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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS - MG
Instituto de Ciências da Natureza
Curso de Geografia –Licenciatura
KATRINE CEZARINO DE OLIVEIRA
A FEIRA LIVRE DE DOMINGO NA CIDADE DE
ALFENAS: PERTENCIMENTO, RESISTÊNCIA E
PADRONIZAÇÃO
ALFENAS – MG
2015
KATRINE CEZARINO DE OLIVEIRA
A FEIRA LIVRE DE DOMINGO DA CIDADE DE ALFENAS:
PERTENCIMENTO, RESISTÊNCIA E PADRONIZAÇÃO
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentada como parte dos requisitos para
obtenção do título de Licenciado em
Geografia pelo Instituto de Ciências da
Natureza da Universidade Federal de
Alfenas- MG, sob orientação da Profª. Drª.
Sandra de Castro Azevedo.
KATRINE CEZARINO DE OLIVEIRA
A FEIRA LIVRE DE DOMINGO DA CIDADE DE ALFENAS:
PERTENCIMENTO, RESISTÊNCIA E PADRONIZAÇÃO
A banca examinadora abaixo assinada
aprova o Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como parte dos requisitos para
aprovação na disciplina de Trabalho de
conclusão de curso II e obtenção do título
de licenciado em Geografia pela
Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL
– MG).
Aprovado em:
Profª Drª Sandra de Castro de Azevedo Assinatura:
Universidade Federal de Alfenas
Prof. Dr. Flamarion Dutra Alves Assinatura:
Universidade Federal de Alfenas
Prof.ª Dr. Evânio dos S. Branquinho Assinatura:
Universidade Federal de Alfenas.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1- Localização da Microrregião de Alfenas no Estado de Minas Gerais.....................18
Figura 2- Visão Geral das feiras livres da cidade de Alfenas-2015.........................................20
Figura 3- Feira Livre de Quarta- Feira na Praça Rachid B. Saliba- Alfenas............................21
Figura 4- Feira Livre de Sábado- bairro Pinheirinho- Alfenas.................................................21
Figura 5- Feira Livre de domingo.............................................................................................23
Figura 6- Feira de Domingo: Do passado ao presente..............................................................24
Figuras 7, 8 e 9- Imagens da feira livre de domingo na década de 90.....................................25
Figuras 10 e 11- Imagens feira livre de Domingo no presente................................................26
Figuras 12 e 13- Barracas de roupas, acessórios e industrializados.........................................27
Figura 14- Futura mudança territorial da Feira Livre de Domingo- Alfenas...........................33
Figuras 15 e 16- A diversidade de produtos em uma única barraca- Um dos feirantes mais
antigos da feira de domingo em Alfenas- MG........................................................................36
Figuras 17 e 18- A permanência de tradições até os dias atuais- Burros ainda são um meio de
transporte para muitos feirantes e a produção artesanal de pamonhas....................................49
LISTA DE GRÁFICOS
Gráficos 1 e 2 - Sexo X faixa etária dos feirantes da feira de domingo da cidade de
Alfenas.....................................................................................................................................39
Gráficos 3 e 4- Tempo de trabalho na feira em anos X tradição familiar trabalhar
nela...........................................................................................................................................39
Gráficos 5 e 6 - Cidade de origem dos feirantes X bairros de residência dos feirantes de
Alfenas.....................................................................................................................................40
Gráficos 7 e 8- Produtos comercializados pelos feirantes X Origem dos produtos................40
Gráficos 9 e 10- Motivos que comercializam na feira X Renda dependente da feira............41
Gráfico 11- Outras fontes de renda.........................................................................................42
Gráficos 12 e 13- Frequência de trabalho nas feiras de Alfenas e região...............................42
Gráficos 14 e 15- Importância de preservação e gosto por trabalhar na feira.........................43
Gráficos 16, 17 e 18- Faixa etária X sexo X escolaridade dos consumidores da feira de
domingo..................................................................................................................................44
Gráficos 19, 20 e 21- Bairros onde os consumidores residem X frequência nas feiras de
Alfenas.....................................................................................................................................45
Gráficos 22 e 23- Produtos mais procurados X vantagens em ter o sacolão próximo a feira de
domingo...................................................................................................................................46
Gráficos 24 e 25- Motivos de frequentar a feira X tombamento............................................47
Gráfico 26- Relação consumidor X feira................................................................................47
“Vou mostrando como sou e vou sendo como posso.
Jogando meu corpo no mundo,
andando por todos os cantos
e pela lei natural dos encontros,
eu deixo e recebo um tanto.
E passo aos olhos nus ou vestidos de lunetas
Passado, presente,
participo sendo o mistério do planeta.”
(Novos Baianos)
Agradecimentos
Para eu chegar até aqui não foi tarefa fácil. Sair da casa dos pais, viajar mais de 300
quilômetros em busca de um sonho...
Um sonho que esta sendo realizado graças a “Força maior” que rege nosso planeta,
que nos dá vida para seguirmos todos os dias com garra e amor...
Um sonho que esta sendo realizada pelo esforço dos meus queridos familiares que me
educaram e me proporcionaram todo suporte para que pudesse chegar até aqui...
Um sonho que esta sendo realizado graças ao meu querido pai (avô) Seu Benedito,
minha mãe (avó) Dona Delfina, e minha mãe querida Lili que me ensinaram os valores da
vida, o respeito e a humildade. Um agradecimento especial à tia Simone que me abriu os
olhos ao mundo, sempre mostrando os vários caminhos que poderia seguir....
Um sonho que esta sendo realizado por todo aprendizado que a vida me proporcionou
nesses seis anos de graduação, que não foram poucos...
Um sonho que esta sendo realizado pelas grandes pessoas que cruzaram o meu
caminho ao longo dessa caminhada, principalmente grandes professores e amigos.
Agradeço imensamente a minha querida amiga, professora e orientadora Sandra que
me fez enxergar o sentido da geografia na minha vida e na minha trajetória como professora,
além de me acolher como uma filha nos momentos de desespero e nos momentos de
empolgações com o tema do tcc... Como eu digo “isso não é uma orientadora, é uma mãe”.
Um agradecimento mais que especial a todos os atores envolvidos no processo de
construção deste trabalho, principalmente aos feirantes da cidade de Alfenas que com o amor
pela terra, trabalham duro para trazer nosso alimento de cada dia.
Agradeço a todos os verdadeiros e grandes amigos que estiveram comigo nesta
caminhada, em especial as minhas amigas no qual já dividi minha vida e aprendi muito.
Agradeço também pela pessoa incrível que cruzou o meu caminho a pouco mais de um
ano, meu namorado Léo. Sem seu apoio talvez não tivesse concluído este trabalho, obrigada
por acreditar no meu potencial e erguer minha cabeça quando pensava em desistir... Obrigada
por todo suporte tecnológico nas formatações do trabalho, suas opiniões foram de extrema
importância... Obrigada por todo amor dedicado, essa vitória é nossa.
Agradeço a cidade de Alfenas e a família emprestada que ganhei quando cheguei aqui,
obrigada Tia Rosangela, Tio Lucas e Evandro por terem me acolhido quando mais precisei.
Obrigada a mim mesma por ter acreditado no meu potencial.
A todos uma ótima leitura e espero que sintam- se caminhando pela feira ao fazer a leitura
deste trabalho.
Resumo
O presente trabalho apresenta um estudo sobre a Feira Livre de domingo da cidade de
Alfenas. Daremos ênfase em analisar as feiras livres desde seu contexto global até o local para
que o tema seja mais bem compreendido. Faremos uma viagem ao tempo para descobrir a
origem do comércio periódico no mundo, e em seguida descobriremos como ele chegou,
instalou-se e se desenvolveu no Brasil. A análise foi realizada na própria feira livre de
domingo, buscando saber onde, quando e como ela se deu, fazendo um traçado histórico do
passado, do presente e suas perspectivas, a fim de compreender melhor a dinâmica de seu
território, de seus frequentadores e dos feirantes que nela comercializam, buscando refletir
que além de ela ser um lugar de comércio também é um lugar de encontro onde as pessoas
sentem-se pertencidas por toda bagagem cultural que ela carrega, além de resistir com suas
características tradicionais diante da sociedade contemporânea.
Palavras chave: feira livre; pertencimento; comércio; resistência; território.
Abstract
This paper presents a study about Sunday’s Street Market in the city of Alfenas. We
will focus on analyzing street markets from its global context then to this location so that the
issue is better understood. We will travel in time to discover the origins of regular trade in
world history, and then find out how it came, settled and developed in Brazil. The analysis
was performed inside Sunday’s Street Market, searching for where, when and how it all
happened, setting a historical outline of the past, present and the perspectives, in order to
better understand the dynamics of its territory, visitors and the stallholders who trade in it,
reflecting that beyond being a place for trade it is also a meeting point where people feel
belonging to the cultural background it has, resisting with its traditional characteristics up
against contemporary society.
Keywords: street market; belonging; trading; resistance, territory.
Sumário
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................1
2. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS............................................................................3
3. A ORIGEM DA FEIRA LIVRE E A RESISTÊNCIA..............................................7
3.1. A ORIGEM DAS FEIRAS NO BRASIL..................................................................11
3.2. A RESISTÊNCIA DAS TRADICIONAIS FEIRAS LIVRES FRENTE AO “MODERNO
COMÉRCIO VAREJISTA CONTEMPORÂNEO”..........................................................14
4. ALFENAS E SUA FEIRA LIVRE DE DOMINGO..................................................17
4.1 CARACERIZAÇÃO DE ALFENAS..........................................................................17
4.2 DINÂMICA DA FEIRA..............................................................................................19
4.3. A FEIRA LIVRE DE DOMINGO: PASSADO, PRESENTE E FUTURO..............23
4.4. PASSADO..................................................................................................................24
4.5. PRESENTE................................................................................................................26
4.6. FUTURO...................................................................................................................29
5. A FEIRA NA ÓPTICA DE SEUS AGENTES: A PERCEPÇÃO DOS FEIRANTES E
FREQUENTADORES SOBRE A FEIRA DE DOMINGO.......................................39
5.1. PERFIL DOS FEIRANTES.....................................................................................39
5.3. PERFIL DOS CONSUMIDORES...........................................................................43
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................50
7. REFERÊNCIAS........................................................................................................51
APÊNDICES...................................................................................................................55
1
1. Introdução
Esta pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de valorizar e compreender melhor as
características da feira livre de domingo na cidade de Alfenas. A ideia surgiu diante da
percepção de que essa feira da cidade especificamente a que acontece aos domingos provoca
um movimento diferenciado e exclusivo, tornando-se praticamente um “evento” imperdível
assim como uma missa ou um show.
As feiras livres surgiram na Idade Média com o intuito de trocar mercadorias para que
não houvesse produção de excedentes. Conforme o comércio foi se transformando e
evoluindo, as relações de trocas foram extinguindo- se e foram substituídas pelo surgimento
da moeda, que trouxe um valor aos produtos que antes eram trocados. Um fator que
contribuiu para que as trocas fossem extintas, foi o crescimento da população e a evolução do
sistema econômico.
No Brasil, o princípio de feiras livres começa a chegar à época da colonização com os
índios e portugueses. Tudo que se produzia em solo brasileiro era “trocado” por adornos como
pedras, penas e etc. A partir daí que começou o processo de exploração dos recursos naturais
(que não eram poucos) dentro do território brasileiro. Com o passar dos anos, as feiras foram
adequando-se ao contexto econômico mundial e elas foram expandindo-se para todos os
cantos do país, principalmente no nordeste com as feiras de gado.
Contudo, quando chega- se na era moderna e o capitalismo começa tomar a frente da
economia, e esses comércios periódicos de rua começam a perder forças devido à
modernização do comércio. Começam a chegar os super e hipermercados, competindo com
preços mais baixos, além de toda comodidade que este tipo de empreendimento oferece.
Por isso neste trabalho daremos ênfase em compreender como as feiras livres ainda resistem
frente esse comércio varejista sustentado pelo capitalismo.
O nosso objeto de estudo é a feira livre de domingo na cidade de Alfenas, localizada
ao sul do estado de Minas Gerais.
Este trabalho fará uma abordagem dialética e fenomenológica, buscando compreender
as contradições da sociedade e também evidenciar a relação de poder, as emoções e
sentimentos que os frequentadores da feira de domingo possuem com seu território.
A pesquisa consiste em levantamentos bibliográficos e históricos acerca das feiras
livre pelo Brasil e pelo mundo, pesquisa de campo nas feiras livres da cidade de Alfenas para
constatar se nosso objeto de estudo possui um valor afetivo diferenciado das feiras que
2
ocorrem durante a semana, depoimentos orais e questionários com os protagonistas desta
manifestação como feirantes, fregueses, fiscal responsável pela feira, vereador e moradores
antigos.
