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ISSN 2176-185X Autor José Maria de Souza Júnior Bacharel em Relações Internacionais pelas Faculdades Integradas Rio Branco e mestrando pelo programa de integração da América Latina (Prolam) da Universidade de São Paulo (USP). Resumo O presente artigo tem como objetivo mostrar o tratamento despendido à Educação Superior na agenda de integração do MERCOSUL. Analisando documentos oficiais (atas, acordos e planos estratégicos) e trabalhos acadêmicos retomar-se-á a criação do Setor Educacional do MERCOSUL (SEM) e suas iniciativas no sentido de criar uma área de internacionalização da educação superior na região. A partir de programas de acreditação de currículo como o MEXA (acreditação experimental) e o ARCU-SUL (acreditação permanente) e o programa MARCA (mobilidade acadêmica para cursos de graduação) é possível observar a internacionalização da educação na região. Conclui- se que este movimento é lento, porém contínuo no processo de integração regional aqui tratado. Palavras-chave Integração Regional, MERCOSUL, Educação Superior, Mobilidade Acadêmica. A educação superior na agenda de integração do MERCOSUL: os programas promovidos pelo SEM José Maria de Souza Júnior ANO 1, VOL 1, JAN/JUL 2011 O Autor agradece à Fapesp e a Fundação dos Rotárianos pelo apoio dado à pesquisa de iniciativa científica “Intercâmbio Universitários no âmbito do mercosul” (2009-2010)

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ISSN 2176-185X

AutorJosé Maria de Souza JúniorBacharel em Relações Internacionais pelas Faculdades Integradas Rio Branco e mestrando pelo programa de integração da América Latina (Prolam) da Universidade de São Paulo (USP).

ResumoO presente artigo tem como objetivo mostrar o tratamento despendido à Educação Superior na agenda de integração do MERCOSUL. Analisando documentos oficiais (atas, acordos e planos estratégicos) e trabalhos acadêmicos retomar-se-á a criação do Setor Educacional do MERCOSUL (SEM) e suas iniciativas no sentido de criar uma área de internacionalização da educação superior na região. A partir de programas de acreditação de currículo como o MEXA (acreditação experimental) e o ARCU-SUL (acreditação permanente) e o programa MARCA (mobilidade acadêmica para cursos de graduação) é possível observar a internacionalização da educação na região. Conclui-se que este movimento é lento, porém contínuo no processo de integração regional aqui tratado.

Palavras-chaveIntegração Regional, MERCOSUL, Educação Superior, Mobilidade Acadêmica.

A educação superior na agenda de integração do MERCOSUL: os programas promovidos pelo SEM

José Maria de Souza Júnior

ANO 1, VOL 1, JAN/JUL 2011

O Autor agradece à Fapesp e a Fundação dos Rotárianos pelo apoio dado à pesquisa de iniciativa científica “Intercâmbio Universitários no âmbito do mercosul” (2009-2010)

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Perrota (2008) alega que o MERCOSUL é um processo de integração onde a economia e o comércio são os objetivos predominantes.

Contudo, a autora aponta que o avanço nestas áreas ficou prejudicado no final da década de 90 devido a crises e disputas entre os membros do bloco. Para Perrota (2008), apesar das dificuldades sofridas na principal área de atuação da integração regional de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, houve áreas que, mesmo não sendo o principal foco, pôde-se observar certo avanço – esta área seria a educação. Em outras palavras, apesar das dificuldades sofridas no processo de integração do MERCOSUL na parte da economia, do ponto de vista da educação o processo de integração tem tido alguns avanços desde a criação do bloco.

Assim, pretende-se com o presente artigo demonstrar e analisar a evolução institucional no MERCOSUL no que se refere à educação superior. As iniciativas promovidas pelo Setor Educativo do MERCOSUL (SEM) e seus respectivos acordos serão importantes para evidenciar tal evolução. Nominalmente, os principais acordos são: o MEXA (Mecanismo Experimental de Acreditação para Cursos de Graduação1), o Sistema ARCU-SUL (Sistema de Acreditação com caráter permanente) e, principalmente, o MARCA (Programa de Mobilidade Acadêmica para Cursos Credenciados) que é o programa que promove a mobilidade propriamente dita de alunos de graduação. Além destes acordos, os Planos Trienais e Planos Estratégicos do SEM são relevantes por tratar do tema da educação superior na integração regional do bloco.

