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A D IVERSIDADE DA G EOGRAFIA B RASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 5394 A EXPERIÊNCIA, O LUGAR, A CIDADE: O LUGAR-SAMBA EM UMA SÃO PAULO THIAGO RODRIGUES GONÇALVES 1 Resumo O presente artigo procura avançar no debate sobre a ―cidade possível‖ a partir da consideração do saber experiencial na cidade e da permanência do passado enquanto tempo vivido a memória. Busca por uma compreensão dos lugares na cidade enquanto centros de significado e de que maneira é possível olhar-pensando a cidade em termos de planejamento e gestão. Propõe, acima de tudo, um desafio aos geógrafos na busca por essa utopia. Palavras-chave: Lugar-samba; saber experiencial; Geografia Humanista Abstract This paper aims to advance the debate about the "possible city", considering the experiential knowledge in the city and the permanence of the past as lived time memory. Search for an understanding of the places in the city as centers of meaning and how is possible to look- thinking the city in terms of planning and management. Proposes, above all, a challenge to geographers in the search for this utopia. Keywords: Place-samba; experiential knowledge; Humanist Geography 1 Introdução O presente artigo se propõe a desdobrar alguns resultados obtidos ao longo da produção do trabalho de dissertação intitulado ―O lugar-samba no Bixiga: memória e identidade‖, apresentado para a avaliação do Programa de Pós- Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista (UNESP Rio Claro) em outubro de 2014. Esse trabalho emergiu de algumas preocupações e interesses que precisam ser citados. Em primeiro lugar, um interesse pelo samba paulista enquanto expressão cultural costumeiramente ignorada (ou sumariamente desconhecida, no pior dos casos) diante de outras formas de expressão associadas ao Estado de São Paulo. Uma intenção de ouvir as vozes daqueles que encontram nessa encarnação do samba um esteio norteador de práticas identitárias, afim de compreender a relação que existe entre essa expressão cultural, seu papel identitário e os seus lugares de prática de existência. 1 - Mestre em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista (UNESPRio Claro). E-mail de contato: [email protected].

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

DE 9 A 12 DE OUTUBRO

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A EXPERIÊNCIA, O LUGAR, A CIDADE: O LUGAR-SAMBA EM UMA SÃO PAULO

THIAGO RODRIGUES GONÇALVES1

Resumo O presente artigo procura avançar no debate sobre a ―cidade possível‖ a partir da consideração do saber experiencial na cidade e da permanência do passado enquanto tempo vivido – a memória. Busca por uma compreensão dos lugares na cidade enquanto centros de significado e de que maneira é possível olhar-pensando a cidade em termos de planejamento e gestão. Propõe, acima de tudo, um desafio aos geógrafos na busca por essa utopia. Palavras-chave: Lugar-samba; saber experiencial; Geografia Humanista Abstract This paper aims to advance the debate about the "possible city", considering the experiential knowledge in the city and the permanence of the past as lived time – memory. Search for an understanding of the places in the city as centers of meaning and how is possible to look-thinking the city in terms of planning and management. Proposes, above all, a challenge to geographers in the search for this utopia. Keywords: Place-samba; experiential knowledge; Humanist Geography

1 – Introdução

O presente artigo se propõe a desdobrar alguns resultados obtidos ao longo

da produção do trabalho de dissertação intitulado ―O lugar-samba no Bixiga:

memória e identidade‖, apresentado para a avaliação do Programa de Pós-

Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista (UNESP – Rio Claro)

em outubro de 2014. Esse trabalho emergiu de algumas preocupações e interesses

que precisam ser citados.

Em primeiro lugar, um interesse pelo samba paulista enquanto expressão

cultural costumeiramente ignorada (ou sumariamente desconhecida, no pior dos

casos) diante de outras formas de expressão associadas ao Estado de São Paulo.

Uma intenção de ouvir as vozes daqueles que encontram nessa encarnação do

samba um esteio norteador de práticas identitárias, afim de compreender a relação

que existe entre essa expressão cultural, seu papel identitário e os seus lugares de

prática – de existência.

1 - Mestre em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista

(UNESP–Rio Claro). E-mail de contato: [email protected].