Em nosso estudo será questionado qual a percepção dos feirantes e consumidores em
relação ao papel da feira de domingo na cidade, tendo em vista que ela é considerada um
“evento” tradicional da cidade desde a década de 60, promovendo o encontro e o comércio
concomitantemente.
Também faremos uma “viagem ao passado” para saber onde a feira se deu por início,
como ela se encontra no presente e as perspectivas para o futuro como, padronização,
setorização, modernização deste comércio de rua e o projeto de tombamento como Patrimônio
Histórico da cidade de Alfenas.
3
2. Métodos e Procedimentos
O presente capítulo trata da discussão dos dados obtidos em campo, a partir dos
questionários e observações do objeto de estudo.
A análise dos dados será dividida em dois blocos, sendo o primeiro a discussão das
informações a partir do questionário dos feirantes, e o segundo será relacionado às discussões
a cerca dos questionários dos consumidores. Após essa divisão serão pontuadas algumas
informações que possibilitem uma discussão consistente e resultados satisfatórios dos dois
pontos de vista.
Para que esta pesquisa fosse realizada com clareza, dividimos ela em algumas fases de
extrema importância para a compreensão efetiva do objeto de estudo.
O primeiro passo foi realizado mediante um estudo prévio sobre as feiras livres pelo
mundo, com o intuito de ter uma melhor compreensão do tema. Em seguida foram realizados
levantamentos históricos e bibliográficos mais aprofundados para usá-los no referencial
teórico, resultando em um pensamento mais maturo em relação às feiras livres numa escala
global e local, tendo em vista que Lima e Mioto 2007( apud PIZZANI et. al, 2012) afirmam que
quando uma pesquisa bibliográfica é bem feita, ela é capaz de gerar, especialmente em temas
pouco explorados, a postulação de hipóteses ou interpretações que servirão de ponto de
partida para outras pesquisas. A pesquisa foi realizada a princípio em sites que contavam a
trajetória das feiras livres pelo mundo até os dias atuais. Situados no espaço e tempo do objeto
de estudo, posteriormente buscou-se informações em livros, artigos, teses de mestrados,
doutorados, trabalhos de conclusão de curso, vídeos e documentários. Existem muitos
trabalhos relacionados a diversas feiras no Brasil, principalmente as da região nordeste, que
carregam uma bagagem cultural de grande relevância para a história do comércio periódico no
país.
Um fator relevante que limitou a pesquisa em seus aspectos teóricos foi a falta de
materiais de apoio e referenciais a respeito da feira livre de domingo da cidade de Alfenas.
Num segundo momento de pesquisa consistiu na coleta de informações a respeito do nosso
objeto de estudo: a feira livre de domingo da cidade de Alfenas, contribuindo para o
andamento deste trabalho.
4
Realizada a fase teórica, chegamos à prática. As práticas foram realizadas em diversos
dias de observações e coleta de dados em campo nas feiras livres em estudo, principalmente
na feira de domingo. Por mais relevante que seja o levantamento bibliográfico, a fase mais
importante foram as informações obtidas em trabalho de campo, pois é na vivência que
podemos sentir o que é fazer a feira e pertencer a ela, como foi constatado nas conversas com
feirantes e frequentadores. Foram necessárias algumas idas a campo apenas para observar a
dinâmica do espaço como, por exemplo, os horários de montagem, de baixa e alta frequência
de fregueses, disponibilidade de tempo para conversa com alguns feirantes e por fim a
desmontagem e limpeza do espaço para que posteriormente pudesse ser efetivada uma coleta
de dados bem sucedida.
As coletas de dados se fizeram necessárias durante três domingos aleatórios entre os
meses de setembro e outubro de 2015, das 7 h as 11 h da manhã, tendo em vista que quanto
mais cedo havia menos circulação de pessoas e vise versa. Outra diferença constatada nos
horários foram os públicos que a frequentam. Quanto mais cedo, mais idosos e quanto mais
tarde mais jovens e adultos. Essa permanência durante esses horários possibilitou uma
diversidade de públicos participantes na pesquisa.
De acordo com as técnicas de interlocuções de Venturi (2011) o formulário de
questões deve ser elaborado com muito cuidado pelo pesquisador, atendendo aos objetivos
propostos, sendo ele a técnica mais utilizada para investigar o perfil de um determinado grupo
(nosso caso, feirantes e fregueses da feira), servindo então como um subsidio nos estudos de
geografia e outras áreas. Os questionários a princípio são quantitativos, mas em sua analise
podemos atribuir classificações qualitativas, transformando-as em informações.
Foram aplicados 52 questionários aos consumidores e 14 aos feirantes de diferentes
segmentos de barracas. Uma das maiores dificuldades encontradas na realização desta
pesquisa foi a resistência de consumidores mais velhos, principalmente mulheres em dar um
minuto de seu tempo para responder os questionários, muitas davam satisfação de que
estavam atrasadas, ou que não tinham tempo para responder.
Para que os dados pudessem ser interpretados, houve a fase de tabulação destes, onde
exigiu- se uma atenção redobrada para que não houvesse qualquer tipo de erro que viesse a
comprometer a veracidade das informações. Após a reunião dos dados, estes serviram para
que os gráficos fossem confeccionados com o objetivo de melhor interpretar as informações
5
fornecidas por eles e permitiu que o terceiro capítulo fosse elaborado a partir da interpretação
dos resultados.
A fase final ficou a cargo de depoimentos orais e conversas realizados com diversos
atores importantes no processo de construção deste trabalho, sendo estes, vereador da cidade,
fiscal responsável pelas feiras, moradores antigos, feirantes, consumidores e jornal de notícias
da cidade.
Segundo Venturi (2011), o depoimento oral é uma fala autêntica, um relato de vida,
sem roteiro nem script preestabelecido, apenas abrigado em um tema amplo, repleto de
informações e, sobretudo, de subjetividades, como opiniões, características culturais, crenças,
emoções. Eles são apoiados por instrumentos como gravadores, câmeras e, sobretudo
filmadoras, já que nem só as palavras são importantes, também os gestos, as expressões
faciais e a ambientação. No caso dessa pesquisa, o depoimento com o vereador da cidade foi
gravado com um aparelho celular, e o depoimento do fiscal responsável pela feira foi
registrado com caneta e papel, destacando as falas mais importantes.
Houveram várias tentativas de agendamento de entrevista com o vereador Hesse
Pereira, cidadão muito antigo que, segundo pessoas que o conhecem, disseram que é um
grande conhecedor da história da cidade e da feira , inclusive já foi prefeito da cidade de
Alfenas por quatro mandatos, mas não houve disponibilidade pois já esta com uma idade
avançada, o que compromete certos compromissos.
Todas as informações obtidas com esses atores foram interpretadas e colocadas dentro
do segundo capítulo. Esta fase foi de extrema importância, pois tanto ela quanto a coleta de
dados nos permitiu uma aproximação efetiva com os atores principais deste lugar de comércio
e encontro, resultando em informações primárias que permitem a possibilidade de maior
credibilidade ao trabalho, dado que as fontes primárias contêm os trabalhos originais com
conhecimento original e publicado pela primeira vez pelos autores. (PIZZANI. L, et. al, 2012,
pág. 57).
Em relação aos métodos da ciência geográfica, a pesquisa foi embasada em duas
vertentes da geografia humana, a dialética e a fenomenologia.
A dialética foi utilizada para compreendermos a relação de poder que os feirantes e
seus frequentadores têm com aquele território,
6
Pois esse é um método histórico e que dá melhores resultados quando
empregado para se compreender e interpretar os problemas sociais,
entendendo a realidade e o espaço geográfico como concretos e produzidos
pelo próprio homem. Este método tem por base as contradições da sociedade
e essas contradições são os fundamentos para as mudanças e transformações
sociais, daí a história da sociedade ser comandada pelos conflitos de
interesses entre as classes sociais (CAMARGO E ELESBÃO, 2004).
Para que possamos compreender com mais clareza o processo de pertencimento e
percepção, iremos utilizar também o método fenomenológico, ou também conhecido como
“Geografia Humanista ou da Percepção Ambiental”. Este método nos levará a entender
melhor o sentimento de pertencimento que os atores envolvidos na dinâmica da feira livre de
domingo tem com o lugar.
A corrente fenomenológica valoriza a experiência de vida, a visão de mundo,
os aspectos mais subjetivos das pessoas, procurando evidenciar suas
emoções, os seus sentimentos, desejos ou fobias em relação ao lugar
(espaço) onde vivem (CAMARGO e ELESBÃO, 2004, p. 15).
E também (CHRISTOFOLETTI, 1982 apud CAMARGO E ELESBÃO) fará uma colocação
em que,
A fenomenologia preocupa-se em analisar os aspectos essenciais dos objetos
da consciência, através da supressão de todos os preconceitos que um
indivíduo possa ter sobre a natureza dos objetos, como os provenientes das
perspectivas científica, naturalista e do senso comum, Preocupando-se em
verificar a apreensão das essências, pela percepção e intuição das pessoas, a
fenomenologia utiliza como fundamental a experiência vivida e adquirida
pelo indivíduo. Desta maneira, contrapõe-se às observações de base
empírica, pois não se interessa pelo objeto nem pelo sujeito
(CHRISTOFOLETTI, 1982, p. 22 apud CAMARGO E ELESBÃO, 2004, p.
16).
7
3. A Origem da Feira Livre.
As relações comerciais atuam diretamente na produção do espaço. Já em tempos mais
distantes as relações de trocas eram de extrema importância, tornando os espaços públicos,
lugares de comércio e encontro, tornando a feira um centro de economia e atividades. O papel
do encontro nessas feiras se dá exatamente pela necessidade do homem em organizar as
relações de trocas, reunindo todos os produtos que estivesse se excedendo, satisfazendo a
necessidade do trocar, do comerciar e do relacionar.
Ao observarmos as relações de trocas obtidas ao longo do tempo, podemos afirmar
que as feiras livres são as maiores provas dessa relação do homem com o espaço e o trabalho.
Assim como diversos acontecimentos, as feiras possuem diversos significados, onde a
princípio na Idade Média sua função era o que Sousa (2004, p. 194) afirmava ser a principal
causa da origem das feiras: a produção de excedentes.
Outro fato social muito interessante associado a feira livre é a festividade popular. No
latim feria dá origem a palavra feira na língua portuguesa, significando um dia santo ou
feriado, originando- se a ideia de festa. E são em ocasiões religiosas que o comércio e a
festividade aconteciam concomitantemente.
Vamos tentar aqui de forma breve entender como se deu o processo de transformação
do espaço das feiras livres, desde seu princípio, na Idade Média até os dias atuais.
As feiras livres remontam um período que pode ser lembrado pelas práticas primitivas
de atividades comerciais e sociais, a Era Medieval. Como em toda sociedade, um sistema de
comércio/ econômico é de extrema importância, neste momento o sistema econômico adotado
foi o Sistema Feudal. Sistema este que permitia uma relação extremamente restrita a grandes
negociações, uma vez que não era viável para a época a produção de excedentes por conta da
baixa taxa de densidade demográfica. A autossuficiência ficou conhecida como a economia
feudal. Conforme o passar do tempo, a sociedade foi se organizando e as relações comerciais
e sociais vieram a crescer através principalmente das grandes navegações, permitindo que
houvesse uma produção de excedentes, contribuindo para a abertura comercial em outros
lugares, fato este que levou a uma expansão do comércio livre e de troca.
8
LE GOFF (2005) em sua obra “A civilização do ocidente medieval” argumenta a
respeito da economia do ocidente medieval, baseada na subsistência, onde:
A economia do Ocidente medieval tem por finalidade a subsistência dos
homens. Não vai além disso. Se parece ultrapassar a satisfação do
estritamente necessário, é porque, com certeza, a subsistência é uma noção
socioeconômica e não puramente material. A subsistência varia segundo as
camadas sociais. À massa basta a subsistência no sentido estrito da palavra,
isto é, o suficiente para subsistir fisicamente: primeiro a alimentação, depois
a vestimenta e a casa. Neste sentido, a economia medieval era
essencialmente agrária, baseada na terra que fornecia o necessário para
viver... Para as camadas superiores, a subsistência inclui a satisfação de
necessidades maiores, deve permitir- lhes conservar sua posição social, não
decair. Sua subsistência é fornecida numa pequena parte pelas importações
estrangeiras e, de resto, pelo trabalho da massa. (Le Goff, 2005, p. 218)
Em “A história da riqueza do homem” Huberman (1981) irá retratar claramente como
funcionava as atividades relacionadas ao comércio. Nada era comprado, quando sim, no
máximo sal e ferro. No mais tudo era comercializado no feudo, através das trocas nos
mercados semanais. Os feudos eram praticamente autossuficientes, não produziam
excedentes, e quando sim, havia a troca do que cada servo e sua família necessitavam.
