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DIÁRIO DA REGIÃO Sexta-feira, 25 de dezembro de 2015 / 3B Desconsiderar a crença de um paciente é perder um recurso muito importante que pode favorecer na superação de um trauma Julio Peres, psicólogo clínico e doutor em neurociência pela USP Mais de 3 mil artigos são publicados em 9 anos São estudos sobre o papel da fé no restabelecimento dos pacientes Em outubro, a Sociedade Mundial de Psiquiatria aprovou parecer sobre a im- portância de incluir a espiritualidade no ensino, pesquisa e prática clínica. Mais de mil estudos que mostram os benefícios da religiosidade na melhora de pacientes com doenças psiquiátricas já foram pu- blicados e estão listados no PubMed, que é um motor de busca de artigos de investigações em biomedicina, do go- verno americano. Durante uma semana, o Diário procu- rou a Associação Brasileira de Psi- quiatria, mas ela não se ma- nifestou sobre o assunto. O Programa de Saú- de, Espiritualidade e Religiosidade (Pro- ser), do Instituto de Psiquiatria do Hospi- tal das Clínicas da Faculdade de Medi- cina da Universida- de de São Paulo, rea- liza atualmente a pes- quisa “Uma Interven- ção com Meditação pa- ra Pacientes com Transtorno Alimentar”. O psicólogo clínico e doutor em neuro- ciência pela USP Julio Peres, autor do li- vro “Trauma e superação: o que a psicolo- gia, a neurociência e a espiritualidade en- sinam” afirma que a fé pode provocar im- pactos positivos na superação de traumas. “Quem tem religiosidade intrínseca, ou seja, crença em algo superior, seja Buda, anjo da guarda, Deus, no momento trau- mático, se o paciente faz uso dessa força subjetiva, ele se favorece no sentido de se sentir mais amparado”, diz. Segundo Peres, o grande desafio é formar uma aliança entre a espiri- tualidade e a psicoterapia. Um de seus estudos, publicado na Revista de Psiquiatria Clínica trata exata- mente sobre isso. É o “Psicotera- pia, religiosidade e espiritualida- de, um encontro frutífero e ne- cessário”. “Desconsiderar a crença de um paciente é perder um recur- so muito importante que pode favorecer na superação de um trauma”, conclui. (NF) CIDADES Nos Estados Unidos há um movimento mais forte para introduzir a espiritualidade nas faculdades de medicina. No Brasil começamos a caminhar nesse sentido Domingo Braile, cardiologista Divulgação Pierre Duarte/ Arquivo Nany Fadil [email protected] O crescimento do interesse do papel da fé no restabeleci- mento de pacientes é comprova- do no número de artigos cien- tíficos publicados. A primeira edição do Handbook: of Reli- gion and Health, editado pela Universidade de Oxford, traz 1,2 mil estudos feitos ao longo do século 20. Já a segunda edi- ção, de 2012, contempla 3 mil pesquisas sobre o tema e que fo- ram executadas no período de 2001 a 2010. Recentemente, um trabalho publicado na revista Câncer, da Sociedade Americana do Cân- cer, mostra que pacientes onco- lógicos com fortes crenças espi- rituais reagem melhor ao trata- mento. Esse estudo é a compila- ção de outros feitos em todo o mundo e que envolveram 44 mil pessoas. Conduzido pelo médico Franco Bonaguidi, da Moffitt Cancer Center, na Flóri- da, a conclusão é que o paciente com “alto envolvimento religio- so” que busca ativamente “a aju- da de Deus” teve uma “sobrevi- vência mais prolongada do que o com baixa religiosidade”. Os pacientes mostraram melhor au- topercepção do preparo físico, maior habilidade de executar ta- refas do dia a dia e menos sinto- mas associados ao tratamento e à doença. Um trabalho do Instituto Dante Pazzanese, com quase 250 artigos de todo o mundo, publicados entre 2009 e 2012, concluiu que a religiosidade, quando praticada de forma regu- lar, pode reduzir o risco de mor- te em 30%. É que essas pessoas têm hábitos de vida mais saudá- veis, são menos suscetíveis à de- pressão, têm menos pensamen- tos suicidas e consomem menos álcool e outras drogas. Segundo o cardiologista Do- mingo Braile, na Sociedade Bra- sileira de Cardiologia há um de- partamento que trata da espiri- tualidade e cardiologia. Mas es- se tipo de abordagem ainda está no início no Brasil. “Nos Estados Unidos há um movimento mais forte para in- troduzir a espiritualidade nas fa- culdades de medicina. No Bra- sil começamos a caminhar nes- se sentido”, diz. A CIÊNCIA RECONHECE A FÉ - Uma das pesquisas aponta que a religiosidade, quando praticada de forma regular, pode reduzir o risco de morte em 30% A religiosidade no ensino médico