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Num segundo momento, em função da própria história do samba paulista, tal

como ela é normalmente contada, pareceu importante buscar por uma abordagem

metodológica que privilegiasse a experiência dos lugares associados ao samba

paulista. No entanto, muitos desses lugares – conforme constatado – vão além da

experiência presente das práticas atuais. Em muitos casos, essa experiência está

imersa numa relação ontológica com o passado. O passado dos lugares, o

passado das práticas, o passado do próprio samba.

Porém, essa relação ontológica com o passado é tratada como um fato

inescapável na história do samba paulista. Ou seja, sempre que o samba paulista é

considerado, a atenção baseia-se na aparente extinção dessa expressão cultural,

restando pouca conexão com o presente. No trabalho, entretanto, ficou demonstrado

que este não é o caso, na medida em que o passado, na relação entre samba

paulista e seus lugares, permanece. E que essa permanência dá-se no par

ontológico memória-experiência.

A esse encontro entre memória, experiência e lugar chamo ―lugar-samba‖

(GONÇALVES, 2012a; 2012b; 2014a; 2014b).

Por fim, o lugar-samba no Bixiga emerge a partir da experiência que tem no

samba paulista o seu pivô, no lugar do bairro em que historicidades e

geograficidades assim compreendidas confluem: a quadra do Grêmio Recreativo

Cultural Escola de Samba Vai-Vai, testemunha da memória que permanece.

Considerando esses pontos, a pergunta que instiga é a que procura pelo

sentido da experiência da cidade que considere em um mesmo patamar aquilo

que é possível extrair do saber comum – a partir da experiência do lugar como dado

essencial para a reflexão – e a própria reflexão acadêmica, refratária, no mais das

vezes, às vozes tradicionalmente consideradas desimportantes.

Esse artigo, portanto, parte dos resultados obtidos no trabalho de pesquisa

citado e procura avançar no esforço de construção de uma ponte compreendida

como necessária entre a tarefa de reflexão e o saber experiencial.

2 – Lugar-samba: historicidades e geograficidades

O Bixiga não existe oficialmente. A divisão administrativa oficial da cidade de

São Paulo termina no nível dos distritos. O Bixiga é, então, um trecho relativamente

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pequeno do Distrito da Bela Vista, na região central da cidade. Convém lembrar, no

entanto que, antes de tudo, ―[…] o Bixiga é um estado de espírito‖ (LUCENA, 1983;

o negrito é meu).

A história do Bixiga estende-se por mais de três séculos de ocupação e

disputas entre proprietários de terras, comerciantes, quilombolas, imigrantes,

cortiços, pensões, ladeiras e vielas. O bairro, que hoje não existe formalmente, é

resultado de camadas e camadas de histórias sobrepostas. Há toda uma

arqueologia importante sobre o Bixiga produzida no âmbito acadêmico, já há

algumas décadas.

No mais das vezes, nos acostumamos a pensar o Bixiga como um bairro de

imigrantes. Um espaço de disputa e reafirmação de tradições herdadas e mantidas

por aqueles que precisaram encontrar-se consigo mesmos e com o novo lugar onde

passaram a viver. Não é diferente naquele bairro paulistano. As marcas da presença

imigrante estão ali.

Porém, a história – em suas várias camadas – vai além da presença

calabresa no Bixiga. Na medida em que aquele é, também, um bairro negro da

cidade de São Paulo. Um ―território negro‖, de acordo com Jesus (2010), Rolnik

(1986; 1989) e Simson (1991; 2007), que expressam de modo mais acertada a

condição do bairro, uma vez que atentam às disputas que de maneira geral

constituem os territórios.

A presença negra no Bixiga é atestada desde pelo menos o século XVIII,

quando nos ermos daquela área, então periférica, organizou-se uma comunidade

quilombola (CARRIL, 2006; KOGURAMA, 1999; ROLNIK, 1989). O relativo

isolamento da área, distante do núcleo central da cidade, associado às

características do terreno – um baixio alagável, formado pela confluência de pelo

menos três cursos d’água (os ribeirões Bexiga e Saracura e o rio Anhangabaú) –

permitiu que para ali concorressem as condições ideais para o refúgio e a

organização da população negra frente ao escravismo brasileiro. Desde então, e

apropriando-se de diversas estratégias de territorialização, a população negra

mantem sua presença no Bixiga.

