americanos:

Fox News: “Legalizar a cocaína. Esse é um dos principais itens da campanha de Evo

Morales, um briguento esquerdista e consistente crítico dos EUA, que concorre à

Presidência da Bolívia”. ABC: “Ele é um homem que não é amigo da administração

Bush. Morales, que há um mês chamou o presidente Bush de ‘terrorista’, faz parte de

uma nova onda de líderes esquerdistas na América do Sul. As apostas que são altas. A

Bolívia tem a segunda maior reserva de gás natural no sul” (imagem de Evo Morales

sendo empossado no cargo de presidente e, ao seu lado, Hugo Chávez).

Stone repercute a vitória de Morales, recordando que foi na Bolívia que Che

Guevara foi morto, em 1967, e que pela primeira vez elegeram um líder do povo

indígena, que representa 70% da população boliviana.

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Voz de Oliver Stone in off: “Por gerações, os indígenas mastigaram folhas de

coca para aliviar a tensão sobre o corpo. Não é o mesmo que cocaína, como muitos nos

EUA acreditam. As folhas de coca têm de ser processadas quimicamente para se

produzir cocaína. Mas em sua forma nativa tem efeitos estimulantes leves, como a

cafeína”.

Encontro de Evo Morales e Oliver Stone no palácio presidencial. Ambos

experimentam folha de coca in natura. Morales comenta: “A guerra contra as drogas faz

parte dos interesses geopolíticos dos EUA”, e diz que o governo americano o acusa “de

conspiração e revolta”. O presidente também afirma que: “pela primeira vez, não se

permite aqui nenhuma base militar estrangeira” e que a mídia “...sempre tentará

criminalizar a luta contra o neoliberalismo, o colonialismo e o imperialismo. É quase

normal, o meu pior inimigo é a mídia”. Ainda Morales: “Sinto-me mais como líder de

um sindicato que presidente. É uma luta permanente”.

Num momento de descontração, Stone aparece jogando futebol com o presidente

Evo Morales, no gramado do palácio.

Em Buenos Aires, Oliver Stone entrevista a presidente Cristina Kirchner e o ex-

presidente Nestor Kirchner. Imagens do passado recente da Argentina (2001) são

reproduzidas, relembrando o caos financeiro e de autoridade que vivia o país naquele

período.

In off Stone afirma que: “Nestor Kirchner era o presidente e recusou-se a

concordar com as condições do FMI, forçando-os a recuar. Quando acabou seu

mandato, sua esposa, Cristina, com o mesmo espírito bolivariano, foi eleita”.

Em entrevista com Cristina Kirchner, Oliver Stone, caminhando com a

presidente, ouve sua explicação sobre as mudanças que estão ocorrendo na América do

Sul: “Parece-me que pela primeira vez na região os líderes se parecem com os

governados. Se for à Bolívia e olhar o rosto de Evo, seu rosto é o rosto de boliviano. É a

primeira vez que isso acontece... acreditamos em integração respeitando a moral, a

identidade de cada país, a cultura e os processos políticos que nunca são iguais, pois

somos povos diferentes com sociedades e histórias diferentes”.

Stone pergunta para Cristina Kirchner: “O que acha de a imprensa chamar

Chávez de ditador?”

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Cristina comenta: “Acho que nunca houve um governo na América Latina ou no

mundo que teve tantas eleições como o de Hugo Chávez. Acho que é a 13ª eleição. Não

vi muitos ditadores eleitos treze vezes seguidas. Pode-se concordar ou não com o que

ele diz, mas afirmar que não há liberdade na Venezuela para se dizer o que pensa, não

acredito nisso, ao contrário”.

O diretor fez uma pergunta inconveniente para Cristina Kirchner: “Quantos

pares de sapato tem?”. Imediatamente a presidente, de forma ríspida, responde: “Não

sei, nunca contei. Não entendo, nunca perguntam a um homem quantos pares de sapato

ele tem, ou calças. Sempre perguntam isso a mulheres”.

