A EFETIVIDADE DA RESSOCIALIZAÇÃO POR MEIO DA ASSISTÊNCIA NA EXECUÇÃO PENAL

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É com satisfação que disponibilizo meu trabalho de conclusão de curso, construído ao longo de minha vida acadêmica, e que alicerça e exterioriza alguns valores pessoais.Desejo que seriva de norte, não apenas acadêmico, mas social.Que possamos um dia vivenciar a aplicabilidade dos institutos assistencias previstos na Lei de Execuções Penais - LEP.

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  • KAMILA MICHIKO TEISCHMANN

    A EFETIVIDADE DA RESSOCIALIZAO POR MEIO DA

    ASSISTNCIA NA EXECUO PENAL

    UNIC/IUNI UNIVERSIDADE DE CUIAB

    FACULDADE DE DIREITO CAMPUS PANTANAL

    CUIAB MT

    2012

  • KAMILA MICHIKO TEISCHMANN

    A EFETIVIDADE DA RESSOCIALIZAO POR MEIO DA

    ASSISTNCIA NA EXECUO PENAL

    Monografia apresentada pela

    acadmica Faculdade de Direito da

    Universidade de Cuiab / UNIC/IUNI -

    Campus Pantanal, como critrio para

    aceite no programa de ensino de

    graduao no curso de Direito - ano

    2012, para desenvolvimento do

    Trabalho de Concluso de Curso II do

    8. Semestre Noturno.

    Professor orientador: Esp. Danilo Galadinovic Alvim

    CUIAB - MT

    2012

  • APRECIAO

    ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________

  • DEDICATRIA

    Dedico este trabalho a todos que lutam

    diuturnamente pela concretizao da, hoje

    utpica, ideia de recuperao do ser

    humano, dentro e fora do sistema

    penitencirio.

  • AGRADECIMENTO

    Agradeo profundamente a meus familiares

    pela educao social que me deram.

    Agradeo pelas vitrias e principalmente

    pelo modo com que me ensinaram a

    enxergar as derrotas, que nos fizeram ainda

    maiores. Agradeo de todo o corao.

  • EPGRAFE

    Costuma-se dizer que ningum conhece

    verdadeiramente uma nao at que tenha

    estado dentro de suas prises. Uma nao

    no deve ser julgada pelo modo como trata

    seus cidados mais elevados, mas sim pelo

    modo como trata seus cidados mais

    baixos".

    (MANDELA, Nelson)

  • SUMRIO

    INTRODUO ................................................................................................ 09

    CAPTULO I

    A ORIGEM DA PENA, SUAS TEORIAS E EVOLUO HISTRICA

    1.1 A origem da pena e sua aplicao como controle social ............................ 10

    1.2 A luz do iluminismo nas Escolas Clssica e Positivista .............................. 14

    1.3 Teorias das penas e a ordem jurdica brasileira ......................................... 17

    CAPTULO II

    SISTEMAS PRISIONAIS

    2.1 Sistema Pensilvnico ................................................................................ 21

    2.2 Sistema Auburniano .................................................................................. 22

    2.3 Sistema Progressivo .................................................................................. 23

    2.4 Comparaes entre os sistemas e seus resultados prticos ..................... 25

    CAPTULO III

    DAS ESPCIES DE ASSISTNCIA NA EXECUO PENAL

    3.1 A assistncia e sua importncia na funo social da pena ....................... 26

    3.2 Assistncia Material .................................................................................. 27

    3.3 Assistncia Sade .................................................................................. 29

    3.4 Assistncia Jurdica ................................................................................... 33

    3.5 Assistncia Educacional ............................................................................ 36

    3.6 Assistncia Social ..................................................................................... 40

    3.7 Assistncia Religiosa ................................................................................. 42

    3.8 Assistncia ao Egresso ............................................................................. 46

    CAPTULO IV

    ASSOCIAO DE PROTEO E ASSISTNCIA AO CONDENADO APAC

    4.1 O surgimento da APAC ............................................................................. 49

    4.2 O mtodo ................................................................................................... 50

    4.3 Resultados alcanados ............................................................................. 53

  • CONSIDERAES FINAIS ............................................................................. 55

    REFERNCIAS ............................................................................................... 57

  • LISTA DE TABELA Tabela n 1 ... Tabela comparativa: APAC x Presdio Comum .................. 53

  • INTRODUO

    A lastimvel situao em que se encontra o sistema penitencirio

    brasileiro foi o que originou o presente estudo, na nsia de obter meios que

    apontem uma sada efetiva no cumprimento da finalidade da pena, que alm da

    aplicao da sentena/disposio criminal, deve propiciar condies para a

    harmnica integrao social do preso.

    Frente ao vertiginoso aumento da populao carcerria e da patente

    ausncia de recuperao dos presos, questiona-se se a Lei de Execuo Penal

    (Lei n 7.210/84 LEP) falha ou se a aplicao da mesma que no

    realizada, questo que ser elucidada no desenvolver do presente trabalho.

    Diante de tal celeuma na busca por opes que revitalizem o

    sistema penitencirio, ser minuciado de que forma a aplicao do instituto da

    assistncia, existente na LEP, pode recuperar e oferecer ao preso e sociedade

    uma sada diante do caos penitencirio atual. Nesse sentido, ser demonstrado

    porque o mtodo APAC (Associao de Proteo e Assistncia ao Condenado)

    vem se consolidando como uma sada na execuo penal, uma vez que, dentre

    outros fatores positivos, evidenciam esperanosos ndices de ressocializao.

    O reflexo causado pela diminuio da reincidncia na sociedade

    ntido, sendo esses econmicos e sociais, em razo da subtrao da populao

    carcerria e consequentemente dos gastos pblicos de manuteno e

    sustentao dos segregados, e das bvias perdas que ocorrem em razo de

    furtos cometidos pelos reincidentes, materiais ou vitais, trazendo de volta a paz

    social por meio da atenuao da reincidncia.

    Pela breve exposio acerca do presente, verifica-se a urgncia de

    ao do Estado brasileiro quanto s mudanas no sistema penitencirio atual ou,

    a efetiva aplicao da Lei de Execuo Penal, meio pelo qual poder se tornar

    possvel a reabilitao social, urgindo a necessidade de relembrar aos

    segregados, e a toda a sociedade, que aqueles que l se encontram privados de

    sua liberdade, no podem ser privados de sua dignidade, devendo ser fornecidos

    os meios que possibilitem o efetivo processo de humanizao e recuperao dos

    encarcerados.

  • 10

    CAPTULO I

    A ORIGEM DA PENA E SUA EVOLUO HISTRICA

    1.1. A origem da pena e sua aplicao como controle social

    O conceito de Direito Penal est intimamente ligado com a sano

    penal, isso porque esse s existe como forma de satisfao daquele, ou seja, o

    Direito Penal surgiu justamente para frear a violncia e desrespeito crescentes h

    milnios e, para tanto, devia-se aplicar uma sano penal ao autor da infrao de

    forma proporcional ao mal causado, surgindo nesse contexto a primeira

    demonstrao do efeito ao reao com a edio da Lei de Talio, no Cdigo

    de Hamurabi (sc. XXIII a.C.), pregando o princpio amplamente difundido atravs

    dos tempos.

    O Cdigo de Hamurbi um conjunto de leis criadas na Mesopotmia, por volta do sculo XVIII a.C, pelo rei Hamurbi da primeira dinastia babilnica. O cdigo baseado na lei de talio, olho por olho, dente por dente. Cdigo Hamurbi - que tinha o objetivo de dar disciplina vida econmica e garantir a propriedade privada e ordem na sociedade. Baseava-se em um princpio bem prtico olho por olho e dente por dente, este era o princpio de Talio, onde o castigo ou punio do criminoso deveria ser equivalente ao crime cometido.

    1

    Diga-se de passagem, ntido que a ideia de proporo estava

    absolutamente equivocada, comparada aos dias atuais, sendo realizada naquela

    poca verdadeira crueldade e de pouqussimos resultados prticos.

    Deste modo, nota-se que o contexto do surgimento do Direito Penal

    era outro, onde a sociedade dava os primeiros passos a disciplinar as relaes

    jurdicas existentes, havendo o conceito arcaico e, infelizmente, ainda

    evidenciado, de sano penal com o carter retribucionista, onde o criminoso

    deveria ser punido de forma a servir de exemplo, pouco importando as

    circunstncias do crime.

    Assim, verifica-se que as sanes aplicadas eram cruis, brutais e

    sem qualquer finalidade de fato, tanto sociedade quanto ao agente do delito,

    1 OLIVEIRA, Jos Fabrcio de. Histria. Disponvel em:

    . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 11

    servindo apenas para causar a impresso de controle das situaes que eram

    repelidas pelas sociedades formadas.

    Nesse contexto, os agrupamentos comunitrios foram surgindo, e

    como era de se esperar em se tratando da raa humana, gerou inmeros

    conflitos, que necessitavam de controle, ainda que fosse um conjunto de regras

    baseado em suposies e entidades superiores de existncia mais que duvidosa.

    Muito embora possa parecer tola a ideia do direito atrelado s divindades,

    naquela poca fazia muito sentido e, certamente devemos agradecer por essa

    vinculao, tendo em vista ter sido o primeiro passo para a tipificao das

    condutas que hoje conhecemos.

    Os agrupamentos humanos se tornaram mais numerosos, comportando uma exploso demogrfica que originou as primeiras cidades e, posteriormente, as primeiras civilizaes. Este aumento das populaes humanas criou rivalidade entre grupos humanos, fazendo nascer a figura do guerreiro e organizaes militares para proteger ou tomar recursos e terras.

    2

    Diante da convivncia comunitria e dos conflitos advindos dessa,

    surgiu a chamada Vingana Privada. Sempre que ocorria ciso e divergncia de

    posies e at mesmo agresses fsicas, impunha-se a vontade do outro pela

    fora e obedecia-se pelo medo.

    Ocorrendo esse fato natural do ser humano sua populao comeava a ter conflitos de interesses no podendo aquela pequena comunidade viver sem distines de classes, havendo uma primeira ciso no grupo social, dividindo-os em aqueles que mandam seja atravs da fora, e os que obedecem, pelo medo. Assim inicia-se todo um perodo que passou a ser conhecido vingana privada. Esse perodo que inicia a historia do homem marcado pela falta de um sistema estruturado da prpria sociedade primitiva no possuindo princpios gerais visto que esta mesma organizao primitiva era envolta em um ambiente primitivo cheio de crendices e muita religiosidade.

