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Paula Clarissa de Souza
A CONTRIBUIÇÃO DOS PROJETOS DE EXTENSÃO DE
CUNHO SOCIAL PARA A FORMAÇÃO CIDADÃ DO ALUNO
DO INSTITUTO FEDERAL DE SANTA CATARINA À LUZ DA
RESPONSABILIDADE SOCIAL UNIVERSITÁRIA
Dissertação submetida ao Programa de
Pós-Graduação em Administração
Universitária da Universidade Federal
de Santa Catarina para a obtenção do
Grau de Mestre em Administração
Universitária.
Orientadora: Prof.ª Marilda Todescat,
Dr.ª
Florianópolis
2016
Catalogação na fonte por Graziela Bonin - CRB14/1191.
S729c Souza, Paula Clarissa de
A contribuição dos projetos de extensão de cunho social para a formação
cidadã do aluno do Instituto Federal de Santa Catarina a luz da
responsabilidade social universitária / Paula Clarissa de Souza; orientadora,
Marilda Todescat. - Florianópolis, SC, 2016.
158 p.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro
Socioeconômico. Programa de Pós-Graduação – Mestrado Profissional em
Administração Universitária.
Inclui referências
1. Responsabilidade – social universitária. 2. Formação cidadã. 3.
Extensão universitária. 4. Gestão universitária. I. Todesca, Marilda. II.
Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em
Administração Universitária. III. Título. CDU 35
Paula Clarissa de Souza
A CONTRIBUIÇÃO DOS PROJETOS DE EXTENSÃO DE
CUNHO SOCIAL PARA A FORMAÇÃO CIDADÃ DO ALUNO
DO INSTITUTO FEDERAL DE SANTA CATARINA À LUZ DA
RESPONSABILIDADE SOCIAL UNIVERSITÁRIA
Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de
“Mestre”, e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-
Graduação em Administração Universitária da Universidade Federal de
Santa Catarina.
Florianópolis, 25 de maio de 2016.
___________________________________
Prof.ª Alessandra de Linhares Jacobsen, Dr.ª
Coordenadora do Curso
Banca Examinadora:
___________________________________
Prof.ª Marilda Todescat, Dr.ª
Orientadora Universidade Federal de Santa Catarina
___________________________________
Prof.ª Alessandra de Linhares Jacobsen, Dr.ª
Universidade Federal de Santa Catarina
___________________________________
Prof.ª Evelize Welzel, Dr.ª
Universidade Federal de Santa Catarina
___________________________________
Prof. Douglas Juliani, Dr.
Instituto Federal de Santa Catarina
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por me dar força para enfrentar todos os
desafios e me mostrar que sou capaz de enfrentá-los.
Ao meu filho, Pedro Eduardo, que me proporcionou o amor
incondicional, enchendo-me de coragem para lutar por dias melhores.
Aos meus pais, que sempre estiveram muito presentes e foram
grandes apoiadores desse projeto. À minha mãe, principalmente, que por
vezes, veio à Florianópolis para me socorrer em momentos de muitas
tarefas.
À minha professora orientadora, Profa. Dra. Marilda Todescat,
por sua gentileza em todas as orientações e, principalmente, por ter
proporcionado liberdade na escolha do caminho a ser percorrido e ter
possibilitado minha identificação e realização com o estudo.
À minha tia, Maria José, que sempre me incentivou e me
impulsionou para grandes desafios.
Aos meus colegas e amigos da Diretoria de Extensão no IFSC,
pois foram essenciais para me tranquilizar e me apoiar nessa empreitada.
Principalmente, aos meus queridos amigos, Ania, Cristina, Douglas e
Márcio, por ouvirem meus desabafos.
Às minhas amigas Ani Rasia, Juliana Ribeiro, Juliana Ludwig,
Morgana, Luciane e Paula Rassi, amigas de longa data, que foram
sempre incentivadoras nos momentos de desafio.
Aos meus colegas e amigos da turma de mestrado, os quais foram
sempre grandes apoiadores uns dos outros, demonstrando sempre um
sentimento de solidariedade nas aulas.
Aos professores do PPGAU, pelos mestres incríveis que são,
agradeço pela gentileza, pelos ensinamentos, pela dedicação e
competência.
Aos participantes dessa pesquisa, que não mediram esforços para
colaborar com esse estudo, de maneira muito rica nas informações e
contribuições.
RESUMO
Nas instituições federais de ensino superior, assim como nas
universidades e nos institutos federais de educação, a conscientização da
importância da Responsabilidade Social se faz cada vez mais necessária
devido aos aspectos legais e éticos, na medida em que as instituições
devem dar retorno à sociedade sobre seus gastos públicos. A
responsabilidade social universitária se dá em quatro dimensões
principais: na gestão, no ensino, na pesquisa e na extensão. O objetivo
deste estudo foi analisar a contribuição dos projetos de extensão de
cunho social para a formação do aluno do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Santa Catarina à luz da Responsabilidade
Social Universitária. Para atender ao objetivo geral, o estudo se propôs a
descrever os projetos de cunho social cadastrados na extensão da
instituição no ano de 2014; avaliar a formação do aluno participante nos
projetos sociais existentes nos campus na perspectiva dos coordenadores
e alunos envolvidos; e, propor melhorias para a gestão dos projetos de
extensão na instituição sob o enfoque da responsabilidade social
universitária. Metodologicamente, este trabalho foi decorrente de um
estudo de caso de predominância qualitativa, caracterizando-se, ainda,
como uma pesquisa bibliográfica, descritiva e aplicada, baseada em uma
estrutura teórica e conceitual pertinente ao tema. A coleta de dados se
deu por meio de entrevista semiestruturada com os coordenadores e com
os alunos envolvidos nos projetos sociais da instituição. A análise dos
dados utilizou a técnica de Bardin. Por meio da análise das entrevistas
foi possível perceber a importância da participação do aluno nos
projetos de cunho social. Constataram-se aprendizados adquiridos e o
reforço de competências que contribuem para sua formação cidadã.
Dentre elas, estão a formação e o fortalecimento de uma atuação ética
frente a situações da sociedade, respeito à diversidade de todos os tipos,
conscientização da importância da interação dialógica, assim como da
criatividade e inovação nas atividades propostas pelos projetos. Enfim, o
aluno foi capaz de repensar seus direitos e deveres enquanto cidadãos,
concomitantemente, e também puderam refletir e proporcionar cidadania
à comunidade atendida. Além disso, foram propostas algumas
contribuições para o fortalecimento da Extensão com relação a esses
projetos, os quais desempenham papel no cumprimento da missão
institucional, na medida em que proporcionam uma formação cidadã ao
aluno e atendem às demandas da sociedade.
Palavras-chave: Responsabilidade Social Universitária. Formação
Cidadã. Extensão Universitária. Gestão Universitária.
ABSTRACT
In the federal institutions of higher education, as well as in universities
and federal institutes of education, awareness of the importance of
Social Responsibility makes increasingly necessary due to legal and
ethical aspects, considering that institutions must give return to society
on their public spending. The university social responsibility can be
happen in four main dimensions: in the management, in teaching, doing
research and university extension. The aim of this study was to analyze
the contribution of social extension projects for the student's training of
the Federal Institute of Education, Science and Technology, taking into
account and in accordance with university social responsibility. To meet
the overall objective, the study aimed to identify the extension projects
developed in the IFSC in the year 2014; identify the community social-
oriented projects registered in the institution's extension in the year
2014; and evaluate the student's training in social projects and evaluate
existing community social projects on university campus from the
perspective of the coordinators and students involved.
Methodologically, this work was a result of a predominantly qualitative
case study, featuring, as a bibliographical research, descriptive and
applied, based on a theoretical and conceptual framework relevant to the
topic. Data collection was made by semi structured interview with
coordinators and questionnaire with students involved in social projects.
Data analysis used the technique of Bardin. Through the analysis of the
interviews it was possible to realize the importance of student
participation in social projects, the acquired learning and the
strengthening of skills that contribute to its Education for Citizenship
and therefore a better citizen formation. Among them is the formation,
development and strengthening of an ethic performance confronting the
society situation, respect for diversity of all kinds, awareness of the
importance of the dialogical interaction, as well as, of creativity and
innovation in the proposed activities by projects. Finally, the student
was able to rethink their rights and duties as citizens, at the same time,
they also were able to reflect and provide citizenship to the attended
community. In addition, some contributions have been proposed to
strengthen the extension referring to those projects, which play a role in
fulfilling the institutional mission, to the extent that they provide a
citizen training students and meet the demands of society.
Keywords: Social responsibility. University Management. Education
for Citizenship. University Extension.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Pilares da RSU ...................................................................... 49
Figura 2 - Gestão Universitaria e RSU .................................................. 66
Figura 3 - Câmpus distribuídos por Santa Catarina ............................... 82
Figura 4 - Investimentos PROEX 2014 ................................................. 86
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Conceitos de Responsabilidade Social Universitária .......... 46
Quadro 2 - Competências cidadãs ......................................................... 56
Quadro 3 - Conceitos e principais autores ............................................. 70
Quadro 4 - Região e projeto .................................................................. 71
Quadro 5 - Competências da Formação Ética e Cidadã ........................ 74
Quadro 6 - Resumo da metodologia do estudo ..................................... 76
Quadro 7 - Missão, visão e valores do IFSC ......................................... 81
Quadro 8 - Perfil dos coordenadores ..................................................... 93
Quadro 9 - Perfil dos alunos .................................................................. 94
Quadro 10 - Competências da Formação Ética e Cidadã ...................... 94
Quadro 11 - Atuação ética ..................................................................... 97
Quadro 12 - Comprometimento e responsabilidade dos alunos ............ 98
Quadro 13 - Resgate dos valores de justiça ........................................... 99
Quadro 14 - Fortalecimento dos valores éticos ................................... 102
Quadro 15 - Respeito à diversidade - coordenadores .......................... 107
Quadro 16 - Respeito à diversidade - alunos ....................................... 108
Quadro 17 - Agir com solidariedade e cooperação ............................. 109
Quadro 18 - Habilidade de conviver coletivamente ............................ 111
Quadro 19 - Interação dialógica .......................................................... 113
Quadro 20 - Habilidade na resolução de conflitos .............................. 116
Quadro 21 - Estímulo a ideias e soluções ............................................ 119
Quadro 22 - Pensamento crítico .......................................................... 121
Quadro 23 - Autonomia ....................................................................... 122
Quadro 24 - Cidadania para os entrevistados ...................................... 124
Quadro 25 - Cidadania nos projetos .................................................... 126
Quadro 26 - Entendimento da realidade onde vive ............................. 127
Quadro 27 - Indignação ....................................................................... 129
Quadro 28 - Quadro Síntese ................................................................ 132
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABE - Associação Brasileira de Educação
ADCE - Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior
CEFETs - Centros Federais de Educação Tecnológica
CNPq - Conselho Nacional de Pesquisa
CRUB - Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras
EAD - Educação a Distância
FIES - Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior
FORPROEX - Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão das
Universidades Públicas Brasileiras
GUNI - Rede Universitária Global para Inovação
IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
IES - Instituições de Ensino Superior
IFES - Instituições Federais de Ensino Superior
IFs - Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia
IFSC - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa
Catarina
LDBN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC - Ministério da Educação
MINTER - Ministério do Interior
ONU - Organização das Nações Unidas
PDI - Plano de Desenvolvimento Institucional
ProUni - Programa Universidade para Todos
REUNI - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão
das Universidades Federais
RSC - Responsabilidade Social Corporativa
RSU - Responsabilidade Social Universitária
SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
SER - Responsabilidade Social Empresarial
SESU/MEC - Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação
SETEC - Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
SINAES - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
UNE - União Nacional dos Estudantes
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência
e a Cultura
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 23 1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA ....... 25
1.2 OBJETIVOS ................................................................................... 26
1.1.1 Objetivo geral ............................................................................. 26
1.1.2 Objetivos Específicos .................................................................. 26
1.3 JUSTIFICATIVA ............................................................................ 26
1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO .................................................... 28
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................... 29
2.1 GESTÃO UNIVERSITÁRIA ......................................................... 29
2.1.1 Evolução do Ensino Superior Brasileiro .................................. 30
2.1.2 O Gestor Universitário e suas Responsabilidades
Administrativas ................................................................................... 37 2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR SOB O ENFOQUE DA GESTÃO .................................... 40
2.2.1 Responsabilidade Social na Educação Superior sob
o enfoque da Formação ....................................................................... 51
2.2.2 Responsabilidade Social Universitária e Cidadania ................ 58 2.3 EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA .................................................... 61
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................. 69 3.1 CARACTERIZAÇÃO E TIPO DE ESTUDO ................................ 69
3.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA ......................................................... 71
3.3 COLETA E ANÁLISE DE DADOS ............................................... 72
3.4 LIMITAÇÕES DA PESQUISA ...................................................... 77
4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS .......................... 79
4.1 CONTEXTO HISTÓRICO E CARACTERIZAÇÃO DA
INSTITUIÇÃO ..................................................................................... 79
4.2 EXTENSÃO NO IFSC .................................................................... 85
4.2.1 Projetos Selecionados ................................................................. 88
4.2.2 Caracterização dos Respondentes ............................................. 92
4.3 ANÁLISE DOS RELATOS DOS ENTREVISTADOS ................. 95
4.3.1 Atuação Ética .............................................................................. 95
4.3.2 Respeito à Diversidade ............................................................. 105
4.3.3 Interação Dialógica .................................................................. 111
4.3.4 Criatividade e Inovação ........................................................... 117
4.3.5 Cidadania .................................................................................. 123
5 CONCLUSÕES .............................................................................. 135
REFERÊNCIAS ................................................................................ 141
APÊNDICE A - Roteiro Entrevista sobre Formação Cidadã
do Aluno ............................................................................................. 155
23
1 INTRODUÇÃO
No contexto da administração pública atual, alguns desafios têm
sido colocados aos gestores: Globalização – é preciso aumentar a
compreensão sobre este fenômeno; Complexidade – deve-se reconhecer
o aumento dos problemas e de sua complexidade com os quais os
governos devem lidar; Desigualdade – é crescente a distância entre ricos
e pobres em todo o mundo; Equidade de gênero – é preciso tratar
profundamente das questões da igualdade de gêneros, especialmente, as
oportunidades educacionais; Diversidade – é crescente a incorporação
de normas em respeito à diversidade cultural em todos os setores da
sociedade; Boa governança – é observável um crescimento significativo
no sentido da democratização política, com ênfase na ética do governo,
transparência e accountability; Capacidade – nota-se o enfraquecimento
gradual do Estado; Erosão da confiança – observa-se a diminuição da
confiança nas instituições do governo; Reforma administrativa – deve-se
buscar soluções ideais para estruturas e funcionamento dos sistemas de
implementação de políticas e de prestação de serviços (SCHWELLA,
2005).
Para Dias Sobrinho (2005b), a educação superior é um
patrimônio público, já que exerce funções de caráter político e ético,
indo além da simples função de capacitação técnica e treinamento de
profissionais para as empresas. Para o autor, não há um modelo a ser
seguido, cada instituição seguirá suas características peculiares e poderá
se basear na sua missão para exercer aquilo que entende ser sua
responsabilidade perante a sociedade. Indubitavelmente, é necessário
que a instituição cumpra com suas obrigações de caráter educativo,
promova o desenvolvimento material da sociedade, de produção de
conhecimentos, de formação intelectual, de aprofundamento dos valores
democráticos, principalmente, no que diz respeito à diversidade, à
justiça, à solidariedade e ao bem comum.
O autor enfatiza que o que dá conteúdo e forma à ideia da
responsabilidade social é aquilo que, de modo específico e fundamental,
a sociedade atribui às instituições educativas de nível superior: formar
cidadãos e produzir conhecimentos com forte sentido de pertinência e
relevância sociais. A pertinência tem um forte sentido ético, pois diz
respeito àquilo que os indivíduos de uma determinada realidade social
reivindicam como sendo suas demandas e suas carências.
Silva A. (2014) coloca que a educação profissional deve
responder aos desafios de formar, não somente reproduzindo as
demandas do mercado, mas também ampliando as possibilidades de
24
desenvolvimento humano-social, trazendo a ética e a cidadania nas
abordagens de uma formação humanística. Segundo Bottoni, Sardano e
Costa Filho (2013, p. 41), “as universidades brasileiras carregam a
enorme responsabilidade de contribuir para a formação de cidadãos que
ajudarão a construir um país mais desenvolvido, justo e democrático”.
Por sua vez, a extensão vem tomando forma e um papel
estratégico importante na definição do papel das Instituições de Ensino
Superior (IES) no meio em que está inserida. A interpretação das
prioridades da extensão universitária expostas por Boaventura Santos
(2005) afirma que as atividades de extensão devem ter como objetivo
prioritário, dentro da universidade, o apoio solidário na resolução dos
problemas da exclusão e da discriminação sociais, dando-se voz aos
grupos excluídos e discriminados.
Conforme Severino (2007), a extensão universitária deve ser
entendida como o processo que articula o ensino e a pesquisa, enquanto
interage conjuntamente, criando um vínculo fecundante entre a
Universidade e a sociedade, no sentido de levar esta a contribuição do
conhecimento para sua transformação. Ao mesmo tempo em que a
extensão, enquanto ligada ao ensino, enriquece o processo pedagógico
ao envolver docentes, alunos e comunidade num movimento comum de
aprendizagem, enriquece o processo político ao se relacionar com a
pesquisa, dando alcance social à produção do conhecimento.
Dessa forma, a Extensão Universitária é um dos pilares
norteadores de uma IES e está relacionada à crença de que o
conhecimento gerado por essas instituições deveria transformar a
realidade social, intervindo nas problemáticas existentes. O presente
estudo aprofundar-se-á nos projetos sociais existentes fomentados pela
Pró-Reitoria de Extensão do IFSC para que se possam estudá-los sob a
ótica dos conceitos de responsabilidade social das instituições de ensino
superior.
O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa
Catarina - IFSC - é uma instituição pública que tem por finalidade
ofertar formação e qualificação em diversas áreas, nos vários níveis e
modalidades de ensino, bem como realizar pesquisa e desenvolvimento
de novos processos, produtos e serviços, em articulação com os setores
produtivos da sociedade catarinense (IFSC, 2014).
A missão do IFSC é promover a inclusão e formar cidadãos por
meio da educação profissional, científica e tecnológica, gerando,
difundindo e aplicando conhecimento e inovação, contribuindo para o
desenvolvimento socioeconômico e cultural. Sua visão é ser instituição
de excelência na educação profissional, científica e tecnológica,
25
fundamentada na gestão participativa e na indissociabilidade entre
ensino, pesquisa e extensão (IFSC, 2014).
Dada a amplitude do tema, responsabilidade social na
Universidade, houve a necessidade de se fazer um recorte, explorando
os projetos de cunho social realizados na instituição no ano de 2014, os
quais tiveram por objetivo proporcionar bem-estar às comunidades
atendidas, ao mesmo tempo em que visualizavam a construção de uma
sociedade mais democrática e mais igual.
1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA
A responsabilidade social, resultante de políticas públicas, é
obrigatória de acordo com a Lei do Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior (SINAES) e, por isso, as IES estão planejando
formas e estratégias de implementação de ações e projetos na
comunidade. Essas IES estão cada vez mais conscientes da importância
da realização das atividades de extensão, principalmente, porque a
responsabilidade social faz parte de uma das dimensões avaliadas pelo
MEC por ocasião da avaliação das IES e de seus cursos (CARBONARI,
2011).
Existem ações, projetos e programas sociais no IFSC que são
coordenados pelos servidores dos câmpus distribuídos em Santa
Catarina. Em cada câmpus, há um coordenador de extensão responsável
por auxiliar os coordenadores de cada projeto/programa. Tendo em vista
a distância dos câmpus em relação à Diretoria de Extensão da reitoria,
localizada em Florianópolis, existe uma dificuldade de acompanhamento
dos projetos sociais e sua efetividade.
Para Castanho (2010), a responsabilidade social das instituições
de ensino superior pode ser visualizada por meio de duas perspectivas:
da educação e da gestão. Na perspectiva da educação, o autor explica
que educar para o desenvolvimento sustentável está relacionado a
educar indivíduos autônomos, formar cidadãos éticos e responsáveis,
assim como preparar profissionais qualificados para o mercado de
trabalho, responsabilizando-se pelas consequências sociais de todas as
atividades exercidas.
Vercelli (2013) coloca que a Responsabilidade Social
Universitária pode se dar por meio de projetos sociais que poderão
formar cidadãos capazes de fazer uma leitura da realidade, de
reconstruir a cidadania das camadas populares e buscar a transformação
social em prol de uma vida mais digna. Nesse contexto, a problemática
levantada quer investigar: quais as contribuições dos projetos de
26
extensão de cunho social para a formação cidadã do aluno do Instituto
Federal de Santa Catarina à luz da Responsabilidade Social
Universitária?
1.2 OBJETIVOS
Nesta seção, procura-se elucidar o principal objetivo da pesquisa,
mostrando por meio dos objetivos específicos, as etapas que foram
desenvolvidas para que ele fosse alcançado.
1.1.1 Objetivo geral
Analisar a contribuição dos projetos de extensão de cunho social
para a formação cidadã do aluno do Instituto Federal de Santa Catarina à
luz da responsabilidade social universitária.
1.1.2 Objetivos Específicos
a) Descrever os projetos de cunho social cadastrados na extensão
da instituição no ano de 2014 selecionados para esse estudo;
b) Avaliar a contribuição dos projetos sociais existentes nos
câmpus para a formação cidadã do aluno, na perspectiva dos
coordenadores e alunos envolvidos.
c) Propor ações de melhoria para a gestão dos projetos de
extensão na instituição sob o enfoque da responsabilidade
social universitária.
1.3 JUSTIFICATIVA
Castro (2006) expõe que uma pesquisa pode ser justificada a
partir de sua importância, originalidade e viabilidade. O trabalho é
importante quando está ligado, de alguma forma, a uma questão crucial
que polariza ou afeta algum segmento substancial da sociedade ou se
está ligado a uma questão teórica que merece atenção continuada na
literatura especializada. A originalidade está presente quando os
resultados têm potencial de surpreender e a viabilidade é considerada
quanto aos seguintes fatores: prazo, recursos financeiros, competência
do autor e disponibilidade de informações sobre o tema.
O presente estudo é importante para o ambiente da instituição da
pesquisadora, visto que por meio dele, pretende-se obter maiores
informações com relação à gestão da Extensão e, principalmente, quanto
27
à Responsabilidade Social da Instituição. Assim, o estudo tornará
possível o cruzamento das informações nessas duas áreas, objetivando
resultados práticos dessa intersecção que proporcionem um clareamento
de ideias e facilitem sua gestão. Os projetos selecionados atendem à
definição de Projeto Social dada por Vercelli (2013), colocada na página
13 desse trabalho e são representativos das seis regiões do estado de
Santa Catarina. Dalben e Vianna (2009) entendem a extensão como uma
atitude política da universidade com o compromisso deliberado de
constituir vínculos estreitos com a sociedade, visando aprofundar as
relações de democratização do saber científico, artístico e tecnológico.
Dowbor (2012) coloca que a dimensão e a importância da área
social mudaram qualitativamente, exigindo novos equilíbrios nas
prioridades da sociedade. A construção de alternativas envolve alianças
sociais e parcerias para o desenvolvimento, reunindo diversas esferas e
atores sociais na busca de articulações. A universidade, sobretudo, a
pública, deve ser legitimada pela sociedade civil, num diálogo aberto e
com retorno em ações concretas.
O tema é relevante para a pesquisadora que exerce suas funções
diretamente com o setor envolvido, Diretoria de Extensão do IFSC,
tornando a pesquisa aplicada de fato. A pesquisa aplicada tem por
objetivo contribuir para fins práticos de gestão, solucionar problemas,
buscando transformar em ação concreta os resultados do trabalho
(CERVO; BERVIAN, 2006).
Por meio de uma pesquisa nas dissertações e teses do portal da
CAPES, percebeu-se a existência de 7 teses e 4 dissertações
relacionadas à Responsabilidade Social nas Universidades, as quais
foram produzidas entre os anos de 2009 e 2015. No mesmo portal da
CAPES, constatou-se também que 14 artigos estão relacionados ao tema
de Responsabilidade Social na administração pública / Gestão Pública,
Responsabilidade Social nas Universidades / IFES, sendo que a maioria
foi produzida na América Latina. Assim como nas bases SCOPUS e
SCIELO, verificaram-se apenas 8 artigos publicados relacionados ao
tema. Esse fato talvez possa ser explicado por se tratar de um
instrumento originário e, atualmente, mais recorrente no meio privado.
Dessa maneira, torna-se também, academicamente, original e relevante.
Outro dado foi a inexistência de artigos relacionados à Responsabilidade
Social nas Universidades / Instituições de Ensino Superior aliada à
Extensão Universitária nas bases de dados citadas anteriormente.
O estudo está diretamente alinhado ao Programa de Pós-
Graduação em Administração Universitária por se tratar de um estudo
de caso que visa um aprofundamento teórico e que, posteriormente, trará
28
contribuições na prática da instituição pública de ensino. Caracteriza-se
como relevante ao programa na medida em que se propõe relacionar
dois temas fundamentais à gestão universitária, que por serem amplos,
requerem detalhamento e estudo.
O estudo pode ser considerado viável, principalmente, pela
proximidade da pesquisadora com a gestão dos projetos sociais e de
extensão, tornando o acesso aos arquivos, documentos e registros
extremamente prático, assim como existe a facilidade no acesso aos
coordenadores de extensão, coordenadores dos projetos e demais
possíveis entrevistados.
É relevante apontar que o referencial teórico utilizado foi,
principalmente, o relacionado à universidade em geral, já que os
Institutos Federais e as Universidades possuem as mesmas
responsabilidades, pois atendem ao tripé Ensino/Pesquisa/Extensão.
Ademais, não foi encontrado material específico dos Institutos Federais
ligados ao tema da extensão e da responsabilidade social.
1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Este trabalho de dissertação se organiza em cinco capítulos,
objetivando que os leitores compreendam como a pesquisa foi
desenvolvida.
No primeiro capítulo, apresentou-se a introdução, a delimitação
do tema e problema de pesquisa, a justificativa e os objetivos gerais e
específicos, bem como a organização do estudo proposto.
No segundo capítulo, foi evidenciada a fundamentação teórica
relacionada ao estudo proposto, abordando temas e conceitos como:
Gestão Universitária, Responsabilidade Social Universitária e Extensão
Universitária.
No terceiro capítulo, foi demonstrada a metodologia percorrida
para que os objetivos da pesquisa sejam alcançados. Foram apresentados
os instrumentos utilizados para a coleta de dados, a população, a
amostra e a forma como foi realizada a coleta e análise dos dados.
No quarto capítulo, foram elucidados os resultados desta
pesquisa, procurando responder ao tema problema do presente estudo,
ou seja, analisar a contribuição dos projetos de extensão de cunho social
para a formação do aluno do Instituto Federal de Educação de Santa
Catarina à luz da responsabilidade social universitária.
No quinto e último capítulo, foram descritas as considerações
finais e as conclusões obtidas com a pesquisa a partir dos objetivos
propostos.
29
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 GESTÃO UNIVERSITÁRIA
Para Colossi (2004) e Meyer e Murphy (2000), o estudo da gestão
universitária é relevante e oportuno para toda a comunidade acadêmica.
Nela estão envolvidos os alunos, professores, servidores, como também
a comunidade em geral. A organização universitária é responsável pela
construção e disseminação do saber, da ciência e da tecnologia, que são
essenciais à vida em sociedade. Segundo os autores, a gestão
universitária, enquanto área de estudo, preocupa-se com a estrutura e o
funcionamento organizacional, analisando missão e objetivos, tamanho,
sistemas hierárquicos e de comunicações, métodos e procedimentos nas
organizações universitárias. Também, analisa as questões
comportamentais dos envolvidos na organização, tais como motivação,
liderança, poder e conflitos existentes.
Segundo Bottoni, Sardano e Costa Filho (2013), o poder dentro
de uma universidade é descentralizado, distribuído entre os grupos de
interesse existentes. Os profissionais contribuem, individualmente, de
formas diferentes para a formação de um serviço padronizado. Além
disso, as universidades precisam atuar em ambientes dinâmicos,
instáveis e turbulentos, precisando lidar com suas próprias
ambiguidades, com as incertezas e a rápida transformação dos serviços
educacionais. Em meio a esse ambiente, essas instituições precisam se
descobrir e se reinventar a cada dia para sobreviver e,
concomitantemente, promover o crescimento da instituição. “A
instituição possui uma diferencial importância relativa para diferentes
grupos de interesse, uma vez que grupos diferentes valorizam objetivos
diferentes, o que torna sua priorização problemática”. (SILVA, 1991, p.
84).
Segundo Meyer (2007), é preciso buscar novas formas de gestão,
com estruturas mais flexíveis, agilidade nos processos de decisão,
liderança efetiva e processos gerenciais que primem pela eficiência e
eficácia, capazes de dar conta das características das instituições, dentre
elas, a ambiguidade e a imprevisibilidade. Dentre os desafios, está a
dificuldade de gerenciar uma organização em que a estrutura, tanto dos
processos quanto dos comportamentos, não se enquadra nos modelos e
paradigmas conhecidos da gestão empresarial. Castro (2000, p. 19)
coloca que o maior problema das instituições públicas são as regras do
jogo, “[…] que não premiam o bem-feito e não puxam as orelhas de
quem deixa de fazer o seu serviço”. Como exemplo, o autor coloca a
30
situação dos professores, que muitas vezes, não cumprem o tempo
integral e dedicação exclusiva imposta ao seu cargo, identificando
situações de dificuldade de controle da gestão universitária.
Finger (1991) corrobora com os autores supracitados quando
coloca que os modelos tradicionais de administração empresarial não
podem ser utilizados em sua totalidade na universidade, por suas
características e especificidades. Para o autor, o modelo administrativo
da universidade é uma pirâmide invertida em que o poder está mais na
base do que na cúpula. O agente do processo acadêmico e produtor do
saber têm um poder de decisão muito grande. A administração amadora
das universidades ainda é comum no Brasil, porém, para o autor, existe
uma preocupação maior atualmente com a preparação de pessoal e com
métodos mais científicos de gerência das IES. “Gerir uma instituição
universitária é uma tarefa complexa, por isso não pode mais ser
atividade desenvolvida por amadores ou pessoas não talhadas para essa
função” (ALMEIDA, 2001, p. 301).
Há algum tempo, as instituições de ensino superior brasileiras
têm sido alvo de muitas críticas acerca de seus reais objetivos, da rigidez
da sua estrutura burocrática, da ineficiência no uso de recursos escassos,
da baixa qualidade do ensino ministrado e da pouca pertinência social
dos serviços educacionais prestados (MEYER, 2000). Para Finger
(1991), a construção de um sistema administrativo capaz de responder
às necessidades da instituição e da sociedade precisa promover o
pensamento no coletivo e não no engrandecimento de posições pessoais.
Para se entender o cenário da gestão universitária nos tempos
atuais é necessário voltar ao passado e resgatar as raízes do tema aqui
estudado. É o que se pretende na seção a seguir. Adiante, identificam-se
os acontecimentos relevantes no Ensino Superior Brasileiro, bem como
um breve histórico dos Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia (IFs). Em seguida, coloca-se em questão as
responsabilidades do gestor universitário.
2.1.1 Evolução do Ensino Superior Brasileiro
Segundo Teixeira (1989), a Educação no Brasil foi iniciada com
os jesuítas na época da colonização do país em que a estrutura social era
composta pelos senhores brancos e pelos escravos (negros e índios).
Gadotti (1993) coloca que a educação dos jesuítas focava na formação
das elites burguesas e descuidava da educação popular. Os valores e as
escolhas vividas na educação superior da colônia estavam vinculados à
visão da sociedade portuguesa. Os professores precisavam lidar com
31
uma sociedade de estrutura rígida e centrada na hierarquia, fundada em
princípios religiosos. Ao professor era dado o poder da onipotência, ou
seja, ele possuía o controle do saber, podendo administrá-lo da forma
que lhe interessasse.
Segundo Mendonça (2000, p. 5),
[...] com a Proclamação da Independência em
1822, os liberais anunciaram novas perspectivas
para a política educacional. Começaram a surgir
preocupações com a educação popular. Foram
abolidos os privilégios do Estado, que ofereciam
instrução apenas para a elite. Apesar das
exigências da Constituição, o alcance dessa
escolaridade era limitado em número e em
qualidade. O sistema dominante não tinha
interesse em ter operários bem-formados e
exigentes. A preocupação da classe dominante,
por ser maior com os títulos (sinônimo de
prestígio) do que com educação, não exigia uma
melhor qualidade; se assim o desejasse, poderia
buscá-la na Europa.
