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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” LUANA SOUZA XAVIER A FOTOGRAFIA NA IMPRENSA BRASILEIRA O fotojornalismo da revista Realidade Rio de Janeiro 2009

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

LUANA SOUZA XAVIER

A FOTOGRAFIA NA IMPRENSA BRASILEIRA

O fotojornalismo da revista Realidade

Rio de Janeiro 2009

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LUANA SOUZA XAVIER

A FOTOGRAFIA NA IMPRENSA BRASILEIRA O fotojornalismo da revista “Realidade”

Monografia apresentada à

Universidade Candido Mendes para

a conclusão do curso de Pós-

Graduação em Comunicação

Empresarial.

Rio de Janeiro 2009

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pois sem Ele nada disso

seria possível. Agradeço aos meus

Professores pela atenção e incentivo que me

deram; à minha família e aos amigos que fiz

durante o curso, pelo apoio e

companheirismo.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos aqueles que,

como eu, gostam de fotografia e da rica

história da imprensa ilustrada no Brasil.

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RESUMO

O presente trabalho trata sobre o fotojornalismo e sua importância na imprensa

dos anos 1950-60. Faz um retrospecto sobre o surgimento da fotografia e como

ela passou a ser usada para transmitir informações. O estudo aborda

historicamente o surgimento dos principais veículos de comunicação impressos

dos séculos XIX e XX; e tem seu foco na revista ilustrada Realidade, que foi um

marco na história das fotorreportagens. O projeto apresenta uma análise sobre

duas edições da revista: a primeira à época de seu surgimento 1967; e a

segunda quando a revista estava sob a forte censura da Ditadura Militar.

Focando-se no estudo das fotografias contidas nessas edições.

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METODOLOGIA

O presente estudo baseia-se na análise do objeto de pesquisa: As

reportagens fotográficas da revista Realidade.

Embasado por pesquisas bibliográficas de autores que retrataram em

seus livros a história da fotografia e da imprensa brasileira, contadas também

no contexto deste estudo acadêmico.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 8 CAPÍTULO 1 – RETROSPECTO SOBRE A FOTOGRAFIA E SEU USO NA IMPRENSA ............................................................................................................... 10 1.1. O nascimento da fotografia ............................................................................... 10

1.2. O fotojornalismo ............................................................................................... 13

1.3. A imprensa brasileira do século XIX ................................................................. 18

CAPÍTULO 2 – A FOTOGRAFIA DO SÉCULO XX ................................................. 24 2.1. Alguns veículos da imprensa brasileira do século XX ...................................... 24

2.2. Fotojornalismo entre as décadas de 1920 a 1950 ............................................. 29

2.3. Anos 60: O auge do fotojornalismo nacional ..................................................... 31

CAPÍTULO 3 – REVISTA REALIDADE .................................................................... 34 3.1. Breve histórico da Editora Abril ......................................................................... 34

3.2. Surge a revista Realidade ................................................................................. 35

3.3. Análise da reportagem fotográfica ..................................................................... 37

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 45

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 47

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INTRODUÇÃO

A fotografia surge na imprensa como uma nova forma de noticiar. Aos

poucos, com o avançar da tecnologia, vai ganhando espaço nos veículos

impressos; começando timidamente, com poucas imagens em notícias e

anúncios. Mas adquire força e notoriedade com o passar dos anos, ocupando

cada vez mais o interior dos jornais, as primeiras páginas e chegando ao

apogeu, sendo o carro-chefe das revistas ilustradas.

Os impressos passaram a vender mais e aumentar suas tiragens, pois a

fotografia popularizou a notícia, permitindo que, mesmo aqueles que não

tinham acesso à leitura, pudessem tomar conhecimento dos acontecimentos

através do registro de suas imagens. As fotos mostravam a sociedade para a

sociedade, fatos ocorridos distante da realidade de uma determinada região,

tornavam-se familiar, algo próximo àquela população.

Imagens que, por vezes, chocavam eram publicadas para que todos

pudessem ver como era realmente o dia-a-dia de uma guerra, por exemplo.

Como afirma Jorge Pedro Sousa, em Uma História Crítica do Fotojornalismo

Ocidental:

Depois da fotografia, a guerra nunca mais seria a mesma. Com o medium emergente, o observador era projetado num mundo mais próximo, mais real, mas por vezes mais cruel. No mundo da imprensa, com as fotos, o conhecimento, o julgamento e a apreciação deixaram de ser monopolizados pela escrita. (SOUSA, 1998 – grifo do autor)

Com a importância e o destaque que vão sendo agregados à fotografia,

o mercado editorial começa a se movimentar. São criados inúmeros periódicos,

revistas ilustradas e publicações especializadas. Entre esses meios de

comunicação, nasce a revista Realidade.

Esse trabalho propõe analisar a revista Realidade, mais especificamente

a seção Ensaio, que era um espaço destinado à publicação de

fotorreportagens. A publicação viveu por dez anos, de 1966 a 1976,

enfrentando muitos problemas à época da Ditadura militar. Mas acabou sendo

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engolida pelo mercado, com jornais e revistas mais ágeis e diretos, e a

chegada da televisão.

O projeto aborda também a história de alguns dos principais veículos

que antecederam Realidade; fala sobre o invento da fotografia e sua chega ao

Brasil, como as imagens começaram a ser utilizadas na imprensa e conta a

trajetória de importantes veículos de comunicação dos séculos XIX e XX.

Além de fazer um breve relato sobre o surgimento da Editora Abril – e a

vida de seu fundador Victor Civita - criadora da revista; e contar alguns

episódios que marcaram a história da publicação.

A partir da história da revista, percebe-se que ela trás muitas inovações

para o jornalismo, como o método do New Journalism. Novidade no mercado,

chegou a ser uma das revistas mais vendidas do país.

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CAPÍTULO 1

RETROSPECTO SOBRE A FOTOGRAFIA E SEU USO NA IMPRENSA

O homem sempre buscou uma forma de parar o tempo, guardar um

pedaço da realidade para si. Ao descobrir o processo fotográfico, esse anseio

foi realizado; porque as “fotos são um meio de aprisionar a realidade, entendida

como recalcitrante, inacessível; de fazê-la parar. (...). Não se pode possuir a

realidade, mas pode-se possuir imagens” (SONTAG, 2004, p. 180). Momentos

transformados em fotografias guardam informações, sentimentos e histórias.