Nesse período o trabalho artesanal era o carro chefe da economia feudal, onde em suas
próprias casas as famílias produziam os objetos no qual necessitavam e quando viesse a faltar
alguma matéria prima, procuravam quem tivesse para ocorrer uma possível troca de produtos
entre feudos.
Mas com o comércio em tão baixo nível não havia razão para a produção de
excedentes em grande escala. Só se fabrica ou cultiva além da necessidade
de consumo quando há uma procura firme. Quando não há essa procura, não
há incentivo à produção de excedentes. Assim sendo, o comércio nos
mercados semanais nunca foi muito intenso e era sempre local.
(HUBERMAN, 1981).
Assim, com toda produção de excedentes que o feudo gerava, surgiam então, as
cidades e vilas, que por consequência do sistema, onde houvesse tal produção teria de haver
pessoas para consumi-la.
Conforme o amadurecimento desta, as trocas nas feiras-livres foram crescendo,
surgindo núcleos populacionais, contribuindo para a formação de cidades mercantis, com
9
caráter excepcionalmente voltado ao comércio. Após este período Dantas apud Sposito (2001,
p. 89) afirmam que:
“Com o passar do tempo, as feiras-livres foram adequando- se à transformação do
espaço, principalmente por conta do crescimento das cidades, deparando- nos com
a chegada da urbanização”. E assim chegamos ao que Sposito conclui: a ruptura da
produção feudal (SPOSITO, 2001 apud DANTAS , 2008, p. 89)
A intensificação das trocas comerciais neste período (inicialmente interna e depois
externa) foi o elemento preponderante para o Renascimento Urbano. Neste contexto, o
comércio estimulou o crescimento dos núcleos populacionais existentes e transformou o
caráter essencialmente agrícola da sociedade, ou seja, “as primeiras cidades mercantis
resultaram da transformação do caráter destas aglomerações medievais sem função urbana”
(SPÓSITO, 2001, p. 31 apud DANTAS, 2008).
Com o capitalismo mercantil e o processo de urbanização que foi se fortalecendo
juntamente com a industrialização, na maioria dos países, o comércio também foi se
transformando, principalmente quando o ato de consumir se torna um dos principais
responsáveis pelo movimento do capital.
Harvey apud Dantas (1981) irá ainda discutir como conceber a produção de
excedentes, onde ela vai além daquilo que é necessário para a manutenção biológica, social e
cultural. Ela visa garantir a manutenção e a reprodução da força de trabalho no contexto de
um modo de produção qualquer”. (HARVEY, 1981 apud DANTAS p.62).
Conforme as evoluções do comércio a cerca do sistema capitalista, as feiras livres
foram tomando moldes diferentes daqueles citados no sistema feudal. Uma vez como uma
atividade dita “tradicional” o comércio de rua, tornou-se apenas um facilitador do escoamento
da produção local, além de contribuir com a entrada de mercadorias industrializadas,
fomentando a economia globalizada.
Neste sentido comprovamos que as feiras livres não só permitiram que as pessoas
comerciassem se relacionassem como também visualizamos a afirmação do encontro,
concomitantemente com as festividades religiosas que reuniam diversos povos, das mais
diversas sociedades da época, assumindo papéis de centralidades socioeconômicas e culturais
nos espaços por elas influenciadas (DINIZ, 2004, p. 128 apud CAVALCANTI).
10
Na chamada “Era Moderna”, os espaços livres de comercialização ganham novo
significado, e as cidades passam a ser lugares privilegiados para o comércio, sobretudo nas
feiras livres. Chega-se então à contemporaneidade, na qual o capitalismo impulsiona o
processo de urbanização e a atividade de compra e venda é transferida, na maioria das grandes
cidades, para as grandes redes de supermercados (PORTO, 2005, pág. 24).
Milton Santos traz consigo a teoria do "circuito inferior" orientando sua atividade para
a população e economia locais de países periféricos, ou seja, trabalha-se intensivamente
utilizando tecnologia pouco sofisticada, e os vínculos de trabalho são precários em termos de
proteção social, além das atividades comerciais dirigirem-se, exclusivamente, para as camadas
médias e populares e visando, garantir a sobrevivência apenas. (SATO, 2007, P. 96)
Isso quer dizer que, nos dias atuais, as feiras receberam e recebem tais características
que Milton Santos diz ser o “circuito inferior”, uma vez que tal é voltada as camadas
populares e com o mínimo de avanços no que diz respeito a tecnologias ou práticas
comerciais.
Sobre a teoria dos circuitos inferiores aplicada nas feiras livres, nos vem um
questionamento ou reflexão: por que as feiras livres continuam a ser tão importantes para a
vida cotidiana urbana? Podemos considerar o território da feira como um símbolo de
resistência e persistência frente os grandes empreendimentos varejistas atuais, vistos como
parte o circuito superior da economia?
Com as diversas mudanças no cenário econômico e produtivo, as cidades se formam
em torno das praças de mercado e a partir desse momento, “a troca comercial torna-se função
urbana; essa função fez surgir uma forma (ou formas: arquiteturais e/ou urbanísticas) e, em
decorrência, uma nova estrutura do espaço urbano” (LEFEBVRE, 2004, p. 23).
No que se refere à América Latina, podemos perceber que as feiras e mercados, quanto
à sua origem, podem ser reunidos em dois grupos. Um formado pelos países que já possuíam
praças de mercado antes da chegada dos colonizadores; e, o segundo grupo, no qual o Brasil
está incluso, refere-se àqueles onde as feiras e mercados são considerados inovações
desconhecidas até então pela população nativa (DANTAS, 2008, p 89).
11
3.1 A origem das feiras no Brasil
Na Europa, as feiras livres no Brasil tiveram origem a partir das relações da não
produção de excedentes, bem como nos feudo medievais. Relatos de viajantes e cronistas da
época, dizem que tais trocas deram início entre as tribos indígenas que habitavam
principalmente o litoral nordestino, lugar onde, segundo a históriografia, afirma ser o lugar
onde os portugueses pisaram em terras brasileiras pela primeira vez. Segundo Mott(1975) o
comércio intertribal se limitava à troca silenciosa de alguns bens raros ou de luxo, tais como
certas pedras verdes e plumas de aves destinadas ao adorno corporal.
A fim de confirmar tal comércio, possuímos apenas uma referência: Jean de Léry
(1557) apud Mott (1975) nos diz que,
Os Tupinambá ao comerciarem com os Guaitacá postavam-se a uma
distância de mais ou menos uns 100 metros uns dos outros. Mostravam de
longe os objetos que queriam permutar e deixavam-nos por cima de uma
pedra ou pedaço de pau a meio caminho entre os dois grupos. Vinham os
Guaitacá, examinavam os objetos ofertados, deixavam suas pedras e penas e
levavam em troca as coisas deixadas pelos outros. Feita, porém a troca
rompia-se a trégua entre os dois grupos e apenas ultrapassados os limites do
lugar fixado para a permuta, procurava cada qual alcançar o outro a fim de
arrebatar-lhe a mercadoria. (JEAN DE LÉRY, 1557 apud MOTT 1975).
Tal comportamento nos faz chegar à conclusão de que os povos nativos que habitavam
as terras brasileiras na época, usavam de práticas extremamente primitivas de trocas. Observa-
se que cada tribo já mantinha seus territórios mais ou menos traçados para que todos
pudessem realizar suas práticas de subsistência sem depender um do outro, quando então
surge o homem branco com a ideia de produção de excedentes, totalmente fora da realidade
dos nativos.
A primeira aparição constatada em bibliografia do comércio livre no Brasil, data dos
anos de 1548 quando Dom João III determina ao 1º Governador Geral do Brasil, Tomé de
Sousa que,
12
Ordenareis que nas ditas vilas e povoações (da Bahia) se faça em um dia de
cada semana, ou mais, se vos parecerem necessários, feira a que os gentios
possam vir vender o que tiverem e quiserem, e comprar o que houverem
mister, e assim ordenareis que os cristãos não vão às aldeias dos gentios e
tratar com eles...”( AHU apud MOTT, 1975)
Sabeis ao certo então qual a real intenção da coroa portuguesa em dar início nas
relações comerciais da época numa terra mal conhecida pelos homens brancos (civilizados)
até então?
Com toda aquela grandiosidade paisagística, o português enxergou dentro do território
brasileiro uma gama de produtos de muito interesse a coroa e a toda Europa. Era madeira,
açúcar, milho, feijão, que atraiam os colonizadores a comerciar indiretamente com os nativos
da época. Relatos dizem que os nativos mais conhecidos eram os tupinambás, que por sinal,
mantinham certa distância dos homens brancos ao estabelecerem relações de trocas. Tal
distância foi rompida quando os portugueses começaram a capturar os índios para servirem de
mão de obra escrava para transportar tudo que eles extraiam e exploravam das terras
douradas.
Desde o princípio os europeus faziam com que os nativos levassem tudo que lhes era
de interesse para perto da costa com o objetivo de juntar o maior número de produtos para
serem transportados até a Europa, e assim quase não havia produção de excedentes, ou seja,
mesmo com o decreto imposto por D. João, oficializando o funcionamento das feiras, elas não
foram postas em pratica de imediato. Confirmamos esse atraso no funcionamento das feiras
com Mott(1975) onde “o pau-brasil ia diretamente das matas para a costa; em seguida, o
açúcar, dos engenhos para os portos de embarque, sem precisão de que os mesmos fossem
anteriormente reunidos em praça pública” (MOTT, 1975, p.269).
Após 40 anos de estabelecido o primeiro regimento sobre o funcionamento das feiras,
o segundo foi mandado aos governadores da Bahia, ordenando que se faça feira um dia ou
mais na semana.
De acordo com relatos, a primeira feira no Brasil foi constituída em Capoame datada
do século XVI, no Recôncavo Baiano. Porém Mott (1975) discorda dessa data, uma vez que
“ainda em 1677, no “Regimento que trouxe o Mestre de Campo General do Brasil”, D.
Afonso IV determinava exatamente como seus antecessores do século XVI, que se criassem
feiras em que os gentios pudessem ir vender”.
13
Em pesquisa realizada diretamente nos documentos da colônia, Mott (1975) concluiu
que:
Consultando os documentos oficiais da Colônia e igualmente os relatos dos
viajantes e cronistas que passaram pela Bahia nos séculos XVI e XVII, não
encontramos referência alguma à existência de feiras. Deste modo, podemos
adiantar uma hipótese: embora a ideia das feiras se enraíze nos primórdios
da vida brasileira, sua emergência provavelmente só se consubstanciará mais
tarde, quando do maior desenvolvimento demográfico e da diversificação
econômica da Colônia (MOTT, 1975, P. 270).
Podemos notar que a falta de documentação acaba limitando a pesquisa, mas os
poucos relatos encontrados contribuem para que tenhamos uma noção de que a relação do
nativo com qualquer tipo de atividade comercial foi bem tardia e até então suas relações
foram totalmente ligadas ao escambo e a produção estritamente para subsistência.
O comércio mantido no início do período colonial se organizava através do único carro
chefe de produção: a cana- de- açúcar. Através dela, organizavam-se os engenhos, vilas e
cidades que serviam de armazenagem para a produção açucareira.
Em sua tese, Dantas (2007) cita Prado Jr (1990, p. 43), onde ele diz que nas cidades, o
maior problema era a escassez de alimentos básicos para o abastecimento da população, pois,
uma vez que deveria se produzir alimentos essenciais para sobrevivência humana, era
produzido apenas a cana-de-açúcar por ter grande valor no que diz respeito aos lucros e por
ser um produto base, serviu e ainda serve de matéria prima na produção de diversos outros.
Os únicos indícios de comércios na época eram de tavernas e quitandas. Por volta de 1587,
um cronista relata a existência de “logeas de mercadores”, onde eram realizados dois tipos de
comércio. A um cabia comercializar artigos de luxo e o outro o comércio era realizado ao ar
livre com produtos vindos de roças da região, porém o cronista não afirma ser uma feira livre
de fato.
Com o passar do tempo, a população foi crescendo, as necessidades aumentando na
mesma proporção, porém as técnicas também vieram a se aprimorar, e assim a diversidade de
produtos para consumo foram surgindo e as feiras livres foram dando seu formato nas mais
diversas cidades.
O desenvolvimento das feiras livres no Brasil se inicia com as feiras rurais e feiras de
gado no nordeste. Tais feiras remontam dos séculos XVIII e XIX, onde em 1732 temos o mais
antigo registro com a feira do gado bovino no sítio Capoame , na Bahia. De acordo com as
14
pesquisas de Mott (1975), se tem notícias de outras feiras, como da Mata de São João, da Vila
de Nazareth, Feira de Santana e da Vila do Conde na Bahia; de Goiana e Itabaianinha, na
capitania de Pernambuco; e em muitas vilas de Sergipe.