Segundo Bottoni, Sardano e Costa Filho (2013), até o início do
século XX, após muitas reivindicações, reformas e constituições, uma
parte do povo teve acesso à educação - uma educação fraca e voltada
apenas ao aprendizado das funções que viriam a ser desempenhadas por
essa parcela populacional. O Brasil era dependente de outros países em
tecnologia. Para Pereira (2009), a universidade no Brasil foi
influenciada, primeiramente, por uma perspectiva funcionalista. Era
vista apenas como instrumento para formação profissional e política dos
cidadãos, aproximando-se do Modelo Napoleônico, oriundo da França e
de países socialistas.
Pereira (2009) afirma também que somente na primeira metade
do século XX, outro modelo educacional surgiu no País, o Modelo
Humboldtiano, presente na Alemanha e que tinha como princípio
essencial a pesquisa. Assim, o principal meio de formação era unir o
ensino e a pesquisa. Havia a liberdade da gestão da instituição e da
ciência que ela produzia e o Estado criava e mantinha as universidades,
mas não intervia em sua administração.
A Universidade do Rio de Janeiro foi criada em 7 de setembro de
1920 em meio a debates, oriundos, principalmente, da Associação
Brasileira de Educação (ABE), em torno dos problemas relacionados à
32
universidade no país. Dentre as questões debatidas, destacaram-se a
concepção de universidade, suas funções, sua autonomia e o modelo de
universidade a ser adotado no Brasil. Em relação às funções e ao papel
da universidade, duas posições foram defendidas: as que queriam, além
do conhecimento e formação profissional, o desenvolvimento da
pesquisa científica; e as que priorizavam a formação profissional (ABE,
1929).
De acordo com Mendonça (2000), em 1930 foi criado o
Ministério da Educação após o golpe político de Getúlio Vargas, o qual
assumiu o poder. Nessa época, houve a promoção da educação
massificada e profissional, surgindo muitas escolas em todo o país.
Assim, surgiram a Universidade Federal da Bahia e a Escola Técnica
Federal Baiana. Em 1934 foi criada a Universidade de São Paulo por um
grupo de intelectuais que se articulava em torno do jornal O Estado de São Paulo. O objetivo era reconquistar a hegemonia paulista na vida
política do país. Em 1960 foi criada a Universidade de Brasília.
Segundo Bottoni, Sardano e Costa Filho (2013), assim como nos
primórdios da educação brasileira, a eficiência dessas universidades
estava no professor, escolhido por meio de concurso público. Sendo as
universidades instituições do Estado, a lei e o governo davam ao
professor uma posição de extremo prestígio. A função de professor era
uma honra, contudo a remuneração era pouco mais que simbólica. O
poder para administrar era de competência de um diretor, o qual era
eleito pelos professores titulares e antigos na instituição.
Os autores afirmam também que em relação à pesquisa, em 1948
foi criada a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Em 1951, surge o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) para
promover a pesquisa científica e tecnológica nuclear no Brasil e, em
1951 surge a Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior, hoje chamada de Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES) com o objetivo de investir na
formação dos quadros universitários por meio da concessão de bolsas no
país e no exterior. De acordo com a autora, esses três órgãos
representaram um passo importante para o ensino superior,
institucionalizando a pesquisa e os cursos de pós-graduação que
começavam a se alinhavar com as necessidades do País.
Dentre os fatos históricos que marcaram o Ensino Superior
brasileiro está o ano de 1961, em que a União Nacional dos Estudantes –
UNE realizou, em Salvador, o I Seminário Nacional de Reforma
Universitária. As conclusões desse seminário foram condensadas na
33
chamada “Carta da Bahia” e apontaram como diretrizes básicas da
reforma universitária os seguintes pontos:
a. democratização da educação em todos os níveis;
b. abertura da universidade ao povo por meio da extensão
universitária e dos serviços comunitários;
c. articulação com os órgãos governamentais (MENDONÇA,
2000).
Em 1964, com o golpe militar, a educação nacional entrou em
fase de retrocesso. As universidades públicas eram encaradas como foco
de subversão. Como consequência, importantes lideranças do ensino
superior foram expulsas e as universidades do setor privado começaram
sua expansão, sobretudo, a partir de 1970. O percentual das matrículas
do setor privado cresceu de 43,7% entre 1933 e 1960 para 62,3% no fim
da década de 70. A reforma de 1968, a despeito de ocorrer em clima de
deterioração dos direitos civis, inspirou-se em muitas ideias do
movimento estudantil e da intelectualidade das décadas anteriores. A
preocupação com o próprio conteúdo do ensino superior surgiu com
críticas ao tecnicismo pragmático e a preconização do humanismo total
(BOTTONI; SARDANO; FILHO, 2013).
Segundo Silva (2001, p. 12),
[...] foi sobretudo a partir da década de 90, com
um investimento cada vez menor do Estado no
campo da educação, que as universidades públicas
brasileiras acabaram se deteriorando: “[...] entre
1995 e 1999, houve uma redução de 17,3% nos
gastos com as instituições federais de ensino
superior e de 22,8% em sua participação no PIB,
contrastando com o aumento de 17,9% na oferta
de vagas e de 20,4% no número de matrículas”.
Bottoni, Sardano e Filho (2013) colocam que nesse momento
houve o processo de expansão e privatização do sistema de ensino
superior. A pesquisa passou a ser direcionada para o setor produtivo sob
encomenda das empresas e a formação era cada vez mais voltada para o
mercado de trabalho. Para que as organizações universitárias
apresentassem qualidade de ensino, pesquisa e extensão, exigiu-se que
ao menos um terço do corpo docente apresentasse titulação de mestre ou
doutor e tivesse disponibilidade para suas funções em regime de tempo
34
integral. As exigências oneraram as instituições, criando dificuldades de
crescimento nesse período.
De acordo com Chaves (2010), desde 1995, durante o governo de
Fernando Henrique Cardoso, várias mudanças ocorreram na política
educacional, as quais tiveram como base a nova Lei de Diretrizes e
Bases - LDB de 1996, além de outros documentos legais
complementares que foram combinados com uma política de
congelamento de salários dos docentes das universidades federais, de
cortes de verbas para a pesquisa e para pós-graduação. Nesta lei, é
estabelecida a expansão do setor privado que definiu quatro tipos de
instituições educacionais privadas: a) particulares, em sentido estrito
(empresariais); b) comunitárias; c) confessionais; e, d) filantrópicas.
No governo de Luiz Inácio Lula da Silva, dois novos
instrumentos legais contribuíram para a expansão do setor educacional
privado: o Decreto nº 4.914, de 11.12.2003 que concedeu autonomia aos
centros universitários e o Decreto nº 5.622, de 19.12.2005 que
regulamentou a Educação a Distância (EAD) no Brasil. Essas medidas
foram decisivas para o crescimento explosivo do setor privado do ensino
superior. Além disso, foram criadas várias bolsas para o ensino superior
privado, como:
a. Programa Universidade para Todos (ProUni - medida
provisória nº 213, de 10.09.2004) - democratização do acesso
ao ensino privado por meio de vultuosas somas de isenção
fiscal;
b. Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão
das Universidades Federais (REUNI) - Decreto nº 6.096, de
24.04.2007 - elevação, num prazo de cinco anos, da taxa
média de conclusão dos cursos presenciais de graduação para
90%, praticamente, dobrando a relação de alunos de
graduação por professores em cursos presenciais, um
indicador de precarização das condições de ensino;
c. FIES - Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino
Superior;
d. Portaria Interministerial MEC-MPOG nº 22, de 24.04.2007 -
condições de trabalho precárias dos professores nas
universidades federais, enfraquecendo a pesquisa e a extensão
nas universidades federais; projeto Universidade Nova
(ALMEIDA FILHO, 2007).
Segundo Bottoni, Sardano e Filho (2013), a qualidade de muitos
cursos foi questionada e criticada no passado. Hoje, esses cursos
35
ressurgem como sequenciais ou de educação a distância. Essas
iniciativas acabam por oferecer alternativas mais acessíveis e menos
custosas em relação ao tempo, dinheiro e investimento intelectual para
aqueles que procuram o ensino superior. Entre os anos de 2001 e 2010,
o crescimento foi de 3,036 milhões para 6,379 milhões de matrículas no
ensino superior brasileiro (110%). Nas instituições privadas, o
crescimento foi de 2,091 milhões para 4,736 (126%), enquanto que nas
instituições públicas o crescimento foi de 0,944 milhão para 1,643
milhão (74%). Ainda que essa discrepância tenha caído nas duas últimas
décadas, as instituições privadas continuam com uma participação bem
superior em relação às públicas no universo de matrículas do ensino
superior. Segundo os autores, é preciso questionar não só a qualidade
dos cursos ofertados, mas também se essas iniciativas contribuem para
democratizar o ensino superior ou apenas reforçam as desigualdades
sociais.
Segundo Chaves (2010, p. 17),
[...] as instituições acadêmicas são organizações
bastante atípicas, apesar da articulação entre o
mercado educacional e o restante da economia.
Como qualquer organização, seu sucesso depende
do desempenho de sua gestão, em especial das
estratégias e da visão de seus líderes. Entretanto, a
ideia de que as instituições de educação superior
são empresas comuns tem feito com que
estratégias do setor empresarial sejam importadas
como solução para seus problemas gerenciais. Na
prática, essas experiências não são bem-sucedidas.
A educação não deve ser vista apenas como um
negócio a ser comercializado, em que os
estudantes não passam de clientes-consumidores.
A reflexão crítica que a educação deveria
promover encontra-se cada vez mais distante.
O Sistema Federal de Ensino Superior é regido pela LDB (Lei nº
9.394/1996) e pelo decreto nº 2.306/1997, sendo coordenado pela
Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação (SESu/MEC).
De acordo com Neves (2002), o sistema é organizado da seguinte
maneira: Instituições universitárias; Universidades; Universidades
especializadas; Centros universitários; Instituições não universitárias;
Institutos superior de educação; CEFETs (Centros Federais de Educação
Tecnológica) e CETs; Faculdades isoladas; e Faculdades integradas.
36
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB-1996), no art. 43, a educação superior tem as seguintes
finalidades:
estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito
científico e do pensamento reflexivo;
formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento,
aptos para a inserção em setores profissionais, para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira e
colaborar na sua formação contínua;
incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica,
visando ao desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da
criação e difusão da cultura e, desse modo, desenvolver o
entendimento do homem e do meio em que vive;
promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos
e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e
comunicar o saber por meio do ensino, de publicações ou de
outras formas de comunicação;
estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente,
em particular os nacionais e regionais, prestar serviços
especializados à comunidade e estabelecer com esta uma
relação de reciprocidade;
promover a extensão aberta à participação da população,
visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da
criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas
na instituição (BRASIL, 1996).
Silva A. (2014) coloca que existe uma urgência no fortalecimento
da democracia nas sociedades, exigindo de todas as áreas de
conhecimento da educação superior um grande desafio: a construção de
uma nova educação. Essa educação se dá no espaço acadêmico
universitário em que há a formação de profissionais, visando o domínio
dos conhecimentos técnico-científicos e específicos da profissão. A
nova educação colocada pelo autor é aliada à competência política de
modo a contribuir para a humanização das pessoas, estabelecendo o
respeito integral aos direitos de todos e todas, na preservação de um
ambiente saudável e sustentável. De acordo com Severino (2007, p. 22),
o ensino superior visa atingir três objetivos, que
são articulados entre si. O primeiro objetivo é o da
37
formação de profissionais das diferentes áreas
aplicadas, mediante o ensino/aprendizagem de
habilidades e competências técnicas; o segundo
objetivo é o da formação do cientista mediante a
disponibilização dos métodos e conteúdos de
conhecimento das diversas especialidades do
conhecimento; e o terceiro objetivo é aquele
referente à formação do cidadão, pelo estímulo de
uma tomada de consciência, por parte do
estudante, do sentido de sua existência histórica,
pessoal e social.
O autor coloca também que para dar conta desses objetivos, a
Universidade desenvolve atividades específicas, quais sejam: o ensino, a
pesquisa e a extensão. Essas atividades articuladas entre si assumem
uma perspectiva de prioridade nas diversas circunstâncias histórico-
sociais em que os desafios humanos são postos. A distinção entre as
funções de ensino, de pesquisa e de extensão, no trabalho universitário,
é apenas uma estratégia operacional, não sendo aceitável conceber-se os
processos de transmissão da ciência e da socialização de seus produtos,
desvinculados de seu processo de geração.
2.1.2 O Gestor Universitário e suas Responsabilidades
Administrativas
O ambiente dinâmico desafia as organizações em nossa
sociedade. As forças econômicas, sociais, políticas, tecnológicas,
culturais e demográficas que estão em constante mudança exigem uma
nova postura dos administradores das universidades. É importante
destacar a necessidade de planejamento com base em fatores internos e
externos em todos os escalões. Seu exercício é responsabilidade de cada
membro da organização (FINGER, 1991).
As principais características das instituições universitárias são
apontadas por Estrada (2000): os grupos de profissionais atuam de modo
independente e compartilham os mesmos recursos; a estrutura de poder
é mal definida; os objetivos são mal definidos; o corporativismo é muito
forte; as mudanças dos principais administradores são frequentes; as
considerações políticas podem dominar; a tomada de decisão é
incrementalista; o sistema de avaliação é limitado; muitos grupos de
interesse tentam influenciar as decisões; e, as mudanças geralmente
ocorrem com reações e crises.
38
Nesse contexto, Carvalho, Bertol e Alberton (1998, p. 142)
elegem como atitudes e responsabilidades dos administradores
universitários:
definir e rever periodicamente os valores, a
missão, a visão e as estratégias da instituição,
fazendo com que ela funcione em função
disto;
coordenar e orientar a adequação de
estruturas, sistemas, recursos, processos e
procedimentos;
promover o mapeamento, análise e tratamento
das disfunções e deficiências institucionais;
contribuir para harmonizar os interesses da
instituição, dos profissionais universitários, do
mercado e dos clientes;
acompanhar, avaliar e orientar o desempenho
institucional; e
administrar os conflitos, as comunicações
entre departamentos, os setores e as pessoas, o
comportamento, o moral e a motivação dos
profissionais universitários.
Longo (2003) coloca que é essencial o desenvolvimento dos
dirigentes públicos, cujas competências deverão ser diversas e baseadas
num conjunto de atributos, tais como: motivos e traços de caráter;
conceito de si mesmo; atitudes e valores; habilidades; e, capacidades
cognitivas e de conduta. “Na maior parte dos ocupantes de cargos de
direção nas instituições de ensino superior são professores e são
conduzidos a posições administrativas. Muitas destas pessoas não se
sentem administradores e nem agem como tal” (MEYER, 2000, p. 139).
Colombo (2010) afirma que o maior patrimônio das instituições
de ensino são os seus colaboradores. Porém, a gestão de pessoas ainda
precisa percorrer um longo caminho já que o gerenciamento de
profissionais de forma eficaz é atualmente utilizado por poucos. Para a
autora, as pessoas devem ser tratadas como peça-chave, para que deem o
melhor de si com comprometimento e alto nível de qualidade. Para que
isso se torne cada vez mais realidade, os gestores precisam agregar os
melhores esforços, mostrando por meio de ações e não de palavras, o
valor de um colaborador para a conquista de patamares superiores rumo
à excelência.
39
Finger (1991) coloca que são muitos os desafios para os que
desempenham alguma função na universidade. Para os professores, há
uma grande oportunidade de superar-se, superando o conhecido e
tornando visível o idealizado. Para aqueles que pretendem desenvolver
um trabalho criativo, esse é o melhor ambiente devido à convivência
diária com pessoas jovens, grande maioria aberta às novas experiências
e trabalhos. Para os alunos, cabe o desafio de superação das gerações
mais velhas. Na universidade, eles encontram a oportunidade de
conhecer com liberdade as diversas correntes de pensamento, desde o
humanismo mais puro ao tecnicismo extremo. Em geral, a comunidade
universitária encontra na instituição infinitas possibilidades de
crescimento pessoal e social.
A gestão universitária exige preparação constante de quem a
exerce e implica:
domínio das informações institucionais e dos
indicativos mais importantes de produção e
disseminação do conhecimento na
universidade;
conhecimento da história institucional e do
processo evolutivo que esta enfrentou no
decorrer de sua existência;
sintonia com as tendências sócio-econômico-
político-culturais mundiais, bem como atenção
permanente no que tange às expectativas e
necessidades do mercado;
capacidade de diálogo e respeito aos
argumentos e posturas divergentes com
relação à condução institucional, procurando
incorporar sempre os novos conceitos
aprendidos com as pessoas divergentes - desde
que eles não ameacem a identidade
institucional;
respeito à importância da função que exerce,
mediante assunção da autoridade que lhe cabe
na instituição e seu efetivo exercício nos
momentos em que isso se fizer necessário; em
outras palavras, o gestor não pode ter medo de
exercer a autoridade que é própria do seu
cargo;
compromisso com a qualidade pessoal e
institucional, buscando antingi-la em cada
ação ou evento e disseminando esse
40
compromisso entre os atores sociais que à
universidade se vinculam;
adoção de conduta criteriosa e ética nas
relações que estabelece para que adquira a
credibilidade e a confiabilidade necessárias
para administrar a instituição e seus conflitos
(ALMEIDA, 2001, p. 302).
Almeida (2001) afirma que os gestores devem saber identificar os
pontos fortes da instituição, compreendendo o diferencial em relação a
outras universidades. Do mesmo modo, é necessário saber identificar os
pontos fracos a fim de superá-los e elevar o desempenho institucional,
conquistando credibilidade nacional e internacional. Para o autor,
encarar a gestão universitária como um compromisso com o
aperfeiçoamento da espécie humana faz dessa tarefa a mais significativa
na universidade, a qual deve ser desempenhada por pessoas que estejam
conscientes dessa responsabilidade e que demonstrem, por palavras e
ações, a coerência e a sabedoria necessárias a essa imprescindível
missão.
É possível constatar que a gestão universitária é compreendida
por muitos desafios e também responsabilidades, as quais precisam ser
cumpridas a rigor. Na sequência, passa-se, a discutir a Responsabilidade
Social na Educação Superior.
2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL NA EDUCAÇÃO SUPERIOR
SOB O ENFOQUE DA GESTÃO
A sociedade como um todo, bem como as instituições de Ensino
Superior nela inseridas, estão em processo de transformação global em
todos os contextos, embora com especificidades nos diferentes lugares
do mundo. No papel da Educação Superior existe o desempenho de
gerar e disseminar conhecimento para a sociedade como um todo, que
deveria estar aliado à responsabilidade de servir ao bem comum
(ESCRIGAS; LOBERA, 2009). De acordo com Pinto (2009), a
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
- UNESCO vem se dedicando em pensar sobre as questões que
envolvem a universidade socialmente responsável, dentre outros órgãos internacionais. A UNESCO possui uma Rede Universitária Global para
Inovação (GUNI/Global University Network for Innovation)
caracterizada como um espaço para discutir assuntos referentes ao
Ensino Superior.
41
Dentre as oportunidades para a criação de estruturas que
orientassem o papel social das universidades, destaca-se a Conferência
Mundial sobre Educação Superior (World Conference on Higher
Education - WCHE) promovida pela UNESCO em 1998. Por meio dos
relatos nacionais foram elaborados diagnósticos, análises e propostas
para a transformação das IES. Porém, poucas dessas estruturas foram
incorporadas aos sistemas de Educação Superior (ESCRIGAS;
LOBERA, 2009). Os autores acreditam que no futuro a visão e a missão
da Educação Superior deverão ser reorganizadas para atender aos
desafios da sociedade a fim de se reinventar uma resposta inovadora e
socialmente comprometida que acrescente valor ao processo de
transformações sociais. Dentre os desafios, estão a criação e a
distribuição de conhecimento socialmente relevantes, presentes em
atividades essenciais das universidades, fortalecendo sua
responsabilidade social.
De acordo com Silva I. (2014), a responsabilidade social vem se
apresentando relevante na educação superior, tanto como elemento
incorporado à gestão, aos processos educativos e às práticas
institucionais, quanto como preocupação da ciência e objeto de
pesquisa. Como categoria em construção, a responsabilidade social
convida a universidade à reflexão crítica, à discussão interna, à busca
pelo alinhamento de concepções e ao posicionamento institucional que
responda de forma coerente às demandas sociais em conformidade com
a missão, identidade e cultura de cada instituição de ensino.
Segundo Larrán-Jorge e Andrades-Pena (2015) e Moura (2010), o
fato de as universidades públicas receberem recursos da administração
pública e gozarem de alto grau de autonomia na tomada de decisões
estratégicas e de gestão cotidiana faz com que exista uma importante
obrigação por parte dessas instituições de prestação de contas à
sociedade com relação à utilização dos recursos. Larrán-Jorge e
Andrades-Pena (2015) analisa cinco teorias que poderiam contribuir
para a construção de um marco teórico a respeito da Responsabilidade
Social Universitária (RSU). São elas: teoria da agência, teoria dos
stakeholders, teoria da legitimidade, teoria institucional e teoria baseada
em recursos e capacidades. As teorias possuem inclinação ao âmbito
empresarial, porém, são as que melhor se ajustam na tentativa de
explicar o compromisso com a responsabilidade social das
universidades.
O autor coloca que a teoria de agência dá enfoque à prestação de
contas na medida em que a universidade goza de autonomia e deve usar
de transparência para responder a sociedade sobre os seus gastos. A
42
teoria da legitimidade coloca, principalmente, a utilização de políticas
de divulgação de informação social e ambiental para legitimar seu
compromisso com a sociedade. A teoria institucional analisa a
universidade desenvolvendo práticas socialmente responsáveis
fundamentadas na pressão institucional exercida por diferentes
organismos sociais para garantir sua sobrevivência e êxito. A teoria
baseada em recursos e capacidades coloca a RSC nas universidades
como um mecanismo para geração de vantagens competitivas e
sustentabilidade. Por fim, a teoria dos stakeholders, que é considerada
pelo autor a que mais se adequa às especificidades da universidade
porque reforça o compromisso com a satisfação das necessidades e
expectativas das diferentes partes interessadas em cada uma de suas
funções (ensino, pesquisa e extensão). Ademais, nessas diretrizes, a
RSU é fundamentada em um modelo de direção e gestão das
universidades baseadas em uma série de princípios sociais, éticos e
ambientais, os quais devem existir em cada função da universidade.
Segundo Morosini (2008), a GUNI coloca a responsabilidade
social universitária como a capacidade que tem a universidade como
instituição de difusão e colocação em prática de um conjunto de
princípios e valores por meio de quatro processos principais, quais
sejam:
gestão, docência, investigação e extensão. São os
valores e princípios declarados: no plano pessoal:
dignidade da pessoa, liberdade, integridade; no
plano social: bem comum e equidade social;
desenvolvimento sustentável e meio ambiente;
sociabilidade e solidariedade para a convivência;
aceitação e apreço a diversidade; cidadania,
democracia e participação; e no plano
universitário: compromisso com a verdade;
excelência; interdependência e
transdisciplinaridade (MOROSINI, 2008, p. 5).
Nesse sentido, Moura (2010) coloca que o processo de
instauração de uma política de responsabilidade social da universidade
está fundamentado no estabelecimento do vínculo com a sociedade e
suas dimensões de desenvolvimento econômico, social e ambiental. É
preciso que haja mobilização de seu público interno na disseminação
dos conceitos de responsabilidade social, resultando na construção de
compromissos e responsabilidades perante a comunidade. Essa política
deve estar sustentada em princípios éticos e democráticos, tais como a
43
promoção do desenvolvimento regional, o incentivo à participação da
comunidade e o reconhecimento às instituições legítimas de
representação da sociedade organizada e comunidade universitária.
Segundo a autora, as políticas de responsabilidades sociais da
universidade devem ser continuamente repensadas, se possível, em
espaços propícios para debates junto às comunidades (interna e externa).
Assim, é possível analisar indicadores sociais que servirão como
indicadores de ações a serem desenvolvidas nas dimensões de ensino,
pesquisa e extensão.
Para Vallaeys (2006), a responsabilidade social universitária
exige articulação de todos os setores da instituição a fim de promover
princípios éticos e de desenvolvimento social sustentável,
proporcionando a formação de cidadãos responsáveis. O autor propõe
uma nova parceria entre a universidade e a sociedade, redefinindo as
atividades de ensino, pesquisa e extensão com base em três grandes
eixos: a responsabilidade social da ciência; a formação visando à
cidadania democrática; e, a capacitação para o desenvolvimento. O
núcleo central da responsabilidade social da educação consiste em
“fazer da educação um fenômeno que eleva os interesses particulares em
categorias de valor público, assim construindo as bases de uma
cidadania pública” (DIAS SOBRINHO, 2005b, p. 92). Corroborando
com essa ideia, Hernández et al. (2015) colocam que a universidade
precisa definir uma visão integral de suas funções acadêmicas: docência,
pesquisa e extensão, baseando-se em um novo modelo que permita a
conexão entre o que a sociedade necessita e a pertinência social que
pretende a instituição universitária, diminuindo também o hiato entre o
discurso e a ação.
Outro relevante desafio emergente da Educação Superior seria a
ponte entre a pesquisa científica com os desafios coletivos, tais como
sustentabilidade, mudança climática e Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio, entre outros. Certamente, isso traria grandes avanços
impactantes no futuro e tornariam evidentes os elos entre a atividade
acadêmica e as necessidades sociais. “É essencial aumentar a habilidade
de estabelecer um compromisso entre pesquisa e prática em questões
relacionadas ao desenvolvimento humano e social” (ESCRIBAS;
LOBERA, 2009, p. 13).
Segundo os autores, existe a necessidade das IES tornarem suas
relações externas mais efetivas, democratizando o acesso ao
conhecimento e fornecendo orientação especializada às instituições e à
sociedade civil em geral. Para se chegar a uma transformação social é
preciso uma maior articulação entre governos, sociedade civil, grupo
44
intelectualizado e empresas. Dessa forma, a sociedade civil precisa
enxergar as universidades como parceiras com as quais pode
desenvolver alianças e intercâmbio.
Não pode ser considerada a responsabilidade
social como “um mero paliativo para as mazelas
das instituições educativas e da sociedade, mas
pode constituir-se em olhar diferenciado sobre o
fazer executivo, facilitando diálogos,
compromissamentos, profissionalidades e ações
auto-responsabilizantes de todos e de cada um”
(RODRIGUES, 2008, p. 155).
Calderón (2000) relata a situação do Ensino Superior brasileiro
na década de 90 quando surgem diversas instituições privadas de ensino
superior, denominadas pelo autor de “universidades mercantis”, as quais
dedicam-se a oferecer o ensino como produto, tornando os alunos
consumidores-clientes, visando prioritariamente o lucro e sem
compromisso com a excelência acadêmica. Essas instituições se opõem
à ideia da universidade como instituição social voltada ao ensino,
pesquisa e extensão, detentora do ensino universitário como direito
social e atividade não lucrativa. Em contrapartida, essas universidades
mercantis foram responsáveis pela democratização do ensino superior.
Por meio delas, um grande número de pessoas pode ter acesso a uma
universidade. Com relação à qualidade do ensino, o autor coloca a
importância do controle do Estado nas atividades dessas universidades.
A responsabilidade social do ensino superior foi contemplada
como dimensão institucional obrigatória na Lei nº 10.861 (BRASIL,
2004), que disciplina o Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior (SINAES):
Art. 3º A avaliação das instituições de educação
superior terá por objetivo identificar o seu perfil e
o significado de sua atuação, por meio de suas
atividades, cursos, programas, projetos e setores,
considerando as diferentes dimensões
institucionais, dentre elas obrigatoriamente as
seguintes:
[...]
III - a responsabilidade social da instituição,
considerada especialmente no que se refere à sua
contribuição em relação à inclusão social, ao
45
desenvolvimento econômico e social, à defesa do
meio ambiente, da memória cultural, da produção
artística e do patrimônio cultural;
O SINAES tem como princípios fundamentais: a
responsabilidade social com a qualidade da educação superior, o
reconhecimento da diversidade do sistema, o respeito à identidade, à
missão e à história das instituições e a globalidade, isto é, compreensão
de que a instituição deve ser continuadamente avaliada com base em um
conjunto significativo de indicadores de qualidade. A proposta do
SINAES é uma avaliação sistêmica e focada nas IES que consigam
realizar ao mesmo tempo as funções de avaliação e regulação.
Independentemente de sua natureza jurídica e de seus propósitos, as IES
precisam ser entendidas como instituições sociais e devem ser avaliadas
e se deixar avaliar periodicamente (DIAS SOBRINHO, 2010).
Segundo Nogueira (2012), as instituições de ensino superior
enfrentam um contexto marcado pela competitividade local, regional e
global, pelas exigências governamentais e institucionais, pelos anseios
da comunidade acadêmica em que estão inseridas. Nesse panorama, elas
procuram análise mais aprofundada acerca do desenvolvimento das suas
atividades e a consequente qualidade delas resultante, tendo em vista a
prestação de contas à sociedade, considerando critérios de excelência,
equidade e relevância social. Para o autor, o SINAES é considerado o
principal regulador em termos de verificação da qualidade em suas
diversas dimensões. Um bom funcionamento do SINAES vem por
intermédio da avaliação institucional, permitindo que a IES elabore um
autodiagnóstico das condições de oferta das atividades acadêmicas. O
objetivo maior é avaliar para aperfeiçoar continuamente o trabalho de
educação superior, ou seja, a busca pela qualidade.
Em contrapartida, para Rosetto (2011), a lei dos SINAES não
apresenta clareza na definição do que seria a Responsabilidade social
das IES e faz referência aos termos “compromisso social” e
“responsabilidade social”, os quais podem se complementar ou terem
interpretações antagônicas. A explicação do proposto pela lei do
SINAES para o termo da RSU está mais alinhada à proposta de RS
corporativa, sendo que nas universidades não cabe a filantropia, a
prestação de serviços à comunidade ou campanhas de marketing. Para a
autora, a RS da IES não pode ser quantificada em número de projetos de
extensão como propõe o SINAES, pois seu significado vai além, já que
seu papel social está na formação individual de cada ser humano que
atua no espaço universitário. Assim, o conceito de RS necessita ser
46
debatido em todas as esferas públicas para que se possa buscar uma
definição em que haja consenso tanto para as Universidades quanto para
as IES e, principalmente, para os gestores do Ensino Superior.
Para Ribeiro (2013), a responsabilidade social das IES pode
assumir pelo menos dois vetores: a busca pela qualidade, analisando a
atuação da universidade no que se refere ao desempenho de suas
funções básicas e, assim, perseguir a qualidade; como também pode
servir para identificar os serviços prestados à sociedade, como um
mecanismo de prestação de contas a quem a financia. A avaliação vista
como uma mera prestação de contas ou accountability se constitui numa
perspectiva de avaliação com uma preocupação com a competitividade
internacional e com a eficácia dos investimentos em educação.
O Quadro 1, a seguir, apresenta alguns dos conceitos encontrados
de Responsabilidade Social Universitária na literatura.
Quadro 1 - Conceitos de Responsabilidade Social Universitária
(continua)
Conceito de Responsabilidade Social Universitária Referência
Consiste em difundir e praticar um conjunto de princípios e
valores por meio de suas principais funções de ensino, pesquisa,
envolvimento da comunidade e gestão institucional, que podem
incluir compromisso com a verdade, justiça e ética, a promoção
da equidade social e o desenvolvimento humano sustentável;
reconhecimento da dignidade do indivíduo e da liberdade;
valorização da diversidade e multiculturalismo; e promoção dos
direitos humanos, democracia e responsabilidade cívica.
Mohamedbhai
(2011)
Baseia-se na capacidade que a universidade tem de difundir e
colocar em prática um conjunto de princípios e de valores gerais
e específicos, com base em quatro processos tidos como
primordiais na universidade, isto é, gestão, docência, pesquisa e
extensão universitárias, atendendo, assim, do ponto de vista
social, à própria comunidade universitária, à região e ao país.
Jimenez et al.
(2006)
Visa estabelecer relações entre as diversas áreas institucionais em
projetos de promoção social, com princípios éticos, de
desenvolvimento social, equitativo e sustentável, objetivando a
transmitir saberes responsáveis para a formação de cidadãos
igualmente responsáveis.