Utilizando trabalhos acadêmicos e documentos oficiais do MERCOSUL procurar-se-á verificar a evolução da integração no âmbito da educação superior, especialmente os cursos de graduação. Analisando as metas e objetivos dos dois Planos Estratégicos (2001-2005 e 2006-2010) tentar-se-á também evidenciar se tais planos cumpriram com as metas propostas com relação à educação superior de uma forma geral e, especificamente, ao que se refere ao intercâmbio e mobilidade estudantil na graduação.

Será retomado o processo de inclusão da educação superior na agenda da integração. Para isso, mostrar-se-á a criação do SEM e seus Planos Trienais. Estes planos foram os primeiros documentos a criarem normas comuns aos sistemas educativos dos Estados membros e associados do bloco.

Os Planos Estratégicos (de 2001 a 2005 e de 2006 a 2010) são importantes por terem metas a cumprir com relação à educação superior regional. Estes planos tem

maior densidade que os Planos Trienais e tratam de questões mais práticas como a acreditação de cursos e a mobilidade.

Por fim, serão apresentados o Programa MEXA (programa provisório de acreditação), o Sistema ARCUSUL (sistema permanente de acreditação) e o Programa MARCA (programa de mobilidade de graduação). Estes são os avanços mais concretos em termos de internacionalização da educação no MERCOSUL. Estas iniciativas serão tratadas a fim de testar a hipótese central do presente artigo: mesmo sendo um tema marginal no processo de integração, a educação, em termos institucionais, teve uma evolução contínua no Mercosul. Em outras palavras, apesar de lenta, esta evolução não sofreu rupturas ou retrocessos que podem ter ocorrido em outras áreas da integração.

O SEM – A educação no processo de integração regional

O Tratado de Assunção, que foi assinado no dia 26 de março de 1991, iniciou o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). O conteúdo deste documento é estritamente econômico-comercial, ou seja, trata do início da formação do mercado comum em suas questões técnicas de redução tarifária, seus mecanismos, estrutura, etc.

No entanto, além dos aspectos econômicos e financeiros, os membros do bloco buscaram ampliar o debate para outras áreas. Neste sentido, o Protocolo de Intenções foi assinado pelos Ministros da Educação da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, em Brasília, no dia 13 de dezembro de 1991. O referido Protocolo deu origem ao Setor Educativo do MERCOSUL (SEM). O SEM, por sua vez, tem o propósito de demonstrar o comprometimento dos Ministérios da Educação na agenda educacional no âmbito regional (MERCOSUL, 1991). Assim, o documento ressalta a importância da educação na integração e revela a necessidade dos sistemas educacionais, em todos os níveis, manterem contato entre si e criarem canais de diálogo, garantindo tanto a qualidade da educação oferecida quanto a convergência dos sistemas de educação dos Estados. Não obstante, o documento ressalta também que a diversidade nacional deve ser preservada.

Do ponto de vista da teoria funcionalista de integração regional, a intenção de aglutinar os sistemas de educação superior dos membros do MERCOSUL pode ser entendida como uma iniciativa para se criar um tipo de padronização nesta

1 Na bibliografia analisada, o referido acordo foi denominado de formas diferentes, estando entre elas: Mecanismo Experimental de Credenciamento de Cursos para o Reconhecimento de Títulos de Graduação Universitária nos Países do MERCOSUL (SOARES, 2009), Mecanismo Experimental de Credenciamento do Setor Educacional do MERCOSUL (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2005).

