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“A Cooperação Internacional da Fiocruz na formação de recursos
humanos em saúde: os programas de pós-graduação”
por
Livia de Oliveira Pasqualin
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre
Modalidade Profissional em Saúde Pública.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria do Carmo Leal
Rio de Janeiro, novembro de 2014.
Esta dissertação, intitulada
“A Cooperação Internacional da Fiocruz na formação de recursos humanos em saúde: os programas de pós-graduação”
apresentada por
Livia de Oliveira Pasqualin
foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:
Prof. Dr. Wilson Savino
Prof.ª Dr.ª Virginia Alonso Hortale
Prof.ª Dr.ª Maria do Carmo Leal – Orientadora
Dissertação defendida e aprovada em 03 de outubro de 2014.
Catalogação na fonte Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica Biblioteca de Saúde Pública
P284 Pasqualin, Lívia de Oliveira A cooperação internacional da Fiocruz na formação de
recursos humanos em saúde: os programas de pós-graduação. / Lívia de Oliveira Pasqualin. -- 2014.
viii,75 f. : tab. ; mapas
Orientador: Leal Maria do Carmo Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde
Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2014.
1. Cooperação Internacional. 2. Saúde. 3. Educação de Pós-Graduação. 4. Recursos Humanos em Saúde. 5. África. 6. América do Sul. I. Título.
CDD - 22.ed. – 362.1042
Serviço de Gestão Acadêmica - Rua Leopoldo Bulhões, 1.480, Térreo – Manguinhos-RJ – 21041-210 Tel.: (0-XX-21) 2598-2969 ou 08000-230085
E-mail: [email protected] Homepage: http://www.ensp.fiocruz.br
A U T O R I Z A Ç Ã O
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a
reprodução total ou parcial desta dissertação, por processos
fotocopiadores.
Rio de Janeiro, 03 de novembro de 2014.
________________________________ Livia de Oliveira Pasqualin
/Fa
"… porque en realidad, nuestro norte es el Sur. No debe haber norte, para nosotros, sino por oposición a nuestro Sur. Por eso ahora ponemos el mapa al revés, y entonces ya tenemos justa idea de nuestra posición, y no como quieren en el resto del mundo. La punta de América, desde ahora, prolongándose, señala insistentemente el Sur, nuestro norte."
Joaquín Torres García. Universalismo Constructivo, 1941.
ii
AGRADECIMENTOS
Neste momento que marca o fim de mais um ciclo, deixo alguns agradecimentos indispensáveis.
Primeiramente, agradeço aos meus pais, Luiz e Marisa, por tudo o que representam na minha vida e na minha formação, pelos exemplos como pessoas e profissionais, pelo
amor, auxílio e afeto de sempre.
Aos meus irmãos, André Luis e Mariana, e aos quase irmãos Juliana e Júlio, pela amizade, lealdade e por serem tão presentes e essenciais.
À pequena e amada Alice, que torna leves, alegres e descontraídos mesmo os dias mais
nublados.
Ao Tito, pelo amor, companheirismo e paciência. Por ser um porto seguro e me fazer querer ser sempre uma pessoa melhor. Sem seu apoio e motivação o caminho seria
certamente mais árduo.
A Prof. Dra. Maria do Carmo Leal, por aceitar esta orientação, pela competência, pelo auxílio, experiência e conhecimentos compartilhados, pela disponibilidade e dedicação
neste trabalho.
À coordenação e aos profissionais que ajudaram a realizar o mestrado em Saúde Global e Diplomacia da Saúde, por proporcionarem semanas intensas de constante aprendizado,
sem os quais nada teria se concretizado.
Aos colegas e companheiros do mestrado em Saúde Global e Diplomacia da Saúde, pela convivência, risadas desestressantes e cumplicidade ao longo desses dois anos.
Aos pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, pela dedicação e
disposição em nos auxiliar nesta formação.
Aos funcionários e pesquisadores da ENSP, IOC e VPEIC, em especial aos muitos que, de forma solícita e cordial, foram essenciais durante a coleta dos dados.
Aos Professores Virgínia Hortale e Wilson Savino, que gentilmente aceitaram compor as
bancas de qualificação e defesa, pelas valiosas observações e sugestões.
À Direção e aos colegas da Seção de Apoio Institucional da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, por possibilitar minhas ausências e torná-las
menos tumultuadas.
A minha família carioca, Sandra, Henrique e Bê, pela acolhida, abrigo e por permitirem sentir-me em casa, serei eternamente grata.
A Lúcia Helena de Oliveira Pileggi pelas correções no texto.
A todos que colaboraram para a realização deste trabalho.
iii
RESUMO
PASQUALIN, L. O. A Cooperação Internacional da Fiocruz na formação de recursos humanos em saúde: os programas de Pós-Graduação. 2014. 75 f. Dissertação (Mestrado Profissional) – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fiocruz, Rio de Janeiro, 2014.
A cooperação técnica internacional é importante instrumento de desenvolvimento e auxilia países a promoverem mudanças estruturais, como forma de superar restrições que prejudicam seu crescimento e desenvolvimento. A formação de recursos humanos qualificados em saúde é um dos maiores desafios destes países, assim como a retenção e educação permanente destes profissionais. Uma das estratégias para diminuir estes efeitos, é a formação rápida e em larga escala de recursos humanos especializados na área da saúde, principalmente em nível de Pós-Graduação, que sejam capacitados para a inovação e pesquisa em saúde. As parcerias do Brasil com a África e América do Sul são frequentes e este estudo exploratório-descritivo buscou analisar os cursos de Pós-Graduação realizados pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com parceira internacional. Foi pesquisada a trajetória da Cooperação Internacional da Instituição na área de formação em pós-graduação, modalidade mestrado, realizada com instituições em Angola, Argentina, Moçambique e Peru. Foi realizada pesquisa bibliográfica sobre formação de recursos humanos em saúde, ensino e avaliação da Pós-Graduação no Brasil e Cooperação Internacional. Também foi realizada coleta de dados com estratégia e análise documental para consecução parcial dos objetivos propostos. Os perfis dos egressos e títulos das dissertações foram objeto de análise. As iniciativas pesquisadas apontam que são programas heterogêneos, que apesar de apresentarem alto índice de conclusão, há experiências exitosas e outras que devem ser aprendizado para as iniciativas que terão continuidade e para as que podem surgir no futuro.
Descritores: Cooperação Internacional, Saúde, Educação de Pós-Graduação, África, América do Sul.
iv
ABSTRACT
PASQUALIN, L. International Cooperation by Fiocruz in human resources for health development: Graduate Programs. 2014. 75 p. Thesis (Professional Master’s) – Sérgio Arouca National School of Public Health, Oswaldo Cruz Foundation, Rio de Janeiro, 2014.
International technical cooperation is an important tool for development and supports countries to promote structural changes as a way to overcome constraints that impair their growth and development. The training of qualified human resources for health is one of the biggest challenges in these countries, as well as the retention and continuing education of these professionals. One of the strategies to lessen these effects is the rapid and large-scale training of specialized human resources in health, especially in graduate level, who are trained on health innovation and research. Brazil's partnerships with Africa and South America are frequent and this descriptive exploratory study investigates the graduate programs conducted by the Oswaldo Cruz Foundation (Fiocruz) with international partnership. The path of the Institution on International Cooperation on master's training performed with institutions in Angola, Argentina, Mozambique and Peru was searched. Literature review on training of human resources for health, education, evaluation of Brazilian graduate studies and International Cooperation was held. Data collection with documental strategy and analysis for partial achievement of the proposed objectives was also performed. The profile of graduates and titles of the thesis were also analyzed. The initiatives surveyed indicate successful programs, high completion rates and continuity of some of the initiatives. The initiatives researched indicate that they are heterogeneous programs, which despite their high completion rate, there are successful experiences but also others that should be a lesson learnt for the initiatives to be continued and those that may arise in the future.
Descriptors: International Cooperation; Health; Education, Graduate; Africa; South-America.
v
LISTA DE FIGURAS E QUADROS
Figura 1: O conceito de “Cooperação Estruturante em Saúde”: inovações conceituais e
operacionais....................................................................................................................10
Tabela 1: Dados demográficos e econômicos selecionados de Angola, Argentina, Brasil,
Moçambique e Peru............................................................................................37
Tabela 2: Índice de Desenvolvimento Humano de Angola, Argentina, Brasil,
Moçambique e Peru........................................................................................................38
Figura 2: Países com carência crítica de prestadores de serviços de saúde (médicos,
enfermeiros e parteiras)..................................................................................................40
Tabela 3: Densidade de trabalhadores da saúde por 1000 habitantes em Angola,
Argentina, Brasil, Moçambique e Peru..................................................................................39
Quadro 1: Universo de estudo.......................................................................................43
Tabela 4: Gasto anual per capita em saúde, gasto em saúde pelo setor público e esperança
de vida ao nascer em Angola, Argentina, Brasil, Moçambique e Peru..........41
Tabela 5: Egressos e alunos matriculados nos cursos de mestrado acadêmico realizados
em cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e
Peru.................................................................................................................................59
Tabela 6: Descrição dos cursos de mestrado acadêmico realizados em cooperação
internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru.................62
Tabela 7: Características dos alunos dos cursos de mestrado acadêmico realizados em
cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru
........................................................................................................................................64
Tabela 8: Temáticas das dissertações defendidas nos mestrados acadêmicos realizados em
cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e
Peru.................................................................................................................................67
vi
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABC - Agência Brasileira de Cooperação
AISA/MS - Assessoria de Assuntos Internacionais de Saúde do Ministério da Saúde
AOD - Ajuda Oficial para o Desenvolvimento
ANLIS - Administracion Nacional de Laboratorios e Institutos de Salud “Dr. Carlos G.
Malbran”
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEP - Comitê de Ética em Pesquisa
C&T – Ciência e Tecnologia
CI - Cooperação Internacional
CID - Cooperação Internacional para o Desenvolvimento
COBRADI - Cooperação Brasileira para o Desenvolvimento Internacional
CNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CPLP - Comunidade de Países de Língua Portuguesa
CRIS - Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fiocruz
CTI - Cooperação Técnica Internacional
CTPD - Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento
ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca
FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz
FMI - Fundo Monetário Internacional
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
IES – Instituição de Ensino Superior
IOC - Instituto Oswaldo Cruz
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MRE - Ministério das Relações Exteriores
MS - Ministério da Saúde
ODM - Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
OI - Organizações Internacionais
OMS - Organização Mundial da Saúde
ONGs - Organizações Não-Governamentais
vii
ONU - Organização das Nações Unidas
OPAS - Organização Pan-americana da Saúde
PALOP - Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa
PBDCT - Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
PECS - Plano Estratégico de Cooperação em Saúde
PED – Países em Desenvolvimento
PEC-G - Programa de Estudantes-Convênio de Graduação
PEC-PG - Programa de Estudantes-Convênio de Pós-Graduação
PG – Pós-Graduação
PIB - Produto Interno Bruto
PND - Plano Nacional de Desenvolvimento
PNE - Plano Nacional de Educação
PNPG – Plano Nacional de Pós-Graduação
PNUD - Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas
RHS – Recursos Humanos em Saúde
RINS - Rede dos Institutos Nacionais de Saúde
RMS – Relatório Mundial da Saúde
SUS - Sistema Único de Saúde
UNASUL - União de Nações Sul-Americanas
USAID - United States Agency for International Development
VDPDT - Vice-Direção de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da ENSP
VDPG - Vice-Direção de Pós-Graduação da ENSP
VPEIC - Vice-Presidência de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz
viii
Sumário
1. A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NA FORMAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE ............................................................................................... 7
1.1 Justificativa ................................................................................................................. 8
1.2 Objetivo Geral .......................................................................................................... 13
1.2 Objetivos Específicos ............................................................................................... 13
2. RELAÇÕES INTERNACIONAIS, SAÚDE E EDUCAÇÃO: UM PONTO DE INTERSECÇÃO .......................................................................................................... 14
2.1 Formação de Recursos Humanos em Saúde ............................................................. 14
2.2 Ensino e Avaliação da Pós-Graduação ..................................................................... 17
PNPG 1975/1979 ....................................................................................................... 18
PNPG 1982/1985 ....................................................................................................... 19
PNPG 1986/1989 ....................................................................................................... 19
PNPG 2005/2010 ....................................................................................................... 20
PNPG 2011/2020 ....................................................................................................... 21
2.3 Cooperação Internacional em Saúde ........................................................................ 23
3. METODOLOGIA .................................................................................................... 27 3.1 Referencial Teórico-Metodológico .......................................................................... 27
3.2 Desenho do Estudo ................................................................................................... 28
4. ANTECEDENTES HISTÓRICOS: A FIOCRUZ E OS PAÍSES ESTUDADOS31 4.1 A atuação Internacional da Fiocruz .......................................................................... 31
4.2 Diferentes países, diferentes realidades .................................................................... 36
5. AÇÕES INTERNACIONAIS DA FIOCRUZ EM PROGRAMAS DE MESTRADO INTERNACIONAIS ............................................................................ 41
5.1 Mestrado em Saúde Pública – Angola...................................................................... 43
5.2 Mestrado em Biologia Celular e Molecular – Argentina ......................................... 47
5.3 Mestrado em Epidemiologia em Saúde Pública – Argentina ................................... 49
5.4 Mestrado em Ciências da Saúde – Moçambique ...................................................... 51
5.5 Mestrado em Sistemas de Saúde – Moçambique ..................................................... 54
5.6 Mestrado em Saúde Pública – Peru .......................................................................... 56
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 59 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 68 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 71
7
1. A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NA FORMAÇÃO DE
RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE
A formação de recursos humanos qualificados em saúde é um dos maiores
desafios dos países em desenvolvimento, assim como a retenção e educação
permanente destes profissionais.
Ao mesmo tempo em que muitos países adotam como prática o envio de
estudantes de pós-graduação para formação nos Estados Unidos da América e na
Europa, os benefícios desta realização são contrapostos pelos altos custos, pequeno
número de pessoas beneficiadas e especialização em tópicos que não necessariamente
são prioritários para a região de origem. Além disso, o risco de brain draini para países
com melhor remuneração e condições de trabalho é um agravante (SAVINO et al.,
2008).
Uma das estratégias para diminuir estes efeitos, que podem ser devastadores em
locais como o continente Africano, é a formação rápida e em larga escala de recursos
humanos especializados na área da saúde, principalmente em nível de Pós-Graduação,
que sejam capacitados para a inovação e pesquisa em saúde. Na maioria das vezes esta
formação se dá por meio de projetos de Cooperação Internacional, como no caso do
Brasil e Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOPs) e da América Latina,
que se beneficiam ainda da colaboração em pesquisa em saúde e troca de experiência
em saúde pública.
Embora fruto da cooperação internacional (CI), esta estratégia faz com que o
foco dos programas esteja centrado nas prioridades locais, permitindo não apenas a
expansão dos cursos de pós-graduação, mas também de pessoal qualificado para
pesquisa em saúde, que podem ser os catalisadores da estruturação e fortalecimento dos
sistemas de saúde de países em desenvolvimento (SAVINO et al., 2008).
Estas ações de Cooperação Internacional se enquadram na concepção de
‘cooperação Sul-Sul estruturante em saúde’ (ALMEIDA et al., 2010), baseada no
conceito de construção de capacidades para o desenvolvimento, que integra a formação
i Brain drain, traduzido para o idioma português como ‘Fuga de capital humano’ ou ‘Fuga de cérebros’, é a emigração de elevado número de profissionais instruídos ou especializados de um país, setor econômico ou área para outro em busca de melhores condições, normalmente devido a fatores relacionados à falta de oportunidades, riscos à saúde e baixa remuneração.
8
de recursos humanos, fortalecimento organizacional e desenvolvimento institucional e
que será abordada neste estudo.
O foco dessa pesquisa é a atuação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) na
formação de Recursos Humanos em Saúde (RHS), em nível de Pós-Graduação, por
meio da cooperação internacional desenvolvida pelo Brasil, especificamente com
Angola, Argentina, Moçambique e Peru, analisando suas características, similaridades,
diferenças, áreas de concentração e resultados parciais atingidos pelas ações até o
momento.
A pesquisa foi dividida em sete partes. O primeiro capítulo traz uma introdução
ao tema, que tem como objetivo fornecer uma visão geral do trabalho, fazer a
caracterização quanto ao objeto escolhido, sua contextualização, objetivos propostos e a
justificativa da pesquisa. O segundo capítulo apresenta as dimensões teóricas que
fundamentam a cooperação internacional, abordando ainda a formação de recursos
humanos, o desenvolvimento da Pós-Graduação no Brasil e o adensamento da CI em
saúde. Traz as considerações de pesquisadores e a atuação do Brasil em relação ao tema
focado. O referencial teórico-metodológico e o desenho do estudo são explicitados no
terceiro capítulo. Um breve histórico da Fiocruz e a contextualização dos países
abordados são objeto do quarto capítulo. O universo de estudo é apresentado na quinta
seção, com detalhamento dos programas pesquisados. O sexto capítulo traz os
resultados encontrados na análise dos programas em questão e busca responder às
perguntas colocadas ao início da dissertação por meio da discussão dos resultados. Os
comentários finais ocupam a sétima seção.
1.1 Justificativa
A atuação do Brasil na Cooperação Internacional vem sendo crescentemente
retratada na academia, na política e pela mídia, reflexo da expansão desta atividade da
qual até meados da década de 70 o país era majoritariamente beneficiário, e que a partir
de então passa a ser também contribuinte.
O Artigo 4º da Constituição Federal de 1988, que trata dos princípios que regem
as relações internacionais da República Federativa do Brasil, estabelece o fundamento
da “cooperação entre os povos para o progresso da humanidade”, sendo a base legal
que sustenta as ações de cooperação técnica do governo Brasileiro (BRASIL, 1988).
Ainda assim, mais de duas décadas depois da promulgação da constituição, o país
9
carece de uma lei que reja a prática da CI, o que muitas vezes dificulta e até mesmo
impede que ações sejam realizadas devido à falta de um marco regulatório.
O relatório da Cooperação Brasileira para o Desenvolvimento Internacional
(COBRADI), publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pela
Agência Brasileira de Cooperação (ABC), apresenta os gastos dos órgãos da
administração pública federal em 2010. O documento evidencia crescimento e a
participação de mais de uma centena de órgãos do governo federal, entre ministérios,
autarquias, fundações e empresas públicas nas áreas de agricultura, educação, ensino
profissionalizante, saúde, meio ambiente, administração pública, transportes, energia,
saneamento, cultura e justiça, na realização da Cooperação Técnica Internacional (CTI)
entre o governo do Brasil e outros países em desenvolvimento. A área da saúde divide,
com a agricultura, educação e ajuda humanitária, a maior parte da aplicação de recursos
da Cooperação Sul-Sul do país (INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA
APLICADA; AGÊNCIA BRASILEIRA DE COOPERAÇÃO, 2010).
A Cooperação horizontal representa uma alternativa ao modelo em que países
ricos do Norte auxiliam os mais pobres do hemisfério Sul, na tradicional Cooperação
Norte-Sul. Esta alternativa propõe vantagens mútuas às nações em desenvolvimento e
emergentes, assim como permite que ganhem papel mais relevante na diplomacia
global em questões econômicas e sociais (BUSS; FAID, 2013). Apesar da Cooperação
Sul-Sul ser prática recorrente entre países em desenvolvimento, o Brasil justifica sua
diferenciação pelo foco em ações sustentáveis em longo prazo e que desenvolvam as
capacidades dos países parceiros.
Documento técnico do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas
(PNUD) traz o conceito de ‘desenvolvimento de capacidades’ como alternativa às
ações de cooperação internacional desenvolvidas por mais de 40 anos que mostraram
resultados decepcionantes quanto ao impacto sustentável, a apropriação nacional e o
uso de tecnologias apropriadas.
A avaliação dos programas de ajuda, termo usado por alguns países e
organismos internacionais como sinônimo de cooperação internacional, revelou os
limites das abordagens de desenvolvimento institucional, incapazes de empoderar
indivíduos e fortalecer organizações. Muitas cooperações ‘tradicionais’, com práticas
definidas pelos doadores, dirigidas a especialistas e direcionadas pelo custo-benefício,
estão dando lugar a abordagens que promovam o controle, conhecimento e participação
locais, além da interação entre os diferentes atores e níveis de programas, grupos e
10
organizações nacionais. Com este enfoque, a cooperação para o desenvolvimento tem
capacidade de promover a sustentabilidade em longo prazo e um ambiente que facilite
o desenvolvimento humano (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O
DESENVOLVIMENTO, 1997).