Vallaeys
(2006)
47
Quadro 1 - Conceitos de Responsabilidade Social Universitária
(conclusão)
Conceito de Responsabilidade Social Universitária Referência
Significa relevância científica e pertinência, fortalecimento da
vida democrática e da justiça social, aprofundamento da ética e
do sentido estético da sociedade. O sentido essencial da
responsabilidade social da educação superior consiste em
produzir e socializar conhecimentos que tenham não só mérito
científico, mas também valor social e formativo e que sejam
importantes para o desenvolvimento econômico que tenha
sentido de cidadania publica.
Dias Sobrinho
(2005b)
Fonte: Adaptado de Sousa Júnior et al. (2013).
Sousa Júnior et al. (2013) colocam que não existe um instrumento
de coleta de dados padronizado para uma avaliação das ações de
responsabilidade social desenvolvidas nas IES, pois não é um fenômeno
que possa ser observado diretamente como receita e despesa ou tempo e
distância. Dessa forma, os autores propõem um instrumento de coleta de
dados sob a forma de questionário, elaborado com base nas seguintes
dimensões: social, ambiental, legal, ética, econômica e fundamentada
nos temas centrais da ISO 26000. Em seguida, foi possível desenvolver
uma escala de medida por meio da Teoria da Resposta ao Item (TRI)
para identificar, mensurar e avaliar tais ações. A partir das respostas dos
respondentes a uma série de itens, a TRI possibilita a estimação dos
parâmetros dos itens e dos respondentes em uma escala de medida que
permite estabelecer níveis para diagnosticar as ações de
Responsabilidade Social das IES.
Ribeiro (2013) faz uma análise sobre a Responsabilidade Social
Universitária nas dimensões social, cultural, ambiental e econômica, as
quais representam os desafios das universidades na contemporaneidade.
A abordagem metodológica foi qualitativa e se deu de duas formas: por
meio de um estudo dos estatutos de 15 universidades públicas
portuguesas e 27 universidades públicas federais brasileiras; e um
estudo na Universidade Estadual do Piauí. Por meio da análise
documental chegou-se ao resultado de que 100% das universidades
federais brasileiras demonstram em seus Estatutos preocupação com o
desenvolvimento social e cultural, comparando com o desenvolvimento
sustentável e o desenvolvimento econômico. O desenvolvimento
econômico aparece em segundo lugar com 37,03% e o desenvolvimento
sustentável atinge apenas 18,5% dos documentos analisados.
48
A autora coloca que o conhecimento da universidade usado com a
finalidade de promover o desenvolvimento social constitui uma
universidade capaz de levar os estudantes a desenvolver consciência
crítica sobre o mundo no qual vivem e auxiliá-los a melhor articular
processos alternativos para a construção de sociedades melhores, mais
justas e mais democráticas. Nesse contexto, a universidade pode praticar
a ética do desenvolvimento e buscar o conhecimento da realidade, pois a
responsabilidade social diz respeito a uma forma de gestão capaz de
assistir aos grupos sociais excluídos pela pobreza, pela fome, pela falta
de segurança, pelas enfermidades e pela falta de garantias de seus
direitos sociais. A partir da formação ética dos estudantes, por meio da
reflexão e da vivência de experiências de solidariedade e voluntariado
com a comunidade, acontece a promoção da responsabilidade social nas
universidades.
Em outro contexto, Sandu et al. (2014) colocam que a missão do
ensino superior é atender às necessidades específicas de educação e
formação profissional do indivíduo, bem como as necessidades de
desenvolvimento social e econômico de sociedade. De acordo com a
visão de sustentabilidade, a implementação de um Sistema de Gestão de
Responsabilidade Social no ensino superior é uma das soluções viáveis
para resolver os atuais problemas da sociedade. A implementação eficaz
do sistema no ensino superior significa aproximar o aluno como um
participante ativo no processo educacional, o professor como um
treinador, gerente e líder, unidade de educação com o papel de
modelagem dos recursos humanos socialmente responsáveis. Os autores
desenvolvem uma série de propostas para a implementação de um
sistema de gestão de responsabilidade social no ensino superior com
base em personalização de alguns requisitos da Lei Nacional de
Educação e depois adaptá-los às exigências da norma SA 8000 de
responsabilidade social.
Ainda segundo os autores, a aderência do ensino superior ao
padrão estabelecido pela SA 8000 não é uma moda, mas sim uma
maneira de enfrentar os novos desafios e manter suas atividades em um
ambiente competitivo, atendendo às necessidades de intervenientes na
dinâmica do mercado global. A norma SA 8000 nas unidades de ensino
envolve, dentre outros, uma abordagem focada em todos os envolvidos
(fornecedores, clientes, administrações locais, estado) no processo de
educação de uma atitude socialmente responsável; concentração dos
esforços da organização sobre a aplicabilidade (resultados), e menos
teorização (documentação) dos requisitos das normas e exigências da
legislação, estabelecendo indicadores de desempenho; expansão da lei
49
de educação com critérios de avaliação sobre a responsabilidade social
dos auxiliares de pessoal, professores e alunos a fim de conduzi-los na
execução dos objetivos estratégicos.
Para Vallaeys (2014), o paradigma das universidades
latinoamericanas de definirem a responsabilidade social universitária
como o compromisso solidário com as comunidades mais vulneráveis
vem sendo amplamente criticado. A RSU não deve ser reduzida à
extensão universitária e sim expandida a todas as suas devidas áreas: da
gestão, ensino, pesquisa e extensão. Para o autor, os empresários têm de
entender que a responsabilidade social da empresa não é filantropia, na
mesma medida que os universitários possuem dificuldade de entender
que a RSU não é extensão universitária. A seguir, a figura 1 demonstra
os quatro pilares em que devem estar compreendidos os entendimentos
da RSU, para que a gestão universitária seja a mais eficiente possível.
Figura 1 - Pilares da RSU
Fonte: Dados primários (2016).
No que tange à responsabilidade social universitária, uma das questões quase unânime entre os autores é o fato de que ela deve ir de
encontro ao perfil e à missão educacional da instituição, havendo a
compreensão do âmago de seu compromisso com o progresso e o
desenvolvimento em seu contexto social. A partir dos objetivos e
50
finalidades, é possível identificar os desafios da instituição
relativamente a ensino, pesquisa, extensão e gestão, os vieses capazes de
delinear a responsabilidade social. A gestão socialmente responsável,
segundo Carbonari (2011), ultrapassa as ações de extensão universitária,
pois engloba as atitudes e os procedimentos de seus gestores. Essa
gestão envolve planejamento, acompanhamento e avaliação de
resultados no sentido de atingir metas e objetivos estabelecidos em seu
Estatuto ou Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI).
Assim, o pensamento institucional deve se focar nos impactos
produzidos pela responsabilidade social universitária, no funcionamento
da instituição e na formação acadêmica e profissional. Segundo Vallaeys
(2006), estes impactos definem quatro eixos da gestão socialmente
responsável, que são: gestão da organização propriamente dita: clima
organizacional, gestão de recursos humanos, processos democráticos
internos; gestão da formação: organização curricular e metodologias de
ensino; gestão do conhecimento: produção e difusão do saber,
investigação e modelos epistemológicos; e, gestão da participação
social: desenvolvimento da comunidade.
De acordo com Ribeiro (2013), a responsabilidade social
universitária se configura em uma alternativa de modernização que
permite a busca constante de redefinição da gestão socialmente
responsável e crítica permanente sobre a maneira de pensar e adotar os
processos educativos. Ainda que seja de origem empresarial, a
responsabilidade corporativa na educação superior tem uma
configuração bem diferente. Por seu caráter público, ela vai além de um
produto ou serviço. Trata-se de uma responsabilidade social que visa
promover ações firmadas em princípios éticos que garantam o
desenvolvimento em suas múltiplas dimensões: social, cultural,
ambiental e econômica. Assim, a instituição precisa convergir suas
ações subsidiadas em compromissos sociais e educacionais, tais como:
compromisso com equidade social, com sustentabilidade, com exercício
da cidadania e da democracia; compromisso com a ciência, com a busca
de sua identidade e de sua autonomia e com a geração de conhecimento
para a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
51
2.2.1 Responsabilidade Social na Educação Superior sob o
enfoque da Formação
A educação é colocada como direito constitucional no artigo 205
da Constituição Federal (BRASIL, 1988, p. 120): “A educação, direito
de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para
o trabalho”. Para Ruza e Suárez (2013), é de responsabilidade da
universidade orientar adequadamente o estudante no alcance do
propósito pedagógico e propósito social, promovendo assim um alto
nível de aprendizagem e uma alta qualidade de serviço. A universidade
estará então cumprindo sua missão proporcionando ao aluno um
conjunto de benefícios acadêmicos, pessoais e sociais. Bittencourt
(2003) coloca em suas reflexões a importância da universidade oferecer
uma formação ampla, fundamentada em quadros teóricos e analíticos
gerais, com disponibilidade para a inovação, capacidade de negociação,
de modo que cria oportunidades para os trabalhadores e não a adaptação
aos interesses do mundo empresarial. Para Held (2006), a universidade
tem a responsabilidade de construir cidadãos completos, interessados
nas necessidades do seu entorno social e não unicamente concentrados
em satisfazer seus próprios interesses.
Nesse contexto, Escrigas e Lobera (2009, p. 8) colocam que:
Uma sociedade embasada em um modelo de
produção centrado em conhecimento e tecnologia,
e que empurra o conhecimento humano, social,
ético e filosófico para segundo plano devido a sua
falta de valor de troca, pode ser uma sociedade
com um sistema de produção com base no
conhecimento, mas não pode ser chamada de uma
sociedade de conhecimento. Uma sociedade
hipertécnica, que é deficiente em compreensão
humana e em capacidade de prover contextos e
condições decentes para toda a vida no planeta,
com iguais oportunidades para todos, precisa
repensar uma maneira de criar uma sociedade
verdadeiramente embasada em conhecimento.
Os autores destacam um dilema com relação às funções e aos
objetivos das atividades educacionais e de pesquisa, que está
diretamente ligada ao que entendemos por conhecimento; ao valor que
52
se dá a diferentes tipos de conhecimento; aos conteúdos que se seleciona
para transmitir aos cidadãos que estão no mais alto nível de educação; e,
à mensagem que se dá à sociedade com relação ao que é ou não é
importante saber para viver na sociedade contemporânea. “A maneira
pela qual essas considerações são tratadas determinará o papel do
sistema da Educação Superior no futuro” (ESCRIGAS; LOBERA, 2009,
p. 8).
Nesse contexto, Dias Sobrinho (2005b) afirma que a chamada
sociedade do conhecimento demanda grandes possibilidades e desafios à
educação superior, tendo o conhecimento como matéria-prima principal
do desenvolvimento econômico. Todavia, segundo o autor, a maioria da
população mundial não tem acesso a esses benefícios e nessa
desigualdade está o principal desafio da educação superior: enfrentar
esse problema de equidade.
Carbonari (2011) e Castanho (2011) colocam que a educação,
como um bem social, tem o compromisso com a formação e com o
desenvolvimento dos cidadãos. Ao contemplar em seu projeto
pedagógico a responsabilidade social, as IES assumem o compromisso
para além da instrução, sendo corresponsáveis pelas transformações
necessárias e exigidas pela sociedade globalizada e comprometida com
os valores da responsabilidade social e da sustentabilidade. “Refletir
sobre a contribuição e a responsabilidade social das universidades
envolve um exame completo da sua missão. Os últimos anos trouxeram
incertezas em termos de forma e do conteúdo dessa questão
fundamental” (ESCRIBAS; LOBERA, 2009, p. 9).
Corroborando com os autores, Dias Sobrinho (2005b) afirma que
a questão ética da educação superior – sejam elas públicas ou de
iniciativa privada – reside no sentido público e social de suas funções. A
formação significa também promoção de valores, desenvolvimento
moral e intelectual, autonomização do sujeito, participação na vida
social, cidadania. De acordo com o autor, a responsabilidade social das
instituições educativas consiste, essencialmente, no desenvolvimento da
ciência e na formação dos cidadãos, ou seja, no cumprimento da
produção de conhecimentos e promoção de valores que acrescentem
humanidade à vida das pessoas. Seria esse o sentido mais importante da
dimensão ética da educação.
Vallaeys (2006) afirma que a formação ética precisa ser
transversal, ou seja, não em uma única disciplina, e sim em todas elas. É
algo bastante complexo, pois demanda discussões sérias em sala de aula,
principalmente, sobre as implicações éticas do exercício profissional.
53
Além disso, faz-se relevante que o estudante experimente situações reais
de trabalho junto à comunidade, de solidariedade ativa, de voluntariado.
“As IES deveriam avaliar a importância vital de enfocar o
desenvolvimento contextual humano e social, e aceitá-lo como seu
primeiro objetivo educador” (ESCRIBAS; LOBERA, 2009, p. 11). Os
autores colocam a importância de se ter uma educação cidadã com
consciência cívica, pois as universidades educam cidadãos do futuro que
são responsáveis pelos sistemas sociais que as futuras gerações
herdarão. Para eles, o sistema atual de educação é baseado no
treinamento competitivo dos seres humanos e que deveria ser
substituído por uma educação de cidadãos instruídos sobre a condição
humana e social, com consciência ética e comprometimento cívico.
Afinal, esses cidadãos partilharão valores com a sociedade por meio do
exercício de sua profissão. “As instituições de ensino tornam-se, então,
o ponto de partida para comportamentos sócio ambientalmente
responsáveis” (CASTANHO, 2010, p. 249).
Corroborando com essa ideia, Castanho (2010, p. 233) coloca:
Quando a organização é uma instituição de
ensino, essa responsabilidade para com a
sociedade destaca-se por sua natureza formativa,
traduzida em sua capacidade de transformar e
fortalecer os indivíduos, de provocar mudanças na
sociedade e de responder às suas necessidades. A
educação é de importância vital para a
humanidade, e as instituições de ensino se
comprometem com a sociedade, local e
globalmente, não apenas quando produzem e
disseminam conhecimentos e tecnologias, mas
principalmente quando assumem seu papel de
despertar a consciência dos educandos para a
responsabilidade social, i.e., quando preparam
indivíduos para a autonomia e educam para o
desenvolvimento sustentável. Além disso,
considerando-se o lado corporativo, as instituições
de ensino são socialmente responsáveis quando
cuidam da gestão acadêmica, da gestão de
pessoas, da gestão administrativo-financeira e da
gestão de marketing, pautando-se pelos mesmos
princípios de responsabilidade social apregoados
aos alunos.
54
Segundo o autor, a formação do indivíduo envolve aprendizado
com autonomia, habilidade de identificar e solucionar problemas,
desenvolvimento da criatividade, pró-atividade, autocontrole,
cooperação, motivação, capacidade de trabalhar individual e
colaborativo, dentre outros. Em suma, a formação do indivíduo precisa
desenvolver capacidades de cooperação e de autonomia nos alunos.
Educando para a autonomia se estará educando para o mundo, fazendo
da sala de aula um espaço de pensar e de fazer pensar as diversas
possibilidades de ampliação e aplicação do tema da responsabilidade
social. Corroborando com o autor, Moura (2010) coloca que a formação
não deve ser apenas voltada para o trabalho e para o lucro. Na verdade é
preciso formar indivíduos em toda a sua amplitude de homem
econômico, social e ético. Uma educação para o desenvolvimento,
criando condições para a criatividade e o senso de observação do
educando, tornando-se uma pessoa e um profissional mais produtivo e
responsável.
Segundo Sordi (2005, p. 33):
Dada a complexidade de desenvolver em nossos
alunos a consciência de seu papel social,
defendemos que todo espaço e toda atividade que
se intitula educativa deva conter em si o
compromisso com a responsabilidade social e
cuidar de que a mesma seja praticada, exercitada
em situação real, no presente, fortalecendo a ação
providenciadora de um futuro mais humano e
humanizado.
Para Escribas e Lobera (2009), a responsabilidade social das
universidades consiste em uma gama de ações e processos que
objetivam atender às necessidades do ambiente ao seu entorno de
maneira efetiva com forte senso de ética. Para isso, é necessário assumir
um compromisso público com os interesses gerais da sociedade na qual
elas se inserem. Além disso, o sistema de Educação Superior é
responsável por formar pessoas que ocuparão diversas posições de
responsabilidade na sociedade. Dessa forma, suas decisões com relação
ao ensino, pesquisa e extensão, em todas as profissões, podem resultar
em um impacto positivo ou negativo no progresso da humanidade como
um todo e nas sociedades. Sendo assim, a Educação Superior possui
responsabilidade fundamental no que diz respeito aos conteúdos de
currículos, aliados à ética e aos valores que eles incorporam. “Dessa
55
forma, deveríamos nos preocupar com o tipo de educação que recebem
aqueles que têm acesso à ES, e que intercâmbios e retornos eles
estabelecem com a sociedade” (ESCRIBAS; LOBERA, 2009, p. 9).
Rojas Mix (2003, p. 127) coloca que “a universidade não pode
renunciar à Utopia porque seu projeto de futuro só pode ser o de uma
sociedade melhor e seu compromisso ético na sociedade democrática
não pode prescindir de formar um cidadão mais humano”. Escribas e
Lobera (2009) descrevem a necessidade de se contemplar nos currículos
dos cursos tópicos como a sustentabilidade, a interculturalidade, valores
éticos, habilidades intelectuais e diversidade. Para Evangelista (2000),
por meio dessa nova orientação dos currículos, a educação é capaz de
melhor se relacionar com a sociedade na busca pelo desenvolvimento
sustentável. Além disso, essa mudança proporcionará uma formação
integral de indivíduos, cidadãos profissionais e líderes mais competentes
e capazes de solucionar problemas, avaliar cenários, propor inovações e
incentivar o comprometimento das organizações com as questões da
responsabilidade social.
Silva I. (2014) discorre sobre a Educação Socialmente
Responsável (ESR) em seu estudo, como uma dimensão da RSU que diz
respeito aos processos acadêmicos de formação humanística e
profissional e às medidas de gestão e avaliação da qualidade acadêmica,
no sentido do cumprimento da missão socialmente responsável da
universidade. Assim, a ESR emerge como a dimensão da RSU que
contempla a própria essência da missão e do fazer universitário – o
ensino e os impactos educativos que de tal tarefa são desencadeados por
meio dos processos de formação. A autora utiliza quatro de dez
competências colocadas por Villar (2009) como sendo importantes a
serem ensinadas, fortalecidas e apropriadas pelos estudantes na sua
formação profissional na Universidade. As escolhidas pela autora são as
mais ligadas à ética e cidadania, que são: atuação ética, valorização e
respeito à diversidade, inovação e criatividade e gestão do
conhecimento. A seguir, as competências e seus significados colocados
pelo autor.
56
Quadro 2 - Competências cidadãs
Atuação ética
Demonstra sentido ético sustentado em
princípios e valores de justiça, bem
comum e dignidade absoluta do humano
que estão a servir à sociedade de forma
responsável em resposta às necessidades
que ela demanda como pessoa, cidadão e
profissional.
Valorização e respeito à
diversidade
Reconhece o outro em sua dimensão
humana sem incorrer em práticas
discriminatórias e compreendendo que as
diferenças sociais, culturais e de
capacidade enriquecem a convivência.
Inovação e criatividade
Gera novas respostas, produtos ou
serviços para melhor atender as
necessidades do entorno sociocultural,
profissional, laboral e científico.
Gestão do conhecimento
Processa o conhecimento e o que implica
conhecer, compreender, aplicar, analisar,
sintetizar e avaliar conforme as exigências
do meio sociocultural.
Fonte: Adaptado de Villar (2009).
Para Villar (2009, p. 31), “a ética nos questiona sobre as más e
boas práticas pessoais e sociais”. Nesse contexto, o autor coloca a
necessidade de se ter profissionais conscientes da realidade social que os
rodeia e do impacto de suas ações e decisões, reforçando ainda mais a
necessidade da construção de um perfil ético-profissional socialmente
responsável, íntegro e coerente com seus valores e suas decisões. O
autor coloca a competência de atuação ética em três diferentes níveis de
domínio:
a) Nível 1: descobre dilemas éticas na vida cotidiana pessoal e
social, descrevendo suas causas e consequências assim como
os valores éticos em jogo.
b) Nível 2: julga dilemas éticos de âmbito profissional,
utilizando princípios éticos universais que têm como base a
justiça, bem comum e a dignidade da pessoa e que se
concretizam nos direitos humanos individuais e coletivos.
c) Nível 3: atua frente a dilemas éticos complexos de sua própria
realidade pessoal e profissional, colocando em prática valores
contrastados com os princípios éticos universais, demostrando
um espírito de serviço social em seu desempenho profissional.
57
Segundo o autor, deve haver o exercício de resolução de dilemas
éticos profissionais a partir de uma proposta ética de caráter universal
vinculada aos direitos humanos em diálogo com posturas de valores
próprios de cada estudante. Porém, existem muitos desafios nessa
formação ética que tratam de algumas dificuldades, tais como:
ensinamentos teóricos ético filosóficos são dificilmente compreendidos
e apropriados pelos estudantes; falta de recursos pedagógicos para a
preparação dos docentes; e, complexidade de avaliação da aprendizagem
do aluno. O autor afirma que a melhora na eficácia da formação ética e
de responsabilidade social se dá na integração social, sendo que essas
competências envolvem habilidades cognitivas e afetivas na resolução
de problemas mediante a tomada de boas decisões.
Para Villar (2009), a aprendizagem na prática dos projetos sociais
se faz necessária para a qualidade educativa na formação ética dos
alunos. Isso porque:
- trabalha na realidade social com pessoas e problemas sociais
concretos;
- exige que o professor conecte o conteúdo curricular com
tarefas concretas, as quais necessitam dos conteúdos para
resolver problemas reais;
- exige muito dos alunos no aprendizado de como se deve se
relacionar com pessoas que têm necessidades e problemas;
- têm relação de afetividade, autoestima, habilidades
interpessoais e pessoais, valores concretizados, cruzados,
questionados por todos os participantes. Tudo isso está em
jogo para alcançar a aprendizagem;
- o aprendizado não é validado somente pelo professor, e sim
pelo resultado do trabalho feito e como o trabalho foi
realizado pelo aluno.
Segundo Silva, I. (2014), os objetivos da formação ética e cidadã
voltam-se à promoção do estudante como autor de sua aprendizagem e
corresponsável de sua formação integral e à promoção de formação
baseada no desenvolvimento integral de competências e baseada em
valores. Esses valores contemplam liberdade, verdade, justiça, bem
comum, solidariedade e desenvolvimento sustentável. A formação ética
e cidadã implica conhecer temas sociais e ambientais, responder às
exigências de modernização e democratização social, econômica e
política.
Dentre os benefícios proporcionados pelo ensino e aprendizagem
com base na formação ética para a Responsabilidade social, Zuleta e
58
Reutter (2006) se propõem a destacar os seguintes:
- o docente se obriga a conectar o conteúdo curricular à
execução de tarefas concretas, relacionando a resolução de
problemas reais;
- inspira requisitos complexos ao estudante ao colocar em jogo
exigências cognitivas e atitudes sociais, imprescindíveis para a
interação com pessoas e com diferentes necessidades e
inquietudes das comunidades;
- promove ambientes de aprendizagem que potencializam a
independência, o desenvolvimento da autoestima, habilidades
interpessoais e de projeção social, clareamento de valores,
talvez esquecidos ou questionados por atores comunitários;
- trabalho interdisciplinar e intergrupal com objetivos concretos
a atingir;
- aprendizagem validada pelos resultados dos projetos e pela
percepção do público atendido sobre os benefícios alcançados.
Segundo Moura (2010), cabe à universidade proporcionar a
formação de um profissional com pleno domínio da sua área de
conhecimento, com entendimento na busca por inovações, capaz de usar
a tecnologia, assim como ser capaz de contribuir como cidadão no
desenvolvimento de uma sociedade mais justa e democrática. A autora
coloca que a formação do profissional e cidadão se dá na sua interação
com a sociedade, seja para se identificar culturalmente ou para tomar
como referência para sua formação os problemas que irá enfrentar
futuramente. A Extensão como prática acadêmica, que interliga a
universidade com as demandas da população, possibilita a formação
desse profissional e cidadão.
2.2.2 Responsabilidade Social Universitária e Cidadania
De acordo com Rosetto (2011), a universidade enquanto
instituição social, que tem como função a produção e disseminação do
conhecimento e a formação do cidadão, deve tornar-se responsável por
sua contribuição para desenvolver a capacidade crítico-reflexiva de seus
educandos, exercitando-os a compreender seu papel na sociedade como
agentes de mudança. Segundo Oshiro (2000), “o cidadão deve saber
pensar, ultrapassar a mera expressão de seus interesses particulares,
concordar com um ponto de vista universal, encarar os problemas
considerando o interesse da comunidade em seu conjunto”. Além disso,
o autor coloca a importância da percepção do quanto se precisa
59
caminhar junto com outras pessoas, ajudar na construção de uma
sociedade com bases na cidadania.
O termo cidadania se originou em Atenas na Grécia no século
VIII A.C. Nessa época, gozavam de cidadania os indivíduos do sexo
masculino, adultos e não estrangeiros ou escravos. Segundo Chauí
(1994), os cidadãos possuíam igualdade perante a lei e o direito de expor
e discutir em público opiniões sobre ações que a cidade deveria ou não
realizar. O termo cidadão era então utilizado para designar pessoas que
possuíam privilégios e direitos. Os romanos foram os responsáveis por
incluir as mulheres na cidadania, visto que reconheceram suas fortes
presenças na sociedade. Enfim, os gregos e romanos iniciaram as
discussões acerca da cidadania e de certa forma contribuíram para a
evolução do termo, que hoje é estendido a todos os indivíduos, direito
garantido muitas vezes por meio de lutas e guerras ocorridas ao longo
dos tempos.
Para Gasca-Pliego e Olvera-Garcia (2011), a função prioritária da
universidade é instituir a responsabilidade social da ciência por meio de
uma gestão social do conhecimento para todos os atores sociais,
promovendo assim a construção de uma cidadania informada,
responsável e participativa, e que, principalmente, posicione-se ante a
injustiça, a insustentabilidade, a violência e a corrupção. Segundo os
autores, a responsabilidade social questiona a racionalidade econômica,
o individualismo exacerbado, incentivando valores de solidariedade,
cooperação, igualdade e respeito mútuo. Destacam a importância da
educação voltada para a cidadania mundial, incluindo a educação para o
desenvolvimento sustentável, a educação para a paz, para os direitos
humanos, para a prevenção de conflitos e a educação intercultural, como
novas dimensões da cidadania global.
Para Dallari (1998), cidadania é um conjunto de direitos que
oportuniza à pessoa a participação ativa da vida e do governo do seu
povo. Para o autor, quem não tem cidadania está marginalizado ou
excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando em situação
inferior dentro da sociedade. Já Marshall (1967) dá enfoque aos deveres
de cidadania, pelos quais se invoca a cidadania em defesa dos direitos
dos cidadãos. Nesse sentido, é colocada pelo autor, a necessidade de que
os atos dos indivíduos sejam inspirados por um senso geral de
responsabilidade para com o bem-estar da comunidade.
Para Matiz (2013), o cidadão necessita estar disposto a ter uma
atitude aberta ao reconhecimento crítico do seu entorno, precisa ter
inclinação emotiva para atuar com solidariedade com outros cidadãos,
comprometendo-se em ações construtivas e não violentas, organizadas
60
coletivamente. Para a autora, um modelo de cidadania plena é composto
por duas grandes dimensões: a cidadania crítica e a cidadania ativa.
De acordo com a autora, na cidadania crítica se pressupõe a
cidadania como um processo em construção que contempla a releitura
da realidade por seus sujeitos, identificando as características dessa
realidade, os fenômenos que a compõem, a diferença de outras
realidades, as diferentes visões que existem em uma mesma realidade e
as relações interdependentes que comportam. Esse tipo de cidadania
incita a avaliação constante e cotidiana da ordem socialmente
estabelecida e a valorização de atitudes de resistência aos diferentes
atores que defendem a reprodução diária dessa ordem. Existem critérios
gerais que norteiam a noção dessa cidadania, tais como: a democracia
como um estilo de vida, a interculturalidade como uma forma de relação
com o outro, a indignação como a emoção a resgatar, a não violência
como ação pacífica de troca e como aposta ética, a união social para o
exercício da cidadania e expressão do poder político dos cidadãos. “La
orientación crítica del enfoque se orienta no sólo a fomentar una actitud
de discusión y de auto comprensión histórica de la realidad, sino que
pone en juego la necessidad de generar posturas claras frente a la
misma” (MATIZ, 2013, p. 209).
Com relação à cidadania ativa, Matiz (2013) afirma que é um
segundo passo, uma vez que o cidadão já se apropriou da cidadania
crítica. É um modelo proposto a partir de duas dimensões principais:
como capacidade emotiva e como capacidade de gestão. No primeiro, o
conceito diz respeito a resgatar a importância da emoção como motor
principal da ação. Dessa forma, é preciso que os cidadãos saibam
identificar as emoções geradas frente a realidade, principalmente, as
emoções relacionadas aos processos de injustiça social, desigualdade,
pobreza e exclusão social. É um convite a entender não só como os
indivíduos se relacionam, racionalmente, mas também como se
relacionam emocionalmente. A emoção ressaltada pela autora é a
indignação que deve ser mobilizadora e derivada da sensibilidade pelos
outros e que clama a luta pela superação das injustiças. Nesse processo
também se invoca a atuação frente as emoções experimentadas e
identificadas, mediante os princípios filosóficos da não violência.
De acordo com a autora, a capacidade de agência diz respeito às
possibilidades reais de participação de maneira contundente, ou seja, é
um plano de informação e estímulo de habilidades e conhecimentos
específicos para a participação, a organização social, a ação coletiva e a
ação em redes sociais. Implica a compreensão de meios de gestão que
permitam uma gestão e um controle social efetivo, capacidade de
61
elaborar propostas para atender a demandas específicas, habilidades
argumentativas para participar de diálogos públicos que conduzam
decisões públicas concretas e a favor do bem comum.
Por meio de um aprofundamento no tema da Responsabilidade
Social é possível perceber o quão amplo é este estudo. No próximo
tópico, busca-se perceber a Responsabilidade Social nas instituições de
Ensino Superior por meio da extensão universitária, a qual compõe um
dos pilares da Gestão Universitária.
2.3 EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
De acordo com Sousa (2000), a extensão surge como atividade da
Universidade no século XIX quando uma nova concepção de educação
leva as universidades a se preocuparem com a prestação de serviços que
deveriam oferecer às comunidades. Segundo a autora, a Universidade
Inglesa passa a responder às demandas sociais, diversificando suas
atividades e não ficando limitada à formação das elites. Nesse ponto, é
possível se reconhecer o surgimento incipiente da Extensão,
caracterizando o modelo europeu com a criação de cursos que visavam
proporcionar uma educação continuada e uma formação técnica. Porém,
a Extensão nas Américas surge de forma diferente, mais voltada para a
prestação de serviços, encontrando terreno para seu desenvolvimento e
consolidação. De acordo com a autora, a pesquisa surge também na
mesma época, servindo como instrumento de fortificação da ordem
vigente e não como agente de transformação.
Sousa (2000) coloca que o estudo da extensão universitária tem
se mostrado como uma exigência da prática docente. As respostas para
os questionamentos sobre o que seria a extensão universitária se
apresentam de variadas formas por meio de tentativas de se criar limites
para sua prática ou para justificar práticas que acontecem fora da
academia. A concepção dessa prática costuma ser vinculada a
proposições individuais, sem muitos cuidados com a construção teórica,
havendo uma variação sobre o seu entendimento de todos os envolvidos.
Dessa forma, a identificação das práticas extensionistas e a busca por
compreendê-las têm sido objetivo de muitos. Segundo a autora, foram
identificados três interlocutores, sujeitos da práxis extensionista no
Brasil: os discentes, representados pelo movimento estudantil; o Estado,
representado pelo Ministério da Educação (MEC); e, as próprias
Universidades, como Instituições de Ensino Superior (IES) que foram
representadas recentemente pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de
62
Extensão das Universidades Públicas Brasileiras (FORPROEX), criado
em 1987.
Segundo a autora, pelo ponto de vista do Movimento Estudantil, a
extensão universitária foi se desenvolvendo com concepções que
avançavam no sentido de construir a Extensão como instrumento de
envolvimento político, social e cultural da Universidade com a
Sociedade, com direcionamentos para o desenvolvimento das classes
populares no sentido de empoderá-las. Sob a ótica do Estado, a Extensão
universitária teve sua concepção construída de forma lenta, em que se
fez uma transposição e modelos europeus e norte-americanos, com a
ideia de Universidade Popular, dando ênfase à prestação de serviços,
prestando assistência às comunidades carentes. Um exemplo concreto
disso está na criação do Projeto Rondon em 1970, que por meio do
Decreto nº 67.505 passa a funcionar como órgão autônomo, de
Administração Direta, ligado ao Ministério do Interior (MINTER). O
Rondon assumia uma visão assistencialista e surge num momento crítico
da história brasileira numa tentativa de propor mudanças de rumo da
nação. Essas mudanças eram dirigidas por um Estado não democrático
que objetivava manter o controle e a ordem, ao mesmo tempo em que
visava o desenvolvimento e a integração do território nacional (SOUSA,
2000).
