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7/31/2019 A Efetividade Dos Direitos Fundamentais
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Artigos Doutrinrios Felipe Silva Noya
Sumrio
Introduo; 2 Questes terminolgicas; 3
Princpios, regras e postulados; 4 A estrutura normativa
dos direitos fundamentais; 5 Os direitos fundamentais
como direitos subjetivos; 6 Eccia e exigibilidade dos
direitos fundamentais; Concluso; Referncias.
Introduo
A presente pesquisa busca tecer algumasconsideraes acerca da estrutura e da eccia das
normas de direitos fundamentais.
Para cumprir tal desiderato, buscamos, em
primeiro lugar, esclarecer questes terminolgicas
que envolvem grande confuso na denominao
desses direitos, mas que vem sendo claricada pela
doutrina que busca uma sistematizao no uso dos
termos comumente utilizados para designar os direitos
fundamentais.
A partir desse ponto, passamos ao estudo da sua
estrutura normativa formulando breves comentriossobre a distino entre regras, princpios e postulados,
em especial aquela trazida por Robert Alexy e Humberto
vila para s ento adentrarmos na estrutura normativa
das normas objeto da pesquisa.
Com essas premissas examinamos a natureza
dos direitos fundamentais como direitos subjetivos e a
essencialidade ou no de se considerar a existncia de
um dever que lhe intrinsecamente correlato seguindo,
como consequncia, para os questionamentos sobre a
sua eccia, em especial face escassez de recursos.Que o esclarecimento sobre esses temas agura-
se de grande importncia despiciendo raticar tanto
pelos constantes equvocos na interpretao/aplicao
na praxis forense das normas de direitos fundamentais
como pela ausncia de uma apreenso harmnica pela
doutrina.
O contedo dos direitos fundamentais: consideraesacerca da estrutura e da eficcia normativa
Felipe Silva Noya*
*Bacharel em Direito laureado pela Universidade Salvador UNIFACS,especialista em Direito Processual Civil, mestrando em Direito
pblico pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente analistana Defensoria Pblica da Unio em So Paulo, exercendo a funode assessor do defensor chefe.
Atento a isto, buscamos, no texto que se segue,
xar algumas concluses sobre o problema proposto.
2 Questes terminolgicasJuntamente expresso direitos fundamentais, a
doutrina vem se utilizando de outros vocbulos para
indicar as mesmas espcies normativas, tais quais
direito naturais e direitos humanos.
No obstante a confuso terminolgica, formou-
se certo consenso ao se atribuir diferena entre asexpresses direitos fundamentais e direitos humanos.Nesse sentido leciona Ingo Wolfgang Sarlet:
Em que pese sejam ambos os termos (direitos
humanos e direitos fundamentais) comumente
utilizados como sinnimos, a explicao corriqueira
e, diga-se de passagem, procedente para a distino de que o termo direitos fundamentais se aplica
para aqueles direitos do ser humano reconhecidos
e positivados na esfera do direito constitucionalpositivo de determinado Estado, ao passo que a
expresso direitos humanos guardaria relao com
os documentos de direito internacional, por referir-se quelas posies jurdicas que se reconhecem ao
ser humano como tal, independentemente de sua
vinculao com determinada ordem constitucional,e que, portanto, aspiram validade universal, para
todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um
inequvoco carter supranacional (internacional)1.
Para alm dessa distino em relao ao
mbito de positivao, Ingo Sarlet aponta que ograu de efetivao dos direitos fundamentais, por
incidirem dentro de uma ordem jurdica especca,
consideravelmente maior do que o grau de efetivao
dos direitos humanos, at mesmo porque dentro destaordem jurdica existem instncias (especialmenteas judicirias) dotadas do poder de fazer respeitar e
realizar estes direitos2.
Por outro lado, expresses como liberdadespblicas3 e direitos pblicos subjetivos pecam pela
1 SARLET, Ingo Wolfgang. A eccia dos direitos fundamentais. 6. ed.,Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 35-36.
2 Ibidem, p. 40.
3 A expresso liberdade pblica aparece na Frana no nal do sculoXVIII, sendo expressamente empregada no art. 9 da Constituio de
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reduzida margem qual se referem. que se a
primeira expresso ca circunscrita a uma ideia de
no interveno na esfera individual, a segunda limita-
se a uma noo individualista que, por certo, afasta
aqueles direitos ditos transindividuais, os quais, muitomesmo por tal caracterstica, so considerados direitos
fundamentais.
Tambm a ideia de direitos naturais traz uma
noo equivocada de um direito pr-existente
que seria meramente descoberto e declarado pelo
ordenamento jurdico; nesse sentido, Prez Luo
arma que o conceito dos direitos humanos tem como
antecedente imediato a noo dos direitos naturais
em sua elaborao doutrinal pelo iusracionalismonaturalista4.
Essa ideia dos direitos naturais, conforme aponta
Andr Ramos Tavares:
Compreende o processo de positivao dos
direitos humanos como a consagrao normativa
de exigncias que so prvias prpria positivao,
ou seja, o reconhecimento, no plano das normas
jurdicas, de faculdades que correspondem ao
Homem pelo simples fato de s-lo, vale dizer, emvirtude de sua prpria natureza5.
Esse vnculo entre a expresso direitos naturais e
o jusnaturalismo a relegou ao desuso, em especial pela
superao da referida linha juslosca, de forma que
a expresso preferida neste trabalho, em especial por
ter seu mbito de estudo circunscrito ao ordenamento
brasileiro, a dos direitos fundamentais.
1.793 daquele pas. Neste se proclamava: la loi doit protger la libertepublique et individuelle contre loppresion de ceux qui gouvernent. Otermo, empregado no singular, ainda utilizado, da mesma forma,na exposio de motivos da Constituio de 1.814. A primeira vezem que apareceu o termo liberte publiques (plural) em TextoConstitucional foi precisamente no art. 25 da Constituio do IIImprio de 1.852. Atualmente, o Decreto ministerial de 30 de abrilde 1.997 qualica o tema como o emprego da expresso Droit dsLiberts Fondamentales (TAVARES, Andr Ramos. Curso de DireitoConstitucional.3.ed. So Paulo: Saraiva, 2006, p .406).