A entrevista com Cristina Kirchner prossegue dentro da casa presidencial.

Perguntas sobre a relação entre a Argentina e o FMI são levantadas. Stone insiste neste

ponto com todos os presidentes entrevistados. Também destaca o relacionamento dos

governos com os EUA e com a administração Bush. A presidente mostra a foto de posse

de Nestor Kirchner, em que estão presentes Hugo Chávez e Fidel Castro.

Provocativamente, Stone afirma ao ex-presidente Nestor Kirchner que, por

ocasião de uma reunião da Câmara do Comércio americana, confrontou-se com o

presidente norte-americano George W. Bush: “Diria que um dos pontos altos de sua

vida pessoal seria a conferência com Bush em Mar Del Plata”. Nestor Kirchner

concorda com a afirmação de Stone: “Diria que sim. Naquele dia, a América Latina

derrotou as intenções da primeira potência mundial representada pela política do

presidente Bush e pudemos atuar todos coletivamente. Jamais esquecerei aquele dia.

Tanto que guardei a cadeira daquela reunião em minha casa. Naquele dia tivemos a

coragem não de falar pelo rádio, quando o homem não está, ou quando o representante

da política imperial não está, mas agimos coletiva e coordenadamente. Foi um dos

passos mais importantes que demos na região”.

As imagens desta reunião ganham destaque com Bush e Nestor não se olhando e

não se cumprimentando. Stone selecionou exatamente a imagem para comprovar os

confrontos detalhados pelo ex-presidente argentino. Aproveitando a abertura de Stone,

Kirchner comenta que só faltam seis dias para o término do mandato de Bush, ao que o

diretor responde: “Sim. Graças a Deus”.

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Outro presidente entrevistado é Fernando Lugo, presidente do Paraguai, que é

apresentado por Stone: “Ex-bispo Fernando Lugo, um teólogo liberal venceu as eleições

e pôs fim a décadas de liderança do Partido Colorado, a favor de Washington” (imagem

de Lugo recebendo Oliver Stone e uma cerimônia de confraternização).

“A mansão do ditador”, referência ao General Alfredo Stroessner que governou

ditatorialmente o Paraguai, é focada, agora para ressaltar que quem ocupa a mansão é

Lugo. Pelo seu depoimento: “Minha família foi perseguida por Stroessner. Meu pai foi

preso 20 vezes. É um paradoxo eu viver agora onde Stroessner viveu”.

Oliver Stone pergunta para Lugo o que significaram estas mudanças na América

Latina. Ao que Lugo responde: “Sim, sem dúvida, cremos que as raízes das mudanças

na América Latina começaram com uma nova forma de pensamento. Há 15 ou 20 anos,

ninguém imaginaria que um indígena se tornaria presidente, que duas mulheres seriam

presidentes de dois países importantes, que um metalúrgico seria presidente, que um

militar seria presidente e menos ainda que um bispo seria presidente. Creio que há um

novo ator aqui, os movimentos sociais”.

Quando Stone comenta sobre o caso brasileiro, deixa claro que as mudanças no

Brasil “foram mais políticas que estruturais”.

O telejornal da emissora americana ABC faz uma apresentação de Lula: “Lula

da Silva foi eleito presidente do Brasil com a vitória de maior margem da história do

país. O Sr. da Silva é o primeiro presidente de esquerda da classe trabalhadora da

história do país. Ele foi presidente de sindicato e preso político quando a direita

governava o Brasil, que tem a 9ª maior economia do mundo e enfrenta uma crise

econômica. A administração Bush apoiou seu oponente” (imagem de Lula sendo

empossado e o povo nas ruas comemorando a sua vitória).