O PNUD define a construção de capacidades como “o processo pelo qual
indivíduos, organizações, instituições e sociedades desenvolvem habilidades
(individualmente ou coletivamente) para desempenhar funções, solucionar problemas,
estabelecer e alcançar objetivos” (PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DAS
NAÇÕES UNIDAS, 1997, p.2).
O termo “cooperação Sul-Sul estruturante em saúde”, baseado no conceito de
construção de capacidades para o desenvolvimento, é utilizado para qualificar a atuação
brasileira na área. O conceito é inovador, pois busca explorar as capacidades e recursos
endógenos existentes em cada país ao integrar formação de recursos humanos,
fortalecimento organizacional e desenvolvimento institucional, diferindo da tradicional
transferência passiva de conhecimentos e tecnologias (ALMEIDA et al., 2010).
Este conceito de cooperação se alinha aos princípios e práticas recomendadas
pelas Declarações dos Fóruns de Alto Nível sobre Harmonização e sobre a Eficácia da
Ajuda, realizados em Roma, Paris, Acra e Busan na última década.
Esta prática é essencial para o fortalecimento dos sistemas de saúde dos países
parceiros e é ilustrada na Figura 1. Ao mesmo tempo em que busca aprimorar as
capacidades locais, gerar conhecimento e promover o diálogo entre os diversos atores
envolvidos nas ações de cooperação em saúde, tem como fim possibilitar que estes
sejam os protagonistas das mudanças e liderem processos no setor saúde, inclusive
formulando a agenda de desenvolvimento da área (ALMEIDA et al., 2010).
Figura 1 – O conceito de “Cooperação Estruturante em Saúde”: inovações conceituais e
operacionais.
Fonte: ALMEIDA et al., 2010.
11
Este conceito de cooperação completa-se pela combinação entre intervenções e
a promoção de diálogo entre os atores locais, com o intuito de que estes sejam
capacitados a assumir a liderança dos processos setoriais e das agendas políticas locais,
para que as ações de cooperação que buscam o fortalecimento das instituições
estruturantes do sistema possam contribuir para o fortalecimento dos sistemas nacionais
de saúde como um todo (FIOCRUZ, 2013).
Parte considerável dos projetos de cooperação do Brasil na África e América
Latina tem como meta criar ou fortalecer instituições estruturantes do sistema de saúde,
e para isto formam recursos humanos e os capacitam em pesquisa, ensino e serviços. A
Fiocruz, instituição vinculada ao Ministério da Saúde (MS), é a principal agente de
desenvolvimento e execução de cooperação em saúde do governo Brasileiro.
Entre estas ações, a vasta experiência da Escola Nacional de Saúde Pública
Sérgio Arouca (ENSP) e do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), unidades da FIOCRUZ, no
desenvolvimento e condução de programas de formação de RHS e programas de pós-
graduação tradicionais e de mestrado profissional no Brasil, permitiu à Instituição
adquirir qualificação e prática para iniciar a oferta de cursos de pós-graduação na
modalidade mestrado para parceiros internacionais.
Além da escassez e por vezes inexistência de oportunidades de pós-graduação
em temáticas de saúde nos países parceiros, os programas de cooperação realizados
pela Fiocruz são inovadores e têm como diferencial o fato de serem desenvolvidos nos
países de origem dos alunos, a fim de evitar o brain drain em geral ou mesmo a
migração dos egressos para os países ofertantes dos cursos. Ademais, têm como
clientela profissionais que já estão inseridos nos serviços de saúde, diferentemente de
programas tradicionais com concorrência aberta, e exigem o compromisso de que os
egressos permaneçam trabalhando em seus países de origem após a formação.
Nos últimos anos, parte considerável da cooperação Sul-Sul brasileira é voltada
aos países da América do Sul e África de língua Portuguesa, em especial devido ao
papel Brasileiro junto ao Conselho da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e
seu Plano Quinquenal de Saúde 2010–15, e papel no desenvolvimento do Plano
Estratégico de Cooperação em Saúde (PECS) da Comunidade de Países de Língua
Portuguesa (CPLP) (BUSS, 2011).
Buss e Leal (2009) enfatizam a atuação brasileira na diplomacia da saúde, no
contexto da cooperação Sul-Sul, como potência emergente global entre os países de
renda média, com priorização pela política externa brasileira de parceiros que façam
12
parte de blocos regionais em que participa. Os autores destacam “a emergência da
‘saúde global’ e da ‘diplomacia da saúde’ como áreas da política externa e da
cooperação internacional, assim como campo disciplinar e de formação de recursos
humanos” (BUSS e LEAL, 2009, p. 2540).
A Fiocruz foi instituição pioneira no desenvolvimento de programas de
mestrado na África e América Latina, a fim de formar profissionais qualificados que
permanecessem no quadro das instituições de saúde pública de países destas regiões,
por meio de projetos de cooperação apoiados por instituições de fomento, organizações
internacionais e pelo governo Brasileiro. A presente pesquisa surge da necessidade de
se resgatar e investigar o processo de Cooperação Internacional realizado pela Fiocruz
na formação de recursos humanos em saúde em nível de Pós-graduação.
O histórico de oferecimento de programas para formação de RHS pela Fiocruz
em países em desenvolvimento, a parceria com instituições públicas destes países para
tal formação e qualificação em alto nível e o pioneirismo neste tipo de cooperação Sul-
Sul demandaram o resgate desta trajetória. A análise dos processos de negociação e do
percurso da cooperação internacional da Fiocruz nesse âmbito pode trazer lições
aplicáveis a outras realidades semelhantes.
O período de existência dos programas já permite a análise dos históricos de
negociação, das temáticas das dissertações, a continuidade dos programas e desafios
futuros. O público-alvo dos programas são funcionários que trabalham nos institutos
nacionais de saúde ou instituições similares, sendo que os cursos não são abertos a
qualquer interessado, o que os torna, neste aspecto, semelhantes aos programas de
mestrado profissional no Brasil, devendo haver relação com a atuação profissional no
setor público do país. Isto leva a pressupor que estejam sendo formados e qualificados
profissionais que permanecerão nos serviços e que contribuirão para o desenvolvimento
dos sistemas de saúde dos países.
Apesar de serem programas acadêmicos, como os mestrados tradicionais do
Brasil, os projetos guardam grande semelhança com o conceito de mestrado
profissional. Ainda que as regulamentações dos dois tipos de mestrado sejam
semelhantes, o Mestrado Profissional foi institucionalizado mais recentemente, sendo a
diferença fundamental o fato de ser temático, na maioria das vezes por demanda, e
voltado a pessoas que já estejam trabalhando nas áreas específicas do programa. Um
dos escopos desta modalidade é oferecer formação para profissionais que atuam em
13
áreas sensíveis e auxiliar na resolução de problemas enfrentados no cotidiano de
trabalho (CAPES, 1998).
Pressupõe-se que os mestrados estudados não tenham sido assim denominados
devido ao desconhecimento do conceito pelos países parceiros e devido à
regulamentação recente, evitando qualquer tipo de dúvida por parte deles e de entraves
junto à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
órgão regulador dos programas de educação superior no Brasil.
Ainda que trabalhos anteriores sobre temas relacionados tenham sido
desenvolvidos, nenhum focou especificamente a trajetória da atuação internacional da
Fiocruz na formação de RHS com o oferecimento de programas de mestrado.
1.2 Objetivo Geral
Este estudo teve como propósito analisar a trajetória da Cooperação
Internacional da Fiocruz na área de formação de recursos humanos em saúde,
nomeadamente os programas de pós-graduação na modalidade mestrado realizados
com instituições em Angola, Argentina, Moçambique e Peru.
Com essa perspectiva, elaborou-se o problema da pesquisa nos seguintes
termos: Quais são e como se caracterizam as parcerias da Fiocruz, realizadas por
meio de cooperação internacional, na formação de recursos humanos em nível de Pós-
Graduação e quais os resultados alcançados por estas iniciativas?
1.2 Objetivos Específicos
Como objetivos específicos de pesquisa foram estabelecidos:
1. Descrever as ações internacionais da Fiocruz em programas de mestrado nos quatro países;
2. Discutir os antecedentes históricos que permitiram o desenvolvimento dos programas de mestrado realizados pela Fiocruz nos países estudados;
3. Verificar a percentagem de selecionados e o índice de conclusão do curso para inscritos e egressos;
4. Caracterizar o perfil dos atores (egressos dos cursos) quanto à idade, sexo, profissão e vínculo empregatício;
5. Descrever os temas das dissertações defendidas.
14
2. RELAÇÕES INTERNACIONAIS, SAÚDE E EDUCAÇÃO: UM PONTO DE INTERSECÇÃO
A compreensão e análise dos projetos de cooperação brasileira para formação
de recursos humanos qualificados, no âmbito da pós-graduação, demandam o
conhecimento de conceitos nas áreas de relações internacionais, saúde e educação.
Assim, a revisão bibliográfica para esta pesquisa incluiu os temas Formação de
Recursos Humanos em Saúde, Ensino e Avaliação da Pós-Graduação e Cooperação
Internacional em Saúde.
2.1 Formação de Recursos Humanos em Saúde
Depois de algumas décadas afastado das prioridades da cooperação
internacional, o tema dos Recursos Humanos para a Saúde voltou à agenda no início do
século XXI, em especial após a publicação do Relatório Mundial da Saúde (RMS) 2006
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), intitulado ‘Trabalhando juntos pela
saúde’. Antes disso, já no ano 2000, a organização afirmava que os RHS constituem a
mais importante das contribuições do sistema de saúde.
Nas décadas anteriores, medidas neoliberais impostas nos anos 80 e 90
restringiram o gasto público e significaram, em muitos países, a privatização e a
redução do quadro de pessoal dos setores sociais, incluindo a saúde, e afetaram serviços
estatais e privados.
O RMS de 2006 considera como profissionais de saúde todas as pessoas que
tem como dedicação principal ações com a intenção primordial de melhorar a saúde,
faz uma avaliação sobre a crise no mercado de trabalho global da área e traz propostas
ambiciosas para enfrentá-la. Revela uma carência estimada de quase 4,3 milhões de
médicos, parteiras, enfermeiras e trabalhadores de apoio em todo o mundo, com
escassez mais grave nos países mais pobres, especialmente na África subsaariana, onde
os profissionais de saúde são mais necessários. Concentrando-se em todas as fases da
vida profissional dos trabalhadores em saúde, da entrada à formação específica, do
recrutamento à aposentadoria, o relatório traça um plano de ação para a década seguinte
com o intuito de ajudar os países a construir sua força de trabalho na área com o apoio
de parceiros globais (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2006).
15
O ex-Diretor-Geral da OMS, Lee Jong-Wook, resume, na introdução do RMS
2006, os principais problemas enfrentados globalmente na área dos RHS
Há uma escassez crônica de profissionais de saúde bem treinados. A escassez é global, mas mais agudamente sentida nos países que mais necessitam deles. Por uma variedade de razões, tais como a migração, doença ou morte de trabalhadores de saúde, os países são incapazes de educar e sustentar o pessoal de saúde que melhoraria as chances de sobrevivência e o bem-estar das pessoas. As pessoas são um ingrediente vital para o fortalecimento dos sistemas de saúde. Mas é preciso um investimento considerável de tempo e dinheiro para treinar profissionais de saúde. Esse investimento vem tanto das pessoas como de subsídios ou recursos institucionais. Países precisam que sua mão-de-obra qualificada permaneça de modo que sua experiência profissional possa beneficiar a população. Quando os profissionais de saúde partem para trabalhar em outros lugares, há uma perda de esperança e uma perda de anos de investimento (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2006, p. xiii, tradução livre).
O foco da OMS na área de recursos humanos atende à necessidade de buscar
alternativas para o fortalecimento da capacidade técnica e de liderança entre os
profissionais de saúde. Os RHS são afetados por questões como migração, desemprego,
distribuição geográfica, condições de trabalho e incentivos. Embora estas condições
devam receber atenção especial, são por vezes deixadas de lado em detrimento de
interesses políticos e redução de custos. As despesas com remuneração representam
normalmente parte importante dos gastos em saúde na maioria dos países. Além disso,
a mão-de-obra no setor é complexa, envolvendo grupos específicos de profissionais,
com papéis distintos, estruturas de formação e regulação próprias (DAL POZ, 2002).
A área de RHS envolve diversos atores, e na tomada de decisão é preciso
reconhecer e incorporar esta diversidade tanto no âmbito nacional como internacional,
o que inclui as associações de profissionais, conselhos, sindicatos, Organizações Não-
Governamentais (ONGs) e Organismos Internacionais (OIs).
Como exemplo do esforço na área, em setembro de 2007, durante a 27a
Conferência Sanitária Pan-Americana, a Organização Pan Americana da Saúde (OPAS)
ratificou a Resolução CSP27.R7, sobre as ‘metas regionais em matéria de recursos
humanos para a saúde 2007-2015’, que tem por objetivo apoiar o desenvolvimento de
planos de ação nacionais para RHS, para fortalecer a atenção primária e as capacidades
em saúde pública integradas, garantindo acesso a populações e comunidades
subatendidas (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 2007).
Na mesma linha, o braço da OMS na África (WHO AFRO) tem realizado
esforços para ajudar os países na definição de suas políticas de RHS, e adotou na 48ª
Sessão do Comitê Regional da OMS para a África, em 1998, a Estratégia Regional para
16
o Desenvolvimento de Recursos Humanos para a Saúde, na tentativa de criar uma
perspectiva regional no desenvolvimento de RHS. No entanto, com a adoção de
diferentes políticas, estratégias e planos na área por cada país, o Escritório, preocupado
com a lenta implementação da estratégia, publicou em 2006 um documento com
diretrizes para os países da região sobre as políticas e planos de RHS. Direcionado aos
agentes dos Ministérios da Saúde e outros órgãos competentes responsáveis pelo
desenvolvimento das políticas de recursos humanos, o documento fornece orientações
aos países da região para utilização na avaliação e desenvolvimento de análises,
políticas e planos estratégicos sobre a situação dos RHS (WHO REGIONAL OFFICE
FOR AFRICA, 2006).
Apesar destas e de outras iniciativas regionais específicas, os desafios do setor
são complexos e amplos e estão relacionados à deficiência de pessoal, modificações na
composição das equipes e nas habilidades exigidas para o trabalho em saúde,
oportunidades de acesso e desenvolvimento na carreira para as mulheres, incentivos
financeiros e não financeiros que melhorem a motivação e desempenho dos
profissionais, inadequadas condições de trabalho, moradia e educação permanente,
oportunidades de aperfeiçoamento e desenvolvimento profissional, isolamento
profissional, segurança no trabalho, flexibilidade de horários, entre outros (DAL POZ,
2002).
Há grande disparidade na densidade de profissionais de saúde nas diferentes
regiões do globo, entre países e dentro de uma mesma nação. A maior delas é entre os
países da Europa e da África, chegando a 10 vezes em média (ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE, 2006). Alguns dados do capítulo quatro ilustram estas
desigualdades.
Em muitos países faltam informações completas sobre o corpo de trabalhadores.
Isto porque não existem subsídios nas bases de dados internacionais, como da OMS e
Banco Mundial, nem nas do próprio país. Estudo de Fronteira e Dussault (2010) nos
PALOPs evidencia que muitos Ministérios da Saúde têm pouca capacidade instalada
em áreas-chave das ciências da informação, como epidemiologia, demografia,
estatística, tratamento e comunicação de informação. Também relatam a falta ou
inadequada unidade administrativa no Ministério da Saúde responsável pela coleta,
gestão, análise, disseminação e utilização de informação em saúde, incluindo
informação sobre RHS. Estudos nestes países encontraram dificuldade em obter
informações sobre a formação de trabalhadores da saúde, seja por se tratar de área
17
híbrida dos Ministérios da Saúde e da Educação, pela baixa prioridade, ou por haver
sistemas de informação pouco desenvolvidos ou inexistentes, o que dificulta estudos
sobre a previsão de formação de RHS, o planejamento de ações para impulsionar esta
capacidade e a tomada de decisões adequadas sobre a força de trabalho em saúde
(FRONTEIRA; DUSSAULT, 2010).
2.2 Ensino e Avaliação da Pós-Graduação
A partir da emissão do Parecer 977 (BRASIL, 1965) de 1965, pelo Conselho
Federal de Educação, se estabelece um novo nível no ensino brasileiro: a Pós-
Graduação (PG), destinada à formação de pesquisadores e docentes para os cursos
superiores, dividido em dois ciclos sucessivos, equivalentes ao master e doctor, do
modelo norte-americano, sendo este nível de estudos atribuição das universidades e não
de estabelecimentos isolados. Ocorrida durante o regime militar, a implantação da PG
brasileira reflete a opção por uma alternativa avançada de formação, doméstica e de
baixo custo, para a qualificação de professores de universidades federais, então em
expansão. A consolidação da PG brasileira teve apoio norte-americano, via Agência
Norte-Americana de Desenvolvimento Internacional (USAID), inclusive com a adoção
de elementos organizacionais extraídos de universidades de pesquisa naquele país
(HOSTINS, 2006).
A implementação de cursos stricto sensu buscava o “aprofundamento do saber
adquirido no âmbito da graduação, além da oferta de ambiente e de recursos adequados
para a livre investigação científica” (HOSTINS, 2006, p.135).
A pós-graduação pública brasileira é o nível de ensino com melhor avaliação na
educação nacional, fruto de alto investimento feito desde a década de 70, tanto em
infraestrutura quanto na formação e profissionalização dos pesquisadores. Além disso,
resulta da institucionalização de uma cultura de avaliação e de tentativas de
planejamento de seu crescimento e financiamento (FARIA FILHO, 2013).
Dentre os fatores que possibilitaram o desenvolvimento dos cursos de Pós-
Graduação brasileiros estão a regulação e avaliação sistemáticas de seus programas,
levada a cabo pela CAPES, com critérios coerentes para verificar a qualidade dos
cursos, infraestrutura das instituições e produção científica de alunos e docentes.
Além da concessão de bolsas e apreciação dos programas, no final da década de
70 a CAPES se torna responsável pela aprovação dos Planos Nacionais de Pós-
Graduação (PNPGs) que, com cinco edições até os dias atuais, traça as diretrizes da PG
brasileira.
18
A análise dos Planos Básicos de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(PBDCT), que vigoraram de 1973 a 1985, do Plano Nacional de Desenvolvimento
(PND) e PNPGs evidencia a evolução dos objetivos: da integração Indústria-
Universidade a uma maior harmonia entre o planejamento do país e aquele em Ciência
e Tecnologia (C&T).
Ao longo das últimas quatro décadas, o Brasil conquistou importantes avanços
quantitativos e qualitativos em relação aos cursos de pós-graduação, formação de
pessoal e produção científica. Tais resultados são atribuídos ao planejamento
estratégico realizado nas áreas de C&T e educação, de maneira coordenada entre os
Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, por meio da CAPES, CNPq
(Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e FINEP
(Financiadora de Estudos e Projeto), com financiamento do Fundo Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O desenvolvimento dos planos nacionais que culminaram neste avanço permitiu
à Pós-Graduação do país adaptar-se aos novos desafios que surgiram quanto à formação
profissional e na tentativa de minimizar a concentração dos cursos da Região Sudeste
(LEAL, 2008).
Abaixo são sintetizados os conteúdos dos PNPGs, a partir de dados de Hostins
(2006), e Ministério da Educação (1975, 1982, 1986, 2005 e 2010).
PNPG 1975/1979
Elaborado enquanto vigorava o regime militar no país, o primeiro PNPG estava
articulado ao I PND e buscava expandir as universidades federais e consolidar a criação
da PG. O ideal nacionalista de construção de um “Brasil-potência” conduziu o governo
à articulação com dirigentes e representantes da comunidade científica e universitária
para a modernização da universidade e da C&T. Tinha como diretrizes institucionalizar
o sistema de PG, consolidá-la como atividade regular no âmbito das universidades e
garantir financiamento estável, elevar os padrões de desempenho e racionalizar a
utilização de recursos. Planejava a expansão da PG tendo em vista uma estrutura mais
equilibrada entre áreas e regiões do país, evitando disparidades regionais, com destaque
para a capacitação dos docentes das universidades, integração da PG ao sistema
universitário e valorização das ciências básicas. Buscou o rápido aumento dos
19
programas de doutorado e implementou uma consistente política de PG, com a
avaliação pelos pares sob a coordenação da CAPES.