Segundo Cunha (1980), a extensão universitária surge como
alternativa mais institucionalizada nas IES com a criação da
Universidade Popular da Universidade Livre de São Paulo em 1912,
uma cópia do modelo europeu de Universidade Popular. Essa
universidade não possuía uma unidade com corpos discente e docente
próprios, tendo como principal atividade a promoção de conferências e
cursos gratuitos à população. É uma prática de extensão ainda hoje
muito conhecida e difundida, entretanto, não conseguiu atingir as classes
populares, as quais não se interessaram pelo produto ofertado. A
Universidade Livre de São Paulo existiu até o ano de 1917. De acordo
com Sousa (2000), no Brasil, em meados de 1920 era reproduzida a
extensão cooperativa dos EUA, na linha de prestação de serviços ao
meio rural, atuando em programas de assistência técnica aos
agricultores, programas de economia doméstica e de organização da
juventude. Até o Golpe de 1964, não existia uma preocupação com uma
formulação de um caminho próprio da extensão por parte das IES. A
extensão era representada por cursos e conferências eventuais. Apesar
de a extensão ser reconhecida como função da universidade, as
instituições atuavam em função daquilo que era sugerido pelo Estado.
63
Em 1966, foi criado o Conselho de Reitores das Universidades
Brasileiras (CRUB), em Salvador, composto por dezoito reitores. Em
1976, a CRUB definiu a Extensão como:
o instrumento da íntima comunicação da
Universidade com a Comunidade. É a
Universidade flexível, a Universidade laboratório
vivo, livre para viver e atuar no fato
contemporâneo. Extensão é a projeção da
Universidade ao meio, com o oferecimento de
conhecimentos teóricos e práticos para o consumo
das comunidades, sob a forma de treinamento
supervisionado, e simultânea prestação de
serviços. É a definição da efetiva posição
tridimensional da Universidade Moderna (CRUB,
1976, p. 16).
Somente a partir de 1985 o compromisso com a população passou
a ser o centro das atividades e a Extensão passou a ser entendida como
articuladora do ensino e da pesquisa, “vinculando-as ao exercício de
transformação da sociedade” (REIS, 1992, p. 68). De acordo com Sousa
(2000), em 1987 foi criado o Fórum de Pró-Reitores de Extensão como
consequência de um movimento docente que buscava o estabelecimento
da relação entre a Universidade e a Sociedade, vinculada ao ensino e à
pesquisa. Esse fórum era e, ainda é, responsável por representar as IES
na articulação com o MEC nas diretrizes da Extensão nas universidades
brasileiras e, concomitantemente, surgiu para suprir a necessidade de se
conhecer e entender a Extensão universitária, que estava carente de uma
conceituação que possibilitasse nortear sua prática. “A forma como o
Fórum se coloca diante do compromisso da Universidade deixa claro
que o compromisso é social e está direcionado para a cidadania, tendo a
Extensão como instrumento viabilizador” (Sousa, 2000, p. 103). Em
1987, a extensão foi definida como:
o processo educativo, cultural e científico que
articula o Ensino e a Pesquisa de forma
indissociável e viabiliza a relação transformadora
entre a universidade e a sociedade.
A Extensão é uma via de mão dupla, com trânsito
assegurado à comunidade acadêmica, que
encontrará, na sociedade, a oportunidade de
elaboração da práxis de um conhecimento
acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e
64
discentes trarão um aprendizado que, submetido à
reflexão teórica, será acrescido àquele
conhecimento [...]
Além de instrumentalizadora deste processo
dialético de teoria/ prática, a extensão é um
trabalho interdisciplinar que favorece a visão
integrada do social (FORPROEX, 1987, p. 1).
Dentre as iniciativas importantes, no sentido da
institucionalização da Extensão Universitária, uma delas foi o Plano
Nacional de Extensão Universitária, elaborado e aprovado pelo
FORPROEX em 1998. Por meio desse plano, busca-se:
1) a possibilidade de dar unidade nacional aos
programas temáticos que já se desenvolvem em
diferentes universidades brasileiras;
2) a garantia de recursos financeiros destinados à
execução de políticas públicas correlatas,
viabilizando a continuidade dos referidos
programas;
3) o reconhecimento, pelo poder público, de que a
extensão universitária não se coloca apenas como
uma atividade acadêmica, mas como uma
concepção de universidade cidadã;
4) a viabilidade de interferir na solução dos
grandes problemas sociais existentes no país
(FORPROEX, 1998, p. 5).
Este Plano Nacional de Extensão Universitária, elaborado pelo
Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas
Brasileiras e pela Secretaria de Educação Superior do Ministério da
Educação e do Desporto, reflete o compromisso da universidade com a
transformação da sociedade brasileira em direção à justiça, à
solidariedade e à democracia. A adesão de outras instituições de ensino
superior significa adesão a esses princípios, objetivos e diretrizes
(FORPROEX, 1998).
Assim, no início da década de 2000, a Extensão Universitária já
havia adquirido significativa densidade institucional, no que se refere à
Constituição de 1988, à legislação federal e às regulamentações do
FORPROEX. Estava superada a concepção de que a Extensão
Universitária seria simplesmente um conjunto de processos de
disseminação de conhecimentos acadêmicos por meio de cursos,
conferências ou seminários; de prestações de serviços, tais como,
65
assistências, assessorias e consultorias, ou de difusão de conhecimento e
cultura, por meio de eventos diversos e divulgação de produtos artísticos
(SOUSA, 2000).
A extensão possibilita uma formação de profissional cidadão na
medida em que relaciona a universidade com suas atividades de ensino e
pesquisa com as demandas da população. Por meio dessa interligação, é
possível visualizar um espaço junto à sociedade de produção de
conhecimento significativo para a superação das desigualdades sociais.
Assim, tem-se hoje, como princípio, que para a formação do profissional
cidadão, é imprescindível sua efetiva interação com a sociedade, seja
para se situar historicamente, para se identificar culturalmente e/ou para
referenciar sua formação técnica com os problemas que um dia terá de
enfrentar (FORPROEX, 1998).
A Extensão Universitária enquanto atividade é capaz de
proporcionar melhoria na capacidade técnica e teórica dos estudantes,
professores e pessoal técnico administrativo envolvidos, tornando-os
mais aptos a oferecer subsídios aos governos na elaboração das políticas
públicas; mais bem fundamentados para visualizar essas políticas, caso
venham a ocupar algum cargo público, assim como para implementá-las
e avaliá-las. Nesse contexto, a Extensão Universitária apresenta também
significativas potencialidades para sensibilizar todos os atores
envolvidos para os problemas sociais (FORPROEX, 2012).
“São atribuídas à Universidade as funções de transmissão, e
produção e de Extensão do saber, sendo o ensino a função mais
tradicional, pois se consubstancia na transmissão do conhecimento”
(SOUSA, 2000, p. 13). Porém, não se trata mais de estender à sociedade
o conhecimento acumulado pela Universidade, mas de produzir, em
interação com a sociedade, um conhecimento novo, o qual contribua
para a superação da desigualdade e da exclusão social e para a
construção de uma sociedade mais justa, ética e democrática
(FORPROEX, 2012). “A extensão universitária tanto reflete as
condições sociais, econômicas e políticas da sociedade quanto exerce
também influência sobre essas condições” (PAIVA, 1985, p. 19).
As diretrizes que devem orientar a formulação e implementação
das ações de Extensão Universitária, pactuados no FORPROEX, de
forma ampla e aberta (NOGUEIRA, 2000) são as seguintes: Interação
Dialógica, Interdisciplinariedade e interprofissionalidade,
Indissociabilidade Ensino-Pesquisa-Extensão, Impacto na Formação do
Estudante e, finalmente, Impacto e Transformação Social. Para
consecução da missão fundamental da extensão, dar respostas às
necessidades da sociedade, optou-se por sistematizar o trabalho de
66
extensão das Instituições Públicas de Ensino Superior de acordo com as
seguintes áreas temáticas: Comunicação, Cultura, Direitos Humanos e
Justiça, Educação, Meio Ambiente, Saúde, Tecnologia e Produção, e
Trabalho (FORPROEX, 2012). De acordo com o Fórum, a partir dessas
áreas, podem ser desenvolvidos projetos e atividades que estimulem a
participação de toda comunidade acadêmica.
Para Jezine (2004), a extensão tem como princípios integradores
o ensino-pesquisa, conciliando a teoria e a prática como função
acadêmica na universidade, que revelam um novo pensar e fazer por
meio de intervenções na realidade. Nesse contexto, a comunidade deixa
de ser passiva no conhecimento transmitido pela universidade, e sim,
passa a ser participativa, crítica e construtora dos possíveis modos de
organização e cidadania. Segundo a autora, a extensão como função
acadêmica da universidade não está somente na interação entre ensino e
pesquisa, mas implica a sua inserção na formação do aluno, do professor
e da sociedade, na composição de um projeto político-pedagógico de
universidade e sociedade em que a crítica e autonomia sejam os pilares
da formação e da produção do conhecimento. Na figura 2, verificam-se
como os quatro pilares da gestão universitária se relacionam para
atender à responsabilidade social da instituição.
Figura 2 - Gestão Universitaria e RSU
Fonte: Dados primários (2016).
É possível verificar que a Responsabilidade Social Universitária deve acontecer nos quatro pilares da Gestão Universitária: Ensino,
Pesquisa, Extensão e Gestão. Dessa forma, os processos de gestão
devem ser transparentes, democráticos e éticos para a comunidade
interna e externa à instituição. O Ensino e a Pesquisa também precisam
67
estar baseados em princípios éticos e preocupados com a qualidade da
formação oferecida pela instituição. Por último, a Extensão tem o papel
de ponte entre o conhecimento concentrado na instituição e a
comunidade externa, oportunizando melhorias sociais e econômicas às
comunidades ao entorno.
Constata-se que em cada uma dessas perspectivas, existem
desafios distintos, de acordo com suas finalidades. Porém, a busca pela
qualidade da formação e a ética nos processos são quesitos presentes na
Gestão Universitária como um todo. Apresentados os fundamentos
teóricos que embasaram esta pesquisa, seguem os procedimentos
metodológicos.
69
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Segundo Vergara (2013), é de fundamental importância a
utilização de uma metodologia adequada, compreendendo métodos,
técnicas e instrumentos utilizados nas etapas desenvolvidas durante o
trabalho para um alcance eficaz dos objetivos. A seguir, estão os
métodos que foram utilizados no estudo.
3.1 CARACTERIZAÇÃO E TIPO DE ESTUDO
A natureza da pesquisa será aplicada. Pode ser caracterizada
como qualitativa e pode, também, ser classificada, quanto aos fins,
como descritiva. Quanto aos meios, classifica-se como bibliográfica,
documental e estudo de caso.
A pesquisa aplicada possui objetivo prático, diferenciando-se da
pesquisa pura, motivada, sobretudo pela curiosidade do pesquisador.
Segundo Vergara (2013), a pesquisa aplicada é fundamentalmente
motivada pela necessidade de resolver problemas concretos. A pesquisa
visa um aprofundamento do tema da responsabilidade social no IFSC,
assim como objetiva um maior clareamento da extensão e seu
importante papel social junto à sociedade.
Eisner (2001) cita como preocupação da pesquisa qualitativa sua
capacidade para particularizar. O autor justifica essa afirmação ao
atribuir ao pesquisador a tarefa de tentar ver o pesquisado segundo seus
próprios termos. Ao pesquisador qualitativo incumbe revelar o que é
particular e, assim se distanciar de uma abordagem comparativa.
A pesquisa qualitativa, segundo Minayo (1994), caracteriza-se
por se preocupar com a realidade que não pode ser quantificada por
aprofundar-se em um universo de significados contido nas relações
humanas. Esta pesquisa se enquadra na abordagem qualitativa, pois
proporcionará à pesquisadora conhecer a dinâmica e a estrutura da
situação estudada, do ponto de vista de quem a vivencia. Além disso,
possibilitará atender fenômenos complexos e únicos, bem como
contribuirá para a melhor compreensão da distância entre o
conhecimento e a prática da instituição.
Possui também caráter descritivo, pois a pesquisa descritiva
expõe características de determinada população ou de determinado
fenômeno (VERGARA, 2013). Esta pesquisa pretende descrever as
atividades compreendidas nos projetos de extensão do IFSC que
contribuem para a formação do aluno à luz da responsabilidade social
universitária.
70
Qualquer que seja o campo a ser pesquisado, sempre será
necessário uma pesquisa bibliográfica a fim de se ter um conhecimento
prévio do estágio em que se encontra o assunto (PARRA FILHO;
SANTOS, 2002). Vergara (2013) caracteriza a pesquisa como o estudo
sistematizado desenvolvido com base em material publicado em livros,
revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é, material acessível ao público
em geral. A bibliografia utilizada se baseou nos livros sobre
administração universitária, responsabilidade social universitária e
extensão universitária, assim como em revistas dirigidas a essas áreas,
artigos publicados em revistas e na rede mundial de computadores. A
seguir, no Quadro 3, estão os principais autores pesquisados nos
conceitos utilizados para esse estudo.
Quadro 3 - Conceitos e principais autores
Conceito Principais autores
Gestão Universitária
Meyer Jr. (2000); Finger (1991);
Pereira (2009); Almeida (2001);
Bottoni, Sardano; Costa Filho (2013);
Mendonça (2000).
Responsabilidade Social na Educação
Superior
Dias Sobrinho (2005b); Vallaeys
(2006); Escribas e Lobera (2009);
Moura (2010); Calderon (2010); Villar
(2009); Matiz (2013); Castanho
(2011).
Extensão Universitária
Sousa (2000); Cunha (1980); Reis
(1992); Fraga (2010); Nogueira
(2000).
Fonte: Dados primários (2016).
Conforme Vergara (2013), a investigação documental é a
realizada em documentos conservados no interior de órgãos públicos e
privados de qualquer natureza, ou com pessoas: registros, anais,
regulamentos, circulares, ofícios, memorandos, balancetes,
comunicações informais, fotografias e outros. Neste estudo, foram
utilizados documentos, tais como: regulamentos, registros, Plano de
Desenvolvimento Institucional, relatórios, dentre outros.
O estudo de caso não é uma escolha metodológica, mas a escolha do objeto a ser estudado (STAKE, 1994). O objeto de estudo foi
realizado em seis câmpus do Instituto Federal de Santa Catarina em que
foram realizados os projetos sociais alvos da pesquisa, os quais são
vinculados à Diretoria de Extensão na reitoria do IFSC e que a
71
pesquisadora realiza suas funções como servidora, visto que é de
interesse da pesquisadora aprofundar seu conhecimento sobre a
instituição, assim como proporcionar maior compreensão também a
todos os servidores envolvidos. Conforme Yin (2005), o estudo de caso
é uma estratégia de pesquisa que busca analisar dados contemporâneos
no seu contexto real, utilizados para contribuir com o conhecimento de
fenômenos individuais, organizacionais, sociais, políticos e de grupo.
De acordo com Vergara (2013), este estudo é circunscrito a uma ou
poucas unidades, entendidas como uma pessoa, família, produto,
empresa, órgão público, comunidade ou mesmo país. Tem caráter de
profundidade e detalhamento.
3.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA
A população da pesquisa compõe-se dos projetos de cunho social,
realizados nos 22 câmpus do Instituto Federal de Santa Catarina no ano
de 2014. O número total é de 63 projetos. Para a distinção dos projetos
de cunho social dos demais projetos de extensão, utilizou-se a definição
de projeto social colocada por Vercelli (2013), em que o autor define
esse tipo de projeto como um meio de formação de cidadãos que podem
reconstruir a cidadania das camadas populares e buscar a transformação
social em prol de uma vida mais digna. Considerando a dificuldade de
se trabalhar com um número elevado de projetos, optou-se por uma
amostra de 1 projeto por região do estado de Santa Catarina, ou seja, a
amostra será composta por 6 projetos realizados nas 6 regiões: Sul,
Grande Florianópolis, Planalto Serrano, Vale do Itajaí, Norte e Oeste.
Os projetos por região estão descritos no Quadro 4 a seguir.
Quadro 4 - Região e projeto
Região Título do Projeto
Grande
Florianópolis
“Projeto Rondon” - Operação Grande Oeste
Vale do Itajaí “Direitos? Para quais Humanos?”
Planalto
Serrano
“Fazendo Arte, conquistando Direitos e construindo Cidadania”
Oeste “Programa Mulheres SIM”
Norte “Inclusão Digital: Uso do computador e internet na comunidade
rural”
Sul
“O ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas
públicas de ensino médio de Criciúma e os desafios para a
eliminação do racismo”
Fonte: Dados primários (2016).
72
De acordo com Richardson (2008), ao se trabalhar com amostras,
é necessário que ela represente a população, isto é, a amostra deve ter a
mesma estrutura ou composição da população, no que diz respeito às
variáveis que se deseja pesquisar.
Para a amostragem do presente estudo, utilizou-se o método não
probabilístico por acessibilidade, que segundo Vergara (2013), é a
seleção de elementos pela facilidade de acesso a eles, e, por tipicidade,
pois foi constituída pela seleção de elementos que a pesquisadora
considera representativos da população-alvo. Portanto, o objetivo foi
utilizar um projeto que representasse a sua região do Estado.
Os sujeitos da pesquisa foram os coordenadores dos projetos, que
podem ser professores ou técnicos administrativos, e os alunos
participantes que integraram os projetos sociais no ano de 2014. Para
cada projeto, teve-se uma amostra de um coordenador e um aluno, com
exceção de um projeto que foram considerados 3 alunos participantes
para a pesquisa e um projeto que não houve a participação do bolsista,
totalizando-se 6 coordenadores e 7 alunos participando desta pesquisa.
O critério de escolha do aluno-participante foi estar diretamente
envolvido no projeto.
3.3 COLETA E ANÁLISE DE DADOS
A coleta de dados se deu por meio de dados primários e
secundários. A fonte de dados primários foram as entrevistas. As fontes
de dados secundários foram os documentos e fontes bibliográficas.
Para a elaboração da pesquisa, houve o levantamento dos
documentos e sua análise, principalmente, os documentos relacionados à
área de gestão do IFSC, área da extensão e dos projetos sociais
registrados na extensão. Os documentos puderam se apresentar na forma
física, como registros em arquivo; documentos virtuais, no caso do site
do IFSC, analisando o Plano de Desenvolvimento Institucional - PDI da
instituição e resoluções de extensão; e, também, documentos acessados
via lime survey, como os relatórios finais dos projetos, ou ainda, sob a
forma de planilha excel, formato em que são registrados os projetos de
extensão da instituição.
Conforme Severino (2007, p. 126), a “documentação é a técnica
de identificação, levantamento, exploração de documentos fontes do
objeto pesquisado e registro das informações retiradas nessas fontes e
que serão utilizadas no desenvolvimento do trabalho”. Por meio da
análise documental, a pesquisadora foi capaz de fazer um levantamento
dos projetos de extensão de cunho social realizados nos 22 câmpus da
73
instituição durante o ano de 2014. A partir daí, selecionou-se um projeto
social de cada região de Santa Catarina, que foram as seguintes: região
Sul, Grande Florianópolis, Planalto Serrano, Vale do Itajaí, Norte e
Oeste. Portanto, as entrevistas foram realizadas em uma amostra de 6
projetos sociais executados em 2014.
De acordo com Vergara (2013), a pesquisa bibliográfica é o
estudo sistematizado desenvolvido com base em material publicado em
livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é, material acessível ao
público em geral. Fornece instrumental analítico para qualquer outro
tipo de pesquisa, mas também pode esgotar-se em si mesma. A pesquisa
bibliográfica baseou-se na consulta em livros, trabalhos acadêmicos,
revistas focadas nesse assunto, portais de periódicos, documentos da
rede mundial de computadores, dentre outros que tratam do assunto, já
mencionados.
A coleta de dados primários ocorreu por meio de entrevista
semiestruturada para os coordenadores e os alunos bolsistas
participantes dos projetos. Conforme Gil (2008), a entrevista pode ser
definida como a técnica em que o pesquisador se apresenta frente ao
investigado e lhe formula perguntas, no intuito de obter os dados que
interessam à pesquisa. Segundo Roesch (2012), nas entrevistas
semiestruturadas se utilizam de questões abertas, permitindo ao
entrevistador entender e captar a perspectiva dos participantes da
pesquisa. O roteiro de entrevista está como apêndice A no final desta
pesquisa e é composto por questões abertas a serem respondidas pelos
coordenadores e alunos dos projetos selecionados.
O roteiro de entrevista utilizado como instrumento foi elaborado
de acordo com as categorias de análise que compõem a discussão acerca
da formação cidadã. No roteiro de entrevista, foram usadas 4 questões
relacionadas à primeira categoria de análise (C1), 4 questões
relacionadas à segunda categoria (C2), 3 questões relacionadas à terceira
categoria (C3), 4 questões relacionadas à quarta categoria (C4) e 4
questões relacionadas à quinta categoria (C5). Além disso, foram
utilizadas 3 questões relacionadas às participações e motivações dos
entrevistados nos projetos, sobre a existência de grupos de pesquisa ou
algum espaço para se tratar de assuntos que discutam a formação cidadã
do aluno. As categorias de análise são descritas no Quadro 5 e foram
adaptadas a partir dos autores Villar (2009, p. 41, 42) e Matiz (2013, p.
45):
74
Quadro 5 - Competências da Formação Ética e Cidadã
(C1) Atuação ética
Demonstra sentido ético sustentado em
princípios e valores de justiça, bem
comum e dignidade em sua atuação como
pessoa, cidadão e profissional.
(C2) Valorização e respeito à
diversidade
Reconhece o outro em sua dimensão
humana, sem incorrer em práticas
discriminatórias e compreendendo que as
diferenças sociais, culturais e de
capacidade enriquecem a convivência.
(C3) Interação dialógica
Visa estabelecer relações, o
compartilhamento de ideias, promovendo
e valorizando as interações das partes de
um todo.
(C4) Inovação e criatividade
Gera novas respostas para melhor atender
as necessidades do entorno sociocultural,
profissional, laboral e científico.
(C5) Cidadania plena (cidadania
crítica + cidadania ativa)
Cidadania crítica (capacidade de reflexão,
argumentação) e cidadania ativa
(resolução de problemas, atitudes
altruístas, altruísmo - vontade de
beneficiar a pessoa que está passando por
uma situação crítica).
Fonte: Adaptado de Villar (2009) e Matiz (2013).
Estabelecido o roteiro da entrevista e identificados os sujeitos da
pesquisa, agendaram-se as entrevistas via telefone ou e-mail e, assim
deu-se início ao processo de coleta de dados, que ocorreu durante os
meses de outubro e novembro de 2015. Foi utilizado um gravador
digital nas entrevistas a fim de obter o registro fiel das falas dos
entrevistados. Algumas entrevistas foram presenciais na cidade de
Florianópolis e outras por meio do skype, com duração variável entre 40
minutos e 1 hora.
Na medida em que as entrevistas iam sendo realizadas, fazia-se
também a transcrição, de forma concentrada, no intuito de não haver
nenhuma alteração nas falas dos entrevistados que pudesse alterar a
compreensão de suas respostas sobre cada questionamento. Após transcritas todas as entrevistas, foi garantido o anonimato dos
entrevistados da seguinte forma: atribuindo a cada entrevistado um
código de identificação, assim definidos:
a) Coordenadores (representados pela letra C):
i. C1 - Coordenador 1;
75
ii. C2 - Coordenador 2;
iii. C3 - Coordenador 3;
iv. C4 - Coordenador 4;
v. C5 - Coordenador 5; e,
vi. C6 - Coordenador 6.
b) Alunos (representado pela letra A):
i. A1 - Aluno 1;
ii. A2 - Aluno 2;
iii. A3 - Aluno 3;
iv. A4 - Aluno 4;
v. A5 - Aluno 5;
vi. A6 - Aluno 6; e,
vii. A7 - Aluno 7.
Para a análise de dados, foram relacionados a análise documental,
as informações obtidas nas entrevistas, ligando estas informações com a
teoria por meio de análise de conteúdo. Para Bardin (2011, p.34):
[…] a análise de conteúdo aparece como um
conjunto de técnicas de análise das comunicações,
que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos
de descrição do conteúdo das mensagens. [...] A
intenção da análise de conteúdo é a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção
(ou, eventualmente, de recepção), inferência esta
que recorre a indicadores (quantitativos ou não).
Segundo Bardin (2011), a técnica de análise de conteúdo procura
conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça,
objetivando compreender criticamente o sentido das comunicações, seus
conteúdos e significações explícitos ou ocultos.
A seguir está o quadro 6 que sintetiza a metodologia, utilizada de
acordo com os objetivos específicos do estudo.
76
Quadro 6 - Resumo da metodologia do estudo
(continua)
Objetivos
específicos
Categorias de
análise
Fatores de
análise
Metodologia de
investigação
Descrever os
projetos de
cunho social
selecionados e
cadastrados na
extensão da
instituição no
ano de 2014;
- Projetos de
intervenção
em
comunidades;
- Projetos com
financiamento
institucional;
- Preocupação
em
desenvolver o
bem-estar
social.
Projetos que
formam cidadãos
capazes de
reconstruir a
cidadania das
camadas
populares e
buscar a
transformação
social.
(VERCELLI,
2013)
Análise documental
na instituição
(relatórios)
Avaliar a
formação do
aluno nos
projetos sociais
existentes nos
câmpus na
perspectiva dos
coordenadores e
alunos
envolvidos.
Atuação ética - formação ética;
-
responsabilidade
e compromisso
dos alunos;
- resgate de
valores de
justiça;
- fortalecimento
de valores éticos.
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
Respeito à
diversidade
- respeito às
diferenças;
- agir com
solidariedade e
cooperação;
- habilidade de
conviver com o
coletivo.
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
Interação
dialógica
- participação de
todos;
- habilidade em
lidar com
conflitos
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
77
Quadro 6 - Resumo da metodologia do estudo
(conclusão)
Objetivos
específicos
Categorias de
análise
Fatores de
análise
Metodologia de
investigação
Avaliar a
formação do
aluno nos
projetos sociais
existentes nos
câmpus na
perspectiva dos
coordenadores e
alunos
envolvidos.
Inovação e
criatividade
- estímulo às
ideias e
soluções;
- pensamento
crítico;
- autonomia
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
Cidadania - entendimento
da realidade em
que vive;
- ação em
benefício de
outros;
- indignação.
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
Propor ações de
melhoria para a
gestão dos
projetos de
extensão na
instituição sob o
enfoque da
responsabilidade
social
universitária.
- Gestão dos
projetos de
extensão;
- Avaliação
dos projetos;
- Participação e
motivação dos
entrevistados;
- conhecimento
de espaço ou
grupo de
pesquisa no
câmpus do
entrevistado.
Entrevista
semiestruturada com
os coordenadores e
com os alunos
Fonte: Elaborado pela autora (2016).
3.4 LIMITAÇÕES DA PESQUISA
No que diz respeito às limitações, o estudo não visa construir uma
ferramenta de avaliação dos projetos sociais e sim preocupa-se em
levantar a questão da Responsabilidade Social Universitária (RSU) e
como a Extensão contribui no cumprimento da missão social do IFSC,
na medida em que promove a formação cidadã dos alunos por meio de
seus projetos sociais. Dessa forma, é importante destacar que o estudo
fez um recorte específico focado na extensão, uma das dimensões abordadas na RSU, a qual se complementa com as dimensões de ensino,
pesquisa e gestão.
Os projetos de cunho social utilizados na pesquisa foram
recortados, obtendo-se somente àqueles do ano de 2014. Dessa forma,
os resultados da pesquisa não podem englobar outro período de tempo.
78
A pesquisa se limita à instituição utilizada, podendo ser
desenvolvida em outras instituições com as devidas adaptações em
respeito à missão, visão e objetivos da instituição.
Apresentado o caminho metodológico que foi percorrido durante
o processo de estudo, no próximo capítulo se apresenta a análise dos
dados.
79
4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Neste capítulo, serão descritos, analisados e interpretados os
dados coletados por meio das entrevistas com os coordenadores e alunos
que participaram dos seis projetos de extensão de cunho social
selecionados para este estudo. Conforme descrito na metodologia
(capítulo 3), também será feita a descrição da instituição pesquisa por
meio de documentos, além dos pressupostos teóricos abordados no
Capítulo 2 – Fundamentação Teórica.
Este estudo foi realizado por meio da relação entre as categorias
de análise previamente definidas com o embasamento teórico do
trabalho a fim de enriquecer o processo de análise e contribuir para o
alcance dos objetivos geral e específicos, propostos inicialmente.
Primeiramente, apresenta-se um breve histórico e a caracterização
da instituição pesquisada, seguida da apresentação da Extensão na
instituição. Adiante, faz-se a descrição dos projetos selecionados e a
caracterização dos entrevistados, coordenadores (C) e alunos (A). Em
seguida, realizar-se-á a análise e a interpretação dos dados coletados,
focando nas falas dos entrevistados, criando relações entre elas,
separando-as em categorias e buscando embasamento junto à
fundamentação teórica para a interpretação do fenômeno estudado.
4.1 CONTEXTO HISTÓRICO E CARACTERIZAÇÃO DA
INSTITUIÇÃO
A Rede Federal de Educação Profissional Científica e
Tecnológica inicia a sua história em 23 de setembro de 1909 pelo
Decreto 7.566 do Presidente Nilo Procópio Peçanha, sendo criadas 19
Escolas de Aprendizes Artífices em todo o país. No dia 1º de setembro
de 1910 é criada a Escola de Aprendizes Artífices no município de
Florianópolis. O objetivo da nova instituição era a formação profissional
aos filhos de classes socioeconômicas menos favorecidas. Em 1937,
vigência do Estado Novo, a instituição muda o nome para Liceu
Industrial. Em 1942, os Liceus se transformam em Escolas Industriais e
Técnicas. Em 1968, a instituição se tornou a Escola Técnica Federal de
Santa Catarina com o objetivo de especializar a escola com cursos
técnicos de ensino médio, o que se deu a partir de 1971 por meio da
edição da Lei nº 5.692 das Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(IFSC, 2014).
Em 1978, as Escolas Técnicas foram transformadas em Centros
Federais de Educação Tecnológica - CEFETs, sendo que Santa Catarina
80
foi uma das últimas a passar por esse processo, o que somente ocorreu
em 2002. Até dezembro de 2008, a Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica era formada por instituições que
tinham como objetivo principal promover a formação profissional, mas
com características e nomenclaturas distintas. Além dos CEFETs e suas
Unidades Descentralizadas de Ensino, a Rede era composta por Escolas
Agrotécnicas, Escolas vinculadas às Universidades Federais, uma
Escola Técnica Federal e uma Universidade Tecnológica Federal
(SANTOS; SILVA JÚNIOR; SILVA, 2014).
Nacionalmente, o Governo Federal por meio do Ministério da
Educação (MEC) cria um novo modelo institucional em termos de
proposta político-pedagógica: os Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia. Atualmente, são 38 institutos, com 314 câmpus
espalhados por todo país, além de várias unidades avançadas, atuando
em cursos técnicos (50% das vagas), em sua maioria na forma integrada
com o ensino médio, licenciaturas (20% das vagas) e graduações
tecnológicas, podendo ainda disponibilizar especializações, mestrados
profissionais e doutorados voltados, principalmente, para a pesquisa
aplicada de inovação tecnológica (PACHECO, 2010).
Pacheco (2010) afirma que por meio da lei nº 11.892 de 2008 os
institutos federais equipararam-se às universidades, garantindo a oferta
em uma única instituição de cursos básicos até mestrado e doutorado
profissional. Em decorrência disso, houve uma ampliação significativa
de oportunidades de parcerias com universidades e institutos em todo o
mundo. O autor ressalta a inexistência de uma hierarquia entre as
universidades, os centros universitários, a universidade tecnológica, as
faculdades isoladas e os Institutos Federais.
De acordo com o autor,
a estrutura multicampi e a clara definição do
território de abrangência das ações dos Institutos
Federais afirmam, na missão destas instituições, o
compromisso de intervenção em suas respectivas
regiões, identificando problemas e criando
soluções técnicas e tecnológicas para o
desenvolvimento sustentável com inclusão social.