1.1. O nascimento da fotografia

A câmara escura foi um dos primeiros objetos de que se tem notícia

usado para capturar imagens. Através de um orifício feito em um lado de uma

caixa escura, a luz de um objeto que passa através dessa abertura, forma uma

imagem invertida do objeto. De acordo com o texto “Breve história da

fotografia”, disponível no site Mnemocine – Memória e imagem, Filipe Salles diz

que existem registros de imagens feitas com a câmara escura “desde a

Renascença, e suas referências indicam desde a Grécia Antiga, mas ainda há

referências deste conhecimento entre os chineses, árabes, assírios e

babilônios”. (SALLES, http://www.mnemocine.com.br/fotografia/histfoto2.htm)

A partir de então muitos pesquisadores, em diferentes partes do mundo,

se dedicaram a aprimorar a forma de capturar imagens. Em 1827, na França,

Nicéphore Nièpce desenvolveu a ‘Heliografia’, que era a cópia de imagens em

metal sobre o vidro. O resultado de seu trabalho foi registrado, historicamente,

como a primeira fotografia realizada; “mas o próprio Nièpce não considera esta

uma experiência bem-sucedida, porque a imagem original é um borrão,

impossível de ser copiada”. (SALLES, id.)

Hercules Florence foi um desenhista francês que viveu no Brasil a maior

parte de sua vida. Em 1833 “desenvolveu um processo rudimentar de fixação

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de imagens em papel sensível” (SALLES, id.). É atribuído a ele o emprego do

nome ‘fotografia’, pois o principal agente para realizar a impressão de imagens

em papel era a luz. “Utilizando esse processo, Florence teria impresso, em

1833, rótulos de farmácia e um diploma maçônico”. (MONTEIRO, 2004, p. 12)

Na Inglaterra, em 1835,William Henry Fox Talbot criou a ‘Calotipia’ – ou

‘Talbotipia’- processo de obtenção de imagens em papel sensível (mergulhado

em cloreto de prata); ao ser exposto a luz, formava uma imagem negativa que

era fixada nessa matriz de papel fotográfico com sal de cozinha. Com esse

processo foi possível produzir inúmeras cópias a partir da imagem original, mas

estas não apresentavam boa qualidade quanto maior fosse o número de

cópias.

"The pencil of Nature", o primeiro livro do mundo ilustrado com fotografia, foi publicado por Talbot em 1844. O livro foi editado em seis grandes volumes com um total de 24 talbotipos originais, e continha a explicação detalhada de seus trabalhos, estabelecendo certos padrões de qualidade para a imagem. (OKA, Cristina. Origens do processo fotográfico. Disponível em: <http://www.cotianet.com.br/photo/hist/fox.htm>. Acessado em 29 Mai. 2009).

Em 1839, na França, Hypolite Bayard e Louis Jacques Mandé Daguèrre

apresentaram outras duas formas de fixação e impressão de imagens; ‘o

processo positivo de impressão em papel’ e a ‘Daguerreotipia’,

respectivamente.

A nitidez das fisionomias assustava, e tinha-se a impressão de que os pequenos rostos humanos que apareciam na imagem eram capazes de ver-nos, tão surpreendente era para todos a nitidez insólita dos primeiros daguerreótipos. (BARBOSA, Gabriel Collares. Fotografia digital e manipulação. A contribuição de Walter Benjamin para a era da reprodutibilidade de verossimilhanças. Disponível em: http://www.redealcar.jornalismo.ufsc.br/cd4/midiologia/GabrielCollaresBarbosa.doc. Acessado em 27 Mai. 2009)

O processo de Daguèrre foi o mais utilizado para gravar imagens, ele se

disseminou por todo o mundo, a partir de 19 de agosto de 1839 quando o

‘Daguerreótipo’ foi apresentado à Academia de Ciências da França. Chegando

ao Brasil no ano de 1840 através do Abade Louis Compte, capelão de um

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navio-escola francês que aportou no Rio de Janeiro em 16 de janeiro. A

primeira imagem foi feita diante de uma grande platéia; sendo o fato noticiado

pelo então Jornal do Commércio.

É preciso ver a cousa com seus próprios olhos para se fazer idéia da rapidez e do resultado da operação. Em menos de nove minutos o chafariz do Largo do Paço, a Praça do Peixe, o mosteiro de São Bento, e todos os outros objetos circunstantes se acharam reproduzidos com tal fidelidade, precisão e minuciosidade, que bem se via que a cousa tinha sido feita pela própria mão da natureza, e quase sem a intervenção do artista. (LEITE, Enio. História da fotografia no Brasil. Disponível em: http://www.ofoco.natalrn.net/profenio3.htm. Acessado em 29 Mai. 2009).

Os objetos retratados com essa técnica tinham suas formas muito

nítidas e bem definidas, as imagens feitas eram tão boas que possibilitavam

ver detalhes que passavam despercebidos ao olhar o objeto original. Ao utilizar

o vapor de mercúrio e o tiossulfato de sódio para tratar as chapas, as imagens

se formavam mais rapidamente e a sua durabilidade aumentava. Mas a

daguerreotipia produzia apenas uma imagem na chapa de vidro: quando se

tentava copiá-la, perdia-se a qualidade.

Aquela época em que tirar foto demandava um aparato caro e complicado – o passatempo dos hábeis, dos ricos e dos obsessivos – parece, de fato, distante da era das cômodas câmeras de bolso que convidam qualquer um tirar fotos. (SONTAG, 2004, p.18).

Em 1888, é lançada comercialmente a primeira câmera que utilizava

filme em rolo, a câmera-caixote Kodak nº 1. O inglês George Eastman

aprimorou os processos de impressão e cópia de imagens e desenvolveu um

aparato pequeno e leve, que não precisava de conhecimentos técnicos para

operá-lo. Começa então a popularização da fotografia. “Você aperta o botão,

nós faremos o resto” (SALLES, id.), esse era o slogan criado por Eastman para

convidar as pessoas a fotografarem; elas compravam a câmera, que vinha

carregada com um rolo de filme com 100 negativos, e após usá-los,

entregavam o material para o laboratório de Eastman, que revelava, imprimia e

enviava as imagens e a câmera carregada com um novo filme para o fotógrafo.