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Organograma do SEM em relação ao MERCOSUL:

Para compreender a evolução do SEM é necessária a análise dos documentos oficiais do organismo (decisões, planos, tratados, acordos e atas disponíveis no sítio do Setor Educacional do MERCOSUL), pois existe uma escassa literatura que analisa este processo. O texto de Soares (2009) apresenta um balanço sucinto e descritivo que busca complementar e analisar. De acordo com a autora, o Primeiro Plano Trienal que vigorou de 1992 a 1994 tinha como objetivo: “1 – formação de consciência social favorável ao processo de integração; 2 – capacitação de recursos humanos para contribuir para o desenvolvimento e; 3 – compatibilização e harmonização dos sistemas educacionais” (SOARES, 2009, p. 7). Este Plano foi prorrogado (MERCOSUL, 1997a) até o ano de 1998, quando foi lançado o Segundo Plano Trienal. No período de vigência do Primeiro Plano Trienal foram firmados acordos que diziam respeito à pós-graduação e em 1999 foram emitidas a Decisão 04/99 “Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Países Membros do MERCOSUL” e a Decisão 05/99 “Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados Partes do MERCOSUL, na República da Bolívia e na República do Chile” (MERCOSUL, 1999). Assim, estes acordos foram os primeiros movimentos no sentido de harmonizar os sistemas de ensino superior nos Estados membros e Estados Associados (Chile e Bolívia) do MERCOSUL.

O Segundo Plano Trienal que vigorou de 1998 a 2000 (SOARES, 2009) previa a melhora da educação de um modo geral e, novamente, a maior integração entre os Estados respeitando princípios democráticos, a diversidade (soberania e a autodeterminação) e a equidade (maior acesso à educação). A formação de recursos humanos para a implantação dos mecanismos para atingir os objetivos propostos também era ressaltada no documento. Tal formação previa estudos para identificar as carências da região em termos de mão-de-obra; a aplicação de tecnologias avançadas no

área. Segundo Mitrany (1975 apud BRAILLARD, 1990, p. 570) a cooperação pode ser atingida mais facilmente em atividades técnicas. Um dos conceitos centrais do Funcionalismo desenvolvido pelo autor é a cooperação funcional que representa a padronização em atividades técnicas. Neste sentido, a educação superior é vista como tal atividade, onde se busca a referida padronização. A criação do SEM e as iniciativas posteriores representam a tendência de criar práticas comuns na educação no âmbito do MERCOSUL. Como já dito, a educação não é a área prioritária da integração regional do bloco, no entanto, pode-se aplicar o conceito de Mitrany ao processo de inclusão da educação superior no âmbito da integração regional.

De acordo com o Protocolo de Intenções, os Ministros da Educação se comprometeram a manter reuniões no mínimo semestrais, mas ressaltaram que reuniões poderiam ser convocadas, quando necessário. O Protocolo prevê ainda que é necessária, de forma geral, uma melhora na capacitação de mão-de-obra e de docentes nas instituições de ensino da América Latina. No caso dos países do MERCOSUL, o debate sobre a qualificação de profissionais apresenta tanto objetivos econômicos, quanto sociais. Em sociedades marcadas pela desigualdade econômica e social, a educação tem dupla função: de um lado visa a melhora da formação educacional geral da sociedade; por outro lado, tem forte impacto no desenvolvimento econômico.

A partir das análises das atas das primeiras Reuniões de Ministros da Educação (RME) (MERCOSUL, 1996; MERCOSUL, 1992) fica clara a percepção da importância da educação para o desenvolvimento de um país e para o sucesso de um processo de integração regional. As reuniões dos Ministros da Educação são consideradas como o topo da hierarquia do setor educacional do MERCOSUL, sendo subordinado ao Conselho do Mercado Comum fazendo parte da Reunião de Ministros / Altas Autoridades.

A RME propõe estratégias gerais de trabalho, tendo, por sua vez, como subordinado o Comitê Coordenador Regional (CCR) que propõe políticas de integração e cooperação na área educacional. Abaixo do Comitê Coordenador Regional estão as Comissões Técnicas que atuam nas áreas da educação básica, técnica e superior auxiliando na implantação de estratégias e na definição dos mecanismos para realização dos objetivos definidos nos planos de ação. Ainda existem grupos ad hoc que desempenham funções específicas e temporárias para execução de projetos (SOARES, 2009). O SEM está organizado da seguinte forma:

Elaboração própria. Fonte: Soares, 2009; Ministério das Relações Exteriores, 2010.

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ensino para capacitação de discentes e docentes; mais rapidez e melhor formação dos professores e dos gestores educacionais; melhora na qualidade da educação através da participação dos atores educacionais aproveitando os espaços da integração para criar mecanismos adequados no nível de coordenação e execução; e a promoção de cultura e mecanismos de avaliação, que incluam o intercâmbio de experiências e o estímulo ao estabelecimento de indicadores comuns, possibilitando conhecer a evolução da educação no MERCOSUL (MERCOSUL, 1997b).

