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8/2/2019 A a Filosofia de Bergson
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A FILOSOFIA DE BERGSON
O Essai sur les données immédiates de Ia conscience (1889) contém a sua teoria doconhecimento;
Matière et Mémoire (1896) sua psicologia,
L’Évolution créatrice (1907) sua metafísica fundada na biologia especulativa, Les deux sources de la Morale et de la Religion (1932) sua ética e filosofia da religião.
Primeiro capítulo de Matéria e Memória argumenta contra as teorias da representação,isto é, contra a idéia da representação como mediadora entre o sujeito e o mundo.
Teoria da representação:Émile Durkheim – 1858-1917s representações são construídas socialmente pelos grupos e se caracterizam como
imagens da realidade.
O método utilizado por Émile Durkheim não se atém apenas à observação e análise doque é verbalizado pelos indivíduos para representar a realidade, pois ele afirma que arepresentação feita pelo grupo ocorre “até mesmo pela maneira como se dispõe
territorialmente, face à realidade. E suas formas organizacionais da vida social, além demediações empíricas, são portadoras de uma ideologia implícita, que forma umarcabouço interno”
Esta é uma característica marcante do conceito de representação coletiva: a suaexterioridade às consciências individuais. Ela é sempre construída coletivamente, não éfruto da elaboração de cada indivíduo isolado, mas sim da união de todos emcooperação.
A filosofia de Bergson se constrói sobre algumas noções:
Elã vital ou vitalismo – não quer dizer que Bergson tem a vida como princípio primeiro.Quer dizer que a vida é de essência psicológica. Não somos nem totalmente livre e nemtotalmente determinados. A vida como a totalidade dos vivos deixa cada um seindividualizar em parte. Ela é uma vontade que atravessa a matéria com um fim, ahumanidade; e o próprio homem com uma destinação, a criação através da inteligência,o ultrapassamento de si, animado pela intuição. “Na origem de toda criação, há a
emoção que se prolonga em ela do lado da vontade e em representação explicativa nainteligência.”
Corpo e espírito – o corpo está do lado da ação e a memória do lado do espírito. Mas avida psíquica é um incessante vai-e-vem entre estes dois pólos. O corpo é pensado comomovimento. O corpo faz parte do universo, e o cérebro faz parte do corpo. O universo éum conjunto de imagens. O corpo é uma imagem particular que age sobre as outras,recebendo excitações e respondendo por movimentos. O cérebro desempenha o papel detransmissor-emissor dos movimentos nervosos associados aos movimentos musculares.
Duração – Kant concebeu o tempo sob o mesmo modelo que o espaço e viu, na estética
transcendental, as duas fontes do conhecimento sensível.Para Bergson, com a medida e a espacialidade estamos na ordem da quantidade. A
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duração ao contrário é qualitativa.Duração e mudança: a duração não é idêntica a uma sucessão; a duração é o jorrar daimprevisível novidade; não é estritamente linear, no sentido que o presente colore opassado da sua nuance e assim o modifica. Podemos prever a sucessão, pois aexperiência física se repete; mas não podemos predizer a duração, pois o futuro de um
ser consciente não tem nada de comum com o futuro do universo natural.A existência do eu é uma mudança incessante; a duração do eu é uma mudança criadora,enquanto a duração do organismo é envelhecimento. “A duração é o progresso contínuodo passado que rói o futuro e que incha avançando.
Memória - como realidade do espírito, não se localiza no cérebro. O cérebro não énecessário para a conservação, pois a conservação se dá em todo o nosso corpo. Mas é océrebro que evoca as nossas lembranças, um aparelho de transmissão que estabelece asconexões entre os movimentos dos nervos; é um órgão de ação que impede aconsciência de ser invadida pelo passado e mantém a atenção para a vida e para a ação.Bergson faz distinção entre memória-hábito ou memória ativa, inteiramente absorvida
na ação presente e indiferente ao passado; e memórias-lembranças, memória pura,desinteressada da ação, involuntária, tal como pode ser a consciência no sonho.Em todos os casos, em todos os níveis da vida psicológica, o passado é todo presente,mas sob uma forma mais ou menos simplificada ou complexa. Um tenista não temnecessidade de evocar lembranças, mas mobiliza em seu corpo todo o aprendizado queteve.
