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ANAIS DO III ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Configurações Estéticas – Maio/2013
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A CONSTRUÇÃO DA DANÇA: ESPAÇO DE PASSAGEM ENTRE O FAZER E O PENSAR A LINGUAGEM
LARA SEIDLER (UFRJ), MARIA INÊS GALVÃO SOUZA (UFRJ)
RESUMO O trabalho busca aprofundar a importância de se falar sobre a dança a partir de seu próprio conteúdo, de forma que se discuta a linguagem de dentro dela. Tentamos pensar uma obra coreográfica produzindo uma escrita a partir dessa vivência interna do processo cênico e do diálogo próprio da linguagem com os autores. A abordagem teórica que se alimenta da experiência vivida na prática artística, traz em si uma clareza fundamental na argumentação na medida em que convoca o leitor a participar também de sua atualização e de seu fazer. Portanto, alguns aspectos da corporeidade dançante alimentam a construção da linguagem da dança e contribuem para entender que ela se constrói nesse processo de experimentação e na compreensão das teorias. PALAVRAS-CHAVE: Texto, Pesquisa, Produção de linguagem.
THE CONSTRUCTION OF DANCE: THE SPACE OF PASSAGE BETWEEN DOING AND THINKING THE LANGUAGE
ABSTRACT This paper seeks to deepen the importance of talking about the dance from your own content, so that we discuss the language within it. We try to think of a work producing choreographic writing from that inner experience of the process of dialogue and scenic own language with the authors. The theoretical approach that also feeds the experience in artistic practice, in itself brings a clarity on the fundamental argument in that it invites the reader to also participate in its update of your doing. Therefore, some aspects of corporeality dance feed the construction of the language of dance and contribute to understand that it builds in the process of experimentation and understanding of theorie KEYWORDS: Text, Research, Language Production.
ANAIS DO III ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Configurações Estéticas – Maio/2013
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Na produção artística da dança na atualidade percebemos a tendência
para uma livre atitude em relação à mistura de técnicas, saberes e linguagens
conduzindo as produções para processos que investem e investigam cada vez
mais os diálogos, complexidades, fluxos e atravessamentos. Seguindo esse
curso, trazemos algumas reflexões que recaem sobre o papel do corpo e da
prática dançante no processo de experimentação de encontros e diálogos,
dando uma particular atenção à maneira como esses múltiplos diálogos
chegam a efetivamente integrar-se no momento dançante tornando-os não
somente elementos agrupados, mas efetivamente integrados, produzindo
novas possibilidades de fala.
Maria José Fazenda, autora do prefácio do livro Poética da dança
contemporânea de Laurence Louppe (2012), caracteriza seu pensamento
acerca da dança contemporânea utilizando o conceito de rizoma de Gilles
Deleuze e de Félix Guatarri. Para ela, Louppe aprofunda o fazer da dança
contemporânea a partir ”(...) de um sistema em rizoma, com formas diversas,
cuja vida se rege por um princípio central de multiplicidade, de articulações a
vários níveis, sem estar preso a um modelo anterior, a uma genealogia que o
determine ou que o condicione” (p. 10). Percebemos na tentativa de
delimitação conceitual dessa arte, a grande questão que rege as dificuldades
encontradas por seus formadores e criadores: a compreensão e a transmissão
sobre o que abarca as qualidades físicas e criativas do seu próprio fazer.
O olhar por sobre o processo de criação e interpretação do trabalho
artístico Sonoplásticos da Companhia de dança da UFRJ nos fornece um lugar
estratégico e fundamental como uma configuração estética específica, para
refletir sobre como os conteúdos se encontram, e mais, como eles se integram
na corporeidade dançante. Ressaltamos nesse contexto a importância do
momento da experiência e do processo de investigação que produz novas
conexões sobre a dança tanto no âmbito da singularidade vivida (de dentro da
experiência) como no âmbito da produção teórica.
Sonoplásticos é desenvolvido pela pesquisa sonora produzida pelo
corpo na relação com diferentes objetos plásticos. Sacos, chocalhos e
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armações de garrafas pet produzem uma composição de melodias, ritmos e
sentidos sonoros pelos corpos que se movimentam através do espaço cênico.
Cada apresentação é transformada em função do tamanho do espaço, da
interação com o público e da intensidade de energia do grupo na interpretação
da dança.