Segundo Pazera Jr (2003), nessa época, havia dois tipos de feiras no Brasil,
A Feira de Mercado, realizada aos sábados para o abastecimento alimentar
da população da cidade e das redondezas e a Feira Franca, realizada anual ou
bianualmente destinada à comercialização de bens regionais como o gado e
por isto atraiam grande número de compradores e vendedores das mais
distantes regiões (PAZERA JR, 2003, p. 26)
Em sua tese Mott (1975) afirma que no século XIX as feiras ocorriam com maior
frequência, sendo algumas de grande abrangência física, pois eram abatidos cerca de 60 a 70
bois, como na feira de Itabaianinha em Pernambuco, por exemplo.
No início do século XX, as feiras foram ganhando moldes próprios, um tanto quanto
modernizados no ramo varejista no final de 1904. Neste momento, segundo Mascarenhas
(2008) por sua expressão reduzida, as feiras livres apresentam-se mais como efeito
decorativo, um “(ornamento da modernidade), que propriamente como canal de
abastecimento”.
3.2 A resistência das tradicionais feiras livres frente ao “moderno comércio
varejista contemporâneo”.
A tradição e a cultura das feiras livres também passaram a ser cotidianas nas grandes
cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo, exercendo um importante papel no
abastecimento dessas cidades, tornando- se elemento crucial de persistência e resistência no
atual período da globalização.
Para Mascarenhas (2008) a feira livre nos dias atuais talvez seja uma filha rebelde da
modernidade que insiste em desafiá-la. Enquanto os grandes empreendimentos varejistas
(CEASAS por exemplo) sonham em manterem-se materialmente, as feiras livres lutam pela
sobrevivência sociocultural.
O próprio supermercado recria em seu interior a “ferinha” enquanto forma,
mas não pode recriar a figura do feirante, conhecedor profundo das
particularidades da freguesia e da natureza dos produtos que vende, e com
autonomia para barganhar o preço. (MASCARENHAS 2008, pág. 83).
15
Com a chegada da modernidade podemos perceber que o próprio sistema capitalista
foi condicionado a realizar uma produção maior do que o comércio de rua proporcionava a
sociedade, isso por conta do aumento da população de um século para o outro. Porém como
podemos responder o questionamento em relação a resistência desse comércio periódico que
vem a ser a feira livre?
A grande diferença entre o comércio de rua (feira) e os grandes empreendimentos
varejistas é notada a partir da relação afetiva no qual o consumidor exerce ao estar de corpo e
alma escolhendo o que levar para a casa. A feira permite uma aproximação direta do
consumidor com o produtor e o produto final, além de que na rua não há distinção entre raça,
cor, sexo ou classe social, todos se misturam e contemplam a liberdade de escolha do que
desejam levar para suas mesas e lares.
Importante lembrar que o conflito entre feirantes e supermercados não se
restringiu às esferas econômica e jurídico-política. No plano do imaginário,
recriam-se as feiras livres como territórios do desconforto, do informal, do
transtorno, do atraso, do barulho e sujeira das ruas, enquanto os
supermercados são massivamente apresentados como portadores do novo, do
belo, do conforto, do "american way of life". A grande imprensa, entre 1969
e 1974, intensifica brutalmente o volume de reportagens sobre aspectos
negativos das feiras livres (insegurança, sujeira, atravancamento do tráfego),
mesmo numa época em que ainda funcionavam com performance bastante
satisfatória. Em muitas ocasiões se levantou a absurda hipótese de
suspensão definitiva de todas as feiras livres, no Rio de Janeiro, em São
Paulo, e várias outras cidades. Entretanto, como forma de sobrevivência para
milhares de famílias de baixa renda, a feira livre vem persistindo, resistindo
ao processo acentuado de negação da rua, do espaço público de franco
acesso, que vem marcando a urbanização brasileira nas últimas décadas.
Trata-se não apenas de garantir aos pobres uma forma de geração de
emprego e renda, ou de oferecer ao consumidor urbano uma alternativa a
mais para aquisição de uma gama de produtos. Trata-se de preservar a rua
como lugar de encontro. De preservar uma tradição popular urbana. Uma
questão de cidadania (MASCARENHAS, 2008, p. 79).
No próximo capitulo iremos fazer um estudo mais detalhado do nosso objeto de
estudo: a feira livre de domingo na cidade de Alfenas, traçando uma linha do tempo entre o
16
seu passado, o presente e o futuro diante das propostas de modernização deste comércio
periódico.
17
4. Alfenas e sua Feira Livre de Domingo
A Feira Livre de Alfenas, mais especificamente a de domingo é um dos eventos mais
divulgados aos recém-chegados e aos turistas. Os moradores da cidade se referem a ela como
um evento diferenciado tanto no que diz respeito aos produtos vendidos quanto à
possibilidade de encontro. Realmente ela apresenta algumas características que a destaca de
outras feiras da cidade. Este capítulo tem como objetivo recuperar um pouco da história da
feira de domingo e de compreendê-la melhor.
Na perspectiva de Bromley (1980) as feiras geralmente surgem em
sociedades estratificadas com nítidas divisões de trabalho e fortes vínculos
de influências externas. Tornam-se periódicas a partir do estabelecimento do
comércio em tempo parcial e a designação de dias especiais para a sua
realização e persistem ao longo do tempo pelas necessidades dos produtores
e consumidores. Ou seja, as feiras atendem periodicamente às necessidades
dos consumidores e dos produtores, como uma alternativa a outras formas de
comércio. Para além dos pressupostos econômicos, as feiras livres
desempenham o papel de ponto de encontro e reafirmação de culturas, onde
o vivido, o experienciado em grupo seja na produção ou no consumo traduz
modos de vida. Este modo de viver envolve, sobretudo, as manifestações
econômicas, sociais e culturais que se materializam no espaço urbano das
praças, ruas e avenidas. (SILVA, 2013: 1595)
Antes de iniciar uma reflexão sobre a Feira que é o objeto de estudo da pesquisa, se
faz necessário escrever um pouco sobre a cidade que a sedia.
4.1- Caracterização de Alfenas
A cidade de Alfenas possui uma área de 850, 446 Km2, uma população de 73.722
habitantes e uma densidade demográfica de 86,7 hab/Km2
de acordo com o último censo
realizado pelo IBGE em 2010. Situa-se nas coordenadas geográficas de latitude 21º25”44’S e
de longitude 45º56”49’W, na mesorregião do Sul de Minas e possui como municípios
limítrofes: ao Norte - Alterosa Carmo do Rio Claro Campos Gerais e Campo do Meio; a Leste
- Paraguaçu e Fama; ao Sul - Machado e Serrania e a Oeste - Divisa Nova e Areado. (Figura
1)
18
Figura 1- Localização da Microrregião de Alfenas no Estado de Minas Gerais.
Fonte: IBGE- Base Cartográfica Digital. Elaboração: Mayara Fontes Dantas. Adaptação: André
Bellini.
Alfenas esta localizada nos vales dos rios Sapucaí, Machado e Verde. A cidade se
situa em uma localização privilegiada. Por estar inserida em uma rede urbana formada por
prósperas cidades de porte médio, também esta inserida em localização estratégica em relação
aos grandes centros urbanos contemporâneos: Belo Horizonte (365 km), São Paulo (300 km)
e Rio de Janeiro (470 km).
Além desse fácil acesso, Alfenas se destaca por sediar duas grandes instituições de
ensino superior, sendo uma privada próxima a saída para Pouso Alegre, a Unifenas, e uma
pública, a Universidade Federal de Alfenas- Unifal-MG, com sede no centro da cidade e um
campus II no bairro Santa Clara, próximo a saída para Carmo do Rio Claro. A Unifal também
conta com campus nas cidades vizinhas de Varginha e Poços de Caldas.
Ambas as universidades da cidade se destacam na região pelos cursos na área da
saúde, onde, inclusive, a Unifenas possui o maior hospital da cidade que atende os moradores
dela própria e das cidades vizinhas, fazendo de Alfenas um dos polos mais importantes na
área da saúde e educação no Sul de Minas.
Este fenômeno acaba trazendo uma população flutuante extremamente ativa na cidade,
a exemplo de diversos jovens quem saem das cidades vizinhas para estudar e acabam
morando por no mínimo quatro anos e pacientes que tratam os mais diversos problemas de
saúde na cidade em questão, fomentando a área de serviços, fazendo com que, principalmente
19
os estudantes se encantem com a diversidade cultural que a feira de domingo traz a todos que
a frequentam.
4.2- Dinâmica da Feira
A população estudantil contribui de forma efetiva no que diz respeito ao público que
frequenta a feira de domingo. Por volta das 21 horas de sábado muitas barracas de salgados já
estão montadas e funcionando, o que acaba chamando muitos estudantes que voltam de festas
durante a noite e a madrugada ou que procuram alimentos rápidos e prontos para consumo
imediato como, por exemplo, o famoso e tradicional pastel de feira. Já pela manhã, assim
como a população alfenense, muitos estudantes vão à feira em busca de produtos para
abastecer suas geladeiras e fruteiras para a semana que se inicia, já que muitos cozinham sua
própria alimentação, sendo a feira um comércio onde os preços são mais acessíveis a este
público, visto que o orçamento de muitos desses estudantes são restritos, cabendo dar
prioridade a alimentação.
Em relação ao horário de funcionamento desta, atualmente, a prefeitura não consegue
efetivar uma fiscalização rígida quanto à montagem e funcionamento das barracas, o que
resultou um projeto de padronização, que veremos mais adiante, tendo como um de seus
objetivos principais, a rigidez no cumprimento do horário estipulado pela fiscalização da
feira quanto sua montagem, funcionamento e desmontagem, dado que sua antecipação em
funcionar atrapalha o trabalho dos chalés de lanches localizados nas calçadas que cercam o
espaço das barracas. Tais informações foram obtidas em depoimento oral com o fiscal
responsável pelas feiras da cidade.
A feira livre pode ser entendida como um processo de construção do território,
A construção de territórios na cidade implica em distintos conflitos, seja
entre os grupos que territorializam o espaço, seja entre estes e o Estado,
como acontece com as feiras livres. Isso porque o território é a expressão
cabal das relações de poder travadas pelos diferentes atores sociais na
produção do espaço urbano (SOUZA, 1995 apud SANTOS, 2013, p.48).
A cidade de Alfenas é conhecida na região por ser um dos maiores produtores de café.
No ranking fica entre as três cidades que mais produzem na região e a 10ª em todo o estado de
Minas Gerais de acordo com o IBGE. Além das grandes fazendas de café, a cidade possui
diversos produtores agrícolas, tanto de grande, médio e pequeno porte.
20
Com base na pesquisa realizada por Codignole (2011),
O município de Alfenas, segundo o Censo Agropecuário 2006 do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, possui aproximadamente 1.044
(um mil e quarenta e quatro) unidades de estabelecimento agropecuário
individual, somando uma área de 36.758 hectares. Sendo café, batata inglesa,
milho, feijão, tomate, hortaliças, mandioca, seus principais produtos
(CODIGNOLE, 2011, p. 5).
E também,
De tradição agrícola, Alfenas manteve, até a década de 1950, a base de sua
economia centrada na cultura cafeeira, não só em termos de produção como
também em área cultivada. Até a década de 1950 a população rural
sobressaía em relação à urbana e a partir dessa década ocorreu o predomínio
da população urbana tendo seu crescimento progressivo (crescente evolução
populacional). Apesar da mudança em relação à população rural e urbana, a
ocupação da maioria da população economicamente ativa do município
continua no setor agrícola, somando maioria entre a população
(CODGNOLE, 2011, p. 15).
Muitos produtos cultivados em Alfenas e na região são comercializados em nosso
objeto de estudo: na feira livre de domingo, esta se deve a isenção na taxa de arrecadação que
os alfenenses possuem para participar desta atividade.
A cidade promove três feiras livres durante a semana atualmente, sendo a principal
logo no início da semana aos domingos na Praça Fausto Monteiro no centro, aos sábados no
bairro Pinheirinho próximo ao campus II da Universidade Federal de Alfenas e as quartas-
feira na Praça Rachid B. Saliba próximo ao campus I da mesma universidade. (Figura 2).
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
Figura 2: Visão geral das Feiras Livres de Alfenas- 2015
21
A feira de quartas- feira localizada ao entorno de uma praça pública já mencionada, se
destaca por abastecer principalmente as famílias da região central da cidade, tornando seu
papel exclusivamente comercial (Figura 3).
Figura 3: Feira Livre de Quarta- Feira na Praça Rachid B. Saliba- Alfenas.
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
O mesmo vale para as feiras aos sábados na Avenida João Januário Magalhães no
bairro Pinheirinho, facilitando a vida dos moradores que precisavam se deslocar
(principalmente de transporte público) do bairro as quartas e domingos para fazer a feira no
centro da cidade, dado que a distância entre elas são aproximadamente de 2,8 Km (Figura 4).
