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1 A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção das Novas Ameaças pela Região Andina e o Cone Sul Caroline Targino Silva¹, Bryanna Rayllane Dantas¹, Aline Melquíades Silva¹, Cláudio Victor Rosas Pacheco¹, Karina Guimarães Marques²; ¹Graduando(a) em Ciência Política com Ênfase em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Pernambuco UFPE; ²Graduanda em Letras Espanhol pela Universidade Federal de Pernambuco UFPE Resumo: Este artigo tem por objetivo analisar as transformações ocorridas no contexto internacional que corroboraram na evolução teórica e surgimento do novo conceito de segurança, adaptado a enfrentar as chamadas novas ameaças, e como estas são percebidas no cenário global, por organizações internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e União Europeia (EU), apreendendo também a percepção de ameaças por dois blocos de países, o Cone Sul e a Região Andina, através de seus documentos oficiais de defesa, que nos fornecem material empírico para distinguir as visões estratégicas nas regiões. A abordagem teórica é apresentada através dos estudos de importantes teóricos e autores das Relações Internacionais como Barry Buzan e Grace Tanno, com utilização da metodologia comparativa que consiste na definição e classificação de ameaças pelos países analisados. Conclui-se que há similitudes e divergências na percepção de ameaças, tanto na relação dos blocos Região Andina - Cone Sul, quanto entre os próprios Estados pertencentes a cada bloco, e que há predominância da identificação das “novas ameaças” na análise. Palavras-Chave: Conceito de Segurança Cone Sul Novas ameaças Organizações Internacionais Região Andina INTRODUÇÃO O campo de estudos acadêmicos de Relações Internacionais é bastante recente se comparado a outros campos das ciências humanas e sociais. Surgido logo após a Primeira Guerra Mundial, tal seara acadêmica deriva sua discussão teórica da Ciência Política, adaptando seu enfoque na ação estratégica dos Estados, posteriormente também em atores não-nacionais, no cenário internacional. Os debates acadêmicos foram, portanto, evoluindo ao longo do século XX e tiveram como marco principal as guerras, fatores tidos como determinantes na discussão, enfrentamento e evolução das escolas de pensamento que viriam a surgir. Os principais centros de ensino e pesquisa da área estavam bipolarmente distribuídos nos Estados Unidos e na Europa, com forte preponderância do primeiro na formulação das linhas de pensamento teóricas iniciais. Desta maneira, o pensamento internacional refletia a doutrina política e realidade interna desse país. Surge, portanto, a escola realista como principal concepção teórica da área. Com a derrocada da União Soviética e, consequente, fim da Guerra Fria, outra corrente de pensamento consegue fincar-se definitivamente no centro das políticas guiadoras das relações internacionais. Além desse fato, apontam-se outros anteriores tais qual o declínio da economia americana, as crises do petróleo, a crescente importância atribuída às relações de cooperação e a interdependência econômica resultante do processo de globalização. Logo, criaram-se inúmeros desafios ao paradigma realista. Surgem então novas correntes teóricas adaptadas ao novo contexto internacional. Eventos como a queda do Muro de Berlim, o fim da Guerra Fria, ataques terroristas contemporâneos, entre outros, o cenário da secutirização modificou-se, dando espaço para o novo conceito de segurança, conceito este que surge diante das “novas ameaças”, o presente artigo discutira como se deu o processo evolutivo nos estudos de

A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

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Page 1: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

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A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção das Novas Ameaças pela

Região Andina e o Cone Sul

Caroline Targino Silva¹, Bryanna Rayllane Dantas¹, Aline Melquíades Silva¹, Cláudio Victor

Rosas Pacheco¹, Karina Guimarães Marques²;

¹Graduando(a) em Ciência Política com Ênfase em Relações Internacionais pela

Universidade Federal de Pernambuco – UFPE; ²Graduanda em Letras Espanhol pela

Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

Resumo: Este artigo tem por objetivo analisar as transformações ocorridas no contexto

internacional que corroboraram na evolução teórica e surgimento do novo conceito de

segurança, adaptado a enfrentar as chamadas “novas ameaças”, e como estas são percebidas

no cenário global, por organizações internacionais como a Organização das Nações Unidas

(ONU) e União Europeia (EU), apreendendo também a percepção de ameaças por dois blocos

de países, o Cone Sul e a Região Andina, através de seus documentos oficiais de defesa, que

nos fornecem material empírico para distinguir as visões estratégicas nas regiões. A

abordagem teórica é apresentada através dos estudos de importantes teóricos e autores das

Relações Internacionais como Barry Buzan e Grace Tanno, com utilização da metodologia

comparativa que consiste na definição e classificação de ameaças pelos países analisados.

Conclui-se que há similitudes e divergências na percepção de ameaças, tanto na relação dos

blocos Região Andina - Cone Sul, quanto entre os próprios Estados pertencentes a cada bloco,

e que há predominância da identificação das “novas ameaças” na análise.