Para entrar nesse processo de investigação do movimento em
Sonoplásticos foi fundamental considerar o ritmo como um elemento que não
se caracterizasse somente como um conjunto de durações ou “uma sequência
de alturas, dinâmicas ou articulações. O ritmo é muito mais que isso; é uma
ideia inteira com vibração suficiente para transmitir possibilidade de significar
sua vibração seja na vida cotidiana ou na vida artística” (SANCHÉZ, 2010:
111). Nesse sentido, o movimento tomou uma dimensão imponderável na sua
relação de tempo, espaço e subjetividade, sendo necessário um mergulho na
obra e seu desvelamento a cada apresentação.
No processo de experimentação de cada espetáculo foi possível
perceber essa investigação insistente e constante que fazia com que os
movimentos acontecessem integradamente ao preenchimento desse tempo-
espaço nas relações em rede: intérpretes, objetos cênicos e público.
Corporeidade Dançante
Partimos, em primeiro momento, da reflexão sobre a corporeidade
dançante, no sentido de entender que o corpo é um espaço, um lugar, não
somente onde a diversidade de realidades tem a possibilidade de atuar juntas,
mas e principalmente, de produzir efetivamente integrações potentes e
momentos criativos.
Segundo o filósofo Michel Bernard (2001), a corporeidade é uma
entidade móvel, feita de atividade perceptiva e ficcional, modulada pela história
individual e coletiva do sujeito e onde a materialidade corporal, desejo, pulsão,
linguagem, gesto e imaginário se entrecruzam e interpenetram. Ou seja, é
espectro sensorial e energético de intensidades heterogêneas e dinâmicas.
Uma trama constituída entre os sentidos cujo funcionamento global está
baseado no imaginário e na projeção promovendo uma relação de alimentação
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e retroalimentação. A atividade específica da corporeidade dançante que ele
denomina como orchésalité configura-se pelo jogo entre o movimento visível e
o invisível, ou seja entre a dinâmica sensível e a articulação cinética do
movimento: "em suma, a orchésalité é a ressonância dinâmica ou cinética e a
transmutação visível do fluxo aleatório da nossa musicalidade corporal”
(BERNARD, 2001: 174).
Ainda, para ele, o momento dançante é da ordem de uma
“temporalidade corporal” ou de uma “corporeidade temporal”, por designar uma
rede de forças heterogêneas que compõem o tecido percepto-motor, afetivo e
intelectual e que determina suas modulações como um campo aberto e
maleável entre a corporeidade e o meio. Assim, o artista tem a capacidade de
atuar sobre esse mecanismo de agenciamento das modalidades temporais que
regulam ou orquestram o jogo de conexões dos “fios” que compõem o tecido
perceptivo, determinando as qualidades gestuais e modulações artísticas.
O que eu vejo, ouço, toco se implanta e ao mesmo tempo se autodestrói pelo jogo da sucessão de instantes uma vez idênticas na sua emergência e diferentes pelas suas ordens de inscrição, sua qualidade sensorial e sua tonalidade afetiva e intelectual (BERNARD, 2001: 211).
Portanto, cada corporeidade dançante se delineia na singularidade de
cada um, pela qual os dados sensoriais e físicos se integram e retroalimentam
essa gestão energética produzindo imagens, sensações, percepções, reflexões
e tonalidades cinéticas sempre renovadas. Isso quer dizer que o processo de
diálogo entre as diferentes realidades, como por exemplo, na relação entre o
som e movimento em Sonoplásticos, se dá na corporeidade e na experiência
dançante, mas, entretanto, depende do quanto o sujeito investe sensivelmente
na ação de mover-se.
Pensando desta forma, podemos afirmar que a dança se constitui não
somente na superfície do corpo. Através da noção de uma especificidade da
corporeidade dançante, ela é construída com e em todas as suas “camadas”:
com todo o seu corpo, suas práticas, sua história, suas influências. As práticas
contemporâneas da dança se valem de todos esses atravessamentos,
conferindo ao corpo em todas as suas instâncias, material de trabalho.