4 PREZ LUO, Antonio Enrique. Delimitacin conceptual delos derechos humanos. In: _____ (et al). Los derechos humanos:Signicacin, estatuto rdico y sistema. Sevilla: Publicaciones
Universidad de Sevilla, 1979. p. 17.
5 TAVARES, op. cit, p. 400.
3 Princpios, regras e postuladosTanto a doutrina de Karl Larenz6 quanto a de
Hans Kelsen7 traziam a ideia de que norma jurdica
era apenas aquela formulada em estrutura de regra
devido ausncia de carter vinculativo dos princpiosjurdicos.
A Teoria Pura acarretou a equiparao dos
conceitos de Direito e lei ocupando-se da anlise
apenas do direito positivado8; visava, assim, afastar o
valor de justia, de forma que ao jurista s interessa a
aplicao daquela norma, conhecendo-a e afastando
todo o carter axiolgico no se julga o direito
positivo9.
Tal posio, conforme aponta Eros Roberto Grau,
pode ser vista na crtica de Kelsen a Esser ao tecer
comentrios acerca da positivao dos princpiosquando aquele arma que princpios morais, polticos
ou dos costumes no podem ser chamados de
jurdicos seno na medida em que inuenciam a criao
de normas jurdicas individuais pelas autoridades
competentes10, e assim o pois o direito isento de
valores.
Nesse sentido, Friedrich Muller arma que:
De acordo com a inteno da teoria pura
do direito, a norma jurdica como juzo hipottico
no deve mais apresentar nenhuma semelhana
ideolgica com a norma moral imperativa. O deverser do direito positivo remanesce apenas como
expresso do nexo de condio e conseqncia no
enunciado jurdico. Na nova verso dessa teoria da
norma jurdica, o carter jurdico-cientco tambm
de uma autossucincia extremamente formalista;
ca excluda outrossim, junto com tudo o que
6 LARENZ, Karl. Metodologia da Cincia do Direito. 3. ed. Lisboa:Fundao Calouste Gulbenkian, 1997.
7 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. So Paulo: Martins Fontes.
1999.8 Como bem aponta Friedrich Muller A denominao usual da teoria
kelseniana de normativismo excessivamente otimista; ordensisoladas sem referncia material carecem de acesso normatividade. verdade que Kelsen concebe somente na segunda edio dasua Teoria Pura do Direito a norma jurdica, agora distinguida doenunciado jurdico, como um imperativo maneira de um quadroreferencial; na primeira edio ela fora igualada ao enunciado
jurdico (que apresenta a forma fundamental da lei) e caracterizadacomo juzo hipottico. Mas em ambos os casos est expurgada danorma jurdica a pergunta pela correo do seu contedo ( in Teoriaestruturante do Direito. 2. ed. So Paulo: RT, 2009, p. 25).
9 GOMES, Orlando. Razes histricas e sociolgicas do Cdigo Civilbrasileiro. So Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 47.
10 GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretao/aplicao do Direito. 3. ed. So Paulo: Malheiros, 2005, p. 46.
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metajurdico, toda e qualquer normatividade
concreta; resulta extremada a medida da
objetividade, de acordo com um ideal extrajurdico
de lgica formal. A distino entre interpretao
autntica e no-autntica corresponde distino
entre norma jurdica e enunciado jurdico. Elaborados
em interpretao no-autntica pela cincia jurdica
na forma de juzos hipotticos, os enunciados
jurdicos descrevem as relaes constitudas pelas
normas jurdicas entre os suportes fticos por elas
determinados sem vistas a valores ou valoraes,
que podem ser considerados metajurdicos. Com
isso a cincia jurdica fornece enunciados, que
devem conter assim como as leis da natureza
das cincias naturais - uma descrio do seu objeto,
isenta de valores11.
No obstante, o desenvolvimento da cincia
jurdica acabou afastando essa falsa percepo de que
o Direito se dava de modo isento de valores.
Assim, vemos em Karl Larenz a importncia dos
princpios na identicao dos valores subjacentes
norma permitindo o preenchimento de lacunas e at
mesmo o desenvolvimento judicial do Direito. Nesse
sentido, embora no compreenda os princpios como
normas jurdicas lhes atribui carter jurdico, permitindo
que a ponderao levada a cabo luz desses princpios
possua, por sua vez, natureza jurdica. Assim:
Por valorar ou avaliar deve entender-se,
em primeiro lugar, um acto de tomada de posio.
O objecto a avaliar ser julgado como apetecvel ou
despiciendo, meritrio ou no meritrio, prefervel a
outro ou secundrio em relao a ele. Algo que todas
as pessoas ou uma pessoa de so entendimento
considera apetecvel chama-se um bem, por
exemplo, a paz, a sade, a independncia, a ausncia
de coaco e a necessidade. Uma actuao que
fomenta ou contm este e outros bens aprovamo-
la; uma actuao contrria desaprovamo-la. A
aprovao ou desaprovao encontram a sua
expresso num juzo de valor, que pode ser de
natureza moral ou, se se orienta por princpiosespecicamente jurdicos, de natureza jurdica12.
J em Robert Alexy13 as normas jurdicas so
divididas em duas espcies: as regras e os princpios.
Destarte, os princpios jurdicos integram a estrutura
da norma jurdica dos direitos fundamentais e a sua
11 MULLER, Friedrich. Teoria estruturante do Direito. 2. ed. So Paulo:RT, 2009, p. 26.
12 LARENZ, op. cit., p. 410.
13 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. So Paulo:Malheiros, 2008.
distino das regras torna-se uma das colunas-mestras
do edifcio da teoria dos direitos fundamentais14.
Partindo dessa premissa Alexy traz dois critrios
de distino: umprima facie e outro referente coliso
das regras e dos princpios. Pelo critrioprima facie,
Princpios so, por conseguinte, mandamen-
tos de otimizao, que so caracterizados por pode-
rem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de
que a medida devida de sua satisfao no depende
somente das possibilidades fticas, mas tambm
das possibilidades jurdicas. O mbito das possibi-
lidades jurdicas determinado pelos princpios e
regras colidentes.