Além do Segundo Plano Trienal, o documento denominado “MERCOSUL 2000” também orientava os trabalhos do SEM, tendo sido lançado em 1997, pregava novamente a maior aproximação entre os sistemas de ensino dos Estados e recomendava (assim como outros documentos) a formação de um sistema de informação sobre a educação na região sendo que este serviço seria para consulta do público.

É preciso ressaltar que os acordos mencionados

visavam ao reconhecimento de títulos para as atividades acadêmicas e não para exercício da profissão. Além disso, as decisões prevêem que a implantação dos acordos seria feita a partir de recomendações emitidas pela Reunião de Ministros da Educação. Assim, os documentos indicam a intenção de criar laços entre os diferentes sistemas de ensino superior, mas a implementação seria negociada posteriormente.

Perrota (2008) alega que um dos maiores progressos da inserção da educação no processo de integração regional do MERCOSUL foi o Mecanismo Experimental de Acreditação (credenciamento) para Cursos de Graduação, mais conhecido como MEXA que se iniciou em 1998. Soares (2009, p. 7) ressalta que:

O credenciamento é o processo mediante o qual se outorga validade pública, de acordo com as normas legais nacionais, aos títulos universitários, garantindo que os cursos correspondentes cumpram com requisitos de qualidade previamente estabelecidos no âmbito regional. Este processo estará baseado em mecanismos de avaliação que permitam garantir a devida formação dos titulados.

Os cursos inclusos no MEXA eram das áreas de agronomia, medicina e engenharia2. O credenciamento se dava de forma que as universidades e os programas eram avaliados por Agências Nacionais Credenciadoras. A avaliação abrangia o corpo docente, a biblioteca, a infra-estrutura de serviços e os laboratórios. Em outras palavras, este processo buscava garantir que todos os cursos aprovados no programa estariam em um patamar semelhante no que dizia respeito à qualidade (SOARES, 2009).

A próxima seção se dedica aos Planos de Ação lançados pelo SEM a partir de 2001, que se subdividem em dois períodos – de 2001 a 2005 e de 2006 a 2010. Estes planos eram mais densos e previam metas a serem cumpridas pela organização.

Os Planos Ação: objetivos a serem alcançados pelo SEM

O Plano de Ação do SEM orientava as ações do órgão no período de 2001 a 2005. O documento continha: desafios, princípios orientadores, objetivos estratégicos e estratégias de ação, além de ter planos de ação para a educação básica, educação tecnológica e educação superior. Neste trabalho, serão analisados os temas que dizem respeito à educação superior.

O Plano Ação enfatiza a importância da educação na integração regional do bloco como um todo, mostra a intenção de ajudar na promoção de educação igualitária e manifesta vontade de formar consciência favorável a integração.

A mobilidade aparece como um importante fator

em um dos Princípios Orientadores: “A mobilidade e intercâmbio de atores educativos para o desenvolvimento e fortalecimento de redes e experiências” (MERCOSUL, Plano Estratégico 2001- 2005, p. 4); e em uma das Estratégias de Ação: “A circulação de atores educativos com o objetivo de favorecer o intercâmbio de experiências educativas e culturais” (MERCOSUL, Plano Estratégico 2001- 2005, p. 5).

Em seu plano de ação3, o documento ressalta a importância do Comitê Coordenador Regional (CCR) que é a chave de articulação do SEM e tem como funções: 1) coordenar a agenda estratégica do SEM; 2) promover as relações entre o SEM e as outras instâncias internacionais de educação e do MERCOSUL; e 3) criar um sistema de financiamento do SEM para garantir recursos para a implantação das suas linhas de ações.

Com relação à Educação Superior, o plano inclui a formação de um espaço acadêmico regional e a melhora constante de sua qualidade, assim como a formação de recursos humanos para tratar da Educação Superior em âmbito regional.