Para frustração de Stone, Lula comenta que pagou todas as dívidas que o Brasil

tinha com o FMI. Diante dessa afirmação, Stone reforça a ideia da força política do

presidente Lula: “Lula pode não ter confrontado o FMI diretamente, mas recusou

cumplicidade brasileira no plano de estabilização da Venezuela ou da Bolívia. Agora,

no fim de seu mandato, eu o acho mais combativo do que no início” (imagem de Lula,

Chávez e Morales).

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Lula ainda comenta que: “E muitas vezes aqui na América Latina nós tivemos

governantes subservientes, e também uma elite subserviente. Tudo que era americano

era bom, tudo que era japonês era bom. Tudo que era nosso não prestava. Eu aprendi na

vida sindical que o interlocutor só respeita o outro se ele se respeitar. Eu pessoalmente

não tenho nenhum interesse em brigar com os EUA, a única coisa que eu quero é ser

tratado em igualdade de condições”.

Rafael Correa, presidente do Equador, é entrevistado por Stone. Ao comentar a

vitória e a posse de Correa, a emissora Fox News critica a posição do presidente: Correa

mostra seu descontentamento com Bush, dizendo que a política americana na América

Latina é responsável pelo surgimento de movimentos esquerdistas em toda a região”

(imagem de Correa sendo empossado e discursando).

Stone afirma que: “quando Washington rejeitou a exigência de Correa de

remover a base militar de seu país, o novo presidente exigiu equidade. Uma base

equatoriana em Miami”. Sempre preocupado em explorar confrontos entre os EUA e os

países da América do Sul, Stone pergunta qual era a posição do presidente em relação

aos EUA, ao que Correa responde: “Nós gostamos muito dos EUA. Eu vivi lá. Estudei

lá. Amamos muito o povo dos EUA. Mas, obviamente, a política externa dos EUA é

questionável. Por isso, quando querem nos pressionar para manter a base militar deles

em nosso país, uma base estrangeira pela qual não pagam nada, também dizem que

somos extremistas por não querermos a base...”.

Stone parte para Cuba e entrevista o presidente Raul Castro. O diretor força a

hipótese de que as mudanças que estão ocorrendo na América Latina são baseadas na

Revolução Cubana, ao que Castro retruca e nega: “Todos são adultos, andam sozinhos,

têm suas próprias ideias e contribuem com novas ideias” (imagem de Raul Castro,

Oliver Stone e Rafael Correa). Castro reforça sua ideia: “Somos herdeiros de algumas

das batalhas mais recentes de outros companheiros que caíram, como Che Guevara.

Agora alguns são jovens, como os presidentes Correa e Chávez. Mas cada um está

aprendendo sua própria identidade no continente. Não somos os padrinhos, e eles não

são os herdeiros”.

Oliver Stone, andando pelas ruas de Havana, comenta que em janeiro de 2003

entrevistou Fidel Castro e ele era, segundo o diretor, “um lobo solitário... Ele foi o rato

que rugiu, que lutou a 80 km dos EUA por 50 ou 60 anos. Como o velho e o mar, é uma

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história triste de Hemingway. O velho pescador sai, pesca esse peixe gigantesco que é a

revolução, em 1960. E, quando o traz à costa, ele foi comido por tubarões. Mesmo

assim, o homem tentou, foi nobre” (imagens históricas de Fidel Castro e a revolução

cubana).

Para Stone: “Chávez enfrenta os mesmos desafios de Castro. Acho que tem mais

aliados. O que me impressionou nele foi a força. É um touro. Ele tem a mesma força

que Castro tinha em 2003. Isso lembra o quão forte Castro era. Ele manteve a força.

Chávez mantém a força”.

Perguntado por jornalistas sobre a posição dos EUA em relação a Chávez, Stone

responde: “Isso é óbvio. Ele é uma ameaça tão grande ao sistema quanto Castro foi. É

um grande exemplo e, se for bem-sucedido, será a primeira vez na história da América

Latina, a não ser por Castro, em que ele levou toda uma região, quase todo o continente,

para longe do FMI e do controle econômico dos EUA”.