A memória, diferentemente da percepção, nos afasta do transcorrer das coisas, do ritmoda necessidade. A memória bergsoniana toma três formas.Em primeiro lugar, a memória pura, memória representacional, que consiste no registrode todo o que acontece à consciência individual, em todos os momentos da duração,deixando a cada fato, cada gesto, seu lugar e sua data.Em segundo lugar, o hábito, que consiste na constituição de mecanismos corporais porrepetição e reprodução automática, mais ou menos inconsciente. Enquanto a primeira éa memória por excelência, a segunda, alvo do estudo da psicologia da época, é apenas ohábito modificado pela memória.Finalmente, a memória imediata, a síntese que define o presente da duração e quecomunica as outras duas memórias, inscrevendo o passado puro na ação presente e osmecanismos do corpo em uma consciência e uma história individual.
Percepção – O idealismo engana-se; os objetos, de que o mundo se compõe, são
"imagens verdadeiras" e não unicamente elementos da consciência. Tanto o realismohabitual como o de KANT cometem erro ainda maior, ao situarem entre a consciência ea realidade exterior o espaço homogêneo, que consideram como indiferente. De fato, oespaço é só uma forma subjetiva, em correspondência unicamente com a ação humana.
Percepção e memória se interpenetram de tal forma que a percepção concreta ésimplesmente uma “ocasião de lembrar”. Mesmo a percepção mais instantânea consiste
em uma “incalculável multiplicidade de elementos rememorados, e toda percepção é já
memória. Nós percebemos apenas o passado, uma vez que o presente puro é oinapreensível progresso do passado roendo o futuro”. A vida mental assume então
diferentes tons, mais próximos ou mais longínquos da ação, segundo o grau de atenção
à vida. Quanto mais perto a memória fica da percepção, mais adquire uma finalidadeprática, a memória se contrai no ato. Dessa maneira, para Bergson, o equilíbrio
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encontra-se no jogo entre os dois extremos da experiência humana: nem viver na puraação, reagindo imediatamente como os animais inferiores, nem viver como umsonhador,
evocando lembranças sem vínculo com a situação atual.
Afecção - O idealismo e o realismo são para ele teses igualmente inapropriadas: “é falso
reduzir a matéria à representação (...), também é falso fazer dela uma coisa queproduziria em nós representações, mas que seria de outra natureza”.O erro das tradições realistas e idealistas leva, segundo ele, à aceitação das hipótesesparalelistas e epife-nomenais, sem fundamentação alguma, nem teórica nem empírica.Para levar a cabo sua argumentação, ele concebe a matéria como um conjunto deimagens, tendo o conceito de imagem uma existência situada a meio caminho entre acoisa e a representação. Uma imagem pode ser sem ser percebida, as imagens são partesvirtuais do universo material, entre as quais a percepção escolhe os objetos de suarepresentação. Do conjunto das imagens (todas em interação segundo as leis danatureza), distingue-se uma em particular, nosso corpo, uma vez que não o conhecemosapenas de fora por meio de percepções, mas também de dentro, por meio das afecções.
Com efeito, a noção de afecção é o termo que Bergson prefere ao de sensação.E enquanto as percepções informam sobre objetos exteriores e traduzem as açõespossíveis, as afecções fornecem informação sobre o corpo, seu estado atual e as açõesreais que padece. Essa diferença faz com que seja impossível pensar as sensações comoorigem das percepções, isto é, a percepção como fruto da somatória de sensações.
Intuição – designa o dado sensível, sensação ou percepção. A intuição, enquanto franjade instinto, tem origem vital como a inteligência. Ultrapassamos por intuição a oposiçãoentre inteligência e vontade, entre razão teórica e razão prática. A intuição é a visãodireta do espírito pelo espírito; ela tem por objeto, o espírito, a duração, a mudançapura. Não é nem instinto e nem sentimento; é reflexão. O esforço da intuição é umsobressalto da vontade para separar-se dos hábitos e entrar decididamente na própriacoisa, na duração e em tudo o que depende dela. O esforço da intuição não tem nada aver com o esforço intelectual. “A obra bem acabada é aquela que consome do seu fogo a
emoção original e única, nascida de uma coincidência entre o autor e seu assunto, isto é,de uma intuição”.