Palavras-Chave: Conceito de Segurança – Cone Sul – Novas ameaças – Organizações

Internacionais – Região Andina

INTRODUÇÃO

O campo de estudos acadêmicos de Relações Internacionais é bastante recente se

comparado a outros campos das ciências humanas e sociais. Surgido logo após a Primeira

Guerra Mundial, tal seara acadêmica deriva sua discussão teórica da Ciência Política,

adaptando seu enfoque na ação estratégica dos Estados, posteriormente também em atores

não-nacionais, no cenário internacional. Os debates acadêmicos foram, portanto, evoluindo ao

longo do século XX e tiveram como marco principal as guerras, fatores tidos como

determinantes na discussão, enfrentamento e evolução das escolas de pensamento que viriam

a surgir. Os principais centros de ensino e pesquisa da área estavam bipolarmente distribuídos

nos Estados Unidos e na Europa, com forte preponderância do primeiro na formulação das

linhas de pensamento teóricas iniciais. Desta maneira, o pensamento internacional refletia a

doutrina política e realidade interna desse país. Surge, portanto, a escola realista como

principal concepção teórica da área.

Com a derrocada da União Soviética e, consequente, fim da Guerra Fria, outra corrente de

pensamento consegue fincar-se definitivamente no centro das políticas guiadoras das relações

internacionais. Além desse fato, apontam-se outros anteriores tais qual o declínio da economia

americana, as crises do petróleo, a crescente importância atribuída às relações de cooperação e

a interdependência econômica resultante do processo de globalização. Logo, criaram-se

inúmeros desafios ao paradigma realista. Surgem então novas correntes teóricas adaptadas ao

novo contexto internacional. Eventos como a queda do Muro de Berlim, o fim da Guerra Fria,

ataques terroristas contemporâneos, entre outros, o cenário da secutirização modificou-se,

dando espaço para o novo conceito de segurança, conceito este que surge diante das “novas

ameaças”, o presente artigo discutira como se deu o processo evolutivo nos estudos de

buenofonseca
Anotação
Começar a frase com "Com"
buenofonseca
Anotação
Após "ameaças" colocar ponto final.
buenofonseca
Anotação
Colocar o verbo no futuro.
buenofonseca
Anotação
Iniciar nova frase com "O" maiúsculo
buenofonseca
Anotação
tais como
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2

segurança, da formulação do novo conceito de segurança e da definição das novas ameaças,

assim como trará a percepção acerca de ameaças por parte de organizações internacionais

como a Organização das Nações Unidas, União Europeia e por fim de dois blocos de países, a

Região Andina e o Cone Sul.

1. O Contexto Internacional e a Evolução do Conceito de Segurança

O realismo permeia sua discussão na afirmação de que o Estado é o cerne das Relações

Internacionais, representando-se como um ator monolítico que busca duplamente o “interesse

mínimo de se resguardar e o interesse máximo de aumentar seu poder no sistema

internacional” (Waltz, 1979)1. Além disso, o ambiente internacional é caracterizado pela

inexistência de uma autoridade suprema acima dos Estados. Consoante o pensamento realista,

as Relações Internacionais são definidas basicamente por questões de high politics2e hard

power3.

Entretanto, verifica-se que os realistas são incapazes de prever e/ou explicar veemente

determinados fatos ocorridos no cenário internacional. O início dos anos de 1990 vem a se

tornar um importante divisor de águas para a corrente realista sob uma perspectiva macro

teórica. Com a derrocada da União Soviética e, consequente, fim da Guerra Fria, outra

corrente de pensamento consegue fincar-se definitivamente no centro das políticas guiadoras

das relações internacionais. Além desse fato, apontam-se outros anteriores tais qual o declínio

da economia americana, as crises do petróleo, a crescente importância atribuída às relações de

cooperação e a interdependência econômica resultante do processo de globalização. Logo,

criaram-se inúmeros desafios ao paradigma realista.

Dada a nova ordem no contexto internacional, os autores do Liberalismo têm em voga

suas assertivas. Defendem que a interdependência econômica é a chave para o equilíbrio de

forças entre os Estados. Concentrando seus esforços no avanço da tecnologia e ciência,

integrando-se regionalmente e estabelecendo um sistema econômico mundial que possibilite a

maximização dos interesses e necessidades de cada ator, os países conceberiam uma

configuração em que o enfrentamento militar se tornaria mais dispendioso. Dessa maneira,

seria possível consolidar, por exemplo, organizações supranacionais que viriam a sustentar

através dos regimes jurídicos internacionais essa disposição do cenário externo.

É importante frisar que, assim como no Realismo, o Liberalismo não forma um grupo

teórico homogêneo. É um “guarda-chuva de teorias” que abarca estudiosos com crenças e

afirmações afins sobre determinadas questões principais, mas que também diferem em outros

pontos.

Sendo um dos subcampos das Relações Internacionais, o estudo sobre segurança também

é fortemente determinado pela complexidade do contexto internacional. E a evolução deste

influencia nas percepções daquele. Na área de segurança internacional, a evolução dos

conceitos se deu de maneira similar às principais escolas de pensamento internacionalistas.

Logo, percebe-se que de início há uma inegável preponderância dos realistas na conceituação

do subcampo de estudo.

1Waltz, 1979 in TANNO, Grace. A contribuição da escola de Copenhague aos estudos de segurança

internacional. Contexto int., Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 47-80, Junho 2003. 2 Questões vitais ligadas ao fim principal de sobrevivência do Estado. Esse conceito está dinamicamente ligado à

discussão de segurança nacional e internacional. 3 Criado por Joseph Nye, esse termo refere-se ao uso de força principalmente militar como forma de influenciar e

defender interesses por parte dos Estados.