J as regras so normas que so sempre ou
satisfeitas ou no satisfeitas. Se uma regra vale,
ento deve se fazer exatamente aquilo que ela exige;
nem mais, nem menos. Regras contm, portanto,determinaes no mbito daquilo que ftica e
juridicamente possvel. Isso signica que a distino
entre regas e princpios uma distino qualitativa e
no uma distino de grau15.
Por tais consideraes, percebe-se que os
princpios so mandados de otimizao devendo
ser realizados na maior medida possvel dentro das
possibilidades jurdicas e fticas existentes enquanto
que as regras seriam mandados de determinao de
forma que ou so cumpridas ou no na exata medida
de sua disposio.
O segundo critrio utilizado aquele referente ao
da coliso das normas, sendo que a soluo do conito
entre regras se d com a introduo em uma das regras
de uma clusula de exceo ou com a declarao de
invalidade de uma das normas para a eliminao do
conito16.
J em relao aos princpios, a sua coliso
resolvida de modo completamente diverso, por
meio do critrio do peso no caso concreto, dizer,
sob determinadas condies, um dos princpios irprevalecer o que no implica a retirada do que ceder
do ordenamento jurdico, tendo em vista que sob
outras condies este poder ter precedncia.
Assim, para Alexy, conitos entre regras ocorrem
na dimenso da validade, enquanto as colises entre
princpios visto que s princpios vlidos podem
14 Ibidem, p. 85.
15 Ibidem, p. 90-91.
16 Ibidem, p. 92.
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colidir ocorrem, para alm dessa dimenso, na
dimenso do peso17.
Criticando esses critrios, Humberto vila
arma a possibilidade de reformulao parcial do
critrio do modo nal de aplicao na medida em
que tambm as regras poderiam ser ponderadasmediante consideraes sobre aspectos concretos e
individuais18, enquanto os princpios tambm seriam
ou no aplicados: ou o comportamento necessrio
realizao ou preservao do estado de coisas
adotado, ou no adotado. Por isso, defender que os
princpios sejam aplicados de forma gradual baralhar
a norma com os aspectos exteriores, necessrios a sua
aplicao19.
A proposta de Humberto vila, por conseguinte,
produz uma reformulao parcial dos conceitos de
regras e princpios na medida em que arma que:
As regras so normas imediatamente descriti-
vas, primariamente retrospectivas e com pretenso
de decidibilidade e abrangncia, para cuja aplicao
se exige a avaliao da correspondncia, sempre
centrada na nalidade que lhes d suporte ou nos
princpios que lhes so axiologicamente sobrejacen-
tes, entre a construo conceitual da descrio nor-
mativa e a construo conceitual dos fatos.
Os princpios so normas imediatamente
nalisticas, primariamente prospectivas e com
pretenso de complementaridade e de parcialidade,
para cuja aplicao se demanda uma avaliao da
correlao entre o estado de coisas a ser promovido
e os efeitos decorrentes da conduta havida como
necessria sua promoo20.
Agregados s regras e aos princpios encontra-
mos na doutrina de vila os chamados postulados
normativos que integram a estrutura das normas ju-
rdicas. Assim, ao contrrio de Alexy que arma cate-
goricamente que toda norma ou uma regra ou um
princpio21, Humberto vila fundamenta uma cons-
truo tricotmica da norma jurdica dividindo-a em
regras, princpios e postulados.
A categoria dos postulados normativos, por sua
vez, pode ser dividida em duas espcies: os postulados
hermenuticos destinados a compreenso em geral
17 ALEXY, op.cit., p. 94.
18 VILA, Humberto. Teoria dos Princpios: da denio aplicao dosprincpios jurdicos. 10. ed. So Paulo: Malheiros, 2009, p. 48.
19 Ibidem, p. 50.
20 Ibidem, p. 78.
21 ALEXY, op. cit. p. 91.
do Direito e os postulados aplicativos, cuja funo
estruturar a sua aplicao concreta22, sendo
caracterizados, portanto, como normas secundrias.
No obstante a doutrina de vila, parece-nos que
a distino entre regras e princpios so bem delineadas
j com Alexy no podendo ser aceita a ideia de queas regras so ponderveis. Quando Humberto vila
arma tal possibilidade, acaba por considerar como
pondervel a regra, quando em verdade a ponderao
do prprio princpio que lhe subjacente. Tal confuso
percebida na seguinte passagem:
Os casos acima enumerados, aos quais outros
poderiam ser somados, indicam que a consequncia
estabelecida prima facie pela norma pode deixar
de ser aplicada em face de razes substanciais
consideradas pelo aplicador, mediante condizente
fundamentao, como superiores aquelas quejusticam a prpria regra. Ou se examina a razo
que fundamenta a prpria regra (rules purpose)
para compreender, restringindo ou ampliando, o
contedo de sentido da hiptese normativa, ou
se recorre a outras razes, baseadas em outras
normas, para justicar o descumprimento daquela
regra (overruling). Essas consideraes bastam para
demonstrar que no adequado armar que as
regras possuem um modo absoluto tudo ou nada
de aplicao. Tambm as normas que aparentam
indicar um modo incondicional de aplicao podem
ser objeto de superao por razes no imaginadas
pelo legislador para os casos normais. A consideraode circunstncias concretas e individuais no diz
respeito a estrutura das normas, mas a sua aplicao;
tanto os princpios como as regras podem envolver a
considerao a aspectos especcos, abstratamente
desconsiderados23.
Percebe-se que Humberto vila, ao justicar a
inaplicabilidade do tudo ou nada na coliso de regras,
a justica por meio da ponderao no desta mesma
regra, mas sim dos bens jurdicos e dos princpios
que lhes so subjacentes. Deste modo, a ponderao
continua situada no mbito dos princpios embora sua
consequncia possa ser a no aplicao de uma regra.
O que ocorre aqui, no entanto, nada mais do
que ou a declarao de invalidade de uma das normas,
devido aos valores impregnados no ordenamento, ou
a criao de uma regra de exceo para a no aplicao
da regra, o que, como j dito, defendido por Alexy.