Na busca de sintonia com as potencialidades de
desenvolvimento regional, os cursos nas novas
unidades deverão ser definidos através de
audiências públicas e de escuta às representações
da sociedade. (PACHECO, 2010, p. 13).
81
Nesse contexto, de acordo com Pacheco (2010) os Institutos
Federais devem buscar a constituição de Observatórios de Políticas
Públicas, viabilizando intervenções por meio das ações de ensino,
pesquisa e extensão articuladas com as forças sociais da região. Dessa
maneira, os Institutos Federais constituem espaço fundamental na
construção dos caminhos com vista ao desenvolvimento local e regional.
Entretanto, segundo o autor, precisa ir além da educação profissional e
tecnológica focada na instrumentalização de indivíduos para ocupação
no mercado de trabalho. “Os Institutos Federais se identificam como
verdadeiras incubadoras de políticas sociais na construção de uma rede
de saberes que envolvem cultura, trabalho, ciência e tecnologia em favor
da sociedade” (PACHECO, 2011, p. 18).
Esta pesquisa foi realizada no Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), o qual é uma autarquia
vinculada ao Ministério da Educação (MEC) por meio da Secretaria de
Educação Profissional e Tecnológica (SETEC). É uma instituição
pública federal com sede em Florianópolis, com autonomia
administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e
disciplinar. A seguir, no quadro 7, apresenta-se a missão, visão e valores
da instituição.
Quadro 7 - Missão, visão e valores do IFSC
Missão
Promover a inclusão e formar cidadãos, por meio da educação
profissional, científica e tecnológica, gerando, difundindo e aplicando
conhecimento e inovação, contribuindo para o desenvolvimento
socioeconômico e cultural.
Visão
Ser instituição de excelência na educação profissional, científica e
tecnológica, fundamentada na gestão participativa e na
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Valores
ÉTICA, pautada por princípios de transparência, justiça social,
solidariedade e responsabilidade com o bem comum.
COMPROMISSO SOCIAL, pautado pelo reconhecimento às
diferenças históricas, econômicas, culturais e sociais.
EQUIDADE, pautada pelos princípios de justiça e igualdade nas
relações sociais e nos processos de gestão.
DEMOCRACIA, pautada pelos princípios de liberdade,
participação, corresponsabilidade e respeito à coletividade.
SUSTENTABILIDADE, pautada pela responsabilidade social e
ambiental.
QUALIDADE, pautada no princípio de dignificação humana, por
meio do trabalho, do conhecimento e do aprimoramento das
relações individuais e sociais.
Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (IFSC, 2014).
82
O IFSC é organizado em estrutura multicâmpus, com proposta
orçamentária anual identificada por câmpus e Reitoria, exceto no que
diz respeito a pessoal, encargos sociais e benefícios aos servidores. A
seguir, a Figura 3 com todos os câmpus que compõem a instituição.
Figura 3 - Câmpus distribuídos por Santa Catarina
Fonte: IFSC, 2014.
A estrutura organizacional básica do IFSC é composta por:
I – Órgãos Superiores da Administração:
a) Conselho Superior, de caráter deliberativo e consultivo;
b) Colégio de Dirigentes, de caráter consultivo;
II – Órgão Executivo e de Administração Geral: Reitoria, composta pelo
Reitor e cinco Pró-Reitores:
1. Pró-Reitoria de Ensino;
2. Pró-Reitoria de Administração;
83
3. Pró-Reitoria de Extensão e Relações Externas;
4. Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação;
5. Pró-Reitoria de Desenvolvimento Institucional.
III – Órgãos de Assessoramento:
a) Colegiado de Desenvolvimento de Pessoas:
1. Comissão Permanente de Pessoal Docente;
2. Comissão Interna de Supervisão do PCCTAE;
b) Colegiado de Ensino, Pesquisa e Extensão;
c) Comissão Própria de Avaliação.
IV – Órgão de Controle: Auditoria Interna;
V – Procuradoria Federal;
VI – Órgãos de atividade finalística: Diretorias-gerais dos câmpus e
Diretoria do Centro de Referência em Formação e Educação a Distância;
VII – Órgãos de Assessoramento das Diretorias-gerais dos câmpus:
Colegiados dos câmpus (IFSC, 2014).
De acordo com o PDI (IFSC, 2014), o IFSC, para atender à sua
lei de criação, garante o mínimo de: 50% de suas vagas para ministrar
educação profissional técnica de nível médio, para os concluintes do
ensino fundamental e para o público da educação de jovens e adultos; e,
20% de suas vagas para programas especiais de formação pedagógica,
com o objetivo de formar professores para a educação básica, sobretudo
nas áreas de ciências e matemática, e também para a educação
profissional.
O Instituto atua na educação básica e na educação superior, nas
modalidades presencial e a distância, em diferentes níveis:
a. Qualificação profissional: cursos de formação inicial e
continuada de trabalhadores (FIC).
b. Educação Básica:
cursos de qualificação profissional articulada ao ensino
fundamental na modalidade de educação de jovens e
adultos, incluindo ofertas de educação no campo;
cursos de qualificação profissional ou cursos técnicos
articulados ao ensino médio na modalidade de educação de
jovens e adultos;
84
cursos técnicos integrados, subsequentes e concomitantes,
articulados ao ensino médio regular, incluindo ofertas de
educação no campo.
c. Educação Superior:
cursos de graduação:
cursos superiores de tecnologia;
bacharelados;
licenciaturas, incluindo ofertas de educação no campo;
cursos de pós-graduação:
I. lato sensu: aperfeiçoamentos e especializações;
II. stricto sensu: mestrados e doutorados. (IFSC, 2014)
O IFSC oferta somente um curso de mestrado na área de
mecatrônica e dez cursos de especializações na área da saúde, gestão
pública, PROEJA, ensino de ciências, dentre outros, (presenciais e
EADs). Com relação aos cursos técnicos e superiores de tecnologia,
concentram-se nos seguintes eixos tecnológicos: Ambiente e Saúde;
Controle e Processos Industriais; Gestão e Negócios; Informação e
Comunicação; Infraestrutura; Produção Alimentícia; Produção Cultural
e Design; Produção Industrial; Recursos Naturais; Segurança; Turismo,
Hospitalidade e Lazer. Além dos cursos de tecnologia, a instituição
também oferta cursos de engenharia e licenciatura nas seguintes áreas do
conhecimento:
a. Engenharias, com os seguintes cursos: Controle e Automação;
Civil; Elétrica; Eletrônica; Mecatrônica e Telecomunicações;
b. Ciências exatas e da terra, com os cursos de Licenciatura em
Física e Licenciatura em Química. (IFSC, 2014).
Segundo o Anuário Estatístico da instituição (ano base 2015), o
IFSC é composto por 2.353 servidores, dentre eles, 1.080 técnicos
administrativos e 1.272 professores. Os alunos contemplados por seus
cursos compõem o número de 32.070. Este número de alunos é
distribuído nos cursos ofertados da seguinte maneira: 13.180 alunos nos
cursos de qualificação profissional; 13.116 nos cursos técnicos
(incluindo alunos de ensino médio); 4.007 são alunos de graduação.
Destes 32.070 alunos, 1.767 são alunos de pós-graduação (especialização e mestrado); 27.967 são alunos de cursos presenciais; e,
4.103 são alunos de cursos a distância. No total, são 643 cursos
ofertados pela instituição, dentre eles, 143 cursos técnicos, 36 cursos de
85
graduação, 22 cursos de especialização, 1 curso de mestrado e 441
cursos FIC (formação de iniciação continuada).
4.2 EXTENSÃO NO IFSC
De acordo com o PDI, o IFSC é uma instituição de educação,
ciência e tecnologia, pública, que deve assumir sua função social,
considerando o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão. A educação se baseia na relação dessas três áreas, cabendo à
última área o compartilhamento de conhecimentos com a sociedade,
contribuindo para o cumprimento da missão institucional. As ações da
extensão são responsáveis por relacionar os saberes teóricos e práticos,
desenvolvendo as potencialidades dos alunos para que sejam cidadãos
participativos e corresponsáveis nos processos de transformação da
sociedade. (IFSC, 2014).
Na articulação com os diversos setores da sociedade, o IFSC
intervém por meio de ações de ensino, pesquisa e extensão, construindo
processos que contribuem para o desenvolvimento local e regional,
assumindo que a educação profissional e tecnológica atua atendendo o
seu compromisso com o todo social. Nesse contexto, a instituição torna-
se um agente estratégico na estruturação de diretrizes regionais e de
formação com base nas demandas reais, contribuindo para o
desenvolvimento com base nos aspectos sociais, culturais e econômicos
de uma região (IFSC, 2014).
As atividades de extensão no Instituto têm por objetivo
proporcionar aos diferentes segmentos da sociedade o conhecimento
construído nas práticas de ensino e pesquisa da instituição. As principais
diretrizes que se baseia a extensão relacionada aos alunos são:
Estimular a participação do aluno em atividades de extensão,
através do desenvolvimento de ações na comunidade como
parte integrante dos currículos dos cursos ofertados pelo
IFSC, articulando diferentes áreas do conhecimento;
Incentivar a inserção de atividades de extensão nos projetos
pedagógicos dos cursos;
Possibilitar o contato com a comunidade e com o mundo do
trabalho, favorecendo a inclusão profissional do aluno e do
egresso do IFSC;
Promover uma formação ampla do aluno por meio do
desenvolvimento de atividades que permitam o acesso à
ciência, à tecnologia, à cultura e ao esporte;
86
Sensibilizar os alunos para que desenvolvam a ideia de
pertencimento social, para que sintam corresponsáveis pelo
desenvolvimento de ações profissionais que levem ao
desenvolvimento regional;
Ampliar as experiências discentes em termos teóricos,
metodológicos, tecnológicos e de cidadania;
Fomentar e apoiar programas de mobilidade discente,
especialmente no que se refere a intercâmbios,
independentemente da área de formação. (IFSC, 2014).
A seguir, serão descritas as atividades da extensão da instituição
no ano de 2014, segundo o Relatório de Atividades de Extensão. Nos
projetos de Extensão participaram 951 servidores (dentre eles 679
docentes e 272 técnicos administrativos) e 527 alunos. Foram aprovados
em editais externos, 16 projetos de extensão, com recursos financeiros
do MEC, CAPES e CNPq, para serem executados em 2014 e 2015.
Nesse ano, a Diretoria de Extensão disponibilizou R$ 777.550,00
em recursos financeiros próprios para desenvolvimento de projetos de
extensão fomentados por meio de editais e projetos institucionais. Os
gráficos da figura 4 a seguir apresentam os investimentos da Pró-
Reitoria de Extensão (PROEX) em bolsas de alunos e coordenadores de
projetos.
Figura 4 - Investimentos PROEX 2014
Fonte: Relatório de atividades, 2014/2015 (IFSC, 2015).
87
O Instituto participou do Seminário de Extensão Universitária de
Região Sul - SEURS com 13 trabalhos apresentados nas modalidades: 9
apresentações orais, um mini-curso, 3 Oficinas e um estande
institucional. A instituição foi representada por 7 câmpus. No Seminário
de Pesquisa e Extensão (SEPEI), foram apresentados 122 trabalhos de
Extensão, sinalizando 48% mais trabalhos apresentados em relação ao
ano de 2013. Além disso, foram promovidas atividades de inserção
social, feira de economia solidária, oficinas nas escolas públicas e
apresentações culturais.
Alunos e servidores de diferentes Câmpus, por meio do incentivo
da Extensão, participaram de três edições do Projeto Rondon –
Operação Integração – Udesc/IFSC do Núcleo Extensionista Rondon
(NER), no Planalto Norte de Santa Catarina, no Oeste de Santa Catarina
e uma operação nacional em Goiás. Em 2014, a participação de alunos
no projeto duplicou comparando com os dados de 2013. O Instituto
atende uma parcela da população à margem da devida inserção social,
carentes de ações que os integrem a uma condição mínima de emprego e
renda. Dessa forma, tem cumprido com sua função social ao promover,
por exemplo, cursos de capacitação em Economia Solidária. Os cursos
foram realizados em todas as regionais, capacitando 53 servidores,
assim como foi promovida durante o SEPEI, uma Feira de Economia
solidária.
Também em 2014, foram implementados em 8 câmpus o
programa Mulheres Sim, visando promover a valorização, economia
criativa e geração de renda para mulheres em situação de
vulnerabilidade social. Ao total foram atendidas cerca de 150 mulheres,
as quais participaram de cursos de formação inicial em educação e
gênero e geração de renda. Além disso, foram promovidas feiras de
economia solidária com propósito pedagógico a fim de valorizar e
incentivar a economia criativa das mulheres.
Na extensão também houve a conquista de 81 novas parcerias
para o desenvolvimento de atividades que visaram um maior alcance da
missão institucional, fortalecendo a imagem da instituição. A Diretoria
de Extensão publicou a sua primeira revista científica de Extensão, cujos
trabalhos de avaliação e seleção dos artigos e relatos de experiências
foram realizados no ano de 2014.
O Instituto desenvolveu 385 projetos de extensão, 851 ações e 3
programas de extensão (Mulheres Sim, Novos Talentos e Radiologia na
Comunidade). Dos projetos de extensão, 204 foram contemplados com
bolsas por meio dos editais da Diretoria de Extensão. Os demais foram
fomentados por recursos do câmpus e editais externos. Todos os
88
projetos contemplavam uma das oito áreas temáticas da extensão:
Comunicação, Cultura, Direitos Humanos e Justiça, Educação, Meio
Ambiente, Saúde, Tecnologia e Produção e, por último, Trabalho.
4.2.1 Projetos Selecionados
Em 2014, foram realizados no IFSC 385 projetos de extensão.
Dentre os projetos, 66 eram projetos de cunho social e destes foram
selecionados 6 para este estudo, por acessibilidade e tipicidade. A
seguir, será feita uma breve explicação sobre cada um deles.
PROJETO 1 – Projeto Rondon – Operação Grande Oeste – Câmpus
São José - Região da Grande Florianópolis
O projeto Rondon é promovido no IFSC com parceria da
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e possui o objetivo
de proporcionar uma formação cidadã aos alunos e incentivar a troca de
conhecimentos por meio de intervenções nas comunidades atendidas
pelo projeto. Nessas operações, os alunos oferecem oficinas nas
comunidades a fim de promover o bem-estar e o desenvolvimento
sustentável.
Os alunos e servidores do IFSC foram selecionados pela Diretoria
de Extensão da instituição por meio de edital. Os participantes
contemplados receberam bolsa, cabendo a alimentação e o alojamento
dos alunos à responsabilidade dos dirigentes dos 15 municípios em que
aconteceram as operações: Palmitos, Riqueza, Iraceminha, Flor do
Sertão, Romelândia, Saltinho, Serra Alta, Sul Brasil, Modelo,
Pinhalzinho, Saudades, Cunhataí, Águas de Chapecó, São Carlos e
Maravilha. Foi uma experiência de 12 dias na região de Grande Oeste de
Santa Catarina, praticando ações diretamente nas comunidades e
totalizando 181 pessoas atendidas.
O projeto incluiu o planejamento das oficinas, seleção dos alunos
e servidores participantes da operação e a operação em si. O período de
execução do projeto foi entre 05 de maio e 05 de julho de 2014,
totalizando uma carga horária de 160 horas. A equipe executora era
formada por 2 alunos bolsistas e um técnico administrativo, sendo o
último o coordenador do projeto. Além disso, um grupo de 19 alunos e 4
servidores do IFSC também participaram das operações do projeto.
89
PROJETO 2 – Direitos? Para quais humanos? – Câmpus Gaspar -
Região do Vale do Itajaí
O projeto foi composto por oficinas abertas à comunidade, nas
quais o tema dos Direitos Humanos foi amplamente debatido. Questões
como o preconceito racial, violência contra a mulher, direitos aos casais
do mesmo sexo, acessibilidade e direitos das pessoas com necessidades
especiais, foram o enfoque principal. O conceito de humanidade foi
colocado sob questionamento e o tema dos direitos humanos pode ser
discutido entre todos os participantes.
Dentre os objetivos do projeto estavam: o oferecimento de
subsídios históricos, legais e filosóficos para se repensar a cultura local
e os preconceitos nela inseridos; a oportunidade de esclarecimento
acerca da história da luta pela consolidação dos Direitos Humanos no
mundo, enfocando, principalmente, o nosso país; abertura de um espaço
amplo de reflexão e discussão acerca das desigualdades ainda existentes
em nosso país; e, a capacitação de membros da sociedade civil, tanto
profissionais quanto cidadãos interessados, à divulgação de uma cultura
de Direitos Humanos.
O projeto atendeu profissionais da Educação, alunos, membros
dos Conselhos Tutelares da região e membros da Segurança Pública,
totalizando 17 pessoas. O projeto aconteceu entre o período de 10 de
março a 10 agosto de 2014 com duração de 5 meses, totalizando uma
carga horária de 575 horas. Os encontros aconteciam duas vezes por
semana nas salas de aula do câmpus Gaspar, no período noturno. A
equipe executora do projeto era formada por uma aluna bolsista e 3
ministrantes docentes da instituição, sendo que uma delas foi a
coordenadora do projeto.
PROJETO 3 – Fazendo Arte, conquistando Direitos e construindo
Cidadania – Câmpus Lages - Região do Planalto Serrano
O projeto consistiu na realização de oficinas de artesanato,
abrangendo mulheres em situação de vulnerabilidade social, vítimas de
violência doméstica, moradoras dos bairros periféricos da cidade de
Lages. Por meio do projeto, buscou-se construir um processo de
interação com a perspectiva de detectar limites, potencialidades e
desafios em que vivem as próprias mulheres em suas relações pessoais,
familiares e sociais a fim de dar novos passos na superação das
situações de vulnerabilidade em que vivem.
90
O objetivo era desenvolver oficinas na comunidade para articular
conhecimento acadêmico com as necessidades dessa população
empobrecida e excluída de direitos. Durante a realização das oficinas
foram discutidos e socializados vários assuntos de interesse das
mulheres, suas histórias e experiências culturais da região. No projeto
foram abordados assuntos como os direitos, a violência de gênero, a
autogestão, a economia solidária, dentre outros, com vistas ao
empoderamento e à confecção de produtos. Os produtos foram vendidos
nas feiras de Economia Solidária da região para ajudar no orçamento
doméstico.
O projeto teve início em 01 de setembro de 2014 e foi concluído
em 31 de agosto de 2015, com carga horária total de 192 horas. As
oficinas eram itinerantes e foram realizadas nos Centros de Referência
de Assistência Social dos bairros, nas associações de moradores, nas
escolas, nos centros comunitários e, principalmente, nas casas de
famílias. O público atendido total foi de 161 pessoas, formado por
mulheres em situação de vulnerabilidade social, como: desempregadas,
mães solteiras, mulheres chefes de família, vítimas de violência
doméstica, analfabetas e moradoras da periferia da cidade. A equipe
executora era formada por um docente, 2 alunas bolsistas e 2 técnicas
administrativas, dentre elas, a coordenadora que atua como assistente
social na instituição.
PROJETO 4 – Mulheres SIM – Câmpus Caçador - Região Oeste
O projeto Mulheres SIM realizado em Caçador é um dos projetos
que compõe o Programa de Extensão do IFSC denominado Programa
Mulheres SIM, gerido e financiado pela Diretoria de Extensão do IFSC.
O Programa em 2014 aconteceu em 8 câmpus e tinha o objetivo de
atender e formar mulheres em situação de vulnerabilidade social e sem
escolaridade, oferecendo cursos FIC (formação inicial e continuada),
incentivando o acesso aos direitos, cidadania, possibilidades de geração
de renda e, principalmente, a valorização dessas mulheres.
O projeto de Caçador foi escolhido para o estudo por se tratar de
um público diferenciado, já que o projeto atendeu e proporcionou aulas
às mulheres do presídio do município. As aulas aconteceram duas vezes
por semana, com duas turmas de 15 alunas. O curso FIC ofertado era de
Educação e Gênero e oferecia as seguintes disciplinas: Vivência
Matemática, Saúde da Mulher e da Família, Linguagens, Informática,
Conhecimento Histórico-Cultural, Ética e Cidadania, Desenvolvimento
Social e Sustentável e Geração de Renda.
91
O projeto era composto por três etapas: o curso de Educação e
Gênero, a Feira de Economia Solidária (preparação e participação na
feira) e o Acompanhamento das egressas (avaliação das alunas). O
projeto aconteceu no período de agosto a dezembro de 2014, totalizando
uma carga horária de 96 horas. O público atendido total foi de 30
mulheres presidiárias. A equipe executora era formada por 9 docentes e
uma aluna bolsista.
PROJETO 5 – Inclusão Digital: Uso do computador e internet na
comunidade rural – Câmpus Canoinhas - Região Norte
O projeto surgiu da demanda de um aluno que veio da
comunidade rural fazer o curso Técnico de Informática. Nessa
comunidade existiam alguns equipamentos que não tinham manutenção
e os equipamentos estavam sem uso em um pequeno laboratório de
informática da escola municipal, próxima a Canoinhas. A proposta do
projeto se deu por meio da conversa do aluno com o coordenador do
projeto, o qual soube que tanto os alunos quanto os professores daquela
escola gostariam de utilizar esses equipamentos, assim como algumas
pessoas daquela comunidade possuíam o mesmo interesse.
O projeto contemplou a manutenção dos equipamentos de
informática, a colocação deles em operação e o incentivo do uso dos
equipamentos. Após a primeira etapa de manutenção dos computadores
houve a disponibilização de internet, que antes não existia. Em seguida,
começaram as aulas aos alunos de noções de informática básica e acesso
à internet. As turmas contemplavam alunos da escola municipal e
também os interessados da comunidade rural da região, totalizando 45
pessoas. O projeto aconteceu de 15 de outubro a 15 de dezembro de
2014, com a carga horária total de 30 horas. A equipe era formada pelo
coordenador docente e um aluno bolsista.
PROJETO 6 – O ensino da história e da cultura afro-brasileira nas
escolas públicas de ensino médio de Criciúma e os desafios para a
eliminação do racismo – Câmpus Criciúma - Região Sul
O projeto de extensão buscou analisar o grau de
institucionalização da Lei 10.639/2003 em escolas públicas estaduais de
nível médio em Criciúma/SC na tentativa de aproximar o câmpus dessas
escolas. A partir de referenciais teóricos sobre o tema foram analisadas
algumas escolas de ensino médio selecionadas a partir de critérios, como
a localização geográfica e número de matrículas.
92
Pelo fato de Criciúma ter uma trajetória negra importante e uma
comunidade negra relativamente organizada, houve a motivação de
tentar entender de que maneira as escolas de ensino médio da rede
pública vinham trabalhando a questão da legislação que obriga o ensino
da história afro-brasileira. O projeto visou fazer uma investigação nas
escolas com relação à lei e tentar organizar ações na semana de
Consciência Negra, evento no câmpus, aberto à participação da
comunidade interna e externa ao IFSC. Os professores e a aluna bolsista
participantes do projeto realizaram entrevistas com os coordenadores
pedagógicos e professores das escolas públicas e, posteriormente,
organizaram ações na Semana de Consciência Negra no câmpus.
O projeto aconteceu de 15 de outubro a 15 de dezembro de 2014,
com a carga horária total de 160 horas. O público atendido pelo projeto
foi formado por educadores da rede pública estadual e estudantes de
nível médio de escolas públicas estaduais, totalizando aproximadamente
300 pessoas. A equipe executora do projeto foi composta por 2 docentes
(um deles era o coordenador) e uma aluna bolsista.
4.2.2 Caracterização dos Respondentes
Os respondentes participantes da pesquisa foram 11 pessoas.
Dentre elas, 6 coordenadores dos projetos selecionados e 5 alunos
bolsistas dos projetos. Portanto, a amostra da pesquisa dividiu-se em 2
grupos: dos coordenadores (representados pela letra C) e pelos alunos
participantes (representados pela letra A). A seguir, é apresentado o
Quadro 8 que resume o perfil dos coordenadores participantes da
pesquisa.
93
Quadro 8 - Perfil dos coordenadores
Respondentes Função
Tempo
de
IFSC
Titulação Região Sexo
C1 Assistente em
Administração
5 anos Graduando de
Tecnologia em
Produção
Multimídia
Bilíngue
Grande
Florianópolis
Masculino
C2 Docente de
Filosofia
2,5
anos
Doutora em
Filosofia
Vale do
Itajaí
Feminino
C3 Assistente
Social
2,5
anos
Especialista em
Políticas e Gestão
de Serviço Social
Planalto
Serrano
Feminino
C4 Docente de
Administração
2,5
anos
Doutora em
Administração
Oeste Feminino
C5 Docente de
Informática
4 anos Mestre em
Ciências da
Computação
Norte Masculino
C6 Docente de
Sociologia
3 anos Mestre em
Sociologia
Sul Masculino
Fonte: Dados primários (2016).
No grupo dos coordenadores, 50% dos entrevistados eram do
sexo feminino e 50% do sexo masculino. Dos coordenadores, 4 eram
docentes, uma era assistente social e um assistente em administração. A
maioria dos entrevistados (83%) ingressaram na instituição há menos de
5 anos e 17% ingressaram há mais de 5 anos. Todos os coordenadores se
encontram desempenhando alguma função administrativa,
principalmente, coordenação de curso. Daqueles que não são docentes,
um é coordenador de extensão do seu câmpus e a outra coordena os
recursos da Assistência Estudantil do seu câmpus. Com relação à
formação dos professores, a amostra era composta por uma doutora em
Administração, uma doutora em Filosofia, um mestre em Ciências da
Computação, um mestre em Sociologia, uma especialista em Políticas e
Gestão de Serviço Social e um graduando de Tecnologia em Produção
Multimídia Bilíngue. A seguir é apresentado o Quadro 9 que resume o perfil dos alunos participantes dos projetos de extensão selecionados
para esta pesquisa.
94
Quadro 9 - Perfil dos alunos
Respondentes Curso Região Sexo
A1 Técnico em Refrigeração Grande Florianópolis Feminino
A2 Graduação em Gestão da
Tecnologia da Informação
Grande Florianópolis Masculino
A3 Técnico em Química Vale do Itajaí Feminino
A4 Técnico em Agricologia Planalto Serrano Feminino
A5 Técnico em Administração Oeste Feminino
A6 Técnico em Mecatrônica Sul Feminino
A7 Graduação em Engenharia
de Telecomunicações
Grande Florianópolis Feminino
Fonte: Dados primários (2016).
No grupo dos alunos, 6 eram do sexo feminino e 1 era do sexo
masculino, totalizando 7 entrevistados. Uma das alunas cursa o Ensino
médio integrado com curso técnico em refrigeração e climatização, uma
cursa o Ensino médio integrado com curso técnico em química, um
cursa o tecnólogo de Gestão da Tecnologia da Informação, uma cursa o
técnico em administração, uma cursava o técnico em agricologia, uma
cursava o técnico em mecatrônica e outra cursava a graduação de
Engenharia de Telecomunicações.
A seguir, apresenta-se a análise e interpretação dos dados
relativos as cinco categorias utilizadas neste estudo. A fim de facilitar a
compreensão da próxima etapa, resgatou-se o Quadro 10, o qual coloca
o resumo das categorias que foram analisadas adiante.
Quadro 10 - Competências da Formação Ética e Cidadã
(continua)
(C1) Atuação ética
Demonstra sentido ético sustentado em
princípios e valores de justiça, bem comum e
dignidade em sua atuação como pessoa,
cidadão e profissional.
(C2) Valorização e respeito à
diversidade
Reconhece o outro em sua dimensão
humana, sem incorrer em práticas
discriminatórias e compreendendo que as
diferenças sociais, culturais e de capacidade
enriquecem a convivência.
(C3) Interação dialógica
Visa estabelecer relações, o
compartilhamento de ideias, promovendo e
valorizando as interações das partes de um
todo.
95
Quadro 10 - Competências da Formação Ética e Cidadã
(conclusão)
(C4) Inovação e criatividade
Gera novas respostas para melhor atender as
necessidades do entorno sociocultural,
profissional, laboral e científico.
(C5) Cidadania plena (cidadania crítica
+ cidadania ativa)
Cidadania crítica (capacidade de reflexão,
argumentação) e cidadania ativa (resolução
de problemas, atitudes altruístas, altruísmo -
vontade de beneficiar a pessoa que está
passando por uma situação crítica).
Fonte: Adaptado de Villar (2009) e Matiz (2013).
4.3 ANÁLISE DOS RELATOS DOS ENTREVISTADOS
A seguir, dar-se-á a análise dos relatos dos entrevistados,
relacionando-os às categorias de análise e à fundamentação teórica do
estudo.
4.3.1 Atuação Ética
Os fatores de análise considerados nesta categoria a respeito de
atuação ética serão esclarecidos de acordo com Matiz (2013):
a) a responsabilidade e compromisso dos alunos participantes.
Para o autor, um dos valores presentes em uma formação
cidadã seria a corresponsabilidade, que implica aceitar a cota
de responsabilidade que os diferentes sujeitos de uma
sociedade têm frente aos problemas sociais e, também, frente
a suas alternativas de solução. Esse fator pode ser observado
no comportamento dos alunos, na medida em que eram
autônomos em suas atividades e ao mesmo tempo em que se
percebiam importantes no processo de trocar conhecimento e
tentar atender necessidades das comunidades.
b) o resgate de valores de justiça. Diz respeito à formação que
contempla uma atuação com critérios de justiça social, que
promove a luta de forma não violenta contra todo ato de
injustiça social existente na vida pública. Essa questão
também foi evidenciada nos projetos, fortalecendo nos alunos
a importância de se combater as injustiças sociais.
c) a formação e o fortalecimento de valores éticos. O
fortalecimento dos valores éticos implica na possibilidade de
combater qualquer mecanismo que seja contrário à ética e
exercer uma cidadania baseada no bem comum e não nos
96
interesses individuais ou corporativos. Esse fator pode ser
vivenciado pelos alunos participantes, cujos esforços não se
concentravam nas suas questões pessoais, e sim visavam o
bem-estar social das comunidades atendidas pelo projeto.
De acordo com Rios (2008), a palavra ética vem do vocábulo
ethos, de origem grega, e significa costume, jeito de ser. Segundo o
autor, a ética se diferencia da moral, pois no plano da ética, busca-se um
juízo crítico, próprio da filosofia, querendo compreender o sentido da
ação, o valor que norteia o comportamento, ao contrário da moral que se
refere ao comportamento em si, que pode ser bom ou mau. A atuação
ética está estruturada no respeito, na justiça e na solidariedade,
princípios estes que podem ser reconhecidos em situações de trabalho e
que levam à necessidade do reconhecimento do outro (RIOS, 2009).
Quando perguntados sobre o que entendiam por atuação ética,
percebeu-se um alinhamento no entendimento dos entrevistados,
segundo algumas falas transcritas a seguir.
O que eu entendo por esse conceito de agir com
ética, tipo, fazer o bem, pensando não só em mim,
mas em todos, no geral. (A3)
Ética eu entendo por você conseguir discernir o
que é certo e o que é errado, o que que a gente faz
perante a sociedade, quais nossas ações perante
ela. A partir dessa base da ética, das discussões
que a gente tem sobre ética, a gente entende que
também temos que assumir responsabilidade pelos
nossos atos, de onde vem então o conceito de
responsabilidade social, a base dele é a ética. A
partir disso, pensamos em nós como cidadãos,
como que a gente vai assumir a responsabilidade
pelos nossos atos e como nós enquanto
organização também vamos assumir
responsabilidade pelos nossos atos. (C4)
Por atuação ética, eu entendo agir no mundo com
uma postura que contribua para uma sociedade
saudável. (A7)
A importância de se ter uma atuação ética foi colocada pelos
coordenadores aos alunos em todos os projetos estudados por meio da
reflexão sobre a responsabilidade de se respeitar a realidade das
97
comunidades atendidas, sobretudo, na convivência social das atividades
realizadas. A vivência prática nos projetos permeou esse conceito,
mostrando aos alunos situações em que a ética deve estar presente e
deve nortear seus pensamentos e atitudes enquanto cidadãos. É possível
observar esse aprendizado nas falas do quadro a seguir.