Se antes, as fotos eram uma exclusividade dos ricos, agora ela era

acessível a todos. Fotografar passou a ser uma atividade simples, as pessoas

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fotografavam a família, os eventos, a paisagem. “Somos intimados a disparar

nossas máquinas levados ainda que por um inconsciente desejo de

apropriação — um flagrante, um momento que se procura eternizar através da

revelação da cena em papel”. (BARBOSA, id.)

Com a popularização da fotografia, as indústrias começaram a investir nessa

tecnologia e surgiram novas marcas e modelos de câmeras e lentes. As mais

usadas pelos fotojornalistas eram: “a câmera Rolleiflex 6 x 6 cm, de negativo e

focalização com a câmera no umbigo; a Leica 24 x 36 mm; e a Nikon também

24 x 36mm com o fotômetro incorporado” (LIMA, 1989, p. 47). Os japoneses

investiram no aperfeiçoamento das lentes fotográficas. O desenvolvimento das

grande-angulares e das teleobjetivas aumentavam a qualidade e mostravam

outra perspectiva de determinado fato. Lentes grande-angulares “demonstram

que o fotógrafo está dentro do assunto, em completa intimidade com o fato”

(LIMA, 1989, p. 51); Já a lente teleobjetiva “‘rouba’ uma imagem à longa

distancia” (LIMA, 1989, p. 52 – grifo do autor).

1.2. O fotojornalismo

As imagens de diferentes lugares e acontecimentos começaram a se

espalhar pelo mundo através da imprensa. As pessoas agora podiam saber o

que estava acontecendo, não somente através da descrição de um texto

jornalístico, tendo que imaginar a cena, mas podendo observá-la, dando-lhes a

impressão de que estavam presentes no momento do acontecimento retratado.

Segundo Nelson Júnior, “o público não se contentava apenas com o

relato e o texto reportativo, mas queria ‘ver com os próprios olhos’ os fatos”

(2004, p. 63 – destaque do autor). Com essa nova forma de noticiar, a

imprensa passou a atingir um outro público: os analfabetos. Através das

imagens o leitor tinha uma rápida assimilação da notícia, “a fotografia de

imprensa se transformou num meio de informação independente, consciente,

agitador e emocionante” (LIMA, 1989, p. 22).

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As imagens davam credibilidade às notícias. De acordo com Philippe

Dubois, “a fotografia, pelo menos aos olhos da doxa e do senso comum, não

pode mentir” (2004, p. 25 – grifo do autor); e toda a sociedade compartilhava

esse pensamento. Por esses motivos, a vendagem de jornais e revistas

aumentou depois que os veículos passaram a ter imagens impressas em suas

páginas.

A imprensa, agora, tornara-se um difusor de imagens do mundo para o

mundo, influenciando na cultura, no comportamento e no cotidiano das

pessoas da sociedade.

Até então, o homem comum só podia visualizar os acontecimentos que ocorriam ao seu redor, em sua rua, em seu povoado. Com a fotografia abre-se uma janela para o mundo. Os rostos dos personagens públicos, os acontecimentos que têm lugar no mesmo país ou além das fronteiras tornam-se familiares. Ao estender mais o olhar, o mundo se encolhe. (FREUND, Gisele. Apud DUARTE, Gina Rosa. Disponível em: http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT0303.htm)

No início desse processo de reprodução de imagens, o que se tinha na

imprensa ainda não eram as fotografias reproduzidas no veículo, mas gravuras

feitas em madeira a partir da imagem fotográfica. De acordo com Jorge Pedro

Sousa, a primeira imagem, dita como uma fotografia de imprensa, foi uma

reprodução feita a partir de um daguerreótipo de um incêndio em Hamburgo,

em 1842. A revista The Illustrated London News “usou uma imagem,

desenhada a partir desse original, para ilustrar o sucedido” (Disponível em:

http://ubista.ubi.pt/~comum/sousa-jorge-pedro-historia_fotojorn1.html).

Mas ainda existiam grandes dificuldades para a publicação de imagens,

devido à deficiência técnica dos equipamentos fotográficos e de impressão. As

imagens feitas nesse primeiro estágio de publicações ilustradas eram,

normalmente, “eventos públicos, de caráter político (...), como ocorreu na

assinatura do tratado de paz entre França e China, em 1843.” (PEREIRA

JÚNIOR, 2004).

A primeira fotorreportagem, que historicamente deu início ao

fotojornalismo, aconteceu durante o conflito conhecido como a Guerra da

Criméia. Tal conflito foi causado pela disputa da área da península da Criméia,

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pertencente à Rússia, pela Turquia; a guerra teve início em 28 de março de

1854, com a entrada da França e da Grã-Bretanha na disputa ajudando o lado

turco.

Correspondentes de guerra britânicos trabalhando para o “The Times” de Londres estavam reportando, por escrito, os horrores da guerra da Criméia. Estas reportagens foram lidas pelo proprietário de uma editora chamada Thomas Agnew & Sons. Este Thomas Agnew resolveu enviar então o fotógrafo oficial da família imperial Britânica, Roger Fenton (1819–1869) para produzir uma história fotográfica da zona de guerra. (Disponível em: http://www.jesussite.com.br/acervo.asp?Id=1237. Acessado em 10 de jun. 2009).

Roger Fenton passou quatro meses na região da guerra, retornando

com cerca de 360 fotografias; que foram expostas em Londres, em setembro

de 1855. Trabalhando com as dificuldades técnicas ainda existentes àquela

época – os daguerreótipos eram aparatos pesados, de difícil manuseio e

transporte; as imagens feitas na chapa precisavam ser reveladas

imediatamente, tendo que levar também uma carroça-laboratório - todas as

fotos de Fenton eram imagens posadas e previamente consentidas, como

“portraits de oficiais generais, soldados de cavalaria e artilheiros, assim como

imagens do desembarque de material de guerra nos portos e acampamentos”

(GERVAISEAU. Disponível em:

http://64.233.169.104/search?q=cache:AjHfGxjYDzsJ:doc.ubi.pt/01/artigo_henri

_actualidade_imagem.pdf+guerra+da+crim%C3%A9ia+-roger+fenton&hl=pt-

BR&ct=clnk&cd=5&gl=br).