Ademais, seguimos a crtica feita por Lus Virglio
Afonso da Silva ao armar que:
22 VILA, op. cit., p. 124.
23 Ibidem, p. 47.
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Tambm as redenies que vila sugere
para os conceitos de regra e princpios mais confun-
dem do que esclarecem. Confundem sobretudo porinserir um sem nmero de elementos nas denies
que, alm de dicultar sobremaneira sua inteleco,
no so elementos imprescindveis correra e su-
ciente distino entre os dois conceitos24.
Observando esse panorama, a questo a se
saber a do enquadramento das normas de direitos
fundamentais nessas categorias. Anal, ao aplicar umatal norma estaramos diante de princpios, regras ou
postulados?
o que se passa a analisar.
4 A estrutura normativa dos direitos
fundamentaisRobert Alexy alterca o fracasso dos modelos pu-
ros de regras e princpios no estabelecimento estru-
tural das normas de direitos fundamentais. O referidoautor arma que:
O modelo puro de regras fracassa em todasas trs formas de regulamentao dos direitos
fundamentais consideradas acima. possvel
supor que esse modelo insuciente tambmpara as outras forma de regulao encontrada na
Constituio Alem. O modelo puro de princpios foi
rejeitado porque ele no leva a srio as regulaes
adotadas pela Constituio. Quando duas formaspuras e antagnicas no so aceitveis, deve-se
considerar a possibilidade de uma forma mista oucombinada, ou seja, de um modelo combinado. Um
tal modelo o modelo de regras e princpios, que
surge da ligao entre um nvel de princpios e umnvel de regras25.
Com tal crtica, o autor aponta que a apreensodas normas de direitos fundamentais sob o prisma
exclusivo de uma das categorias seria insucientepara a sua adequada compreenso, sendo necessria
a amlgama entre os modelos baseado em princpios
e em regras constituindo-se, portanto, de um sistemaconstitucional de carter dplice.
Humberto vila26, por seu turno, arma que anorma jurdica no se confunde com o dispositivo
normativo tendo a interpretao um carterconstitutivo do Direito. Partindo de tal ponto tem-
24 SILVA, Lus Virglio Afondo da. O contedo essencial dos direitosfundamentais e a eccia das normas constitucionais. So Paulo:Malheiros, 2005, p. 76.
25 ALEXY, op. cit., p. 135.
26 VILA, op. cit., p. 34
se a compreenso de que a formulao lingustica
do dispositivo no deve, a priori, estabelecer se umadeterminada norma ser considerada como regra ou
como princpio. Assim:
[...] justamente porque as normas soconstrudas pelo intrprete a partir dos dispositivos
que no se pode chegar a concluso de que esteou aquele dispositivo contm uma regra ou um
princpio. Essa qualicao normativa depende deconexes axiolgicas que no esto incorporadas
ao texto nem a ele pertencem, mas so, antes,construdas pelo prprio intrprete. Isso no quer
dizer, como j armado, que o intrprete livrepara fazer as conexes entre as normas e os ns a
cuja realizao elas servem. O ordenamento jurdicoestabelece a realizao de ns, a preservao de
valores e a manuteno ou a busca de determinadosbens jurdicos essenciais a realizao daqueles ns e
preservao desses valores. O intrprete no podedesprezar esses pontos de partida. Exatamente por
isso a atividade de interpretao traduz melhoruma atividade de reconstruo: o intrprete deve
interpretar os dispositivos constitucionais de modo aexplicitar suas verses de signicado de acordo com
os ns e os valores entremostrados na linguagemconstitucional.
O decisivo, por enquanto, saber que
a qualicao de determinadas normas comoprincpios ou como regras depende da colaborao
constitutiva do intrprete.
Essa posio parece ser parcialmente condizen-te com os ensinamentos de Alexy, eis que para este as
disposies de direitos fundamentais possui um carterduplo podendo estatuir tanto uma regra quanto um
princpio, mas arma que tal caracterstica meramen-te contingente nas normas de direitos fundamentaisque sero ou regra ou princpio, podendo ter carter
dplice apenas quando formuladas com o intuito deenglobar ambos os nveis.
Vale destacar, ademais, que a categoria
dos postulados posta como autnoma27 na obra
de Humberto vila deve ser aqui indicada comointegrante tambm da estrutura normativa dos direitos
fundamentais, dizer, alm de serem formulados comoprincpios ou regras, essa gama normativa tambm
pode ser construdo como um postulado hermenuticoou aplicativo.
27 Uma noo aproximada dos direitos fundamentais como postulado,embora no o diga expressamente, pode ser abstrado tambm em
Robert Alexy quando este analisa o efeito irradiante dos DireitosFundamentais, em especial em sua face objetiva (ALEXY, op. cit., p.524 e ss).
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Nestes termos apreendida a norma de direito
fundamental polivalente e, a depender de como
extrada do texto normativo, pode ter uma estrutura
de regra, de princpio ou de postulado.
Verique-se, destarte, que se a norma de direito
fundamental possuir um estrutura de regra, ela
conduzir a um princpio que lhe subjacente e a
um postulado que guie a aplicao dessa regra para a
consecuo do objetivo traado pelo princpio. Desta
forma, a regra se mostra como um instrumento de
concretizao do mandado de otimizao traado pela
regra cuja aplicao ser conduzida por um postulado.
Exemplicativamente vemos o art. 5, II, da
Constituio Federal que preconiza que ningum ser
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno
em virtude de lei. Assim formulada pode-se extrairuma regra que arma que apenas a lei pode obrigar
um indivduo a agir de determinada forma. Isto um
mandado de determinao que reserva legislao a
restrio da liberdade individual.
A partir dessa regra pode-se buscar um princpio
que lhe subjacente e que determina que, na maior
medida possvel, ser assegurado ao indivduo a
liberdade de autodeterminao e autoconduo
ao mesmo tempo em que se extra um postulado
normativo que orienta tanto a criao quanto a
aplicao da norma ao se determinar, v.g., que as leisdevam limitar em menor escala possvel esta liberdade
individual respeitando outros ns constitucionalmente
previstos, p.ex., limita-se a liberdade de contratar para
assegurar a isonomia material como o ocorre nas
relaes consumeiristas.