PNPG 1982/1985
Com a extinção do Conselho Nacional de Pós-Graduação, a CAPES ganha
reconhecimento formal como órgão responsável pela formulação do PNPG, assumindo
a responsabilidade pela elaboração do II PNPG e é reconhecida pelo MEC como a
Agência Executiva do Sistema Nacional de C&T. O Plano previa a formação de
recursos humanos qualificados para as atividades docentes, de pesquisa e técnicas,
visando ao atendimento dos setores público e privado, apoio aos programas em sua
infraestrutura, de modo a assegurar-lhes estabilidade e autonomia financeira.
O Plano deu ênfase à qualidade do ensino superior e da PG, com a participação
da comunidade científica, institucionalização e aprimoramento da avaliação. Foi
centrado na expansão da capacitação docente, com a melhoria da qualidade e
ressaltando o desenvolvimento da pesquisa científica e tecnológica.
PNPG 1986/1989
O primeiro Plano da Nova República foi desenvolvido no contexto do início da
onda neoliberal, em que governos na Europa e Estados Unidos estabeleciam políticas
que causavam perdas nas esferas social, política e ideológica. Na América Latina,
universidades enfrentavam as pressões da demanda social, da abertura democrática, das
restrições financeiras e das mudanças ocorridas no ensino superior nos países
desenvolvidos.
O III PNPG, que estava articulado ao III PND, buscava a expansão significativa
da matrícula, diversificação da oferta e das fontes de financiamento. Surgem propostas
de mestrados profissionalizantes, alianças estratégicas entre agências internacionais,
governos e corporações. Destacava o desenvolvimento da pesquisa pela universidade, a
integração da PG ao sistema nacional de C&T e a necessidade de buscar soluções para
os problemas tecnológicos, econômicos e sociais. Almejava a articulação entre as
diversas instâncias governamentais e a comunidade científica, com a ampliação das
relações entre ciência, tecnologia e o setor produtivo.
A busca pela independência econômica, científica e tecnológica para o Brasil no
século seguinte é marcante, acompanhada da ideologia da conquista da autonomia
nacional, o que exigia a formação de RH de alto nível. Trazia tendências de
20
diferenciação de ofertas, multiplicação de funções e tarefas, redefinição das relações
Estado-universidade e universidade-sociedade, com a transição do status da
universidade, de identidade pública (Estado do Bem-Estar) para a identidade mercantil
(Estado empresarial).
PNPG 2005/2010
Após um hiato de 19 anos, em dezembro de 2004, é lançado o quarto PNPG,
referente ao quinquênio 2005-2010, após ampla consulta a interlocutores qualificados
da comunidade científica e acadêmica.
De imediato, é reconhecida a importância da educação para o desenvolvimento
social e econômico, assim como o sucesso da PG brasileira, devido principalmente à
estreita participação da comunidade científica nacional e internacional na sua
construção (LEAL, 2008). O Plano buscava a expansão do sistema, de maneira a
atender as necessidades do país e da sociedade brasileira, continuando o aumento da
produtividade identificado nos anos anteriores.
O Plano previa, entre outras metas, investimento do Estado na consolidação dos
mestrados profissionalizantes, que foram reconhecidos por Portaria da CAPES de 1998,
em movimento para suprir a necessidade de profissionais com perfis de especialização
distintos dos tradicionais, demanda gerada pelas mudanças técnicas e transformações
econômico-sociais então em curso no país, sendo criada a modalidade Mestrado
Profissional (LANDAU, 2008).
O momento era também de um mercado competitivo emergente com
oportunidades educativas inovadoras, novos provedores oferecendo uma educação não
convencional, com diferentes atrativos, entre eles a universidade virtual e a corporativa.
Alguns programas criaram alianças regionais e internacionais e se submeteram a
processos de acreditação internacional para sobreviver nos novos espaços de
competência. Reforçava-se a aferição da qualidade da PG pela qualidade da produção
científica e tecnológica dos grupos de pesquisa e era valorizada a ida, de forma direta,
da Iniciação Científica para o Doutorado, além da interação da PG com o setor
empresarial.
O modelo de PG é flexibilizado a fim de permitir o crescimento do sistema,
com profissionais de perfis diferenciados para atender à dinâmica dos setores
acadêmico e não acadêmico. O Plano prevê a expansão do sistema em quatro vertentes:
a capacitação docente para o Ensino Superior, a qualificação dos professores da
21
Educação Básica, a especialização de profissionais para o mercado de trabalho público
e privado e a formação de técnicos e pesquisadores para empresas públicas e privadas.
Ao mesmo tempo, observa-se que parcela significativa dos mestres egressos
exerce suas atividades profissionais em setores não acadêmicos, o que indica a
necessidade de retornar à flexibilidade prevista no modelo inicial, de modo a
contemplar demandas diferenciadas da sociedade. É incentivada a atuação em rede para
diminuir os desequilíbrios regionais na oferta e desempenho da PG e atender às novas
áreas de conhecimento.
Incentivam-se novos projetos de educação à distância que contenham propostas
inovadoras e substantivas, em áreas estratégicas, capazes de ampliar significativamente
a formação de RH qualificados e sua oferta para diversos setores da sociedade, com
destaque para a formação de PG de docentes do ensino superior e para a educação
básica, em especial.
Estimula-se a cooperação internacional por intermédio das universidades para
institucionalizar o intercâmbio entre alunos e professores. Este é o primeiro PNPG a
contemplar a atividade de cooperação internacional como parte de suas metas, que
naquele momento sugeria as seguintes modalidades de cooperação internacional:
intercâmbio recíproco de alunos e professores em projetos de pesquisa, bolsas-
sanduíche e estágios de curto prazo, compartilhamento na orientação de doutorandos
com pesquisadores atuando no exterior, apoio a estágio de pós-doutoramento para
jovens doutores e estímulo a parcerias e formação de redes de pesquisa na cooperação
Sul-Sul, como suporte à formação de recursos humanos em áreas prioritárias e de
interesse comum.
PNPG 2011/2020
O Plano vigente atualmente tem o desafio de manter os avanços alcançados e
permitir progressos muito maiores, uma vez que o Brasil figura agora como nova
potência emergente, com a perspectiva de se tornar a quinta economia do mundo neste
decênio, o que não virá sem mudanças profundas em segmentos importantes da área
financeira, com reflexos na geopolítica mundial e impactos em diferentes setores da
sociedade, inclusive no sistema educacional. O desenvolvimento econômico e social do
país deverá conduzir à formação de pós-graduados voltados para atividades extra-
acadêmicas.
22
Quanto às avaliações, estas poderão adotar critérios que contemplem
assimetrias, especialmente no caso de mestrados localizados em regiões em estado de
desenvolvimento ainda incipiente. A avaliação dos programas de mestrado deverá
apontar se o programa em questão é acadêmico ou profissional, e os mestrados
profissionais não devem ser considerados nem concebidos como formação aquém da
dos mestrados acadêmicos e devem ser avaliados com a ajuda de parâmetros
específicos dentro do sistema de bolsas. A avaliação dos programas de natureza
aplicada deverá incorporar parâmetros que incentivem a formação de parcerias com o
setor extra-acadêmico, para a geração de tecnologia e formação de profissionais
voltados para o setor empresarial.
A última década teve grande aumento na formação de doutores e da produção
científica no país, incluindo aumento das citações de trabalhos publicados, resultado de
alto investimento no desenvolvimento científico. Elaborado em paralelo ao Plano
Nacional de Educação (PNE), o PNPG atual enfatiza a realização de avaliação do
sistema de PG pelos pares de diferentes áreas do conhecimento, sua natureza
meritocrática, define políticas e estabelece critérios para o financiamento dos
programas, associando reconhecimento e fomento. Destaca-se a relação entre PG e
educação básica como central, e a considera fundamental para o desenvolvimento
social, econômico e tecnológico do país (FARIA FILHO, 2013).
Quanto à cooperação internacional, o Plano identifica o avanço brasileiro no
credenciamento e avalição perante os países latino-americanos, fruto do trabalho de
décadas do CNPq e CAPES, e reafirma o potencial do país em contribuir com os
sistemas de PG dos países vizinhos, em especial quanto à avaliação e acreditação. O
Plano denomina como ‘internacionalização solidária’ a oportunidade que o país tem de
contribuir na PG e pesquisa de países da América Latina e Caribe, garantindo sua
liderança na formação de RH, na geração de novos conhecimentos e com sólida cultura
de inovação (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2010).
Apesar de reconhecer o caráter político da estratégia e seu papel no
desenvolvimento econômico, o Plano recorda a perspectiva solidária desta
internacionalização com os países vizinhos e com os PALOPs, sendo pautada pelo
respeito à diversidade e reciprocidade. No âmbito prático, as ações incluem programas
consorciados com foco em problemas comuns, ou em que um país tenha tido êxito e
que possa contribuir para o avanço do outro.
23
Ainda no âmbito da solidariedade internacional, há mais de três décadas o
Governo brasileiro mantém o Programa de Estudantes-Convênio de Pós-Graduação
(PEC-PG), criado oficialmente em 1981 com o objetivo de dar a possibilidade a
cidadãos oriundos de países em desenvolvimento de realizar estudos de PG no Brasil,
contribuindo para a formação de recursos humanos nestes países. O Programa,
administrado pelo (Ministério das Relações Exteriores) MRE, CAPES e CNPq,
oferece bolsas de estudo para cidadãos de países em desenvolvimento que possuem
acordo de cooperação cultural ou educacional com o Brasil para formação em cursos de
mestrado e doutorado em Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras. Os
beneficiados são contemplados com vaga isenta de pagamento em IES brasileiras
recomendadas pela Capes, bolsa mensal no mesmo valor que a oferecida aos estudantes
brasileiros e passagem aérea de retorno ao país do estudante estrangeiro (MINISTÉRIO
DAS RELAÇÕES EXTERIORES, 2014).
Entre 2000 e 2013 foram selecionados mais de 2.000 estudantes para o
Programa. Em torno de 75% das candidaturas vem de países das Américas, com
destaque para Colômbia, Peru e Argentina, enquanto os países africanos respondem por
cerca de 20% das candidaturas, principalmente de Moçambique, Cabo Verde e Angola.
Atualmente 56 países participam do PEC-PG, sendo 24 na África, 25 nas Américas e
sete na Ásia. Em 2013 foram recebidas 596 candidaturas e concedidas 226 bolsas, 105
para mestrado e 121 para doutorado.
Este breve histórico permite perceber a evolução ocorrida nos diferentes PNPGs
e a ênfase colocada na internacionalização da pós-graduação e da ciência no Brasil ao
longo dos últimos anos. A cooperação internacional na área pode ser entendida também
como sinal de amadurecimento do sistema de PG brasileiro, que atualmente pode
fomentar a criação de programas para público internacional, em parceria com
instituições estruturantes, com o objetivo de que estes parceiros experimentem
evolução semelhante à ocorrida na PG brasileira.
2.3 Cooperação Internacional em Saúde
O surgimento da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID) no
sistema internacional após a Segunda Guerra Mundial não foi fruto apenas de
motivações humanitárias ou éticas, mas consequência de uma conjuntura geopolítica
originada pela divisão bipolar do mundo. Sua existência está relacionada às mudanças
produzidas pelos processos de descolonização, principalmente ao final da década de
24
1970, e de uma configuração mundial onde havia disputa de poder em zonas de
influência pelas duas potências, EUA capitalista, e URSS socialista (AYLLÓN, 2007).
Os conflitos Leste-Oeste e Norte-Sul, os processos de descolonização e a
dinâmica da globalização foram determinantes para o surgimento e adensamento das
relações de cooperação internacional. No entanto, as condições existentes durante a
Guerra Fria fizeram com que a cooperação nascesse com uma relação entre doador e
receptor já de desigualdade, na qual muitas vezes os interesses do doador eram
priorizados em detrimento das verdadeiras necessidades de desenvolvimento do
beneficiário, que alguns autores denominam ‘fabricação de demanda’ (AYLLÓN,
2007; MAGALHÃES, 2009).
Ademais, os recursos destinados por organizações multilaterais, em sua maioria,
eram controlados por países desenvolvidos, e atendiam aos interesses destes, conforme
a balança de poder presente no sistema internacional à época da Guerra Fria.
Em 1955, buscando fugir desta lógica e efetivar acordos de cooperação que
realmente promovessem o avanço social dos povos mais necessitados, muitos países do
hemisfério Sul iniciaram o Movimento dos Não-Alinhados, defendendo a
indispensabilidade do desenvolvimento econômico para se estabelecer um estado de
bem-estar social para as populações daqueles países. Apesar de uma maior
disseminação da cooperação a partir daí, ainda prevalecia a ideia de ajuda ou
assistência internacional, de uma via doadora, como se ações paternalistas fossem
solucionar os problemas dos países receptores (MACIEL, 2009).
As reivindicações dos países do Sul por uma cooperação além da ajuda com
interesses político-estratégicos, que fosse uma troca benéfica para ambos os lados e
atendesse aos interesses mútuos, fez com que a ONU revisse o conceito de assistência
técnica, possibilitando o aprendizado pelas trocas, fosse entre países de igual nível de
desenvolvimento ou não.
Assim, pouco mais de uma década depois de sua criação, em 1959, a
Assembleia Geral da ONU, por sua Resolução 1.383, substituiu o primeiro termo
utilizado, assistência técnica, por cooperação técnica, que melhor representava uma
relação de trocas e interesses mútuos entre as partes.
Na América Latina, na década de 1970, surgiu um novo modelo de CI, que
objetivava a aproximação entre países com nível semelhante de desenvolvimento e foi
denominada Cooperação Horizontal, Sul-Sul, ou Cooperação Técnica entre Países em
25
Desenvolvimento (CTPD), que buscava a transferência de experiências dos países em
desenvolvimento mais avançados para os menos adiantados (GLOSSÁRIO, 2009).
Esta troca de experiências beneficia não somente os países menos
desenvolvidos, mas também aqueles que ‘ajudam’, pois estes adquirem contatos,
experiência e conhecimento. Segundo Amorim (1994), isto se explica porque quando
não há um grande desequilíbrio entre os parceiros, a cooperação “quando efetivamente
baseada em complementaridade de recursos e objetivos similares, surge, assim, como
um elemento importante da própria política nacional de desenvolvimento científico e
tecnológico” (AMORIM, 1994, p.161).
Esta modalidade de cooperação se consolidou em 1978, na Conferência da
ONU sobre CTPD, evento que teve por objetivo aumentar a capacidade dos países
participantes de solucionar seus problemas de crescimento, aumentar a troca de
experiências, o diálogo político e identificar alternativas comuns entre países do
hemisfério Sul. Desta forma, a CTPD foi reconhecida como um instrumento para o
desenvolvimento dos países periféricos, nascida dos problemas sociais e econômicos ali
existentes e visando à união dos esforços na construção de um novo Sistema
Internacional. Entende-se, portanto, a CTPD como uma iniciativa pactuada de comum
acordo entre as duas pontas da cooperação.
Nas últimas décadas do século XX, a emergência de novos líderes globais como
Rússia, Brasil, China e Índia, criou uma oportunidade de recuperação do espírito da
CTPD, já que tais líderes, através de suas experiências vividas, possibilitam uma
cooperação que não é nem de dominação, nem de caridade (GLOSSÁRIO, 2009).
Este adensamento da cooperação, com especial protagonismo dos países
emergentes, trouxe consigo temas da agenda social para a política externa, com ênfase
na saúde, educação e desenvolvimento social.
A Cooperação Internacional na área da Saúde, por sua vez, teve princípio na
década de 1950, quando começou o financiamento de programas para o combate de
doenças específicas, sob o nome de Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD). A AOD
sofreu mudanças após a Guerra Fria, quando o papel da ONU foi questionado e iniciou-
se a Cooperação Internacional conduzida por agências, de maneira descentralizada.
A literatura destaca que a saúde está entre as áreas de maior concentração da
cooperação técnica brasileira, nos âmbitos multilateral e bilateral, principalmente em
áreas em que o país possui experiência e níveis de excelência internacionalmente
reconhecidos (MAGALHÃES, 2009).
26
Por meio de parceria desenvolvida entre o MRE e o MS, o Brasil se tornou
grande difusor da cooperação técnica em saúde, principalmente nos Países em
Desenvolvimento (PED). Um dos fatores que contribui para isso é a experiência de
instituições de excelência em saúde no país, como a Fiocruz, além de programas
nacionais bem sucedidos desenvolvidos pelo MS (AGÊNCIA BRASILEIRA DE
COOPERAÇÃO, 2007).
A área da saúde está entre os setores prioritários para o Governo Brasileiro na
cooperação horizontal, assim como a América do Sul e os PALOP, em especial durante
o Governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que focou em uma política de
solidariedade e de fortalecimento dos laços Brasil-África e Brasil-América do Sul.
Segundo afirmou o Embaixador Marco Cesar Naslausky, Diretor da ABC entre 2001 e
2003, quando questionado sobre os objetivos pré-estabelecidos e as áreas geográficas e
temáticas de atuação prioritárias definidas pela diplomacia brasileira para a CTPD: “No
plano geográfico, a América do Sul, a África (PALOP) e Timor-Leste. No plano
temático eram os campos mais tradicionais de atuação brasileira: agricultura, saúde...”
(IGLESIAS PUENTE, 2010, p.325).
Como ocorre em outras áreas, os foros internacionais especializados em saúde,
como a OMS e a OPAS, por exemplo, fazem recomendações a serem adotadas e
aplicadas pelos países. No entanto, problemas de saúde cada vez mais globais, como a
disseminação de doenças emergentes ou re-emergentes, a necessidade de aumentar e
organizar a ajuda humanitária, a urgência política de compromissos internacionais,
como os ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) e, mais recentemente, os
ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), o acesso de medicamentos e
vacinas, entre outras prioridades, urgem um tipo específico de ação, disciplinada pela
Diplomacia em Saúde. Apesar da ocorrência da ação diplomática na saúde não ser
recente, nas últimas décadas são vistas ações concretas realizadas como efetivação do
discurso ‘anunciativo’ desta política (AGÊNCIA BRASILEIRA DE COOPERAÇÃO,
2007).
As ações internacionais do MS são coordenadas pela Assessoria de Assuntos
Internacionais (AISA) numa tentativa de conciliar as Políticas Nacionais de Saúde e os
interesses da Política Externa, uma vez que, como publicado pela ABC ela
encara a cooperação técnica como um importante instrumento de promoção das relações externas, bem como de apoio ao seu desenvolvimento. É por meio dos programas e projetos de cooperação técnica que o Brasil transfere, não comercialmente, experiências e
27
conhecimentos bem sucedidos e de caráter técnico para outros países. Os projetos de cooperação técnica não preveem a transferência de recursos financeiros, abrangem apenas atividades de consultoria, formação de técnicos e multiplicadores, treinamento e transferência de tecnologia/conhecimento (AGÊNCIA BRASILEIRA DE COOPERAÇÃO, 2007, p.3).
A literatura aponta a importância da participação popular dos beneficiados pela
cooperação na concepção e implementação dos projetos. As agências de cooperação
têm reconhecido, após décadas de assistência paternalista, que é necessário prover a
população com meios para seu desenvolvimento, ao invés de optar pelo simples
assistencialismo em detrimento da transferência de tecnologia e conhecimentos, ainda
que elementares, às populações dos países parceiros (LANDAU, 2008).
Na área da saúde, a cooperação horizontal promovida pelo Brasil nos PALOP
foca áreas consideradas de experiência comprovada do MS do Brasil, incluindo a
formação de RHS. As parcerias com a América do Sul também são prioritárias, uma
vez que fazem parte da Política Externa com a UNASUL. O modelo de cooperação em
saúde do bloco, estabelecido na ‘Agenda de Saúde Sul-Americana’, aprovada em 2009,
visa a fortalecer os sistemas e serviços de saúde e suas instituições estruturantes, e
avançar no desenvolvimento de RHS (ALMEIDA et al., 2010).
3. METODOLOGIA
3.1 Referencial Teórico-Metodológico
Ao lado de outras formas de conhecimento, a ciência busca significados para a
existência individual e coletiva, para os fenômenos físicos, biológicos e sociais. Com
uma linguagem fundamentada em conceitos, técnicas e métodos, a comunidade
científica busca a compreensão do mundo, das relações, dos processos e dos
acontecimentos, com o fim de verificar suas causas, prever os eventos delas resultantes
e verificar a interdependência destes com outros fatos (MINAYO et al., 1994).
Apesar de nenhuma teoria conseguir explicar ou compreender todos os eventos
e processos, segundo Minayo et al. (1994) é este conhecimento anterior que lança luz
sobre questões das pesquisas em andamento, sendo explicações parciais da realidade.
As teorias contribuem para melhor esclarecer o objeto de investigação, auxiliam no
levantamento das questões, do problema, das perguntas e das hipóteses, permitem
maior clareza na organização dos dados e iluminam sua análise.