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DIÁRIO DA REGIÃO Sexta-feira, 25 de dezembro de 2015 / 3B

Desconsiderara crença deum paciente éperder umrecurso muitoimportanteque podefavorecer nasuperação deum trauma

Julio Peres, psicólogoclínico e doutor emneurociência pela USP

Mais de 3 mil artigos são publicados em 9 anos�n São estudossobre o papel da féno restabelecimentodos pacientes

Em outubro, a Sociedade Mundial dePsiquiatria aprovou parecer sobre a im-portância de incluir a espiritualidade noensino, pesquisa e prática clínica. Mais demil estudos que mostram os benefícios dareligiosidade na melhora de pacientescom doenças psiquiátricas já foram pu-blicados e estão listados no PubMed,que é um motor de busca de artigos deinvestigações em biomedicina, do go-verno americano.

Durante uma semana, o Diário procu-rou a Associação Brasileira de Psi-quiatria, mas ela não se ma-nifestou sobre o assunto.

O Programa de Saú­de, Espiritualidade eReligiosidade (Pro-ser), do Instituto dePsiquiatria do Hospi-tal das Clínicas daFaculdade de Medi-cina da Universida-de de São Paulo, rea-liza atualmente a pes-quisa “Uma Interven-ção com Meditação pa-

ra Pacientes com Transtorno Alimentar”.O psicólogo clínico e doutor em neuro-

ciência pela USP Julio Peres, autor do li-vro “Trauma e superação: o que a psicolo-gia, a neurociência e a espiritualidade en-sinam” afirma que a fé pode provocar im-pactos positivos na superação de traumas.“Quem tem religiosidade intrínseca, ouseja, crença em algo superior, seja Buda,anjo da guarda, Deus, no momento trau-mático, se o paciente faz uso dessa forçasubjetiva, ele se favorece no sentido de sesentir mais amparado”, diz.

Segundo Peres, o grande desafio éformar uma aliança entre a espiri-tualidade e a psicoterapia. Um deseus estudos, publicado na Revistade Psiquiatria Clínica trata exata-mente sobre isso. É o “Psicotera-pia, religiosidade e espiritualida-de, um encontro frutífero e ne-cessário”.

“Desconsiderar a crença deum paciente é perder um recur-so muito importante que podefavorecer na superação de um

trauma”, conclui. (NF)

CIDADES

Nos Estados Unidos háum movimento mais fortepara introduzir aespiritualidade nasfaculdades de medicina.No Brasil começamos acaminhar nesse sentido

Domingo Braile, cardiologista

Div

ulga

ção

Pierre

Duarte/

Arquivo

Nany [email protected]

O crescimento do interessedo papel da fé no restabeleci-mento de pacientes é comprova-do no número de artigos cien-tíficos publicados. A primeiraedição do Handbook: of Reli-gion and Health, editado pelaUniversidade de Oxford, traz1,2 mil estudos feitos ao longodo século 20. Já a segunda edi-ção, de 2012, contempla 3 milpesquisas sobre o tema e que fo-ram executadas no período de2001 a 2010.

Recentemente, um trabalhopublicado na revista Câncer, daSociedade Americana do Cân­cer, mostra que pacientes onco-lógicos com fortes crenças espi-rituais reagem melhor ao trata-mento. Esse estudo é a compila-ção de outros feitos em todo omundo e que envolveram 44mil pessoas. Conduzido pelomédico Franco Bonaguidi, daMoffitt Cancer Center, na Flóri­da, a conclusão é que o pacientecom “alto envolvimento religio-so” que busca ativamente “a aju-da de Deus” teve uma “sobrevi-vência mais prolongada do queo com baixa religiosidade”. Ospacientes mostraram melhor au-topercepção do preparo físico,maior habilidade de executar ta-refas do dia a dia e menos sinto-mas associados ao tratamento eà doença.

Um trabalho do InstitutoDante Pazzanese, com quase250 artigos de todo o mundo,publicados entre 2009 e 2012,concluiu que a religiosidade,quando praticada de forma regu-lar, pode reduzir o risco de mor-te em 30%. É que essas pessoastêm hábitos de vida mais saudá­veis, são menos suscetíveis à de-pressão, têm menos pensamen-tos suicidas e consomem menosálcool e outras drogas.

Segundo o cardiologista Do-mingo Braile, na Sociedade Bra-sileira de Cardiologia há um de-partamento que trata da espiri-tualidade e cardiologia. Mas es-se tipo de abordagem ainda estáno início no Brasil.

“Nos Estados Unidos há ummovimento mais forte para in-troduzir a espiritualidade nas fa-culdades de medicina. No Bra-sil começamos a caminhar nes-se sentido”, diz.

�n A CIÊNCIA RECONHECE A FÉ - Uma das pesquisas aponta que a religiosidade, quando praticada de forma regular, pode reduzir o risco de morte em 30%

A religiosidade no ensino médico