    3

    2 RAMOS, Fbio Pestana. O surgimento do homem, os primeiros agrupamentos sociais e o

    aparecimento das famlias. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012. 3 NORONHA, Magalhes. Perodo da Vingana Privada. Disponvel em:

    . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 12

    Nesse panorama, a vingana privada nada mais era do que a forma

    encontrada para conter e impor determinadas convices de modo arbitrrio,

    tendo em vista a ausncia de estrutura da prpria sociedade primitiva, no

    havendo princpios, sendo fruto do prprio ambiente de crendice e repleto de

    religiosidade.

    Superada a fase da vingana privada e tornando-se presente de

    modo mais marcante as divindades, as punies passaram a ser aplicadas aos

    ditos infratores das leis costumeiras, ligadas religio, devido adorao macia

    aos deuses, estando intimamente ligados aos eventos na poca tidos como

    sobrenaturais - que hoje sabemos serem apenas fenmenos naturais, como a

    chuva e os troves - difundindo a chamada vingana divina, conforme nos

    apontada Nucci:

    No Oriente antigo, fundava-se a punio em carter religioso, castigando-se o infrator duramente para aplacar a ira dos deuses. Notava-se o predomnio do talio, que, se mrito teve, consistiu em reduzir a extenso da punio e

    evitar a infindvel onda de vingana privada.4

    Nos esclarece ainda Joo Farias Jnior:

    Determinados povos da antiguidade cultivavam a crena de que a violao da boa convivncia ofendia a divindade e que sua clera fazia recair a desgraa sobre todos, todavia, se houvesse uma reao, uma vingana contra o ofensor, equivalente ofensa, a divindade depunha a sua ira, voltava a ser propcia a dispensar de novo a sua proteo a todos.

    5

    Aps a difuso da ideia da vingana divina, que tinha como objeto a

    satisfao dos deuses e que ocasionou conflitos ainda maiores, os lderes das

    sociedades se viram na necessidade de estipular a denominada vingana pblica,

    donde as decises em relao aos conflitos seriam tomadas pelos grandes

    lderes.

    O perodo subsequente ao da vingana divina para estudos didticos o da vingana pblica onde a igreja aos poucos foi perdendo a sua fora graas a uma maior organizao social crescente, iniciando o pensamento poltico, questionando-se tais

    4 NUCCI, Guilherme de Souza. Cdigo Penal Comentado. 9 Ed. So Paulo: Editora RT, 2009, p.

    38. 5 FARIAS JUNIOR, Joo. Manual de Criminologia. 3 Ed. Curitiba: Editora Juru, 2001, p. 17.

  • 13

    dogmas, tendo o seu maior expoente Martinho Lutero, culminando com o poder poltico, vindo a surgir a figura do lder, do chefe, figura representativa do Rei que no perodo passado fora esquecida ganha fora e representatividade chegando a se libertar dos dogmas religiosos que agora passa a ser representado pelo Rei, que vem a ser posto como o soberano enviado por Deus onde concentra todas os poderes para si utilizando-os com inmeras arbitrariedades suprimindo ou impondo leis cruis.

    6

    evidente que tal posio no poderia implicar em outro resultado

    seno na manipulao e utilizao indiscriminada de aplicaes das penas para

    intimidar e controlar de modo absoluto a sociedade, sancionando

    discricionariamente do modo que lhe conviesse.

    Os defensores dos Direitos Humanos apregoam a chamada Lei das

    XII Tbuas como um marco histrico, e de fato .

    A lei nessa poca era representada pela Lei das XII Tbuas e a pela legislao posterior complementar. A Lei das XII Tbuas, segundo consta foi redigida com a finalidade de codificar o direito consuetudinrio, impedido as arbitrariedades dos patrcios sobre os plebeus.

    7

    Embora remeta Lei de Talio aos que ferirem a outrem, trouxe a

    equidade do julgamento entre Plebeus e Patrcios na Grcia Antiga, onde os

    julgamentos eram direcionados aos Patrcios, vindo a existir uma comisso

    julgadora vinda de outras regies.

    De todos os mtodos implantados, ainda que fossem concentrados

    em penas cruis e inteis, pode-se verificar que de fato eram necessrias

    intervenes para que a sociedade se desenvolvesse.

    Diante desses fatos, era de extrema necessidade a imposio de

    limites s condutas humanas, visando o desenvolvimento e paz social.

    6 NORONHA, Magalhes de, op., cit.

    7 VIEIRA, Thiago Andr Marques. Direito na Roma Clssica. Disponvel em:

    . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 14

    1.2. A luz do iluminismo nas escolas Clssica e Positivista

    Tambm conhecido como A era da razo, o Iluminismo surgiu no

    incio do sculo XVII, havendo uma impreciso do ano. Nomes de peso apoiaram

    e influenciaram na propagao da ideia da corrente.

    Como de saber notrio, o Iluminismo pregava basicamente a

    superao dos resduos de tirania, que eram evidentes naquela poca, partindo-

    se do pressuposto do valor inerente do ser humano. Os pensadores iluministas,

    em geral, defendiam uma ampla reforma do ensino, criticavam duramente a

    interveno do Estado na economia e achincalhavam a Igreja e os poderosos.

    As ideias de igualdade e de liberdade, apangios do Iluminismo, deram ao Direito Penal um carter formal menos cruel do que aquele que predominou durante o Estado Absolutista, impondo limites interveno estatal nas liberdades individuais. Muitos desses princpios limitadores passaram a integrar os Cdigos Penais dos pases democrticos e, afinal, receberam assento constitucional, como garantia mxima de respeito aos direitos fundamentais do cidado. Todos esses princpios, hoje inseridos, explcita ou implicitamente, em nossa constituio (art. 5), tm a funo de orientar o legislador ordinrio para a adoo de um sistema de controle penal voltado para os direitos humanos, embasado em um Direito Penal da culpabilidade, um Direito Penal e garantista.

    8

    A onda de pensamentos humanitrios no poderia acarretar outra

    situao seno a influncia direta sob a tica das condutas dos chamados

    delinquentes.

    Nessa perspectiva, Cesare Bonesana, o Marqus de Beccaria,

    imbudo dos princpios iluministas, publica em 1764 a obra "Dei Delitti e Delle

    Pene" (Dos Delitos e Das Penas), que, posteriormente, foi chamado de "pequeno

    grande livro", por ter se tornado o smbolo da reao liberal ao desumano

    panorama penal ento vigente.

    Na viso do filsofo, era inconcebvel uma sano penal que impusesse ao transgressor um sofrimento cruel e desproporcional ao crime cometido e ultrapassasse o grau de necessidade de preveno geral sendo que o castigo, nessa tica, teria a finalidade de impedir o acusado de tornar-

    8 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral. 4 Ed. So Paulo: Editora

    Revista dos Tribunais, 1997, p. 35.

  • 15

    se prejudicial sociedade e de afastar os cidados da prtica criminosa. Por influncia desse pensamento, o artigo 8 da Declarao de 1789 prescreveu que a legislao s deve estabelecer penas estritas e necessrias, o que passou a constituir um dos alicerces do Direito Penal contemporneo, tanto que o Cdigo Penal brasileiro, por exemplo, determina, no art. 59, seja a pena fixada segundo o critrio de necessidade e suficincia reprovao e preveno do crime.

    9

    A brilhante obra de Beccaria influenciou inclusive a Declarao dos

    Direitos Universais, tendo em vista sua posio contrria pena de morte e da

    impossibilidade de a pena ir alm da pessoa do condenado, atingindo seus

    familiares, alm de ser contra a tortura como mtodo de investigao criminal.

    Diante de tamanhas transformaes, surgiram duas escolas que

    muito influenciaram (e influenciam at hoje) no estudo do direito penal: a Escola

    Clssica, que teve como representante maior Francesco Carrara, e a Escola

    Positivista, que teve como precursor Cesare Lombroso.

    Carrara deu nfase ao livre-arbtrio, manifestando-se contrrio

    pena de morte ou penas cruis e defendendo a proporcionalidade da aplicao

    da pena ao crime.

    O espetculo de um delinquente emendado edificante, utilssimo moral pblica: nisso convenho. E por isso abomino e me oponho pena de morte; porque acredito firmemente na fora moralizadora do espetculo de um delinquente emendado. E no acredito, absolutamente, na fora, que com temerrio cinismo ouvi chamar moralizadora, do espetculo de uma cabea decepada, exibida ao povo. Um criminoso emendado, porm, ao preo da atenuao da pena merecida uma excitao delinquncia; um escndalo poltico. Considero, pois, utilssima a reforma do cu, a ser procurada com toda diligncia, mas completamente fora do crculo do magistrio penal.

    10

    Lombroso cravou seu marco na linha de pensamento denominada

    Escola Positivista aps a publicao de sua obra O homem delinquente, em

    1876. Ele sustentava que o homem poderia ser um criminoso nato e que no

    9 VELOSO, Roberto. A atualidade do pensamento de Beccaria. Disponvel em:

    . Acessado em: 04 de mar. 2012. 10

    CARRARA, Francesco. Programa do Curso de Direito Criminal: Parte geral. 1 Ed. Campinas: Editora LZN, 2002, p. 40, v. 1.

  • 16

    haveria muito a se fazer alm de identific-lo e procurar monitor-lo, at mesmo

    segregando-o.

    Lombroso decodificou e resignificou determinados signos anatmicos daqueles indivduos, e propunha uma pretensa tecnologia cientfica para classificao dos indivduos naturalmente propensos ao crime.

    Eram signos dessa dita propenso delinquncia nata: lbios muito grossos, mos grandes, braos muito longos, maxilar e arcada dentria disforme ou defeituosa, mais ou menos dedos do que se deveria nas extremidades dos membros, muito cabelo e pouca barba, entre outrasanormalidades dos padres fsicos, e tambm mentais.

    11

    Ao contrrio do que pregava Carrara, para os positivistas no havia

    espao para o livre-arbtrio, j que o cidado nascia com aquela propenso

    imutvel delinquncia. Afirmavam que as caractersticas fsicas determinavam

    quem era ou no o. Seria ento o criminoso nato insensvel fisicamente,

    resistente ao traumatismo, canhoto ou ambidestro, moralmente impulsivo,

    insensvel, vaidoso e preguioso.

    Houve uma expanso dos estudos no direito penal a partir dessas

    ideias, como a psicologia, antropologia e sociologia criminal, alm da investigao

    cientfica, j que as alteraes fsicas do ser humano apontavam para a

    delinquncia.

    Embora paream absurdas tais concluses, inegvel a

    contribuio ao estudo do direito penal, sobretudo nos aspectos da conduta e

    personalidade do agente, o que hoje vimos ser aplicado na dosimetria da pena.

    Pelo breve exposto acerca das escolas, verifica-se imensa

    contribuio de ambas no mundo jurdico-criminal, trazendo a escola clssica a

    preocupao com o homem abstrato, sujeito de direitos, atrelando suas ideias

    com o mtodo dedutivo do jusnaturalismo, enquanto que na escola positivista se

    evidenciou as leis fsicas que regem o universo, em detrimento da espiritualidade

    da pessoa humana, bem como suas caractersticas fsicas.