Quadro 11 - Atuação ética
Olha, de atuação ética eu remeteria a questão da minha formação em termos de
pesquisa né? A questão da ética humana, fomentar um processo de aproximação
com uma comunidade, enfim, esclarecendo, sendo transparente com os
objetivos da pesquisa, com os resultados, com sua possível divulgação,
procurando de certa forma valorizar ou colocar no centro essa questão humana
né? Principalmente, na área de ciências sociais, a gente lida com a questão do
indivíduo, com valores, enfim, com umas séries de questões, que não pode ser
num processo mecânico. (C6)
É claro que a ética no ensino, na pesquisa, na extensão, ela tem que permear
todos os processos, porque especificamente no nosso caso, a gente estava
trabalhando com mulheres que são reeducandas, que são presidiárias, que já
estão numa situação de vulnerabilidade social. Então, toda relação que eu tinha
com elas tinha que ser muito ética, muito clara e de muita responsabilidade
pelos meus atos, porque tudo que eu levava para o presídio eu tinha que saber
que isso poderia causar algum impacto lá dentro. Então, desde materiais, desde
a aula, vídeos, tudo isso a gente tinha que pensar nos impactos que isso ia ter lá
dentro, nas oficinas de artesanato, por exemplo, então a gente levava tesoura,
tecidos e outros materiais. Além disso, tinha que ser muito ético com a direção
do presídio, no sentido de se responsabilizar mesmo pelos atos lá dentro. (C4)
Sim, hoje eu paro e penso antes de tomar uma decisão, antes de falar alguma
coisa, porque às vezes as palavras magoam e, às vezes, a gente age por impulso
e acaba magoando pessoas que a gente gosta. Então, o projeto mostrou que tem
realidades piores que a nossa. A importância da reflexão antes de agir, é bem
melhor refletir do que agir por impulso, como elas agiram e estão pagando por
isso, as mulheres estão cientes que estão lá porque erraram. (A5)
Fonte: Dados primários (2016).
Segundo Ruza e Suárez (2013), o estudante universitário deve
possuir a informação sobre a importância de gerar uma alta qualidade no
projeto social. Além disso, deve assumir o compromisso ético estudantil
no planejamento e execução das diferentes atividades, atendendo aos
interesses institucionais, comunitários e pessoais, para que surja a
oportunidade de desenvolver competências cidadãs no exercício
98
profissional. Para as autoras, essa formação integral depende, muitas
vezes, da orientação adotada pelo professor universitário, o qual deve
assumir a responsabilidade de ajudar a equilibrar os conhecimentos
acadêmicos com as experiências comunitárias a fim de socializar
aprendizagens relacionadas ao bem-estar comum.
Nos depoimentos dos alunos e coordenadores dos projetos foi
possível perceber o comprometimento e a responsabilidade dos alunos
nas atividades. As respostas foram unânimes nesse quesito. Assim como
o coordenador estimulava o compromisso do aluno, também o projeto
clamava por essa responsabilidade, o que era entendida pelos alunos.
Um bom exemplo disso seria a participação dos alunos no Projeto
Rondon, onde os alunos usavam coletes e representavam as instituições
de ensino, tornando-os ainda mais comprometidos em seus propósitos.
A responsabilidade de interagir com as comunidades dos projetos era
grande, pois ao lidar com pessoas, os alunos lidam com expectativas e
necessidades, as quais são subjetividades que demandam cuidado e
comprometimento. A seguir, algumas falas transcritas a esse respeito.
Quadro 12 - Comprometimento e responsabilidade dos alunos
Quando você estabelece, propõe um projeto deste dentro do Campus isso fica muito
mais fácil de você controlar, de ele ser desenvolvido. Quando ele rompe a barreira
dos muros da instituição, quando ele é feito em uma comunidade, ele não está
diretamente sobre nossos olhares. Então tem que ter um compromisso bem maior do
aluno, da comunidade envolvida e isso foi bem discutido antes da proposição do
Projeto. (C5)
Sim, inclusive, até na seleção do bolsista foi colocado muito claramente, que eles
teriam responsabilidades e que eles seriam exemplos para as pessoas que estariam
ali né? Esse foi um dos motivos da aluna ter sido escolhida como bolsista, foi
justamente esse, esse compromisso que ela tem com a questão dos direitos humanos.
(C2)
Eu tive comprometimento porque eu gosto, eu não só ensinei, eu aprendi muito com
elas também. (A4)
É uma responsabilidade muito grande, você está com o colete do Rondon, levando o
nome da UDESC e do IFSC, e você tem que fazer o seu melhor, passar o nome das
instituições, passar conhecimento e tem uma responsabilidade muito grande. Porque
os alunos estão, por exemplo, dentro da sala de aula, dentro da comunidade, dentro
de um grupo de mães falando né? Usando o poder da fala. A responsabilidade e o
compromisso são subentendidos pelos alunos. (A1)
Fonte: Dados primários (2016).
99
Com relação aos valores de justiça, segundo Matiz (2013), parte-
se do pressuposto que a justiça é um valor associado ao comportamento
dos seres humanos, que são aqueles que constituem as instituições e
organizações estatais, empresariais e sociais. Segundo o autor, cabe a
eles agir a favor do público e contra qualquer injustiça social. Nesse
contexto, foi possível perceber que a maioria dos participantes dos
projetos, coordenadores e alunos responderam que o projeto foi capaz de
proporcionar aos alunos uma compreensão melhor a respeito de justiças
sociais. No quadro 13, observa-se que esse entendimento, por parte dos
alunos, sobre os valores de justiça que foram construídos na prática das
atividades com a comunidade atendida.
Quadro 13 - Resgate dos valores de justiça
Eu tinha outra visão das pessoas presas, eu nunca tinha ido num presídio. E o
dia que eu entrei lá, o respeito que elas tiveram por mim me impressionou. Pra
mim houve um crescimento bem grande, na valorização de poucas coisas, vejo
que elas gostariam de estar no meu lugar, e não ter errado como hoje elas
sabem, que estão cumprindo pena porque elas erraram, e elas falam
abertamente. Na minha turma também eles sempre perguntavam como que era,
os professores tocavam no assunto em sala de aula, me senti valorizada na
turma e eu sempre mostrava um outro lado pra turma também, pros meus
colegas de aula, eu acho que foi bem gratificante. (A5)
Essa questão de justiça se fala tanto, só que às vezes a gente fala num modo
assim mais popular né? Nas oficinas a gente sempre discutia essa questão da
justiça social, por exemplo, porque que uns são tão ricos e uns são tão pobres
né? A gente explicava muito isso, porque que 1% da população detém 50% da
riqueza. Daí a gente explicava essa questão dos modos de produção, de que o
rico ele tem todos os modos de produção então ele usa a força do trabalhador,
então essa questão a gente discutia muito. (C3)
A gente conseguiu abrir ainda que minimamente, essa questão dentro do
Campus, principalmente, conseguiu fazer algumas ações, trazendo pessoas de
fora do Campus para dentro, principalmente na Semana da Consciência Negra,
essa questão do racismo é uma questão que é institucionalizada, os próprios
alunos reproduzem muito essa lógica, e no mínimo a gente conseguiu, não digo
causar um constrangimento, não sei se essa palavra é a correta, mas colocar isso
na pauta né? Conseguimos trazer esses aspectos dessa realidade e abordando
essas questões de desigualdade, injustiça, os próprios alunos negros, que, de
repente, começaram a se preocupar mais com essa situação, se afirmar e o
próprio racismo dentro do Câmpus, que é uma situação que existe, tudo isso,
apareceu nesse processo. (C6)
Fonte: Dados primários (2016).
100
Contudo, observa-se que não houve unanimidade por parte dos
coordenadores do projeto em relação a este critério. O projeto que
atendeu uma comunidade rural com manutenção e oferta de curso básico
de informática na escola pública da comunidade, proporcionou ao aluno
a vivência e o atendimento à demanda daquelas pessoas. Porém, nas
atividades não houve espaço para discussões mais reflexivas a respeito
de justiça social. Pode-se perceber que o objetivo do projeto era atender
uma demanda pontual da comunidade, pois o projeto possuía caráter
mais técnico do que reflexivo. Conforme pode ser percebido na fala do
Coordenador 5, transcrita a seguir.
Também o público, eram dois públicos distintos,
que seriam os alunos da própria escola, que eu
acho que é uma faixa etária onde você não discute
muito o que é justo e o que não é. E, além disso, a
comunidade como é do interior não é do costume
do cotidiano fazer estas reflexões e fazer esta
abordagem. Não era objetivo do projeto fazer isso,
esse desenvolvimento ou tocar nestes assuntos.
(C5)
Com relação ao terceiro fator de análise desta categoria, Cortina
(2004) coloca que a formação ética do estudante no contexto
universitário requer a adoção de procedimentos de análises e
discernimento social, dentre os quais destacam-se:
a) metodologias que integram aspectos cognitivos, afetivos,
técnicos e práticas tecnológicas, resolução de conflitos e ações
de voluntariado social. Os entrevistados puderam comprovar,
por meio de seus depoimentos, que as ações sociais são
importantes para a comunidade e, por isso entendem a
necessidade de se resolver os conflitos com muito respeito. Os
conflitos não devem comprometer as ações em prol da
comunidade. Essas questões foram evidenciadas nas falas
transcritas a seguir.
A gente já está ali se colocando à disposição da
comunidade, também se coloca à disposição do
outro dentro da equipe. A gente tenta sempre
como coordenação fazer com que o outro, que as
pessoas enxerguem mesmo o outro né? O conflito
é sempre equacionado dentro desse contexto de
respeito mútuo. (C1)
101
Se a gente começa a brigar internamente, a
comunidade é que vai ser prejudicada, nosso
objetivo de levar conhecimento a eles vai por água
abaixo. (A2)
b) procedimentos críticos e reflexivos, a partir de estudos de
processos sociais, como meio de criar conexão cognitiva e
ética dos estudantes nos seus projetos de trabalhos individuais
e sociais. Por meio dos depoimentos, observa-se que o aluno
participante é capaz de relacionar o conhecimento adquirido
no projeto com seu conhecimento pessoal, ou seja, ele leva o
aprendizado conquistado na troca com as comunidades para a
sua vida, abrindo seus horizontes, tornando-o mais reflexivo
diante de seus propósitos profissionais e pessoais. Isso foi
evidenciado na fala do Coordenador 1 a seguir.
Isso acontece mesmo, porque o aluno ele
desconstrói muitas coisas, vários preconceitos são
colocados por terra, por aquilo que ele viu, por
aquilo que ele sentiu e por aquilo que ele trocou
com a comunidade né? Então, sem dúvida
nenhuma, depois de participar de uma operação
do projeto, o cara vai sair totalmente diferente, e
principalmente, nesse pensamento crítico que ele
vai ter da comunidade, porque as coisas que ele
ouvia falar, ele vai enxergar de fato, vivenciar e
trocar com essas pessoas. (C1)
c) por último, discussões construtivas, acerca das situações
sociais críticas dos contextos nacionais, regionais ou locais,
gerando processos de discernimento fundamentados na
dignidade humana e na justiça social. Nos depoimentos, foi
possível observar a existência de discussões a respeito das
situações sociais críticas vividas pelas comunidades atendidas.
Por exemplo, no projeto com as mulheres presidiárias, foram
possíveis constantes reflexões entre aluna e coordenadora, o
que também era levada pela aluna aos seus colegas de sala e
pessoas do seu convívio. Nessas reflexões, percebe-se um
relevante aprendizado, como relata a Coordenadora 4 a seguir.
Sim, por exemplo, por que elas têm que ficar
naquela cela tão apertada? Porque a bolsista foi lá,
102
ela viu como eram as celas, onde tinham 10, 12
mulheres naquela situação, eu acho que esses
momentos provocam uma indignação e um
inconformismo com a realidade, porque a gente
sabe que o sistema prisional brasileiro ele é
completamente fora de propósito, as pessoas
entram lá e não são reeducadas para se reinserirem
na sociedade, elas entram lá e é uma escola para o
crime, as pessoas ficam revoltadas naquelas celas,
é muito ruim, embora a situação de Caçador seja
muito boa em relação a outros presídios. Mas eu
acho que nesses momentos a gente conseguiu
despertar isso nela, de se indignar com a
realidade, ao longo do projeto. (C4)
Quando perguntados se o aluno participante adquiriu uma nova
atitude frente aos desafios da sociedade e se foi capaz de fortalecer seus
valores éticos com a participação no projeto, as respostas foram
unânimes. Os alunos afirmaram que com toda certeza o projeto foi capaz
de trazer questões antes não analisadas por eles, promovendo um
enriquecimento de seus pensamentos com relação à sociedade e,
também, a si mesmos. A seguir. no quadro 14, é possível visualizar
algumas falas que comprovam essa afirmação.
Quadro 14 - Fortalecimento dos valores éticos
O relato que a gente tem desses alunos é que eles modificam muito a sua maneira de
pensar ou enxergar a sociedade, de se colocar mesmo no lugar do outro e operar
mudanças que ele acredita que sejam importantes. (C1)
Sim, tendo um olhar mais crítico perante as desigualdades do dia a dia, onde pude
observar a naturalização de várias questões tanto racistas como preconceituosas e
rever algumas atitudes, e falas do meu cotidiano. Pude também entender o quanto é
justa e digna de atenção, as questões que o movimento negro ressalta. (A6)
Se não fosse o Rondon eu não estaria indo pro caminho que estou indo, sempre
buscar ser uma pessoa melhor assim, com todo mundo que eu conheço, meio que me
completou assim com coisas boas. (A2)
Sim, acredito que sim, porque ele foi, ele fortaleceu os vínculos com a comunidade
dele né? Então, ele veio para buscar o desenvolvimento da comunidade dele,
preocupado com a comunidade dele. É uma região menos favorecida, seja pela
localização geográfica ou pelas condições financeiras do público, então ele fez esta
ponte, este aporte, com certeza estes valores éticos ficam mais fortes. (C5)
Fonte: Dados primários (2016).
103
Segundo Lúquez, Fernández e Bustos (2014), a formação ética
estudantil começa por uma condução democrática do processo
educativo, reconhecendo-se os deveres e direitos inerentes ao estudo
curricular e ao trabalho produtivo gerado. É necessário saber se há um
fortalecimento de valores éticos e competências sociais, mediados por
atitudes de cidadania, desenvolvendo-se postura crítica no âmbito
comunitário, controle e equilíbrio emocional diante das diferentes
situações e complexidade humana nas comunidades atendidas.
Percebeu-se que nos projetos sociais existem muitas possibilidades de o
aluno desenvolver uma formação ética, contudo, é preciso que ele esteja
disposto. Caso já tenha certo conhecimento teórico sobre ética, o aluno
poderá ampliar e fortalecer seus pensamentos a respeito do tema, na
constatação prática dessas questões, algo que só um projeto de cunho
social pode proporcionar, a vivência com a comunidade.
A partir dessa vivência no projeto, dessa
convivência, de conseguir olhar pro outro, por
exemplo, sem preconceito, eu acho que isso já te
dá um ganho de valor muito grande, no sentido de
que a gente ás vezes vai conviver e trabalhar com
pessoas que são ex presidiárias e a gente não pode
ter preconceito com isso, porque foi um crime, foi
pago, elas pagam por isso e depois tem que
retornar à sociedade e ter uma vida normal. Então
a partir dessa vivência que ela teve é possível que
ela tenha conseguido perceber isso e criar esses
valores também, de ver que nem todo mundo que
está lá dentro é ruim ou tem má índole, umas
pessoas têm e outras não, pois foram influenciadas
pelos maridos, pela família, pelos filhos, e acabam
cumprindo pena junto, então essas pessoas podem
ser recuperadas. Então acho que ela pode perceber
a importância desses valores, de não ter
preconceito, de ser justo, de tratar todo mundo de
uma maneira mais igual. (C4)
Segundo as autoras, nos projetos de extensão que primam pela
formação ética dos estudantes prevalece o interesse e a disposição por transferir conhecimentos e competências em situações planejadas e
atitudes de criatividade naquelas que surgem espontaneamente. Foi
possível perceber a troca de conhecimento existente entre os integrantes
dos projetos - equipe executora e comunidade - de maneira muitas vezes
104
planejada, e outras, de acordo com o público atendido. No projeto
Rondon, por exemplo, havia espaço para troca de conhecimento entre
todos, conforme relatado pelo Coordenador 1 a seguir.
A gente troca muito com a comunidade e a gente
troca em todos os sentidos, tanto com pessoas que
são extremamente capacitadas culturalmente ou
intelectualmente, como a gente aprende muito
mesmo com a cultura popular e com as pessoas
que são ás vezes as mais humildes assim, com
atitudes de vida que elas tem e o tempo todo a
gente se coloca na mesma posição da comunidade.
(C1)
Os estudantes tendem à manifestação de disposição positiva
frente aos papéis de investigador, promotor social, mediador das
transformações sociais promovidas nesses processos interpessoais de
aprendizagem. Assim como, demonstram capacidades comunicativas,
afetivas e cognitivas para corrigir problemas no desenvolvimento dos
projetos sociais, identificando pontos fortes e fracos. Esse aprendizado
para o aluno fica evidenciado na fala do Coordenador 1, a seguir.
Todas as atividades elas partem de iniciativa dos
acadêmicos e eles são totalmente protagonistas,
todas elas, desde o seu planejamento, a criação
mesmo, sentar junto, planejar o que vai ser
ofertado pra comunidade, a execução na
comunidade, a coordenação também vai apenas
para ajudar nesse sentido, e depois na avaliação
também, o acadêmico é protagonista o tempo
todo. (C1)
Diante do analisado, pode-se concluir que em relação à categoria
atuação ética, todos os projetos mostraram que os alunos participantes
apresentaram respeito à diversidade sociocultural que encontraram e
comprometeram-se com os objetivos dos projetos e com as necessidades
das comunidades. Além disso, puderam resgatar valores de justiça e
foram capazes de fortalecer valores e atitudes ético-cívicas e pessoais, tais como: tolerância, solidariedade, justiça, convivência, altruísmo e
participação democrática. Os alunos tiveram a oportunidade de praticar
uma liderança cidadã e espera-se que com essa experiência se tornem
105
mais ativos nas suas instituições de ensino e sociedade. A seguir, passa-
se à análise da categoria Respeito à diversidade.
4.3.2 Respeito à Diversidade
Nesta categoria de análise, utilizaram-se os seguintes fatores de
análise, elucidados a seguir:
a) Respeito às diferenças. De acordo com Matiz (2013), esse
fator de análise se relaciona com o conceito de alteridade, e
este reconhece o outro como diferente, nas suas diferenças
sociais, econômicas e culturais. Concomitantemente a isso,
deve-se respeitar a individualidade do outro.
b) Agir com solidariedade e cooperação. Para Matiz (2013), a
solidariedade compreende o compromisso responsável que um
indivíduo adota frente as ideias e projetos de outros. Segundo
López (2004), as pessoas solidárias, são aquelas que se
reconhecem iguais aos outros. Dessa forma, tentam
transformar as desigualdades existentes nas relações humanas,
principalmente, a favor dos que sofrem diariamente as
consequências disso.
c) Habilidade de conviver com o coletivo. Esse fator de análise
surge como consequência dos fatores de análise anteriormente
citados. De acordo com Cortina (2000), o respeito ativo na
convivência com os outros se concentra em uma interação que
prioriza o entendimento e a compreensão das diferenças.
Para uma melhor compreensão dessa categoria de análise,
precisa-se, primeiramente, entender o significado da palavra
diversidade. Segundo o dicionário Houaiss, pode significar: pluralidade,
reunião do que contém vários e distintos aspectos e pode sinalizar
divergência e não concordância. Diversidade, também, pode ser definida
como característica ou estado do que é diverso; não semelhante. Para
Delors (2001), a convivência baseada na tolerância e no respeito à
diversidade se faz extremamente necessária em uma sociedade em que
se prevalecem os objetivos e as estratégias individualistas.
Para Villar (2009), a partir da vivência dos fenômenos e
processos sociais, o aluno é capaz de fazer uma conexão entre os seus
projetos pessoais e os projetos coletivos. Os valores adquiridos
geralmente são apoiados em projetos de vida, de grande profundidade
espiritual, em que a ética funciona como princípio da dignidade do ser
humano. Com a participação nos projetos sociais estudados, acredita-se
106
que o aluno foi capaz de visualizar em si mesmo, novos valores que
surgiam a partir da observação de pessoas tão diversas, mas que eram
seres humanos e que mereciam o seu respeito. Nesse contexto, acredita-
se que quando o aluno enxerga e analisa sem julgamentos aquela
realidade, ou seja, de forma respeitosa e tolerante, é capaz de adquirir
valores baseados na universalidade dos valores humanos. Um bom
exemplo dessa ideia, pode ser destacado no projeto que atendeu às
mulheres presidiárias. A aluna foi capaz de desconstruir grande parte do
seu preconceito em relação às mulheres, enxergando-as como seres
humanos que são. Esse aprendizado de respeito e tolerância com uma
realidade diferente, pode ser evidenciado em uma das falas da Aluna 5,
colocada a seguir.
A gente como estagiária vendo outra realidade, a
gente dá mais valor para as coisas, até para as
pessoas que estão próximas da gente, vendo a vida
delas, o que elas fazem, por exemplo a presidiária
grávida, que ganhou bebê estando presa, eu acho
que para mim isso foi bem forte! Ter estado lá nas
palestras, todos saíam bem tocados com as
histórias que elas contavam, porque elas não
escondiam da gente, o que elas passaram, e a
maioria, estavam presas por causa dos
companheiros e tráfico. Então eu como pessoa
aprendi bastante. Se eu estivesse desempregada eu
queria ser estagiária de novo (A5).
Quando perguntados sobre o que entendiam por respeito à
diversidade, os alunos apresentaram ideias alinhadas, tais como as
expostas pelos alunos A3, A6 e A7 a seguir.
O que eu entendo por respeito à diversidade. Ah, é
aquilo que eu falei, é tipo, tem que aceitar, tem
que respeitar, se todo mundo é igual em direitos,
porque que a gente vai achar errado, enfim,
alguém que é gay, é trans, ou as pessoas que são
negras, porque a gente está numa região que tem
poucos negros, e que a população brasileira é mais
negra do que branca, então, sei lá, pra mim é tão
óbvio respeitar o próximo que fica difícil explicar.
É só ter bom senso assim, todo mundo é diferente
e igual ao mesmo tempo, né? Então não é nem
uma igualdade, é uma equidade. (A3)
107
No meu entendimento respeito à diversidade, é
entender que cada cultura possui suas
particularidades, e que possuímos características
diferenciadas uns dos outros, e nossas diferenças
não nos tornam superiores ou inferiores a
ninguém. (A6)
Respeito à diversidade para mim é fazer uma
leitura do outro a partir das suas atitudes e
posturas, entendendo que este, teve um processo
histórico diferente do seu e por isso hoje se
relaciona com o mundo de uma maneira distinta.
(A7)
Nesse sentido, os depoimentos sinalizaram que esse tema foi
vivenciado pelos alunos nos projetos selecionados. Para os alunos
participantes que já possuíam valores de respeito às diferenças, eles
puderam perceber mais uma oportunidade de reavivar esses valores que,
muitas vezes, ficam adormecidos na rotina e na pressão do dia a dia.
Para os alunos que não possuíam esses valores tão aguçados, foram
convidados a experimentar novas situações e assim adquirir novos
aprendizados. Os coordenadores destacaram uma compreensão a
respeito do conceito, usando-o de maneira ampla para todos os tipos de
diferenças e, também, relacionando aos diferentes indivíduos e
realidades vivenciadas com o projeto. Essas ideias ficam evidenciadas
nas falas a seguir.
Quadro 15 - Respeito à diversidade – coordenadores
(continua)
Tínhamos mulheres lá que estavam saindo da adolescência, que tinham 18 anos,
até mulheres que estão com 70, 80 anos lá presas. Você consegue trabalhar bem
essa questão da diversidade, até porque dentro desse público aí você vai ter
outras questões relativas, por exemplo, as questões de gênero, tem mulheres
homossexuais, outras heterossexuais, que têm que conviver ali naquele
ambiente. Tinha mulheres na sala de aula que estavam fazendo graduação e
tinham mulheres analfabetas, mulheres que tinham filhos, então trabalhamos
com esse universo grande. (C4)
108
Quadro 15 - Respeito à diversidade – coordenadores
(conclusão)
Assim, o conceito de diversidade a gente não usava (diverso – outro). Então a
gente usava o termo singularidade, onde cada um é um ser singular e deve ser
respeitado naquilo que ele é, entendeu? Então, o conceito é de respeito e, com
certeza absoluta, a aluna bolsista tem muito, muito claro pra ela. Sabe que tem
que respeitar cada um do jeito que é. (C2)
Eu acho que essa questão da diversidade apareceu no projeto, porque você traz a
questão do negro numa sociedade como a nossa, principalmente em Santa
Catarina que tem esse setor social invisibilizado, dentro do próprio Campus, os
alunos negros muitas vezes não se reconhecem enquanto alunos negros, e é todo
um trabalho que tem que ser feito pra reverter esse processo. Eu acho que dessa
maneira, o projeto conseguiu abrir algumas portas para que o aluno negro
pudesse discutir sobre a questão do negro. (C6)
Fonte: Dados primários (2016).
Com relação ao respeito e valorização à diversidade, todos os
alunos entrevistados relataram que nos projetos houve muito respeito às
diferenças as quais conviveram, tais como: diferenças de ideias, gênero,
raça, cultura, religião, dentre outras. Os ensinamentos colocados pelos
alunos foram no sentido de que compreenderam os acontecimentos e
fatos que antes não eram percebidos. Ou seja, suas visões sobre
determinados grupos sociais mudaram bastante, por meio da
aproximação com essas diferenças. Esses aprendizados só foram
possíveis de serem adquiridos por meio do respeito à diversidade. Essas
constatações são percebidas nos depoimentos a seguir.
Quadro 16 - Respeito à diversidade - alunos
Tem muitas oficinas que trabalham as diferenças porque a gente faz bastante
atividade em escola e da terceira série até o terceirão existem muitos problemas que
envolvem a pessoa como bullyng, essas coisas (...) e também tem essa questão da
gente viver na capital e ir pro oeste de SC, por exemplo, tem muitas diferenças. E
entender que eu convivo aqui, eu tenho um modo de viver e de pensar diferente de
alguém que mora num lugar que é completamente diferente. Que não é melhor nem
pior, que é só diferente mesmo. (A1)
Porque claro que a gente comete alguns preconceitos assim, no dia a dia, porque é
enrustido na gente, por exemplo, piadas machistas, racistas, de loira. Tipo essas
coisas assim eu parei, eu odeio xingar, mas às vezes eu xingo, porque é meio
automático, mas acho que bastante coisa eu consegui mudar e transmitir para os
meus colegas também. (A3)
Fonte: Dados primários (2016).
109
Para Ruza e Suárez (2013), é relevante promover no estudante o
sentido solidário perante a sua comunidade, pois ele se torna um cidadão
responsável na medida em que acontece a troca de aprendizagens e a
tentativa para transformar os problemas existentes. Para as autoras, as
experiências que compõem um projeto social proporcionam,
principalmente, um compromisso ético do estudante que, muitas vezes,
tem dificuldade em aliar os conhecimentos adquiridos em sala de aula
com a sociedade ao seu redor.
Quando perguntados se o projeto incentivava que os alunos se
colocassem no lugar dos outros e agissem com solidariedade, tolerância
e cooperação, as respostas também foram todas positivas. Na maioria
dos projetos, é possível perceber que a solidariedade é a base do
processo todo, norteando as ações, superando obstáculos e buscando
alcançar os objetivos traçados, tomando o cuidado de ouvir também os
anseios da comunidade atendida. Foi possível perceber o esforço dos
alunos entrevistados em se colocar no lugar do outro, identificando no
outro as dificuldades e tentando ajudá-lo a superá-las. Nesse processo, o
aluno se compadece com os problemas de outras pessoas, algo que no
seu dia a dia pode ser vivenciado por ele de maneira superficial.
Todavia, no projeto, ele tem a responsabilidade de se envolver e de
tentar visualizar respostas para esses problemas. Tais situações podem
ser simples ou complexas, mas demandam níveis de consciência social
do aluno. Essas ideias ficaram evidenciadas nas falas dos alunos e
coordenadores no Quadro 17, a seguir.
Quadro 17 - Agir com solidariedade e cooperação
(continua)
Uma vez eu estava falando com um rapaz, que ele era do interior, e ele ficava
muito aborrecido com o pessoal que zombava do sotaque dele né? Ele não tinha
noção que o jeito que ele falava era sotaque carregado, ele não se dava conta, as
pessoas riam. E daí isso me tocou assim, porque era um rapaz se formando em
engenharia e ele tinha esse problema. Daí eu pensei e falei pra ele: - por que tu
não aprende a falar inglês? De repente se tu aprender a falar inglês tu vai perder
um pouco do sotaque carregado que tu tens, não sei. Se é uma coisa que te
incomoda, vai morar fora do país um tempo, vê se isso melhora. Acho que eu
me coloquei no lugar dele, eu estava tentando achar uma solução mesmo que,
nem sei se eu tava falando uma coisa certa, mas pelo menos eu estava ali com
ele tentando mudar alguma coisa que faria totalmente a diferença na vida
dele (A2).
110
Quadro 17 - Agir com solidariedade e cooperação
(conclusão)
(...) porque no fim é todo mundo junto né? não dá pra eu conviver sendo
arrogante, tem toda uma comunidade ao meu redor, então, eu não te respeito, tu
não me respeita, e a gente vai viver sempre em guerra. (A3)
Sim, eu já sou bem coração, eu sou uma pessoa assim que o que eu puder ajudar
eu ajudo, eu queria mostrar o meu melhor e passar pra elas, fazia 15 anos que eu
tinha parado de estudar, eu passava pra elas não desistirem. (A5)
Sim. Sem dúvidas, era esse o objetivo mesmo. Alteridade né? Tu te vê no outro.
(C2)
Sim, a aluna sempre foi muito sensível porque o bolsista num projeto desse que
vai lidar com esse público... Você precisa procurar um bolsista que tenha essa
sensibilidade, em se relacionar com esse público, e eu acho que a aluna
conseguiu isso. (C4)
Fonte: Dados primários (2016).
Segundo Matiz (2013, p. 215, tradução livre), “a capacidade que
tem os seres humanos de se interessar e se responsabilizar frente aos
demais leva os cidadãos a escutar vozes distintas das suas, a incluir em
seus juízos outros pontos de vista e atuar a favor deles”. Nesse contexto,
a partir das falas dos entrevistados, é possível perceber que os alunos
experimentaram a possibilidade de conviver tanto com a equipe do
projeto quanto com a comunidade. Foram capazes de ouvir e se
comprometer com as pessoas atendidas a fim de apoiá-las no que fosse
necessário e possível. Muitos dos entrevistados apontaram que houve
melhora na habilidade de conviver coletivamente, devido,
principalmente, ao convívio com pessoas em diferentes situações nas
comunidades atendidas na medida em que se colocavam no lugar dessas
pessoas. Alguns alunos sinalizaram que já possuíam boa habilidade de
convivência social e isso foi reforçado ainda mais. Assim como é
possível perceber a importância desse aprendizado para os alunos,
evidenciado no depoimento do aluno A2 e do coordenador C4,
colocados a seguir.
111
Quadro 18 - Habilidade de conviver coletivamente
Com certeza, sou uma pessoa muito mais fácil de trabalhar hoje em dia do que
eu era antes né? Percebi que é muito bom trabalhar com as pessoas porque às
vezes o planejamento que estava estruturado na minha cabeça, quebra
completamente e vai pra um outro caminho. De repente mais simples e mais
eficiente do que eu pensava. (A2)
Acho que eu já convivia tranquilamente no coletivo, só permaneceu assim, daí
com mais conhecimentos na área né? Só fortaleceu. (A3)
Eu acho que sim, uma experiência como essa sempre melhora, até as minhas
habilidades, porque eu nunca tinha passado por uma experiência dessas. Ela
também nunca tinha entrado num presídio, então o fato de entrar lá, se deparar
com outra realidade e de conviver com essas mulheres. Eu acho que provoca
mudanças na gente que não tem como não provocar, é uma situação muito
diferente, então alguma coisa sempre muda na gente, seja no fato da gente
encarar a vida, seja no fato da gente se relacionar com as outras pessoas. (C4)
Fonte: Dados primários (2016).
Por meio dos depoimentos, foi possível perceber que as relações
estabelecidas entre as pessoas envolvidas nos projetos, sejam elas
coordenadores, alunos ou comunidade atendida, foram baseadas no
respeito mútuo. Parte-se do pressuposto que projetos dessa natureza
atraem pessoas mais dispostas a respeitar o outro, todavia, na prática,
nem sempre essa lógica funciona. Contudo, nos projetos estudados, é
nítida a percepção de que os envolvidos possuíam esse cuidado, de se
relacionar sem coagir, sem diminuir. Tanto os coordenadores quanto os
alunos estavam dispostos a conhecer a realidade das comunidades
atendidas a fim de ajudá-las a superarem seus desafios, baseando-se,
principalmente, na perspectiva da dignidade de todos. A seguir, a análise
da categoria Interação Dialógica.