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Em dança, movimento, imagem, forma do corpo se agenciam sobre um mesmo plano. As práticas que fazem a dança contemporânea juntam-se justamente pelo corpo, em torno da maquinaria de cada corpo. As imagens tocam os corpos porque elas intervém sobre isso que chamamos 'plano dos corpos'. Esse plano não repousa sobre a superfície corporal. Ele é, ao contrário, denso, espesso, consistente como a matéria corporal. O 'plano dos corpos' indica uma certa perspectiva do corpo, um certo nível que difere do 'plano de representação' dos corpos (GADELHA, 2010: .46-47).
Na busca incessante de captar as forças, entretanto, é importante
ressaltar a diferença entre o simples encontro dessas forças e a efetiva
integração delas, fazendo-nos pensar sobre o que significa integrar saberes,
técnicas, corpo e sensibilidade. Para isso é importante refletirmos sobre o valor
da experiência.
O Fazer como Campo de Investigação
Experiência e processo de experimentação
Como se apreende o sentido de uma maçã? Comendo-a”, escreve Fernando Pessoa. Os órgãos sensoriais, o corpo e as suas funções tecem sentidos com o mundo que só eles estão em condições de compreender imediatamente e sem “reenvio”. Qual é o sentido do vermelho? Esgota-se na sua percepção, de imediato e totalmente – e esse sentido revela-se inesgotável pela linguagem. Do mesmo modo há movimentos corporais que contêm em si a sua significação completa (GIL, 2004: 86).
O processo de experimentação na dança é fundamental para a
maturação, aperfeiçoamento e produção da linguagem corporal. É a partir do
processo de experimentação que é possível trabalhar sobre os conteúdos,
ideias, pensamentos e materiais recriando-os, transformando-os e servindo-se
deles como novos alimentos. Também se designa como um lugar estratégico
de produção estética e reflexiva, onde a diversidade de aspectos do eu e do
mundo tem a possibilidade de serem testadas, exercitadas e digeridas juntas.
Em Sonoplásticos, há um esforço para que a relação entre o som e o
movimento alcance tal nível de integração onde o público já não consiga
distinguir os dois separadamente como imagem e sonoridade. Para esta
realização, o processo de experimentação foi essencial, foi também
imprescindível respeitar o tempo das experiências, pois todo processo de
formação técnica e de abertura ao sensível no fazer deve-se à maturação das
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experiências. É necessário tempo de prática, de experimentação, de reflexão e
de conscientização de si e do seu fazer.
A experiência, então, compõe todo esse processo de investigação
comportando-se como um substrato fundamental. Assim, para este estudo a
vivência interna do processo cênico se refere ao olhar por sobre cada
experiência, não deixando que ela não se designe somente para a produção,
mas e, sobretudo, conferindo-lhe como atividade de investigação em todos os
níveis, que vão desde as escolhas de movimentos, até os caminhos sensíveis
que levam potência ao fazer.
Segundo o filósofo André Abath, em palestra realizada no III Encontro da
ANDA/2013 (Palestra intitulada A Revanche do Corpo: filosofia da mente
apreensão do mundo, em 27 de maio de 2013, na Escola de Dança da
Universidade Federal da Bahia/UFBA- Salvador), o artista tem uma relação
com o mundo muito particular. Ele explica, através da fenomenologia, que o
fazer artístico revela a possibilidade de experimentarmos o mundo em nós
mesmos intensamente e não apenas objetivamente. Essa experiência se
traduz como uma intensificação da subjetividade do "Corpo Próprio", no qual a
consciência se torna incorporada. Em outras palavras, muitas vezes dançamos
e estabelecemos com essa dança relações com o mundo, mas poucas vezes
todo o nosso corpo está totalmente imbuído e voltado para o presente. Abath
descreve esse momento como “estar em situação", completamente presente
naquilo que experimentamos. Esse olhar fenomenológico nos indica que o
mundo é efetivamente apreendido por uma consciência incorporada, que
acontece no corpo, entendido em sua totalidade, como integração física,
mental e emocional, no momento da experiência.
Portanto, a experiência da dança, se torna o lugar onde há a
possibilidade de se colocar em ação a atividade específica da corporeidade
dançante. Durante a experiência é possível vivenciar intensamente e
especificamente o fazer na dança, é estar "dentro da dança", sentindo o corpo
contaminado pelos fenômenos do mundo e, ao mesmo tempo, respondendo ao
mundo pelo agenciamento das energias e da sensação de estar no mundo
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vivendo o presente. Lugar onde o mundo interior consegue se integrar ao
exterior criando novos mundos.