No momento do loteamento da antiga Chácara do Bexiga – embrião

urbanizador do bairro atual –, em meados do século XIX, à população negra restou a

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ocupação de vilas e cortiços, que viriam a se tornar a principal marca das habitações

no bairro. A maneira como se dispuseram tais habitações respeitou em grande

medida as condições adversas do terreno, a ponto de Grünspum (1979, p. 27-28)

afirmar em seu relato que ―[…] o bairro não tinha becos ou meandros mas sim ruas

largas e bonitas, mesmo sem verde. O que tinha becos, vielas, subvielas, meandros,

nichos e escaninhos eram suas casas‖. Nessas habitações coletivas, em que várias

famílias dividiam um mesmo imóvel, um cômodo por família, era onde residia a

maioria da comunidade negra do Bixiga, mesmo antes da abolição do sistema

escravista no Brasil (ROLNIK, 1989).

É necessário, portanto, considerar a presença marcante e antiga do

componente negro na recuperação das historicidades do Bixiga. Caminhando para

além da imagem atualmente associada ao bairro (e mesmo à cidade de São Paulo2),

em que se festeja apenas a herança dos imigrantes europeus, essas historicidades,

atentas à resistência negra em São Paulo, contam uma história mais rica do trama

que subjaz no tecido da experiência cotidiana do bairro. As historicidades do Bixiga,

adensadas pelo papel decisivo da presença negra no bairro, se relacionam, num

âmbito mais amplo, com as historicidades do samba paulista – porque também uma

forma de expressão da cultura afro-brasileira, fundamentada na resistência e na luta

por representatividade.

A encarnação paulista do samba tem origens distintas das origens de seus

congêneres baiano e carioca. Muito próximo do jongo e das congadas, o samba

paulista surge como música de trabalho nas lavouras do interior do estado

(MARCOS, 1977). Os instrumentos tradicionalmente associados ao samba paulista

o aproximam de formas mais rurais de expressão da cultura afro-brasileira: o bumbo

– ou zabumba – e o tambú – instrumento construído com o tronco oco de uma

árvore – dão o compasso, marcado pelo tom grave e profundo (MANZATTI, 2005;

CUÍCA; DOMINGUES, 2009). Em função dessas particularidades sonoras e

rítmicas, o samba paulista também é conhecido como samba de bumbo, samba-

lenço, samba de umbigada ou, simplesmente, batuque.

2 Ver, p. ex., AZEVEDO, 2012; 2014.

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É possível afirmar que a cidade de Pirapora do Bom Jesus (SP) foi a principal

vitrine do samba paulista (CUÍCA; DOMINGUES, 2009). Ainda que o samba fosse

praticado em várias regiões do estado, era em Pirapora, a cada mês de agosto, que

os grupos de ―sambeiros‖ (SIMSON, 2007) se encontravam para os festejos em

louvor ao Bom Jesus.

Os sambeiros eram romeiros pobres, em sua imensa maioria negros, que se

hospedavam em alguns barracões, distantes alguns quilômetros do santuário

localizado às margens do rio Tietê. Nesses barracões, após as obrigações

religiosas, o samba acontecia.

Essa função dos barracões de Pirapora do Bom Jesus, e mesmo das festas

religiosas que ano após ano congregavam na pequena cidade um grande número de

sambeiros, são de fundamental importância para compreender a experiência

daqueles que, hoje, no Bixiga, identificam-se com a música e com o lugar de sua

prática.

O encontro de sambeiros em Pirapora do Bom Jesus teve seu auge entre o

final do século XIX e princípios do século XX, ainda que o descoberta da imagem

que motivou a criação do santuário date do final do século XVIII. Após esse apogeu,

em função de determinações oriundas do alto clero da Igreja Católica em Roma

(PETERS, 2012), o culto ao Bom Jesus perde espaço para a devoção em nome de

Nossa Senhora da Conceição Aparecida, tornada, por um lado, a imagem sagrada

do povo mestiço do Brasil e, por outro, uma ferramenta da Igreja para a manutenção

de fiéis em face do novo regime laico instalado pela República Velha, recém-

proclamada (PETERS, 2012, p. 8).

Os festejos em Pirapora contrariavam essas intenções do clero católico a tal

ponto que logo no início do século XX, alegando questões de segurança, a Igreja

proíbe a utilização dos barracões pelos romeiros. Se por um lado a intenção clerical

de alteração do foco de devoção foi conquistado, por outro, o fechamento da

hospedagem acessível pôs um fim ao encontro dos sambeiros naquela cidade.