    O Direito Penal deve estudar o criminoso como esprito e matria, como pessoa humana, em face dos princpios ticos a que est sujeito e das regras jurdicas que imperam na vida

    11

    RABONI, Andr. Lombroso e a ideia do delinquente nato. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 17

    social, e tambm ante as leis do mundo natural que lhe afetam a parte contingente e material.

    12

    1.3. Teorias da pena e a ordem jurdica brasileira

    O surgimento do direito penal trouxe consigo diversas teorias criadas

    a fim de frear a violncia e reger as relaes humanas, tendo como objeto o modo

    como seriam aplicadas as sanes ao infrator bem como sua finalidade.

    A primeira delas foi chamada Teoria Retribucionista ou Absoluta.

    Essa considera que a finalidade e objetivo da pena nica e exclusivamente a

    retribuio do mal causado, o que nos remete Lei de Talio.

    A Teoria retributiva considera que a pena se esgota na idia de

    pura retribuio, tem como fim a reao punitiva, ou seja, responde ao mal

    constitutivo do delito com outro mal que se impe ao autor do delito.13

    A despeito dessa vinculao, temos, portanto, que tal teoria traz

    uma ideia arcaica e ineficaz, tendo em vista a necessidade do ser humano no s

    sofrer pelo mal causado, mas de renovar-se, regenerar-se, o que a simples

    punio por si s no capaz de fazer, nesse sentido:

    No se persegue com a pena nenhum fim para alm da justa e proporcionada retribuio; a recuperao do delinquente no vista como sendo tarefa do Direito Penal, embora seja efeito desejvel.

    14

    Mencione-se tambm a ligao com o pensamento cristo, de

    penitncia, onde o agente que cometeu o delito, aps ser castigado com a

    sano imposta, seria extirpado de seu delito. Tal teoria foi influenciada pelos

    clssicos e pelas ideias de Kant, Hegel e Carrara.

    Ao contrrio do que se busca com a Teoria Retribucionista, a Teoria

    Preventiva vem dar um sentido maior, um objetivo mais nobre sano imposta,

    como o fim de prevenir delitos futuros, promovendo a ressocializao do

    indivduo. Essa teoria subdivide-se em geral e especial.

    12

    BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 15 Ed. So Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 110-111, v. 1. 13

    NERY, Da Carla Pereira. Teorias da Pena e sua Finalidade no Direito Penal Brasileiro. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012. 14

    MESTIERI, Joo. Manual de Direito Penal: Parte Geral. 1 Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002, p. 260, v. 1.

  • 18

    A preveno especial direciona-se exclusivamente ao delinquente,

    no visando um fim maior a no ser prevenir a reincidncia desse infrator. Essa

    espcie de preveno se mostra interessante. Contudo, no Brasil, em razo do

    alto ndice de reincidncia, no devidamente observada.

    J a preveno geral visa que nenhum indivduo, ou seja, que a

    sociedade em geral, no venha a cometer delitos, ao contrrio da especial que

    busca evitar que um nico agente volte a delinquir. Visualiza-se uma preocupao

    social ampla, almejando a paz social e influenciando a conduta da sociedade.

    A teoria preventiva geral est direcionada generalidade dos cidados, esperando que a ameaa de uma pena, e sua imposio e execuo, por um lado, sirva para intimidar aos delinqentes potenciais (concepo estrita o negativa da preveno geral), e, por outro lado, sirva para robustecer a conscincia jurdica dos cidados e sua confiana e f no Direito (concepo ampla ou positiva da preveno geral).

    15

    A preveno geral pode ainda ser positiva ou negativa. A viso

    positiva vem dizer que a criminalizao pode exercer um efeito positivo sobre os

    no-criminalizados, tendo em vista a unificao de pensamentos de que o delito

    traz maus resultados, como forma de evitar o delito, conforme afirma Zaffaroni

    para dissuadi-los pela intimidao, e sim como valor simblico produtor do

    consenso, e, portanto, reforador de sua confiana no sistema social em geral (e

    no sistema penal em particular). 16

    Em relao preveno especial negativa, busca-se o resultado

    atravs da intimidao, tornando o sujeito incuo, inofensivo, em razo da medida

    imposta. Um exemplo de norma intimidadora de preveno especial negativa vem

    a ser a pena de morte, impostas em alguns ordenamentos jurdicos, como forma

    de refletir na inrcia do delinquente quando estiver prestes a praticar o delito em

    comento.

    A teoria adotada pelo Cdigo Penal Brasileiro em seu artigo 59, chamada de Teoria Mista ou Unificadora da Pena. Justifica-se esta teoria pela necessidade de conjugar os verbos reprovar e prevenir o crime. Assim sendo, houve a unificao das teorias absoluta e relativa,

    15

    NERY, Da Carla Pereira, op., cit. 16

    ZAFFARONI, Eugnio Raul; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro: Teoria Geral do Direito Penal. 2 Ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003, p. 121-122, v. 3.

  • 19

    pois essas se pautam, respectivamente, pelos critrios da retribuio e da preveno do mal cometido (punitur quia peccatum est et ne peccetur).

    17

    Diante da abrangncia de teorias acerca da pena, o Brasil adotou a

    chamada teoria mista, tambm conhecida como ecltica, conciliatria ou

    unificadora. Como o nome sugere, vem a ser a ciso da ideia de preveno e

    retribuio ao mal causado, tendo como argumento a complexidade dos

    fenmenos sociais para serem interpretados conforme uma ou outra teoria, o que

    poderia acarretar graves consequncias segurana e direitos fundamentais do

    homem.

    Analisando brevemente o histrico do sistema penitencirio

    brasileiro, vislumbram-se pensamentos sociais e polticos que deram causa

    situao em que o aludido sistema se apresentava, desde sua finalidade sua

    implantao.

    sabido que o descobrimento do Brasil est intimamente ligado

    ideia de ocupao do territrio desconhecido por delinquentes europeus.

    Euclides da Cunha registrou inclusive que via o Brasil inaugurado como vasto

    presdio, 18 evidenciando ainda mais tal pensamento.

    Importante ressaltar que:

    Historicamente o capitalismo recorreu ao sistema penal para duas operaes essenciais: 1. garantir a mo-de-obra; 2. Impedir a cessao do trabalho (...) No Brasil, abolida a escravido e proclamada a repblica, o Cdigo Penal de 1890 trazia a mesma receita: em seu artigo 399 punia a vadiagem, e em seu artigo 206 punia a greve.

    19

    Corroborando com a ideia de que a priso, inicialmente, era vista

    como instituto rentvel ao Estado, por utilizar-se da mo-de-obra dos

    delinquentes para alguma coisa e, o melhor, de graa.

    De outra banda, aps a criao da conscincia de que a pena no

    era puramente retributiva, pode-se visualizar no artigo 1 da Lei 7.210/84 (LEP), a

    17

    DIANIN, Marcos Vincius Tomaz. O sistema penal brasileiro: uma abordagem do real, do legal e da mudana da realidade. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012. 18

    ZAFFARONI, Eugenio Raul. BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro 1. 1 Ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003, p. 411. 19

    BATISTA, Nilo. Punidos e mal pagos: violncia, justia, segurana pblica e direitos humanos no Brasil de hoje. 1 Ed. Rio de Janeiro: Revan, 1990, p. 35-36.

  • 20

    adoo da teoria mista, onde pune-se o infrator e visa-se proporcionar meios para

    sua reintegrao sociedade, estando aqui implcita a preveno de novos

    delitos face ressocializao alcanada.

    Art. 1 A execuo penal tem por objetivo efetivar as disposies de

    sentena ou deciso criminal e proporcionar condies para a harmnica

    integrao social do condenado e do internado.20

    A ltima parte do artigo 59 do Cdigo Penal tambm nos leva a

    concluir pela adoo da citada teoria:

    Art. 59 - O juiz, atendendo culpabilidade, aos antecedentes, conduta social, personalidade do agente, aos motivos, s circunstncias e consequncias do crime, bem como ao comportamento da vtima, estabelecer, conforme seja necessrio e suficiente para reprovao e preveno do crime. (grifo nosso).

    21

    Nesse passo, passamos a visualizar o objeto do presente trabalho

    por meio dos conceitos trazidos e a adoo do sistema de teoria da pena pelo

    ordenamento jurdico brasileiro, que busca, ao mesmo tempo em que pune, a

    ressocializao e reintegrao do indivduo sociedade, revelando-se a

    importncia da efetivao dessa proposio, que certamente, se concretizada,

    pode mudar por completo o cenrio nacional no que se refere poltica criminal e

    ndices de violncia.

    20

    BRASIL, Repblica Federativa do. Lei de Execuo Penal (Lei n. 7.210/84). Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaborao de Antnio Luiz de Toledo Pinto, Mrcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lvia Cspedes. 7 Ed. So Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 581 (Legislao Brasileira). 21

    BRASIL, Repblica Federativa do. Cdigo Penal (Decreto Lei n. 2.848/40). Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaborao de Antnio Luiz de Toledo Pinto, Mrcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lvia Cspedes. 7 Ed. So Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 257 (Legislao Brasileira)

  • 21

    CAPTULO II

    SISTEMAS PRISIONAIS

    2.1 Sistema Pensilvnico

    Originado na Colnia da Pensilvnia (ento uma das 13 colnias

    inglesas na Amrica), o Sistema Pensilvnico trouxe consigo o objetivo de pr

    termo s penas fsicas/corporais, sugerindo apenas o encarceramento e trabalhos

    forados aos delinquentes, sendo inclusive destinada a pena de morte apenas

    aos que cometessem o delito de homicdio. Tinha como fim a reflexo do

    condenado, a autopunio.

    A recluso era total, no tendo os presos sequer contato uns com os

    outros, ficando todo o tempo dentro de suas celas. O preso ficava ocioso todo o

    tempo, no havendo atividades realizadas e nem contato com qualquer pessoa

    que fosse, alm da que levava a refeio cela.

    Nos esclarece de forma minuciosa Farias Junior as caractersticas

    do local:

    O Sistema Pensilvnico teve sua origem na chamada Walnut Slreet Jail. Essa penitenciria foi inspirada basicamente na Penitenciria Papal de 1703. Com base retangular, as celas individuais, do tipo que o americano chama de Outside Ceel, isto , celas com portas macias, tendo s um visor ou janelinha no alto para que o guarda, do lado de fora, possa ver seu interior, e no alto da parede dos fundos, cada cela tem uma janela gradeada para o arejamento de seu interior. Esse tipo de cela se diferencia do tipo Inside Cell, que tem a frente toda gradeada, inclusive a porta tambm gradeada e a parede dos fundos , tambm no fundo de outra cela, por isso esta parede destituda de janela gradeada para arejamento. Qualquer pessoa que chegue a sua frente poder visualizar todo o seu interior atravs de sua grade frontal.