Essa natureza polivalente dos direitos
fundamentais permite uma maior conscincia
na denio, aplicao e efetivao dos direitos
fundamentais evitando argumentos que esvaziem o
seu contedo, tal como comumente procedido com a
dignidade da pessoa humana.
5 Os direitos fundamentais como direito
subjetivo
A expresso direitos subjetivos, como j apontava
Alf Ross28, utilizada para descrever uma situao
jurdica sendo composto pelos seguintes elementos:
sujeito, contedo, objeto e proteo.
28 ROSS, Alf. Direito e Justia. 2. ed. Bauru: Edipro, 2007.
Para a presente pesquisa merecem anlise tanto
o contedo quanto a proteo do direito subjetivo
bastando indicar, para o elemento sujeito que
[...] mister fazer distines relativamente
posio do sujeito em relaes diversas, em
particular aquela do sujeito do interessem dos
processos e da alienao. Em situaes tpicas esses
sujeitos coincidem num sujeito geral simples. Em
situaes atpicas, esto separados29.
Ao se referir ao objeto, Alf Ross aponta
que este indica o objeto fsico que est incluso para
a determinao do contedo do prprio direito
subjetivo, mas que tal elemento prprio dos direitos
subjetivos reais sendo dicilmente aplicvel aos direitos
in personam30.
Gozando de maior importncia, temos
os elementos do contedo do direito subjetivo e de
sua proteo, sendo que em relao ao primeiro o
autor escandinavo arma que:
Em sentido mais amplo o contedo do
direito subjetivo inclui tanto a faculdade (claim)
que o titular do direito (right) dispe contra outros
quanto seu poder para fazer valer essa faculdade
mediante a instaurao de processos, e o poder
para alienar o direito. Visto que, entretanto o poder
de instaurar processos e o poder de alienar so
acessrios da faculdade principal e, portanto,
elementos constantes que a aprecem nos diferentesdireitos subjetivos prefervel restringir a idia do
contedo faculdade especca em virtude da qual
um direito se distingue do outro31.
Dessa forma, o contedo do direito subjetivo
ca restrito faculdade que conferida ao seu titular,
faculdade esta especca e que o diferencia dos demais
direitos subjetivos.
No obstante, esta faculdade, conforme o
prprio Alf Ross aduz, nada sem a tutela do aparato
jurdico32, isto porque a mera positivao sem uma
instrumentalizao que a torne ecaz se reduz merademagogia aplacando as vontades, mas concretamente
nada concedendo.
Com base neste fato, a proteo ao direito torna-
se elemento essencial para a caracterizao do direito
subjetivo visto que,
29 Ibidem, p. 218.
30 Ibidem, p. 218.
31 Ibidem, p. 218.
32 Ibidem, p. 219.
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[...] uma faculdade equivale, quanto sua
funo jurdica, possibilidade de obter umasentena contra a pessoa obrigada, a proteo
processual (ou esttica) de um direito apenasum outro aspecto do contedo do mesmo. Uma
faculdade nada sem a tutela do aparato jurdico.
Ao mesmo tempo, a prpria faculdade pode receberproteo atravs de diferentes reaes jurdicas
(aplicao de uma pena, condenao a realizar oato devido, restituio, indenizao por danos e
prejuzos)33.
Em linha semelhante de inteleco, Hans Kelsenarma que o direito subjetivo nada mais do que
um reexo do dever exigvel, dizer, a visualizaodo contedo de um direito somente poder ocorrermediante anlise do dever que posto ao outro, uma
vez que por meio dele que se d a circunscrio doprprio contedo do direito subjetivo.
Nesses termos leciona Kelsen que:
Esta situao, designada como direito ou
pretenso de um indivduo, no porm, outra coisaseno o dever do outro ou dos outros. Se, neste
caso, se fala de um direito subjetivo ou de umapretenso de um indivduo, como se este direito ou
esta pretenso fosse algo de diverso do dever do
outro (ou dos outros), cria-se a aparncia de duassituaes juridicamente relevantes onde s uma
existe. A situao em questo esgotantementedescrita com o dever jurdico do indivduo (ou dos
indivduos) de se conduzir por determinada maneira
em face de um outro indivduo. Dizer que umindivduo obrigado a uma determinada condutasignica que, no caso da conduta oposta, se deve
vericar uma sano; o seu dever a norma que
prescreve esta conduta enquanto liga uma sano conduta oposta. Quando um indivduo obrigado
em face de outro a uma determinada prestao, aprestao a receber pelo outro que forma o contedo
do dever; apenas se pode prestar a outrem algoque esse outrem receba. E, quando um indivduo
est obrigado em face de outrem a suportar umadeterminada conduta deste, a tolerncia desta
mesma conduta que constitui o contedo do dever.
Quer dizer: a conduta do indivduo em face do qualo dever existe, correlativa da conduta devida, est
j conotada na conduta que forma o contedo dodever. Se se designa a relao do indivduo, em face
do qual uma determinada conduta devida, como indivduo obrigado a essa conduta como direito,
este direito apenas um reexo daquele dever34.
Essa correlao entre direito e dever tambmpode ser abstrada de Karl Larenz quando este,
ao caracterizar uma norma jurdica, arma que a
33 Ibidem, p. 219.
34 KELSEN, op. cit, p. 89-90.
congurao de uma proposio jurdica se d com a
pretenso de validade no sentido de uma exigncia
vinculante de comportamento35.
Essa exigncia vinculante de comportamento
inclui no apenas a consequncia jurdica, dadas as
circunstncias fticas, mas tambm a percepo de umdever correlato que assegure tal consequncia.
A partir dessa premissa pode-se dizer que se um
direito subjetivo fosse mera descrio de uma situao
ns estaramos diante de uma proposio enunciativa
e no normativa de forma que tal disposio encontrar-
se-ia fora do ordenamento jurdico36. Tal posio seria
dicilmente defendida pela doutrina atual.