Figura 4: Feira Livre de Sábado- bairro Pinheirinho- Alfenas
22
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
É importante destacar que ambas as feiras possuem caráter distinto em relação à feira
de domingo. Além de tanto na feira de quarta quanto na feira de sábado o espaço e o tamanho
serem reduzidos em relação à feira em estudo, podemos observar a diferença no
comportamento de seus consumidores. Em observações realizadas nas três feiras podemos
ressaltar que:
a) Nas quartas- feira os consumidores buscam uma compra rápida, visto que se
encontram no meio da semana, onde muitos estão indo para o trabalho ou usam
preciosos minutos do próprio horário de serviço para abastecer suas casas, ou até
mesmo as donas de casa que precisam estar com o almoço pronto dentro de seus
horários;
b) Aos sábados notamos que o público alvo são moradores do bairro Pinheirinho e
bairros vizinhos, por conta da distância entre eles e o centro da cidade. A implantação
da feira aos sábados se deu a partir de um abaixo assinado feito por moradores da
região e contou com o apoio de cerca de 2.500 pessoas (Jornal dos Lagos, 2011).
De acordo com a reportagem realizada em agosto de 2011 pelo Jornal dos Lagos, que
abrange Alfenas e região, podemos confirmar nosso argumento em entrevista, onde,
“A compradora Conceição Maria Santos gostou da facilidade que a feira lhe
trouxe. Ela gastou aproximadamente R$ 10 e estava com várias sacolas. “Lá
na outra, eu não ia”. Muito longe e tinha de pagar o circular para ir.
Comprava numa mercearia, mas na feira é melhor. Agora tá bom” (Jornal
dos Lagos, 2011)”.
c) A feira de domingo, além de ser a maior tanto em aspectos físicos quanto em
diversidade de produtos, também fomenta uma dinâmica espacial muito relevante,
visto que ela promove a relação de pertencimento do consumidor com o lugar e seu
território, tornando aquele espaço um importante idealizador de afirmação das raízes
culturais do povo alfenense. A feira dos domingos na cidade é um evento semanal em
que as pessoas vão com suas melhores roupas, como fosse ir à missa, atraindo não
somente os alfenenses, mas consumidores de toda região e visitantes de capitais como
São Paulo e Belo Horizonte que aproveitam as visitas na casa de parentes para realizar
um turismo pela feira de domingo.
23
4.3 A Feira Livre de Domingo passado, presente e futuro
A feira livre de domingo na cidade de Alfenas traz consigo uma herança cultural muito
forte. Localizada na região central da cidade (Figura 5), ao entorno da Prefeitura Municipal,
Câmara dos Vereadores e Teatro Municipal, ao despertar interesse em seus moradores sejam
nativos ou flutuantes, podemos notar que a feira livre em pesquisa é um grande atrativo para a
cidade, apesar deste momento em busca de entender a feira, seja no seu aspecto econômico ou
cultural, poucos registros e pesquisas são encontrados em relação a ela e alguns apresentam
um nível de pesquisa mais superficial. Ao fazer o levantamento bibliográfico, foram
encontrados dois trabalhos acadêmicos sobre o assunto, um com ênfase na Topoflia1, um com
ênfase em agricultura familiar2 e outro na economia.
3
Figura 5: Feira Livre de domingo Centro - Alfenas.
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
1 LIBANIO, TEODORO e CALDERARO, 2012. PERCEPÇÃO E INTERPRETAÇÃO DO ESPAÇO: A FEIRA LIVRE COMO ASPECTO CULTURAL EM
ALFENAS-MG. 2 CODIGNOLOE, R. C, 2011. IMPORTÂNCIA ECONÔMICA DA AGRICULTURA FAMILIAR NO
MUNICÍPIO DE ALFENAS/MG: O CASO DAS FEIRAS LIVRES 3 CARVALHO, F. G. de et. Al, 2010. HÁBITOS DE COMPRA DOS CLIENTES DA FEIRA LIVRE DE ALFENAS-MG.
24
4.4 Passado
Com objetivo de entender a Topofilia relaciona a Feira Livre de Alfenas LIBANIO;
TEODORO; CALDERARO (2012), relataram em sua pesquisa que a feira de domingo
surgiu por volta de 1960, no entorno da rodoviária municipal segundo feirantes e
consumidores mais antigos. Com o passar dos anos o formato territorial da cidade foi se
modificando, fazendo com que a feira seguisse o mesmo caminho, alterando a quantidade de
bancas e uma transformação no processo de valorização com o projeto de tombamento da
feira livre de domingo como patrimônio cultural do município.
Segundo dados da Entrevista com o Senhor Vereador Antônio Carlos da Silva,
conhecido como Dr. Batata também afirma que “Antigamente a feira funcionava ao entorno
da antiga rodoviária, mas após muita polêmica a feira mudou-se para o atual lugar, ao entorno
da Praça Fausto Monteiro (Figura 6)”.
Figura 6: Feira de Domingo: Do passado ao presente
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
Esta mudança não foi muito expressiva por manter a feira dentro dos limites da área
central da cidade.
Essa modificação que veio a ocorrer com a feira é muito comum devido a dinâmica
que as cidades apresentam ao longo dos anos. As cidades crescem e os interesses mudam e
isto reflete na organização espacial das atividades econômicas das cidades.
25
Não obstante é, pois, o conceito de território o elemento central dessa
análise, no sentido de que as práticas socioespaciais verificadas nessa
atividade tendem a projetar sobre o espaço (conforme aqui já especificado o
urbano) relações de poder, definidoras de (re) apropriação territorial
mediante seus sujeitos socioespaciais e suas atividades comerciais.
(SANTOS, 2013:41)
Todas as mudanças que acontecem nas cidades são intencionais e atendem interesses
de alguns agentes, principalmente os que têm mais poder.
Como já referido, existem poucos registros históricos em relação ao nosso objeto de
estudo, porém foram encontradas algumas fotografias da década de 90 no arquivo do Jornal
dos Lagos que poderão nos levar ao passado, mostrando como o território da feira se
organizava na época e como já havia um grande movimento de frequentadores (Figs. 7, 8 e 9).
Figuras 7, 8 e 9: Imagens da feira livre de domingo na década de 90.
8
7
26
Fonte: Arquivo Jornal dos Lagos. Imagens: José Carlos Santana.
Como os dados secundários disponíveis sobre a feira livre de domingo não são
suficientes para o entendimento da mesma buscou fontes primárias de informações para
entender o objeto de Estudo. Abaixo serão discutidas algumas informações relevantes a
respeito do funcionamento da feira de domingo obtidas em depoimento oral com o fiscal
responsável por ela.
4.5. Presente
Atualmente a feira aos domingos possui cerca de 180 feirantes que pagam a
arrecadação semanal, e cerca de 50 feirantes isentos desta taxa, somando-se ao todo 230
feirantes (figuras 10 e 11).
Em outras palavras, a territorialização periódica dos feirantes manifesta a
possibilidade da existência daqueles que fazem uso deste trabalho. Dessa
forma, o território é desvelado como suporte material que permite a
existência e o fortalecimento dos feirantes, no contexto de produção do
espaço urbano. (SANTOS, 2013:48)
9
27
Figuras 10 e 11- Feira livre de Domingo no presente.
Fonte: Elaboração própria. Data: 22/11/2015
A isenção só é permitida para produtores rurais da região de Alfenas. Além desses 230
feirantes, temos as barracas que compõem o setor de roupas, acessórios e eletrônicos. Este
setor possui cerca de 50 a 60 feirantes, sem exceção para isenção na arrecadação, visto que
são produtos industrializados (figuras 12e 13). Segundo o fiscal responsável pela feira, com a
“crise” muitos vendedores de roupas e afins acabam migrando para eventos na região que
acolhem este tipo de comércio, resultando num vazio nos espaços destinados a ele e uma
procura cada vez menor por parte dos consumidores, onde estes acabam sendo apenas
frequentadores e não mais compradores.
Os valores das arrecadações são: R$ 7 por ponto para feirantes da “feira livre” e R$ 13
por ponto no setor de produtos industrializados (roupas, acessórios e eletrônicos). O tamanho
dos pontos também interfere neste valor, enquanto as barracas da “feira livre” têm 2,5 metros
de largura, as barracas de industrializados tem o dobro, 5 metros de largura.
28
Figuras 12 e 13- Barracas de roupas, acessórios e industrializados.
Fonte: Elaboração própria. Data: 22/11/2015.
Em relação às isenções na taxa de arrecadação, o fiscal responsável pela feira, diz que
quem recebe este benefício nas feiras de quarta e domingo são apenas feirantes da região de
Alfenas. Importante salientar que a única feira livre em que todos os feirantes são isentos da
taxa de arrecadação em Alfenas é a feira que acontece aos sábados no bairro Pinheirinho.
Esta isenção foi uma forma no qual a prefeitura municipal encontrou para incentivar os
feirantes a trabalharem nesta feira, visando o crescimento daquela região da cidade.
Em relação ao espaço disponível hoje na feira de domingo, podemos dizer que está
lotado, porém existe o “sistema alternativo” no qual o espaço do feirante que vier a faltar
naquele dia poderá ser usado por outro feirante que ainda não tem um lugar fixo, porém é
importante destacar que o feirante fixo não perde seu território por isso, apenas o “empresta”.
O feirante perderá seu espaço apenas em caso de três faltas consecutivas sem
justificativa (s) ao fiscal responsável. Em casos de faltas justificadas como, por exemplo, por
doenças são aceitas mediante apresentação de documento médico que comprove o tratamento
ou algo do gênero. Caso o feirante venha a perder seu ponto, se quiser retomar suas atividades
na feira, terá de recorrer ao “sistema alternativo” explicado acima.
12 13
29
Existindo no espaço urbano, as feiras livres chamam às autoridades urbanas
a se empenharem em sua organização e vigilância, pois é comum a presença,
muitas vezes, do fiscal da prefeitura, policiais, em meio aos feirantes e
consumidores etc. Com efeito, “seja como for, intermitentes ou contínuos,
esses mercados elementares entre campo e cidade, pelo seu número e
incansável repetição, representam a mais volumosa de todas as trocas
conhecidas” (BRAUDEL, 1996, p. 16), sendo de certa forma, um território
urbano no/do urbano. ( SANTOS, 2013:45)
O período de montagem das barracas hoje, não é fiscalizado com eficiência como já
discutido anteriormente, porém o projeto que tramita na Câmara dos Vereadores é que sua
montagem e funcionamento se deem a partir das 0:01 horas de domingo até as 13 horas do
mesmo dia.
4.6. Futuro
A) Setorização e Padronização
Assim como em diversas relações com o território, na feira livre de domingo existem
alguns conflitos, já que se trata de um ponto comercial que envolve vários comerciantes e
consumidores. O principal conflito no momento se refere ao local das barracas na Feira. O
vereador Batata fez um pedido baseado na reivindicação de alguns feirantes, onde alguns não
respeitavam a área delimitada de cada barraca. Tal reivindicação foi passada para o secretario
de Meio Ambiente da cidade, dado que tal secretaria é responsável pelas questões
burocráticas das feiras livres da cidade.
Abaixo segue uma transcrição do documento que vem fazer tal reivindicação, cedida
pelo próprio vereador autor de tal.
INDICAÇÃO Nº 241/ 2014
A
Secretaria responsável
Ou setor competente.
O vereador atendendo as reclamações, anseios e desejos da população,
dentro de suas funções e com o finco na legislação pertinente, vem
solicitar ao EXECUTIVO que determine a Secretaria Competente que
30
efetue a demarcação com tintas dos ESPAÇOS que são destinadas aos
FEIRANTES, seguindo a metragem a que cada um tem disponível e já
pré estabelecido.
JUSTIFICATIVAS
Reclamam os feirantes que pela falta da visibilidade e da marcação de
seus espaços, existem feirantes que por descuido ou outras intenções
ocupam os espaços alheios, prejudicando assim o titular do espaço.
Alfenas (MG), 09 de junho de 2014.
Antônio Carlos da Silva- Vereador
RESPOSTA da CI- Nº 704/ GAB/ 2014/ indicação 241/2014.
A secretaria de Meio Ambiente, em resposta à C.I supra, cordialmente
vem por meio desta, informar que foi encaminhado ao fiscal
responsável pela feira e o quão breve possível iremos atender sua
indicação de demarcação com tintas dos espaços que são destinados aos
feirantes.
Sem mais, colocamo- nos a inteira disposição para prestar quaisquer
outros esclarecimentos.