As fotografias da Guerra da Criméia obtidas por Fenton, publicadas no The llustrated London News e no Il fotografo, de Milão, em 1855, foram inseridas na imprensa sob a forma de gravuras, apesar dessas fotos constituirem o primeiro indício do privilégio que o fotojornalismo vai conceder à cobertura de conflitos bélicos. (SOUSA, Jorge Pedro)?*

As fotografias de Fenton não mostravam os horrores da guerra; diferente

das fotos feitas durante a Guerra Civil Americana, em 1861. A intenção dos

fotógrafos nesse conflito era mostrar como era a guerra de verdade, o front, os

campos de batalha e as condições em que os soldados e a população viviam

durante o conflito. Alexander Gardner, um dos que registrou essa guerra, ficou

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conhecido porque chegou a “rearranjar um corpo de um sulista na célebre foto

de um soldado morto intitulada "Home of a Rebel Sharpshooter"” (SOUSA,

1998 – grifo do autor). Mas as fotos dessa guerra que mais repercutiram na

sociedade americana foram as de Mathew B. Brady, um fotógrafo americano

que registrou a guerra de secessão por conta própria, planejando vender as

imagens ao término do conflito. Ele tinha um estúdio fotográfico em Nova

Iorque onde produziu muitos daguerreótipos de cenas fortes. As fotografias de

Brady eram as mais ‘reais’, não fotos posadas ou arrumadas, mas imagens

feitas nos campos, sem esconder os horrores do conflito, chocando as pessoas

com tais registros em uma exposição em 1862.

A sociedade chocou-se ao se deparar com tal realidade; palavras se

perdem na memória, mas imagens ficam guardadas dentro dela. Um texto tem

apenas a idéia e os sentimentos de quem o escreveu, as imagens deixam que

o leitor tenha suas próprias opiniões e emoções. “As imagens paralisam. As

imagens anestesiam. Um evento conhecido por meio de fotos certamente se

torna mais real do que seria se a pessoa jamais tivesse visto as fotos”

(SONTAG, 2004, p. 30).

O trabalho do repórter fotográfico não era fácil, além de carregar os

pesados equipamentos, tinha o inconveniente flash de magnésio; que ao ser

usado liberava fumaça e um cheiro muito forte, e o tempo de exposição

necessário para obter a imagem não permitia fotos espontâneas. “Para esses

primeiros fotógrafos de imprensa o mais importante era documentar os fatos da

forma mais objetiva possível” (COSTA, 1995, p. 114).

Somente com o avanço da tecnologia fotográfica foi que o fotojornalismo

começou a se aproximar do molde em que se apresenta hoje. Com câmeras

menores, mais leves e que dispensavam o uso de flash, os fotógrafos podiam

registrar as imagens sem que sua presença fosse notada e interferisse no

acontecimento, registrando assim cenas naturais; um dos pioneiros a explorar

esses novos recursos foi Erich Salomon. Trabalhando com uma Leica,

Salomon implementou essa nova forma de capturar os fatos.

Helouise Costa conta que as fotos de Salomon “eram flagrantes de

personalidades públicas, principalmente políticos, em atitudes reveladoras,

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numa espontaneidade nunca vista anteriormente” (1995, p. 115). O modo como

Salomon fazia suas fotos ficou conhecido como candid photography, que tinha

como característica principal o flagrante.

Evoluíram também as formas de impressão gráfica de imagens. A partir

do ano de 1890 já era possível a impressão direta das fotografias nos jornais e

revistas através das máquinas rotativas. Com isso, a freqüência e a quantidade

de imagens por edição também aumentaram, e como “a notícia vinculada com

fotografia em um jornal é sempre mais lida” (LIMA, 1989, p. 39), houve também

o interesse por parte dos empresários em ter essas imagens publicadas para

aumentar a tiragem dos veículos.

Então começam a surgir mais revistas e mais fotógrafos que foram

aperfeiçoando o modo como se fazia fotojornalismo. Henry Cartier-Bresson

inaugura o instante decisivo, em que a melhor foto era aquela que reunia os

principais objetos da cena em um só quadro; a câmera era disparada poucas

vezes, procurando sintetizar ao máximo a quantidade de imagem do

acontecimento. Com a utilização crescente de fotografias nas publicações, os

veículos passaram a ter equipes de fotógrafos, que já saiam pautados da

redação; e tinham um outro objetivo: registrar o maior número de cenas

possível, para que o editor de fotografia tivesse mais opções ao escolher a foto

que seria publicada.

E no século XX, no ano de 1907, as fotografias ganham cores. Chega ao

mercado o primeiro filme colorido, o Autocromo (Autochrome), desenvolvido

pelos irmãos Auguste e Louis Lumière. Mas somente no ano de 1941 foi que a

Kodak lançou o filme Kodakcolor, que permitia a reprodução de cópias

coloridas em papel a partir de um original.

As imagens coloridas saltavam aos olhos, tinham mais vida,

aproximavam-se ainda mais do real. As fotos em cores eram como o análogo

perfeito de uma realidade que não estava diante das pessoas, mas que, de

fato, era exatamente o que acontecia.

As imagens fotográficas eram vistas como a realidade exata, sem falhas ou enganos, de tal forma que o leitor, em estando no local da ação, iria ver o mesmo que a fotografia lhe mostrava. (PEREIRA, 2004, p. 65)

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Embora as pessoas preferissem fotos coloridas às em preto e branco, o

custo para a impressão era elevado. Até hoje as fotos em preto e branco

aparecem nas páginas dos veículos impressos, mas as revistas semanais, a

partir de 1970, passaram a usar, predominantemente, imagens coloridas, como

um atrativo a mais para as suas notícias.

1.3. A imprensa brasileira no século XIX

A imprensa chega oficialmente ao Brasil junto com a Corte Portuguesa,

mas houve várias tentativas de introduzi-la antes dessa data – “1706, em

Pernambuco; 1747, no Rio de Janeiro, e 1807, em Vila Rica, Minas Gerais”

(LOPES, Dirceu Fernandes. Disponível em:

http://www.jornalismo.ufsc.br/redealcar/anais/gt1_impressa/A%20Hist%F3ria%

20do%20Jornalismo%20como%20formadora%20de%20consci%EAncia%20cr

%EDti.doc) - que foram impedidas de prosseguirem devido a ordens vindas de

Portugal. O primeiro jornal impresso no país foi a Gazeta do Rio de Janeiro.