No obstante, em Alexy que encontramos posi-
o doutrinria pela qual mesmo sendo considerados
direitos subjetivos, os direitos fundamentais no pos-
suem um dever correlato exigvel, at mesmo porque a
exigibilidade, para o autor, no integra essencialmente
o seu contedo. Assim,
No parece ser imprescindvel que se fale em
direito somente se estiver presente a capacidade
jurdica para a sua exigibilidade, por exemplo,
por meio de uma demanda judicial. Embora seja
possvel denir o conceito de direito subjetivo dessa
maneira, uma tal denio estipulativa no apenas
no reete o uso corrente da linguagem, como
tambm no seria frutfera para o conhecimento dos
sistemas jurdicos37.
Em sentido semelhante, Gustavo Amaral defende
uma natureza de direitos sem deveres correlatos,
baseando-se no fato de que a equivalncia binominal
direito-dever decorre de postulados do Direito Civil
38 que seria incompatvel com a estrutura dos direitos
fundamentais.
Arma o autor que a ideia de dever como
elemento do prprio direito est baseada, no Direito
35 caracterstico de uma regra, no sentido aqui pensado, em primei-ro lugar, a sua pretenso de validade, quer dizer, ser o sentido a elacorrespondente uma exigncia vinculante de comportamento ouser uma pauta vinculante de julgamento o seu caracter normati-vo; em segundo lugar, a sua pretenso de possuir validade, no sprecisamente para um determinado caso, mas para todos os casosde tal espcie, dentro do seu mbito espacial e temporal de valida-de o seu caracter geral (LARENZ, 1997, p. 349).
36 Regra do Direito tem a forma lingustica de uma proposio, apro-posio jurdica. dela que se vai tratar em seguida. A proposiojurdica deve distinguir-se, em virtude do sentido normativo quelhe correspondente, de uma proposio enunciativa, que contmuma armao de factos ou uma constatao (Idem, Ibidem, p.350).
37 ALEXY, op. cit., p. 189.
38 AMARAL, op. cit., p. 58.
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Civil, na autonomia da vontade ou de alguma forma
de responsabilidade causal39, caracterstica ausente
nos direitos humanos que decorriam do mero fato de
pertencer humanidade, ou da aliao a uma dada
sociedade40.
Que tal premissa equivocada parece-nos
bastante claro, tendo em vista que o binmio direito-
dever parte no do estudo do Direito Civil, em especial
do obrigacional, mas sim da prpria Teoria Geral do
Direito e se assenta na noo de que direito inexigvel
no direito, mas apenas paliativo para as vontades
populares.
Note-se, nessa senda, que Kelsen, embora
confundindo os planos de validade, eccia e
existncia41, arma peremptoriamente que norma
integralmente inecaz no pode ser vlida, sendo,nesse sentido, inexistente no ordenamento jurdico.
Em que pese no concordamos com a vinculao
realizada por Kelsen entre os planos de eccia,
validade e existncia da norma jurdica, devemos
armar que a norma no precisa ser ecaz para ser
vlida ou existente, mas deve gozar de pretenso de
ser vinculativa, caso contrrio, seguindo a doutrina
de Larenz, no estamos diante de uma proposio
jurdica, mas apenas de uma proposio enunciativa
onde ir se descrever uma situao ftica ideal sem que
haja qualquer inteno poltica ou meios de coao
jurdicos idneos para forar a sua consecuo.
39 Ibidem, p. 58.
40 Ibidem, p. 59.
41 Embora o autor trace distino entre a eccia e a validade dasnormas arma que A soluo proposta pela Teoria Pura do Direitopara o problema : assim como a norma de dever-ser, como sentidodo ato de ser que a pe, se no identica com este ato, assim avalidade de dever-ser de uma norma jurdica se no identica
com a sua eccia da ordem do ser; a eccia da ordem jurdicacomo um todo e a eccia de uma norma jurdica singular so -tal como o ato que estabelece a norma - condio da validade. Taleccia condio no sentido de que uma ordem jurdica comoum todo e uma norma jurdica singular j no so consideradascomo vlidas quando cessam de ser ecazes. Mas tambm aeccia de uma ordem jurdica no , tampouco como o fato que aestabelece, fundamento da validade. Fundamento da validade, isto, a resposta questo de saber por que devem as normas destaordem jurdica ser observadas e aplicadas, a norma fundamentalpressuposta segundo a qual devemos agir de harmonia com umaConstituio efetivamente posta, globalmente ecaz, e, portanto,de harmonia com as normas efetivamente postas de conformidadecom esta Constituio e globalmente ecazes. A xao positivae a eccia so pela norma fundamental tornadas condio davalidade. A eccia -o no sentido de que deve acrescer ao ato de
xao para que a ordem jurdica como um todo, e bem assim anorma jurdica singular, no percam a sua validade (KELSEN, Hans,op cit. p. 148).
Talvez por isso, de forma um tanto contraditria,
Gustavo Amaral arme que os direitos humanos so
direitos sem deveres correlatos, mas que ao mesmotempo h um dever estatal contraposto de atender
as exigncias formuladas ou justicar o porqu no o
fez42.Verica-se, destarte, que a compreenso dos
direitos fundamentais como direitos subjetivos sem
deveres correlatos ou sem exigibilidade redundam
na criao de uma legislao simblica impregnadaapenas de uma face negativa.
Em verdade, se assim entendidos, esta
caracterstica normativa acabaria formando uma
legislao-libi que, conforme expes Marcelo Neves,
[...] decorre da tentativa de dar a aparnciade uma soluo dos respectivos problemas sociaisou, no mnimo, da pretenso de convencer opblico das boas intenes do legislador. Como setem observado, ela no apenas deixa os problemassem soluo, mas alm disso obstrui o caminhopara que eles sejam resolvidos. A essa formulaodo problema subjaz unia crena instrumentalistanos efeitos das leis, conforme a qual se atribui legislao a funo de solucionar os problemas dasociedade. Entretanto, evidente que as leis no soinstrumentos capazes de modicar a realidade deforma direta, eis que as variveis normativo-jurdicasse defrontam com outras variveis orientadaspor outros cdigos e critrios sistmicos [...]. Aresoluo dos problemas da sociedade dependeriaento da interferncia de variveis no normativo-jurdicas. Parece, portanto, mais adequado armarque a legislao-libi destina-se a criar a imagemde um Estado que responde normativamenteaos problemas reais da sociedade, sem, contudo,normalizar as respectivas relaes sociais.