    22

    Diante desse cenrio obscuro e absolutamente restrito ao

    isolamento, a nica atividade permitida era a leitura da bblia. Esse sistema levou

    inmeros presos loucura e ao suicdio. Diante disso, foi implantando um novo

    22

    FARIAS JUNIOR, Joo, op., cit., p. 663.

  • 22

    sistema, que permitia o contato do preso com visitantes, desde que fossem

    avaliadas e consideradas aptas a frequentar o local, mas ainda sendo vedada a

    comunicao entre os presos. Tal sistema foi denominado Separate Confinement

    (Confinamento Separado).

    Ao final, o balano que se fez acerca do Sistema Pensilvnico no

    foi positivo, pois no se visualizava uma recuperao efetiva do preso e, claro,

    isso resultado da inrcia de meios para tanto, sendo a simples reflexo

    insuficiente para ressocializar o indivduo.

    2.2 Sistema Auburniano

    Buscando livrar-se das mculas evidenciadas no Sistema

    Pensilvnico, o Auburniano, tambm originrio dos Estados Unidos da Amrica,

    buscou eliminar o isolamento absoluto, propondo trabalhos durante o dia.

    Contudo, no se permitia qualquer dilogo com os outros segregados, limitando-

    se a falar com os agentes penitencirios apenas o essencial e em voz baixa.

    Criado em 1818, em Nova Yorque, possua uma estrutura com 108 celas construdas pelos prprios detentos. Os presos trabalhavam em conjunto durante o dia sob a lei do silncio, sujeitos a castigos severos se ousassem infringir as normas. E a noite eram brutalmente isolados, chegando esse sistema a ser conhecido como Silent System.

    23

    Esse sistema foi bastante criticado, pois no permitia a visita de

    familiares, nem a interao com os demais segregados ou outra pessoa alm dos

    agentes carcerrios e apenas quando esses permitiam o contato, no havendo

    qualquer atividade fsica ou que estimulasse outra coisa que no fosse a lei do

    silencio.

    Desse modo, verificou-se que o mtodo no foi to melhor que o

    anterior que pretendia levar o segregado melhora por meio da reflexo.

    23

    SILVA. Cristiane Oliveira da. Penas Alternativas: Vara de Execues e o Trabalho do Servio

    Social com o Prestador de Servio. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 23

    2.3 Sistema Progressivo

    O Sistema Progressivo veio em contrapartida aos anteriores

    expostos, trazendo humanidade, legalidade e individualizao da pena. Tal

    sistema o adotado pelo ordenamento jurdico brasileiro.

    Teve origem no final do sculo XIX, trazendo a possibilidade de o

    segregado obter benefcios aps determinados lapsos temporais de cumprimento

    da pena. O benefcio mais marcante trazido foi a possibilidade de reinsero

    sociedade antes do trmino da pena de fato, em razo de boa conduta e demais

    fatores e, desse modo, impulsionando uma reforma moral, donde o segregado

    estaria apto a conviver novamente em sociedade, diferindo-se e muito dos outros

    sistemas onde, diante da ausncia total de direcionamento para uma reeducao

    social, o segregado no teria a mnima condio de sair da priso diferente do

    que entrou.

    A ideia de um sistema penitencirio progressivo surgiu no final do sculo XIX, mas, no entanto, sua utilizao generalizou-se atravs da Europa s depois da I Guerra Mundial. A essncia desse regime consistia em distribuir o tempo de durao da condenao em perodos, ampliando-se em cada um deles os privilgios que o recluso poderia desfrutar, de acordo com sua boa conduta e do avano alcanado pelo tratamento reformador. Outro aspecto importante era o fato de possibilitar ao recluso reincorporar-se sociedade antes do trmino da condenao. Basicamente, o sistema progressivo tinha como fundamento dois princpios: estimular a boa conduta do recluso e obter sua reforma moral para uma futura vida em sociedade. O avano considervel obtido pelo sistema progressivo justifica-se pela importncia por ele dada vontade do recluso e de que ele diminura o rigor excessivo na aplicao da pena privativa de liberdade.

    24

    Pode-se dizer que a pena baseava-se nos critrios de gravidade do

    delito, aproveitamento no trabalho e conduta do apenado.

    Insta salientar que num primeiro momento o Sistema Progressivo foi

    introduzido pelo Capito Alexandre Maconochie na Austrlia e, posteriormente, foi

    24

    ASSIS, Rafael Damaceno de. Avoluo histrica dos regimes prisionais e do Sistema Penitencirio. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 24

    aperfeioado pelo irlands Walter Crofton, chegando aos moldes que hoje

    conhecemos.

    O capito da Armada Inglesa, Alexander Maconochie, introduziu na llha de Norfolk o Mark System (sistema de marcas), sob o qual os condenados tinha em seus pronturios marcas que poderiam ser positivas ou negativas conforme seu comportamento em razo do trabalho ou conduta disciplinar. Importante ressaltar que foi a partir do aparecimento do sistema progressivo implementado por Alexander Maconochie, que o sistema penitencirio passou por grandes modificaes, trazendo consigo alteraes fundamentais que lhe permitiram sobreviver at agora.

    25

    justamente o presente sistema que vive uma crise de identidade.

    Antes tido como revolucionrio, hoje parece ineficaz, tendo em vista os ndices de

    criminalidade e de ressocializao apontados, diante da ausncia de elementos

    que propiciem a efetiva reeducao e reinsero de modo satisfatrio do

    segregado sociedade.

    Foucault, de modo brilhante traduz a funo ideal da priso:

    Desde o comeo a priso deveria ser um instrumento to aperfeioado quanto a escola, a caserna ou o hospital, e agir com preciso sobre os indivduos. O fracasso foi imediato e registrado quase ao mesmo tempo que o prprio projeto. Desde 1820 se constata que a priso, longe de transformar o criminoso em gente honesta, serve apenas para afund-los ainda mais na criminalidade. A priso fabrica delinquentes, mas os delinquentes so teis tanto no domnio econmico como no politico. Os delinquentes servem para alguma coisa.

    26

    Dito isso, no nos parece to distante a ideia que apregoava

    Foucault h algumas dcadas das de hoje, onde o segregado se mostra cada vez

    mais incapaz de retornar ao convvio social com alguma melhoria. Pelo contrrio,

    as prises atuais costumam ser vistas como fbricas de criminosos, no por

    acaso.

    25

    BATISTELA, Jamilia Eliza; AMARAL, Marilda Ruiz Andrade. Breve Histrico do Sistema Prisional. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012. 26

    FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 9 Ed. Petrpolis: Editora Vozes, 1991, p. 132.

  • 25

    2.4 Comparaes entre os sistemas e seus resultados prticos

    Fazendo um paralelo dos sistemas expostos nota-se que, embora

    tenha havido grande evoluo no que diz respeito ao reconhecimento de

    tratamento digno ao segregado e sua importncia para toda a coletividade, os

    sistemas guardam semelhanas quanto aos seus resultados.

    O Sistema Pensilvnico se mostrou incapaz de atingir qualquer

    resultado positivo, em razo do mtodo arcaico e desumano imposto. De outra

    banda, o Sistema Auburniano, embora tenha trazido alguma melhora, evidenciou-

    se tambm de pouca eficcia, tendo em vista a ausncia do convvio social com

    terceiros. J o aclamado Sistema Progressivo, aclamado com razo, no

    apresenta resultados satisfatrios em razo de sua pouqussima aplicabilidade,

    sendo admirvel no papel e lamentvel na prtica, nas palavras de Wiliam

    Wanderley Jorge:

    Acredita-se, hoje, que a pena de priso tenha cumprido sua misso histrica: j no se destina mais grande tarefa de reeducar e ressocializar o condenado, quando cumprida em estabelecimentos fechados. No cura, corrompe. Tem-se dito que o problema da priso a prpria priso.

    27

    Dentro outros fatores, a ausncia de resultados satisfatrios no

    Sistema Progressivo se deve, como se passar a demonstrar no presente, no

    aplicao do instituto da assistncia, trazida na Lei de Execues de Penais.

    27

    JORGE, Wiliam Wanderley. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 7 Ed. So Paulo: Editora Forense, 2005, v. 1.

  • 26

    CAPTULO III

    DAS ESPCIES DE ASSISTNCIA NA EXECUO PENAL

    3.1 A assistncia e sua importncia na funo social da pena

    Conforme visto nos tpicos anteriores, a pena tem em si uma funo

    social que a torna necessria, qual seja, atingir a recuperao do ser humano, em

    suas diversas formas, por meio da percepo de responsabilidade individual e

    social em relao ao resto da sociedade.

    Foi-se o tempo em que a pena era apenas uma punio ao mal

    causado, nos tempos de vingana privada com a ideia de retribuio da pena.

    Hoje grande parcela da sociedade consegue visualizar a importncia de se

    estabelecer um mtodo que no s faa o preso de fato pagar pelo dano, mas de

    transformar-se de modo a reprovar seu comportamento anterior, no voltando a

    delinquir.

    Esse importante avano intelectual de conscientizao acerca da

    pena adveio da ideia trazida ps Segunda Guerra Mundial, que a dignidade da

    pessoa humana, que no suporta qualquer tipo de violao de direitos.

    Na madrugada de 1. de setembro de 1939, a Alemanha atravessou a fronteira polonesa sem aviso prvio e, sem que se desse conta, Adolf Hitler desencadeou a Segunda Grande Guerra Mundial. Inmeros acontecimentos entre 1. de setembro de 1939 e 2 de setembro de 1945 destroaram a proteo aos direitos humanos no cenrio das relaes exteriores. inegvel que com o advento da conflagrao global e dos massacres perpetrados, os direitos humanos entraram em severo colapso. No entanto, com o trmino dos conflitos, houve um desenvolvimento sem precedentes em sua histria, com o surgimento de inmeros tratados internacionais cuidando do tema.

    28

    A segregao do preso, no caso, a nica perda de direito

    fundamental na priso, no podendo haver mais que isso, pois, conforme nos

    28

    MALHEIRO, Emerson. Os Direitos Humanos e a Segunda Grande Guerra Mundial. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012.

  • 27

    esclarece Thomas Fleiner, com a violao arbitrria desses direitos, nenhuma

    qualidade mais resta ao homem:

    Quando o homem no pode mais dispor de seu corpo, quando ele humilhado de maneira desumana e reduzido fsica e mentalmente, a sua dignidade atingida de maneira irreparvel. A integridade corporal o ltimo reduto em que um homem pode ser ele mesmo. Quando este espao de identidade destrudo, no resta mais nada da qualidade do ser humano.