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Anotação
explicar de forma veemente
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Anotação
tais como
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3

Conforme apresenta Grace Tanno (2003),

Na área de segurança internacional, o debate permitiu a consolidação de três vertentes teóricas:a tradicionalista, a abrangente e a crítica. A primeira proposta, consonante com as premissas teóricas realistas, defende que os estudos da área devem se restringir às questões militares e resguardar o Estado como unidade básica de análise (Walt, 1991); a vertente abrangente (do inglês “widener”) sustenta que os estudos de segurança devem incorporar tanto as ameaças militares quanto aquelas advindas das áreas política, econômica, ambiental e societal (Buzan, 1991); a perspectiva crítica, associada aos trabalhos da Escola de Frankfurt, propõe que as pesquisas de segurança devam colaborar para a emancipação humana. Os teóricos críticos salientam que outros valores como a igualdade e a liberdade, além da segurança, devem ser priorizados pelos acadêmicos (Booth, 1995).

À vista disso, podemos concluir que o conceito de segurança passa de uma noção mais

tradicional, vinculada ao uso da força e questões militares e que enxerga as ameaças a partir

de uma perspectiva objetivista para uma vertente mais abrangente. Essa vertente é

representada pela Escola de Copenhague e defende que o conceito de segurança deve exceder

o âmbito bélico-militar. Surge, portanto, a outras noções de segurança, como a econômica,

humana, societal, ambiental e a segurança cooperativa e coletiva. Além disso, vê-se a questão

das ameaças como sendo subjetivas. Ou seja, as ameaças à segurança são algo socialmente

construído. Barry Buzan, um dos principais expoentes dessa escola de pensamento, defende

que, [...] uma abordagem objetivista da segurança só é viável em casos de ameaças inequívocas e imediatas, como tanques hostis cruzando a fronteira de um país. Mesmo nesse caso, no entanto, os autores observam que a condição de "hostilidade" resulta de uma relação constituída socialmente e, por conseguinte, não é objetiva; os tanques poderiam ser, por exemplo, parte de uma operação de paz. (Buzan et al. 1998, p. 30)

Esse alargamento teórico da segurança internacional se deve ao fato de que a academia

tinha interesse em formular uma contribuição original para os debates teóricos realizados

nessa área, além de que essa era uma tendência verificável nas agendas de segurança

europeias, em que cada vez mais questões não-militares eram também entendidas igualmente

como questões de segurança4. Desta forma, chega-se à conclusão de que há uma intrínseca

relação do conceito de segurança e a disposição do contexto internacional, assim como

verifica-se também essa influencia em relação às demais conceituações do campo das

Relações Internacionais.

2. O Novo Conceito de Segurança

Durante a vigência das relações bipolares que marcaram o período da guerra fria, a

segurança se baseava nas premissas da teoria realista, com uma maior centralidade em

aspectos estratégicos e militares de defesa territorial. Entretanto, atrelado ao processo de

globalização houve o desenvolvimento e a redefinição teórica do conceito de segurança nas

relações internacionais, com sua consequente ampliação, fruto das novas ameaças que

surgiram no ambiente internacional e da maior permeabilidade das fronteiras entre as nações,

incluindo assim, vertentes relacionadas à segurança econômica, humana, social, ambiental e

coletiva (Roboredo, 2010). Deste modo, nas sessões seguintes discutir-se-á as premissas

teóricas de cada nova perspectiva de segurança.

4Huysmans (1998b, p. 493) in idem, ibidem.

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4

2.1.Segurança Militar

O desenvolvimento de novas perspectivas do conceito de segurança não impediu que a

abordagem tradicional se adaptasse ao recente contexto do sistema internacional, decorrente

do surgimento de novas ameaças de natureza transnacional, e a consequente emergência da

cooperação internacional. No entanto, o Estado ainda é o principal detentor da segurança num

sentido mais tradicional, pelo uso legitimo da força, com fim a impedir o desenvolvimento de

uma ameaça (Buzan et al, 1998). Assim,

[..]constata-se que o processo de securitização encontra-se mais institucionalizado no setor militar. Com a institucionalização do monopólio da força pelo Estado moderno, as elites militares tornaram-se porta-vozes legais das ameaças à segurança nacional. Na área militar, o Estado será, portanto, o principal objeto de referência no campo da segurança, e as elites militares conformarão os principais atores securitizadores.(Wæver et all, 1998 apud Tanno, 2003)

2.2.Segurança Econômica

Por meio da liberalização dos mercados no mundo, houve uma crescente

especialização da produção e aumento da comercialização de produtos, gerando uma grande

rede de interdependência comercial. Deste modo, crises econômicas se propagam facilmente,

provocando efeitos em diversos países. Além disso, há o paradoxo da insegurança no

capitalismo, onde segundo Buzan (1991 apud Tanno 2003) a insegurança econômica se

tornaria ameaça quando extrapolasse a esfera econômica, ampliando-se para o âmbito militar.

Ainda segundo Tanno (2003), o setor da segurança econômica é marcado por posições

ideológicas divergentes: os mercantilistas sustentarão que o Estado é o principal objeto do

setor, apontando que a divisão do trabalho defendida pelos liberais aumenta a dependência, e

consequentemente, a vulnerabilidade em relação a outros países; enquanto que os liberais

defenderão que a posição central é ocupada pelas regras que garantem o bom funcionamento

dos mercados, e que as políticas mercantilistas facilitam os conflitos. Para Buzan (1991 apud

Tanno 2003:67), o liberalismo é a melhor escolha em termos econômicos e militares, devido a

maior segurança garantida pela liberalização, fruto dos processos de regionalização

econômica que são agregados a formação de comunidades de segurança.