Quando Dom João VI chegou ao Rio de Janeiro, em março de 1808, trouxe

também todo o material gráfico para a confecção de um jornal; instaurou a

Impressão Régia – uma tipografia usada para imprimir decretos e despachos

públicos; contava com uma Junta Censora da Corte, que analisava

minuciosamente todo o material que era confeccionado -; nomeou o primeiro

censor. No dia 10 de setembro de 1808, foi publicada a primeira edição. O

impresso trazia notícias referentes à família real e decretos políticos; circulava

duas vezes por semana. O jornal era editado sob as ordens de censura da

Junta Censora da Impressão Régia.

Lindoval Oliveira, em seu texto A comunicação pela imprensa, disponível

no site Brasil Rotário (http://www2.brasil-

rotario.com.br/revista/materias/rev922/e922_p18.html), conta que “depois de

passar por várias direções e denominações, sempre com caráter oficial, tornou-

se, em 1º de janeiro de 1892, o Diário Oficial, que se conhece até hoje”.

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Mas antes de a Gazeta do Rio de Janeiro ser lançado como veículo

oficial de notícias, já circulava pelo país (o primeiro número data de junho de

1808) o jornal Correio Braziliense. O jornal chegava ao Brasil em navios vindos

da Europa, e mesmo após ser proibido de circular no país, em 1809, chegava

de forma clandestina através das embarcações; era editado mensalmente em

Londres, por Hipólito José da Costa, que publicava notícias sobre política e

comércio, além de apoiar movimentos emancipação brasileiros; era um

mensário que relatava fatos e idéias criados na Europa que pudessem ser

utilizados no Brasil. Ao ser declarada a independência do Brasil, Hipólito José

parou de editá-lo, já que não era necessário um jornal que lutasse pela

independência, agora que o Brasil não estava mais sobre o domínio da Corte

Portuguesa e podia ter veículos que expressassem opiniões contrárias à

realeza. O último número do Correio Braziliense saiu em dezembro de 1822

(SODRÉ, 1999, p. 28).

Outro jornal que também teve autorização da Impressão Régia para

circular foi a Idade d’Ouro do Brazil. Editado na Bahia, a partir de 1811, o

impresso durou 12 anos e apoiava o domínio português. No ano seguinte,

ainda na Bahia, surge a primeira revista brasileira: As Variedades ou Ensaios

de Literatura; era uma revista cultural ligada a maçonaria. Juarez Bahia relata

que a revista “tinha como programa defender os costumes, as virtudes morais e

sociais, publicar novelas, extratos de história, resumo de viagens, trechos de

autores clássicos “cuja leitura tenda a formar pureza de linguagem” algumas

anedotas e boas respostas...” (1967, p. 23 – destaque do autor).

Ambas as publicações pertenciam ao advogado português Diogo de

Bivar, que morava em Salvador e foi um dos pioneiros na produção de

impressos; ao falecer, seus filhos ficaram responsáveis pelas publicações. Em

1852, a filha de Bivar, V. A. Ximenes de Bivar e Velasco, foi a primeira mulher a

ter funções na imprensa e criou o Jornal da Senhoras, também na Bahia.

Em 1821, D. João VI volta para Portugal e o Príncipe-Regente, D. Pedro,

decreta o fim da censura feita pela Junta Censora da Imprensa Régia no Brasil

em 28 de agosto, começando então a surgirem alguns jornais e pasquins. Esse

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movimento ganhou mais força no ano seguinte com a proclamação da

independência do Brasil.

Minas ganha seu primeiro jornal em 1823, O Compilador. Cinco anos mais tarde circula em Ouro Preto O Precursor das Eleições. Em Olinda e Recife circula um órgão estudantil, O Olindense. O Diário de Pernambuco, também de 1823, se tornará o jornal mais antigo em circulação no país e na América Latina. O Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, é de 1o. de outubro de 1827. (BAHIA, Juarez. A História do jornalismo Brasileiro, ?*).

Esses periódicos tinham liberdade de ir contra o governo, criticar

administrações e expor as opiniões da sociedade sobre abolicionismo,

monarquia, república etc. Nessa época também circulavam jornais em inglês,

francês e italiano; o mais importante foi o francês Revue Brésilienne, de 1830.

Mas a liberdade de imprensa ainda não era total. Prova disso foi que

Cipriano Barata criou o jornalismo do cárcere. Em abril de 1823, editou o

primeiro número do Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, e a

cada vez que Cipriano era preso, ele fazia um número do jornal com o local da

prisão ao lado do nome do periódico. O ultimo exemplar foi escrito em 1835.

Com o fim da censura, assuntos não faltavam aos jornais; que nasciam

às dezenas, porém todos com curtíssima duração. Jornais, pasquins e

publicações humorísticas com estilo panfletário eram editados falando sobre as

lutas sociais, revoluções, a vida da corte e as guerras; mas com conteúdo

“opinativo, engajado, às vezes satírico e corrosivo” (ZANCHETTA JÚNIOR,

2004, p. 41). As imagens começam a ser utilizadas a partir de 1831, em formas

de charges, caricaturas e bonecos para animar as páginas de texto.

A partida da metade do século o jornalismo começou a se aproximar da

literatura. Segundo Zanchetta Júnior, no Brasil muitos livros eram publicados

em forma de folhetins, com trechos de narrativas que saiam na mesma seção

durante semanas, criando uma rotina. “Nomes como Machado de Assis, José

de Alencar, Artur Azevedo, Aluísio Azevedo, Lima Barreto, entre tantos outros,

foram colaboradores assíduos dos jornais ou mesmo jornalistas de profissão”

(2004, p. 42).

Um dos jornais mais importantes desse século foi A Província de S.

Paulo, que foi criado no ano de 1875 e já no ano de 1880 era o jornal com

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maior tiragem e distribuição. Foi fundado por republicanos, mas não tinha uma

função política determinada, era comprometido com o jornalismo. No ano da

proclamação da República o veículo mudou de nome para O Estado de S.