O que se pretende com esse rápido mergulho em certa política territorial

eclesiástica, no entanto, é ressaltar o papel basilar do fim do encontro de Pirapora

como lugar de reunião para o samba. Em função das recomendações e intenções

da Igreja Católica, a festa de Pirapora deixa de ser a vitrine do samba paulista e sua

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relevância migra para o passado, compondo a memória daqueles que por lá

passaram, daqueles que relembram os encontros e, por fim, do próprio lugar.

Nesse mesmo movimento, convém lembrar que ―samba‖ deriva de ―semba‖

ou ―massemba‖, termos originários do mbundo e do kikongo, línguas faladas pelos

povos bantos do Congo e de Angola, na África. Ademais, esses termos referem-se,

ao mesmo tempo, a um ritmo musical, a um conjunto de estilos de dança (as

umbigadas) e, especialmente, ao ato de reunião em um lugar para a prática da

música e da dança.

É possível, portanto, depreender da própria origem do termo samba a

importância da reunião para a afirmação de determinadas práticas de caráter

identitário.

Mário de Andrade, em 1933, testemunhou alguns momentos da reunião dos

sambeiros em Pirapora. Como resultado desse encontro, nos legou um dos nomes

pelos quais o samba paulista é conhecido – ―samba rural‖ – e uma vívida descrição

da festa:

No grupo em consulta, um solista propõe um texto-melodia. Não há rito especial nesta proposta. O solista canta, canta no geral bastante incerto, improvisando. O seu canto, na infinita maioria das vezes, é uma quadra ou um dístico. O coro responde. O solista canta de novo. O coro torna a responder. E assim, aos poucos, desta dialogação, vai se fixando um texto-melodia qualquer. O bumbo está bem atento. Quando percebe que a coisa pegou e o grupo, memorizando com facilidade o que lhe propôs o solista, responde unânime e com entusiasmo, dá uma batida forte e entra no ritmo em que estão cantando. Imediatamente à batida mandona do bumbo, os outros instrumentos começam tocando também, e a dança principia. (ANDRADE apud CARNEIRO, 2005)

Porém, em 1936, por ordem da Igreja, a reunião em Pirapora fica proibida e o

panorama do samba paulista se altera.

Edward Relph (2012) afirma que lugar como reunião é um dos possíveis

aspectos de lugar, e lembra que ―lugar […] tem em si o conceito de especificidade e

abertura, que acontece em virtude da reunião‖ (RELPH, 2012, p. 22). A

especificidade e a abertura de que fala Relph corresponde à possibilidade de

agência do lugar no processo de construção identitária de grupos e indivíduos.

Reunir-se significa estar neste lugar, que, em função de sua circunstancialidade,

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especificidade e abertura, permite esta maneira de ser-e-estar-no-mundo

(MARANDOLA JR., 2014; RELPH, 2012).

Quando, então, a reunião em Pirapora desaparece e o que sobrevive é a

memória da reunião, o passado compreendido como um tempo passado vivido –

porque lembrado – permanece na experiência daqueles que tinham ali uma âncora

geográfica de suas identidades. Os sambeiros, a quem se proibiu Pirapora,

procuraram manter vivo exatamente esse tempo passado que permanece, ainda que

em outros lugares. A esses lugares, de Pirapora aos mais recentes, deu-se a

denominação ―lugares-samba‖.

Os lugares-samba são compreendidos como ―[…] condição de existência em

função da reunião [para o samba] – [que] existem porque existe (ou resiste) a

reunião e, dessa forma, unem geografia, identidade e memória‖ (GONÇALVES,

2014b, p. 24).

A memória concorre para a significação dos lugares-samba. A experiência

atual desses lugares é enriquecida pelo tempo passado que permanece como traço

essencial da relação estabelecida entre indivíduos, grupos sociais e o mundo. Trata-

se, então, de outra condição que requer a atenção da Geografia que se preocupe,

acima de tudo, com a geografia em ato, a ―geograficidade‖ dardeliana (DARDEL,

2011). E então, conforme desenvolvido no trabalho de dissertação, ―[…] propomos,

junto a Lowenthal (1975; 1985) e Bachelard (2007), [que] a experiência do lugar não

é apenas a experiência do espaço geográfico dardeliano, mas é, também,

qualificada pela experiência do tempo intuído da memória, que traz em si as

marcas do passado, não como o tempo morto da história, mas como o tempo vivido

do sentido de passado‖ (GONÇALVES, 2014b, p. 24-25; o grifo é meu).