2.3.Segurança Humana

O termo segurança humana foi oficializado em relatório do Programa de

Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD 1994), em que incentivava uma transição

conceitual do termo “segurança nuclear” (equivalente à militar) para “segurança humana”.

Esta mudança ocorreria através da modificação do foco da segurança territorial para a

segurança da população, e da segurança através de armamento para uma voltada ao

desenvolvimento sustentável (Roboredo, 2010).

É influenciado por quatro desenvolvimentos: a rejeição do desenvolvimento econômico como principal indicador do desenvolvimento bem como a noção de que “desenvolvimento humano” é fator de maior capacitação (empowerment) das pessoas; o aumento de conflitos internos; o impacto da globalização no alastramento de perigos transnacionais como o terrorismo e pandemias; a ênfase pós guerra-fria colocada na defesa dos direitos

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Sublinhar
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humanos e na intervenção humanitária.(Baylis et al., 2007, p. 495 apud Escorrega 2009).

A segurança humana pode ser agrupada em sete categorias, a saber: (a) a segurança

econômica, que diz respeito à garantia de rendimento básico, fruto de trabalho produtivo ou

segurança social pública; (b) a segurança alimentar, que concerne à garantia ao acesso, físico

e econômico, aos alimentos básicos; (c) a segurança da saúde, realizada através da proteção

contra doenças e estilos de vida que não sejam saudáveis; (d) a segurança ambiental, com fins

na garantia da sustentabilidade de recursos naturais, por meio da não deterioração ambiental e

proteção das pessoas contra devastações; (e) a segurança pessoal, realizada por meio da

proteção contra violência física, seja esta realizada pelo Estado (tortura), por guerras, por

tensões étnicas, pela criminalidade, por violência doméstica contra a mulher ou maus tratos

infantis, ou pelo suicídio; (f) a segurança da comunidade, que objetiva a garantia de

participação em grupos da sociedade, protegendo as pessoas da perda de valores e da

violência étnica; (g) a segurança política, que visa a garantia de direitos humanos básicos e

liberdades pessoais (PNUD, 1994:25-38). Em suma, a segurança humana busca prover a

população de cuidados básicos, relacionados ao seu desenvolvimento e bem-estar,

responsabilizando o Estado pela promoção da segurança da população.

2.4.Segurança Societal (ou identitária)

Segundo Tanno (2003), a Escola de Copenhague defende que a sociedade é mais do

que a soma das partes, mas também não pode ser reduzida ao indivíduo porque dependeria da

existência de uma identidade coletiva, que no sistema internacional se traduz em clãs, nações,

civilizações e religiões, e assim, a ameaça societal existiria quando uma dessas identidades

está em “perigo”, como por exemplo, em tensões relativas à migração e intolerância religiosa.

Deste modo, a segurança societal tem como objetivo a proteção de grupos sociais, com

alguma característica identitária, diferente da segurança do Estado (soberania). Assim, como

defende Escorrega (2009): “Permite compreender os novos conflitos intra-estatais onde não

existe correspondência entre o Estado e a nação. Estes conflitos por vezes transpõem a

fronteira Estatal, transformando-se em conflitos regionais e/ou internacionais”.

2.5.Segurança Ambiental

Há um grande desenvolvimento da segurança ambiental, devido a degradação a que se

submete os ecossistemas e o ambiente em geral, e recentemente intensificada pelas alterações

climáticas. Assim, “a segurança ambiental é uma perspectiva da segurança baseada no

princípio do desenvolvimento sustentável. Foca os seguintes aspectos: utilização sustentável

dos recursos naturais, controle da poluição e na garantia de acesso aos recursos vitais pelas

populações” (ONU, 2000 apud Roboredo 2010).

Contudo, dois problemas são identificados nesse setor: primeiro que as ameaças não

seriam intencionais, e segundo que haveria incerteza sobre quais estruturas políticas seriam

produzidas pelas questões ambientais (Buzan 1991 apud Tanno 2003). Tanno (2003), chama

ainda atenção para a heterogeneidade de estruturas voltadas a proteção ambiental, desde

movimentos sociais às Organizações não-governamentais, como o Greenpeace. Outros

problemas estariam relacionados à divergência da agenda governamental e da científica, ao

alto nível de politização e baixo nível de securitização, e a competição por recursos como um

potencial gerador de conflitos.

buenofonseca
Selecionar
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2.6.Segurança Cooperativa e Coletiva

Os conceitos de segurança cooperativa e coletiva possuem uma tênue diferenciação,

pois enquanto o primeiro se propõe a prevenir os conflitos, o segundo foca na resolução

destes. De forma geral, ambos buscam a participação ativa e colaborativa dos atores principais

para fornecer respostas coletivas na comunidade internacional. Assim,

Ambos os conceitos - segurança cooperativa e segurança colectiva - se relacionam com a estruturação de um sistema de segurança comunitária, partindo de um compromisso associativo entre Estados, e tendo como meta a segurança entre os membros da comunidade. A diferença principal está no momento em que se neutralizam os conflitos. Enquanto na segurança cooperativa se actua anteriormente, prevenindo o surgimento de conflitos que possam alterar a status-quo de segurança entre os Estados membros, (ênfase na prevenção) a segurança colectivaactua neutralizando o conflito, após este ter surgido (ênfase na resolução). (Hardy, 2003 apud Escorrega 2009)

Na segurança cooperativa busca-se atenuar conflitos impostos pelo dilema de

segurança, através da adoção de medidas preventivas para redução não só de ameaças

militares, como controle de armamento e transparência militar, mas também em relação as

instituições democráticas e cooperação cientifica ou tecnológica. Já a segurança coletiva, é

formada pela associação de países, que formam uma entidade supra-estatal que centraliza a

força e objetiva fornecer respostas multilaterais à problemas de segurança visando a paz

comum. A ONU é o principal exemplo de uma entidade de segurança coletiva (Escorrega,

2009; Roboredo, 2010).