Paulo. Do mesmo ano de criação, o Diário de Notícias, de Salvador, também

circula até hoje1.

Diz-se que o ano de 1880 encerra a primeira fase da imprensa no Brasil;

a partir de então o jornalismo deixa de ser uma atividade panfletária e não

muito organizada para se transformar em um mercado. O avanço das técnicas

de impressão deu, verdadeiramente, um ar de indústria e empresa para essa

atividade; a substituição de folhas cortadas previamente em formato de jornal

pelas grandes bobinas de papel das máquinas rotativas, permitiu a impressão

de grandes tiragens dos exemplares.

No final do século XIX, surge mais um grande jornal, em 1891 é fundado

o Jornal do Brasil. Rodolfo de Souza Dantas e Joaquim Nabuco criaram um

jornal intelectualizado, que questionava o regime republicano em vigor no país.

Problemas com o governo e com a sociedade fizeram com que o jornal

parasse de circular por algumas vezes: a primeira quando Joaquim Nabuco

escreveu uma série de artigos que criticavam os adesistas do novo governo e

intensificava o descontentamento dos republicanos, causando uma agitação

que colocou a opinião pública contra o jornal e o próprio Nabuco.

Na noite de 16 de dezembro de 1891, a redação do jornal do Brasil foi invadida por uma multidão, aos gritos de “Mata! Mata Nabuco!”, e as oficinas foram completamente depredadas (FERREIRA, 1996, p. 146).

Em abril de 1893, Rui Barbosa assume a direção do jornal e determina

uma nova diretriz para o periódico: “a defesa do regime republico, associada,

porém, ao combate à degeneração do regime promovida pela ditadura de

Floriano” (FERREIRA, 1996, p. 147). O então presidente do Brasil, Floriano

Peixoto, determinou o fechamento do jornal e uma caçada a Rui Barbosa. O JB

ficou um ano e 45 dias fora de circulação; retornou em 15 de novembro de

1 Segundo Juarez Bahia em seu livro Jornal, história e técnica, p. 34

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1894, tendo abandonado os embates políticos, passou a fazer parte da

imprensa popular, noticiando os interesses dos cidadãos.

Com essa nova formulação, o JB ganhou destaque e popularidade –

chegando a ser apelidado de “popularíssimo” pelos outros veículos da

imprensa – muitos investimentos foram feitos por seus novos donos, a firma

Mendes e Cia., que passaram a vender espaços para os anúncios. No ano de

1902, o jornal inova, e publica o primeiro romance policial em quadrinhos. Em

1906, a primeira página do periódico era somente ocupada por anúncios

classificados. Marieta Ferreira conta que “durante toda essa fase (...), o Jornal

do Brasil caracterizou-se como um órgão muito mais informativo do que de

opinião” (1996, p. 148).

No ano de 1909 o jornal muda de mãos outra vez: passa a ser

administrado pelo Conde Ernesto Pereira Carneiro. O Conde queria valorizar

as seções de literatura e artes, onde alguns membros da Academia Brasileira

de Letras tinham colunas assinadas, como Barbosa Lima Sobrinho e Aníbal

Freire.

Durante a Revolução de 1930, a sede do jornal foi invadida e depredada

novamente, e o periódico ficou sem circular por quatro meses. Para reabri-lo, o

Conde Pereira Carneiro convidou Jânio Pombo Brício Filho para chefiar o

jornal, já que este tinha uma boa relação com o governo e poderia mais

facilmente contornar qualquer imprevisto para o relançamento do jornal.

Desde então o jornal passou por inúmeros problemas administrativos;

perdeu seu caráter noticioso e voltou-se para os anúncios classificados –

passando de “popularíssimo” a “boletim de anúncios”. Vivendo em um

ambiente desfavorável, o jornal passou pelo movimento que ficou conhecido

como a reforma do Jornal do Brasil.

Com o afastamento de nomes conhecidos a partir dos anos de 1950,

abriu-se um novo caminho para a administração do jornal pela Condessa

Pereira Carneiro; que comprou novos equipamentos gráficos e viajou para os

Estados Unidos em busca de novas idéias para o veículo. Em 1956, surge a

primeira mudança: um suplemento dominical. O caderno misturava vários

assuntos relacionados à área cultural e assim, o jornal voltava a ter intelectuais

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escrevendo em suas páginas; mais tarde, esse suplemento se transformou em

literário. Outra inovação trazida pelo JB foi a fotografia na primeira página.

Em março de 1957, a primeira modificação substancial na apresentação do jornal se fez sentir com a publicação de uma fotografia na primeira página. Introduzida a título de experiência, a foto foi incorporada definitivamente, embora a primeira página continuasse ocupada basicamente por anúncios (FERREIRA, 1996, p. 152).

Amílcar de Castro, em 1959, começou a reestruturar toda a parte gráfica

do jornal. A primeira página passou a se ocupada pelo noticiaria e os

classificados ganharam seu próprio caderno, o Caderno C. O Caderno B ficou

para a arte e a cultura, dando destaque ao cinema e ao teatro. Marieta Ferreira

diz que essas mudanças só se concretizaram com a chegada de Alberto Dines,

em 1961. E que apesar de todas as mudanças, “o Jornal do Brasil manteve os

quatro atributos que sempre nortearam sua atuação, definindo-se como um

órgão católico, liberal-conservador, constitucional e defensor da iniciativa

privada” (1996, p. 154).

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CAPÍTULO 2

A FOTOGRAFIA DO SÉCULO XX

Dos últimos anos do século XIX aos primeiros períodos do novo século,

a imprensa não passou por mudanças muito expressivas. O movimento de

transformação dos jornais em empresas foi ganhando forma, tendo lugar e

funções definidas; atraindo capital e investimento para as indústrias que

produziam os periódicos de grandes tiragens e circulação. “Os pequenos

jornais, de estrutura simples, as folhas tipográficas, cedem lugar às empresas

jornalísticas, com estrutura específica, dotadas de equipamento gráfico

necessário ao exercício de sua função” (SODRÉ, 1999, p. 275).

2.1. Alguns veículos da imprensa brasileira do século XX

O século XX foi marcado pelo surgimento das revistas, elas apareceram

por vários estados do Brasil; a maioria com vida efêmera, não passavam do

terceiro ano. A imprensa no Brasil tardou a se modernizar, somente em 1902

foi que chegou a primeira máquina de impressão rotativa.