28
Segundo Minayo et al. (1994), os fundamentos da pesquisa quantitativa nas
ciências sociais são os mesmos princípios utilizados nas ciências da natureza, de que o
mundo social opera de acordo com leis causais, o alicerce da ciência é a observação
sensorial e a realidade consiste em estruturas e instituições identificáveis enquanto
dados brutos (reais) e como crenças e valores (dados subjetivos compreendidos através
dos primeiros).
Enquanto os positivistas defendem a suficiência do método quantitativo para
explicar a realidade social por sua objetividade, capaz de expressar generalizações com
precisão, a Sociologia Compreensiva prega que a tarefa central das ciências sociais é
compreender a realidade humana vivida socialmente, sendo o significado o conceito
central de investigação. Para os pesquisadores que seguem a última corrente, o
importante é compreender e explicar a dinâmica das relações sociais, com suas crenças,
valores, atitudes e hábitos, por meio da compreensão da linguagem, das práticas e das
coisas que resultam da ação humana (MINAYO et al., 1994).
Como crítica ao Positivismo, argumenta-se que é restrito ao que pode ser
observado e quantificado para conhecimento da realidade social. Quanto à Sociologia
Compreensiva, as críticas enfatizam o empirismo e subjetivismo dos pesquisadores,
confusão entre o que é percebido e escutado com a verdade científica, e o envolvimento
emocional do investigador com seu campo de trabalho.
São os procedimentos metodológicos que norteiam o caminho a ser trilhado
pelo pesquisador para alcançar resultados legítimos frente à complexa realidade. Esta
seção apresenta os procedimentos metodológicos adotados nesta dissertação, incluindo
a caracterização da pesquisa, o universo de estudo, a coleta e análise de dados.
3.2 Desenho do Estudo
Para analisar a trajetória da Cooperação Internacional da Fiocruz na área de
formação de recursos humanos em saúde foi realizada pesquisa exploratório-descritiva,
já que o interesse estava voltado para a compreensão de um determinado processo
social, as relações estabelecidas historicamente e ao desenvolvimento dos programas
examinados, busca-se maior conhecimento sobre o tema da pesquisa e há escassez de
estudos acerca do objeto investigado.
29
Ressalta-se que as investigações exploratórias são aquelas que têm como
objetivo explicitar e proporcionar maior entendimento de um determinado problema,
como explicitado por Gil (2008), tais estudos
têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores [...] e habitualmente envolvem levantamento bibliográfico e documental, entrevistas não padronizadas e estudos de caso (GIL, 2008, p. 27).
Já as pesquisas descritivas, são aquelas que “têm como objetivo primordial a
descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o
estabelecimento de relações entre variáveis” (GIL, 2008, p 28).
O caráter exploratório-descritivo aplica-se a esta investigação tendo em vista
que as práticas de cooperação internacional para o desenvolvimento de recursos
humanos em nível de pós-graduação devem ser explicitadas e discutidas para poder
entendê-las e, a partir disso, possibilitar melhorias e/ou modificações.
Entre as estratégias de pesquisa aplicáveis aos estudos qualitativos estão a
pesquisa documental, a pesquisa bibliográfica, o levantamento, a pesquisa diagnóstico,
a pesquisa experimental e a quase experimental, a pesquisa-ação, a pesquisa
etnográfica, a Teoria Fundamentada nos Dados, a pesquisa de avaliação, a proposição
de planos e programas, o discurso do sujeito coletivo, a pesquisa historiográfica e o
estudo de caso (MARTINS; THEÓPHILO, 2007).
Neste trabalho realizou-se um levantamento de dados com pesquisa documental,
pois é um procedimento que se utiliza de métodos e técnicas para a apreensão,
compreensão e análise de documentos de fonte primária. Sendo uma técnica
exploratória, a análise documental também indica problemas que devem ser mais bem
explorados através de outros métodos, servindo para este levantamento inicial sobre o
histórico e desenvolvimento dos programas analisados (SÁ-SILVA; ALMEIDA;
GUINDANI, 2009).
Foi realizada ainda revisão bibliográfica, coleta de dados com estratégia
documental e análise documental para consecução parcial dos objetivos propostos,
tendo sido analisados os projetos de proposição dos programas, relatórios, avaliações,
atas de defesa, atas de reuniões, publicações decorrentes de seminários e outros
documentos disponíveis na Vice-Presidência de Ensino, Informação e Comunicação
(VPEIC) e no Centro de Relações Internacionais (CRIS) da Fiocruz, e na Vice-Direção
de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico (VDPDT) e Vice-Direção de Pós-
Graduação (VDPG) da ENSP. Foram também analisados os perfis dos egressos e
30
títulos das dissertações, de acordo com dados coletados na Secretaria Acadêmica da
ENSP e do no IOC, coordenações dos programas e disponíveis no sistema SIGAii.
Reportagens veiculadas na mídia, nos portais da Fiocruz e de suas Unidades e nas
páginas eletrônicas das instituições parceiras também foram levantadas e analisadas.
Para atender aos objetivos do estudo realizou-se levantamento dos dados
relacionados aos seis cursos analisados, organização e sistematização destes de acordo
com as seguintes informações: número de inscritos, número de selecionados, número
de matriculados, número de egressos, número de turmas iniciadas, número de turmas
concluídas, duração em meses, instituto coordenador na Fiocruz, parceiro internacional
e financiamento.
Em relação aos egressos, os dados obtidos do sistema SIGA foram organizados
de acordo com as seguintes variáveis: idade ao ingressar, sexo, vínculo empregatício
(se funcionário público ou não) e formação universitária.
A última análise agrupou os títulos das dissertações defendidas em 23 temas,
para melhor organização e compreensão destes. O agrupamento foi realizado a partir de
similaridades entre os títulos das dissertações defendidas.
Esclarece-se que este estudo limitou-se a levantar e analisar os dados acessíveis
via Internet, os disponibilizados pelas coordenações dos cursos e pela Instituição.
Optou-se por não realizar entrevistas devido à escassez de tempo para abordar a
multiplicidade de atores envolvidos, alguns de difícil acesso, que não residem no
Brasil, como os coordenadores adjuntos, docentes das instituições de origem dos alunos
e os próprios estudantes. Ressalta-se que algumas limitações podem ser encontradas no
decorrer do trabalho, como a dispersão de dados entre as unidades e instâncias da
Fiocruz e dificuldade no acesso a eles.
Os dados foram organizados e sistematizados em tabelas, apresentadas na seção
Resultados e Discussão.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da ENSP
(Parecer consubstanciado CEP ENSP nº 659.024, de 23 de maio de 2014) como parte
de projeto mais amplo que investiga a política externa brasileira, cooperação
internacional e a atuação da Fiocruz.
ii A Plataforma SIGA é um conjunto de sistemas de gestão acadêmica e administrativa para os cursos de nível técnico, lato e stricto sensu da FIOCRUZ, que visa gerenciar as informações e processos relacionados aos diversos atores envolvidos na condução de cursos desses níveis. A plataforma fornece instrumentos para planejamento, controle, tomada de decisão, avaliação e pesquisa, segundo os interesses específicos de cada ator envolvido com estes níveis.
31
A autorização para utilização dos dados foi concedida em termo de anuência
institucional fornecido pela Vice-Direção de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico
(VDPDT) e Vice-Direção de Pós-Graduação (VDPG) da ENSP, e pela Vice-
Presidência de Ensino, Informação e Comunicação (VPEIC) da Fiocruz.
4. ANTECEDENTES HISTÓRICOS: A FIOCRUZ E OS PAÍSES ESTUDADOS
Esta Seção apresenta um breve histórico da atuação internacional da Fiocruz e
das unidades envolvidas nas ações pesquisadas, além de uma necessária
contextualização dos países abordados neste estudo.
4.1 A atuação Internacional da Fiocruz
Uma das condições que habilita o Brasil a difundir a cooperação internacional
em saúde é a experiência de instituições de excelência em saúde no país, como a
Fiocruz, além de programas nacionais bem sucedidos desenvolvidos pelo MS,
instituições de ensino e pesquisa.
A Fundação, vinculada ao MS, nasceu no início do século XX como Instituto
Soroterápico Federal, com o objetivo de fabricar soros e vacinas, mas Oswaldo Cruz,
então diretor técnico, não quis que fosse esta uma Instituição meramente destinada à
fabricação de soros e vacinas, e tinha a intenção de torná-la um centro de investigação
científica original que fundamentasse atividades aplicadas. Chamado posteriormente de
Instituto de Manguinhos em algumas publicações, em 1908 tem o nome alterado para
Instituto Oswaldo Cruz.
Mais de cem anos depois o Instituto evoluiu, expandiu e consolidou-se como
referência nacional e internacional em ciência, tecnologia e saúde, tendo atualmente
como missão
produzir, disseminar e compartilhar conhecimentos e tecnologias voltados para o fortalecimento e a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS) e que contribuam para a promoção da saúde e da qualidade de vida da população brasileira, para a redução das desigualdades sociais e para a dinâmica nacional de inovação, tendo a defesa do direito à saúde e da cidadania ampla como valores centrais. (FIOCRUZ, 2014a)
Em 1970 passou a chamar-se se Fundação Instituto Oswaldo Cruz, adotando a
sigla Fiocruz, e em 1974 recebeu a atual designação de Fundação Oswaldo Cruz. É
atualmente considerada uma das mais importantes instituições brasileiras de pesquisa
32
na área da saúde, executando no presente mais de mil projetos de investigação e
desenvolvimento tecnológico em diversas áreas, que produzem conhecimento para o
controle de doenças, em saúde coletiva e temas relacionados. Todas as unidades
técnico-científicas mantêm cursos de Pós-Graduação stricto sensu, totalizando 32
programas em dez áreas de avaliação da CAPES, o que a torna a “principal instituição
não-universitária de formação e qualificação de recursos humanos para o SUS e para a
área de ciência e tecnologia em saúde no Brasil”. Oferece ainda cursos de pós-
graduação lato sensu (especialização, aperfeiçoamento, atualização e residência) e de
educação profissional (FIOCRUZ, 2014b).
Com sua vocação internacional, a instituição é protagonista na cooperação em
saúde, papel que tem crescido e ganhado evidência com a ascensão do Brasil no cenário
mundial, possibilitando atuação diversificada e com impactos significativos na área.
Por ser a principal agente da diplomacia da saúde brasileira, atua no produto das
negociações de política externa do país e participa de colaboração em âmbito bilateral
com diversos países, tanto na cooperação Norte-Sul, que envolve nações e instituições
mais desenvolvidas, quanto no eixo Sul-Sul, como é o caso dos países que fazem parte
desta pesquisa.
Quanto à atuação internacional, em 1984, foi criada a Assessoria de Cooperação
Internacional da Fiocruz (ACI), ligada à presidência, que tratava dos registros de
convênios internacionais, autorizações de afastamento do país por servidores e
recebimento de visitantes na instituição. Com o intuito de proporcionar uma atuação
mais proativa e menos administrativa, o I Congresso Interno, realizado em 1988,
propôs mudanças na área, ampliadas em 1994 no II Congresso Interno, que discutiu
uma participação mais ativa da Fundação em ações Norte-Sul e Sul-Sul com outros
países e instituições (BRANDÃO, 2009).
No mesmo ano foi aprovado o fortalecimento da ACI como Coordenação de
Cooperação Internacional, que tinha por objetivo
coordenar a cooperação internacional da Fiocruz em relação à demanda, oferta e captação de recursos; formulação, administração, monitoramento e avaliação de acordos, protocolos e projetos; transferência de recursos e conhecimentos; e à organização da participação institucional em fóruns e seminários internacionais (BRANDÃO, 2009, p.21).
Mais de duas décadas após a criação da ACI, em 2009, instituiu-se o Centro de
Relações Internacionais em Saúde (CRIS), que adiciona algumas atividades àquelas já
previstas nas funções da ACI, como componentes de relações internacionais e
33
diplomacia da saúde, o apoio à cooperação internacional das vice-presidências e das
unidades técnicas da instituição. Além disso, o CRIS tem importante papel no apoio ao
gerenciamento, implementação das estratégias e coordenação das atividades
institucionais na cooperação internacional da Fiocruz, mantendo estreita interação com
a Assessoria Internacional do MS e articulação com a Agência Brasileira de
Cooperação (FIOCRUZ, 2013).
O relatório de 2012 do CRIS destaca a abordagem de cooperação estruturante
adotada pela Fiocruz, que “trata de romper com o modelo tradicional, passivo e
unidirecional de transferência de conhecimento e tecnologia, procurando priorizar o
aproveitamento da capacidade e recursos endógenos dos países parceiros” (FIOCRUZ,
2013, p.6). Além do aspecto executivo e gerencial, no campo da diplomacia da saúde o
CRIS participa de maneira efetiva de representações do Brasil em instâncias de
organismos multilaterais, como a OPAS, OMS e UNASUL (BRANDÃO, 2009;
FIOCRUZ, 2014c).
A recente priorização da saúde na política externa brasileira voltou os holofotes
para a Fiocruz, considerada instituição-chave na cooperação internacional em saúde do
governo brasileiro. Ela é a executora de grande parte dos projetos realizados pelo Brasil
na África e América Latina, em especial aqueles que têm como meta criar ou fortalecer
instituições estruturantes do sistema de saúde, o que inclui formar recursos humanos e
os capacitar em pesquisa, ensino e serviços.
A cooperação Fiocruz-África existe desde a década de 90, mas intensificou-se a
partir de 2007, em especial com a CPLP. Assim, num esforço para aperfeiçoar a
proposição, promoção, coordenação e gestão dos projetos e programas na África, uma
das prioridades da política externa brasileira no âmbito da cooperação Sul-Sul, a
Fiocruz criou em 2008 um escritório regional de representação em Maputo,
Moçambique (BRANDÃO, 2009; FIOCRUZ, 2013).
As ações da Fiocruz no âmbito da cooperação internacional alinham-se à
estratégia e projetos priorizados pelo Brasil na prática de sua política. Assim, a
Instituição tem atuado junto às organizações interestatais das quais o Brasil é membro,
além de seguir as orientações de seu Plano Quadrienal 2011/2014, que prioriza a
atuação na África e América do Sul (FIOCRUZ, 2013).
A Fiocruz teve importante colaboração na elaboração do Plano Quinquenal da
UNASUL-Saúde (2010-2015) e nos Planos Estratégicos de Cooperação em Saúde
(PECS) da CPLP, que buscam, entre outros objetivos, apoiar o fortalecimento dos
34
sistemas de saúde dos países da Comunidade com a criação ou modernização de suas
instituições estruturantes. Nos dois Planos constam metas relacionadas às ações
desenvolvidas nos programas de mestrado objeto desta pesquisa. No PECS consta o
desenvolvimento da força de trabalho em saúde, vigilância epidemiológica e da
situação de saúde, investigação, informação e comunicação em saúde, enquanto no
UNASUL-Saúde o desenvolvimento e gestão de recursos humanos e de sistemas de
saúde universais e a vigilância em saúde são parte da agenda.
As unidades da Fiocruz que foram responsáveis por executar os cursos de
formação em nível de PG abordados, ENSP e IOC, também possuem histórico de
interação e atuação internacional. O IOC foi a primeira unidade do que hoje configura-
se como Fiocruz, criado em 1900 como o próprio Instituto Soroterápico Federal para
produzir soro e vacina contra a peste bubônica que ameaçava a então Capital Federal.
Referido por algum tempo como Instituto de Manguinhos, por localizar-se na Fazenda
de Manguinhos, em 1907, a instituição foi rebatizada como Instituto de Patologia
Experimental, e, em 1908, como Instituto Oswaldo Cruz, em reconhecimento à
premiação obtida no ano anterior pelo Brasil, através do Instituto, com a medalha de
ouro do Congresso Internacional de Higiene e Demografia em Berlim. Tal premiação
atraiu renomados cientistas estrangeiros para longos períodos nos laboratórios do
Instituto, que colaboraram em diversos estudos e ajudaram a suscitar sua vocação
internacional (SILVA, 2013).
O Instituto diversificou suas ações durante a trajetória secular e hoje tem ampla
gama de atividades, gerando conhecimento, produtos e serviços na área biomédica,
atuando nas áreas de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação. Oferece cursos
técnicos e na PG tem programas lato sensu e stricto sensu (INSTITUTO OSWALDO
CRUZ, 2014).
Além dos acordos de cooperação internacional mantidos pelos Programas de
PG do Instituto com instituições de ensino e pesquisa de vários países para a troca de
experiências e conhecimento, apoio a pesquisas, desenvolvimento tecnológico e
capacitação de recursos humanos, o IOC tem sido parte ativa na cooperação Sul-Sul
realizada pela Fiocruz. Em 2007 foi firmada parceria do Instituto, com envolvimento de
três de seus Programas de PG - Biologia Celular e Molecular, Biologia Parasitária e
Medicina Tropical -, para a criação de dois cursos de mestrado internacionais, um na
Argentina, em Biologia Celular e Molecular, e outro em Moçambique, o Mestrado em
Ciências da Saúde. Tais iniciativas deram ao Instituto uma dimensão internacional
35
formal, com disciplinas ministradas nos países parceiros, alunos orientados por
pesquisadores do IOC com co-orientação no país de origem e realização de estágio nos
laboratórios brasileiros para desenvolvimento parcial das dissertações (ARAÚJO-
JORGE; BARBOSA; OLIVEIRA, 2012).
A ENSP, por sua vez, foi criada em 1954, em um contexto de instabilidade
política, como a primeira escola brasileira de saúde pública de abrangência nacional,
destinada a formar profissionais para a área. Seu efetivo funcionamento, com definição
de finalidade, estrutura, regulamento e regimento, começou apenas em 1958, e no ano
seguinte foram ministrados os primeiros cursos, com corpo docente formado
principalmente por profissionais vinculados ao quadro de outras instâncias também
ligadas ao MS, o que trouxe importantes subsídios para a definição das atividades
necessárias à formação em saúde pública (FONSECA, 2004).
Muitos dos pesquisadores da Escola tiveram grande participação em atividades
internacionais em organizações como a OPAS e OMS, trazendo consigo ideias e
aspirações para ações além das fronteiras. Na década de 80 foram estreitados os laços
com órgãos de financiamento e agências internacionais, o que permitiu a existência de
fundos para projetos de pesquisa e apoio à preparação e aperfeiçoamento de
profissionais de saúde dos PALOPs. Além das ações específicas hoje realizadas para a
formação de recursos humanos de países parceiros, destaca-se o ingresso de estudantes
do exterior, principalmente de países latino-americanos e africanos, nos programas de
Pós-Graduação stricto sensu da ENSP, que já ocorre há mais de três décadas. Segundo
Pereira Neto (2004), entre 1977 e 2000, de um total de 523 egressos, 42 estrangeiros
obtiveram o título de mestre na ENSP, dos quais muitos latino-americanos e africanos.
Ainda na vertente Sul-Sul, a Escola realiza hoje ações de cooperação técnico-científica
com países em desenvolvimento da América Latina, Caribe e África, tendo
responsabilidade pela coordenação dos mestrados em Saúde Pública, com Angola e
com o Peru, em Epidemiologia em Saúde Pública, com a Argentina, e em Sistemas de
Saúde, com Moçambique.
Estas unidades da Fiocruz têm sido acionadas pela Presidência e Vice-
Presidência de Ensino, Informação e Comunicação (VPEIC) da Instituição para tais
coordenações, sendo os cursos resultado do fortalecimento da política que tem
integrado o MRE e o MS na cooperação com países de regiões prioritárias para a
política externa brasileira.
36
4.2 Diferentes países, diferentes realidades
Por se tratar de estudo que envolve quatro países em dois continentes, todos
com características, história e realidades distintas, apresenta-se a seguir algumas
informações e dados comparáveis entre eles, com o intuito de esclarecer
particularidades e prover subsídios para a análise dos cursos estudados. Para fins de
comparação, sempre que possível foram também inseridos dados e índices brasileiros.
Embora não tenham o idioma em comum, Argentina e Peru são, dentre os
países estudados, aqueles que guardam maior semelhança com o Brasil. Entre estas
afinidades estão a localização na América do Sul, a independência dos colonizadores na
primeira metade do século XIX, são democracias estabilizadas e têm economias
consolidadas, apesar das dificuldades de crescimento após a crise econômica mundial
de 2008.
Já os países que dividem o mesmo idioma com o Brasil possuem mais
diferenças em relação a ele, tiveram sua independência apenas na segunda metade do
século XX, passaram por guerras civis pós-independência e, apesar do bom
crescimento econômico anual, ainda enfrentam níveis extremos de desigualdade e
pobreza, em especial entre a população urbana e rural. Em Angola, 36,6% da população
vive abaixo da linha de pobreza, e 54,7% em Moçambique (BANCO MUNDIAL,
2014).