O autor José Gil aborda o espaço exterior como espaço objetivo do
corpo, material onde são percebidas as formas exteriores e o espaço interior
sendo o espaço subjetivo dos pensamentos e dos afetos. Estes espaços estão
em todo momento se confundindo e em relação através do que ele denomina
de “espaço limiar” que tem por característica a flexibilidade de se prolongar
tanto para dentro como para fora: o interior no exterior e vice-versa. É através
das “zonas dos sentidos”, que inclui a pele e também os orifícios do corpo que
se estabelecem esses espaços limiares. É nesta zona fronteiriça entre o eu e
mundo onde se situa o sujeito da percepção e não se trata de uma superfície,
mas um espaço volumoso, uma interface que leva a profundidade da alma. É
aí, que reside o que esta pesquisa vêm destacando enquanto pretensão
poética do fazer na dança: os lugares "abertos", lugares onde ao experimentar
o próprio ato (de experimentação), é possível não mais dissociar sujeitos e
objetos mas, a integração de tudo. Estes lugares surgem em "saltos" e são
fruto de um intenso investimento nos movimentos e relações, das mais sutis às
mais concretas.
Investigar e Integrar
O bailarino experimenta no corpo a diferença das forças implicadas na passagem de uma posição para outra, de um gesto para outro (no interior de uma sequencia, por exemplo). É a diferença dos níveis de energia que lhe permite avaliar a leveza do movimento. É, uma vez mais, como se tivesse permanentemente dois corpos consigo: um que o puxa para baixo e cujo peso deve vencer; o outro que visa a ausência de peso. O primeiro entrava cada vez mais os movimentos, como um corpo estranho alojado em seu corpo; enquanto ele adere cada vez mais ao segundo que doravante lhe pertence a ponto de deixar de aparecer como um corpo-objeto (GIL, 2004: 21).
Integrar-se na ação significa tecer instantes de convergência entre
pensamento, físico e emoção. Significa um dispêndio de um esforço sobre
essas relações, sobre a corporeidade, sobre a experiência e durante a
experiência. Significa esforçar-se, liberando as potencialidades ali existentes,
no sentido de desobstruir os caminhos para a consciência de si. Entretanto, é
interessante lembrar que, para Rudolf Laban (1971, 1990), a dança não é
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causada pelo esforço, mas ela é o esforço propriamente dito. Não é
determinada por todos os conhecimentos e métodos, ela é entendida com mais
amplitude, como algo que se pode desvelar nas ações humanas.
Podemos desta forma, utilizar os elementos técnicos (elementos da ação
corporal) como meios para a abertura e desvelamento das potencialidades do
corpo, principalmente no que diz respeito a sua integração e a busca de uma
totalidade nas ações. O exercício da técnica corporal não necessita se
desvincular de um processo criativo. O rigor e a disciplina no fazer podem
acompanhar a descoberta de diferentes possibilidades da ação. Quando
entendemos o processo de criação e de instrumentalização técnica de forma
integrada entendemos os modelos criados como possibilidades corporais e não
como padrões para a aquisição de habilidades físicas. Os meios técnicos se
confundem e integram o próprio corpo vivo transformando-o num devir de
experimentações, num corpo vivido. Os meios técnicos são importantes
enquanto delineadores estéticos do trabalho, mas principalmente, como um
meio de acesso à singularidade de atuação e à potência de invenção de cada
um dos intérpretes.
Na dança, o meio técnico está imbricado na corporeidade e pode
usufruir de um vasto campo de aspectos, vocabulários, elementos,
experiências e histórias que dialogam entre si e delineiam os caminhos
estéticos e criativos. A arte não pode existir sem a técnica, sem o seu modo de
fazer específico. Eis porque o artista consegue ser tanto mais artista quanto
menos esquecer de ser, antes de tudo, um artesão. Não é pertinente a
atividade artística fragmentar-se em uma parte original, inventiva e uma parte
mecânica, fabril, já que o “ato artístico é todo criativo, e, ao mesmo tempo,
técnico” (PAREYSON, 2001: 171).
As vastas reservas da herança moderna e as riquezas infinitas das práticas, das filosofias corporais e dos diversos ensinamentos incessantemente em mutação permitiram ao bailarino de hoje, talvez mais modestamente, não inventar o corpo, mas procurar compreender, apurar e aprofundar o seu corpo e, sobretudo, fazer dele um projecto lúcido e singular (LOUPPE, 2012: 70).