Quando Stone retorna aos EUA, após as filmagens, o país se encontra com um

novo presidente, Barack Obama, do Partido Democrata (imagem do presidente Obama

discursando). Depois acompanhamos a ida de Obama à reunião da Cúpula das

Américas, em Trinidad, e o comentário de Stone transparece otimismo em relação ao

novo presidente: “Obama não se portou como Bush. Ele encontrou-se com Chávez, que

lhe fez uma oferta de paz”. Sua atitude foi muito criticada pela imprensa americana, ao

que Obama responde: “É improvável que, como consequência de eu ter apertado a mão

ou ter tido uma conversa com o Sr. Chávez, estejamos pondo em risco os interesses

estratégicos dos EUA”.

A fala final é de Chávez, que, dialogando com Oliver Stone, afirma: “E talvez

essa seja umas das coisas que nos fazem continuar. O otimismo, a fé, a esperança e a

evidência concreta de que podemos mudar o curso da história. É possível, Oliver”.

Cena final do filme apoteótica, com os presidentes latino-americanos se dando

as mãos e representando a união da América Latina.

O letreiro apresenta os créditos do documentário e a música que toca é South

American Way, de Al Dublin e Jimmy McHugh, interpretada por Cucu Diamantes.

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No ano de 2011, “o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, qualificou como

‘muito estranha’ a sucessão de diagnósticos de câncer de vários líderes e ex-presidentes

da América Latina e levantou a possibilidade de alguém ter desenvolvido ‘uma

tecnologia para induzir’ esta doença”. (Disponível em:

http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,chavez-estranha-casos-sucessivos-de-

cancer-em-lideres-na-america-latina,816386,0.htm.)

Considerações Finais

A dificuldade em sistematizar os filmes selecionados para analisar – Nixon, W. e

Ao Sul da Fronteira – é decorrente da narrativa estabelecida e escolhida por Oliver

Stone ao construir estes filmes, bem como de seu posicionamento político. Os filmes,

embora com imagens e cenas que ilustram e descrevem os personagens políticos, são

secundários diante da priorização dos roteiros, que reforçam as palavras, os diálogos e a

reflexão in off do próprio diretor. Outra dificuldade que merece ser apontada é que esses

dois filmes (Nixon e W), embora falem de lideranças políticas reais, são narrativas que

seguem uma dinâmica que mescla ficção e documentário. Alguns fatos descritos e

realçados nas duas histórias podem ter sido interpretados pelo diretor Oliver Stone.

Como não houve contestação de suas histórias políticas, acreditamos que a construção

da imagem de Nixon e de George W. Bush seja coerente e correta do ponto de vista de

suas trajetórias políticas.

Outro aspecto a ser levado em conta é a construção de seus filmes sobre Nixon e

George W. Bush, já que suas histórias pessoais e a história de seus governos são feitas a

partir de flashbacks, conforme já apontado anteriormente. Não são histórias lineares,

que tenham um começo, um meio e um fim. Em vários momentos as histórias destas

lideranças se cruzam com outros momentos da política americana. O espectador, para

compreender a narrativa e os períodos históricos trabalhados pelo diretor, deve conhecer

estas lideranças e acompanhar os filmes, sem ficar atento à continuidade. As idas e

vindas dos personagens e dos episódios políticos só devem ser conhecidas por uma

parcela pequena dos espectadores.

Stone descreve as trajetórias de Richard Nixon e George W. Bush impregnadas

de observações que culpam as famílias de seus erros e, em alguns momentos, de seus

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acertos. Nixon é de origem humilde e possuía um complexo de inferioridade; seu maior

desafeto sempre foi John Kennedy, mesmo depois do assassinato deste. Já George W.

Bush é descrito como o filho preterido de George Bush, e, por conta desta relação

complexa com seu pai, sempre quis e buscou alcançar suas metas políticas, chegando ao

cargo de presidente, apesar das resistências expressas por seus familiares a que ele

concorresse a este cargo político. Nixon e Bush são obstinados. Querem provar que são

bons como governantes. Mas a posição de Oliver Stone também é clara ao descrever

estas lideranças políticas como fracas e despreparadas para ocupar os cargos para os

quais foram eleitos.