    29

    Buscando a no configurao desse triste cenrio - onde se pode

    inclusive afirmar que, ainda que indiretamente, o Estado pune por duas vezes o

    indivduo, j que evidente o sacrifcio realizado para sobreviver de forma s

    dentro daquele local - a aplicao da assistncia da execuo da pena se mostra

    mais que necessria, exibindo-se como a essncia do objeto.

    Reza o artigo 10 da Lei 7.210/84 (LEP) o seguinte: A assistncia ao

    preso e ao internado dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o

    retorno convivncia em sociedade.30 Nota-se, portanto, que dever do Estado

    a implementao de meios que propiciem o alcance da finalidade da pena.

    Se a reabilitao social constitui a finalidade precpua do sistema de execuo penal, evidente que os presos devem ter direito aos servios que a possibilitem, servios de assistncia que, para isso, devem ser-lhes obrigatoriamente oferecidos, como dever do Estado.

    31

    Se assim fosse, poderia o Estado descansar sabendo que fez o

    possvel para a recuperao daquele que manteve sob custdia. Mas, enquanto

    isso de fato no se concretizar, pode sim o Estado se culpar por sua omisso.

    3.2 Assistncia Material

    A assistncia material compreende no s as instalaes fsicas

    higinicas disponveis, mas tambm a alimentao e vestimentas dos

    segregados. Esse necessita dispor de roupas adequadas/prprias e, ainda, deve

    29

    FLEINER, Thomas. O que so Direitos Humanos? 1 Ed. So Paulo: Editora Max Limonad, 2003, p. 11-12. 30

    VADE MECUM SARAIVA, op., cit., p. 582. 31

    MIRABETE, Julio Fabbrini, Execuo Penal. 11 Ed. So Paulo: Editora Atlas, 2007, p. 63.

  • 28

    o estabelecimento prisional fornecer uniformes aos presos, apropriados ao clima

    local, tendo em vista a variao de temperaturas em todo o pas.

    Muito embora grande parcela da sociedade pense se tratar de muita

    regalia o fato de o preso ter direito a vrias refeies ao dia - como qualquer ser

    humano digno, diga-se de passagem -, devidamente equilibrada e em quantia

    suficiente, trata-se do mnimo necessrio a suprir tal necessidade, no tendo

    porque da diminuio e/ou absteno de tais refeies to somente pelo fato de

    se tratar de um segregado. A prpria LEP, alis, traz tal previso:

    Art. 41 - Constituem direitos do preso:

    I - alimentao suficiente e vesturio.32

    dever do preso manter sua cela/alojamento limpo, bem como a

    conservao de seus pertences pessoais, contudo, no se deve olvidar que a

    administrao do estabelecimento prisional deve fornecer os meios para tanto.

    A ONU no 1 Congresso das Naes Unidas sobre Preveno do

    Crime e Tratamento de Delinquentes, realizado em Genebra em 1955,

    estabeleceu as chamadas Regras Mnimas para o Tratamento de Prisioneiros, a

    qual traz, dentre muitas outras recomendaes, que as instalaes sanitrias

    devero ser tais que os presos possam satisfazer suas necessidades naturais

    quando quiserem e, bem assim, asseadas e decentes, enquanto os banheiros e

    chuveiros devem ter temperatura adequada ao clima, em nmero suficiente para

    que cada preso possa fazer uso deles com a frequncia exigida pela higiene

    pessoal.

    Percebe-se que uma boa alimentao, local e vestimentas

    adequadas no so simples regalias, e sim o incio de um tratamento que torna o

    preso responsvel por mnimas coisas, como o asseio de seu espao e o zelo por

    sua aparncia, o que, acima de tudo, devolve-lhe a dignidade que um dia possa

    ter sido perdida, estabelecendo os pilares de uma nova vida.

    A alimentao se mostra to necessria ao equilbrio e boa

    convivncia entre os presos e os que laboram no estabelecimento prisional, que a

    ausncia da mesma pode trazer um colapso no sistema, conforme depoimento de

    um empresrio fornecedor de alimentos para um presdio de Cuiab MT, que

    32

    VADE MECUM SARAIVA, op., cit., p. 584.

  • 29

    cogita no guarnecer mais em razo da falta de pagamento pelo poder pblico:

    Imagina a guerra que no vai ser dentro dos presdios sem fornecimento de

    comida. Para ns empresrios est insustentvel a situao, os fornecedores no

    querem mais vender os produtos, pois temem atrasos nos pagamentos.33

    Apesar de to importante, a no observncia dessa espcie de

    assistncia parece unanime em todos os estabelecimentos prisionais espalhados

    pelo pas.

    Como cedio, no particular o Estado s cumpre o que no pode evitar. Proporciona a alimentao ao preso e ao internado, nem sempre adequada. Os demais direitos assegurados e que envolvem a assistncia

    material, como regra, no so respeitados.34

    Nesse breve apontamento, notamos mais uma deficincia do poder

    publico em no arcar com suas responsabilidades, correndo o risco da suspenso

    de fornecimento dos alimentos aos presos, que traria ainda mais desordem no j

    to tumultuado estabelecimento prisional em questo, no havendo a mnima

    considerao e respeito, tanto com os fornecedores, quanto com os presos, que

    j carecem de tantas outras necessidades.

    3.3 Assistncia Sade

    A vulnerabilidade do preso em contrair molstias de diversas

    espcies mais comum do que a parcela da sociedade que est em liberdade,

    principalmente em razo da ausncia da assistncia material acima descrita, onde

    os ambientes em que permanecem se mostram completamente insalubres e

    propcios proliferao de doenas.

    Em ateno a isso, imprescindvel se faz a aplicao da assistncia

    sade, que envolve, alm de servio mdico para atender s doenas

    manifestamente visveis, aquelas invisveis, que muitas vezes se apresentam pelo

    simples contato do preso com o ambiente prisional.

    possvel, tambm, que uma doena esteja latente e venha a manifestar-se

    33 TEIXEIRA, Hrica. Fornecedores de alimentos de presos denunciam falta de pagamento. Hiper Notcias. Disponvel em: . Acessado em: 18 de fev. 2012. 34

    MARCO, Renato. Curso de Execuo Penal. 7 Ed. So Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 21.

  • 30

    aps a priso, seja por sua natural evoluo, seja porque o ambiente do estabelecimento penal influiu, no todo ou em parte, para sua ecloso ou desencadeamento. Entre elas h que se mencionar um possvel trauma psicolgico provocado pelo primeiro contato com o ambiente prisional, capaz de desencadear doena latente ou provocar estados de perturbao que, evoluindo, venham a transformar o preso em doente mental.

    35

    Verifica-se mais uma vez que a permanncia na atmosfera hoje

    abominvel pode acarretar no agravamento das enfermidades porventura j

    vindas com os presos, que, ao contrrio do que deveria ser, encontram no

    estabelecimento prisional um fator potencializador de suas deficincias, podendo,

    inclusive, levar a contrair outras mais, sendo a mais perigosa delas a psicolgica,

    que responsvel tanto pela recuperao quanto pela degenerao.

    Em ateno a essa preocupante possibilidade, as Regras Mnimas

    da ONU apregoa a necessidade de o estabelecimento prisional dispor de, pelo

    menos, um mdico com conhecimento de psiquiatria, vindo o artigo 14 da LEP a

    somar com tal exigncia, preconizando que a assistncia sade ser de carter

    preventivo e curativo, compreendendo atendimento mdico, farmacutico e

    odontolgico.

    A assistncia mdica compreende dois aspectos, o preventivo e o curativo: aspecto preventivo ou medidas profilticas, onde o mdico examinar todo aquele que ingressar no estabelecimento prisional, alm de inspecionar a higiene das dependncias do presdio, da dieta alimentcia e dos presos submetidos a medidas disciplinares. Aspecto curativo refere-se assistncia mdica diria para o diagnstico e tratamento dos enfermos da priso ou do hospital psiquitrico.

    36

    Tendo em vista os constantes motins realizados nos

    estabelecimentos prisionais e a violncia com que geralmente resolvem suas

    diferenas nesse universo, a assistncia mdica prestada por profissionais

    devidamente capacitados se mostra indispensvel, a fim de evitar resultados

    ainda mais gravosos.

    35

    MIRABETE, Julio Fabbrini, op., cit., p. 68-69. 36

    JORGE, Estvo Lus Lemos, Execuo Penal. 1 Ed. Campinas: Editora Millennium, 2007, p. 19.

  • 31

    Outra preocupao em relao proliferao de doenas

    sexualmente transmissveis, em especial a AIDS, j que os segregados muitas

    vezes acabam por fixar parceiros sexuais de sua prpria convivncia, uma vez

    que as visitas ntimas raramente so respeitadas em razo da ausncia de local

    adequado e privativo para tanto, onde a incidncia do homossexualismo se

    perfaz.

    Vrias doenas infectocontagiosas, tais como tuberculose e AIDS atingiram nveis epidmicos entre a populao carcerria brasileira. Ao negar o tratamento adequado dos presos, o sistema prisional no apenas ameaa a vida dos presos como tambm facilita a transmisso dessas doenas populao em geral atravs das visitas conjugais e o livramento dos presos. Como os presos no esto completamente isolados do mundo exterior, uma contaminao no controlada entre eles representa um grave risco sade pblica. Segundo o relatrio da CPI sobre os estabelecimentos prisionais do estado de So Paulo, o estado atual de assistncia mdica pode ser descrito com uma palavra: "calamidade.

    37

    Desse modo, devem ser periodicamente realizados exames clnicos

    e acompanhamento da evoluo das doenas, caso preexistente. Afinal, o

    ordenamento jurdico brasileiro no permite que a pena de priso ultrapasse os 30

    anos de segregao, portanto, um dia o preso voltar ao convvio social e, nada

    mais conveniente que venha de modo apropriado, em todos os sentidos,

    beneficiando alm de si mesmo, os prprios cidados que direta e indiretamente

    tero de conviver com o mesmo, alm dos benefcios do tratamento preventivo

    das doenas, no ocasionando um colapso no sistema de sade.

    Importante salientar que est implcita dentro da assistncia sade

    a prestao de servios voltados odontologia. Apesar de grande parte da

    populao no dar a devida importncia a essa questo, os ndices de doenas

    referentes sade bucal vem crescendo significativamente, em especial os casos

    de cncer bucal.

    O limiar para que se estabelea a prestao desses direitos do

    preso, faz-se necessrio que haja um corpo de pessoal adequado e apto a prestar

    assistncia, desenvolvendo as atividades de modo a acompanhar e prevenir

    37

    HUMAN RIGHTS WATCH. O Brasil atrs das grades. Disponvel em: . Acessado em: 10 de jan. 2012.