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Conceber as possibilidades do corpo como alfabeto de uma linguagem
articulada pelos movimentos e gestos amplia nosso entendimento da
necessidade acerca da insistência nos processos de investigação dos
conteúdos que permeiam as possibilidades de combinações e variações desse
corpo.
O fazer na dança, portanto, parece ser construído nesse espaço limiar,
nesse entre-lugar, ou seja, numa convergência dinâmica destes encontros que
refletem o constante gerenciamento do bailarino quando está em ação, tal
como destaca Gil: “é este que modula a maneira como o interior sai do, ou
permanece no corpo, segundo modalidades infinitas” (GIL, 1997: 158).
Portanto, o fazer na dança que busca um corpo que esteja " 100% em
situação" parece um espaço não limitado, não fixo, ele necessita ser
constantemente modulado, reforçado e ajustado porque lida com o movimento
da oscilação afetiva, física e mental. Na experiência, vista pelo viés da 1ª
pessoa, ou seja, de "dentro da sua experiência", a corporeidade dançante é
entendida menos como objetiva e mais como subjetiva na medida em que ela
se torna sempre um potencial para ação junto à demanda do mundo. Observar
atentamente aos chamados do mundo, aflorando os sentidos, pode levar a um
estado de disponibilidade do corpo.
É por uma insistência nestas relações moventes e permanentes que o
bailarino busca intensificar a própria experiência enquanto situação no tempo
presente, incorporando sua consciência, gerenciando seus sentidos, gerando
mais ação e, por conseguinte, tecendo novas relações. Na dança, esta trama
intensiva e recorrente cria modos de existência, acentua a complexidade das
interseções em vários âmbitos e acentua a potência de ação dessa diversidade
de forças que vem de fora e de dentro do corpo, colocando em jogo o visível e
o sutil. O filósofo Henri Bergson (2006) pontua a importância da cadeia de
movimentos e imagens, quando comenta a dinâmica perceptiva que envolve o
interior e o exterior do corpo:
Percebo bem de que maneira as imagens exteriores influem sobre a imagem que chamo meu corpo: elas lhe transmitem movimento. E vejo também de que maneira este corpo influi sobre as imagens
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exteriores: ele lhes restitui movimento (...) mudem-se os objetos, modifique-se sua relação com meu corpo, e tudo se altera nos movimentos interiores de meus centros perceptivos. Mas tudo se
altera também em „minha percepção‟. Minha percepção é portanto
função desses movimentos moleculares, ela depende deles (BERGSON, 2006: 14).
Investigar, portanto, para esse estudo é mergulhar profundamente na
experiência, percorrer diferentes níveis até a intuição. Investigar é testar
possibilidades, selecionar e gerenciar escolhas gestuais e ao mesmo tempo,
conscientizar-se e perceber-se fazendo, deixando-se experimentar-se, testando
a própria potencialidade de se reinventar em cada detalhe a cada instante.
O fato é que arte não é somente executar, produzir, realizar, e o simples 'fazer' não basta para definir sua essência. A arte é também invenção. Ela não é execução de qualquer coisa já ideada, realização de um projeto, produção segundo regras dadas ou predispostas. Ela é um tal fazer que, enquanto faz, inventa o por fazer e o modo de fazer. A arte é uma atividade na qual execução e invenção procedem pari passu, simultâneas e inseparáveis, na qual o incremento de realidade é constituição de um valor original. Nela concebe-se executando, projeta-se fazendo, encontra-se a regra operando, já que a obra existe só quando é acabada, nem é pensável projetá-la antes de fazê-la e, só escrevendo, ou pintando, ou cantando é que ela é encontrada e é concebida e é inventada (PAREYSON, 2001: .25-26).
Assim como Pina Baush suscitava: “o que move o corpo que dança?”,
podemos nos perguntar: o que move a dança dentro da multiplicidade de
formas, maneiras, métodos e configurações estéticas? Muitas coisas fazem o
corpo mover, mas poucas maneiras de mover o corpo podem produzir sentidos
e significados:
Assim, voltamos novamente ao conflito entre duas necessidades: de um lado, a liberdade absoluta de abordagem, a aceitação de que 'tudo é possível', e por outro lado o rigor e a disciplina, fazendo ver que 'tudo' não pode ser simplesmente 'qualquer coisa' (BROOK, 2010: 52).