4.3.3 Interação Dialógica
Nesta categoria, utilizaram-se os seguintes fatores de análise:
participação de todos e habilidade em lidar com conflitos, que serão
discutidos e analisados posteriormente, juntamente, com as falas dos
entrevistados. O primeiro diz respeito à preocupação em se dar voz a
todos os participantes do processo. Para que isso se concretize, Matiz
(2013, p. 220) coloca que “é preciso criar um clima para a livre
expressão do educando, sem coações nem medo de equivocar-se”. Com
112
relação ao segundo fator de análise, compreende-se na habilidade de
solucionar os choques de opiniões dos envolvidos em determinada
interação, que segundo Matiz (2013), precisa ser resolvido com diálogo
e respeito mútuo.
Freire (1967, p. 107) revela o que se entende por diálogo:
E o que é o diálogo? É uma relação horizontal de
A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera
criticidade. Nutre-se do amor, da humildade, da
esperança, da fé, da confiança. Por isso, só o
diálogo comunica. E quando os dois pólos do
diálogo se ligam assim, com amor, com
esperança, com fé um no outro, se fazem críticos
na busca de algo. Instala-se, então, uma relação de
simpatia entre ambos. Só aí há comunicação.
Nesse contexto, vale destacar que a interação sem diálogo perde
seu sentido de aprendizado, pois quando duas partes não interagem
democraticamente, a interação não será aproveitada no máximo do seu
potencial. Do ponto de vista das relações pessoais, sabe-se que existem
inúmeras dificuldades a serem transpostas nesse sentido, como por
exemplo o excesso de preocupações com o individual e a falta de
solidariedade com as opiniões alheias. Em se tratando dos projetos
sociais, essas dificuldades acabam se reduzindo muito na medida em
que os alunos se veem comprometidos e dispostos a desenvolver suas
atividades com a comunidade para atender aos objetivos do projeto.
Os entrevistados foram perguntados sobre o que entendiam por
interação dialógica. Foi possível perceber uma dificuldade dos alunos
entrevistados a respeito do tema, alguns até mesmo relataram
desconhecimento do conceito. Todavia, quando explicado que se
tratavam, principalmente, de relações baseadas no diálogo, todos os
alunos puderam contribuir, relacionando o conceito com situações
práticas dos projetos. Os coordenadores puderam apresentar suas ideias
a respeito do tema, concomitantemente, também expuseram a relevância
de uma interação dialógica nos seus projetos. Nas falas dos
coordenadores C2, C4 e C6 ficam evidenciadas suas opiniões sobre o
tema, a seguir.
Eu entendo pelo respeito mútuo, pelo ouvir o
outro e que o outro me ouça. (C2)
113
Interação dialógica sempre tem a ver com dois,
por exemplo, eu como professora, eu ensino, mas
também aprendo né? É essa relação de estar
sempre transmitindo conhecimento e estar sempre
aprendendo com os alunos. (C4)
O que eu entendo por interação dialógica seria o
estabelecimento de uma relação onde haja um
canal de diálogo de construção permanente e até
certo ponto horizontal, onde você consiga
estabelecer uma construção. No caso do projeto,
de conhecimento e ações que não sejam
impositivas, por interação eu compreendo assim,
um relacionamento a partir dos conhecimentos
tanto práticos e teóricos de ambos os participantes
envolvidos no processo. (C6)
Quando os entrevistados foram questionados se as interações
entre as pessoas envolvidas no projeto eram baseadas no diálogo, todos
afirmaram positivamente. Os entrevistados demostraram satisfação com
relação às situações de troca com outras pessoas, assim como
perceberam a riqueza desses momentos para o aprendizado dos alunos
participantes. Por exemplo, no Projeto Fazendo Arte, a coordenadora
ressalta a importância de se estabelecer um diálogo apropriado à
realidade das pessoas atendidas para que os objetivos do projeto fossem
alcançados. Por meio dos depoimentos, foi possível perceber que tanto
os alunos quanto as pessoas da comunidade puderam exercer seu poder
de fala, sem nenhum tipo de coação, mas sim promovendo o diálogo
entre todos. Seguem algumas falas que evidenciam essa troca no quadro
19, a seguir.
Quadro 19 - Interação dialógica
(continua)
Conversamos muito sobre isso, por ser um grupo diferenciado, algumas
analfabetas, você tem que ter muita paciência no sentido de saber respeitar o
processo delas, até no próprio jeito de falar, eu dizia pra bolsista né? Nosso
modo de falar tem que levar em conta a situação delas, porque não adianta eu
chegar lá e falar um termo bem bonito e elas não entenderem nada. Então essa
coisa de você ter paciência, respeitar e ir interagindo, algumas até falavam
palavrões e a gente tinha que ir orientando. (C3)
114
Quadro 19 - Interação dialógica
(conclusão)
Eu tinha 17 anos quando perdi meu pai, não por isso errei na vida, coloquei para
elas a minha história também, eu tive que amadurecer muito cedo, achei
importante o projeto porque pude mostrar também a minha história e conhecer a
delas, assim a gente tem outra visão, a realidade delas é chocante. Muitas vezes
chorei, mas elas estão lá pra pagar o que fizeram, mas muitos não sabem por
que elas estão lá e a história delas. Eu vi pessoas que estudaram comigo lá
dentro, é bem chocante. Isso também me fez refletir bastante e vejo a vida
diferente. (A5)
Nas escolas é muito legal, porque não são os professores que estão indo trocar
conhecimento, são alunos da universidade. Nessa troca as pessoas se sentem
muito à vontade e isso é extremamente rico. E é geral, nos depoimentos dos
alunos se fala muito que se aprende muito mais do que se ensina. Às vezes se
sente até envergonhado com aquilo que foi levar, e o aluno chega com um
pensamento de que vai ensinar muitas pessoas, mas acaba aprendendo muito
mais do que ensinando. (C1)
Fonte: Dados primários (2016).
Quando perguntados se o projeto previa a participação de todos,
tanto coordenadores como alunos responderam positivamente. Na
maioria dos casos isso era uma preocupação constante, promover amplo
debate com todos os participantes, os integrantes da equipe executora e a
comunidade atendida pelo projeto. Essa liberdade de participação tinha
o intuito de criar um ambiente leve, dinâmico e criativo. Abaixo
algumas falas que demonstram essa questão.
A gente é estudante, a gente vive em culturas
diferentes, e que tanto eu posso aprender com eles
quanto eles podem aprender comigo, é uma troca.
(A1)
A gente sempre fala isso, que a gente vai pra uma
oficina pra dialogar, quebra essa questão de uma
palestra que ficam os rondonistas lá na frente
falando e todo mundo na plateia. A gente sempre
quebra isso, a gente faz uma roda, um círculo de
conversa, então nossas oficinas nunca vão ser uma
palestra, vão ser sempre uma roda de conversa, e
isso tem a ver com o diálogo. (A2)
Sim, algumas tarefas foram desenvolvidas em
cima de algumas curiosidades. Quando você
115
busca na internet, por exemplo, o que era
interessante pra cada um, o que cada um gostaria.
Então incentivava a continuidade no projeto, o
aprendizado e a motivação. Buscando tudo isso
em conjunto, na verdade. Dessa maneira a gente
também presta atenção no aluno, em quem
participou do projeto. (C5)
O conceito também apareceu nas relações entre coordenador e
aluno, conforme depoimento de grande parte dos alunos. “El educador
se convierte sólo en el mediador entre los conocimientos y los demás
sujetos participan en lo que aprenden”. (MATIZ, 2013, p. 220). Diante
disso, é possível verificar a importância do relacionamento positivo
entre coordenador e aluno em que é construída uma aliança com
objetivos claros. Nessa relação existe, principalmente, a
responsabilidade do coordenador em relação ao aluno, no incentivo e
promoção de sua autonomia nas atividades, na medida em que o
direciona aos objetivos do projeto, tornando-o protagonista e articulador
nos momentos de troca com a comunidade.
Pode-se perceber, pelas falas a seguir, que a relação coordenador-
aluno foi estabelecida de forma respeitosa e construtiva para que os
anseios dos alunos também fizessem parte das perspectivas do projeto,
contribuindo para um aprendizado muito mais rico para o aluno
participante.
Isso sempre a professora passou, que ela não
estava ali dando aula, que a gente estava
construindo uma coisa juntos assim. Mas claro
que ela com mais conhecimento ia transmitir
muito mais, mas era uma via de mão dupla. Então
no caso eu vi indiretamente também, não “vamos
ler o conceito tal e discutir sobre ele”, não foi uma
coisa assim monótona. (A3)
Na minha relação com a bolsista eu sempre me
concentrei em ensinar e aprender também muito,
deixando ela muito livre nos trabalhos que ela ia
fazer, cobrava prazos, mas ela tinha autonomia
pra executar as atividades dela também. Eu
também acabei aprendendo muito com essa
relação com ela, a nossa convivência, o diálogo, o
dia a dia, de conversar, eu acho que isso foi
116
construindo um aprendizado, algo novo, a nossa
relação foi baseada muito nisso, nessa troca. (C4)
A respeito da habilidade dos alunos na resolução de conflitos, a
maioria dos respondentes sinalizou que não houve conflitos durante a
realização do projeto. Percebe-se que o senso de responsabilidade dos
alunos participantes reflete em um ambiente mais livre de conflitos e de
boa convivência com os demais. Nos projetos em que surgiram
conflitos, coube aos participantes resolvê-los de maneira respeitosa e
com muito diálogo. Segundo Matiz (2013), o cidadão deve valorar o
diálogo como forma propícia para interagir com os demais na resolução
de conflitos. Seguem algumas falas que tratam dessa discussão.
Quadro 20 - Habilidade na resolução de conflitos
Se a gente está em conflito entre a gente, não vai ser passada uma imagem boa.
A gente não vai conseguir passar o que a gente quer pra comunidade, a gente
precisa estar bem, bem estruturado pra gente fazer o melhor possível. (A1)
Teve uma senhora que se apegou muito comigo, ela teve um AVC e fui visitá-la
na casa dela, dei força e disse que ela voltaria, quando ela voltou foi uma festa,
mas depois nos trabalhos ela queria atenção só pra ela, e a gente vai ajeitando e
contornando. Mas nada de muito complicado. No geral o grupo de mulheres se
dava super bem. (A4)
Como as presas ficam em celas diferentes, tinha alguns conflitos entre elas
sabe? E muitas não se conheciam, e os conflitos eram resolvidos pela
coordenadora do projeto, se conscientizaram de que uma tinha que ajudar a
outra, a dividir e se ajudar. (A5)
Os conflitos eram resolvidos com muito diálogo. Acredito que a aluna tenha
aprendido que não existe uma verdade única! Não existe a verdade né? Que
existem vários lados de cada situação em que a gente tem que saber analisar e se
a gente quer fazer alguma coisa de realmente importante com relação a esta
questão dos direitos humanos, a gente tem que ouvir até o lado oposto, pra até
saber como dialogar com ele. (C2)
Fonte: Dados primários (2016).
Perceberam-se nos dados coletados que a participação de todos os
envolvidos no projeto era enfatizada constantemente, principalmente,
pelos coordenadores que, muitas vezes, ficavam mediando e
impulsionando essas interações. Nessas interações, o aluno participante
era incentivado a agir com respeito na resolução de conflitos para que a
117
comunidade não fosse prejudicada. E, também, o aluno fosse capaz de
compreender a relevância de se estabelecer o diálogo com as pessoas,
trocando ideias e informações tanto quanto possível, resultando em mais
conhecimento para o aluno e para a comunidade.
A seguir será feita a análise da categoria Criatividade e Inovação.
4.3.4 Criatividade e Inovação
Nesta categoria, a respeito do conceito de Criatividade e
Inovação, com base em Matiz (2013), utilizaram-se fatores de análise
que serão discutidos e analisados posteriormente e que, primeiramente,
serão elucidados:
a) Estímulo a novas ideias e soluções. Esse fator diz respeito a
estimular que o aluno desenvolva suas capacidades críticas de
forma que atue como agente transformador e responda às
necessidades concretas da sociedade.
b) Pensamento crítico. Para o autor, ele surge na compreensão
dos outros na realidade social em que vivem, entendendo que
os atores envolvidos têm seus próprios interesses e
necessidades. Para se tornar um cidadão crítico e reflexivo
deve-se “cuestionar lo aparentemente evidente y lo construido
socialmente como “normal” pero que atenta contra la
integridade y la dignidade humana” (MATIZ, 2013, p. 221).
Por exemplo, no projeto “O ensino da história e da cultura
afro-brasileira”, que aborda as questões do negro, elas ficam
fáceis de serem identificadas, já que ainda convivemos com o
preconceito contra o negro em nossa sociedade. O aluno
precisa ter consciência crítica nesse sentido, de saber
identificar situações que não respeitam determinado indivíduo
ou grupos e se posicionar para transformar essa realidade.
c) Autonomia. Segundo Oliveira et al. (2013), quanto maior é a
autonomia do indivíduo, mais responsável ele se sentirá por
algo e, também, haverá maior conscientização por parte deste.
Nesse contexto, pode-se perceber que o processo de criatividade e
inovação demanda dos atores envolvidos um pensamento crítico e certa
autonomia no desenvolvimento de suas atividades. Esse entendimento
pode ser evidenciado nos depoimentos, pois quando questionados sobre
o que entendiam por criatividade e inovação, os entrevistados puderam
contribuir com suas explanações. Eis algumas citações transcritas a
seguir.
118
Criatividade e inovação, o que eu entendo é você
enxergar de outra forma aquilo que está posto pra
você durante o dia a dia. (C1)
Pra mim, criatividade e inovação é fazer algo
novo, algo diferente, agregar valor a alguma coisa
existente, por exemplo nos produtos. (C4)
Criatividade eu acho que tem a ver com a questão
da autonomia da construção do pensamento, do
conhecimento. Enfim, tem a ver com autonomia,
liberdade, coisa que a escola não possibilita tanto.
Em geral, mais ceifa a criatividade do que
fomenta. (C6)
Foi possível constatar que nos projetos sociais, o pensamento
crítico aliado à autonomia do aluno participante deu espaço à sua
criatividade. Isso foi incentivado aos alunos, diferentemente, do que é
proposto em sala de aula. O próprio ambiente na comunidade
proporciona a criatividade e a inovação quando o aluno vai percebendo
as coisas ao seu redor e busca novas formas de agir com os recursos
disponíveis.
Quando perguntados se a criatividade e a inovação apareceram
nos projetos de cunho social, a maioria conseguiu visualizar os
conceitos nas atividades dos projetos. A criatividade surgiu de diferentes
formas, de acordo com a demanda das atividades e das circunstâncias e
materiais existentes na comunidade atendida, como foi colocado nos
depoimentos a seguir.
Acredito que o desembaraço para lidar com os
discursos, pois quando você está tratando com
direitos humanos, geralmente, as pessoas que vão
para esses cursos, elas já têm um viés né? Então
por exemplo no caso do delegado de polícia, que
era participante do curso, da senhora que tinha um
padrão de escolaridade mais elementar, que dizia
que não poderia ficar feliz se seu filho fosse
homossexual. Enfim, era mais senso comum
assim, eu acho que a criatividade foi em tentar
buscar, por exemplo, exemplos que pudessem
alcançá-los, entendeu? E de saber lidar com
pontos de vistas, por exemplo o ponto de vista da
repressão que é o da polícia. (C2)
119
Trabalhamos a questão da Economia Solidária
(ECOSOL) que são alternativas ao capitalismo.
Então, nós estimulamos outro jeito de você viver e
de você conseguir sobreviver através da Economia
Solidária. Você tem outros valores, da troca, da
experiência, não é do lucro, mas apenas da sua
subsistência. (C3)
Quando perguntados se o projeto promoveu a criatividade e
inovação nas atividades, a grande maioria respondeu positivamente,
dizendo que os alunos possuíam liberdade para pensar em ideias que
fugiam ao convencional. Segundo Matiz (2013), é necessário que haja
processos participativos conscientes e coletivos que partam da
compreensão da realidade, com atuação crítica na sociedade para
superar injustiças sociais. Essas questões foram percebidas nos projetos
de forma que um grupo formado por professores ou técnicos
administrativos e alunos se propôs a sair dos muros da instituição de
ensino e buscou conhecer um determinado grupo de uma comunidade. A
partir disso, aconteceu a troca de conhecimentos entre os dois grupos,
refletindo e agindo de forma criativa e inovadora com as condições e
dificuldades apresentadas. Por exemplo, no Projeto Fazendo Arte, a
equipe do projeto se reunia sempre na casa de uma das mulheres
participantes, ou seja, as aulas eram trabalhadas com os recursos
disponíveis na comunidade. A seguir, algumas falas no Quadro 21 que
sinalizam a existência de ideias não convencionais nos projetos de
extensão.
Quadro 21 - Estímulo a ideias e soluções
(continua)
Acontece de muitas formas isso, até de, por exemplo, utilizar materiais
reciclados pra criar outra coisa, que a comunidade está precisando. Eu ouvi um
relato de outro colega que eles pegaram um daqueles rolos de enrolar fiação
bem grande, como não estava sendo usado, pegaram e fizeram uma toquinha
numa praça. (A1)
Tem também a estrutura da palestra e roda de conversa. A gente sempre quebra
isso, isso é bem inovador. (A2)
Foi estimulada a participação na feira de economia solidária para que elas
montassem uma equipe e se organizasse para participar da feira. (A4)
120
Quadro 21 - Estímulo a ideias e soluções
(conclusão)
Isso se dá sim porque os espaços que você vai atuar são os mais diversos. E aí a
criatividade ela se dá, a gente coloca assim, que não são as dificuldades que
você vai ter durante a oficina, são os desafios. E esses desafios eles têm que ser
superados naquele momento, naquele espaço, pelas pessoas que estão
responsáveis pela atividade. Isso se dá muito na prática, e a inovação também
ela se dá, porque, às vezes, você vai fazer uma oficina, e uma coisa é você fazer
uma atividade dentro da academia, da instituição, outra coisa é você fazer na
comunidade. Você vai ter que fazer o que você faria lá na instituição, só que de
outra forma, com os recursos que você tem, então a inovação também se dá
nesse sentido. (C1)
Fonte: Dados primários (2016).
Siveres (2005) afirma que é importante que as instituições de
ensino superior possam promover uma percepção crítica da realidade,
exigindo um espaço de liberdade, assim como promove a autonomia
para melhor atender aos desejos da sociedade. Nesse contexto, os
projetos de extensão de cunho social podem ser encarados como
oportunidades aos alunos para que sejam críticos e reflexivos, que sejam
livres para expressar suas ideias e autônomos no seu modo de pensar e
agir em suas atividades na comunidade. Com relação ao pensamento
crítico, houve uma unanimidade positiva dos entrevistados, sinalizando
que as participações nos projetos proporcionaram uma visão mais ampla
aos alunos envolvidos. Por meio do pensamento crítico, conseguiram
identificar desigualdades, e quando trazidas essas realidades tão diversas
para a sua vida, seus problemas se tornaram insignificantes porque nas
comunidades existem situações bem mais urgentes a serem trabalhadas.
A esse respeito, os sujeitos revelam a seguir.
121
Quadro 22 - Pensamento crítico
Sim, trabalhando com as mulheres no projeto e tendo os incentivos ali do IFSC,
só tenho vontade de querer mais, tenho fome de conhecimento e de fazer as
coisas (risos). A oportunidade que as pessoas estão tendo, a gente tem que
ajudar, incentivar essas pessoas a terem uma vida mais digna na sociedade, isso
tudo faz crescer. (A4)
Sim, eu aprendi muita coisa e hoje eu sou uma pessoa melhor, entrei no projeto
quando eu reclamava um pouco da minha vida, não sabia que eu tinha tudo e
que havia pessoas bem piores do que eu. Hoje eu valorizo muito mais as
pessoas que estão ao meu redor, aprendi isso com as histórias que ouvi das
meninas lá. (A5)
Sim, quando a gente fala da questão do trabalho, da exploração que existe, das
empresas, dos salários baixos, da diferença, por exemplo, de salário entre
homem e mulher, por que existe a violência de gênero, isso tudo a gente foi
conversando. Porque começamos com um projeto chamado tricotando, porque
enquanto você tricota, você tricota também a vida, as mulheres vão contando
suas dificuldades, começou aí esse projeto. (C3)
Fonte: Dados primários (2016).
Um dos significados da palavra autonomia, segundo o dicionário
Houaiss, aponta o direito ao livre-arbítrio, fazendo com que qualquer
indivíduo esteja apto para tomar suas próprias decisões. Nessa
perspectiva, percebe-se que a autonomia permite um empoderamento
dos indivíduos e, consequentemente, um maior comprometimento dos
mesmos, pressupondo-se que todos os indivíduos são capazes de pensar
e agir. Nesse sentido, a autonomia respeita a liberdade de cada indivíduo
e não compartilha da ideia de que uns são mais aptos que outros na
tomada de decisão.
A autonomia apareceu nos projetos aqui estudados. Foi possível
perceber nos relatos transcritos que os alunos participantes gozavam de
autonomia para a realização de suas atividades, podendo decidir sobre
elas em diversas variáveis. Existia significativa liberdade no modo como
as preparavam e as executavam. Por exemplo, no caso do Projeto
Rondon, os alunos realizavam oficinas de maneira autônoma, em
conjunto com outros alunos, sempre comprometidos em atender à
comunidade em que se davam as atividades. Segundo Matiz (2013), é
mais interessante para o educando quando ele pode participar do
processo de aprendizagem desde seu planejamento, a seleção das
122
atividades e fontes de informação. Os relatos dos entrevistados que
sinalizaram essa questão estão no Quadro 23, a seguir.
Quadro 23 - Autonomia
Tem as oficinas que sempre acontecem, mas a forma com que o grupo vai
abordar essa oficina é do grupo, pode inovar na oficina, não precisa seguir um
roteiro, faz do seu jeito, tem uma experiência e acha que vai dar certo, você tem
autonomia total de fazer isso, com inovação e criatividade, está tudo ligado.
(A2)
Todas as atividades elas partem de iniciativa dos acadêmicos e eles são
totalmente protagonistas, todas elas, desde o seu planejamento, a criação
mesmo, sentar junto, planejar o que vai ser ofertado pra comunidade, a
execução na comunidade, a coordenação também vai apenas pra ajudar nesse
sentido e depois na avaliação também, o acadêmico é protagonista o tempo
todo. (C1)
Sim, tanto é que ela organizava e tinha muita iniciativa, ela criava coisas, muito
determinada. Então ela assumiu o projeto pra si, eu não precisava me preocupar
com os dias do projeto. (C3)
Sim, o tempo todo, tinha algumas tarefas que eu pedia pra ela, mas o controle
dentro das ações, de como ela ia fazendo a atividade era de responsabilidade
dela, Ela sabia as metas, os objetivos, mas ela sabia também o que ela tinha que
fazer e cumprir ao longo do projeto.
(C4)
Sim, eu tinha autonomia sim, colocava minhas ideias, nossas ideias eram
parecidas, movidas pelo coração. (A5)
Fonte: Dados primários (2016).
Nas falas dos entrevistados fica claro que a criatividade e a
inovação puderam ser experimentadas pelos alunos nos projetos, na
busca por novas e criativas alternativas de se solucionar problemas ou
melhorar situações vividas pela comunidade atendida. Os alunos
participantes puderam vivenciar situações bem diversas das suas. Dessa
forma, os projetos foram capazes de estimular seus pensamentos
críticos, assim como demandaram do aluno autonomia e criatividade nas suas atividades, nos seus modos de pensar e agir. A seguir, se dará a
análise da categoria relacionada à Cidadania.
123
4.3.5 Cidadania
Nesta categoria, a respeito do conceito de cidadania, com base em
Matiz (2013), utilizaram-se fatores de análise que serão discutidos e
analisados posteriormente e que, primeiramente, serão elucidados a
seguir.
a) Entendimento da realidade em que vive. Segundo o autor,
nesse processo o indivíduo conhece e analisa a realidade
existente, compreendendo as relações, as influências e as
interações. Além disso, poderá refletir sobre os processos
sociais, econômicos, políticos ou culturais que geram
situações de pobreza, exclusão social e desigualdade.
b) Ação e tomada de decisão. Quando os indivíduos possuem a
liberdade de usar seus conhecimentos prévios para entender a
realidade e tomar decisões na tentativa de promover o bem-
estar dos envolvidos.
c) Indignação. Após o reconhecimento da realidade, é importante
que o indivíduo reconheça as sensações e emoções que estas
geram. Assim, aprenderá a usar suas emoções de forma
eficiente, como por exemplo, a indignação, como ferramenta
política poderosa na forma de ação social de maneira pacífica.
A indignação se fez presente nos projetos, despertando ações
voltadas para superar desigualdades e vencer desafios na medida em que
os participantes conheciam a realidade da comunidade atendida. A
superação das desigualdades, por exemplo, dava-se na tentativa de
promover a cidadania daquelas pessoas que desconheciam muitos de
seus direitos. A questão da informação é essencial para vencer os
desafios vividos, pois muitas pessoas não sabem a quem recorrer e se
sentem incapazes de reivindicar direitos. A maioria dos projetos trabalha
no sentido de empoderar as pessoas atendidas para que elas possam ser
ativas frente a sociedade.
Pinsky (2008, p. 19), conceitua cidadania como “qualquer atitude
cotidiana que implique a manifestação de uma consciência de
pertinência e de responsabilidade coletiva”. Para Lister (1997),
cidadania envolve o processo de apropriação dos indivíduos do seu
contexto local e global, no uso de seus direitos e deveres. Os
entrevistados puderam expor seus entendimentos a respeito do conceito
de cidadania, alguns colocados a seguir.
124
Quadro 24 - Cidadania para os entrevistados
Eu entendo como cidadania a consciência que nós temos deveres e de que nós
temos direitos da sociedade e que é um dever nosso reivindicar esses direitos
né? Ter plena consciência deles, ser tratado com igualdade de condições,
independente de raça, credo, gênero, sexualidade, orientação sexual. (C2)
Cidadania é a forma de a gente cumprir os nossos direitos e nossos deveres
enquanto cidadãos. (C4)
Cidadania seria exercer meu papel na sociedade. Com ética, se colocando no
lugar do outro, respeitando a liberdade, respeitando a opinião de cada um,
respeitando também a cultura da localidade, a cultura da comunidade. (C5)
Cidadania, em tese, num debate bem superficial, seria a possibilidade de
exercício de direitos né? Agora pensar o conceito de cidadão e pensar quem na
sociedade efetivamente usufrui os direitos ou tem a garantia desses direitos
coloca em cheque o próprio conceito de cidadania. É um conceito muito mais
voltado para um tipo de cidadão, para um perfil social né? Então a cidadania é
exercício de direitos, mas para alguns grupos. (C6)
O que eu entendo por cidadania? Acho que é tipo, um grupo de pessoas, onde
cada individual é diferente, mas dentro da cidadania, todos ali são iguais e
precisam ter os seus direitos contemplados, o cadeirante tem que ter o direito de
caminhar, assim como o cego e assim como a pessoa “normal”, que na verdade
normal ninguém é né? O que é a normalidade? (A3)
Estímulo a elas de conseguirem as coisas. Cidadania pra mim é isso, a pessoa
precisa se valorizar, erguer a cabeça, e perceber que ela não precisa de uma
segunda pessoa, ela pode por ela mesma fazer as coisas que ela quer fazer. (A4)
Fonte: Dados primários (2016).
Um exemplo desse conceito é o colocado no Projeto 1 - Mulheres
SIM, o qual oferece um curso para mulheres com vulnerabilidade social.
Quando a mulher se politiza, ela politiza a família, pois é a figura central
da casa. A partir do momento que começa a se empoderar, passa a ver
oportunidades que antes não ficavam visíveis, sua autoestima se eleva e
ela age de forma mais autônoma. O projeto promoveu pequenas
revoluções sociais, primeiro na família, depois ao redor dela, nas interações das pessoas daquela família com outras pessoas, pequenas
transformações que são difíceis de mensurar, mas elas existem e foram
relatadas nos depoimentos das mulheres atendidas no projeto. A aluna
participante do projeto foi capaz de perceber essas modificações na
125
comunidade atendida, reforçando seu compromisso e sua
responsabilidade perante a sociedade. A seguir, a fala do coordenador 4
que sinaliza essa questão.
Acho que por meio das ações, da vivência, de
estar perto dessa realidade, de ver que a gente tem
deveres de melhorar a vida do próximo, de
trabalhar com esse público que é excluído, que é
marginalizado da sociedade, de levar uma nova
esperança para esse público, a gente consegue
trabalhar bem esse conceito com os alunos que
participam. Deu para perceber que temos direitos,
mas também temos deveres, de contribuir para a
sociedade, especialmente com esse público, com
vulnerabilidade social, que tem dificuldade em
acessar programas sociais, tem dificuldade em
mudar sua realidade, acho que isso também é
nosso papel enquanto cidadão. (C4)
Para Matiz (2013), dentre os valores dos cidadãos associados ao
exercício pleno da cidadania estão: a solidariedade, a equidade, a
corresponsabilidade, a justiça, a alteridade, a não violência, o respeito
mútuo e o diálogo. Nesse contexto, a autora coloca que o conhecimento
da realidade é um processo contínuo que acompanha o exercício da
cidadania plena. O modelo de formação cidadã une a prática com
posicionamento crítico, expressão emotiva e ações de processos de
transformação.
“En cuanto a la conciencia ciudadana, podría
definirse como la capacidad del ciudadano para
conocer y comprender sus prerrogativas, derechos
y obligaciones, así como los principios básicos
(normas y procedimientos) del funcionamento de
la democracia. Esto implicaría que el ciudadano
debiera contar con nociones elementales de lo que
es el interés general, los límites entre lo público y
lo privado, el respeto a los derechos de los demás
y la tolerancia a la diferencia, así como sobre sus
propias capacidades para exigir transparencia y
rendición de cuentas a la autoridad (SOMUANO,
2007, p. 940).
126
Gasca-Pliego e Olvera-Garcia (2011) colocam a necessidade de
se avançar para uma educação que abra os olhos dos cidadãos sobre as
realidades do mundo e os motivem a lutar por um mundo de direitos
humanos para todos. Segundo os autores, um dos desafios do século
XXI é promover a responsabilidade social das universidades públicas no
processo de formação cidadã dos indivíduos. Nos projetos estudados
predominaram a presença do conceito de cidadania, sendo muitas vezes
o ponto principal do projeto, revelando a importância de como a
cidadania é encarada pelos coordenadores e pelos alunos. A experiência
nos projetos promoveu ao aluno, principalmente, aprendizado para além
dos muros do IFSC, ou seja, os alunos demonstraram em seus
depoimentos uma visão mais ampla de seus direitos e deveres enquanto
cidadãos. Além disso, proporcionou aos alunos, a compreensão de que
entre seus deveres, está a responsabilidade de garantir os direitos de
outros. Os depoimentos em que os entrevistados relacionam a cidadania
com os projetos estudados podem ser visualizados a seguir.
Quadro 25 - Cidadania nos projetos
(continua)
O motivo pelo qual existe o Projeto Rondon é você entender que todas as
instituições que participam, que são parceiras são públicas né? Mas alguém
paga por elas, não sou eu que pago mensalmente mas o IFSC por exemplo é
pago por todos os cidadãos de SC, e que a gente estuda, somos então
beneficiados por isso, temos universidades e instituições públicas de extrema
qualidade. Então a extensão é um pouco disso, sair do seu mundinho ali de
estudante e ver o que você como estudante e como cidadão também pode
contribuir na melhoria do seu estado e do seu país. (A1)
Cidadania crítica, por exemplo, quando você está refletindo e argumentando,
quando você está lá com os gestores discutindo e cidadania ativa é você
enxergar um problema e tentar achar uma solução simples, prática, que vai
mudar a vida das pessoas. (A2)
Já desde o Guia do Rondonista, que é estimulado que a pessoa leia antes de
fazer a inscrição, a cidadania está extremamente estampada nesse Guia do
Rondonista, em que sentido? Você chega na comunidade e ouve ela primeiro
para entender quais são as carências dela e se coloca à disposição de tentar
suprir essas carências. E ainda mais que tudo, em toda atividade é estimulado
que você pense ela de maneira sustentável, de que você saia da comunidade e
que aquela atividade possa ser estimulada a continuar na comunidade. (C1)
127
Quadro 25 - Cidadania nos projetos
(conclusão)
Isso se dá sim porque os espaços que você vai atuar são os mais diversos. E aí a
criatividade ela se dá, a gente coloca assim, que não são as dificuldades que
você vai ter durante a oficina, são os desafios. E esses desafios eles têm que ser
superados naquele momento, naquele espaço, pelas pessoas que estão
responsáveis pela atividade. Isso se dá muito na prática, e a inovação também
ela se dá, porque, às vezes, você vai fazer uma oficina, e uma coisa é você fazer
uma atividade dentro da academia, da instituição, outra coisa é você fazer na
comunidade. Você vai ter que fazer o que você faria lá na instituição, só que de
outra forma, com os recursos que você tem, então a inovação também se dá
nesse sentido. (C1)
Fonte: Dados primários (2016).