Grande jornal que nasceu nessa época foi o Correio da Manhã, no Rio

de Janeiro, fundado por Edmundo Bittencourt, em 1901. Voltado para as

questões de interesse popular, sofreu muita pressão dos governos autoritários

brasileiros; mesmo assim teve longa duração, 73 anos, saindo em oito de julho

de 1974 a sua última edição. Por ser avesso ao governo, o periódico sofreu

com represálias e por vezes foi impedido de circular. “Em agosto de 1924, o

jornal teve sua circulação suspensa a pretexto de estar imprimindo em suas

oficinas o folheto clandestino denominado Cinco de Julho, que supostamente

divulgaria as propostas tenentistas” (LEAL, Carlos Eduardo. Correio da Manhã.

Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/dhbb/verbetes_htm/5814_1.asp.

Acessado em: 28 Mai. 2009).

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Outro vespertino de grande expressão foi o A Gazeta, de São Paulo.

Inaugurada por Adolfo Araújo em 1906, o periódico só alcançou sua melhor

formação em 1918, quando Cásper Líbero assumiu a direção. Com uma visão

empreendedora, o jornal passou a abordar temáticas locais, esportivas e

sociais; que por vezes eram esquecidas pelos demais veículos da época.

Cásper Líbero criou o suplemento, A Gazeta Esportiva, que circulava junto com

o jornal às segundas-feiras; em 1928, já circulava como um tablóide, porém,

ainda encartado junto com o jornal principal. De acordo com o site da Gazeta

Esportiva, “em 1939, o suplemento trazia fotos coloridas em várias páginas.

Mais tarde, em 1941, passaria a circular também aos sábados”

(http://www.gazetaesportiva.net/agazetaesportiva/como_e_onde_nasceu_o_ma

is_completo/). Em 1947, no dia 10 de outubro, sai A Gazeta Esportiva, mas

como um jornal independente e diário. “No dia 1º de setembro de 1953 foi

lançada A Gazeta Esportiva Ilustrada. A revista era vendida separadamente

dos outros veículos. E com notícias do esporte brasileiro e internacional. Ela

somente vai parar de circular em 1967” (Idem). Atualmente só existe a versão

on-line da revista – http://www.gazetaesportiva.net - seu último número

impresso foi publicado em 19 de novembro de 2001; e o periódico extinguiu-se

em 1979, quando se tornou um suplemento do jornal esportivo.

Juarez Bahia relata que “no período de 12 a 20, surgiram alguns jornais

que se tornaram influentes: A Noite, do Rio (1912); A Tarde, de Salvador

(1912); Jornal do Comércio, de Recife (1918); O Jornal, do Rio (1919)”

(1967, p. 57 – Destaques do autor).

É no ambiente futurista do século XX que surgem dois importantes

personagens e suas empresas: Irineu Marinho, fundando o jornal O Globo - e

posteriormente, seu filho, Roberto Marinho com as Organizações Globo - e

Assis Chateaubriand com os Diários Associados.

O jornal O Globo nasce em 29 de julho de 1925 e até hoje é um jornal de

grande circulação no país. Com o falecimento de seu fundador, a direção do

jornal foi assumida por seu filho, Roberto Marinho, que a partir de então

construiu uma das maiores empresas de comunicação da América latina.

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No ano de 1924, O Jornal, do Rio de Janeiro, foi comprado por Assis

Chateaubriand, que deu início ao grupo de comunicação Diários Associados;

nos anos que seguiram, o grupo colocou no mercado editorial “36 jornais, 18

revistas, 36 rádios e 18 emissoras de televisão em todo o País” (Disponível em:

http://www.terra.com.br/dinheironaweb/122/assis_chateaubriand.htm. Acessado

em: 28 Mai. 2009). Um dos veículos que teve vida mais longa foi a revista O

Cruzeiro.

Ainda são lembrados, por Juarez Bahia, alguns outros jornais que

nasceram e circularam pelo país nessa primeira metade do século XX; como a

Folha da Manhã (1925) e o Diário da Noite (1926), de São Paulo; o Jornal do

Comércio, de Mato Grosso do Sul (1921); O Estado (1915), de Florianópolis; e

O Povo (1928), de Fortaleza (1967, p. 62).

No campo das revistas, a primeira a ser lançada no século XX foi a

Revista da Semana (1901), que começou a circular em 20 de maio; criada por

Álvaro de Tefé, logo passou a ser propriedade do Jornal do Brasil. E voltou a

circular de forma independente em 1915, sob a orientação de Carlos Malheiros

Dias, Aureliano Machado e Artur Brandão, que a tornaram, segundo Nelson

Sodré, “leve, alegre, (...) elegante e feminina” (1999, p. 301). A Revista da

semana, um ano após seu lançamento, disputaria mercado com a revista O

Malho; e em 1904, entraria em cena a revista Kosmos. Tratando de assuntos

como teatro e crítica literária, a revista Kosmos circulou até 1906, foi pioneira

ao explorar os recursos gráficos já existentes no país, que permitiam separar o

desenho da fotografia.

Com o mesmo espírito inovador, surgem as revistas Fon-Fon, em 1907 e

Careta, em 1908. Ligadas à literatura e as ilustrações – charges humorísticas –

circularam até o final da década de 1950; a revista Careta teve em suas

páginas sonetos de Olavo Bilac.

As revistas ilustradas, aparecendo na fase em que imprensa e literatura se confundiam e como que separando, ou esboçando a separação entre as duas atividades, submeteram-se, inicialmente, ao domínio da alienação cultural então vigente, buscando emancipar-se

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depois, ao se tornarem principalmente mundanas, e até femininas umas, e principalmente críticas outras. (SODRÉ, 1999, p. 302)

As revistas desse período, começaram a deixar um pouco de lado os

assunto locais para importar cultura. Assuntos relacionados ao simbolismo,

parnasianismo, modernismo e a literatura européia eram abordados por vários

autores - para imitar as rodas parisienses, chegaram a ser publicados poemas

em francês (SODRÉ, 1999, p. 300).