As iniciativas gerais do plano seriam para três áreas: 1- acreditação (que facilitaria a mobilidade, pois gera maior compatibilidade entre as grades curriculares); 2- mobilidade (que depende de um espaço comum regional e pretende incluir a mobilidade estudantil, acreditação, intercâmbios de docentes e pesquisadores) e; 3- cooperação interinstitucional (reconhecendo que

2 Engenharias: civil, mecânica, química, elétrica, eletrônica e industrial.3 Aqui se trata de um dos tópicos do documento e não do nome do documento em si.

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Estas metas reafirmam os compromissos assumidos anteriormente e prevêem mais avanços e convergência entre os sistemas educacionais dos Estados membros e associados do MERCOSUL.

Já o Plano de Ação (2006-2010) é consideravel-mente mais longo tendo propostas mais ambiciosas para as três áreas da educação: básica, tecnológica e superior. O documento, a partir do balanço histórico das atividades do SEM, redefine os objetivos estraté-gicos no âmbito da integração:

1 Contribuir para a integração regional acordando e executando políticas educativas que promovam uma cidadania regional, uma cultura de paz e respeito a democracia, aos direitos humanos e ao meio ambiente. 2 Promover educacão de qualidade para todos como fator de inclusão social, de desenvolvimento humano e produtivo. 3 Promover a cooperação solidária e o intercâmbio, para a melhora dos sistemas educativos. 4 Impulsionar e fortalecer programas de mobilidade de estudantes, estagiários, docentes, investigadores, gestores e profissionais. 5 Concertar políticas que articulem a educação com o processo de integração do MERCOSUL. (MERCOSUL, Plan Estratégico 2006 – 2010, tradução nossa).

O plano reafirma os propósitos iniciais do SEM, ou seja, a educação é um elemento importante para o avanço da integração geral e promoção do desenvolvimento regional. Contudo, algumas das metas são de difícil aferição com relação ao seu sucesso. Em outras palavras, como medir se após a vigência do plano estão sendo executadas ações no sentido de: “Contribuir para a integração regional acordando e executando políticas educativas que promovam uma cidadania regional, uma cultura de paz e respeito à democracia, aos direitos humanos e ao meio ambiente?” Quais políticas educativas promovem a cidadania regional e o respeito ao meio ambiente, por exemplo?

Com relação à meta número 2, observa-se que a educação é um fator de inclusão social, desenvolvimento humano e produtivo. No entanto, o que significa “educação para todos”? Não há uma especificação do público que será atingido, ou seja, a meta se refere a todos os habitantes do país / bloco, ou de uma certa faixa etária, ou há uma porcentagem que eles determinam para que seja inclusa no(s) sistema(s) de educação superior.

Entretanto, algumas metas apresentam indicadores claros. Esse é o caso da meta número 3, pois envolve a análise dos dados referentes ao volume de intercâmbio. O mesmo se apresenta com relação à meta número

Tabela 1: MERCOSUL, Plano Estratégico 2001-2005, tradução nossa.

os atores centrais do processo de integração na área de educação são as próprias instituições educacionais, objetiva-se aproveitar as experiências que estas já tem ou estão tendo e estimulá-las assim como promover novas ações na graduação e pós-graduação).

As metas do plano em cada área eram:

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4, que se refere ao aumento da quantidade de mobilidade feita intrabloco. Por sua vez, a meta número 5 é pouco específica, mas é possível, ao longo do tempo, avaliar se “políticas públicas que articulem a educação com o processo de integração” foram ou não concertadas.

Nesses casos, as metas podem ser vistas como princípios gerais. Não se cogita aqui retirar a importância de objetivos gerais, mas indicar a complexidade de constatar se eles foram ou não alcançados nas ações implementadas. Assim, a análise das iniciativas do Programa MARCA (Programa de Mobilidade Acadêmica para Cursos Credenciados) se torna importante para aferir a evolução geral do SEM e alguns dos pontos dos Planos tanto de 2001- 2005 quanto de 2006-2010. Neste sentido, busca-se avaliar os progressos do Programa de forma geral e não comparando exatamente com as metas do Plano de Ação 2006-2010.

Os Programas MEXA, ARCU-SUL e MARCA4

O Plano de 2006 a 2010 ressalta os avanços do MEXA e do MARCA (Programa de Mobilidade Acadêmica para Cursos Credenciados). O documento enfatiza que os progressos feitos com estes programas devem ser utilizados como experiência da concepção e aplicação de programas futuros que ajudem a integração regional no âmbito da educação superior.