Quando perguntados se o aluno participante foi capaz de refletir e
entender melhor a realidade em que vive, se estavam preparados e com
mais argumentos para reivindicar seus direitos ou de outros, os
coordenadores tiveram razoável dificuldade em responder, por ser algo
difícil de mensurar. Todavia, todos relatam acreditar que sim, que os
alunos participantes puderam aprender no projeto sobre situações
cotidianas em que precisam se posicionar e enfrentar desafios da nossa
realidade. Para os alunos, foi indiscutivelmente importante a
participação no projeto. Nesse sentido, puderam expor que aprenderam
muito sobre a realidade em que vivem e também com as diferentes
realidades que tiveram a oportunidade de conviver, reforçando neles a
necessidade de reavaliação constante de seus pensamentos a respeito de
tudo que os cercam. Eis algumas falas que sinalizam essa questão no
quadro 26, a seguir.
Quadro 26 - Entendimento da realidade onde vive
(continua)
Com certeza, antes de ter ido pro Rondon eu nem ligava muito pra política, hoje
em dia eu comecei a me forçar a prestar atenção nas questões políticas e saber
que isso é importante para cidadania. Eu também faço parte da sociedade, eu
estou com 20 anos na cara e nem vejo jornal, comecei a refletir sobre isso. (A2)
Foi uma experiência que contribuiu imensamente na minha formação como
cidadã, e entender a necessidade de participar das lutas para reivindicação de
direitos não só meus, mas como de todo um grupo. Também contribuiu para que
eu visse a necessidade da luta conjunta por uma sociedade melhor. (A6)
128
Quadro 26 - Entendimento da realidade onde vive
(conclusão)
Sim, é estimulado e é bem legal, por exemplo, tem catadores no município que
não tem ainda uma associação ou mesmo uma cooperativa, a gente reúne esse
pessoal, passa pra eles como você faz pra abrir uma associação, como você se
organiza pra criar uma cooperativa, e isso é totalmente cidadania, você está
passando pras pessoas conhecimento que podem mudar a vida delas, mudar a
realidade delas. Isso para o acadêmico também é muito interessante, numa
oficina dessas, com certeza, vai ter um acadêmico que faz Administração e que
tem o conhecimento acadêmico pra passar pras pessoas. (C1)
Fonte: Dados primários (2016).
Segundo Matiz (2013), para se chegar à cidadania ativa, é preciso
autoconhecimento e solidariedade. Após o entendimento da realidade, é
necessário que se reconheçam as emoções que estas o proporcionam,
trazendo à tona a indignação frente as injustiças sociais, combatendo o
medo que impede a ação e ressuscitando a esperança de que as coisas
podem se modificar, por mais difíceis que pareçam. Quando
questionados se os alunos eram impulsionados para a ação e tomada de
decisão, coordenadores e alunos assinalaram positivamente e que
também eram impulsionados a agir em benefício dos outros. Por
exemplo, no Projeto “Direitos? Para quais humanos?”, o aluno era
impulsionado a falar e a agir em prol da coletividade participante no
projeto. Além disso, foi capaz de socializar os conhecimentos adquiridos
com seus colegas de sala de aula, tornando-se multiplicador no processo
de conscientização a respeito dos direitos humanos. Eis algumas falas
que demonstram isso, a seguir.
Sim, porque a gente vai preparado pra uma oficina
mas pode chegar lá e ser totalmente o contrário
né, diferente do que você planejou, e aí você tem
que tomar decisão na hora de como fazer aquilo
(A1).
No Rondon existe a liderança 360 graus, a gente
está sempre liderando e sendo liderado, e o líder
quer sempre o melhor pra todos (A2).
Ah, tipo, em benefício dos outros, eu divulgava
sempre aos alunos, acho que eu influenciei
bastantes colegas de curso, pra participar das
discussões e tudo mais, tipo, mudou o pensamento
de uma galera assim. Não sou só eu, não é só a
129
professora, tipo, é todo mundo junto né? Isso que
foi o legal e o diferencial. (A3)
Com relação ao questionamento sobre a percepção do sentimento
de indignação dos alunos frente a problemas ou injustiças sociais, os
coordenadores concordaram positivamente que o projeto oportunizou o
conhecimento de muitas dessas situações, trazendo muita reflexão e
aprendizado tanto para os alunos quanto para os coordenadores. Os
alunos participantes puderam vivenciar situações de vulnerabilidade
social, por exemplo, nas operações do Projeto Rondon, em que se
sensibilizaram e se dispuseram a ajudar. Os alunos tiveram a
oportunidade de reivindicar demandas da comunidade, como no caso do
Projeto Inclusão Digital, em que os alunos conseguiram com a prefeitura
do município, a instalação de internet na única escola da comunidade.
Também ouviram muitos relatos a respeito de violência contra a mulher,
como por exemplo, no Projeto Fazendo Arte, em que o grupo se reunia
na casa de uma das participantes da comunidade no município de Lages.
Essas experiências, muitas vezes chocantes, segundo os alunos,
foram de extrema importância, na medida em que proporcionaram uma
nova visão de mundo, fizeram rever conceitos e valores, ampliando
questões de caráter mais social e diminuindo assim a relevância de
questões individuais e pessoais. As falas a respeito da indignação
experimentada pelos alunos são colocadas no Quadro 27, a seguir.
Quadro 27 – Indignação
(continua)
Eu tenho um exemplo muito forte, mesmo não sendo o objetivo do Rondon,
porque o Rondon não é assistencialismo né? Ele é extensão, mas uma vez eu
estava em uma comunidade mais carente e a gente conheceu uma família que
tinha os filhos pequenos, ficamos conversando e eles falaram que os pequenos
dormiam em cima de tábuas, não tinham nem colchão pra dormir. Na cidade
tinha uma escola, onde ficamos alojados e conversamos com muitas pessoas
sobre a situação chocante que presenciamos, e conversando sobre isso de forma
bem emocionada, de repente olhamos numa sala e tinha uma pilha de colchões
no canto, era uma sala que conseguimos abrir, que estava há muito tempo
fechada, e tinha um amontoado de colchões totalmente inúteis, e tinha uma casa
ali há 100 metros que não tinha colchão pras crianças dormirem. E mesmo não
sendo o propósito do Rondon, ficamos indignadas com um monte de colchões
inúteis e gente dormindo em madeira sabe? E aí falamos com a prefeitura e
resolveram então disponibilizar aqueles colchões para família. (A1)
130
Quadro 27 – Indignação
(conclusão)
Sim, tudo me dói, não gosto de ver as pessoas sofrerem, não aceito injustiça, e
quando eu via alguém comentando que o marido não deixa sair de casa era
difícil mesmo. Procurei ajudar nesse sentido, de a mulher não se acomodar e
não se amedrontar diante dessas situações. (A4)
Sim, de maneira emocional até, com certeza o projeto te dá uma capacidade de
indignação, porque você vai se deparar de fato com as realidades, e é
interessante porque não é você ler a respeito, ou você ver uma postagem no
facebook a respeito, é você ir lá e enxergar, sentir, cheirar, tocar e trocar né?
Então essa capacidade ela é fato. (C1)
O que o aluno ficou mais indignado é que não estava funcionando a internet lá
na escola da comunidade. Como era o espaço e os equipamentos da prefeitura, a
gente não tinha acesso e não deveria ter permissão. Então a gente conseguiu
entrando em contato e requisitando que a prefeitura efetuasse a manutenção dos
equipamentos. Demorou um pouco mas aconteceu. (C5)
Sim, tanto é que quando a aluna bolsista fez uma fala. Ela se emocionou muito,
chorou, por lembrar-se de ver aquelas mulheres naquela situação, mulheres que
chegavam no grupo sem falar nada. De repente estavam falando, estavam
participando, criando coragem, isso diz muito para um aluno, ela conseguiu
perceber essa diferença, esse crescimento que o grupo teve, então, com certeza.
A gente tem que se indignar diante das coisas, não considerar as injustiças como
natural, porque quando a gente considera como natural aí não tem mais jeito,
principalmente as próprias mulheres, a gente falava muito nisso, porque em
Lages tem muito, é a primeira em SC e a 17ª no Brasil na violência contra a
mulher. (C3)
Fonte: Dados primários (2016).
Houve uma coordenadora, que mesmo concordando com o fato
de que o projeto promovia no aluno o sentimento de indignação, fez um
exercício de reflexão relatando sua opinião a respeito das emoções
experimentadas no processo. A coordenadora propõe que lutemos a
favor do que achamos correto de maneira racional, e não emocional.
Percebe-se que o grande desafio é a conscientização da necessidade de
transformação social que pode ser iniciada no indivíduo de maneira racional ou emocional. Matiz (2013) acredita que as emoções estimulam
os indivíduos a tomarem atitudes em prol do bem-estar social. Eis a
seguir, a opinião da Coordenadora 2 que apresenta divergência com a
opinião colocada pela autora.
131
Porque eu sempre dizia assim pra eles ó, a gente
não pode defender os direitos humanos por
compaixão nem por amor, mas porque é certo. E o
ser certo é uma coisa racional, porque a partir do
momento que tu depende da emoção dos outros,
tu está dependendo de como ela está naquele dia,
e se é racional, se é certo, se tu achas que aquilo é
certo, vai independer do teu estado de espírito, tu
vais te deixar guiar pela tua razão. É um direito
das pessoas serem respeitadas, independentemente
de se hoje eu estou bem ou se estou com cólica.
(C2)
Tapia (2006) apresenta os projetos sociais com outro nome,
“aprendizaje-servicio”. Sua metodologia é descrita como uma atividade
de serviço solidário realizado pelos estudantes, orientado a atender
necessidades de uma comunidade e planejada de forma integrada com
conteúdos curriculares com o objetivo de fortalecer as aprendizagens.
Esse conceito vai de encontro aos objetivos de um projeto social, na
medida em que visa atender às necessidades de comunidades e também
promover uma formação cidadã aos estudantes. As vantagens de se ter
esse tipo de experiência são, principalmente:
Liderança estudantil: fortalece o aprendizado cooperativo e a
criatividade do estudante como principal responsável pelo
planejamento, execução e avaliação do projeto.
Promoção de atividades solidárias: por meio das atividades
coletivas orientadas a solucionar problema mediante a
cooperação de um coletivo organizado.
Aprendizagem recíproca: construção de um espaço de
transformação social para que exista troca de aprendizagem
de maneira que tanto o estudante quanto os membros da
comunidade sejam beneficiados com o projeto.
Fortalecimento cidadão: promoção da solidariedade como
norma ética e desenvolvimento de habilidades cidadãs
(TAPIA, 2006).
Diante disso, é visível nos depoimentos o quão importante é a participação do aluno nesse tipo de projeto na medida em que atende às
características citadas anteriormente pelo autor e que foram debatidas na
análise das categorias propostas neste estudo. É perceptível, também,
que nesse processo os alunos possuem a oportunidade de vivenciar uma
132
educação voltada para a cidadania, centralizando suas ações na
dignidade humana e ampliando suas ideias para objetivos, ligados ao
bem-estar social, refletindo também em suas visões profissionais e
pessoais. A seguir, o Quadro 28 que sintetiza os resultados observados,
relacionando-os com as categorias e os fatores de análise da pesquisa.
Quadro 28 - Quadro Síntese
Categoria Fatores de Análise Resultados Observados
Atuação
ética
- formação ética;
- responsabilidade e
compromisso dos
alunos;
- resgate de valores de
justiça;
- fortalecimento de
valores éticos.
- os alunos participantes puderam refletir
acerca de princípios éticos ao longo dos
projetos;
- os alunos demonstraram forte
comprometimento e responsabilidade;
- fortalecimento dos valores éticos por
meio da vivência com as comunidades;
- resgate dos valores de justiça social a
partir das carências das comunidades
atendidas.
Respeito à
diversidade
- respeito às diferenças;
- agir com
solidariedade e
cooperação;
- habilidade de
conviver com o
coletivo.
- os alunos participantes demonstraram
respeito às diferenças de todos os tipos,
assim como mudaram sua opinião a
respeito de realidades diversas nunca
antes vistas;
- os alunos participantes puderam agir em
prol de outros, tanto da comunidade como
em prol do seu próprio grupo do projeto.
Interação
dialógica
- participação de todos;
- habilidade em lidar
com conflitos
- puderam participar do processo como
um todo e promoveram a participação da
comunidade;
- experimentaram diferentes situações em
que foi preciso o uso de muito diálogo.
Criatividade
e inovação
- estímulo às ideias e
soluções;
- pensamento crítico;
- autonomia
- o projeto proporcionou autonomia aos
alunos participantes para pensarem e
desenvolverem novas ideias e soluções;
- no projeto as situações demandaram
pensamento crítico dos alunos
participantes.
Cidadania - entendimento da
realidade em que vive;
- ação em benefício de
outros;
- indignação.
- o aluno participante pode entender
melhor a sociedade em que vive;
- usaram suas emoções como motivação
para agir com solidariedade.
Fonte: Dados primários (2016).
133
Depois de realizada a análise dos dados, com base na
fundamentação teórica, passa-se ao capítulo que contempla as
conclusões deste estudo.
135
5 CONCLUSÕES
Neste último capítulo, faz-se necessário resgatar o objetivo geral
desta pesquisa: analisar a contribuição dos projetos de cunho social para
a formação cidadã dos alunos do IFSC à luz da responsabilidade social
universitária. Para atender ao objetivo geral proposto, foram definidos
três objetivos específicos, dos quais apontam para as seguintes
considerações.
O primeiro objetivo específico consistiu na descrição dos projetos
de cunho social selecionados para o estudo e cadastrados na extensão da
instituição no ano de 2014. Foram identificados na Diretoria de extensão
do IFSC – setor responsável pela gestão dos projetos de extensão da
instituição – 387 projetos cadastrados compondo os projetos realizados
nos 22 câmpus em 2014. Esses projetos estão relacionados a diferentes
áreas temáticas da extensão, tais como: comunicação, cultura, direitos
humanos e justiça, educação, meio ambiente, saúde, tecnologia e
produção, e por último, trabalho.
A partir da identificação dos projetos de extensão realizados,
optou-se por fazer uma seleção dos projetos de cunho social, os quais
poderiam estar inseridos em qualquer uma das áreas temáticas
existentes. Dessa forma, obteve-se 66 projetos sociais executados nesse
período, e a partir deles foi possível selecionar os projetos que melhor
atenderiam ao propósito do estudo. Tomou-se o cuidado de selecionar
um projeto por região de Santa Catarina, já que o IFSC divide os
câmpus em 6 regiões que abrangem o Estado todo. Portanto, ficaram
definidos 6 projetos sociais como alvo do estudo. Na região da Grande
Florianópolis, o projeto escolhido foi o Projeto Rondon - Operação
Grande Oeste; na região do Vale do Itajaí foi o projeto Direitos? Para
quais Humanos?; na região do Planalto Serrano foi o projeto Fazendo
Arte, conquistando Direitos e construindo Cidadania; na região Oeste, o
projeto escolhido foi o projeto contemplado pelo Programa Mulheres
SIM; na região Norte foi o projeto Inclusão Digital: Uso do computador
e internet na comunidade rural; e, finalmente, na região Sul, o projeto
escolhido foi O ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas
públicas de ensino médio de Criciúma e os desafios para a eliminação
do racismo.
Após a seleção dos projetos de cunho social, foi possível realizar
uma descrição de sua natureza, objetivos, perspectivas e comunidades
atendidas. A descrição foi capaz de proporcionar ao leitor uma ideia da
realidade em que foi realizado o projeto, seu público-alvo e uma breve
contextualização do projeto. Dessa forma, constatou-se o atendimento
136
ao primeiro objetivo específico, na medida em que foram fornecidas
informações precisas ao leitor a fim de facilitar sua compreensão ao se
apresentarem os depoimentos dos entrevistados.
O segundo objetivo específico foi avaliar a contribuição dos
projetos sociais existentes nos câmpus para a formação cidadã do aluno
na perspectiva dos coordenadores e alunos envolvidos. Nessa etapa, foi
possível estabelecer categorias para análise da formação cidadã do aluno
e a partir delas obtiveram-se os depoimentos por meio do instrumento de
coleta de dados. Foi possível perceber nos alunos uma atuação ética nas
atividades desenvolvidas e nas reflexões que repercutiram das interações
com a comunidade, assim como foi perceptível o respeito dos alunos
com relação à diversidade do público atendido. Os projetos
proporcionaram espaço para uma interação dialógica, tanto na relação
coordenador e aluno, como na relação dos alunos e dos coordenadores
com a comunidade. A criatividade e a inovação também se fizeram
presentes nos projetos estudados, na medida em que os alunos
precisavam lidar com os recursos disponíveis na comunidade atendida.
Além disso, puderam constatar situações em que se fez necessário uma
consciência cidadã, ou seja, os alunos foram incentivados a esclarecer e
a promover a cidadania de pessoas que, por diversas razões,
desconheciam seus direitos. Enfim, nos relatos dos coordenadores e
alunos participantes dos projetos selecionados, muitas considerações
foram relevantes, compondo então o cerne deste estudo. Dentre elas,
destaca-se a satisfação relatada pelos coordenadores e alunos com
relação às suas participações nos projetos aqui tratados.
Foi perceptível uma valiosa contribuição dos projetos sociais para
a formação cidadã dos alunos participantes, os quais foram levados a ter
uma visão mais humanística na medida em que foram conhecendo
melhor a realidade do seu entorno, foram motivados a interagir
dialogicamente com essa realidade, a colocar-se no lugar dela,
respeitando seus valores e ideias, agindo de forma ética e criativa diante
das adversidades e, principalmente, visualizando e esclarecendo
oportunidades de cidadania ainda não experimentadas. Por meio dos
depoimentos, compreende-se a relevância desses projetos para os
alunos, de como essa experiência os toca de maneira racional e
emocional, refletindo em aprendizado profissional e pessoal.
Em alguns depoimentos, fica nítido o quanto é significativa a
participação do aluno em um projeto de atende comunidades no entorno
da instituição. Segundo uma das coordenadoras, a vivência social de
algo que não é comum ao dia a dia do aluno proporciona um
aprendizado significativo, sobretudo, provoca reflexões. Dessa forma, os
137
projetos proporcionaram ao aluno se colocar no lugar do outro,
mudando a perspectiva e fazendo com que ele encare as coisas de outra
maneira. Tornou-se evidente que as atividades realizadas nos projetos
estudados promoveram um trabalho mais cooperativo e colaborativo em
detrimento dos interesses individuais dos alunos e membros da equipe
executora. Os projetos puderam impulsionar aos alunos valores de
liberdade, igualdade, solidariedade, responsabilidade, justiça e
dignidade. Esses valores eram percebidos pelos alunos na medida em
que se envolviam com a comunidade atendida pelo projeto, bem como
se colocavam à disposição das pessoas daquela comunidade,
concomitantemente, mudavam ou reforçavam pensamentos, ideais e
percepções de vida.
Para atender ao terceiro objetivo específico deste estudo, propor
ações de melhoria para a gestão da extensão na instituição sob o enfoque
da responsabilidade social universitária, faz-se necessário apresentar
algumas considerações a respeito da extensão no IFSC com base nos
depoimentos dos entrevistados. Primeiramente, é possível perceber que
na instituição não há muitos incentivos da extensão para o
desenvolvimento de projetos sociais. Não existem empecilhos, porém o
incentivo se dá de maneira generalizada para todas as áreas temáticas de
extensão por meio da participação dos editais de fomento aos projetos
de extensão, geridos pela Pró-Reitoria de Extensão e Relações Externas.
Dessa forma, acredita-se ser interessante abrir espaço mais específico
para esse tipo de projeto que se destaca dos demais por seu caráter, ao
mesmo tempo educativo e socialmente responsável. Segundo um dos
coordenadores, as questões sociais dentro do seu câmpus são tratadas
não de forma superficial, mas de forma voluntária, ou seja, dependendo
muito mais da vontade ou da organização de um docente do que
propriamente uma prática institucional.
Na maioria dos depoimentos dos coordenadores, percebeu-se um
esforço pessoal do coordenador para a realização de um projeto de
extensão de cunho social na instituição. Muitos colocaram que não é
algo reconhecido como importante, ou seja, não se dá o devido valor a
projetos dessa natureza. Inclusive alguns alunos colocaram que não há
muitas oportunidades nesse campo e afirmaram que a instituição deveria
promover mais debates e proporcionar mais espaço para discussões de
questões sociais. Quando os entrevistados foram perguntados se
conheciam algum grupo de pesquisa que desenvolvesse trabalhos em
prol do bem-estar da sociedade, foram citados poucos, pois muitos dos
servidores e alunos desconheciam grupos que pesquisassem esse tema
na instituição.
138
Caberia à extensão encontrar uma forma de engajar também a
pesquisa nessas abordagens, tentar promover a indissociabilidade entre
ensino, pesquisa e extensão, objetivando criar meios de se conseguir
avançar no tema, promovendo um amadurecimento dos professores e
dos alunos nessa área do conhecimento. Nesse contexto, “é mais
importante estar de acordo com os parâmetros internacionais em termos
de pesquisa de ponta, ou é mais importante nos recolhermos a um
contexto que ainda clama por soluções?” (BAZZO, 2014, p. 114).
Segundo um dos coordenadores, o debate dentro do seu câmpus sobre as
questões sociais é lamentável, assim como o próprio espaço no qual a
área de humanas se mostra periférico. O coordenador considera que no
IFSC existe um processo mais forte do que em outras instituições, por
ter caráter bem tecnocrático.
Segundo Bazzo (2014), as conquistas tecnológicas estão cada vez
mais presentes no nosso cotidiano. Seus idealizadores defendem que o
bem-estar do homem está diretamente atrelado ao desenvolvimento
científico e tecnológico. Porém, apesar de todas as conquistas
tecnológicas experimentadas, atualmente, os problemas sociais se
agravam a cada dia. Segundo o autor, a área de humanas e a área de
tecnologia deveriam parar de se digladiar. É preciso reflexão e
reconhecimento da importância das contribuições mútuas na construção
do conhecimento. “É preciso um trabalho conjunto na busca de um
horizonte comum que propicie a extensão de benesses da tecnologia a
todos” (BAZZO, 2014, p. 71).
Segundo o autor, para acabar com o hiato existente entre o campo
do conhecimento tecnológico e o campo de conhecimento das ciências
sociais, não é necessário transformar os alunos dos cursos de tecnologia
em aprendizes de filósofos e sociólogos. O segredo é a
interdisciplinaridade por meio de grupos de conhecimento formados
pelos mais diversos professores, utilizando de novas e diversificadas
técnicas. Seria interessante promover a compreensão dos estudantes a
respeito da ciência, tecnologia e sociedade por meio de teoria e prática,
com exemplos específicos da área técnica e com reflexão nos problemas
e questões do contexto atual.
A esse respeito, cabe a colocação de que os projetos sociais
realizados na instituição propõem essa dinâmica de trabalho, porém é
carente ainda de embasamento teórico, focando mais na parte prática das
atividades. Isso também ficou muito evidente neste estudo. Dessa forma,
é preciso fundamentar teoricamente os projetos sociais para que possam
embasar melhor as ações dos alunos e dos coordenadores nos projetos.
A qualidade, atualidade e relevância das referências bibliográficas
139
poderiam ser consideradas como importante fator de análise na seleção
dos projetos para fomento por meio dos editais. Além disso, a proposta
do projeto poderia conter competências sugeridas como aprendizado aos
alunos, ou seja, o coordenador colocaria na proposta do seu projeto, suas
intenções com relação à formação cidadã do aluno participante como
bolsista.
Outro aspecto interessante seria se utilizar deste estudo para
avaliar o projeto, após a sua conclusão, verificando se no entendimento
do coordenador constata-se o aprendizado de competências cidadãs por
parte dos alunos no decorrer do processo. Tendo em vista que a
avaliação dos projetos é superficial, feita por meio de relatório final
entregue à Diretoria de Extensão, em que se segue um modelo pré-
determinado, visando esclarecer as atividades realizadas, não abarcando
as questões qualitativas, as quais são complexas de se mensurar. Eis,
então, que surge uma tentativa de avaliar qualitativamente a formação
cidadã dos alunos que participam de projetos de extensão de cunho
social, podendo ser ampliada a avaliação de acordo com a necessidade
de cada projeto, respeitando as especificidades de cada um deles. É
interessante perceber que a formação do aluno como cidadão é pontuada
em muitos discursos e documentos da instituição, porém é algo muito
pouco tratado de fato.
A importância de participar de um projeto de extensão e
compreender como essa dinâmica funciona ficou evidenciada pelos
alunos. Segundo um deles, foi importante vivenciar e aprender sobre a
extensão no IFSC, pois as vivências trouxeram autoconhecimento na
medida em que conheciam pessoas diferentes e começavam a olhar para
si de maneira diferente também. Diante disso, poder-se-ia pensar em
estratégias de divulgação para uma maior conscientização dos alunos
para as questões sociais para que pudessem participar mais dos projetos
existentes na instituição e, concomitantemente, pudessem se sentir mais
parte atuante da instituição e da sociedade.
Nesse contexto, Vercelli (2013) coloca que a Responsabilidade
Social Universitária pode se dar por meio de projetos sociais que
poderão formar cidadãos capazes de fazer uma leitura da realidade, de
reconstruir a cidadania das camadas populares e buscar a transformação
social em prol de uma vida mais digna. Essa questão foi percebida neste
estudo, pois por meio dos projetos sociais os alunos possuem a
oportunidade de se conectar com a sociedade ao seu redor, conhecendo-
a e modificando-a. Concomitantemente, o aluno é capaz de perceber
significativas transformações no seu modo de pensar, agir e se
relacionar.
140
O papel da educação vai muito mais além de direcionar os alunos
aos seus empregos na vida adulta: ela precisa tornar os jovens criativos e
críticos em relação às realizações da ciência e da tecnologia; precisa
ajudá-los a pensar com respeito às aspirações de seus colegas e de todos
os cidadãos; precisa levá-los a pensar, num processo coletivo, nos
resultados e consequências dos seus conhecimentos adquiridos. “A
educação deve, sobretudo, apontar na direção do pensamento crítico da
riqueza dos valores culturais e das dimensões morais e espirituais da
vida.” (BAZZO, 2014, p. 159).
Dessa forma, é possível concluir que existe uma significativa
contribuição dos projetos de extensão de cunho social para a formação
cidadã dos alunos do Instituto Federal de Santa Catarina. “Como una
educación que abre los ojos de los ciudadanos sobre las realidades del
mundo y les invita a participar en la realización de un mundo más justo
y más equitativo, un mundo de derechos humanos para todos” (GASCA-
PLIEGO; OLVERA-GARCIA, 2011, p. 44). Essa percepção foi
possível ser encontrada, utilizando-se pressupostos colocados pela
responsabilidade social universitária na perspectiva de proporcionar uma
formação cidadã e reflexiva aos alunos da instituição. Tal formação
proporciona, principalmente, uma consciência social em que o todo é
mais importante do que o bem-estar individual, incitando o aluno na
busca por respostas, por meio da ciência e da tecnologia, às
necessidades da sociedade.
141
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APÊNDICE A - Roteiro Entrevista sobre Formação Cidadã do
Aluno
1. O que você entende por atuação ética? Esse conceito foi
repassado aos alunos de alguma maneira?
a) No projeto como os alunos eram incentivados para a
responsabilidade e o compromisso?
b) O projeto resgatou valores de justiça? O projeto foi capaz
de promover discussões construtivas acerca de injustiças
sociais locais?
c) O aluno adquiriu uma nova atitude frente aos desafios da
sociedade e foi capaz de fortalecer seus valores éticos com
a participação no projeto?
2. O que você entende por respeito à diversidade? Esse conceito foi
repassado aos alunos de alguma maneira?
a) Os alunos demonstraram respeito nas diferenças de ideias,
gênero, raça, cultura, religião, etc,?
b) Os alunos foram incentivados a se colocarem no lugar do
outro? Agir com solidariedade, tolerância e cooperação?
c) O aluno foi capaz de melhorar sua habilidade de conviver
coletivamente?
3. O que você entende por interação dialógica? Esse conceito foi
repassado aos alunos de alguma maneira?
a) O projeto incentivou a participação de todos, todos
puderam expressar suas ideias? Qual a importância disso
para o aluno?
b) Quando surgem conflitos, como eles são resolvidos na equipe? O projeto proporcionou ao aluno adquirir melhor
habilidade para lidar com esses conflitos?
4. O que você entende por criatividade e inovação? Esse conceito
foi repassado aos alunos de alguma maneira?
156
a) Foram estimuladas ideias e soluções que fogem ao
convencional?
b) Houve uma promoção do pensamento crítico do aluno?
c) No projeto os alunos foram estimulados para a autonomia
no desenvolvimento das atividades?
5. O que você entende por cidadania? Esse conceito foi repassado
aos alunos de alguma maneira?
a) O aluno foi capaz de refletir e entender melhor a realidade
onde vive? Sente-se melhor preparado para reagir e agir frente
aos desafios da sociedade? O projeto proporcionou ao aluno
mais argumentos para reivindicar seus direitos ou de outros?
a) Os alunos eram impulsionados para a ação e tomada de
decisão? Eram motivados para agir em benefício de outros?
b) Foi possível perceber o sentimento de indignação dos
alunos frente às injustiças e problemas sociais?
6. Indique outro ensinamento relevante que o aluno tenha adquirido
na participação do projeto e que não foi contemplado nessas
perguntas.
a) A participação no projeto foi de iniciativa do aluno? Qual a
sua motivação para participar do projeto? (aluno e
coordenador)
b) Você já discutiu esse conceito de Formação Cidadã em
alguma disciplina ou evento no IFSC? Quais?
c) Você tem conhecimento de algum grupo de pesquisa com
esse tema?
157
APÊNDICE B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Prezado(a) Senhor(a),
Gostaríamos de convidá-lo a participar de nosso estudo “A
Contribuição da Extensão para a Responsabilidade Social do Instituto
Federal de Santa Catarina” que tem como objetivo analisar a
contribuição dos projetos de extensão de cunho social comunitário para
a Responsabilidade Social do IFSC à luz da formação do aluno.
A pesquisa consistirá na realização de entrevistas e aplicação de
questionários junto aos participantes do estudo e posterior análise dos
dados. Será conduzida dessa forma, pois pretendemos compreender
como se dá a formação do aluno nos projetos de extensão de cunho
social, esperando contribuir para um melhor entendimento da
Responsabilidade Social na instituição.
Trata-se de uma dissertação, desenvolvida por Paula Clarissa de
Souza e orientada pela Profª. Drª. Marilda Todescat, do curso de Pós-
Graduação em Administração Universitária da Universidade Federal de
Santa Catarina.
A qualquer momento da realização desse estudo qualquer
participante/pesquisado poderá receber os esclarecimentos adicionais que
julgar necessários. Todos os registros efetuados no decorrer desta
investigação serão usados para fins unicamente acadêmico-científicos e
apresentados na forma de dissertação ou artigo científico, não sendo
utilizados para qualquer fim comercial.
Em caso de concordância com as considerações expostas,
solicitamos que assine este “Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido” no local indicado abaixo. Desde já agradecemos sua
colaboração e nos comprometemos com a disponibilização à instituição
dos resultados obtidos nesta pesquisa, tornando-os acessíveis a todos os
participantes.
PAULA CLARISSA DE SOUZA
Pesquisadora
Mestrado Profissional em
Administração Universitária
PPGAU / UFSC
Prof.ª MARILDA
TODESCAT, Dr.ª
Orientadora
PPGAU / CSE / UFSC
158
Eu, _______________________________________, assino o termo de
consentimento, após esclarecimento e concordância com os objetivos e
condições da realização da pesquisa “A Contribuição da Extensão para a
Responsabilidade Social do Instituto Federal de Santa Catarina”,
permitindo, também, que os resultados gerais deste estudo sejam
divulgados sem a menção dos nomes dos pesquisados.
Florianópolis, __ de__________ de 2015.
Assinatura do(a)
Pesquisado(a)