Investigar e Refletir de dentro da Dança:
Doravante, a abordagem teórico-crítica da dança ultrapassará como muito justamente assinalou Gay Morris, a questão de saber “como é que a dança deve ser estudada e analisada”, em proveito do“ lugar da dança na cultura e na história”. Por outras palavras, trata-se não tanto do que trabalha a dança, mas do que a própria dança trabalha, o meio humano no qual ela desenvolve as suas possibilidades e de que ela própria propõe um saber (e uma interpretação) (LOUPPE, 2012: 35).
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Refletir, portanto, sobre esse fazer-atuar na dança significa, para este
estudo, uma reflexão que não se limita somente à produção teórica ou textual,
mas uma reflexão que se dá no e através do interior da própria experiência
dançante, levando em consideração e ressaltando que ela se faz em meio a
uma rede complexa, maleável, de aspectos que se transformam a cada
instante.
Neste sentido, a atuação dançante revela-se como um lugar de
investigação permanente, porque diz respeito à lógica de um processo em
movimento, que incita movimentos e dá corpo à cena. Um lugar, que
arriscamos dizer, de investigação da experiência que leva em consideração: a
produção e organização de conteúdos sensíveis que são próprios da
experiência dançante e a singularidade e a potência que, de certa forma,
privilegia essa experiência àquele que atua, no instante e na intensidade em
que atua. Para integrar as instâncias, elementos, saberes é preciso investir
sobre o fazer, investigando-o. As reflexões que surgem desse processo dizem
respeito às reflexões específicas e únicas que se produzem a partir da
experiência dançante e, principalmente, durante ela: o ato de dançar é também
investigar pela lógica e usando os elementos que participam daquele momento
único.
É nesse sentido do pensamento que tentamos operar na seleção de
estratégias para o desenvolvimento de corporeidades dançantes. As reflexões
de Laurence Louppe (2012) nos auxiliam na investigação desse novo
entendimento sobre esse corpo:
Ora, num sector de expressividade ainda indistinto e mal explorado pelos saberes estéticos, a dança diz tanto respeito à ontologia como à filosofia da arte. Diz respeito ao conjunto das ciências do Homem. Nessa medida, o essencial da poética na dança depende, sem dúvida, menos de uma abordagem estética, que é a nossa, do que dos saberes sobre o movimento e dos modos de análise que observam em simultâneo as suas funções e as suas finalidades. A cinesiologia e os diferentes métodos de análise do movimento são ainda mais indispensáveis para o estudo da arte da dança do que a linguística para os estudos literários (LOUPPE, 2012: 29).
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Podemos dizer que se a análise e a compreensão do movimento são
indispensáveis para o estudo da arte da dança, o domínio do corpo precisa de
alguns parâmetros do conhecimento para que, ao serem desenvolvidos, sejam
transformados em referências das possibilidades da ação. Assim, para que o
corpo seja atravessado pela experiência do presente, do instante, do que
podemos chamar de intuitivo, ele precisa fundamentalmente de um
conhecimento experimentado e compreendido. Esse conhecimento está
relacionado diretamente aos fundamentos: espaço, forma, movimento (partes
envolvidas), dinâmica e tempo. Sem compreender e experimentar
possibilidades do corpo como exercício de combinações dessa rede de
elementos, o intérprete terá dificuldade de transformar esse corpo em um corpo
inteiro em cena, “100% em situação” (ABATH, ANDA, 2013).
Conceituar e aplicar os parâmetros da dança delimitando seus sentidos,
bem como seus elementos de variação, significa investigar e descobrir
ferramentas para o afloramento de intérpretes autônomos, pesquisadores de
seu próprio fazer. A questão não é mais a cópia e a repetição de movimentos
de outros corpos, pois para além de uma simples reprodução de uma ação, o
sujeito, ao ter consciência e autonomia de seus gestos, se apropria do
movimento do outro produzindo uma ação única, porque é singular e efêmera.
Quando um modelo de movimento produzido por alguém se caracteriza apenas
como uma possibilidade de ação e não um padrão a ser adquirido como
habilidade, ele pode ser instrumento de formação técnica coadunada à
experimentação criativa do corpo, ou seja, propulsora do exercício da
criatividade reflexiva. Entender e investigar possibilidades da ação corporal
significa buscar a amplitude de um vocabulário que se desenvolve e aprimora
conforme a insistência na experiência de produzir, transformar, criar, improvisar
e interpretar movimentos dançantes.