Angola, como país que saiu do conflito armado apenas em 2002, apesar de
alguns intervalos desde sua independência em 1975, enfrenta inúmeros desafios quanto
à infraestrutura, serviços e recursos humanos em saúde (FERREIRA et al., 2014). Em
Moçambique a realidade não é muito diferente. Em 1977, dois anos após a
independência de Portugal, teve início a Guerra Civil Moçambicana, que terminou
apenas em 1992, com a realização em 1994 das primeiras eleições multipartidárias do
país. Devido aos graves problemas de saúde enfrentados pelo país, Gilio e Freitas
(2008) evidenciam a dependência da ajuda externa enfrentada pelo setor saúde no país,
reportando
um grande número de ONG's internacionais que apoiam diversos setores da saúde, algumas assumem medidas de resolução momentânea, como a vinda de profissionais da saúde de outros países para atender à falta de pessoal, e outras adquirem o papel de ajuda no desenvolvimento das unidades sanitárias através de medidas administrativas, financeiras e pedagógicas (GILIO; FREITAS, 2008, p. 100).
37
As inúmeras dificuldades destes dois países, como a independência recente,
ocorrência de guerras civis e demais problemas históricos, econômicos e sociais torna
mais difícil o acúmulo de meios e experiência suficientes para promover a melhoria das
condições de saúde de suas populações.
A Tabela 1 apresenta dados demográficos e econômicos que permitem uma
breve comparação entre os países.
Tabela 1: Dados demográficos e econômicos selecionados de Angola, Argentina, Brasil, Moçambique e Peru
País Idioma oficial
Indepen-dência
Território(km2)
População PIB per
capita 2013 (USD)
Crescimento do PIB 2013
(%) Angola Português 1975 1.246.700 21.471.618 5.668 4,1
Argentina Espanhol 1816 2.780.400 41.446.246 14.760 3,0
Brasil Português 1822 8.515.767 200.361.925 11.208 2,5
Moçambique Português 1975 801.590 25.833.752 593 7,1
Peru Espanhol 1821 1.285.220 30.375.603 6.660 5,8
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Banco Mundial, FMI e páginas eletrônicas oficias dos países
(BANCO MUNDIAL, 2014). A análise da Tabela 1 mostra que em alguns índices, como PIB per capita, o
Brasil apresenta valor menor que a Argentina, e quanto ao crescimento percentual do
PIB o país teve, em 2013, elevação menor que os outros países estudados.
A Tabela 2, por sua vez, apresenta o Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH)iii, como maneira de oferecer uma medida de progresso mais homogênea, de
amplo uso e equacionada a partir de três dimensões - renda, saúde e educação – que
proporcionam, como o próprio nome diz, um retrato mais realista quanto ao
desenvolvimento humano das populações em questão, e não meramente econômico.
iii O Índice de Desenvolvimento Humano oferece um contraponto ao Produto Interno Bruto (PIB) per capita, muitas vezes utilizado como indicador e que considera apenas a dimensão econômica do desenvolvimento. O IDH, por sua vez, é uma medida geral do desenvolvimento humano. No entanto, apesar de ampliar a perspectiva sobre o desenvolvimento humano, o IDH não abrange todos os aspectos do desenvolvimento, deixando de fora variáveis como democracia, participação, equidade e sustentabilidade (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2014).
38
Tabela 2: Índice de Desenvolvimento Humano de Angola, Argentina, Brasil, Moçambique e Peru
País Posição no
IDH Global IDH 2013 Classificação
Angola 149º 0,526 Baixo Desenvolvimento Humano Argentina 49º 0,808 Muito Alto Desenvolvimento Humano
Brasil 79º 0,744 Alto Desenvolvimento Humano Moçambique 178º 0,393 Baixo Desenvolvimento Humano
Peru 82º 0,737 Alto Desenvolvimento Humano
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Relatório de Desenvolvimento Humano, 2014.
Evidencia-se que, de acordo com o IDH, os países sul-americanos analisados
possuem muito alto ou alto desenvolvimento humano, diferentemente dos africanos,
classificados como de baixo desenvolvimento humano. O Brasil (79º) encontra-se entre
Argentina (49º) e Peru (82º) nesta classificação, ao passo que Angola e Moçambique
estão em posições bem inferiores.
Quanto aos recursos humanos para a saúde, a Tabela 3 apresenta a densidade de
trabalhadores da saúde por 1000 habitantes, a partir de dados coletados junto ao
Repositório de Dados do Observatório de Saúde Global da OMS (WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2014). Apesar de diferenças entre a atualização dos dados
disponibilizados pelos países e de algumas categorias de dados não estarem disponíveis
para todos os anos selecionados, é possível observar que o Brasil é o país com maior
densidade para todas as categorias de profissionais para as quais apresenta dados,
exceto médicos e outros trabalhadores da saúde, que tem a Argentina (3,155 em 2004)
com maior densidade. Ressalta-se, no entanto, que os dados argentinos (1998 e 2004)
estão defasados em relação aos dados brasileiros (2004, 2008 e 2013).
Ainda em relação à densidade de médicos, com valor menor que Argentina e
Brasil (1,891 em 2013), estão Peru (1,132 em 2012), Angola (0,166 em 2009) e
Moçambique (0,040 em 2012). O mesmo não ocorre quanto ao número de enfermeiras
e parteiras, para o qual a ordem decrescente é Brasil (7,601 em 2013), Angola (1,660
em 2009), Peru (1,514 em 2012), Argentina (0,481 em 2004) e Moçambique (0,412 em
2012).
De modo geral, o Brasil encontra-se em primeiro lugar em relação à densidade
da maioria dos trabalhadores, enquanto a Argentina ocupa a segunda posição também
por mais vezes. Com exceção dos ‘trabalhadores em gestão e suporte da saúde’, o Peru
ocupa sempre a terceira posição, sendo que curiosamente no caso desta categoria,
definida como “pessoas que ajudam no funcionamento do sistema de saúde, mas não
prestam serviços de saúde diretamente à população” (DAL POZ et al., 2007, p.3), o
39
Peru tem uma densidade bastante elevada (3,496 em 2012), o que sugere um alto grau
de burocratização do sistema de saúde.
Com exceção dos ‘trabalhadores da saúde em laboratórios’, em que está na
terceira posição, Moçambique é o país analisado com menor densidade de recursos
humanos em saúde em todas as categorias.
Tabela 3: Densidade de trabalhadores da saúde por 1000 habitantes em Angola, Argentina, Brasil, Moçambique e Peru
País Ano Médicos Enfer-meiras
/parteiras
Odontó-logos
Farma-cêuticos
Trabalha-dores da saúde em
laboratório
Outros trabalh-adores
da saúde
Trabalha-dores em gestão e
suporte da saúde
Angola 2004 0,830 1,313 0,016 0,065 0,144 0,018 0,018 2009 0,166 1,660 0,305
Argentina 1998 3,009 0,802 0,799 0,423 2004 3,155 0,481 0,916 0,502 0,505 2,046
Brasil 2004 1,616 3,798 0,985 0,153 2008 1,764 6,419 1,172 0,537 1,109 2013 1,891 7,601
Moçambique 2004 0,027 0,322 0,008 0,032 0,049 0,086 0,495 2008 0,026 0,341 0,039 0,032 0,127 0,016 2012 0,040 0,412 0,057 0,058 0,014
Peru 2009 0,920 1,271 0,120 0,061 0,038 0,748 2,899 2012 1,132 1,514 0,150 0,051 0,051 0,721 3,496
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Global Health Observatory Data Repository – WHO, 2014.
A Figura 2 mostra que, dos países com os quais a Fiocruz firmou parceria para a
formação de RHS em nível de Pós-Graduação, apenas a Argentina não possui
deficiência crítica de prestadores de serviços de saúde.
Figura 2: Países com carência crítica de prestadores de serviços de saúde
(médicos, enfermeiros e parteiras)
Fonte: Organização Mundial da Saúde, RMS 2006, p. XX.
40
Em todos os países há a combinação da oferta de serviços públicos e privados
de saúde, mas com parcela importante dos gastos em saúde pelo setor públicoiv. Quanto
ao gasto anual per capita em saúdev, o Brasil é o país com maior gasto, seguido por
Argentina, Peru, Angola e Moçambique. Acerca da esperança de vida ao nascer, a
Argentina tem o maior índice, com um ano a mais que o Peru e dois que o Brasil,
enquanto os países africanos têm expectativas mais baixas. A discrepância entre as
taxas para os países americanos e africanos deve-se à epidemia de Aids que nas últimas
décadas vem causando a morte de jovens e adultos e reduziu a esperança de vida ao
nascer em grande parte da África. A Tabela 4 ilustra estes indicadores (BANCO
MUNDIAL, 2014).
Tabela 4: Gasto anual per capita em saúde, gasto em saúde pelo setor público e esperança de vida ao nascer em Angola, Argentina, Brasil, Moçambique e Peru
País
Gasto anual per
capita em saúde (USD)
Gasto em saúde pelo setor público (% do gasto total
em saúde)
Esperança de vida ao nascer (anos)
Angola 190,00 62,2 51 Argentina 995,00 69,2 76
Brasil 1056,00 46,4 74 Moçambique 37,00 44,3 50
Peru 337,00 58,9 75
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Relatório de Desenvolvimento Humano e do Banco Mundial, (BANCO MUNDIAL, 2014).
Nos países africanos em questão, apesar dos altos níveis de crescimento
econômico, Angola com 4,1% ao ano e Moçambique 7,1%, ainda persiste a alta
incidência de pobreza. No entanto, índices como a taxa de mortalidade infantil, infanto-
juvenil e de mortalidade materna melhoraram nos últimos 10 anos em Moçambique,
com crescimento da esperança de vida ao nascer (INSTITUTO NACIONAL DE
SAÚDE, 2009; UNITED NATIONS, 2014). O mesmo não ocorre em Angola, que
mantém elevadas taxas de mortalidades infantil e materna, mesmo se comparado a
países em situação econômica semelhante na África (ESCOLA NACIONAL DE
SAÚDE PÚBLICA SÉRGIO AROUCA, 2012b).
iv De acordo com o Banco Mundial, “o gasto público em saúde compreende o gasto regular e de orçamento proveniente de fundos públicos (centrais e locais), o endividamento externo e as doações (inclusive as doações de organismos internacionais e de organizações não-governamentais) e os fundos de seguro de saúde sociais ou obrigatórios (BANCO MUNDIAL, 2014, tradução própria). v Definido pelo Banco Mundial como “a soma dos gastos em saúde públicos e privados, como proporção da população total. Abrange a prestação de serviços de saúde (preventivos e curativos), as atividades de planejamento familiar, de nutrição e a assistência de emergência, excluindo o abastecimento de água e serviços sanitários” (BANCO MUNDIAL, 2014, tradução própria).
41
Além dos problemas de carência de recursos humanos para a saúde e
dependência de financiamento externo para a manutenção dos serviços de saúde,
Angola e Moçambique enfrentam a fragmentação e verticalização das intervenções
sanitárias e contexto epidemiológico nacional heterogéneo, tendo que lidar, ao mesmo
tempo, com o peso das doenças infecciosas e das crônicas. Como afirmam Fronteira e
Dussault (2010)
apesar das diferenças significativas existentes entre os PALOP, no que diz respeito aos indicadores sócio demográficos, epidemiológicos, administrativos e econômicos, existem problemas comuns a todos eles. [...] inclui o corpo de trabalhadores, a educação, a distribuição geográfica, as condições de trabalho e desempenho, as políticas e a gestão e o financiamento (FRONTEIRA e DUSSAULT, 2010, p.83).
Entre outros problemas, “persistem situações de disparidades demográficas
devido a grandes deslocamentos populacionais, sérios problemas de educação,
saneamento básico e infraestrutura, além de inadequação na gestão do sistema e dos
serviços de saúde” (AGÊNCIA BRASILEIRA DE COOPERAÇÃO, 2007, p.4). Estes
fatores os tornam dependentes de assessoria especializada de outras nações, além da
utilização de pessoal com formação elementar ou técnica em cargos que demandam
recursos humanos de nível superior especializado para uma melhor assistência.
5. AÇÕES INTERNACIONAIS DA FIOCRUZ EM PROGRAMAS DE MESTRADO INTERNACIONAIS Esta Seção apresenta as características, informações coletadas e dados sobre o
oferecimento dos seis cursos de Pós-Graduação desenvolvidos pela Fiocruz em parceria
com instituições em Angola, Argentina, Moçambique e Peru.
Os programas em questão são o mestrado em Saúde Pública, coordenado pela
ENSP/Fiocruz e pelo Ministério da Saúde de Angola, o mestrado em Ciências da
Saúde, coordenado pelo IOC/Fiocruz e pelo Instituto Nacional de Saúde (INS) de
Moçambique, o mestrado em Sistemas de Saúde, coordenado pela ENSP/Fiocruz, pelo
INS pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM) em Moçambique, o mestrado em
Biologia Celular e Molecular, coordenado pelo IOC/Fiocruz e pela Administração
Nacional de Laboratórios e Institutos de Saúde ‘Dr. Carlos G. Malbran’ (ANLIS) da
Argentina, o mestrado em Epidemiologia em Saúde Pública, coordenado pela
ENSP/Fiocruz e pela ANLIS da Argentina e o mestrado em Saúde Pública, coordenado
pela ENSP/Fiocruz e pelo Instituto Nacional de Saúde do Peru.
42
Quanto à qualidade dos cursos, destaca-se que os programas que coordenaram
as iniciativas são avaliados pela CAPES como ‘muito bom’ (5) e ‘excelente’ (6) e
equivalente a ‘alto padrão internacional’ (7), já que os dois programas da ENSP
possuem nota seis e dos três programas do IOC envolvidos o de Biologia Celular e
Molecular e de Biologia Parasitária possuem conceito sete e o de Medicina Tropical,
cinco.
O programa realizado com Angola teve uma turma concluída e não se repetiu. O
mestrado em Biologia Celular e Molecular com a Argentina encontra-se na segunda
turma, a parceria em Epidemiologia em Saúde Pública no mesmo país concluiu a
primeira turma e não se repetiu. Em Moçambique, o mestrado em Ciências da Saúde
encontra-se atualmente na quarta turma e o de Sistemas de Saúde na primeira. O
mestrado no Peru concluiu a primeira turma em 2014.
Alguns dos programas são multidisciplinares, ou seja, admitem candidatos de
diversas áreas de conhecimento, não se limitando à área de ciências biomédicas, com
exceção dos mestrados em Biologia Celular e Molecular e em Ciências da Saúde.
Todos os processos de seleção obedeceram às exigências regulamentares da CAPES,
com publicação de edital que demandava competência em leitura e compreensão da
língua inglesa para textos no âmbito de saúde pública. Alguns processos seletivos
incluíram exame de língua inglesa, que poderia ser eliminatório ou classificatório,
provas eliminatórias em temas e bibliografia previamente informados no edital e
entrevista dos candidatos com uma banca de doutores credenciados. Algumas seleções
incluíram ainda avaliação de currículo e carta de intenções.
O Quadro 1 apresenta um resumo dos cursos estudados.
País Curso Coordenação na Fiocruz Coordenação estrangeira
Angola Mestrado em Saúde Pública
ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio
Arouca Ministério da Saúde, Angola
Argentina
Mestrado em Biologia Celular
e Molecular
IOC - Instituto Oswaldo Cruz
Administração Nacional de Laboratórios e Institutos de Saúde (ANLIS), Argentina
Mestrado em Epidemiologia
em Saúde Pública
ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio
Arouca
Administração Nacional de Laboratórios e Institutos de Saúde (ANLIS), Argentina
Moçambique
Mestrado em Ciências da
Saúde
IOC - Instituto Oswaldo Cruz
Instituto Nacional de Saúde, Moçambique (INS/Moz)
Mestrado em Sistemas de
Saúde
ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio
Arouca e CPqAM - Centro
Instituto Nacional de Saúde (INS) e Universidade
Eduardo Mondlane (UEM)
43
de Pesquisas Aggeu Magalhães
Peru Mestrado em Saúde Pública
ENSP – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio
Arouca
Instituto Nacional de Saúde, Peru (INS/Peru)
Quadro 1: Universo de estudo
Fonte: elaborado pela autora, 2014.
5.1 Mestrado em Saúde Pública – Angola
O curso de Mestrado em Saúde Pública representou a primeira experiência
internacional de apoio à formação stricto sensu da Pós-Graduação brasileira fora do
país. Assim, as instituições governamentais careciam de prática para viabilizar este tipo
de cooperação, que criou desafios a serem enfrentados pela coordenação e corpo
docente e discente do curso. Esta vanguarda gerou um know-how que capacitou a ação
brasileira no apoio ao desenvolvimento científico e de investigação em saúde nos países
parceiros.
O curso surgiu por demanda do Ministério da Saúde de Angola, que buscava
consolidar a capacidade institucional de seu sistema de saúde por meio da capacitação
de quadros estratégicos que iriam compor a futura Escola Nacional de Saúde Pública de
Angola (ENSPA), buscando com isso contribuir para o aprimoramento e
desenvolvimento do Sistema de Saúde do país em um contexto de democratização e
reconstrução nacional pós-guerra civil. Assim, o objetivo do curso foi formar
pesquisadores e docentes numa perspectiva interdisciplinar e multiprofissional. O curso
buscava ainda contribuir para o aprimoramento e desenvolvimento do Sistema de
Saúde, qualificar os profissionais para a análise, planejamento, desenvolvimento e a
avaliação de políticas de saúde, no contexto epidemiológico e social do país (ESCOLA
NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA SÉRGIO AROUCA, 2012b).
O mestrado, cuja proposta inicial surgiu em 2006, depois de algumas missões e
visitas técnicas em anos anteriores ao país, foi realizado no âmbito de um projeto de
cooperação técnica do governo Brasileiro com os PALOPs. O programa inseriu-se na
proposta mais ampla de um Projeto de Cooperação Brasil-Angola, firmado em 2007
com o Ministério da Saúde Angolano, que incluía a implantação de uma biblioteca de
saúde, uma Escola de Saúde Pública e outros projetos relacionados, sendo a formação
de recursos humanos em Saúde Pública fundamental e estratégica para o
desenvolvimento do país. Os elementos estruturantes desta cooperação, qual sejam o
44
apoio à implantação da ENSPA e ampliação da sustentabilidade dos demais projetos de
ensino técnico e de nível superior, possuem componentes de pesquisa e formação em
saúde pública que possibilitam uma capacitação comprometida com a transformação
das práticas, para além de uma mera reprodução (AGÊNCIA BRASILEIRA DE
COOPERAÇÃO, 2008).
A base legal que possibilitou as atividades foi a existência de um Acordo de
Cooperação Econômica, Científica e Técnica entre o Governo da República Federativa
do Brasil e o Governo da República Popular de Angola, assinado em 11 de junho de
1980 e promulgado em 05 de outubro de 1990. Para implantação do projeto de
Capacitação do Sistema de Saúde de Angola foi firmado um Ajuste Complementar a
este Acordo em julho de 2007, intitulado "Formação de docentes em Saúde Pública em
Angola". O curso foi financiado pela CAPES e pela ABC/MRE, com gestão dos
recursos realizada pela VPEIC/Fiocruz, e o Governo de Angola arcou com o transporte
interno dos docentes e coordenação durante os módulos e orientações no país.
De natureza multiprofissional, o programa exigiu que os candidatos, com
diploma de nível superior, fizessem parte dos quadros públicos de saúde do país, como
o Ministério de Saúde e suas dependências, a Universidade Agostinho Neto (UAN) e as
direções provinciais de saúde. Uma das metas do curso era proporcionar uma
articulação entre o MS/Angola e a UAN, para fomentar a continuidade de iniciativas
educacionais entre eles. Inicialmente foi previsto o oferecimento de 25 vagas, sendo 20
para Angola e cinco para Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e
Príncipe. Em caso de não preenchimento das cinco vagas dos outros países dos
PALOPs, estas seriam revertidas para Angola, como ocorreu, inclusive com expansão
para 30 matriculados após a seleção realizada no primeiro semestre de 2007.