Atenciosamente,
John Straus S. Oliveira- Secretário Municipal de Meio Ambiente
Acredita-se que tal indicação motivou a secretaria do Meio Ambiente e a Câmara
Municipal de Alfenas a dar importância a discussão a respeito da setorização e padronização
das feiras livres da cidade.
Diante dessa discussão tão atual, alguns jornais da região e da cidade levantaram
vários questionamentos em relação ao processo de padronização das feiras livres de Alfenas.
O Jornal dos Lagos trouxe uma manchete no mês de agosto de 2015 com a seguinte
afirmação: “ Cada um no seu retângulo”. A reportagem teve como objetivo expor as propostas
do projeto de padronização e setorização das feiras livres da cidade.
No projeto estão sendo discutidos assuntos como montagem e horário de
funcionamento das barracas, onde estas poderão ser montadas a partir da meia- noite do dia
31
anterior a feira e desmontadas até as 13 horas no domingo e até as 12 horas às quartas e
sábados, lembrando que a desmontagem deve ocorrer em no máximo até 30 minutos após o
término destas.
Outro assunto importante que vem sendo discutido é em relação a padronização das
barracas, onde de modo geral o tamanho de cada barraca será de 2,5 metros de comprimento
por 1,5 metros de largura. No caso de barracas de produtos industrializados e artesanatos a
medida será de 5X2 metros.
Sabe-se que a maneira pela qual os diferentes grupos sociais participam da
produção do espaço urbano é distinta. Mas conscientes ou inconscientes os
grupos sociais veem a cidade, cada vez mais como um espaço de
possibilidades. Isto é, os objetos e as ações representativas do cotidiano de
um grupo social manifestam-se mediante um jogo de forças travado entre os
outros representantes da coletividade urbana (SANTOS, 2009a; CORRÊA,
1995). Diante disso, as possibilidades transformam-se e significam a
manifestação de diferentes territorialidades (SAQUET, 2007), diferentes
formas de (co)agir, num mesmo território ( SANTOS, 2013).
De encontro com o processo de padronização temos o processo de setorização, que de
acordo com entrevistas realizadas com feirantes exclusivamente para esta pesquisa estão
muito insatisfeitos com tal discussão.
A setorização será disposta da seguinte forma:
Produtos hortifrutigranjeiros;
Produtos derivados de origem animal ou vegetal;
Produtos industrializados e artesanatos;
Especiarias;
Produtos alimentícios preparados e prontos para consumo, como por exemplo barracas
de pastéis e pamonhas.
Em relação a produtos perecíveis com rápida deterioração como peixes, aves e
laticínios, por exemplo, só poderão ser comercializados mediante prévia inspeção da
vigilância sanitária.
Cada feirante terá que portar crachá de identificação com foto 3X4, além de, ter de
renovar anualmente sua licença de funcionamento da barraca.
32
Um passo de relevante discussão é a concessão de pontos de barracas, onde os
feirantes poderão ter no máximo dois pontos por CPF. O feirante que se apropriar de
documento de outras pessoas para obter mais pontos terá sua concessão anulada. Em caso de
desistência de ponto, o feirante deverá comunicar o fiscal da feira para entregar a licença.
Nesse sentido, o trabalho exercido pelos feirantes expressa amplo sentido.
Além de sua significativa importância econômica, uma vez que é elemento
estruturador das relações de troca que permeiam esses microterritórios, esse
mesmo trabalho pode ser entendido como um ato político, sendo seu
reconhecimento, por parte dos demais atores socioespaciais produtores do
espaço, fortalecedor dos laços entre o feirante e o seu “território de trabalho”
– espaço delimitado nas ruas e avenida da cidade ( SANTOS, 2013:47)
A transferência de ponto também foi um assunto no qual entrou na pauta da discussão,
onde tal poderá ser realizada mediante o óbito, doença ou incapacidade física comprovada.
Em caso de óbito, a transferência só valerá para herdeiros do proprietário num prazo de até 90
dias, já no segundo caso a transferência poderá ser feita mediante requerimento num prazo de
até 90 dias.
A limpeza do local onde acontecem as feiras livres também foi assunto colocado em
pauta, uma vez que cada feirante deverá recolher e ensacar seu próprio lixo, levando os restos
para um local pré- determinado, cabendo a prefeitura recolhê-lo posteriormente para descarte
em local adequado.
Ainda segundo o vereador Batata
Hoje existe um pedido da população para que a feira de domingo seja
realocada, devido a certos transtornos nas ruas que ela é realizada. Muitos
moradores reclamam de problemas como limpeza, poluição sonora e tumulto
em frente as casas na região da praça Fausto Monteiro. ( informação verbal)
Apesar das feiras livres serem históricas e um importante ponto comercial, além de
possibilitar momento de encontros e pertencimento, grande parte delas não são totalmente
aceitas pela população que residem em sua proximidade. O barulho dos feirantes na
madrugada quando montam as barracas, o impedimento de mobilidade na rua e muitas vezes
a impossibilidade de entrar e sair com o carro naquele período, o barulho das pessoas que
consomem na feira e as sujeira ao seu término são pontos destacados em muitos estudos de
caso.
33
O futuro logradouro da feira de domingo esta sendo discutido para que seja realocado
para a Rua Pedro Silveira (Figura 14), área pericentral da cidade, próximo ao córrego
Chafariz. Neste local tem espaço suficiente para banheiros e estacionamento, sendo possível a
construção de uma praça de eventos para fazer outros tipos de feiras como por exemplo a
Mostra Alfenas, evento anual da cidade. A vizinhança aceita essa realocação, desde que os
problemas que existem no lugar atual como descrito acima sejam sanados no futuro.
(informação verbal)
Figura 14: Futura mudança territorial da Feira Livre de Domingo- Alfenas
Fonte: GoogleMaps- Adaptado pela autora.
Mesmo com todas as reclamações a transferência da Feira Livre para outro lugar não é
muito aceita pela população que a frequenta. O vereador Batata ainda completa que
Constata-se que a população alfenense tem certa resistência ao retirar as
atividades de serviços do centro da cidade como, por exemplo, a feira. Em
cidades vizinhas de maior porte como Pouso Alegre, órgãos públicos estão
sendo transferidos para áreas pericentrais e periféricas da cidade, segundo o
vereador entrevistado. Essas realocações servem para amenizar os
transtornos causados nas áreas centrais, valorizando áreas esquecidas com
amplo espaço para este tipo de comércio periódico que são as feiras livres.
(informação verbal)
Este tipo de comportamento da população pode levar as seguintes suposições: a) as
pessoas que frequentam a feira aproveitam este momento para passar em outros locais da área
central;b) a sensação de manter a importância da centralidade da feira como elemento
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cultural e um local central; c) muitas pessoas que frequentam moram próximas a feira e esta
mudança pode dificultar o acesso (lembrando que muitas famílias e idosos frequentam a feira)
A partir do pensamento de que a feira de domingo ocupa um território cheio de
significados para a sua população e assim podemos concluir que ele os pertence, no sentido de
que a identidade sócio- cultural das pessoas estaria inarredavelmente ligada aos atributos do
espaço concreto (natureza, patrimônio arquitetônico, “paisagem”.) (SOUZA, 1995).
O território surge, na tradicional Geografia Política, como o espaço concreto
em si (com seus atributos naturais e socialmente construídos), que é
apropriado, ocupado por um grupo social. A ocupação do território é vista
como algo gerador de raízes e identidade: um grupo não pode mais ser
compreendido sem o seu território. (SOUZA, 1995, p. 84)
E também, ao falarmos de mudanças e permanências, enxergamos o quanto o território
pode ser modificado, dado que,
Territórios existem e são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas
escalas, da mais acanhada (ex. uma rua) à internacional (ex. a área formada
pelo conjunto de territórios dos países- membros da OTAN; territórios são
construídos (e desconstruídos) dentro de escalas temporais as mais
diferentes: séculos, décadas, anos, meses ou dias; territórios podem ter um
caráter permanente , mas também podem ter uma existência periódica,
cíclica (SOUZA, 1995, pág. 81).
De encontro às palavras de (SOUZA, Porto, 2006) irá dialogar que essa afirmação
respalda o interesse e o desejo de entender as feiras enquanto território porque acontecem em
quarteirões ou ruas de fácil acessibilidade, porque existem desde a origem de vilas no século
XIX, que hoje são as cidades-sedes municipais e porque possuem existência periódica, em
outrora a configuração espacial deste lugar pode sofrer modificações ocasionando a
desterritorialização.
Segundo informações obtidas em entrevista com o Vereador Batata e leitura dos
jornais, um assunto que deve receber uma discussão mais ampla é o caso da proibição ou não
da venda de bebidas alcoólicas nas feiras. Há quem seja favorável que se comercialize apenas
cerveja, retirando apenas as bebidas destiladas como por exemplo a cachaça.
Essa questão envolve um fenômeno muito importante no qual estamos tratando nesta
pesquisa, a relação afetiva, de pertencimento no qual o usuário tem para com a feira. Em
entrevista realizada na coleta de informações, muitos alfenenses acreditam que a feira de
domingo é um lugar de encontro, é o dia que saem de casa para ver os amigos e comer um
35
espetinho acompanhado de uma cerveja. Na geografia podemos conceituar o fenômeno do
sentimento de pertencimento a partir do conceito de territorialidade, onde:
A territorialidade, além de incorporar uma dimensão estritamente política,
diz respeito também às relações econômicas e culturais, pois está
“intimamente ligada ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas
próprias se organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar”.
(HAESBAERT, 2005, p. 6776)
O vereador Batata é a favor da venda apenas da cerveja, pois acredita que o consumo
de destilados reúne um maior número de consumidores que causam transtornos no local da
feira. Segundo ele, os maus comportamentos de pessoas que ingerem bebidas destiladas se
tornam caso de polícia e não da prefeitura.
Aqui fica claro a dificuldade que os gestores municipais tem de lidar com a
apropriação da rua pelas pessoas, que usam o momento da feira como lazer e descontração.
Dado esse projeto de setorização e o de padronização podemos questionar os
interesses envolvidos para que tais sejam concluídos, visto que ambos os projetos podem ser
considerados fenômenos da sociedade contemporânea.
Em depoimento oral l com um feirante antigo, afirmou que não concorda com o plano
de setorização, pois em seu caso e de muitos outros feirantes, que produzem de tudo um
pouco, caso as mudanças venham a ocorrer terão de escolher qual produto irá comercializar,
visto que as normas de setorização irão permitir no máximo dois pontos por feirante. No caso
deste feirante, seus produtos abrangem três setores, pois a barraca é muito diversificada,
vendendo de cabaças à verduras e de esponjas vegetais à queijo fresco (Figuras 15 e 16)
O lado positivo da setorização visa a igualdade de espaço para todos os feirantes,
porém o lado negativo, onde muitas vezes é o que prevalece, irá interferir diretamente no
espaço do feirante que já exerce suas atividades comerciais desde o principio da feira em
estudo.
De acordo com as informações obtidas com o fiscal, “o projeto é para decretar uma lei
e os feirantes passarem a respeitá-la” disse ele.
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15 16
Figuras 15 e 16: A diversidade de produtos em uma única barraca- Um dos feirantes mais antigos da
feira de domingo em Alfenas- MG.
Fonte: Elaboração própria. Data: 22/11/2015.
B) Projeto de Tombamento
Dada a relação de pertencimento da população com a Feira Livre de Domingo da
Cidade de Alfenas e o reconhecimento popular da feira como algo tradicional, apesar de ter
uma idade relativamente pequena ( 1960 – 2015 ) existe um movimento de defesa do
Tombamento desta Feira.
De acordo com o IPHAN por meio da constituição de 1988:
os bens culturais de natureza imaterial dizem respeito àquelas práticas e
domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de
fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas, musicais ou
lúdicas; e nos lugares (como mercados, feiras e santuários que abrigam
práticas culturais coletivas)...O Patrimônio Cultural Imaterial é transmitido
de geração a geração, constantemente recriado pelas comunidades e grupos
em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua
história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo
para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.
O processo de Tombamento de uma feira depende exclusivamente da gestão
municipal, principalmente dos vereadores, não existe critérios como a idade, tamanho ou
característica especifica.
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A prefeitura de Alfenas no ano de 2010 criou um projeto de lei no qual “Promove o
Tombamento como Patrimônio Histórico e Cultual das Feiras Livres de Alfenas, bem como
concede isenção de taxas de licença municipal aos feirantes das feiras livres realizadas às
quartas- feiras e aos domingos nos logradouros públicos e dá outras providências”.
O documento em questão discute a importância de se preservar os valores culturais
que as feiras da cidade de Alfenas representam para a região do sul de Minas, bem como para
seus moradores, visando a preservação e o incentivo aos pequenos produtores.