  • 32

    enfermidades. Assim, preciso que existam enfermarias, material clnico,

    medicamentos e aparelhamento mnimo, proporcionais ao nmero de presos,

    para atender a essa necessidade vital do ser humano, em qualquer condio que

    se encontre.

    claro que a unio de todas as espcies de assistncias previstas

    na Lei de Execuo Penal se mostra de suma importncia para resultados

    satisfatrios, mas h que se frisar a essencialidade do instituto da assistncia

    sade, que no apenas um anseio da populao carcerria, mas da populao

    de modo geral. Se j no mbito da sade pblica lato sensu no se obtm a

    mnima satisfao desse direito fundamental, no conseguindo o poder pblico

    oferecer amplo acesso e tratamentos eficazes, pode-se concluir que esses que

    esto de fato margem da sociedade no atraem os olhares de nossos

    governantes.

    Ocorre, entretanto, que tambm a rede pblica, que deveria prestar tais servios, carente e, no dispe de condies adequadas para dar atendimento de qualidade mesmo camada ordeira da populao, que tambm necessita de tal assistncia estatal. O Estado no conseguiu efetivar tais direitos. No os assegura, de fato, ainda hoje.

    38

    Diante do lamentvel cenrio penitencirio atual, que de modo geral

    no apresenta condies mnimas que atendam a assistncia sade, os

    tribunais tm decidido de modo pacfico quanto possibilidade de tratamento

    mdico-hospitalar em ambiente diverso da priso, mas que atenda s finalidades

    da mesma no cumprimento de seus deveres.

    Impossibilidade de tratamento ambulatorial para preso perigoso TACRSP: Em se tratando de sentenciado dependente de drogas e considerado perigoso, ao qual foi imposta medida de segurana consistente na internao em estabelecimento hospitalar, incorre constrangimento ilegal pelo fato de permanecer preso em virtude da inexistncia de vaga em Manicmio Judicirio, uma vez que deix-lo em liberdade para ser submetido a simples tratamento ambulatorial representaria verdadeira temibilidade, sendo certo ainda que, caso no se obtenha vaga de imediato naquele estabelecimento, possvel consegui-la em outro similar, nos termos dos arts. 96, Ido CP e 14, 2 da Lei de Execuo Penal, ressaltando-se a indispensabilidade da garantia de

    38

    MARCO, Renato, op., cit., p. 21.

  • 33

    custdia, a fim de evitar a fuga do internado (RJDTACRIM 37/425).

    39

    V-se que para que o preso veja concretizado seu direito

    assistncia mdica, deve buscar o judicirio, o que torna por demais burocrtica a

    efetivao de seus direitos, correndo o risco de ocorrer tardiamente. Contudo, h

    que se louvar os julgados que concedem o tratamento extramuros e reconhecem

    a insuficincia na prestao desses direitos pelo Estado.

    Quando o condenado carecer de cuidados especiais e no for recomendvel o tratamento na unidade prisional, o preso deve ser encaminhado a estabelecimento hospitalar pblico, previamente indicado em lei de organizao estadual, com a devida autorizao do diretor do estabelecimento penal.

    40

    Atente-se ao fato de a prestao de servios de sade se dar de

    forma externa, implicando em gastos ainda maiores ao Estado do que a

    organizao em quadro de pessoal, bem como da estrutura fsica, uma vez que

    dever arcar com a escolta policial at o local de atendimento, que importa no

    deslocamento de agentes policiais, combustvel, alm das despesas com o

    atendimento hospitalar em si. Portanto, vislumbra-se a ausncia de planejamento

    adequado, no precisando ser um individuo com habilidades ou conhecimentos

    especiais para enxergar o bvio que, de to obvio, chega a assustar que no seja

    feito nada a respeito.

    3.4 Assistncia Jurdica

    A vivncia jurdica nos mostra que grande parcela da populao

    carcerria no conta com advogado constitudo por falta de condies financeiras

    para tanto, desse modo valem-se da defensoria pblica para apresentarem suas

    defesas e pretenses ao judicirio, sendo tal assistncia destinada justamente a

    essas pessoas.

    A assistncia jurdica destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogados. Pobres na acepo jurdica do termo, assim considerados aqueles que no renam condies de custear a

    39

    MIRABETE, Julio Fabbrini, op., cit., p. 72. 40

    TONELLO, Lus Carlos Avansi. Manual de Execuo Penal. 1 Ed. Cuiab: Editora Janina, 2009, p. 38.

  • 34

    contratao de advogado sem prejuzo do

    sustento prprio e de sua famlia.41

    Ocorre que tambm sabido que os defensores pblicos so

    responsveis por inmeras outras questes que no dizem respeito ao direito

    penal, atuando nas diversas reas do direito e, por isso, h insuficincia no

    quadro de carreira desses profissionais, que escolheram to nobre profisso.

    O que sucede que a assistncia jurdica se mostra de extrema

    importncia para a populao carcerria que, muitas e muitas vezes, v seus

    direitos violados e nada podem fazer a respeito, j que no contam com o devido

    amparo de seus defensores, seja por insuficincia de pessoal, seja por ausncia

    de local adequado para a instalao desses profissionais no estabelecimento

    prisional.

    Necessrio se faz lembrar que no apenas o defensor pode

    representar os interesses do preso, mas tambm o defensor dativo, sendo o

    advogado nomeado pelo magistrado para realizar a defesa do ru, tambm

    denominado de defensor ad hoc. claro que necessria uma contraprestao

    estatal pelo ofcio do advogado, entretanto, muitos enxergam como caridade tal

    ao, devendo haver uma indenizao, tambm conhecida como honorrios

    advocatcios j que decorrem da prestao do trabalho tcnico pelo profissional.

    Para o presidente do TJ-MG, desembargador Cludio Costa, "ao simplificar o sistema de pagamento de honorrios, eles contaro com mais agilidade e menor burocracia". Ele destacou que esse convnio no paga o advogado, apenas o indeniza um pouco. "O que o advogado faz caridade, ainda que receba, no so honorrios, mas indenizao. Muitas vezes, ele se sacrifica para dar um pouco do seu trabalho aos necessitados".

    42

    Infelizmente no Brasil verifica-se a incidncia de inmeros casos em

    que o preso cumpriu sua pena e ainda continua no estabelecimento prisional em

    face da no observncia e acompanhamento adequado, tanto por seus

    defensores, quanto pelo judicirio, implicando em mutires judiciais que se

    realizam ano aps ano, como forma de amenizar essa lamentvel situao, o que

    41

    MARCO, Renato, op., cit., p. 22. 42

    SCRIBONI, Marlia. Em Minas, advogados dativos recebero em um ms. Revista Consultor Jurdico. Disponvel em: . Acessado em: 10 de fev. 2012.

  • 35

    torna ainda mais imprescindvel a observncia do direito assistncia jurdica

    trazida pela Lei de Execues Penais.

    Uma vertente bastante interessante para reverter a ineficincia

    nessa espcie de assistncia, seria a possibilidade de o poder pblico firmar

    convnio com universidades para que os alunos do curso de direito possam, ao

    mesmo tempo em que aprendem, prestar atendimento jurdico ao presos.

    Por isso, os Estados-Membros devem aparelhar as unidades prisionais, disponibilizar defensores pblicos, ou at mesmo facilitar convnios com faculdades, para que advogados, professores universitrios e estagirios de direito possam oferecer o servio de atendimento jurdico.

    43

    A ideia que se faz acerca da necessidade dessa assistncia que

    serve to somente para a fase processual em si e, sendo finalizado o processo,

    finaliza-se tambm a atuao do profissional. Tal postura equivocada, uma vez

    que dentro do estabelecimento prisional a necessidade de acompanhamento

    judicial no nada menos importante que a fase inicial, pelo contrrio, mostrando-

    se fundamental, principalmente no que tange efetivao do cumprimento da

    pena pelo condenado.

    O atendimento, na maioria dos Estados, abrange apenas aspectos relativos fase puramente judicial, no havendo a menor preocupao com a situao do interno diante da direo do presdio, nem equipes que funcionem sistemtica e continuadamente no estabelecimento. Indispensvel, pois, que se tornasse obrigatria para os Estados a instalao em todos os presdios desses servios de assistncia jurdica.

    44

    Alm de prestar socorro ao preso, a assistncia jurdica compreende

    tambm seus familiares, tendo sido criado pelo Governo Federal via Ministrio da

    Justia, o Programa Nacional de Segurana Pblica com Cidadania (PRONASCI)

    que inclui como principal objetivo a assistncia ao preso, presa e seus familiares

    pela defensoria pblica, dando enfoca na efetivao dos direitos humanos a

    todos.

    Nas palavras de Manoel Pedro Pimentel, que inclusive d nome funo acima mencionada: importante que o preso sinta ao seu alcance a possibilidade de lanar mo das

    43

    TONELLO, Lus Carlos Avansi, op., cit., p. 38. 44

    MIRABETE, Julio Fabrini, op., cit., p. 73-74.

  • 36

    medidas judiciais capazes de corrigir eventual excesso de pena, ou que possa abreviar os dias de priso. Para isso, deve o Estado tendo em vista que a maioria parte da populao carcerria no dispe de recursos para contratar advogados, propiciar a defesa dos presos.

    45

    A figura do assistente jurdico, qualquer que seja sua titulao e

    status, se apresenta como essencial, no mbito da prpria legalidade processual.

    A assistncia jurdica, muitas vezes no observada, de fundamental importncia para os destinos da execuo da pena. Alis, sua ausncia no processo de execuo acarreta flagrante violao do princpio da ampla defesa, que tambm deve ser observado em sede de execuo.

    46

    Assim, correlacionando a necessidade de um defensor, encontramos

    guarida na Constituio Cidad de 1988, que garante o contraditrio e ampla

    defesa ao acusado, o que somente pode ocorrer mediante atuao do profissional

    apto a apreciar as questes jurdicas em concreto e, sua ausncia, causa de

    nulidade da deciso jurisdicional na execuo.

    3.5 Assistncia Educacional

    No h divergncia quando o assunto a essencialidade da

    educao para o desenvolvimento de uma nao, que no se faz com armas,

    mas com caneta e papel. Embora tal assertiva seja unnime, manifesta a

    ausncia de aplicabilidade nesse sentido, donde se v professores mal

    remunerados e alunos entrando no ensino mdio mal sabendo ler e escrever. Nos

    estabelecimentos prisionais a realidade no diferente, sendo ainda mais

    alarmante.