É no Bixiga – e não por acaso – que se encontra a sede social, a quadra do

Grêmio Recreativo Cultural Escola de Samba Vai-Vai. Nas várzeas do Saracura se

organizou, no princípio do século XX, um cordão carnavalesco que tinha como

características fundamentais as tradições do samba de bumbo. Muitos de seus

participantes eram romeiros assíduos de Pirapora. O Cordão do Vai-Vai foi, até 1972

(ano em que oficialmente se converte em escola de samba), uma reminiscência

fincada no tempo passado vivido do lugar-samba em Pirapora do Bom Jesus. E é,

hoje, com todas as transformações pelas quais passou, uma referência importante

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não apenas no contexto do bairro do Bixiga, mas para toda a comunidade daqueles

que enxergam no samba um fator identitário decisivo.

A quadra do Vai-Vai, enquanto lugar-samba por excelência no Bixiga,

congrega à fruição da festa e do encontro, a memória, que pode ser compreendida

como um traço essencial que permanece na experiência daquele lugar e, por

extensão, da própria cidade.

3 – Do samba à cidade: geografias da experiência

A experiência da cidade está intimamente associada à imagem da cidade que

construímos social e coletivamente. A maneira como nos relacionamos com a ideia

que temos da cidade deriva daquilo que é nosso conhecimento sobre a cidade ou

aquilo que imaginamos sobre a cidade. Os lugares de nossa experiência – aqueles

que compõem a colcha de retalhos de lugares topofílicos – são a expressão do

relacionamento íntimo entre imagem e cidade.

Caminhar pelo caminho sempre trilhado traz segurança existencial. Sair

desse caminho desde sempre conhecido exige um amálgama de atitudes individuais

(de curiosidade, de necessidade, de obrigação, etc.) e de conhecimento produzido

tanto individual quanto coletivamente. Ou seja, a descoberta de novos caminhos na

cidade está associada ao próprio caminhar, que emana de vontades individuais, mas

que são enriquecidas pelas informações coletadas pela comunidade à qual

pertencem as pessoas.

Que significa pensar a cidade a partir da perspectiva da experiência? Essa

pergunta, que é pergunta fundante na busca pelo traço essencial da experiência da

cidade, vai também procurar pela cidade possível.

Como pensar a partir do Bixiga uma São Paulo? Note-se: não ―São Paulo‖,

enquanto entidade geográfica abstrata – um corpo político-administrativo –, nem

―outra São Paulo‖, enquanto alternativa-miragem em um aparente deserto em que

tudo o que está é limitado ou limitante. Mas ―uma São Paulo‖, expressão da cidade

enquanto experiência individual e coletivamente significada. A cidade enquanto a

própria imagem de si. Como considerar essa ―uma São Paulo‖ na relação entre

experiência e memória a partir do lugar-samba no Bixiga para a reflexão em direção

a uma cidade que se humaniza naquilo que o humano lhe confere?

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Uma das formas de pensar as questões propostas é através da consideração

dos problemas colocados pela visibilidade e pela identidade dos grupos sociais, no

contexto de cidades. Visibilidade e identidade remetem, enquanto termos de busca,

ao par ontológico experiência e memória.

Mobilizar a ideia de visibilidade pressupõe estar atento, diante da imagem da

cidade, às vozes que comumente estão à margem. ―Estar à margem‖ pode ser

compreendido de algumas maneiras: (i) uma sinalização de posição relativa, no

interior de uma sociedade segregada e segregadora, que determina posições e

relega vozes a um lugar de silêncio por vezes institucionalmente produzido; (ii) pode

significar não estar sujeito de maneira direta a determinações consideradas normais

por imposições e acordos sociais.

Qual é a imagem de cidade que emerge quando a atenção recai sobre as

vozes à margem? Quais as possibilidades de cidade aparecem se as vozes à

margem deixam de ser ignoradas? Essas questões aparecem se se considera a

cidade a partir da experiência de cidade, que não é a mesma para todos os

indivíduos ou para todas as comunidades urbanas.