3. As Novas Ameaças

Faz-se necessário o perscrute e distinção entre os termos risco e ameaças, Segundo a

Estratégia Internacional para Redução de Desastres (EIRD) da Secretaria da Estratégia

Internacional para Redução de Desastres da ONU, ameaça corresponde a “Evento físico,

potencialmente prejudicial, fenômeno e/ou atividade humana que pode causar a morte e/ou

lesões, danos materiais, interrupção de atividade social e econômica ou degradação ambiental.

Isso inclui condições latentes que podem levar a futuras ameaças ou perigos, as quais podem

ter diferentes origens: natural (geológico, hidrometeorológico, biológico) ou antrópico

(degradação ambiental e ameaças tecnológicas). As ameaças podem ser individuais,

combinadas ou sequênciais em sua origem e efeitos. Cada uma delas se caracteriza por sua

localização, magnitude ou intensidade, frequência e probabilidade”.

Para tanto, risco é definido como: “Probabilidade de consequências prejudiciais ou

perdas esperadas, como: mortes, lesões, propriedades, meios de subsistência, interrupção de

atividade econômica ou ambiente ameaças naturais ou antropogênicas e condições de

vulnerabilidade. Convencionalmente, o risco é expresso por R=A x V, onde: (R) Risco, (A)

(V) Vulnerabilidade”.

Destarte, observamos que as ameaças contemporâneas são cada vez mais difusas

quanto a sua natureza, estas novas ameaças, são em sua maioria transnacionais e infra-

estatais, ou seja, incluem desde eventos ambientais, migratórios, ecológicos, como também

pobreza, narcotráfico, terrorismo, entre outros, assim:

As ameaças que não tardaremos a enfrentar não podem ser facilmente categorizadas como agressões de Estados; de fato, pela primeira vez desde o nascimento do Estado, não há mais necessidade de uma estrutura estatal para

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organizar a violência em uma escala devastadora para a sociedade. (BOBBITT, 2003:774)

3.1 Percepções de ameaças no cenário global

As percepções de ameaças por parte dos Estados e organizações internacionais

alteraram-se com o impulso da globalização e mudanças no contexto internacional.

3.1.2 Organização das Nações Unidas (ONU)

De acordo com o Relatório do Grupo de Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e

Mudança da Organização das Nações Unidas, intitulado: “Um mundo mais seguro: a nossa

responsabilidade partilhada”, ameaça pode ser definida como “qualquer acontecimento ou

processo que cause mortes em grande escala ou uma redução maciça das expectativas de

vida e que enfraqueça o papel do Estado como unidade básica do sistema internacional”.

Este documento elenca seis grupos de ameaças às quais merecem prioridade global nas

próximas décadas, são estes: (1) Guerra entre Estados; (2) Violência intra-estatal (guerras

civis, atentados aos direitos humanos em larga escala e genocídios); (3) Pobreza, degradação

do meio-ambiente e proliferação de doenças infecciosas; (4) Terrorismo; (5) Crime

Organizado transnacional;

3.1.3 União Europeia (EU)

A União Européia (UE), em seu documento “Uma Europa segura num mundo

melhor: estratégia Europeia em matéria de segurança” (UE,2003:3-5), destaca as seguintes

ameaças como sendo os principais desafios globais: (1) Terrorismo; (2) Proliferação de

Armas de Destruição de Massa (ADM); (3) Conflitos Regionais; (4) Fragmentação e fracasso

dos Estados; (5) Criminalidade Organizada;

Em 2008, a União Europeia publica O “Relatório sobre a Execução da Estratégia

Europeia de Segurança: Garantir a Segurança num Mundo em Mudança” (UE, 2008b: 3-5)

que traz novas ameaças e reforça algumas discutidas no documento anterior, são estas: (1)

Proliferação de Destruição de Massa (ADM); (2) Terrorismo e Criminalidade Organizada; (3)

Ciber-segurança; (4) Segurança Energética; (5) Alterações Climáticas;

4. Percepção de ameaças: Região Andina

A região Andina é constituída geograficamente e politicamente pelos seguintes

Estados: Bolívia, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela.

4.1 Bolívia

Conforme Figura 1, as ameaças não-convencionais, também conhecidas como “novas

ameaças” são responsáveis por causar os conflitos contemporâneos e podem implicar no uso

das Forças Armadas, em sua resolução. Apontam-se como principais: terrorismo,

narcotráfico, delinquência internacional e trafico de armas. Em seu Livro Branco de Defesa

(2004), a Bolívia elenca que também são consideradas ameaças à defesa nacional: pobreza,

racismo, exclusão social, depredação do meio ambiente, crime organizado, entre outros.

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Estado BOLÍVIA

Fonte Libro Blanco de Defensa (2004)

Tipos de ameaças Convencionais

São aquelas que se dão de Estado para Estado.