    A cada trmino de mandato os polticos renovam as j manjadas

    promessas de melhoria da educao, de valorizao do professor e da estrutura

    fsica das instituies de ensino e os eleitores, j acostumados com a mesmice

    que nunca se concretiza, ainda tentam renovar suas esperanas.

    45

    JORGE, Estvo Lus Lemos, op., cit., p. 21. 46

    MARCO, Renato, op., cit., p. 23.

  • 37

    A Constituio Cidad de 1988 preconiza que a educao direito

    de todos e dever do Estado, que mais uma vez deixa, e muito, a desejar. J a Lei

    de Execuo Penal prev que o ensino de primeiro grau seja obrigatrio.

    Partindo-se da ideia de indispensabilidade da educao para a

    renovao do ser humano, que passa a possibilitar que o preso compreenda as

    situaes ao seu redor, sentindo-se parte de um todo, temos ser fundamental sua

    aplicao.

    Assim, pois, qualquer pessoa, no importa a idade e tampouco sua

    condio ou status jurdico, tem o direito de receber educao desde que,

    evidentemente, seja dela carente qualitativa ou quantitativamente.47

    Ainda mais essencial do que a educao extramuros, a

    concretizao da mesma dentro dos estabelecimentos prisionais tem uma funo

    a mais: transformar o indivduo que no a possui, de renovar-lhe a confiana em

    si mesmo.

    A assistncia educacional deve ser uma das prestaes bsicas mais importantes no s para o homem livre, mas tambm quele que est preso, constituindo-se, neste caso, em um elemento do tratamento penitencirio como meio para reinsero social.

    48

    Ainda nesse sentido nos esclarece o magnnimo Tonello em sua

    obra: A educao dos presos uma preocupao da execuo penal devido sua

    capacidade transformadora, seja na formao de um cidado mais consciente ou

    na capacitao de um trabalhador mais preparado para o mercado de trabalho.49

    Apesar de expressa na LEP a obrigatoriedade de os presos

    cursarem o primeiro grau dentro dos estabelecimentos prisionais - ou ao menos

    que sejam oferecidos meios para tanto -, a realidade mais uma vez nos assola.

    claro que no simples que sejam oferecidos cursos e aulas dentro do

    estabelecimento, contudo, h que se concretizar os preceitos constitucionais e

    infraconstitucionais vigentes.

    Tero os presos o direito instruo de primeiro grau se no o tiverem, e a essa instruo deve o Estado arcar com os custos, como deveria fazer com qualquer pessoa em liberdade. Deve haver, assim, nos

    47

    MIOTTO, Armida Bergamini. Curso de cincia penitenciria. 1 Ed. So Paulo: Saraiva, 1975, p. 403, v. 2. 48

    MIRABETE, Julio Fabrini, op., cit., p. 76. 49

    TONELLO, Lus Carlos Avansi, op., cit., p. 38-39.

  • 38

    estabelecimentos prisionais, escolas ou substitutivos que a ela se equiparem, podendo haver convnios com escolas pblicas ou particulares que ofeream cursos especializados.

    50

    Nesse sentido, a LEP j prev para os presos que cumprem pena

    em regime semiaberto, sada temporria, sem necessidade de vigilncia direta,

    dentro outros casos, para a frequncia em curso profissionalizante, bem como de

    segundo grau ou superior, desde que ministrados na comarca do Juzo da

    execuo. Aqui se inserem os casos de monitorao eletrnica via tornozeleira,

    subterfgio recentemente implantado no ordenamento jurdico.

    Observe-se que a LEP no previu a sada temporria para

    frequncia em curso de primeiro grau, atestando mais uma vez a necessidade de

    o mesmo ser ministrado em crcere.

    Considerando a dificuldade em se manter cursos educacionais

    dentro do estabelecimento prisional, a LEP tambm j previu a hiptese de

    utilizar-se dos convnios com instituies pblicas ou privadas, a fim de no se

    perder de vista o importante papel da educao na reinsero do preso

    sociedade. Aqui se verifica a participao da sociedade nesse sentido, onde pode

    se engajar com o objetivo de oferecer vagas e auxiliar na educao dos presos.

    Frise-se que a regulamentao dos convnios dever ser instituda em lei

    estadual, j que compete a cada unidade da federao cuidar dessa espcie de

    assistncia.

    Insta salientar a possibilidade de o preso remir parte de sua pena

    pelo estudo. A cada 12 horas de estudos, divididas em no mnimo trs dias, um

    dia de pena ser remido, seja em atividades de ensino fundamental, mdio ou

    profissionalizante, o que incita ainda mais o preso participar de atividades

    educacionais.

    O ensino profissionalizante, embora facultativo, importantssimo

    para o preso, que poder aperfeioar-se em determinada rea e quando sair

    poder exercer ofcio de forma especializada. Alm do benefcio prprio ao preso

    que ter acesso s aulas, essas refletiro em facilidade para obteno de

    emprego, o que pode ser causa da no reincidncia do mesmo, que ter

    recuperada sua autoconfiana por meio do trabalho, que lhe permitir suprir suas

    necessidades e de seus familiares.

    50

    JORGE, Estvo Lus Lemos, op., cit., p. 22.

  • 39

    Tendo em vista os diversos nveis educacionais que podem ser

    aplicados aos presos, h que se fazer uma triagem acerca da formao bsica de

    cada um, a fim de que seja possvel oferecer atividades condizentes com suas

    necessidades diante da carncia em alguns aspectos pontuais.

    O ensino profissional dever ser em nvel de iniciao ou de aperfeioamento tcnico para aqueles que j tiveram a formao bsica profissional antes da priso. Nessa hiptese, ao iniciar-se o cumprimento da pena privativa de liberdade, deve ser feita uma previso quanto sondagem de aptides do condenado, iniciando-se o ensino para a instruo profissional, tendo-se em vista o tempo em que o condenado dever permanecer preso.

    51

    Assim como o ensino de primeiro grau, a existncia de biblioteca

    tambm obrigatria nos estabelecimentos prisionais, devendo conter livros com

    contedos didticos, instrutivos e recreativos. As bibliotecas, alis, proporcionam

    uma diversidade de opinies sobre o mesmo assunto, o que eleva o nvel

    intelectual e prope ao leitor a formao de uma opinio nica, o que bastante

    interessante no que se refere ao preso, que busca tambm por definir uma nova

    personalidade, um novo modo de pensar e agir.

    "A instruo tem por objetivo formar a pessoa humana do recluso,

    segundo sua prpria vocao, sobretudo, para reincorporar-se na comunidade

    humana e dar sua contribuio na realizao do bem comum".52

    O objetivo dessa espcie de assistncia ultrapassa o prprio preso,

    mostrando-se interessante at mesmo na questo disciplinar dentro do

    estabelecimento, refletindo em condutas positivas.

    A assistncia educacional tem por escopo proporcionar ao executado melhores condies de readaptao social, preparando-o para o retorno vida em liberdade de maneira mais ajustada, conhecendo ou aprimorando certos valores de interesse comum. inegvel, ainda, sua influencia positiva na manuteno da disciplina do estabelecimento prisional.

    53

    Tramita perante a Cmara dos Deputados, o Projeto de Lei n

    7791/10, que pretende alterar a LEP para incluir, alm da obrigatoriedade do

    51

    MIRABETE, Julio Fabrini, op., cit., p. 77. 52

    ALBERGARIA, Jason, Direito Penitencirio e Direito do Menor. 1 Ed. Belo Horizonte: Editora Mandamentos, 1999, p. 164-165. 53

    MARCO, Renato, op., cit., p. 23-24.

  • 40

    ensino de primeiro grau, atividades educacionais por iniciativa prpria, sempre

    que no for possvel estabelecer convnios, que ser fiscalizada pelo chamado

    Conselho da Comunidade, que dever relatar a situao ao Juiz da Execuo

    local e ao Ministrio Pblico. Fica a torcida para que seja implementado o mais

    rpido possvel.

    3.6 Assistncia Social

    A presena de assistentes sociais, ainda mais importante que no

    mbito daqueles que se encontram em liberdade, se mostra imprescindvel vida

    dos que esto reclusos, diante do ambiente monstruoso em que esto inseridos.

    J diz a LEP que a finalidade da assistncia social dentro dos

    estabelecimentos prisionais tem a finalidade de amparar e preparar o preso para

    o retorno em liberdade.

    Art. 23. A assistncia social tem por finalidade amparar o preso e o

    internado e prepar-los para o retorno liberdade.54

    O papel da assistncia social tem por finalidade levar o preso a uma

    reflexo sobre seus atos e sobre si mesmo, havendo uma correlao acerca do

    que o levou priso e como evitar que isso ocorra novamente. claro que os

    cidados de modo geral enfrentam problemas econmicos, sociais e polticos,

    que podem direcionar determinadas atitudes e o servio social vem para ajustar

    as condutas realidade desejada.

    Em razo da ausncia de implementao das demais espcies de

    assistncia dentro da priso, o preso vive momentos de cio que, combinados

    com a realidade descomunal vivida, pode lev-lo a uma confuso de

    pensamentos e percepes negativas, principalmente acerca de sua vida e de si

    mesmo, o que prejudica no tratamento de recuperao do mesmo, sendo o

    assistente social primordial nesses momentos. Cabe destacar que a assistncia

    social estende-se aos familiares do preso, que tambm necessitam de auxilio

    nesse momento conturbado de suas vidas e, principalmente, para receb-lo de

    maneira adequada no momento da to esperada liberdade.

    54

    VADE MECUM SARAIVA, op., cit., p. 583.

  • 41

    A ao do Servio Social visa facilitar para o sentenciado rever seu papel enquanto homem, em relao famlia e sociedade; auxilia os sentenciados a analisar e refletir sobre o delito cometido, assim como sua conduta frente sociedade, esclarecendo seus direitos e deveres, tentando buscar alternativas de ao para a reinsero dos mesmos. Ao Servio Social cabe o papel de orientador e esclarecedor dos direitos e deveres desse cidado, bem como o compromisso de estabelecer uma relao de confiana e credibilidade, pois, neste momento iniciase uma nova etapa na vida do sentenciado, etapa esta de reeducao, ressocializao e de resgate a princpios bsicos da cidadania.

    55

    Dentre outras incumbncias, deve o assistente social, que

    acompanhar individualmente cada um dos presos, elaborar relatrio acerca dos

    problemas e dificuldades enfrentadas por cada um deles, que podero valer-se de

    mais essa convenincia para reivindicar seus direitos.

    Ser traado um perfil de cada um dos presos, compreendendo sua

    vida pregressa e atual, com suas habilidades e dificuldades, para ao final traar

    um mtodo de trabalho que propicie a formao de uma nova identidade, no

    sentido de acrescer qualidades ao preso, que ser reajustado sociedade.