Na minha opinião, só existe uma dança contemporânea desde que a ideia de uma linguagem gestual não transmitida surgiu no início do século XX; ou melhor, através de todas as escolas, eu reencontro, talvez não os mesmos princípios estéticos, mas os mesmos valores. Esses valores (a que Françoise Dupuy chama “fundamentos da dança contemporânea”) sofrem abordagens por vezes opostas, mas sempre reconhecíveis: a individualização de um corpo e de um gesto
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sem modelo que exprime uma identidade ou um projecto insubstituível, a produção (e não a reprodução) de um gesto (a partir da esfera sensível individual - ou de uma adesão profunda e cara aos princípios de um outro), o trabalho sobre a matéria do corpo e do indivíduo (de maneira subjectiva ou, pelo contrário, em acção na alteridade) a não antecipação sobre a forma (ainda que os planos coreográficos possam ser traçados de antemão, como em Bagouet ou Lucinda Childs) e a importância da gravidade como impulso do movimento (quer se trate de jogar com ela ou de se abandonar a ela). Em causa estão também valores morais com a autenticidade pessoal, o respeito pelo corpo do outro, o princípio da não-arrogância, a exigência de uma solução justa, e não somente espectacular, a transparência e o respeito por diligências e processos empreendidos (LOUPPE, 2012: 45).
Segundo Louppe (2012) as raízes do projeto contemporâneo da dança
estão na “descoberta de um corpo que encerra um modo singular de
simbolização, alheio a qualquer movimento preconcebido” (p. 62). Mas na
verdade, para que aconteça a descoberta desse corpo enquanto expressão
singular é fundamental compreendê-lo a partir de ferramentas referenciais que
envolvam diferentes possibilidades na ação de dançar. Essas ferramentas
referenciais encerram conjuntos de possibilidades infinitas de combinações de
movimentos do corpo. Os movimentos básicos anatômicos, as combinações
simultâneas e sucessivas desses movimentos, as bases de apoio, os planos e
níveis do corpo e suas relações com o espaço externo, o delineamento das
formas, as forças aplicadas aos gestos, as variações temporais, enfim, são
alguns elementos que podem orientar o corpo em suas descobertas e ao
mesmo tempo são conhecimentos/conteúdos da própria linguagem da dança.
Sem recorrer a modelos preconcebidos, o corpo pode ser uma potência criativa
quando investigado a fundo, seja de forma analítica ou espontânea.
É certo que a ruptura epistemológica operada pela dança contemporânea é ainda mal percepcionada. Esta ruptura pretende, como veremos, que o corpo, e sobretudo o corpo em movimento, seja ao mesmo tempo sujeito, objeto e ferramenta do seu próprio saber, e é a partir dela que uma outra percepção e uma outra consciência do mundo poderão emergir. Constitui, sobretudo, uma nova maneira de sentir e de criar (LOUPPE, 2012: 21).
A partir do exercício laboratorial do corpo, experimentando elementos
diversificadores relacionados ao movimento, ao espaço, a dinâmica e ao tempo
na criação e interpretação de partituras, preparamos um corpo fértil para a
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constante renovação da linguagem, um corpo que “seja ao mesmo tempo
sujeito, objeto e ferramenta do seu próprio saber” (LOUPPE, 2012: 42).
Sobre a Permeabilidade e a Especificidade da Investigação da Dança:
Conquistas e Perspectivas
Podemos perceber atualmente que a experiência da dança vem se
contaminando pelo atravessamento de outros saberes. Observamos também
que muitas vezes os conhecimentos de outras áreas acadêmicas sustentam e
até mesmo justificam ideias e pensamentos específicos da própria dança.
Nesse sentido, queremos ressaltar a importância de voltar nossa atenção para
o desenvolvimento de um pensamento vinculado diretamente à linguagem da
dança, que se esforce em destacar sua própria matéria, seu conteúdo e seu
modo específico de produzir conhecimento.