Não convencionais

São conhecidos como “conflitos contemporâneos ou novas

ameaças” e muitas vezes implicam no uso das Forças armadas, na

resolução dos mesmos.

Figura 1. Percepção de ameaças – Bolívia

4.2 Colômbia

De acordo com a Política de Defesa e Seguridade Democrática (2003) as ameaças à

Colômbia têm ligações entre si e são muitas vezes caracterizadas pela capacidade de

transbordamento das fronteiras nacionais. Por constituírem risco imediato ao país, às

instituições e à população, listam-se as seguintes ameaças: terrorismo; comércio de drogas

ilícitas; finanças ilícitas; tráfico de armas, munições e explosivos; sequestro e extorsão;

homicídio. A Política Integral de Seguridad y Defensa para la Prosperidad (2011), reforça a

percepção do documento anterior e aborda a importância do combate ao terrorismo praticado

por organizações armadas ilegais, principalmente aqueles grupos ligados ao tráfico de drogas,

como as FARC.

Figura 2. Percepção de ameaças – Colômbia

Estado COLÔMBIA

Fonte

Política de Defensa y Seguridad Democrática (2003)

Política Integral de Seguridad y Defensa para la Prosperidad

(2011)

Tipos de ameaças Ameaças Graves

Constituem-se como ameaças de grande impacto, porém, de

solução não imediata. Ex: Corrupção

Ameaças Imediatas

Constituem-se como ameaças de grande impacto e de solução

imediata. Ex: Terrorismo, Drogas ilícitas, Finanças Ilícitas,

Tráfico de armas, munições e explosivos, Sequestro, Extorsão e

Homicídios, além de ameaças transnacionais como o

narcotráfico.

Page 9: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

9

4.3 Equador

Em sua Política de Defesa Nacional, o Equador caracteriza o atual cenário global pela

presença das “novas ameaças”. As ameaças se dividem quanto ao meio de sua origem, externa

ou interna como observa a Figura 3.

As ameaças externas são: Ameaças convencionais, que se dão por conflitos entre

Estados; Efeitos resultantes de problemas no controle das fronteiras, como o aumento de

imigrantes e refugiados relacionados ao aumento das taxas de violência urbana e crime

organizado no país; Tráfico de drogas e o crime organizado, que são fenômenos conhecidos

como “ameaças de rede” por estarem relacionados à outros crimes; Terrorismo internacional;

Desigualdade no comércio internacional; Proliferação de armas de destruição em massa; e

Deterioração do meio ambiente. Pobreza, corrupção, migração descontrolada, conflitos

advindos de crises governamentais, deterioração do meio ambiente, efeitos adversos de

desastres naturais e conflitos étnicos e culturais, são consideradas ameaças internas.

Estado EQUADOR

Fonte Política de La Defensa Nacional Del Ecuador (2002 e 2006)

Tipos de ameaças Externas

São as ameaças convencionais e novas ameaças de origem

externas ao Estado

Internas

São as ameaças de origem internas ao Estado, como: pobreza,

corrupção, conflitos étnicos, culturais, políticos, entre outros. Figura 3. Percepção de ameaças – Equador

4.4 Peru

O Peru identifica as ameaças por sua origem, sendo elas ações incompatíveis com a

vigência do direito internacional, as que resultem de conflitos por recursos energéticos, como

também terrorismo, narcotráfico e delinquência internacional. As ameaças internas são:

corrupção, depredação do meio ambiente, tráfico de drogas, ações de grupos terroristas

contrários ao ordenamento constitucional e grupos radicais que promovam violência social.

Estado PERU

Fonte Libro Blanco de Defensa Nacional – Perú (2005)

Tipos de Ameaças Externas

Considera-se ameaças externas qualquer ação incompatível com

as regras do Direito Internacional, ameaças aos recursos

energéticos do Estado e as “novas ameaças” de origem externa

ao Estado.

Internas

Compreende ameaças de origem interna ao Estado. Como as

“novas ameaças”, corrupção, delinquência organizada e

depredação do meio ambiente.

Figura 4. Percepção de ameaças – Peru

Page 10: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

10

4.5 Venezuela

A percepção de conflitos e ameaças para a Venezuela se dá por sua origem no

ambiente interno ou externo, em seu documento oficial são consideradas ameaças à segurança

nacional: conflitos entre países vizinhos nas fronteiras, pressão de potências estrangeiras que

buscam apoio às suas políticas externa, terrorismo, corrupção, tráfico de drogas, imigração

ilegal, pesca ilegal, sequestro, extorsão, pirataria, e delinquência organizada.

Estado VENEZUELA

Fonte

Ley Orgánica de Seguridad de la Nación (2002)

Concepto Estratégico Militar de la Fuerza Armada Nacional

(2005)

Tipos de Ameaças Externas

Ameaças advindas do meio externo

Internas

Ameaças advindas de dentro do Estado

Figura 5. Percepção de ameaças – Venezuela

5. Percepção de ameaças: Cone Sul

O Cone Sul, região composta pelas zonas Austrais da América do Sul, em seu sentido mais

amplo é constituído pelos Estados: Argentina, Brasil, Chile e Uruguai.