Através do tombamento é concedido ao bem cultural um atributo para que
nele se garanta a continuidade da memória. É o ato de reconhecer o valor
cultural de um bem, que o transforma em patrimônio oficial. Nesse vértice,
há de se ressaltar que as aludidas feiras são elementos integrantes dos
costumes dos cidadãos alfenenses, pois há décadas se encontram em plena
atividade nestes logradouros o que, por si só, já é causa suficiente para que
passem a integrar o patrimônio histórico e cultural desta municipalidade.
Portanto, ao longo de todos esses anos mais e mais pessoas passaram a
frequentá-las, de modo que, além de disponibilizarem produtos alimentícios
cultivados na nossa região, as feiras também são tidas como espaços
saudáveis que proporcionam descontração aos seus frequentadores.
(Mensagem Nº 59, de 05 de setembro de 2010; Prefeitura Municipal de
Alfenas).
Seguindo a mesma linha de raciocínio, também foi criado um projeto de lei no mesmo
ano em nome do povo alfenense, dos representantes da Câmara Municipal e do antigo prefeito
Luiz Antonio da Silva, onde em seu Art 1º :
ficou autorizado a promoção do Tombamento como Patrimônio Histórico e
Cultural do Município de Alfenas as feiras livres realizadas aos domingos
nos logradouros públicos localizados no entorno da Praça Fausto Monteiro,
bem como às quartas- feiras no, entorno da Praça Rachid B. Saliba (Projeto
de lei nº 55 de 05 de setembro de 2010.
Em relação à isenção nas taxas de licença municipal, tem o objetivo de:
incentivar os agricultores a incrementarem suas lavouras, tendo em vista que
sabidamente possuem pequenas lavouras que, na maioria das vezes, são
fonte de sustento. Assim sendo, ao desobriga-los do pagamento das aludidas
taxas municipais. O dinheiro que seria utilizado para o pagamento desse
tributo poderá ser mais bem aproveitado no aumento de suas produções e até
mesmo na diversificação de seus cultivos.
Neste trecho fica claro a preocupação dos agentes do governo municipal com a área
rural e a atividade agrícola da cidade, fortalecendo suas relações com ela.
38
Passados seis anos, pouco ou quase nada ouvem- se falar a respeito do projeto de
tombamento da feira livre de domingo da cidade de Alfenas.
O capitulo seguinte irá dialogar com dados obtidos em campo, relacionando-os com as
pesquisas já existentes acerca da feira livre de domingo da cidade de Alfenas. Tais diálogos
irão fortalecer nossas afirmações em relação à importância que este comércio periódico traz
para a cidade, seus consumidores e apreciadores.
39
5. A FEIRA NA ÓPTICA DE SEUS AGENTES: A PERCEPÇÃO DOS
FEIRANTES E FREQUENTADORES SOBRE A FEIRA DE
DOMINGO.
5.1 O perfil dos feirantes
Dos 14 (quatorze) feirantes entrevistados, 72% são homens e 28% são mulheres
(gráfico 1).
Gráficos 1 e 2 - Sexo e faixa etária dos feirantes da feira de domingo da cidade de Alfenas
Fonte: Elaboração própria
Dessa amostra de 14 feirantes, 1 tem 81 anos ou mais; 4 tem entre 61-70 anos; 3 entre
51-60; 3 entre 41- 50 anos; 1 entre 31-40 anos e 2 entre 20- 30 anos (gráfico 2). A partir
desses dados quantitativos em relação a idade e sexo podemos concluir que entre os feirantes,
a maioria são homens e já estão na terceira idade. Este resultado mostra que independente da
idade , feirantes resistem em exercer suas atividades comerciais, fato este que garante a
preservação do clima e da tradição da feira livre de domingo.
Gráficos 3 e 4- Tempo de trabalho na feira em anos e tradição familiar trabalhar nela
40
Fonte: Elaboração própria
Também foi constatado que dos 55 anos de existência da feira de domingo, entre os 14
feirantes entrevistados apenas 1 tem mais de 40 anos de trabalho; 3 entre 15- 20 anos; 4 entre
15- 20 anos; 3 com mais de 5 anos; 2 com mais de 2 anos e 1 com menos de 1 ano. Apesar de
descoberto que existe apenas 1 feirante com mais de 40 anos de trabalho podemos perceber
que 71% dos entrevstados afirmam ser tradição familiar trabalhar na feira de domingo, fato
que mais uma vez comprova o sentimento de pertencimento.
Gráficos 5 e 6 - Cidade de origem dos feirantes X bairros de residência dos feirantes de Alfenas.
Fonte: Elaboração própria
Dos 14 feirantes, 64% são de Alfenas. Os 36% restantes são das cidades vizinhas de
Machado (1), Fama (1), São João da Mata (1), Muzambinho (1) e Guaxupé (1). Dos 9
residentes da cidade de Alfenas, 2 moram na zona rural ( Sítio São José e Bárbaros); e o
restante na zona urbana, sendo 1 no Centro; 2 no Jd. Alvorada; 1 na Aparecida; 1 no Pôr do
Sol e 1 no Jd. Panorama. Como 64% dos feirantes são da cidade de Alfenas, comprova-se que
isso se dá por conta da isenção na taxa de arrecadação que seus beneficiários recebem por
residirem nela, fator que pode servir de incentivo a comercializar na feira em estudo,
reforçando a ideia de ruralidade na cidade de Alfenas.
Gráficos 7 e 8- Produtos comercializados pelos feirantes X Origem dos produtos
41
Fonte: Elaboração própria
Em relação aos produtos comercializados, os que ganham mais destaque são as
verduras e legumes com 6 barracas, frutas e alimentação (prontos) com 3 barracas cada,
artesanatos, laticínios e vestuário com uma barraca cada segmento. Constatou-se que 10 dos
feirantes tem produção própria, 3 recebem mercadoria de fornecedores e 1 adquire de grandes
centros comercias.
Segundo CODIGNOLE, (2011), o município de Alfenas possui, um total de 1350
produtores rurais, sendo destes 960 pertencentes a agricultura familiar, ou seja, são produções
que vêm de indivíduos que mantêm entre si laços afetivos, seja de sangue ou casamento.
Podemos perceber que 71% dos produtores entrevistados ainda possuem produção própria,
assim podemos afirmar que a tradição em fazer feira se dá por completa uma vez que o
feirante tem o contato maior com o produto, desde o plantio até a sua comercialização.
Gráficos 9 e 10- Motivos que comercializam na feira X Renda dependente da feira
Fonte: Elaboração própria
Ao questionar a respeito dos motivos que os levam a comercializar na feira, 9 dizem
que comercializam apenas pelo lado financeiro e 5 pelo clima dela. De acordo com as
necessidades de cada feirante, 6 dizem que a renda mensal depende exclusivamente da feira e
8 dizem que exercem outras profissões para complementá-la. Podemos fazer uma comparação
entre os dados dos gráficos 9 e 10, onde os que dizem que exercem outras profissões é
maioria assim como os que dizem que comercializam na feira apenas pelo lado financeiro
também, ou seja, quem depende exclusivamente da agricultura possui um sentimento maior
com o clima da feira de domingo, visto que o restante possui outras responsabilidades que os
fazem dividir seu tempo em duas ou mais atividades, fato que os fazem não sentir a mesma
42
coisa como quem depende exclusivamente deste comércio periódico, fazendo-os
comercializar apenas pelo lado financeiro. Dos feirantes que dependem exclusivamente da
feira como fonte de renda, 4 tem produção própria e 2 recebem a mercadoria de fornecedores.
Já os que não dependem da feira exclusivamente como fonte de renda, apenas 2 recebem
mercadoria de fornecedores e de grandes centros e 8 possuem produção própria, dado que o
único feirante entrevistado que comercializa no setor de roupas exerce outra profissão nos
outros dias da semana.
Gráfico 11- Outras fontes de renda
Fonte: Elaboração própria
Dos 8 feirantes que possuem outra profissão além dessa, 2 possuem lavoura de café, 2
são locadores de casas, 1 artesão, 1 servidor público, 1 agente penitenciário, 1 agricultor, 1
aposentado e 1 cabelereiro. A partir desses dados podemos concluir que para a maioria dos
feirantes é necessário complementar a renda exercendo outra função, tendo em vista que o
comércio periódico é suscetível a alta e baixa dos preços com frequência, o que compromete a
renda final mensal para mais ou para menos.
Gráficos 12 e 13- Frequência de trabalho nas feiras de Alfenas e região
43
Fonte: Elaboração própria
Contabilizamos 11 feirantes que trabalham apenas na feira de domingo, 2 às quartas e
domingo e 1 na feira de Guaxupé e domingo.
Se faz necessário registrar que grande parte dos feirantes da feira de quarta trabalham
na de domingo (barraca da pamonha, queijos, frutas, ovos, peixes, salgados e alguns legumes
e verduras), mas como a coleta de dados foi amostral por setor esta informação não foi
constatado. O que reforça a necessidade de aplicação de questionários e observação de campo.
Gráficos 14 e 15- Importância de preservação e gosto por trabalhar na feira
Fonte: Elaboração própria
Ao fim, uma das hipóteses mais importantes foi constatada, onde 100% dos feirantes
acham importante que a feira de domingo seja preservada tal como ela é. Independente do
tempo que os feirantes entrevistados trabalham na feira, podemos afirmar também que 100%
deles gostam de trabalhar nela, fato este que comprova o sentimento de pertencimento pelo
território da feira de domingo.
5.2 Perfil dos consumidores
Os dados e gráficos abaixo estão relacionados aos questionários realizados com 52
consumidores da feira livre de domingo.
44
Gráficos 16, 17 e 18- Faixa etária X sexo X escolaridade dos consumidores da feira de domingo.
Fonte: Elaboração própria
Dos consumidores entrevistados 52% eram mulheres e 48% eram homens. Dessa
amostra, 10 consumidores tem entre 18- 25 anos, 9 entre 26-32 anos, 10 entre 33- 40 anos, 4
entre 41- 48 anos, 8 entre 49- 55 anos, 4 entre 56-63 anos, 5 entre 64- 71 anos, 1 entre 72- 79
anos e 1 com mais de 80 anos. Quanto ao nível de escolaridade, 9 possuem fundamental
incompleto, 8 com fundamental completo, 18 com ensino médio completo, 1 com superior
incompleto e 6 com superior completo. A partir destes dados podemos notar a diversidade do
público que a feira livre atrai aos domingos, comprovando a presença de jovens estudantes
(por conta da faixa etária e escolaridade) que contribuem fortemente para a economia da
cidade, a presença de adultos que junto de seus filhos fazem a feira para abastecer suas
dispensas para a semana e senhoras e senhores que além de comprar vão à feira para prosear,
encontrar amigos e passear.
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Gráficos 19, 20 e 21- Bairros onde os consumidores residem X frequência nas feiras de Alfenas.
Fonte: Elaboração própria
De acordo com os dados, concluímos que 30% dos entrevistados residem no centro da
cidade, 20% nos bairros pericentrais (Vl. Betânia, Aparecida e Jd. São Carlos) e 30% residem
nos bairros periféricos ( Vl. Teixeira, Res. Oliveira, Recreio, Pôr do Sol, Jd. América,
Pinheirinho, Santa Clara, Morada do Sol, Nova América, Vl. Formosa, Jd. Elite, Jd.
Primavera, Novo Horizonte e St. Maria). Em relação à frequência na feira de domingo, 60%
dizem ir 4 vezes por mês (todos os domingos), 1% três vezes por mês, 32% duas vezes por
mês e 5% apenas uma vez por mês. Já nas outras feiras que ocorrem durante a semana, 46%
frequentam apenas a feira de domingo, além dessa, 42% também frequentam a feira as quartas
e 12% aos sábados.
Ao analisarmos os bairros onde os consumidores mais residem, cerca de 50% reside
no centro e na área pericentral, fator que facilita o deslocamento até a feira e possibilita que o
consumidor carregue suas compras com mais facilidade, tendo em vista que se encontra
próximo de sua casa. O restante reside em bairros periféricos com uma distância entre 2 e 3,5
Km de distância da residência até a feira, tendo então que depender de transporte público,
46
onde este aos domingos trabalha com horários menos flexíveis e gera um gasto a mais ao
consumidor por ter de pagar a condução de ida e volta para no mínimo uma pessoa,
dependendo do tamanho da compra. Por isso, a implantação da feira aos sábados no bairro
Pinheirinho foi de extrema importância para seus moradores e da região, poupando-os de ter
de se descolar e gastar com tal deslocamento que pode ser convertido em um dinheiro a mais
para comprar mais produtos na feira local. Julgamos importante que a prefeitura da cidade
abra os olhos para a implantação de mais feiras nos bairros mais distantes do centro, tendo em
vista que a cidade passa por uma expansão territorial cada dia maior. Uma observação muito
importante é que a pesquisa não abrangeu nenhum consumidor dos bairros de classe sociais
mais elevadas, como Jardim Aeroporto e Jardim das Colinas. Talvez este público se interesse
por consumir nas “feiras” dentro de supermercados e sacolões. Como já discutido, esses
espaços frutos da sociedade contemporânea são equipados com equipamentos que dão
sensações de conforto e segurança (ar condicionado, banheiros, atendimento personalizado),
diferente da sensação de liberdade e descontração da feira livre.