Nesse sentido, pode-se armar que alegislao-libi constitui uma forma de manipulaoou de iluso que imuniza o sistema poltico [...]desempenhando uma funo ideolgica. Masparece muito limitada e simplista a concepo queconsidera, no caso da legislao-libi, o legisladorcomo quem ilude e o cidado como o iludido. Emprimeiro lugar, deve-se observar que, face perdade realidade da legislao em um mundo que setransforma aceleradamente, confundem-se o real ea encenao, desaparecem tambm os contornosentre desejo e realidade, iluso e autoilusotornam-se indiferenciveis, de tal maneira quelderes polticos no so apenas produtores, mastambm vtimas de interpretaes simblicas. Alegislao-libi implica uma tomada de papis sociaistanto pelas elites que encenam, quanto por parte dopblico-espectador, no podendo ser restringida aatividades conscientes das elites para alcanar seusns; eis que tentativas de manipulao desse tipo
42 AMARAL, op. cit., p. 55, nota 34.
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tornam-se usualmente conhecidas e tendem aofracasso. Entretanto, embora seja de relativizar-seos conceitos de manipulao e de iluso, evidenteque a legislao-libi pode induzir um sentimentode bem-estar (resoluo de tenso), portanto,servir lealdade das massas43.
Em concluso, que todos os direitos fundamentaisso direitos que possuem um dever exigvel correlatono nos parece ser equivocado, mas em quais termose em que extenso eles o so algo a ser analisado naprxima seo.
6 Eccia e exigibilidade dos direitos
fundamentaisA fora vinculativa das normas constitucionais
defendida desde Konrad Hesse
44
parece ter sidoremoldurada com a festejada classicao trazida porJos Afonso da Silva45 quando este trata das normas deeccia plena, contida e limitada.
Em breve resumo, as normas de eccia plenaseriam aquelas que
desde a entrada em vigor da constituio,produzem, ou tm possibilidade de produzir, todosos efeitos essenciais, relativamente aos interesses,comportamentos e situaes, que o legisladorconstituinte, direta e normativamente, quisregular46.
De forma semelhante, as normas de ecciacontida possuem aplicabilidade direta, masso potencialmente restringveis por normasinfraconstitucionais. No obstante, sua eccia noca condicionada existncia de norma inferior comoocorre nas normas de eccia limitada.
Para esta ltima categoria, o autor defende ummnimo de eccia, mas condiciona a sua aplicaointegral nas situaes concretas ao do legisladorinfraconstitucional ou de outros rgos estatais,aceitando que elas
regem, at onde possam [...] situaes,comportamentos e atividades na esfera de alcancedo princpio ou esquema que contm, especialmentecondicionando a atividade dos rgos do Poder
43 NEVES, Marcelo. Constitucionalizao simblica. So Paulo:Acadmica, 1994. p. 49-50.
44 HESSE, Konrad. A fora normativa da constituio. Porto Alegre:Sergio Antnio Fabris, 1991.
45 SILVA, Jos Afondo da.Aplicabilidade das normas constitucionais. 4.
ed. So Paulo: Malheiros, 2000.
46 Ibidem, p. 101.
Pblico e criando situaes jurdicas de vantagensou de vnculo47.
Em sntese, as normas de eccia limitada, por taldoutrina, possuem por si s uma eccia circunscritaapenas orientao na criao de outras normas ou na
vinculao negativa do poder estatal.Assim, deve-se ter cuidado ao vincular as noes
das diferentes geraes/dimenses das normas coma classicao tricotmica acima esboada, o quegeraria inmeros equvocos na aplicao dos direitosfundamentais.
Por tal caminho, a primeira gerao de direitosfundamentais, que rene aqueles que visavam proteo das liberdades individuais e imposiode limites ao Estado48, poderia ser correlacionada snormas de eccia plena, em especial devido ao seu
carterprima facie negativo.Por seu turno, os direitos de segunda gerao,
aqueles ditos sociais, por possurem como notadistintiva o seu carter positivo, prestacional, ensejandoa interveno estatal49 para a consecuo do bem-estar social50, tornaria fcil o seu enquadramento emnormas de eccia limitada.
No obstante, a anlise promovida por StephenHolmes e Cass Sustein demonstra a falsidade daarmao de que os direitos classicamente ditosnegativos exigem exclusivamente omisses do Estado,assim:
Are the liberties protected under the Bill ofRights wholly negative? Do they require the stateto refrain from acting without requiring the state toact?
Some constitutional rights depend for theirexistence on positive acts by the state, and thegovernment is therefore under a constitutional dutyto perform, not to forbear, under the Constitution asit stands. []
Pratically speaking, the governmentenfranchises citizens by providing the legalfacilities, such as polling stations, without which
they could not exercise their rights51
.
47 Ibidem, p. 164.
48 COMPARATO, Fbio Konder. A armao histrica dos direitoshumanos. 3. ed. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 51.
49 Note-se que a eccia limitada est associada no apenas necessidade de uma intermediao legislativa, mas antes podenecessitar tambm da atuao de rgos estatais o que no ocorrenas de eccia plena ou nas de eccia contida.
50 SARLET, op. cit., p. 55-56.
51
HOLMES, Stephen, SUNSTEIN, Cass R. The cost of rights: Why libertydepends on taxes. New York: W.W. Norton & Company, 1999, p. 52-53.
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Nesses termos, parece-nos que a classicaoentre geraes/dimenses dos direitos fundamentaisdeve pautar-se em outro fundamento que no aexistncia ou inexistncia de obrigaes comissivasdo poder estatal, dizer, independentemente da
dimenso, poder ou no haver normas de eccialimitada ou plena no sendo tal critrio lastro sucientepara sustentar a diferenciao.
Exemplicativamente basta pensar no direito sindicalizao, considerado como direito social, masque estruturalmente assemelha-se muito mais aosdireitos de primeira dimenso devido ao seu carterprimariamente negativo.