Só podemos conhecer a duração graças à intuição; mas com ela conhecemo-ladiretamente e como algo íntimo. A intuição distingue-se por características que secontrapõem às características da inteligência. Órgão do homo sapiens, a intuição nãoestá ao serviço da prática; seu objeto é o fluente, o orgânico, o que está em marcha; só
ela pode captar a duração. Enquanto a inteligência analisa, decompõe, para preparar aação, a intuição é uma simples visão, que não decompõe nem compõe, mas vive arealidade da duração. Não se adquire facilmente a intuição; tão habituados estamos aouso da inteligência que se torna necessária uma viragem íntima violenta, contrária anossas inclinações naturais, para podermos exercitar a intuição, e só em momentosfavoráveis e fugazes somos capazes de o fazer.
Evolução criativaFala-se em vitalismo em Bergson, assim como em Nietzsche, para dizer que suafilosofia tem a vida como princípio primeiro.Na juventude Bergson era spenceriano convicto e sua própria filosofia proveio da
tentativa de aprofundar os fundamentos do sistema spenceriano. Contudo, semelhantetarefa levou-o finalmente a repudiar completamente o spencerismo, que não cessou de
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combater daí em diante, e também a Tane. Bergson era contra todos os determinismos.Procurava o lugar de liberdade do indivíduo.Para Spencer, o conhecimento só era adquirido pela razão. O teórico inglês buscou noevolucionismo os mecanismos e objetivos da sociedade, e defendeu o ensino da ciênciapara formar adultos competitivos. Sua filosofia serviu aos pressupostos do liberalismo e
inclusive do imperialismo. Para Spencer, havia uma lei fundamental da matéria, que elechamou de lei da persistência da força. Segundo ela, a tendência natural de todas ascoisas é, desde a primeira interação com forças externas, sair da homogeneidade rumo àheterogeneidade e à variedade. À medida que as forças vindas de fora continuam a agirsobre o que antes era homogêneo, maior se torna o grau de variedade.
BERGSON repele o mecanicismo darwinista e neodarwinista e, em geral, a concepçãomecanicista do órgão vivo. O órgão vivo deve ser considerado como a expressão
complexa de uma função simples; pode ser comparado a um quadro composto demilhares de traços, mas que expressa a inspiração simples do artista. Sem dúvida, oorganismo contém um mecanismo, parece até ser um mecanismo. Mas assim como num
arco dividido em minúsculos segmentos, estes segmentos coincidem aparentementecom a tangente, assim também a vida examinada em suas minúcias com os métodos dasciências da natureza parece ser um mecanismo, mas não o é.
Para Bergson, a destinação da vida se realiza na duração. A evolução é criadora; “a
realidade surge-nos como um jorro ininterrupto de novidades”. Isto não ocorre sem
problema. Ao contrário, a evolução se produz por diferenciação, divergência ebifurcação. Não se pode explicar a vida pela adaptação, pois isso seria explicar aevolução apenas pelas condições exteriores às quais corresponderia a plasticidade davida. Mas, sobretudo, o argumento desenvolvido com brio contra o fato de eleger aadaptação como princípio da vida é que encontramos os mesmos órgãos sobre linhasdivergentes.
A adaptação não explica a evolução, pois ele não dá conta da inventividade criadora. Avida tem um futuro aberto e não fechado. Pelo élan vital e pelo processo dediferenciação, Bergson apresenta uma teoria da evolução como um ato pelo qual a vidase divide e se bifurca
A filosofia extraviou-se, por haver utilizado a inteligência e seus conceitos. Valendo-sede minuciosas análises, BERGSON mostra como surgiu a idéia da desordem (a saber,da contingência das duas ordens possíveis, a vital e a geométrica) e como se formou a
idéia do nada, que é propriamente uma pseudo-idéia. BERGSON investe contra os maisimportantes sistemas filosóficos do passado. A metafísica de PLATÃO e deARISTÓTELES, seguindo a propensão natural da inteligência, conseqüência dosconceitos que não fazem mais do que imitar a linguagem, subjugou a duração. Outrotanto acontece fundamentalmente, embora com diferenças de pormenor, nos sistemasmodernos, como os de DESCARTES, SPINOZA, LEIBNIZ, no criticismo de KANT eprincipalmente em SPENCER. Neste último é onde se manifesta com particularevidência o caráter cinematográfico de nosso pensamento: pretende captar e representara evolução por uma sucessão de estados do ser que se desenvolve, e desconhece assimtotalmente a verdadeira duração.