A primeira iniciativa de mobilidade do MARCA

ocorreu no segundo semestre de 2006. Os cursos que foram previamente aprovados no MEXA poderiam fazer parte do programa que visa ao intercâmbio de estudantes de graduação por períodos letivos regulares de um semestre acadêmico. Os cursos participantes eram das áreas de agronomia, engenharia e medicina. No entanto, as instituições de ensino não necessariamente participam nas três áreas, ou seja, algumas instituições só participam com o curso de Medicina (como, por exemplo, o Instituto CEMIC da Argentina) ou de engenharia química (como a Universidade Estadual de Campinas – Unicamp).

O MEXA era, no entanto, o mecanismo experimental e acabou sendo sucedido pelo Sistema ARCU-SUL. O Sistema ARCU-SUL foi aprovado em novembro de 2006 como um sistema de acreditação permanente (MERCOSUL, 2006) e durante a XXXIV RME (junho de 2008), os Ministros acordaram elevar ao Conselho Mercado Comum projeto de decisão para a criação efetiva do Sistema, que tornou-se a Decisão CMC 17/08, aprovada em julho de 2008. Segundo Soares (2009, p. 17), o credenciamento dos cursos passou a ter

vigência de 6 anos e os cursos autorgados previamente pelo MEXA tiveram sua validade reafirmada.

O Plano de Implementação do Sitema ARCU-SUL prevê a expansão até 2010 para as áreas de Arquitetura, Enfermagem, Odontologia e Veterinária. Já em 2008 foram emitidas novas convocatórias para acreditação em Agronomia e Arquitetura. No ano de 2010 o curso de arquitetura foi incluído no programa de mobilidade. Como pode ser visto no sítio do Ministério da Educação, o referido sistema lança editais convocando os cursos a se inscreverem para a obtenção da acreditação (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2010). Assim, os cursos passam por avaliações para aferir sua qualidade, uma questão importante quando se trata de acreditação.

De acordo com os formulários de inscrição disponíveis no sítio do Programa MARCA (PROGRAMA MARCA, 2009), os alunos dos cursos previamente aprovados no MEXA / ARCU-SUL que aspiram ao intercâmbio do programa MARCA devem ter completado 40% de seu respectivo curso. O aluno deve requerer sua vaga na universidade pretendida e cabe a esta a aceitação do intercambista. No requerimento devem constar as matérias que o pretendente irá cursar na universidade de destino e as matérias a serem reconhecidas na universidade de origem.

A universidade de origem do aluno se prontifica a reconhecer os créditos cursados no intercâmbio, desde que o aluno seja aprovado nas respectivas disciplinas. Os custos relativos à viagem do aluno são de responsabilidade do governo de seu país de origem e a modalidade do traslado cabe à escolha de cada Estado. Os alunos devem, obrigatoriamente, possuir seguro médico internacional para viajarem. Segundo a instrução para os alunos, a estadia e alimentação durante o período do intercâmbio ficam a cargo do governo receptor. No entanto, há um formulário que deve ser assinado pela instituição receptora comprometendo-a a fornecer moradia e alimentação para os intercambistas que vierem a receber.

A iniciativa de acreditação de disciplinas de cursos promovida pelo MEXA /ARCU-SUL mostram a intenção de se criar padronização do ponto de vista da teoria Funcionalista de integração regional. O início do movimento em direção a tal padronização é um importante indício da evolução da questão educacional no processo de integração do MERCOSUL. A mobilidade praticada pelo Programa MARCA ajuda a corroborar a evolução do Setor Educacional do MERCOSUL. A expansão dos programas pode ter uma tendência a ser mais lenta que o previsto pelos documentos, uma vez que os cursos previstos para

4 As informações sobre os mecanismos do processo foram retiradas da análise dos formulários de inscrição, disponíveis no site do MARCA: www.programamarca.siu.edu.ar. Acesso em 09/2009.

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fazer parte do programa em 2010 ainda não foram devidamente inclusos. Entretanto, não pode se negar que já foi praticada a mobilidade e que existe transferência e validação de créditos em programas de educação superior realizados no bloco regional.

