A Decadência Do Trabalho – Raoul Vaneigem

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  • 8/16/2019 A Decadência Do Trabalho – Raoul Vaneigem

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    A decadência do trabalho – Raoul Vaneigem

    Recolhido em guy-debord.blogspot.com.br

    Em uma sociedade industrial que confunde trabalho e produtividade, a necessidade de produzirsempre foi antagonista do desejo de criar. O que resta de centelha humana, de criatividadepossível, em um ser privado do sono s seis horas a cada manh!, que se equilibra nos trenssuburbanos, ensurdecido pelo ruído das m"quinas, li#iviado, cozido a vapor pelas cad$ncias, osgestos privados de sentido, o controle estatístico, e jogado ao fim do dia nos sagu%es dasesta&%es, catedrais de partida para o inferno das semanas e o ínfimo paraíso dos finais desemana, onde a multid!o comunga a fadiga e o embrutecimento' (a adolesc$ncia aposentadoria, nos ciclos de vinte e quatro horas ouve-se o uniforme estilha&ar de vidra&as)rachadura da repeti&!o mec*nica, rachadura do tempo-+-dinheiro, rachadura da submiss!o aoschefes, rachadura do t+dio, rachadura da fadiga. (a for&a viva esmigalhada brutalmente aorasgo escancarado da velhice, a vida se racha por todos lados sob os golpes do trabalho

    for&ado. amais uma civiliza&!o atingiu tal grau de desprezo pela vida afogada no desgosto, jamais um gera&!o e#perimentou tal raiva de viver. queles que matamos lentamente nosmatadouros mecanizados do trabalho s!o os mesmos que discutem, cantam, bebem, dan&am,beijam, ocupam as ruas, pegam em armas, criam uma nova poesia. " est" se formando afrente contra o trabalho for&ado os gestos de recusa j" modelam a consci$ncia futura. /odoapelo produtividade +, sob as condi&%es desejadas pelo capitalismo e pela economiasovietizada, um apelo escravid!o.

    necessidade de produzir acha t!o comodamente as suas justificativas que qualquer 0ourasti+pode encher dez livros com elas sem esfor&o. 1nfelizmente para os neo-pensadores doeconomismo, estas justificativas s!o aquelas do s+culo 212, de uma +poca onde a mis+ria dasclasses trabalhadores fazia do direito ao trabalho o hom3logo do direito escravid!o,reivindicada na aurora dos tempos pelos prisioneiros condenados morte. O mais importanteera n!o desaparecer fisicamente, sobreviver. Os imperativos da produtividade s!o imperativosde sobreviv$ncia mas a partir de agora as pessoas querem viver, n!o somente sobreviver.

    O tripalium era um instrumento de tortura. 4abor significa 5tormento6. 7" uma certaleviandade no esquecimento da origem das palavras 5trabalho6 e 5labor6. Os nobres tinham aomenos a mem3ria de sua dignidade, assim como da indignidade que afligia os seus servos. Odesprezo aristocr"tico pelo trabalho refletia o desprezo do senhor pelas classes dominadas otrabalho era a e#pia&!o qual foram condenadas por toda a eternidade por um decreto divino,que os queria, por raz%es impenetr"veis, inferiores. O trabalho se inscrevia, entre as san&%esda 8rovid$ncia, como a puni&!o do pobre, e, uma vez que ela era tamb+m meio de salva&!ofutura, uma tal puni&!o podia se revestir de satisfa&!o. 9o fundo, o trabalho importava menosdo que a submiss!o.

    burguesia n!o domina, ela e#plora. Ela submete pouco, ela prefere usar. :omo n!o se viuque o princípio do trabalho produtivo substituiu simplesmente ao princípio da autoridadefeudal' 8or que n!o se quis compreender isso'

    ;eria porque o trabalho melhora a condi&!o dos homens e salva os pobres, pelo menosilusoriamente, da dana&!o eterna' ;em d

  • 8/16/2019 A Decadência Do Trabalho – Raoul Vaneigem

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    s3> O mundo se transforma pelo molde do trabalho for&ado e + por isso que ele se transformapara pior.

    O homem se realizar" em seu trabalho for&ado' 9o s+culo 212, subsistia na concep&!o detrabalho um tra&o ínfimo de criatividade. ?ola descreve um concurso de fabricantes de pregoonde os trabalhadores competiam em habilidade para realizar sua min

  • 8/16/2019 A Decadência Do Trabalho – Raoul Vaneigem

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    esperar uma resposta coletiva e entusiasta demanda econLmica. Das o que dizer maisquando sabemos como o trabalho + cultuado em :uba e na :hina, e com que facilidade asp"ginas virtuosas de Puizot passam de agora em diante em um discurso de Ho. de Daio'

    Q medida que a automa&!o e a cibern+tica dei#am prever a substitui&!o em massa detrabalhadores por escravos mec*nicos, o trabalho for&ado revela pertencer aos processosb"rbaros de manuten&!o da ordem. O poder fabrica assim a dose de fadiga necess"ria

    assimila&!o passiva de seus decretos televisionados. 8or qual recompensa trabalhar de agoraem diante' farsa se esgotou n!o h" mais nada a perder, nem mesmo uma ilus!o. organiza&!o do trabalho e a organiza&!o do lazer resguardam as tesouras castradorasencarregadas de melhorar a ra&a dos c!es submissos. =eremos qualquer dia os grevistas,reivindicando a automa&!o e a semana de dez horas, escolherem, como forma de greve, fazeramor nas f"bricas, nos escrit3rios e nos centros culturais' ;omente se inquietariam e seespantariam os planejadores, os gerentes, os dirigentes sindicais e os soci3logos. :om raz!o,talvez. final, + a pele deles que est" em jogo.

     

    /raduzido por (aniel :unha. /ítulo original) 54a d+ch+ance du travail6

    F http)ariSel.free.fraidesvaneigemtraite-T.html G 

    E#certo do livro 5 arte de viver para as novas gera&%es6 F/rait+ de savoir-vivre lUusage des jeunes g+n+rationsG, Raoul =aneigem

    imageRaoul =aneigem + um escritor e fil3sofo belga. unto com Puy (ebord foi um dosprincipais articuladores do movimento político e artístico conhecido como 1nternacional;ituacionista que durante a d+cada de HIN e#erceu grande influ$ncia nas jornadasestudantis e oper"rias de HINK, na 0ran&a .

    ;eu livro 6 rte de =iver 8ara as 9ovas Pera&%es6 junto com a 5;ociedade do Espet"culo, de(ebord , constitui- se como uma das mais importantes obras escritas no s+culo 22 e que at+hoje influ$ncia os movimentos libert"rios em todo o mundo .