A dimensão política que mais se destaca nos filmes Nixon e W. são os

confrontos envolvendo a guerra. No caso de Nixon é a guerra do Vietnã e do W. é a

invasão contra o Iraque. Os bastidores dos governos destes presidentes sobressaem

nestes filmes. Acompanhamos reuniões e embates com as equipes destes governos. O

desgaste político e pessoal do staff administrativo se fazem presentes, é a política da

costura, dos acordos, das divergências e da busca dos consensos.

Outro aspecto que observamos é a valorização das atitudes individuais dos

governantes que embora consultem suas equipes a última palavra e a decisão final é do

presidente dos EUA, prevalecendo um traço personalista e autoritário destas

autoridades. Os partidos políticos são pouco citados, não envolvendo consultas às outras

lideranças políticas. O que vale é a avaliação final do governante. Neste sentido, as

instituições democráticas só aparecem para referendar as decisões dos governantes. O

debate ocorre somente na ‘coxia’, não extrapolando os limites da Casa Branca.

Já no filme Ao Sul da Fronteira, o objetivo de Stone é desconstruir a imagem

negativa de alguns governantes da América Latina, construída pela mídia e por alguns

governos norte-americanos. O diretor valoriza as lideranças entrevistadas – Hugo

Chávez, Raul Castro, Fernando Lugo, Evo Morales, Luiz Inácio Lula da Silva, Rafael

Correa, Cristina Kirchner e Nestor Kirchner – pelos posicionamentos políticos de

contestação à política externa americana e às instituições financeiras internacionais.

Stone faz uma ressalva em relação ao presidente Lula, que, apesar de ter quitado a

dívida com o FMI, teve um papel importante de liderança política no tocante ao

relacionamento político com os outros presidentes.

Stone não esconde sua admiração por Hugo Chávez, o novo Fidel Castro, na sua

avaliação. Só que agora Chávez não está só, não é uma liderança isolada, mas sim um

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presidente com posições claras e com aliados políticos na América Latina e com outros

países.

O encaminhamento das entrevistas realizadas diretamente por Stone é repleto de

admiração e de esperança por um mundo melhor. A cena final do filme Ao Sul da

Fronteira mostra a união dos presidentes e uma nova América Latina, com governantes

que saíram do povo e que se preocupam com os setores mais pobres da população.

Segundo Stone, ele é um “ser cheio de esperança” (Graça, 2010).

Bibliografia de referência

BALANDIER, Georges. O poder em cena. Coimbra: Minerva Editora, 1999.

_____ . La politique a l’épreuve des imagens. Cahiers Internationaux de Sociologie, v.

XCIV, 1993.

GOMES, Wilson. A política de imagem. Revista Fronteira (UNISINOS), São

Leopoldo, v. 1, p. 133-60, 1999.

JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Campinas: Papirus, 1996.

GAUTHIER, Guy. Veinte lecciones sobre la imagen y el sentido. Madrid: Catedra

Signo e Imagen, 1996.

GAUTHIER, Guy. O documentário – Um outro cinema. Campinas: Papirus, 2011.

COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder – a inocência perdida: cinema, televisão,

documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

GRAÇA, Eduardo. O jogo de Oliver, Revista Versus – Revista de Ciências Sociais

Aplicadas do CCJE/UFRJ, Rio de Janeiro, agosto de 2010, ano II, nº 5.

Filmografia

Frost/Nixon. Direção: Ron Howard, 2008. EUA/INGLATERRA/FRANÇA,

Nixon. Direção: Oliver Stone, 1995. EUA.

W. Direção: Oliver Stone, 2008. EUA.

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Ao Sul da Fronteira. Direção: Oliver Stone, 2011. EUA.