Portanto, os programas MEXA, MARCA e Sistema ARCU-SUL representam a internacionalização da educação superior no MERCOSUL. A educação superior foi incluída desde o início dos debates do bloco e pode-se evidenciar que a partir daí houve incremento das práticas com relação à este assunto no decorrer do tempo, pois hoje tem-se transferência de créditos e mobilidade de estudantes de graduação entre universidades de Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.

Considerações Finais

No presente artigo procurou-se retomar a criação do MERCOSUL e a inserção da educação neste processo. O MERCOSUL é um arranjo de integração regional voltado para questões econômicas que promoveriam o desenvolvimento dos países que fazem parte do bloco. Com a criação do Setor Educacional do MERCOSUL (SEM) fica clara a intenção de inserir a educação no contexto da integração. Os primeiros documentos oficiais do SEM (Protocolo de Intenções, atas das Reuniões de Ministros da Educação e decisões) mostram a percepção de que a educação é fundamental para ajudar no desenvolvimento do projeto de integração e no desenvolvimento social e econômico da região em questão. Neste sentido, percebe-se a dupla utilidade da educação: em um primeiro momento serve para o desenvolvimento social e econômico de uma forma geral, ou seja, os Estados devem promover a educação para se desenvolver mesmo que seja individualmente; em segundo lugar a educação também é vista como benéfica para o processo de integração, uma vez que a qualidade dos sistemas educacionais e o contato entre tais sistemas do bloco podem garantir a qualidade educacional e criar um sentimento comum entre as sociedades do MERCOSUL.

A evolução econômica do MERCOSUL não é linear, tendo sofrido com algumas crises ao final da década de 90. Apesar disso, Perrota (2008) defende que em outros aspectos o MERCOSUL evoluiu – um destes aspectos, para a autora, é a educação. Neste artigo foram analisados documentos oficiais e trabalhos acadêmicos sobre o Setor Educacional do MERCOSUL e pode-se constatar que houve

certa continuidade nas reuniões dos Ministros da Educação e nas iniciativas de comunicação entre os sistemas educacionais e até mesmo convergência dos respectivos sistemas em alguns casos – o MEXA (Mecanismo Experimental de Credenciamento) e o ARCU-SUL, neste sentido representam a tentativa de criar um sistema de acreditação de disciplinas em diferentes instituições dos Estados que compõem o bloco.

Os dois Planos de Ação do SEM confeccionados para a presente década (2001-2005 e 2006-2010) são importantes para observar as intenções da instituição e o aprofundamento da abrangência de seus serviços. Os documentos possuem algumas metas claras cujo sucesso é de fácil mensuração. Um exemplo é que se uma das metas diz “promover o intercâmbio”, basta aferir se tal intercâmbio foi realizado. Não obstante, outras metas são compreendidas mais no sentido de princípios gerais, como, por exemplo “promover a educação para todos”, que, por sua vez é um princípio válido, mas de verificação mais complexa ao término do plano de ação, pois de que “todos” se está falando?

Apesar da imprecisão do documento em alguns pontos, é possível observar progresso no SEM, pois a instituição promove o intercâmbio entre cursos de graduação desde 2006 nas áreas de agronomia, desde 2008 em engenharia e medicina. Em 2010 será a primeira vez que alunos do curso de arquitetura participarão do intercâmbio. Estes cursos foram previamente aprovados no Sistema ARCU-SUL e podem ter seus alunos estudando disciplinas em outras instituições participantes do programa através do Programa MARCA (Mobilidade Acadêmica para Cursos Credenciados). Os cursos de odontologia e veterinária estão no processo de adesão.

Desta forma, pode-se afirmar que a internacio-nalização da educação superior tem sido fomentada pelo MERCOSUL. A educação não é o principal ob-jetivo do bloco e a evolução deste tema se dá de for-ma lenta, porém contínua, no processo de integração. Programas como o MEXA, o Sistema ARCU-SUL e o MARCA são importantes no sentido de ampliar o incentivo à internacionalização e a mobilidade aca-dêmica no MERCOSUL.

De qualquer forma, estudos mais específicos mostrando o fluxo de alunos participantes do intercâmbio e o número de instituições que tem seus cursos validados são necessários para avaliar a relevância do Programa em um contexto geral de educação superior nos países do MERCOSUL.

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