Gustavo Amaral, atento impropriedade doscritrios utilizados para a classicao ordinria, trazuma distino baseada na essencialidade da ao
estatal, assim,
[...] cumpre ver que h direitos cuja eccia nodepende necessariamente de uma ao estatal. Aliberdade de expresso e de credo so bons exemplosdisso. De outro lado, h direitos cuja ecciadepende intrinsecamente de uma conduta estatalpositiva, como os direitos ligados assistncia social.
Para facilitar, chamemos nos prximos pargrafos dedireitos parcialmente independentes aqueles queno dependem necessariamente da ao estatal, ede direitos dependentes aqueles cuja dependncia intrnseca.
A diferena perceptvel entre os direitosparcialmente dependentes e os dependentes estaria naprpria resoluo quando presente uma coliso sendoque nos primeiros a soluo estaria em um conito dedelimitao52 e nos segundos haveria necessariamentea anlise dos custos dos direitos.
A percepo dos custos dos direitos e sua anlisena efetivao dos direitos fundamentais, em especialnos direitos fundamentais a uma prestao, aqueleschamados por Gustavo Amaral de necessariamentedependentes, questo das mais tormentosas quando
se passa anlise da eccia desses direitos, o quedividiu a doutrina entre aqueles que acreditam naeccia, independente de se analisar a escassez de
52 Nesses casos, diante de uma demanda concreta, o Estado chamado para dizer, nas circunstncias concretas, qual direitoprevalece. Discute-se acerca da localizao lgica dos fatos, sedentro do domnio de um direito ou de outro. A deciso estatalresolver a disputa asseverando estar a situao concreta aqumou alm dos limites de um direito e no de outro, retroagindoa deciso data dos fatos, de modo que, juridicamente, dir-se-que jamais houve para a situao concreta o direito negado, masapenas o armado, tanto que ao vencido costumam ser aplicadassanes (AMARAL, op. cit., p. 45)
recurso, e aqueles que a pe como elemento essencialpara a sua efetivao.
Dentro desta dicotomia concordamos com Dirleyda Cunha Junior quando este arma que:
[...] na hodierna dogmtica constitucional, com oreconhecimento de um direito fundamental efeti-vao da Constituio, assiste-se, sem dvida, a umdeslocamento da doutrina dos direitos fundamentaisdentro da reserva de lei para a doutrina da reservade lei dentro dos direitos fundamentais, de tal modoque incogitvel negar o carter jurdico e, conse-qentemente, a exigibilidade e acionabilidade dosdireitos fundamentais sociais, que so autnticosdireitos subjetivos. Todos os direitos sociais geramimediatamente posies jurdicas favorveis aos in-divduos, exigveis desde logo, inobstante possamapresentar teores eccias distintos. Esses direitos,portanto, so verdadeiros direitos subjetivos, naacepo mais comum da palavra, mxime quandonecessrios garantia do padro mnimo social53.
No obstante, a escassez dos recursos problemaque no pode ser ignorado ainda quando diante dequestes que envolvam o mnimo existencial, eis que,como bem conclui Gustavo Amaral, a ideia de escasseztraz consigo a noo de trade-o. Sem traduo exatapara o portugus, podemos dizer que a alocao derecursos escassos envolve, simultaneamente, a escolhado que atender e do que no atender54, de forma queas decises alocativas podem salvaguardar o mnimoexistencial de um indivduo, ao tempo em que viola
o mnimo existencial de muitos outros devido a estedeslocamento dos recursos.
Com esta concluso, destarte, aceitamosparcialmente a soluo oferecida por Gustavo Amaralpara o qual,
[...] O Judicirio, ao apreciar demandasindividuais ou coletivas relativas a pretensespositivas, deve ponderar o grau de essencialidadeda pretenso, em funo do mnimo existencial e aexcepcionalidade da situao, que possa justicara deciso alocativa tomada pelo Estado que tenharesultado no no atendimento da pretenso.
Aceitamos parcialmente, pois, embora estadeciso alocativa possa ser revista pelo Poder Judicirioe o Estado tenha a possibilidade de se esquivar daefetivao do direito fundamental no caso concretodevido s ponderaes referentes essencialidade xexcepcionalidade, isto no possui o condo de retirara eccia da referida norma fundamental, dizer, a
53 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Controle judicial das omisses das polticaspblicas. So Paulo: Saraiva, 2008, p. 294
54 AMARAL, op. cit., p. 150.
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escassez no retira do indivduo o direito subjetivofundamental que lhe foi deferido, mas apenas impedeque ele seja efetivado naquele momento.
Essa ausncia de efetivao, embora escusvel,no o retira de sua esfera jurdica, de forma que
embora possa se negar a efetiv-lo continua a viol-loo que legitimaria, como em qualquer infrao a direito,o pleito indenizao a qual estar submetida slimitaes oramentrias como qualquer outra dvidado Poder Pblico.
Com tal soluo evita-se o esvaziamento da foranormativa dos direitos fundamentais ao tempo emque no se olvida de uma questo que no pode sernegada, por mais que a vontade poltica o deseje: oproblema da escassez dos recursos.
ConclusoPor tudo que foi exposto, podemos armar que
a expresso direitos fundamentais, prefervel s demaisquando pretende-se tratar de direito positivadoem determinada sociedade, deve ser utilizada paradesignar um direito subjetivo que impe um devercorrelato para a sua efetivao sob pena de gurarcomo mera proposio enunciativa restando situadafora do ordenamento jurdico.
Esse direito subjetivo fundamental poder ter a
estrutura normativa tanto de uma regra quanto de umprincpio ou a de um postulado, tendo em vista queser assim denido apenas com a participao criativado intrprete/aplicador do direito.
A partir dessas premissas vemos que a ecciadas normas de direitos fundamentais poder ouno depender de uma atuao comissiva do Estadoquando car sujeita anlise da escassez de recursoso que viabilizaria a escusa do Poder Pblico em suaefetivao.
No obstante, embora escusvel, a ausncia de
efetivao do direito fundamental no o retira da esferajurdica do indivduo, de forma que embora remanescea sua violao legitimando, como em qualquerinfrao a direito, o pleito indenizao a qual estarsubmetida s limitaes oramentrias como qualqueroutra dvida do Poder Pblico.
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