5.1 Argentina

Como se observa na Figura 6, de acordo com o Livro Branco de Defesa (1999) e o

Anuário de Defesa da Argentina (2007), a defesa nacional responde a uma série de ameaças e

conflitos derivados de três esferas: (I) No cenário global, antagonismos e da concorrência

derivada de confrontos estratégicos Leste-Oeste; (II) A nível sub-regional, disputas

transfronteiriças e / ou territoriais; (III) Na esfera doméstica, os conflitos resultantes do

confronto contra os grupos políticos internos, no âmbito da assim chamada "luta contra a

subversão".

A nova política de defesa do país está focada em medidas de confiança na arena

regional, o que poderia permitir a desembaraçar conflitos históricos do país com os países

vizinhos. A principal responsabilidade das Forças Armadas é a defesa contra as agressões

militares estaduais a soberania e a integridade territorial da Nação. Os militares só podem

enfrentar as ameaças não militares, incluindo o tráfico de drogas transnacional e o terrorismo,

de tempos em tempos quando chamados pelo sistema de segurança interna, de acordo com

disposições da Lei de Segurança Doméstica.

Page 11: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

11

Estado ARGENTINA

Fonte White book on National Defense (1999)

Anuário de Defesa da Argentina (2007)

Tipos de Ameaças Nível global São conhecidas como ameaças tradicionais, como confrontos

com nações antagônicas.

Nível sub-regional

Disputas transfronteiriças e/ou territoriais.

Nível Doméstico

Onde se inserem ameaças resultantes do confronto contra os

grupos políticos internos.

Novas ameaças

Devido aos novos conhecimentos e novas tecnologias, surgem

novas ameaças as quais as Forças Armadas têm que se adaptar,

estas podem surgir nos três níveis. Figura 6. Percepção de ameaças – Argentina

5.2 Brasil

Em sua Estratégia Nacional de Defesa (2008) e Livro Branco Nacional de Defesa

(2012), o Brasil identifica ameaças de origem externas, internas e ameaças de origens difusas,

percenendo que o fenômeno da globalização trouxe o agravamento de ameaças de naturezas

disseminadas e que novos temas – ou novas formas de abordar temas tradicionais – passaram

a influenciar no cenário global, assim, questões como: biopirataria, proteção da

biodiversidade, defesa cibernética, as tensões decorrentes do aumento da escassez de recursos,

os desastres naturais, ilícitos transnacionais, terrorismos e atuação de grupos armados

marginalizados, são, para o Brasil, ameaças a defesa nacional.

Estado BRASIL

Fonte Estratégia Nacional de Defesa– Brasil (2008)

Livro Branco de Defesa Nacional – Brasil (2012)

Tipos de Ameaças Ameaças Externas

Ameaças advindas da relação entre Estados.

Ameaças Internas

São as ameaças de origem interna ao Estado

Ameaças difusas - Novas ameaças

Também considerados como “conflitos do futuro”, sejam eles as

guerras de informação e os conflitos de pequena escala, como

também narcotráfico, o tráfico de armas e a pirataria marítima,

caracterizados como ameaças difusas por possuírem natureza

distinta, assim, as Forças Armadas são orientadas a cumprir

missões variadas a fim de propiciar suporte às ações do Estado.

Figura 7. Percepção de ameaças – Brasil

Page 12: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

12

5.3 Chile

O posicionamento do Chile diante de conflitos internacionais (relação de interesses

contrapostos entre atores internacionais, em que pelo menos um seja um estado, havendo um

duelo de vontade versus resistência), se dá de acordo com a sua classificação. O Chile

classifica os conflitos internacionais em dois tipos básicos: “crise” ou “Guerra”, embora um

possa derivar do outro. O tipo “Crise” se refere à conflitos de intensidade limitada, que

buscam alterar o status quo, nestes, são utilizadas ações nas quais se tenta influenciar através

do uso de ameaças de dano, de forma a dissuadir o outro ator para que se faça uma nova

negociação, constitui-se como uma ótima oportunidade para o emprego da diplomacia, os

objetivos são conquistados através de pressão e negociação, sem chegar ao uso da força. A

classificação “Guerra” é dada a conflitos os quais não são solucionados pelos elementos

anteriores, se opta então, pelo uso da força com o propósito de alcançar a vitória por todos os

meios possíveis. Esta é, portanto a expressão mais severa do conflito.

Estado CHILE

Fonte Libro de la Defensa Nacional del Chile (2002 e 2010)

Tipos de ameaças Crise

Conflitos e ameaças de intensidade limitada, que buscam alterar o

status quo, nos quais podem estar envolvidos diferentes atores

internacionais.

Guerra

São os conflitos de alta intensidade; Conflito armado no qual os

interesses vitais do Estado encontram-se ameaçados.

Figura 8. Percepção de ameaças – Chile

5.4 Uruguai

Os riscos de um confronto nuclear em escala mundial foram reduzidos, dando lugar a

outros riscos e ameaças como o terrorismo, os extremismos étnicos e religiosos, o

narcotráfico, depreciação do meio ambiente, disputas por bens escassos como água e recursos

energéticos, o fluxo de imigrantes por razões políticas, religiosas, econômicas ou pelo

crescimento dos sentimentos xenófobos, e o acesso às armas de destruição em massa.