Iniciadas em maio de 2007, as aulas foram ministradas em Angola, nas
instalações do Instituto Superior de Enfermagem da UAN, espaço que seria
posteriormente ocupado pela ENSPA. O planejamento do curso incluía o oferecimento
de disciplinas da área da saúde pública ministradas em períodos concentrados com duas
semanas de duração. Apesar de ter sido previsto e desenvolvido ambiente para a
Comunidade Virtual de Aprendizagem do curso, com o intuito de introduzir as
ferramentas de ensino à distância, sua utilização foi bastante limitada. Isto ocorreu
devido às dificuldades de acesso à internet pelos docentes e alunos, além da
inexistência de laboratório de informática nas instalações onde as aulas foram
ministradas, dificultando ainda mais o desenvolvimento de propostas pedagógicas que
45
utilizassem esta ferramenta. Esta situação prejudicou o progresso das atividades à
distância, tanto para o acompanhamento dos alunos como para a orientação na fase de
confecção das dissertações.
Os alunos não foram liberados de seus compromissos de trabalho para se
dedicarem integralmente ao curso, no entanto, desde o início o projeto previu no
cronograma a estada dos alunos na Fiocruz no Brasil por um período de 04 meses para
terminarem as dissertações com os orientadores. O financiamento deste período não foi
definido previamente. Ao final do primeiro ano os alunos deveriam realizar a
qualificação dos projetos de dissertação em Luanda.
Diferentes adversidades ocasionaram atraso e demandaram o replanejamento e
prolongamento do curso, entre elas dificuldades de acesso à internet pelos docentes e
discentes, condições problemáticas do local onde as aulas eram ministradas, com
frequente falta de energia e água, inexistência ou precariedade dos aparelhos de ar-
condicionado. O desempenho insuficiente dos alunos em disciplinas, problemas com
transporte e alojamento dos docentes em Luanda também foram reportados, além da
necessidade dos docentes levarem do Brasil fotocópias da bibliografia, pela falta de
estrutura para realizá-las em Angola. Para contornar questões como acesso à
bibliografia disponível na Internet, o ICICT/Fiocruz enviou acervo bibliográfico físico
a Angola, já que o Portal CAPES de periódicos só é acessível a partir de computadores
no Brasil, o que impossibilitou a consulta pelos estudantes do Programa a partir dos
países de origem. Para dar suporte à revisão bibliográfica dos projetos e auxiliar na
instrução sobre o acompanhamento de atividades à distância, necessário nas etapas
subsequentes, a coordenação facilitou a ida de uma bibliotecária da ENSP que levou
também um conjunto de material para a bibliografia inacessível online in loco.
A realização de eleições nacionais em 2008 em Angola, os contratempos
enfrentados, o ineditismo da iniciativa e os aprendizados da jornada demandaram a
revisão do cronograma e do escopo das atividades, o que exigiu a readequação do
projeto pedagógico original. Em maio de 2008 foi proposta à ABC uma revisão do
Projeto, realizada em conjunto com o Ministério da Saúde de Angola, com o intuito de
tornar a iniciativa mais efetiva e atingir os objetivos inicialmente propostos, uma vez
que a formação de recursos humanos em saúde pública é fundamental e estratégica para
o desenvolvimento do país. Também foi necessária a renegociação do financiamento
junto à ABC e CAPES.
46
Desta maneira, houve um período de interrupção e novas negociações foram
necessárias para a retomada do projeto, com missões realizadas pela Fiocruz em
Luanda em fevereiro de 2009 e julho de 2010, tendo o curso sido paralisado por mais
de um ano.
Após o intervalo, na retomada em 2010, com nova coordenação, foram
programadas aulas de recuperação de conteúdos em Angola para atender a um grande
número de alunos com pendências nas disciplinas e a realização de seminários de
metodologias de pesquisa qualitativa e quantitativa para apoiar os projetos de
dissertação.
A coordenação e o Colegiado do Curso definiram então estratégias e prazos
para a finalização do curso, e decidiram pelo desligamento de alunos que não ofereciam
condições de elaboração do projeto e da dissertação.
O grupo foi dividido entre os já habilitados para trabalhar nos projetos para que
pudessem realizar os exames de qualificação e os que necessitavam de
acompanhamento mais atento dos orientadores, com a definição de estratégias para
enfrentamento de possíveis dificuldades para a conclusão e defesa.
Foram realizados dois seminários para acompanhamento do desenvolvimento
dos projetos e aprofundamento metodológico presenciais no Brasil, com leituras
dirigidas e reuniões de orientação, o que também permitiu participação intensiva dos
orientadores e que os alunos frequentassem disciplinas na ENSP.
As qualificações e defesas, que estavam previstas para ocorrer em Luanda
foram realizadas na ENSP. No ano de 2010 foram qualificados 13 alunos e um
defendeu a dissertação, e em 2011 ocorreram oito defesas no 1º semestre de 2011 e sete
no segundo semestre de 2011, totalizando 15 alunos que completaram o curso e foram
titulados pela ENSP/Fiocruz. O ajuste complementar firmado entre os governos de
Brasil e Angola continha termo que garantia que o diploma expedido pela Fiocruz aos
concluintes do curso tivesse o mesmo valor legal de um diploma expedido por
instituições angolanas. Os 15 alunos desligados receberam declaração de conclusão das
disciplinas em que foram aprovados. Em maio de 2012 foi realizado o I Seminário
Brasil-Angola de Saúde Pública, com apresentação de pôsteres com os resultados das
15 dissertações defendidas.
Em avaliação final, as principais dificuldades observadas pela coordenação do
curso referem-se à infraestrutura em Luanda, em especial relativo à água, luz e
hospedagem, o processo político em Angola com a realização de eleições em 2008 e o
47
compromisso do Governo local com o curso. As diferenças acadêmicas, com cultura
oral predominante em Angola e cultura acadêmica no Brasil, também foram relatadas,
assim como a quase inexistência de CEPs em Angola, que apenas recentemente estão
sendo instalados, além da dificuldade de cadastro dos projetos no CEP/ENSP. Pensar
outras estratégias para a seleção dos alunos também foi apontado como necessário.
Alguns desdobramentos observados após a finalização do curso é a publicação
de um artigo e a continuação de um dos egressos para programa de doutoramento em
Portugal. Outros formados estão assumindo atividades de docência em universidades
angolanas e são considerados, em avaliação da coordenação, aptos a assumirem novas
responsabilidades, seja em termos de docência em saúde pública, em pesquisa ou
cargos no Ministério da Saúde que envolvam contribuições para a reconstrução do
sistema de saúde.
5.2 Mestrado em Biologia Celular e Molecular – Argentina
O projeto do Mestrado em Biologia Celular e Molecular (BCM), área de
concentração Imunobiológicos, surgiu em 2006, por demanda argentina ao MRE, com a
proposta de haver uma troca de tecnologias. Em workshop realizado na Fiocruz, foram
criados grupos de trabalho para estudo de parcerias em projetos colaborativos
interinstitucionais nas áreas de pesquisa e ensino.
Um protocolo de colaboração para implantação de dois cursos de mestrado na
ANLIS, que reúne laboratórios que fabricam vacinas, desenvolvem kits de diagnóstico
e realizam pesquisa básica, foi pensado. Os cursos seriam este descrito e um em
Epidemiologia em Saúde Pública, que ficaria sob responsabilidade da ENSP, ao passo
que este seria coordenado pelo IOC com parceria do Instituto de Tecnologia em
Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), unidade da Fiocruz orientada para a pesquisa e
produção de imunobiológicos e produtos de diagnósticos.
O curso foi pensado nos moldes de um mestrado profissional já existente em
Bio-Manguinhos, no entanto, visita posterior de pesquisadores do Instituto à sede da
ANLIS mostrou que não existiam condições de infraestrutura para um programa com
essas características. Desta forma, no primeiro semestre de 2007, após um período de
aparente latência, a direção da ANLIS solicitou à Fiocruz a retomada das negociações
visando à implementação de convênio para um mestrado. Em novembro do mesmo ano
48
uma delegação de pesquisadores do IOC foi à Buenos Aires e propôs a redefinição do
formato do mestrado, dando-lhe um caráter acadêmico, com o objetivo de apoiar a
qualificação básica e aplicada de recursos humanos em áreas relevantes da produção de
imunobiológicos, diagnóstico imunológico e molecular, e novas ferramentas em
biologia estrutural, bioinformática, genômica e proteômica. O curso contou com
financiamento da OPAS por meio do Programa de Cooperação Internacional em Saúde
(TC-41) vi.
Em fevereiro de 2008 foi realizado workshop para finalizar os detalhes da
implantação dos dois cursos de mestrado com a ANLIS, sendo que o processo de
seleção do curso de BCM ocorreu entre os meses de março e julho do mesmo ano. Em
agosto foi ministrado curso de epidemiologia e bioestatística para nivelamento e as
disciplinas, as mesmas que estão disponíveis para os alunos brasileiros que fazem o
curso regular na Fiocruz, começaram a ser ministradas em setembro.
As aulas foram dadas em Buenos Aires por professores do IOC, com aulas
discursivas, discussões de artigos científicos, apresentação de seminários e aulas
práticas. Após as avaliações, alguns estudantes com rendimento aquém do necessário
repetiram as disciplinas equivalentes no Rio de Janeiro, durante seus estágios de
aprimoramento técnico-cientifico realizados em laboratórios de pesquisadores do IOC
na Fiocruz, em períodos que variaram de 1 a 3 meses. Docentes do IOC foram os
orientadores brasileiros da dissertação de mestrado, com co-orientação de
pesquisadores da ANLIS. Os projetos estavam vinculados às linhas de pesquisa e
produção em que os alunos estavam associados na ANLIS.
Por conta da epidemia de gripe A (H1N1) ocorrida em 2009, o programa do
curso teve que ser temporariamente interrompido, com posterior oferecimento de duas
disciplinas que haviam sido suspensas em 2010, concluindo assim as atividades de
formação e capacitação teórico-práticas.
vi “41º Termo de Cooperação e Assistência Técnica ao Ajuste Complementar celebrado entre o MS, a Fiocruz e a OPAS. Os TC são projetos que definem resultados, indicadores e ações a serem executadas de forma alinhada às prioridades da OPAS e aos objetivos estratégicos do país. Essas ações visam contribuir para a superação dos desafios e para o fortalecimento e aperfeiçoamento do Sistema Único de Saúde, além de consolidar iniciativas governamentais na esfera da cooperação Sul-Sul. O Programa de Cooperação Internacional em Saúde visa promover o desenvolvimento de conhecimentos e o intercâmbio de experiências e tecnologias para enfrentar os problemas de saúde que representam prioridades ou interesses comuns entre o Brasil e outros países membros da OPAS/OMS, com prioridade para América do Sul e África lusófona, apontando para o desenvolvimento solidário em torno das Metas de Desenvolvimento do Milênio. Suas prioridades estão alinhadas com a Estratégia de Cooperação Técnica da OPAS/OMS com o Brasil para o período 2008-2012” (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 2014).
49
Os resultados obtidos durante as disciplinas mostraram que os alunos tinham
formação básica sólida coerente com o padrão de ensino na Argentina, mas que tinham
defasagem de conhecimento em temas relevantes para a missão institucional da ANLIS.
A posterior análise das avaliações pela coordenação mostrou que os alunos tiveram
melhora significativa de conteúdo teórico aplicado às áreas específicas. Os egressos
foram diplomados pelo Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular
do IOC.
Apesar do bom andamento do programa, foram encontrados desafios comuns a
ações inovadoras e com formato bilateral, como a comunicação entre os alunos
Argentinos e orientadores Brasileiros, apesar do avanço tecnológico e ferramentas
existentes. Problemas de natureza logística também foram reportados, em especial
quanto ao estágio dos alunos no Brasil, por dificuldades de alojamento em locais que
fossem viáveis quanto ao custo e que facilitassem o acesso dos estudantes por
transporte público.
A escassez de pesquisadores doutores na ANLIS que pudessem exercer o papel
de co-orientadores também foi relatada entre as dificuldades e aspectos críticos, assim
como mudanças no corpo de co-orientadores tanto brasileiros como argentinos, a
interrupção das atividades dos docentes brasileiros devido ao surto epidêmico de Gripe
A e mudanças no cronograma devido a problemas logísticos. O tempo de permanência
dos alunos na Fiocruz também foi considerado extremamente reduzido para as
atividades necessárias.
De maneira geral, o resultado foi considerado favorável, com o objetivo de
capacitação dos alunos atingido e indicadores de que o programa foi bem sucedido.
Apesar da avaliação positiva dos envolvidos e intenção de manutenção do convênio,
com perspectiva de laços duradouros de cooperação científica e desenvolvimento de
produtos e processos na área de imunobiológicos e diagnóstico, com aplicação direta
em saúde pública, mudanças na diretoria da ANLIS deixaram em suspenso a
continuidade do programa, que teve apenas uma turma titulada.
5.3 Mestrado em Epidemiologia em Saúde Pública – Argentina
O histórico da criação do Mestrado em Epidemiologia em Saúde Pública é
semelhante ao acima relatado, se insere nas atividades do convênio entre a Fiocruz e a
50
ANLIS e também foi financiado pela OPAS, por meio do Programa de Cooperação
Internacional em Saúde (TC-41), e pela ABC.
Coordenado pelo Programa de PG em Epidemiologia em Saúde Publica da
ENSP, o curso teve como objetivo formar mestres com concentração em Epidemiologia
Geral. O programa, de natureza multiprofissional, ofereceu 20 vagas, 15 destinadas a
pessoal da ANLIS e cinco a profissionais pertencentes a instituições de saúde pública,
com alunos de diversas províncias argentinas e não apenas da capital. Após curso de
nivelamento em matemática o curso teve início em outubro de 2008.
O formato do curso foi presencial com estrutura modular, de modo que os
professores da ENSP ministraram aulas em Buenos Aires, com disciplinas de
aproximadamente 45 a 60 horas. Foi previsto estágio dos alunos por dois períodos de
três semanas na Fiocruz para realização da pesquisa.
Para o desenvolvimento da dissertação os alunos tiveram um orientador do
Programa e um co-orientador, com título de doutor, ou colaborador, sem título de
doutor, em Buenos Aires, indicados pela ANLIS. A defesa das dissertações ocorreu na
sede da ANLIS, exceto em casos especiais acordados, quando foram realizadas na
ENSP, e com a presença de ao menos um membro argentino. As últimas defesas
ocorreram em maio de 2011.
As qualificações da primeira turma ocorreram em Buenos Aires, já as da
segunda turma foram planejadas para ocorrer na Fiocruz.
O fato de o curso congregar alunos de diferentes províncias permitiu um
impacto maior, pois a massa crítica formada atingiu outras regiões além da capital,
potencializando os efeitos desta formação.
Como avaliação geral, considerou-se que o mestrado foi uma oportunidade para
aumentar o conhecimento, compartilhá-lo entre o grupo e transferi-lo às equipes de
trabalho. A qualidade acadêmica e do corpo docente foi reconhecida pelos egressos,
assim como a disponibilidade para conduzir e concretizar os trabalhos. A realização dos
seminários foi considerada fundamental, pois permitiram o trabalho individual dos
alunos com orientadores e significaram um tempo de dedicação mais pessoal. A
diversidade temática e metodológica dos trabalhos foi ressaltada.
Uma das dificuldades reportadas pela coordenação para a execução do curso foi
o idioma, pois alguns professores que não tinham conhecimento básico de espanhol
ministraram as aulas em português. Ademais, os docentes apontaram dificuldades
frequentes na comunicação entre alunos e orientadores, com baixa adesão aos prazos e
51
perda de contato com alguma frequência, o que com a distância e pouco contato
presencial prejudicou o desenvolvimento do trabalho. Alguns orientadores não
desempenharam seus papéis adequadamente e tiveram que ser substituídos. A
intensidade de carga horária das disciplinas, as dificuldades logísticas para a estadia dos
alunos no Brasil, o apoio acadêmico e de infraestrutura em Buenos Aires e a adequação
das disciplinas junto à secretaria acadêmica foram mais dificuldades relatadas.
Como sugestões de melhoria foram indicadas a inclusão de novas disciplinas, a
inserção de mais conteúdos de saúde pública, avaliação de programas, determinantes
sociais e análise de sobrevivência. O uso de ferramentas de ensino à distância, fóruns e
videoconferências também foi sugerido.
Quanto à parte argentina, foi demandado maior apoio institucional, que deveria
refletir na liberação dos alunos para participar adequadamente do mestrado. Sugeriu-se
que novas turmas envolvam três programas de PG da Fiocruz com forte conteúdo em
epidemiologia, Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas e Saúde da Criança e da
Mulher, além do que já coordenou esta turma e que manteria a coordenação do curso,
de forma a partilhar disciplinas e orientações, com titulação conferida pelo programa do
orientador principal. Também foi proposta a ampliação da colaboração com
universidades argentinas, mantendo a coordenação do ANLIS, embora a discussão
desse ponto não tenha avançado para propostas concretas.
Como encerramento da turma os alunos prepararam pôsteres para divulgação
dos trabalhos, que foram apresentados para representantes e autoridades do Ministério
da Saúde argentino.
Como perspectivas futuras há a possibilidade de investigações conjuntas,
estruturação de uma rede de intercâmbio entre os egressos, a possiblidade de alguns
seguirem para o doutorado e a continuidade da cooperação na realização de uma
segunda turma do curso que teve início em maio de 2013.
5.4 Mestrado em Ciências da Saúde – Moçambique
O mestrado em Ciências da Saúde coordenado pelo IOC é parte do Projeto de
Fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde de Moçambique, firmado em 2007
como ajuste complementar ao Acordo Geral de Cooperação entre o Governo da
República Federativa do Brasil e o Governo da República de Moçambique, datado de
52
setembro de 1981. Além de formar mestres para atuar no ensino e na pesquisa em
Moçambique, o Projeto teve como objetivo apoiar a reestruturação da rede de
bibliotecas em saúde no país e a elaboração do planejamento estratégico do INS.
A demanda do Governo moçambicano acerca do curso surgiu em 2006, resultou
na estruturação de um grupo de trabalho na Fiocruz e na Redação e envio de um projeto
ao INS em janeiro de 2007. Em julho do mesmo ano foi realizada reunião no INS para
discutir o pré-projeto do curso e definir o calendário de trabalho, sendo que a primeira
turma teve início em março de 2008. O curso, que se insere no âmbito da cooperação
técnica do Governo Brasileiro com os PALOPs, busca formar pesquisadores e docentes
em Moçambique, numa perspectiva interdisciplinar e multiprofissional, com ênfase em
diagnóstico molecular e imunopatogenia de doenças infecciosas. A formação de
mestres dentre os funcionários do INS tem como meta apoiar a criação de capacidades
de pesquisa em saúde no país, contribuindo na busca de soluções para os problemas de
saúde pública e para o aprimoramento e desenvolvimento de seu Sistema de Saúde.
O público elegível é formado por funcionários do Ministério da Saúde
licenciados em áreas das ciências biomédicas, com idade máxima de 45 anos e dando
preferência para aqueles com tempo mínimo de serviço de dois anos. Os selecionados
comprometem-se a trabalhar para o Sistema Nacional de Saúde por um período de
cinco anos após o termino do mestrado, devem estar ligados a uma área de serviço de
laboratório ou investigação científica e ter parecer favorável do local de trabalho para
realização do curso. Os alunos são liberados de suas atribuições para dedicar-se ao
curso em período integral.
O programa funciona como um consórcio dos Programas de PG do IOC, sendo
que cada aluno possui um orientador brasileiro e um co-orientador moçambicano, como
esforço para fomentar a parceria entre pesquisadores dos dois países. O convênio prevê
a vinda dos alunos ao Brasil para um período de 2 a 3 meses de estágio, para
desenvolvimento técnico-acadêmico e para finalizar a dissertação. Durante as
disciplinas, professores brasileiros ministram aulas em Maputo, juntamente com
professores moçambicanos. As aulas da primeira turma foram realizadas no Centro
Regional de Desenvolvimento Sanitário e, por questões de infraestrutura, como falta de
luz e dificuldade de acesso à internet e a artigos fundamentais para a elaboração da
dissertação, a partir da segunda as aulas foram ministradas no INS e no Instituto de
Ciências da Saúde de Maputo. A intenção é que haja cada vez mais docentes
moçambicanos, meta que por vezes esbarra na baixa quantidade de doutores no país.
53
As bancas de qualificação dos projetos e as defesas de dissertação ocorrem em
Maputo, com participação de membros moçambicanos. Os egressos são titulados pelo
IOC.
Além de exemplares de livros que haviam sido doados pela Fiocruz, a direção
do INS se empenhou na compra de novos livros, possibilitando aos alunos consultarem
obras relevantes em diversos temas.
Este é, dentre os cursos estudados, o que tem estrutura mais consolidada, uma
vez que já formou duas turmas e tem outras duas em andamento. A partir da terceira
turma foram oferecidas vagas para pessoal da área clínica. A primeira turma foi
financiada pela ABC/MRE e pela CAPES, a terceira pela OPAS e a quarta ainda tem
financiamento indefinido, sendo por ora assumido pela Fiocruz.