    Dever ser feita verdadeira pesquisa e triagem social formulando resultados que

    demonstrem o motivo da delinquncia de cada um, o que poder ser observado

    pelo poder pblico para o fim de coibir as prticas, agindo no sentido da

    preveno dos delitos.

    Um fator importante que se deve mencionar a incitao ao preso

    buscar sua recuperao primeiramente enxergando seu erro, pois pouco adianta

    o poder pblico e a sociedade contriburem para a reinsero do preso se este

    no se permitir melhorar. Desta forma, necessrio que os profissionais do

    servio social estimulem o preso a buscar seu reajustamento.

    Nos casos em que o preso obtm autorizao de sada ou sada

    temporria, deve o assistente social acompanhar o resultado das mesmas, tendo

    em vista que alguns dos presos se aproveitam dessas oportunidades para fugir,

    da a necessidade do acompanhamento para analisar o que foi feito nessa sada

    do preso, podendo analisar os resultados da assistncia efetuada.

    55

    FERRAZOLI, Mayara; CALOBRIZI, Maria Dvanil DAvilla, O trabalho do assistente social x A ressocializao dos presidirios. Disponvel em: . Acessado em: 11 de fev. 2012.

  • 42

    A recreao tem a funo de aliviar tenses e situaes difceis,

    possibilitando ao recreando a integrao com outras pessoas de modo pacfico e

    refgio de muitos seres humanos. Partindo-se desse entendimento, atividades

    recreativas se mostram de grande valia dentro dos estabelecimentos prisionais,

    que tem o condo de manter a sade fsica e mental dos presos, alm de

    estimular a interao e o convvio pacfico entre eles.

    O homem necessita de recreao em suas diversas formas, no s por motivos de ordem higinica, para a sade fsica e psquica, mas tambm por motivos de ordem moral, pois o equilbrio da pessoa humana abrange tambm o comportamento tico.

    56

    Ainda nesse sentido: Os lazeres de atividade

    contribuem para exercitar a sua capacidade de iniciativa e de realizao; a sua imaginao; a sua dedicao e senso de responsabilidade, vencendo obstculos e dificuldades, at concluir o que se props a fazer, realizar ou alcanar. Essas atividades de lazer ele as realiza porque quer, porque gosta, movido por suas reservas ntimas (ainda que habilmente estimulado por outrem). Alm disso, esses lazeres constituem bom instrumento ou ocasio de desabafo (ab-reao) da tenso ntima produzida pela atmosfera psicolgico opressiva, carregada, prpria da priso.

    57

    Por todo o exposto, percebe-se que a assistncia social possui uma

    atribuio especial no que se refere melhora no quadro psicolgico do preso e

    no direcionamento de seus atos, alm da elaborao do importante relatrio

    acerca de sua vida, o que pode fazer o Estado compreender melhor essa parcela

    da populao, com o fim de tomar providncias para coibir a criminalidade, agindo

    com base em aspectos pontuais diagnosticados.

    3.7 Assistncia Religiosa

    A realizao do liame entre a priso e a religio parece sensvel

    demais a ponto de se chocarem. Contudo, quando se v a funo de um e outro e

    no seus aspectos externos e fsicos, percebe-se a imensa necessidade dessa

    juno, que pode alcanar resultados fantsticos.

    56

    MIRABETE, Julio Fabbrini, op., cit., p. 81. 57

    MIOTTO, Armida Bergamini, op., cit., p. 505.

  • 43

    As estatsticas atribuem religio boa parte das ressocializaes,

    no exatamente em razo da ao sobrenatural - ou talvez sim - sobre o

    indivduo, mas em decorrncia da conduta que esse passa a ter aps conhecer

    das regras crists.

    J no Sistema Pensilvnico, relatado anteriormente, a nica

    atividade permitida era a leitura da bblia, a fim de que os presos meditassem e

    refletissem acerca de seus atos. Assim tambm se fazia nos tempos da Idade

    Mdia, onde os imperadores romanos chamavam os sacerdotes para amparar os

    encarcerados.

    A tentativa de reformar o preso por meio da religio muito antiga, e j na poca do Imprio Romano o Estado chamou os sacerdotes aos crceres para dar-lhes consolo e assistncia moral necessria. A ideia de que clrigos ou monges fossem recolhidos a suas celas nos mosteiros da Idade Mdia para se dedicarem meditao e arrependerem-se da falta cometida, reconciliando-se com Deus, praticamente foi a determinante na construo da primeira priso destinada ao recolhimento de criminosos, a House of Correction, construda em Londres entre 1550 e 1552, e John Howard, autor de The state of prision in England and Walles, de 1576, converteu a assistncia religiosa em um dos pontos fundamentais de seu sistema carcerrio, propondo que em todas as prises houvesse um capelo e que se realizassem no presdio prticas religiosas e a leitura de livros religiosos antes de refeies.

    58

    Nota-se que h muito recorre-se religio para sanar algumas

    feridas trazidas no cerne dos presos, que muitas vezes s um verdadeiro trabalho

    espiritual capaz de modificar, quando a assistncia social e as demais espcies

    de assistncia se mostrarem ineficazes.

    reconhecido que a religio um dos fatores mais decisivos na ressocializao do recluso. Dizia Pio XII que o crime e a culpa no chegam a destruir no fundo humano do condenado o selo impresso pelo Criador. este selo que ilumina a via da reabilitao. O Capelo Pier afirmava que a misso da instituio penitenciria despertar o senso de responsabilidade do recluso, abrir-lhe as portas dos sentimentos nobres, nos quais Deus mantm acesa a chama da f e da bondade capaz de produzir o milagre da redeno do homem.

    59

    58

    MIRABETE, Julio Fabbrini, op., cit., p. 84-85. 59

    ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execuo penal. 3 Ed. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1996, p. 162.

  • 44

    Para os religiosos fcil atribuir religio a converso desses

    indivduos, mas os cticos tambm reconhecem a importncia dessa assistncia,

    que devido ao rigor das regras impostas, muitas vezes mais rigorosas at que as

    condutas exigidas dentro da priso, acaba por traar um novo perfil de conduta,

    havendo um considervel avano no que se refere s atitudes e percepo de

    mundo pelo preso.

    Muito embora faamos a ligao direta de religio com catlicos e

    evanglicos, importante frisar todos os tipos de cultos e crenas devem ser

    respeitadas e podem ser realizadas dentro do estabelecimento prisional. Sendo o

    Brasil um pas laico, onde no vigora nenhuma religio oficial, os cidados tem

    livre escolha de culto, desde que respeitados os limites da lei, no importando em

    sacrifcio humano, por exemplo, devendo ser respeitados os preceitos

    fundamentais trazidos pela Constituio da Repblica Federativa do Brasil.

    Curiosamente, no Carandiru, hoje Casa de deteno de So Paulo, chegou a existir seita satnica com mais de 200 membros, perfeitamente legal, desde que as celebraes no envolvam sacrifcio humano, ou outras prticas vedadas em lei.

    60

    Cabe salientar que o preso pode recusar-se a frequentar qualquer

    reunio, culto, missa ou encontro de qualquer religio, no importando em

    reflexos negativos a esse respeito, tanto legal quanto socialmente.

    Para a Pastoral Carcerria, o ano de 2011 foi de grandes realizaes e desafios: mais de 6000 voluntrios visitaram prises de todo o pas; com a ajuda da Pastoral, o Brasil foi levado Comisso Interamericana de Direitos Humanos e dezenas de casos de tortura foram denunciados.

    61

    Engana-se quem pensa que os grupos religiosos existentes dentro

    das prises possuem o fito de elevar suas preces. A Pastoral Carcerria, grupo

    religioso que conta com mais 6.000 voluntrios em todo o pas, com diversas

    filiais e liderada por um padre, oferece cursos de justia restaurativa, presta

    assistncia jurdica, no propriamente dita por lhes faltarem a titulao

    necessria, qual seja, a de advogados, contudo, servem como um trampolim para

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    TONELLO, Lus Carlos Avansi, op., cit., p. 39. 61

    MARTINUZ, Ervino. Conquistas e Desafios da Pastoral Carcerria no Brasil. Disponvel em: . Acessado em: 04 de mar. 2012.

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    o preso, que obtm informaes acerca de seus processos com essa equipe,

    alm de realizar palestras destinadas a magistrados, promotores, policiais e a

    sociedade civil em geral sobre preveno da tortura.

    A Pastoral Carcerria acaba por acumular outras espcies de

    assistncia em sua finalidade, j que atua como verdadeira defensora dos presos,

    denunciando tortura e maus tratos dentro dos estabelecimentos prisionais,

    contando inclusive com advogados em seu escritrio.

    Dessa maneira, as instituies religiosas, principalmente evanglicas e catlicas, suprem as carncias, preenchem as lacunas deixadas pelo Poder Publico em no violar o princpio da Dignidade Humana. A partir de seus recursos, os agentes religiosos assistem materialmente e juridicamente fornecendo-lhes condies mnimas de higiene e de defesa, respectivamente.

    62

    Embora a assistncia religiosa esteja expressamente prevista na

    LEP e, vista como uma das pioneiras quando se fala em ressocializao, verifica-

    se a resistncia da direo dos estabelecimentos prisionais em permitir a entrada

    dos colaboradores dos grupos religiosos, fomentando as suspeitas de que tal

    resistncia no de todo desinteresse, sendo feita para vetar a possibilidade de

    controle externo, j que, assim como a Pastoral Carcerria, outros grupos

    religiosos vo alm e denunciam situaes irregulares dentro do estabelecimento.

    Portanto, neste Estado existe uma alergia ao controle externo do Sistema Penitencirio, o controle exercido pela sociedade civil organizada e, de maneira incrvel, pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos, nomeado pelo prprio Governador do Estado, embasado em uma lei estadual, a de n 5.165, de1995, que reza, em um dos seus artigos, que o Conselho Estadual de Direitos Humanos tem a autoridade de fazer diligncia em qualquer presdio do Sistema Penitencirio. Ns fomos vrias vezes impedidos de entrar no Sistema Penitencirio, alegado o motivo da falta de segurana.

    63

    62

    GONALVES, Jos Artur Teixeira; COIMBRA, Mrio; AMORIM, Daniela de Lima. Assistncia Religiosa e suas Barreiras: Uma leitura luz da LEP e do sistema prisional. Disponvel em: . Acessado em: 14 de fev. 2012. 63

    Cmara dos Deputados. 7 diligncia [Depoimentos de SAVRIO PAOLILO e CAMILLE POLTRONIERE SANTANA]. Departamento de Taquigrafia, Reviso e Redao. Ncleo de redao final em comisses. Texto com redao final. CPI: sistema carcerrio, Vitria - ES, 8 nov. 2007a. Disponvel em: . Acessado em: 14 de fev. 2012.

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    Ass