Gráficos 22 e 23- Produtos mais procurados X vantagens em ter o sacolão próximo à feira de
domingo.
Fonte: Elaboração própria
Em relação aos produtos mais procurados na feira pelos entrevistados, 100%
consomem legumes e verduras, 92% frutas, 3% laticínios e 3% vestuário e artesanatos cada
segmento. Foi questionado também se os consumidores enxergavam alguma vantagem em ter
o sacolão em funcionamento no mesmo dia de feira e podemos afirmar que 71% não
enxergam vantagem alguma, 17% acham que os produtos são mais em conta ( pode haver
certa competição), 7% por que passa cartões e 1% acreditam que é mais uma opção e os
produtos são mais frescos. Tais gráficos foram colocados em comparação a fim de mostrar os
47
hábitos de compra dos consumidores da feira de domingo. Podemos notar que a maioria dos
fregueses que optam por comprar na feira, não enxergam vantagens em ter o sacolão próximo
ao entorno da feira. Porém é visto que uma parcela acredita que os produtos do sacolão são
mais em conta. Esta visão pode ser realmente verdadeira, pois em depoimentos de
consumidores, ouviu-se dizer que os dias de feira livre o sacolão coloca “os preços lá
embaixo” justamente para gerar uma competição entre ambos os comércios. Outros fatores
que talvez possam chamar os consumidores até o sacolão são: o fato de passar cartões, tendo
em vista que muitas pessoas não andam com dinheiro “vivo” com tanta frequência por
motivos de praticidade e muitas mercadorias que você precisa são encontradas lá, como por
exemplo, produtos de supermercado, açougue, laticínios, verduras, frutas e legumes, o que
acaba trazendo certo conforto e comodidade ao cliente que prefere fazer compras em
estabelecimentos fechados e mais modernos.
Gráficos 24 e 25- Motivos de frequentar a feira X tombamento
Fonte: Elaboração própria.
Gráfico 26- Relação consumidor X feira
Fonte: (Libanio, Teodoro e Calderaro, 2012).
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Em relação aos motivos que levam os entrevistados a frequentarem a feira aos
domingos podemos afirmar que 53% vão à feira para comprar e passear, 46% vão apenas
comprar e 1% vão para encontrar amigos e parentes.
Ao chegar à feira de domingo podemos observar que a maioria das pessoas está
acompanhada de suas famílias, amigos ou parentes, dificilmente estão sozinhas. Este
fenômeno pode ser resultado da percepção que os frequentadores dela têm com o lugar,
formando uma rede de relações afetivas, não só com o espaço, mas com todos os atores
envolvidos no processo de realização deste “evento”. Além das compras, a feira é um lugar
com uma dinâmica diferenciada, que possibilita a prática do lazer em diversos segmentos. Há
quem à frequenta apenas para comer o pastel com caldo de cana, para prosear, encontrar os
amigos na barraca de churrasquinho acompanhado de uma cerveja, comer aquela pamonha
artesanal feita na hora, comprar roupas, flores ou aquele artesanato para presentear alguém.
Acabam que as compras tornam-se apenas um coadjuvante dentro de um ator principal que
vem a ser a feira, fazendo dela um território de lazer, pertencimento e resistência frente à
modernidade. Independente de que 46% dos consumidores vão apenas para passear,
constatou-se que 100% é a favor de que a feira de domingo seja tombada como patrimônio
histórico da cidade, sendo assim, confirmamos que seus frequentadores identificam- se com o
conceito de topofilia,
que está ligado a atribuição de um valor cultural a um elemento da paisagem,
que no caso da nossa pesquisa refere-se identificação da população com a
feria de domingo que ocorre tradicionalmente no município de Alfenas,
sendo assim, este conceito expressar um significado denso, que é justamente
a relação entre a paisagem, memória e cultura (LIBANEO, TEODORO E
CALDERARO, 2012).
No gráfico 26, podemos comparar e notar que em ambas as pesquisas, foram
constatados o sentimento de pertencimento dos consumidores com a feira de domingo,
enquanto em uma constatou-se que eles gostam e sentem-se a vontade para comprar e passear,
na outra constatou-se que atribuem um valor cultural em relação ao objeto de estudo.
Tendo em vista que a minoria identifica-se com o conceito de topofobia, é perceptível
que a relação comercial e a possibilidade de encontro andam juntas.
no qual também pode ser observado na feira alfenense, embora de forma
bastante reduzida, que demonstra uma insatisfação e uma não apreciação por
49
uma pequena parcela da população em relação à feira, devido ao tumulto, a
poluição visual e sonora causada pela feira (LIBANEO, TEODORO E
CALDERARO, 2012).
O sentimento de aversão dos consumidores está relacionado com os problemas que
foram identificados em entrevista com o vereador Batata no capítulo II deste trabalho como a
poluição sonora e visual e tumulto e falta de limpeza em frente as casas localizadas no
entorno das barracas. Esses fatores podem comprometer o futuro da feira livre de domingo na
cidade de Alfenas, podendo haver mudanças em sua dinâmica territorial e cultural. Portanto
acredita-se que a ela é sinônimo de resistência na cidade, pois permeia em pleno século XXI
com muitas características tradicionais de uma feira livre do interior (figuras 17 e 18).
Figuras 17 e 18- A permanência de tradições até os dias atuais- Burros ainda são um meio de
transporte para muitos feirantes e a produção artesanal de pamonhas.
Fonte: Elaboração própria. Data: 22/11/2015.
Assim que a feira se dá por acabada por volta das 12h30min, barracas já encontram-se
desmontadas e o que sobra da mercadoria ou estão dentro das caixas ou jogadas nas calçadas
para descarte ou como o “ resto da feira” para as pessoas que não tem condições de comprar
durante seu funcionamento. Após a limpeza e término dela, a cidade entra no típico clima de
domingo, ela adormece à espera da segunda feira, e aquele território ocupado pela feira aos
domingos, volta a ser o território da rotina diária da cidade de Alfenas.
50
6. Considerações Finais
Ao final de muitas reflexões, podemos concluir que o comércio periódico passou por
diversas fases na história, passando a princípio pelo que chamamos de “escambo” ou troca,
onde era conhecido como um dia de festa e celebração, passando pela Idade Média para
controlar a produção de excedentes e chegando até os dias atuais, resistindo aos processos da
modernidade.
Essa pesquisa permitiu que conhecêssemos e entendêssemos todo o contexto histórico
e territorial da feira livre de domingo da cidade de Alfenas, além de compreender os
diferentes papéis das feiras de quarta e sábado.
Compreendemos que a feira de domingo é considerada um lugar de turismo, lazer,
encontro e comércio, tendo em vista que atrai uma diversidade de faixas etárias e públicos. E
por isso reforçamos durante o trabalho inteiro que ela é um território de pertencimento, onde
seus feirantes, fregueses e apreciadores sentem-se acolhidos por ela. Este sentimento se dá,
por ela ser um lugar de resistência e tradição diante da dinâmica do comércio varejista. Ela
ainda permeia- se até os dias atuais por sua simplicidade, suas características artesanais e
trabalho familiar na agricultura, o que garantem sua resistência.
O projeto de padronização e setorização da feira livre de domingo pode ser
considerada tanto um avanço quanto um retrocesso, tendo em vista que quando aprovado, irá
avançar no sentido igualar o espaço das barracas para todos os feirantes, a atuação da
vigilância sanitária se dará com mais comprometimento devido ao grande número de barracas
que comercializam produtos perecíveis dentre outros. Em contrapartida as chances de a feira
vir a perder sua identidade é muito grandes, pois quem vai até ela para passear, encontrar os
amigos na barraca do churrasquinho e da cerveja poderão perder este espaço de encontro, pois
no projeto estão previstos que a venda de bebidas alcoólicas sejam proibidas. A padronização
e setorização das barracas também é um assunto polêmico, pois se decidir-se que a frente
delas sejam iguais e que ela por completa seja disposta em setores separados, a feira perderá
seu “brio” e sua identidade própria.
Talvez a única forma que enxergamos para que a tradição desta feira não se corrompa
seja a aprovação de seu projeto de tombamento como patrimônio histórico da cidade de
51
Alfenas. Mas até que isso seja uma prioridade diante das autoridades, muitos interesses são
colocados à frente, principalmente quando se trata de um exercício de poder sob o território.
Por isso, independente dos frutos que a modernidade cria, é importante que os
conceitos da territorialidade, da percepção e do pertencimento estejam presentes na vida das
pessoas que a feira frequenta, pois a tendência do sistema é fazer desse comércio periódico
um movimento cada dia mais raro, substituindo-o pelos grandes empreendimentos varejistas e
atacadistas presentes na sociedade contemporânea, que visam apenas o lucro, deixando de
lado a valorização dos sentimentos e emoções dos atores que até os dias atuais persistem e
resistem pela permanência das feiras livres nas ruas e espaços públicos pelo Brasil e pelo
mundo.
52
7. REFERÊNCIAS
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setembro de 2010. 2 p.
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aula. São Paulo: Editora Sarandi, 2011. 528 p., il. (Coleção Praticando).
56
APÊNDICES
A. Questionário Feirante
Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino
1) Cidade
2) Idade?
3) Bairro
4) Grau de escolaridade
( ) Fundamental incompleto ( ) Fundamental Completo
( ) Médio Incompleto ( ) Médio Completo ( ) Técnico
( ) Superior Incompleto ( ) Superior Completo
5) È uma tradição familiar trabalhar na feira?
Sim ( ) Não( )
6) Há quanto tempo trabalha na feira?
( ) Menos de 1 ano ( ) Mais de 2 anos ( ) Mais de 5 anos
( ) Entre 15 e 20 anos ( ) Entre 25 e 40 anos ( ) Mais de 40 anos
7) O que comercializa?
A) Verduras/ legumes ( )
B) Frutas ( )
C) Artesanatos ( )
D) Laticínios ( )
E) Alimentação ( )
F) Vestuário ( )
G) Animais ( )
H) Outros ( ) O que?________________________
8) Só comercializa na feira apenas pelo lado financeiro?
Sim____
Não____
9) Se NÃO, por que?
a) Encontrar amigos
b) Encontrar parentes
c) Gosta do clima da feira
10) Gosta de trabalhar na feira?
SIM_____
NÃO_____
11) Sua renda mensal depende exclusivamente do seu trabalho na feira?
SIM_____
NÃO______
12) Se NÃO, qual a outra função que exerce?
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13) Trabalha apenas na feira de Domingo?
SIM______
NÃO______
14) Possui barraca em outra cidade?
SIM_____
NÃO______
15) Se SIM, em qual cidade?
16) De onde vêm os produtos que você comercializa?
a) Produção própria ( ) b) Fornecedores ( ) c) Grandes supermercados ( )
d) Grandes centros comerciais ( )
17) Você como feirante, acha importante que se preserve a feira livre de Alfenas tal
como ela é?
SIM________
NÃO________
18) A presença do sacolão e do Mercado municipal atrapalham ou ajudam o
funcionamento da feira
B. Questionário Consumidor
Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino
Idade:
Escolaridade:
( ) Fundamental incompleto ( ) Fundamental Completo
( ) Médio Incompleto ( ) Médio Completo ( ) Técnico
( ) Superior Incompleto ( ) Superior Completo
1) Cidade- Bairro
2) Com qual frequência vem à feira?
UMA vez por mês ( ) DUAS vezes por mês ( ) TRES vezes por mês ( )
TODOS os domingos ( )
3) Qual o principal motivo que o leva frequentar a feira? ( ) APENAS para comprar APENAS passear
( ) Comprar e passear ( ) ENCONTRAR amigos e parentes
4) Quais produtos você busca comprar/ consumir na feira?
a) Verduras/ legumes ( )
b) Frutas ( )
c) Artesanatos ( )
d) Laticínios ( )
e) Alimentação ( )
f) Vestuário ( )
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g) Animais ( )
h) Outros ( ) O que?________________________
5) Quais as vantagens que você enxerga ao ter o sacolão em funcionamento no
horário da feira de domingo?
a) O sacolão tem mais diversidade de produtos que a feira.
b) Aceitam cartões de crédito
c) Produtos mais frescos
d) Produtos mais baratos
6) Você frequenta outras feiras durante a semana na cidade? Se sim qual?
( ) Sim. Qual?__________________________
( ) Não
7) Você acha importante que a feira livre de domingo seja tombada como
Patrimônio Histórico da cidade?
Sim ( )
Não ( )