Nesse contexto, o artigo procurou aprofundar o sentido da experiência
dançante valorizando o lugar da práxis artística como um fundamental espaço
de pesquisa. Ressaltamos que a construção diária do intérprete da dança se dá
nesse processo insistente de investigação que passa por uma formação ampla
e concisa, que abrange a teoria e a experimentação prática.
Buscamos enfocar a importância da compreensão e da aplicação do
saber próprio da dança, considerando-o como o instrumental que amplia e
aprofunda sua fala, em termos teóricos e artísticos.
Assim, é salutar compreendermos a existência de um discurso
acadêmico que se origina diretamente desse processo de investigação prática.
Entretanto, há nessa forma de discurso uma certa ruptura com uma tendência
racionalista, própria do discurso acadêmico, na medida em que a pesquisa
artística abrange sutilezas e minúcias muitas vezes próximas ao universo
sensível do ser humano. Encontramos objetivamente algumas dificuldades que
Sánchez nos ajuda a elucidar:
Se a arte é da ordem de um saber que se desenrola pela via do sensível de cada um, como torná-lo universal, universitário? Como construir uma prática que possa ser levada aos estudantes de artes cênicas? Podemos trabalhar o saber como um saber fazer, um savoir-faire? De fato, o que se busca é construir um conhecimento especulativo do que seria a percepção da maneira de operar um
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processo criativo próprio, de descrever uma experiência prática artística (SÁNCHEZ, 2010: 84).
Procuramos assim operar alguns conceitos que apontassem novas
ferramentas para a construção/organização de um discurso próprio da dança.
Nesse processo de desvelamento de possibilidades discursivas desta arte,
destacamos a importância da prática como campo de investigação significativa
para a descoberta desse discurso específico da sua materialidade.
Compreendemos ainda a dificuldade de encontrar um espaço para a
produção em arte dentro da academia. Reconhecemos um avanço significativo
na criação de uma política quando observamos o lançamento de novos editais
de bolsas de iniciação artística e de apoio a novas produções e eventos. É
verdade que estamos progredindo, mas nos perguntamos ainda: existe um
espaço consistente para a formação, a pesquisa e a produção em arte na
universidade? Será que ainda somos a “alegria” e o “divertimento” nos
intervalos dos grandes encontros, congressos e seminários acadêmicos?
Ainda temos muito o que avançar na conquista de um espaço legítimo,
integrando um pensamento lógico-científico a um pensamento/fazer sensível-
artístico, desafio maior das conquistas já realizadas até o presente. Desejamos
que a criação e o aprimoramento da Associação Nacional de pesquisadores
em Dança (ANDA) seja uma das formas de luta para a conquista do mérito e
de um novo discurso da nossa grande arte.
Referências
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BERNARD, Michel. Le Corps. Éditions Du Seuil, 1995.
_______________. De la création chorégraphique. Centre National de la Danse, 2001.
BROOK, Peter. A porta Aberta: Reflexões sobre a Interpretação e o Teatro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.
GADELHA, Rosa Cristina Primo. Corpografias em Dança Contemporânea. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará, (UFC), 2010.
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LABAN, R. Domínio do Movimento. São Paulo: Summus, 1971.
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PAREYSON, Luigi. Os Problemas da Estética. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
SÁNCHEZ, Lícia Maria Morais. A dramaturgia da Memória no Teatro-Dança. São Paulo: Perspectiva, 2010.
SEIDLER, Lara. Dancidade: gesto como campo de circulação de forças. Tese de doutorado. Artes Visuais-Escola de Belas Artes, UFRJ, 2012.
Lara Seidler Professora dos cursos de bacharelado, licenciatura e teoria da dança (UFRJ). Doutora em Artes Visuais pela UFRJ, coordenadora do projeto de pesquisa Dança e outras artes (D.O.A/UFRJ), integrante do Grupo de Pesquisa Artes do Corpo (GPAC/UFRJ). E-mail: [email protected] Maria Inês Galvão Souza Professora dos cursos de bacharelado, licenciatura e teoria da dança (UFRJ). Doutora em artes cênicas pela UNIRIO (2010) é coordenadora do Grupo de Pesquisa das Artes do Corpo (GPAC), do Programa de Iniciação e Profissionalização Artística em Dança da UFRJ. Desde 2010 integra o Grupo de Pesquisa Sentido e Forma desenvolvendo pesquisas e espetáculos teatrais junto a docentes da UNIRIO e da UERJ. E-mail: [email protected]