Nesse sentido, aquilo que a quadra do Vai-Vai representa no Bixiga pode

servir como uma forma de compreensão da cidade que se funda na experiência

urbana visceral. Imaginar a cidade a partir da experiência dessa cidade por aqueles

que vivem essa cidade numa constância de disputa por visibilidade, pode permitir

um novo olhar sobre elementos da administração e planejamento urbanos.

Que seria uma cidade planejada e gerida, em primeiro lugar, em função da

experiência? Cabe ressaltar a ambiguidade entre a urgência com que as ações do

poder público ocorrem – uma vez que são pensadas como respostas a

necessidades mapeadas de uma cidade-entidade – e aquilo que poderia acontecer

caso os instrumentos de participação política privilegiassem a proximidade e a

intimidade daqueles que experienciam a cidade. O futuro aparente da quadra do Vai-

Vai é um exemplo dessa cidade que não é considerada a partir da experiência.

A quadra, que representa também a luta por visibilidade de uma comunidade,

está no caminho da expansão do metrô de São Paulo. Uma nova estação de uma

nova linha será construída exatamente no lugar da quadra. Em função disso,

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representantes do poder público e da escola de samba têm discutido um novo

endereço para o Vai-Vai.

No movimento que expande as possibilidades de circulação na cidade e em

alguma medida a democratiza, um lugar de reiterada importância história, identitária

e, mesmo, política é arrasado. Será esta, de fato, a única possibilidade de

compreensão da experiência urbana? Ou será possível conjugar esforços de

democratização da cidade com os vários – e importantes – significados de seus

lugares?

A presença da quadra do Vai-Vai no Bixiga tem um papel fundamental no

processo de formação identitária da comunidade que ali se reúne para o samba. Um

processo que é um ato individual, na medida em que é possível singularizar as

relações estabelecidas entre as pessoas e o lugar. Porém, ao considerar esse papel

do Vai-Vai em processos individuais é preciso relembrar a proposta de Relph (1976),

quando fala sobre o ―comum-pertencer‖ heideggeriano para pensar uma identidade

que é, antes de tudo, fluida. Uma identidade construída em bases experienciais e

geográficas e que emerge

[…] do pertencimento a uma comunidade (daí a identidade com lugar emergindo na experiência) e a partir da possibilidade de diferenciação do ser perante o mundo […], permitindo o aparecimento da identidade de lugar (GONÇALVES, 2014b, p. 119-120).

A quadra do Vai-Vai, vista individualmente no contexto da metrópole ―[…]

alarga-se a tal ponto, transbordando suas paredes limitadoras, para configurar-se

como centro de significados, memórias, vivências, identidades e esperanças‖

(GONÇALVES, 2014b, p. 121).

O que se propõe aqui é um tratamento mais cuidadoso dos lugares da cidade.

Um cuidado que verdadeiramente considere a amplidão de sentidos de existir que

se enraízam em cada lugar. Reconhecer a cidade – qualquer cidade – como o

acontecer essencial de existir na cidade. Em certo sentido, significa humanizar a

relação entre cidadãos e cidade. Trazer à tona tesouros escondidos na trama

complexa do cotidiano. Uma cidade reaproximada de si mesma – a partir da

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experiência e da compreensão radical dos lugares enquanto centros poderosos de

significados (TUAN, 2013).

Fossem a Prefeitura de São Paulo ou o Governo do Estado ouvir

verdadeiramente os frequentadores do Vai-Vai, teriam planejado para aquele exato

lugar uma nova estação de metrô? Estivesse o planejamento da cidade ancorado no

saber experiencial, não teríamos cidades mais humanas, tornadas eminentemente

casa, habitação – lugar de segurança e conforto?

Que cidade temos construído? A que imperativos temos respondido,

enquanto sociedade? A cidade impessoal e ―eficiente‖ precisa dar lugar a um projeto

civilizatório que recupere a cidade como epítome da convivência e do encontro.

Encontro entre distintas identidades e distintas realidades.

Olhar o Vai-Vai no Bixiga, inserido no contexto de uma metrópole autofágica,

que via de regra se destrói para abrir caminho para a próxima destruição, significa

considerar outras formas de relacionamento das pessoas com seus lugares e, a

partir disso, desse reconhecimento, é possível almejar uma cidade possível – uma

São Paulo.

O desafio está posto. Algumas respostas já se vislumbram no horizonte. O

tempo de olhar-pensando para a trama que subjaz ao que de óbvio se apresenta

como inevitável e imóvel parece ter chegado.

Referências

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