Como ressalta o documento “Bases para una Política de Defensa Nacional (1999)”, no

tocante ao aspecto estritamente militar, as chances de um confronto entre grandes potências

são mínimas, sendo a hipótese mais provável, de um conflito entre poderes regionais. Embora

existam muitos Estados do mundo que mantêm difíceis relações com os seus vizinhos, é

possível prever que só no caso de países com Forças Armadas muito poderosas e

maciçamente implantadas em suas fronteiras, possa surgir um conflito militar em qualquer

momento. Em relação às novas ameaças, são fenômenos que podem ser considerados muitas

vezes distantes, mas têm o potencial de afetar a comunidade internacional como um todo.

buenofonseca
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Page 13: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

13

Estado URUGUAI

Fonte Bases para una Politica de Defensa Nacional (1999)

Tipos de ameaças Ameaças contemporâneas de origem interna ou externa

Consideram-se como ameaças ao Estado, problemas de origens

externas ou internas que em geral estão mais relacionadas à

segurança que a Defesa, como: crime organizado, terrorismo,

narcotráfico, etc.

Figura 9. Percepção de ameaças – Uruguai

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por se tratar de um subcampo das Relações Internacionais, o estudo das temáticas

securitárias encontra-se inerentemente relacionado às alternâncias do contexto internacional.

Isto é, assim como o momento histórico definiu a preponderância de certas ideias nas

correntes de pensamento internacionalistas, como o realismo que se relacionou com o período

de conflitos entre nações, o liberalismo que teve suas bases verificadas com o fim da Guerra

Fria e tendo o processo de globalização se acelerado, o conceito de segurança do mesmo

modo fora influenciado pelo meio.

A abrangência de outros temas não ligados diretamente a aspectos militares, por

exemplo, permitiram que o entendimento de modo basilar, sobre o conceito de segurança

fosse expandido. Isso se deve ao fato de que os estudiosos da área se encontraram diante da

insuficiência da corrente realista para o perscrute de casos e contextos que representavam

ameaças ao Estado, mas que não estavam diretamente ligados às concepções tradicionais de

segurança. Observa-se que o modelo tradicional de organização da defesa e suas instituições

militares no período da Guerra Fria, era adaptado a um conceito de segurança em um contexto

inerentemente marcado pela ação protetora das Forças Armadas contra ataques de outros

Estados e posteriormente contra qualquer ameaça à segurança doméstica.

Destarte, o novo conceito de segurança se distingue pela sua ampliação que inclui

assim, vertentes relacionadas à segurança econômica, humana, social, ambiental e coletiva,

sendo este, fruto da maior permeabilidade das fronteiras entre as nações, e do surgimento das

novas ameaças.

As percepções de ameaças por parte dos Estados e organizações internacionais

alteraram-se com o impulso da globalização e mudanças no contexto internacional, dando

espaço às “novas ameaças”, que então, apresentam natureza difusa, advindo tanto do meio

externo quanto interno ao Estado, assim como resultam da ação de atores diversos no cenário

global. Na perspectiva de organizações internacionais como a Organização das Nações

Unidas e a União Europeia, as novas ameaças em sua maioria são listadas como prioridade

em seus documentos oficiais e dentre estes, ambas identificam em comum, o terrorismo e o

crime organizado. Na análise da percepção de ameaças pelos países da Região Andina e Cone

Sul, nota-se que Equador, Peru, Venezuela, Brasil e Uruguai percebem as ameaças de acordo

com o seu meio de origem, sendo ele externo ou interno ao Estado. A Argentina define de

acordo com o campo em que as ameaças se manifestam, podendo ser a nível global, sub-

regional ou doméstico. A Colômbia e o Chile identificam as ameaças de acordo com sua

intensidade, restando à Bolívia a peculiaridade de classificá-las em convencionais e não

convencionais, que se referem respectivamente aos conflitos entre Estados e às novas

ameaças.

Page 14: A evolução Teórica do Conceito de Segurança e a Percepção

14

Podemos então notar algumas tendências ao nível da análise do conjunto, visto que

todos os Estados analisados identificam as novas ameaças, havendo países cujas percepções

estratégicas convergem e se assemelham quanto à percepção de ameaças dentro dos blocos

Região Andina e Cone Sul quanto entre si. Em suma, as ameaças são por eles tipificadas

quanto: (1) ao seu meio de origem e manifestação, (2) convencionalidade e (3) intensidade.

Constata-se também, que a grande maioria das ameaças é de natureza não-estatal.

Ao analisar o Brasil através da Estratégia Nacional de Defesa, da Política Nacional de

Defesa e do Livro Branco de Defesa Nacional, percebe-se que temas que não eram tratados no

âmbito da segurança nacional, agora o são, tendo em vista a situação atual do sistema

internacional. O capítulo dois do Livro Branco de Defesa Nacional é apresenta que “Novos

temas — ou novas formas de abordar temas tradicionais — passaram a influir no ambiente

internacional deste século” (LBDN, p.28), e posteriormente, “As implicações para a proteção

da soberania, ligadas ao problema mundial das drogas e delitos conexos, a proteção da

biodiversidade, a biopirataria, a defesa cibernética, as tensões decorrentes da crescente

escassez de recursos, os desastres naturais, ilícitos transnacionais, atos terroristas e grupos

armados à margem da lei explicitam a crescente transversalidade dos temas de segurança e de

defesa” (Ibidem).

Afere-se assim, que o que outrora se limitava as questões estratégico-militar,

expandiu-se englobando temas antes restritos ao universo político e da sociedade civil, ou

seja, assuntos foram transportados para a esfera securitária em decorrência da influência das

mudanças ocorridas no contexto internacional e a percepção de novas ameaças.

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