Segundo avaliação pela coordenação da primeira turma, o grande
comprometimento de docentes e alunos e a realização do curso em Maputo foram
fundamentais para o bom andamento e evitaram a evasão. Foi enfatizada a qualidade
das dissertações defendidas, mesmo com dificuldades na orientação causadas pelas
barreiras geográficas que ainda são grandes, apesar da existência das tecnologias de
informação e comunicação.
Quanto aos desafios logísticos, foi destacado o exaustivo deslocamento dos
docentes do Brasil a Maputo, a manutenção do financiamento e o tempo de
permanência do docente no exterior. Foi relatada a dificuldade de alojamento de boa
qualidade próximo à Fiocruz para o período dos alunos no Brasil, curto tempo de
estágio e demora de liberação da bolsa pela Capes, quando existente.
Os egressos consideraram que a experiência do estágio no Brasil foi
fundamental para a interação com outros pesquisadores, as aulas em Maputo foram
importantes e a finalização destas em seis meses permitiu o aumento do tempo para o
estágio e para desenvolvimento do projeto de dissertação. Também destacaram o
aproveitamento dos recursos existentes no próprio país para desenvolver o projeto de
pesquisa. Como aspectos negativos relatados pelos alunos estão a demora de mais de
um mês para obtenção do visto de entrada no Brasil; o atraso na aquisição de reagentes
pelo INS, o que dificultou o andamento da pesquisa; baixa participação dos docentes
moçambicanos e inexistência de conteúdo para que os alunos aprendessem a elaborar
propostas de pesquisa para financiamento. Sobre a viagem ao Brasil, sugeriram que se
realizada em grupo melhoraria a relação custo-benefício.
54
Apesar das ponderações, considerou-se que os problemas operacionais podem
ser melhorados e que esse tipo de cooperação, por ser novo, precisa de maior
estruturação.
A avaliação geral do programa é positiva, com expectativa de que este tipo de
cooperação vá além de um programa de PG, podendo se transformar em uma iniciativa
importante de intercâmbio científico com benefícios para ambos os países. Desta
forma, é possível que haja um efeito multiplicador no retorno dos alunos aos
laboratórios de trabalho, permitindo que induzam um impacto positivo na produção de
conhecimento em Moçambique. O fato das vagas terem sido estendidas a outras
instituições que conformam o sistema de saúde do país, para além do INS, expandiu a
possiblidade de impacto na qualidade dos serviços de saúde.
Segundo o coordenador moçambicano da iniciativa, a realização deste mestrado
é uma das atividades prioritárias do Plano Estratégico do INS, e sua continuação é de
importância crítica para a estruturação do Instituto e do sistema de saúde do país. De
acordo com ele, com os profissionais titulados pela primeira turma quase duplicou o
número de mestres no quadro do INS. Graduados da primeira turma passaram a ocupar
posições de liderança em áreas de intervenção biomédica do INS.
Evidência do bom desenvolvimento do curso é o fato de ter sido realizada, em
2014, a seleção para a primeira turma do doutorado.
5.5 Mestrado em Sistemas de Saúde – Moçambique
Diferentemente dos outros programas estudados, pela primeira vez tem-se uma
cooperação triangular, uma vez que o mestrado em Sistemas de Saúde, iniciado no ano
de 2014, conta com a participação de diferentes parceiros institucionais, quais sejam a
ENSP e o CpqAM (Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães) pela Fiocruz, o INS e a
Universidade Eduardo Mondlane (UEM) em Moçambique, e financiamento do
International Development Research Centre (IDRC), do Canadá. O INS recebeu
financiamento da instituição canadense em projeto que tem como objetivo fortalecer
estruturalmente a capacidade de pesquisa em sistemas de saúde em Moçambique,
através de programas educacionais de curto e longo prazo, pesquisa associada,
prioritariamente com pessoal do INS, que foi responsável pela execução financeira do
projeto.
55
A ENSP valeu-se da experiência anterior com o INS Peru, no mestrado em
Saúde Pública, para utilizar o modelo desenvolvido naquela ocasião, com disciplinas
modulares, que após ajustes foram desenhadas para atender à demanda do projeto em
questão e centrar-se fundamentalmente na discussão do sistema de saúde. Ao contatar a
Fiocruz para esta parceria, a demanda do Ministério da Saúde de Moçambique
(MISAU) centrava-se na preparação de pessoal próprio para atuar no Sistema Nacional
de Saúde (SNS) do país, com o intuito de melhorar a atenção à saúde da população, de
acordo com suas necessidades.
Como nos outros programas, os requisitos acadêmicos regulamentares foram de
responsabilidade da Fiocruz, com atribuição da condução do ensino à ENSP e ao
CPqAM. Igualmente, havia uma coordenação local em Moçambique, atuando
conjuntamente com a coordenação da Fiocruz, e pessoal administrativo local dedicado
ao programa (CENTRO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FIOCRUZ, 2013).
Por definição do INS, o conteúdo do Edital incorporou requisitos
regulamentares da Pós-Graduação em Moçambique. Na perspectiva de estimular os
profissionais do SNS a se candidatarem à seleção, o INS promoveu e divulgou o
lançamento do mestrado antes da chamada e seleção de candidatos. Quanto aos
critérios de elegibilidade, os candidatos deveriam ter pelo menos dois anos de serviço
no SNS, idade inferior a 45 anos, assinar termo de compromisso de honra de que
trabalhariam para o SNS por pelo menos cinco anos após conclusão dos estudos, sob
pena de ação legal e multa de até 10 vezes o custo do mestrado em caso de
descumprimento, avaliação favorável no serviço e permissão de licença para
continuação dos estudos em tempo integral. Quanto à formação, permitiu-se graduação
em diversas áreas de conhecimento, como sociologia, antropologia, psicologia e áreas
afins, ou seja, não limitada às ciências biomédicas, desde que os interessados atuassem
no SNS.
A banca de seleção dos candidatos incluiu três professores da Fiocruz, um
membro do INS e doutores moçambicanos da área acadêmica. As pontuações dadas às
habilidades e competências do curriculum vitae do candidato foram previamente
padronizadas pela comissão de seleção.
No caso desta cooperação, os fundos disponíveis permitiam a seleção de 10 a 12
mestrandos, sendo que candidatos adicionais poderiam ser incluídos desde que
custeados por outras fontes. Destaca-se que a lista de aprovados contava com 14
selecionados. Candidatos excluídos em função dos resultados do processo seletivo, mas
56
cuja frequência a alguns módulos/disciplinas foi considerada de importância estratégica
para o desempenho de suas funções no SNS, poderiam ser autorizados a frequentar
módulos/disciplinas de interesse, como uma opção de formação continuada.
Diferentemente da maioria dos programas de Pós-Graduação convencionais,
neste estabeleceu-se que a titulação no Mestrado seria feita pela unidade da Fiocruz em
que o orientador principal brasileiro de cada mestrando estivesse credenciado (ENSP
ou CPqAM). As dissertações poderiam adotar o modelo habitual ou de dissertação-
artigo, em que o resultado deveria compor um todo coerente em relação ao objeto da
dissertação. Estimulou-se a co-orientação por doutores moçambicanos, por ser esta
interação também um espaço de multiplicação de capacitação e empoderamento local
(CENTRO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA FIOCRUZ, 2013).
Quanto aos temas das dissertações, estes foram definidos após a conclusão da
primeira disciplina do curso, de acordo com os temas de pesquisa considerados
prioritários pelo MISAU, que se adequassem às linhas de pesquisa dos orientadores e
que fossem de interesse dos alunos. Importante diferencial do curso foi o fato de ser
garantida ao menos uma oportunidade de orientação presencial no Brasil, criada e
financiada pelo programa. Outras sessões de orientação seriam combinadas à distância
ou aproveitando a presença do professor brasileiro em Moçambique por ocasião das
aulas. Acordou-se que as qualificações dos projetos seriam presenciais, assim como as
defesas das dissertações. Os temas não foram objeto de estudo desta pesquisa pelo fato
das dissertações não terem sido defendidas ainda. A primeira turma do curso tem
previsão de término para o primeiro semestre de 2016.
5.6 Mestrado em Saúde Pública – Peru
O projeto do curso de Mestrado em Saúde Pública foi fruto de um processo de
cooperação entre a ENSP e o Instituto Nacional de Saúde do Peru, por demanda do
último e iniciativa do Centro de Relações Internacionais da Fiocruz (Cris). A Fiocruz e
o INS/Peru são parceiros estratégicos no processo de fortalecimento dos Institutos
Nacionais de Saúde da região Sul-Americana, como Secretário Executivo e
Coordenador Geral, respectivamente, da Rede dos Institutos Nacionais de Saúde
(RINS) criada no âmbito da UNASUL, além de cooperações anteriores.
57
Em 2010 a Fiocruz e o Ministério da Saúde do Peru assinaram um acordo sobre
programas de formação e capacitação de recursos humanos, com foco nos trabalhadores
do Instituto Nacional de Saúde do país (INS/Peru). Em função do papel e das
potencialidades do INS/Peru como organismo estruturante do Sistema de Saúde do
país, foi acordada, entre outras atividades, a organização e realização conjunta de um
Mestrado em Saúde Pública, que teve como objetivo principal fortalecer a capacidade
de pesquisa e ensino em Saúde Pública, de análise estratégica e de formulação de
políticas e programas de saúde no Peru, além de ampliar conhecimentos e competências
no campo da saúde pública para a estruturação de uma Escola Nacional de Saúde
Pública do Peru (ENSAP-Peru). O mestrado fez parte de um convênio mais amplo de
cooperação entre o INS/Peru e a Fiocruz, que incluiu acordos em outras áreas, como a
iniciativa de construção ENSAP-Peru, um acordo para realização de curso de
especialização em biossegurança para o INS/Peru, de um curso de especialização em
entomologia, para curso em saúde global e relações internacionais para profissionais da
rede de escritórios de cooperação internacional da UNASUL, sobre o plano nacional de
formação e desenvolvimento de recursos humanos para pesquisa em saúde e sobre a
gestão de programas para a prevenção e controle de doenças no contexto da
descentralização.
Foram oferecidas 30 vagas, destinadas preferencialmente a profissionais do
INS/Peru, mas aberto a profissionais de outras instituições públicas, como o Ministério
da Saúde. Os candidatos deviam ser apresentados pelo próprio INS e passaram por um
processo seletivo constituído de prova escrita, prova de inglês, análise do curriculum
vitae e entrevista.
Juntou-se à parceria a Universidad Nacional Mayor de San Marcos,
universidade pública mais antiga do Peru, que mantém um convênio de cooperação
com o INS para o desenvolvimento conjunto de programas de formação e capacitação
de pessoal. A referida Universidade uniu-se ao processo de organização do mestrado
com a finalidade de desenvolver capacidades locais para o futuro desenvolvimento de
programas análogos de formação.
Assim como nos outros programas ora estudados, buscou-se a formação de
quadros estratégicos para o ensino, pesquisa e gestão do sistema de saúde peruano, com
o intuito de reduzir as brechas entre ciência e inovação e entre academia e serviços,
especialmente por meio da qualificação de profissionais atuantes no sistema de saúde.
Desta maneira, a proposta pedagógica do mestrado buscou um modelo de formação que
58
fosse capaz de articular as questões próprias da prática profissional com a apropriação
dos principais instrumentos teórico-conceituais e metodológicos do campo da saúde
pública.
A grade curricular do curso foi criada com base em uma matriz analítica de
desempenho dos sistemas de saúde, com ênfase nas disciplinas de metodologia de
pesquisa, em estrutura modular, com aulas uma semana por mês. O INS/Peru colaborou
na tradução das aulas, apresentações, material docente e bibliográfico para o espanhol,
o que permite o uso em futuras iniciativas de cooperação com países da América do Sul
(ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA SÉRGIO AROUCA, 2012a). Além
disso, arcou com as despesas para uma ida, acomodação e alimentação dos orientadores
para reuniões presenciais.
Quanto aos temas que foram objeto de investigação das dissertações, o projeto
propunha que refletissem os compromissos institucionais dos alunos e as prioridades
sanitárias do Peru, em consonância com as áreas temáticas definidas pela ENSP para as
quais houvesse possibilidade de docentes orientadores para as pesquisas. Buscou-se
formar profissionais com visão em saúde coletiva, modelos de sistemas e políticas de
saúde. No próprio processo de seleção para o mestrado foi analisada uma proposta
preliminar de trabalho dos candidatos com justificativa pertinente das instituições de
origem.
A responsabilidade pela titulação e pela condução pedagógica foi da ENSP,
sendo permitido que a docência e a orientação das dissertações fossem compartilhadas
com o INS, com a Universidad Nacional Mayor de San Marcos e com outras
instituições, se conveniente. A gestão acadêmica do mestrado esteve a cargo da ENSP,
sendo que a gestão administrativa e financeira foi compartilhada entre o INS e a ENSP.
O mestrado teve uma coordenação geral de responsabilidade da ENSP,
composta por coordenador geral e coordenador adjunto do mestrado, designados pela
Fiocruz, e também uma coordenação local, do INS/Peru.
A docência e as orientações foram definidas de comum acordo entre a ENSP, o
INS e a Universidad Nacional Mayor de San Marcos. Pesquisadores de outras unidades
da Fiocruz, como IOC, Farmanguinhos e CDTS (Centro de Desenvolvimento
Tecnológico em Saúde) também aturam como orientadores. As dissertações puderam
ser defendidas por videoconferência ou nas instalações da ENSP/Fiocruz. Apesar de
não ter sido previsto período de estágio na ENSP para os alunos, alguns realizaram um
esforço pessoal e defenderam a dissertação no Rio de Janeiro com financiamento
59
próprio. A Universidade peruana também foi responsável por revalidar para o Peru os
títulos expedidos pela ENSP. Apesar da intenção de compartilhar as orientações com
docentes universitários peruanos, a intenção não foi concretizada, o que dificulta o
processo de continuidade da experiência de maneira mais autônoma, que possibilitaria a
formação de mais profissionais dos serviços.
O curso contou com financiamento da OPAS, por meio do Programa de
Cooperação Internacional em Saúde (TC-41), para pagamento das passagens e diárias
dos docentes, como parte de um projeto de fortalecimento da Rede de Institutos
Nacionais de Saúde da UNASUL. O INS/Peru arcou com as despesas de tradução do
material, alguns custos de hospedagem, alimentação e transporte e uma viagem a Lima
de cada orientador.
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Até o presente momento 85 mestres foram titulados e há 56 alunos matriculados
nos cursos analisados, totalizando potencial para a Fiocruz formar 141 mestres nos
países parceiros, como evidencia a Tabela 5vii.
Tabela 5: Egressos e alunos matriculados nos cursos de mestrado acadêmico da Fiocruz realizados em cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru
Total Angola Argentina (Ep)
Argentina (BCM)
Moçambique (CS)
Moçambique (SS)
Peru Total
Egressos 15 14 9 21 0 26 85 Matriculados 0 16 0 26 14 0 56
Total 15 30 9 47 14 26 141
O maior número de alunos está em Moçambique, com 43,3% do total de
estudantes envolvidos, 24,7% dos egressos e 71,4% dos matriculados atualmente, o que
se justifica pela continuidade do projeto, com duas turmas formadas e duas em
andamento. O Peru é o país com mais egressos, 30,6%, embora não haja no momento
perspectiva de novas formações. A Argentina concentra 27% dos egressos e 28,6% dos
matriculados, com possiblidade de reunir 27,6% dos egressos ao final das turmas em
vii Argentina (Ep) - Mestrado em Epidemiologia em Saúde Pública; Argentina (BCM) - Mestrado em Biologia Celular e Molecular; Moçambique (CS) - Mestrado em Ciências da Saúde; Moçambique (SS) - Mestrado em Sistemas de Saúde.
60
curso, formando o segundo maior grupo. Angola tem hoje em seus quadros públicos
17,7% dos formados pela Fiocruz nesta modalidade de parceria.
A Tabela 6viii reúne um resumo dos cursos estudados, apresentando a
percentagem de selecionados (relação entre o número de candidatos e de selecionados)
e o índice de concluintes (relação entre o número de matriculados e de egressos),
número de turmas, em andamento e concluídas, duração, parcerias institucionais e
fontes de financiamento. Os dados sugerem que uma seleção mais criteriosa resulta em
um maior índice de egressos. O mestrado em Saúde Pública em Angola, por exemplo,
selecionou 94% dos candidatos e teve apenas 50% deles como concluintes, enquanto o
curso com o Peru teve percentagem de selecionados de 33% e índice de concluintes de
100%, e o mestrado em Biologia Celular e Molecular com a Argentina selecionou 68%
dos candidatos e teve 90% deles titulados.
A análise dos institutos da Fiocruz que participaram dos cursos mostra o
envolvimento de três unidades distintas, e dentro delas, diferentes programas de Pós-
Graduação. A ENSP teve participação de dois programas (Epidemiologia em Saúde
Pública e Saúde Pública) para a titulação e docentes de todos os programas na
orientação, enquanto o IOC teve três (Biologia Celular e Molecular, Biologia
Parasitária e Medicina Tropical), além do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães como
unidade.
A presença dos parceiros internacionais e das instituições financiadoras também
mostra um esforço de integração, com colaboração e envolvimento de diversos setores
e órgãos federais, como ABC/MRE, CAPES/Ministério da Educação, CNPq/
Ministério de Ciência e Tecnologia, MS, além de organismos multilaterais como a
OPAS. Este empenho coletivo envolveu também diferentes instituições nos países
parceiros, como todos os Ministérios da Saúde, os Institutos Nacionais de Saúde ou
equivalentes e universidades locais, que contribuíram com a experiência de formação
viii Instituições que constam na Tabela 6: ABC - Agência Brasileira de Cooperação ANLIS - Administração Nacional de Laboratórios e Institutos de Saúde (Argentina) CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CpqAM - Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães ENSP - Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca Fiocruz - Fundação Oswaldo Cruz IDRC - International Development Research Centre (Canadá) INS/Moz - Instituto Nacional de Saúde de Moçambique INS/Peru - Instituto Nacional de Saúde do Peru IOC - Instituto Oswaldo Cruz MISAU - Ministério da Saúde de Angola OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde UEM - Universidade Eduardo Mondlane (Moçambique)
61
no país e são candidatos a dar continuidade aos cursos uma vez que o país e as
organizações reúnam condições para seguir de forma independente na qualificação em
saúde para a melhoria e capacitação dos recursos humanos para seus sistemas de saúde.
Além de tantos atores envolvidos nos países parceiros e no Brasil, há também o
financiamento de instituição canadense para o mestrado em Sistemas de Saúde em
Moçambique, que mostra o componente de cooperação triangular nos programas. O
envolvimento de outras instituições em terceiros países que forneçam os recursos
financeiros indispensáveis para as iniciativas pode ser uma alternativa a ser pensada
pelos programas que, apesar das dificuldades enfrentadas neste quesito, reúnem pessoal
qualificado e engajado para continuar realizando os cursos. Constituem-se ainda em
possibilidades de colaboradores para o momento em que as instituições locais, uma vez
estruturadas e com pessoal habilitado por realizarem esses cursos, consigam manter os
programas de forma independente.
A duração dos cursos mostra que nenhum deles concluiu as turmas no prazo
esperado de 24 meses, de acordo com normas da CAPES, considerando a defesa de
todos os alunos titulados. O projeto com Angola teve a duração mais longa, de 52
meses, enquanto o do Peru foi mais próximo do ideal, 29 meses, sendo que as demais
turmas foram concluídas entre 31 e 36 meses.
62
Tabela 6: Descrição dos cursos de mestrado acadêmico realizados pela Fiocruz em cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru
ix DND - Dado Não Disponível
Paí
s
Nome do Curso Inscritos Selecionados Matriculados Percentagem
de selecionados
Egressos Índice de
concluintes Turmas iniciadas
Turmas concluídas
Duração (meses)
Instituto Fiocruz
Parceiro internacional
Financiamento
Ang
ola
Mestrado em Saúde Pública 35 33 30 94% 15 50% 1 1 52 ENSP MISAU ABC e CAPES
Arg
enti
na
Mestrado em Epidemiologia em
Saúde Pública - Turma 1
19 16 15 84% 14 93%
2 1
31
ENSP
ANLIS ABC e OPAS Mestrado em
Epidemiologia em Saúde Pública -
Turma 2
DNDix 19 16 - - - -
Mestrado em Biologia Celular e
Molecular 22 15 10 68% 9 90% 1 1 31 IOC
Moç
ambi
que
Mestrado em Ciências da Saúde
- Turma 1 25 15 15 60% 11 73%
4 2
32
IOC INS/Moz
ABC e CAPES Mestrado em
Ciências da Saúde - Turma 2
16 11 11 69% 10 91% 36
Mestrado em Ciências da Saúde
- Turma 3 22 10 10 45% - - - OPAS
Mestrado em Ciências da Saúde
- Turma 4 30 16 16 53% - - - Fiocruz
Mestrado em Sistemas de Saúde 21 14 14 67% - - 1 0 -
CpqAM e ENSP
INS/Moz e UEM
IDRC
Per
u Mestrado em Saúde Pública 85 28 26 33% 26 100% 1 1 29 ENSP INS/Peru OPAS
63
Este fator se deve a dificuldades, imprevistos e desafios que são esperados em
programas como estes, que envolvem mais de uma instituição, distância física,
disparidade de formação básica entre os alunos e da expectativa do corpo docente,
dependência de financiamento externo e da necessidade de negociação com embaixadas
e instâncias da administração federal, burocracia característica de organizações públicas
que devem seguir diretrizes específicas na tramitação e execução orçamentária além de,
em alguns casos, interação em diferentes idiomas. Estes fatores podem explicar os
atrasos ocorridos, que, não entanto, não impediram a conclusão das turmas ou o início
de novas iniciativas, e deram mais experiência às unidades da Fiocruz para antecipar os
desafios e melhor planejar o desenvolvimento de parcerias futuras, no intuito de
administrar as adversidades inerentes ao processo.
Esclarece-se que a pesquisa encontrou limites quanto às possibilidades de
levantamento e obtenção de dados para realização desse estudo. Pelo fato do estudo
abranger seis diferentes cursos de Pós-Graduação em quatro países, realizados por
diferentes unidades da Fiocruz e com interveniência e envolvimento de outras instâncias
da Fundação Oswaldo Cruz, notadamente a Vice Presidência de Ensino, esbarrou-se em
algumas dificuldades no acesso aos dados. Entre estas, destaca-se a mudança de
coordenação no caso de cursos oferecidos em mais de uma oportunidade, a
descontinuidade daqueles oferecidos apenas uma vez e informações incompletas
naqueles ainda não finalizados. Em relação à segunda turma do mestrado em
Epidemiologia em Saúde Pública, não foi obtido o número de inscritos no processo
seletivo, o que impossibilitou o cálculo da percentagem de selecionados.
As características dos alunos dos cursos estudados, tanto titulados como
matriculados, são apresentadas na Tabela 7. Quanto à idade ao ingressar, 41,6% tinham
40 anos ou mais, resultado influenciado principalmente pelos cursos em Angola, de
Epidemiologia em Saúde Pública na Argentina e Sistemas de Saúde em Moçambique,
que tiveram respectivamente 66,7%, 43,3% e 42,9% de alunos acima de 40 anos. Isto
ocorreu mesmo com a limitação de idade dos candidatos nos editais dos cursos
realizados em Moçambique em 45 anos. O grupo de 30 a 34 anos foi o segundo maior
(23,2%). Estes dados mostram que os cursos estavam voltados para profissionais
experientes, que já trabalhavam nestas instituições mas precisavam de reforço e
atualização na formação, com exceção do curso de Ciências da Saúde em Moçambique,
que teve público jovem.
64
Tabela 7: Características dos alunos dos cursos de mestrado acadêmico realizados pela Fiocruz em cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru.
x Dados referentes à idade, vínculo empregatício e formação dos alunos da quarta turma não disponíveis. Dados referentes à formação dos alunos da terceira turma não disponíveis.
Características Angola Argentina (Ep) Argentina (BCM) Moçambique (CS)x Moçambique (SS) Peru Total
N % N % N % N % N % N % N %
Idade (ao ingressar)
23-29 anos 0 0,0 5 16,7 1 11,1 12 38,7 6 42,9 1 3,8 25 20,0
30-34 anos 3 20,0 5 16,7 5 55,6 11 35,5 2 14,3 3 11,5 29 23,2
35-39 anos 2 13,3 7 23,3 1 11,1 7 22,6 0 0,0 2 7,7 19 15,2
40 ou mais 10 66,7 13 43,3 2 22,2 1 3,2 6 42,9 20 76,9 52 41,6 Total 15 100 30 100 9 100 31 100 14 100 26 100 125 100
Sexo Feminino 6 40 18 60,0 6 66,7 21 44,7 7 50,0 15 57,7 73 51,8
Masculino 9 60 12 40,0 3 33,3 26 55,3 7 50,0 11 42,3 68 48,2
Total 15 100 30 100 9 100 47 100 14 100 26 100 141 100
Vínculo empregatício
Funcionário público 15 100 30 100 9 100 31 100 14 100 26 100 125 100
Sem vínculo 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Total 15 100 30 100 9 100 31 100 14 100 26 100 125 100
Formação
Biologia/Ciências Biológicas
0 0,0 3 10,0 1 11,0 19 90,5 2 14,3 2 7,7 27 23,5
Biotecnologia 0 0,0 1 3,3 1 11,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 1,7
Enfermagem 8 53,3 1 3,3 0 0,0 0 0,0 3 21,4 5 19,2 17 14,8 Farmácia Bioquímica 1 6,7 4 13,3 5 56,0 0 0,0 1 7,1 4 15,4 15 13,0
Medicina 5 33,3 13 43,3 0 0,0 1 4,8 2 14,3 12 46,2 33 28,7
Nutrição 0 0,0 1 3,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 7,7 3 2,6
Odontologia 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 14,3 0 0,0 2 1,7 Psicologia 1 6,7 1 3,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 3,8 3 2,6 Sociologia 0 0,0 3 10,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 3 2,6
Outros 0 0,0 3 10,0 2 22,0 1 4,8 4 28,6 0 0,0 10 8,7 Total 15 100 30 100 9 100 21 100 14 100 26 100 115 100
65
Quanto à formação na graduação, o grupo mais representativo foi o de médicos,
com 28,7% do total, puxado pelo curso de Epidemiologia em Saúde Pública da
Argentina (43,3%), e o do Peru (46,2%). A segunda formação mais presente foi de
biologia e ciências biológicas, com 23,5%, ocasionada pelo curso de Ciências da Saúde,
que pelas características teve 90,5% dos alunos com esta formação. Verifica-se
importante presença de graduados em Enfermagem (14,8%), e Química/Farmácia
Bioquímica (13,0%), sendo que 53,3% dos egressos do curso de Saúde Pública em
Angola são enfermeiros e os farmacêuticos são 56% do curso de Biologia Celular e
Molecular.
A distribuição entre homens e mulheres foi bastante equilibrada, com ligeira
maioria do sexo feminino (51,8%), o que segue a tendência da educação superior no
Brasil, apesar do resultado quase equivalente. Ao dividir a distribuição entre África e
América do Sul, o primeiro tem 44% de mulheres nos cursos e o segundo 60%.
Todos os alunos são vinculados a serviços públicos, o que era esperado pela
clientela específica dos cursos. Isto sugere que está sendo atingido o objetivo de se
formar quadros para os serviços públicos e ajudar a conformar os sistemas de saúde dos
países envolvidos, num reforço à área de vigilância em saúde, com foco na investigação
científica voltada para as necessidades do contexto local, que possam ser duradouros e
perpetuar a capacitação no futuro.
A Tabela 8, por sua vez, traz as temáticas das dissertações defendidas, que devido
à diversidade de áreas abordadas nos cursos foi bastante abrangente. Para melhor
analisar esta variável foram criados 23 grupos de temas, de acordo com os títulos das
dissertações já defendidas. Na análise do resultado final deste agrupamento os índices
são bastante similares, sem uma temática que se sobressaia na análise conjunta, apesar
do maior percentual ser o grupo de imunopatogenia de doenças infecciosas (12,9%),
resultado que se deve ao fato deste ser o tema de mais da metade das dissertações das
duas turmas de Ciências da Saúde (52,4%). Além desta temática, outra de destaque no
curso foram os estudos sobre prevalência e epidemiologia molecular. De maneira geral,
as temáticas das dissertações de Moçambique evidenciam pesquisas sobre diagnósticos
laboratoriais e doenças de grande incidência no país.
A análise dos cursos de forma separada confere destaque a alguns temas, como
Avaliação em saúde; Diagnóstico, profilaxia, transmissão e tratamento de doenças
infecciosas; Formação de Recursos Humanos em Saúde; Saúde materno-infantil e
Sistemas de saúde, todos responsáveis por 13,3% dos temas das dissertações do curso
66
de Saúde Pública em Angola. Este curso, especificamente, tem temáticas mais
diversificadas, voltadas aos interesses e fazer próprio dos egressos, pois o público foi
do MS e de universidade pública, sendo mais aberto a um escopo de saúde pública e
sem limitação da temática.
Em relação ao mestrado de Epidemiologia em Saúde Pública, destacam-se os
temas de Doenças Crônico-Degenerativas e Epidemiologia e Prognóstico de Doenças,
com 21,4% das dissertações cada, possivelmente devido ao perfil populacional. Outros
temas pesquisados foram Diagnóstico, Profilaxia, Transmissão e Tratamento de
Doenças Infecciosas e Saúde materno-infantil (14,3%). Tiveram uma combinação
importante da parte laboratorial de saúde pública e vigilância de doenças. Temas mais
metodológicos também foram pesquisados, já que o curso era no campo da
epidemiologia.
O outro curso realizado na Argentina, de Biologia Celular e Molecular, teve
como as duas principais temáticas o Desenvolvimento e Comparação de métodos
diagnósticos (55,6%) e os Controles in vivo e in vitro de vacinas e soros (22,2%),
evidenciando característica laboratorial para verificação de qualidade na área.
Por fim, o curso de Saúde Pública no Peru teve distribuição bastante homogenia,
sendo o principal tema a Avaliação em Saúde (19,2%), seguida de Assistência
Farmacêutica, Diagnóstico, Profilaxia, Transmissão e Tratamento De Doenças
Infecciosas e Doenças Crônico-Degenerativas, todos com 11,5%. Com 7,7% das
pesquisas, Sistemas de saúde, Nutrição e saúde e Epidemiologia e Prognóstico de
Doenças ficaram em terceiro lugar.
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Tabela 8: Temáticas das dissertações defendidas nos mestrados acadêmicos realizados em cooperação internacional com instituições em Angola, Moçambique, Argentina e Peru
Temas das dissertações defendidas Angola Argentina (Ep) Argentina (BCM) Moçambique (CS) Peru TOTAL
N % N % N % N % N % N %
1 Acidentes e agravos ocupacionais 1 6,7 0 0,0 1 11,1 0 0,0 1 3,8 3 3,5
2 Assistência Farmacêutica 1 6,7 0 0,0 0 0,0 0 0,0 3 11,5 4 4,7
3 Avaliação em Saúde (de programa, demanda e satisfação do usuário sobre o Sistema de Saúde)
2 13,3 1 7,1 0 0,0 0 0,0 5 19,2 8 9,4
4 Biodisponibilidades in vitro 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 3,8 1 1,2
5 Co-infecção com HIV e outras patologias 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 9,5 0 0,0 2 2,4
6 Controles in vivo e in vitro de vacinas e soros 0 0,0 0 0,0 2 22,2 0 0,0 0 0,0 2 2,4
7 Desenvolvimento e Comparação de métodos diagnósticos 0 0,0 0 0,0 5 55,6 0 0,0 0 0,0 5 5,9
8 Diagnóstico laboratorial de Meningite, Malária, Tuberculose e Diarreia 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 9,5 0 0,0 2 2,4
9 Diagnóstico, Profilaxia, Transmissão e Tratamento De Doenças Infecciosas 2 13,3 2 14,3 0 0,0 0 0,0 3 11,5 7 8,2
10 Doenças Crônico-Degenerativas 0 0,0 3 21,4 0 0,0 0 0,0 3 11,5 6 7,1
11 Prevalência e Epidemiologia molecular 0 0,0 0 0,0 0 0,0 3 14,3 0 0,0 3 3,5
12 Epidemiologia e Prognóstico de Doenças 1 6,7 3 21,4 0 0,0 2 9,5 2 7,7 8 9,4
13 Ética em saúde 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 3,8 1 1,2
14 Formação de Recursos Humanos em Saúde 2 13,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 3,8 3 3,5
15 Imunopatogenia de doenças infecciosas 0 0,0 0 0,0 0 0,0 11 52,4 0 0,0 11 12,9
16 Nutrição e saúde 0 0,0 1 7,1 0 0,0 0 0,0 2 7,7 3 3,5
17 Monitoramento de biotérios 0 0,0 0 0,0 1 11,1 0 0,0 0 0,0 1 1,2
18 Planejamento estratégico 1 6,7 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 1,2
19 Revisão sistemática e validação de instrumentos 0 0,0 2 14,3 0 0,0 0 0,0 1 3,8 3 3,5
20 Saúde materno-infantil 2 13,3 2 14,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 4 4,7
21 Sistemas de saúde 2 13,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 7,7 4 4,7
22 Vigilância epidemiológica, ambiental e de vetores 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 4,8 1 3,8 2 2,4
23 Violência de Gênero 1 6,7 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 1,2
TOTAL 15 100 14 100 9 100 21 100 26 100 85 100
68
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
De maneira geral, todas as iniciativas pesquisadas foram concluídas, algumas
com mais dificuldades e entraves que outras, ou estão em curso como previsto, tendo
formado até o momento 49 profissionais em nível de Pós-Graduação na América-
Latina e 36 na África. O índice de conclusão dos alunos está acima de 70%, com
exceção de Angola que teve índice bastante inferior ao restante, sendo este curso
especificamente o que passou por mais dificuldades durante o desenvolvimento e que
pode apontar importantes lições para iniciativas futuras. Apesar das taxas brasileiras
ficarem em torno de 10% de evasão, com casos atípicos chegando a 70%, é esperado
que programas inovadores que passam pelos mais variados desafios tenham
porcentagens maiores (MAIA, 2014). A continuidade dos cursos e avaliação após o
término das turmas em curso permitirá alguma afirmação quanto ao universo total.
A totalidade dos alunos vinculados a instituições públicas cumpre o requisito de
serem programas para fortalecer os sistemas de saúde dos países, voltados
exclusivamente aos funcionários que já trabalhavam e que se comprometeram a
continuar com o vínculo, para fomentar o avanço dos serviços e sistemas de saúde.
Quanto ao gênero, há mais homens nos cursos com a África e mais mulheres nos
da América do Sul, seguindo tendência da região latino-americana de escolaridade mais
elevada para as mulheres.
O perfil das profissões, predominantemente médicos, seguido de biólogos,
enfermeiros e farmacêuticos, guarda relação com o perfil dos Institutos parceiros, sendo
que no caso do curso de ciências da saúde em Moçambique a principal profissão foi
biólogo devido à especificidade do curso. Com a realização pelo INS/Peru de
atividades de controle de qualidade de produtos, houve grande número de
farmacêuticos, já que esta é atividade característica destes profissionais. Os cursos da
Argentina tiveram público composto também por profissionais da área de ciências
humanas e sociais, sendo que o curso de Epidemiologia em Saúde Pública foi o que
teve maior diversidade de profissões.
Quanto aos temas das dissertações, era esperada a grande diversidade encontrada,
tanto pelo número de alunos titulados quanto pelo foco dos cursos. Realizar o
agrupamento dos temas foi a etapa mais desafiadora dessa dissertação, juntamente com
a busca pelos dados dos atores e cursos. Apesar de não ter sido tarefa simples agrupar
69
os diferentes títulos das dissertações em temas, priorizou-se congregar por funções da
saúde pública e tipos de problema de saúde. Destacam-se as dissertações que
abordaram a Imunopatogenia de doenças infecciosas e o Desenvolvimento e
Comparação de métodos diagnósticos, trabalhados especificamente pelos cursos do
IOC, dado o tema. Os sistemas de saúde e avaliação de programas, que incluem o
monitoramento e constituem assim um grande campo da saúde pública, também
merecem destaque. As Doenças Crônico-Degenerativas, Epidemiologia e Prognóstico
de Doença, Diagnóstico, Profilaxia, Transmissão e Tratamento de doenças infecciosas,
tiveram alta incidência entre os temas, devido às doenças prevalentes nesses países e a
necessidade de investigar o tema.
A análise conjunta dos cursos evidenciou que a Fiocruz tem primado pela
realização de projetos interligados, com apoio estruturante aos sistemas e instituições
públicas de saúde que garantam a sustentabilidade e continuidade das ações, que sem
dúvida passam pelo fortalecimento da formação de recursos humanos para as
instituições públicas de saúde. Para esta estruturação, além do financiamento,
imprescindível, o compromisso dos governos e instituições locais é imperativo, pois
são eles que possibilitarão a continuidade das ações e, mais importante, mudanças
efetivas que contribuam para desenvolvimento dos países.
Por serem cursos com características, público, países e trajetórias muito
diferentes, apontam-se algumas características observadas na síntese realizada. O curso
de Angola, que levou mais tempo para ser concluído, teve 94% dos inscritos
selecionados, mas apenas metade destes concluiu o programa, mesmo assim após mais
de quatro anos do início. É preciso verificar o que ocorreu para que tenha sido uma
experiência negativa. Podem ter ocorrido falhas na seleção ou uma tentativa de
expandir a oportunidade a mais pessoas. A resposta é incerta no momento, mas os
dados analisados sugerem que não respeitou o rigor característico dos processos
seletivos da Pós-Graduação da Instituição.
Os demais cursos, exceto do Peru, tiverem turmas de dez a 16 estudantes, e índice
de conclusão acima de 73%, sugerindo que um menor número de alunos seja benéfico
para a organização e conclusão do curso, já que a distância e a interação necessários
durante o curso podem ser mais difíceis quando há muitos alunos envolvidos.
A consistência da iniciativa do mestrado em Ciências da Saúde em Moçambique,
com maior número de turmas, inícios regulares e interação entre pesquisadores
brasileiros e moçambicanos, evidencia que é um curso consolidado, sendo o exemplo
70
de maior êxito enquanto parceria acadêmica entre os casos pesquisados. Como
contradição, ao comparar os cursos de Angola e Moçambique, ambos países de língua
oficial portuguesa, localizados no mesmo continente, com histórico recente de guerra
civil e reconstrução do sistema de saúde similares, observa-se resultados díspares nas
iniciativas realizadas.
A experiência da formação de recursos humanos por meio de convênios bilaterais
ou tripartites, como os analisados, exige um exercício operacional com cuidadosa
articulação entre diversas instâncias, pelas coordenações geral e local, com o pessoal
administrativo, alunos, professores e orientadores. Como iniciativas inovadoras e
audaciosas para a Pós-Graduação brasileira, são cursos que fazem uma experimentação,
de acordo com suas especificidades, envolvem países muito diferentes e demandam um
enorme esforço dos envolvidos na tentativa de contribuir seja para o (re)nascimento de
uma nação após dois séculos de dominação seja para o desenvolvimento do sistema de
saúde ou de um setor dentro dele . Os resultados alcançados até o momento devem ser
analisados e divulgados, com a intenção de disseminar esta experiência, fornecer
subsídio aos interessados em iniciativas semelhantes e dar conhecimento do que tem
sido realizado nos cursos. A manutenção dos convênios vigentes, retomada dos que não
tiveram seguimento e a ampliação da cooperação internacional com outros países terá
seguramente nos casos ora pesquisados uma fonte para consulta e análise do que já foi
experimentado durante o trabalho meticuloso que exigem tais empreendimentos.
Inicialmente pretendia-se avaliar se os trabalhos resultaram em publicações
cientificas e comparar estes resultados com os programas de PG ordinários realizados
na Fiocruz, mas a impossibilidade de contato com os egressos, que poderiam avaliar
este aspecto, foi uma limitação encontrada quanto a esta avaliação. De forma
semelhante, outra questão interessante seria saber qual o impacto da formação no
trabalho desenvolvido pelos profissionais titulados, mas esta análise também
dependeria de consulta aos egressos e às chefias dos serviços aos quais pertencem, o
que não foi possível realizar neste estudo.
As conclusões deste estudo são parciais, uma vez que não se pôde escutar a
avaliação dos atores formados, o que permanece como sugestão para apreciação
posterior em futuros estudos. O aprofundamento desta temática e a possibilidade de
contato e escuta dos parceiros, investigando o que os egressos e seus superiores nas
instituições públicas para onde retornaram após a formação têm a dizer, pode trazer
novas considerações e sugestões para aperfeiçoamentos em inciativas semelhantes.
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