Em 10 de novembro de 1928 começa a circular a revista que alcançou

as maiores tiragens do país. A revista O Cruzeiro foi uma criação do Diários

Associados, o semanário atingiu a marca de um milhão de exemplares – 700

mil da edição nacional, mais 300 mil da edição internacional da revista (O

Cruzeiro Internacional) (PEREGRINO, 1991, p. 29). O semanário, em sua

primeira fase, assemelhava-se às demais publicações, tendo seu espaço

preenchido por contos e novelas ilustrados, feitos por grandes nomes da

literatura e da pintura/ desenho, como Graça Aranha, Manuel Bandeira,

Emiliano Di Cavalcanti e Portinari; matérias locais e acontecimentos políticos

tinham pouco destaque na publicação.

Com a instabilidade do cenário político e econômico na década de 1930

– o craque da bolsa de Nova Iorque (1929); a Revolução Constitucionalista de

São Paulo (1932); o Estado Novo de Getúlio Vargas (1937) – a revista assumiu

uma nova postura, sendo reformulada por Carlos Malheiro Dias e Anttonio

Accioly Netto, abria mais espaço para as notícias factuais, reportagens e

entrevistas.

Nadja Peregrino relata que O Cruzeiro era uma revista de variedades;

tinha seções voltadas para a política, cinema teatro e colunas como a “Lar

Doce Lar, de receitas culinárias (...); Mulher para Mulher, onde dava conselhos

femininos” (1991, p. 19). Além da seção “Última Página”, que era escrita por

Rachel de Queiroz.

A fotorreportagem ganhou força nas páginas da revista e inaugurou o

estilo no Brasil. Em 1944, Assis Chateaubriand convida para trabalhar no

veículo Jean Manzon - que foi fotógrafo da revista Paris Match - e reformula a

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formatação das fotografias nas páginas de O Cruzeiro; dando às imagens

espaços nobres da revista. Logo fui publicada em suas páginas a primeira

grande fotorreportagem; ocupando 18 páginas da revista, a matéria feita por

David Nasser e Jean Manzon sobre os índios Xavantes fez com que os

exemplares se esgotassem rapidamente. “A reportagem tirou a revista do

marasmo editorial que se encontrava” (FARO, 1999, p. 77); esse fator

contribuiu muito para que a revista ascendesse nos anos que seguiram; “com o

suicídio de Getúlio Vargas, a revista chegou ao auge do seu sucesso,

alcançando a extraordinária tiragem de 720.000 exemplares” (PEREGRINO,

1991, p. 24). A revista foi perdendo importância e mercado, sendo extinta em

julho de 1975.

Surgem outros grandes títulos, como a revista Diretrizes (1938) e a

revista Senhor (1959); além do jornal Última Hora (1951), fundado por Samuel

Wainer, no Rio de Janeiro, mas no ano de 1952 também passou a ser

distribuído em São Paulo; e a partir de 1961 ganhou uma edição nacional.

O jornal foi criado para dar apoio ao governo de Getúlio Vargas. Wainer

inseriu em seu periódico “série de técnicas de comunicação de massa até

então desconhecidas no Brasil” (LEAL, Carlos Eduardo. Última Hora.

Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/dhbb/verbetes_htm/6400_1.asp.

Acessado em: 28 Mai. 2009). Em 1953, o jornal de Wainer lançou um tablóide

chamado Flan; era uma publicação ilustrada em cores, para disputar mercado

com O Cruzeiro. Enfrentando problemas de cunho político, Samuel Wainer

vendeu o jornal; que circulou ainda até o ano de 1991.

Nasce também uma outra importante publicação, que dá grande

destaque ao fotojornalismo; a revista Realidade (1966), mas esta será

abordada no próximo capítulo.

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2.2. O fotojornalismo entre as décadas de 1920 a 1950

A tecnologia avançava junto com o caminhar do novo século, máquinas

que imprimiam maior quantidade em menos tempo e com imagens com boa

qualidade chegavam ao Brasil, que estava em pleno processo de

industrialização. Helouise Costa conta que a melhoria na qualidade de

impressão das fotos fez com que estas também aparecessem em anúncios e

publicações comerciais, elas passaram a ditar costumes e hábitos para a

sociedade burguesa, que copiava os modelos que eram divulgados pela

imprensa (COSTA,1995, p. 27).

Há um movimento de mudança na visão da fotografia; ela deixa de

apenas ilustrar textos e passa a ser percebida como prova documental. “O

primeiro compromisso da imagem é oferecer-se como prova verossímil sobre

determinado episódio” (ZANCHETTA JÚNIOR, 2004, p. 86). As fotografias

documentais têm um compromisso com o social, elas podem desvelar o modo

de vida de determinado grupo ou mesmo, registrar fatos históricos para

conhecimento público.

O fotojornalismo começa a se segmentar. Segundo Ivan Lima, “existem,

basicamente, três gêneros de fotografia jornalística: as fotografias sociais, as

fotografias de esporte e as fotografias culturais” (LIMA, 1989, p. 19). Segmenta-

se também o mercado editorial, injetando publicações específicas para cada

tipo de fotografia, abrindo espaço para os fotógrafos e a nova profissão de

fotojornalista – ou repórter fotográfico. Com os novos veículos para as

fotorreportagens os temas eram os mais variados.

Expedições à Floresta Amazônica para contactar tribos indígenas, o carnaval e as praias cariocas, os esportes, a política, o glamour das atrizes, os acidentes automobilísticos, os crimes famosos e a vida das nossas grandes cidades. Tudo era motivo para uma boa fotorreportagem, satisfazendo plenamente o gosto da classe média. (COSTA, 1995, p. 120)

As guerras também são temas muito reproduzidos por essa nova forma

de noticiar. É durante a I Guerra Mundial que surgem as fotos de maior impacto

dessa época, aumentando a demanda por fotógrafos nos locais de combate.

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Os veículos que não tinham equipes disponíveis para ir para o front, recorriam

às agências de fotos (SOUSA, 2002, p. 21).

As agências de fotografias internacionais, por volta de 1930, vão

ganhando importância na distribuição de imagens pelos países, contam com

equipes espalhadas por diferentes regiões e transmitem fotografias por via

telegráfica – Telefoto (ZANCHETTA JÚNIOR, 2004, p. 79).

As revistas ilustradas têm um público diferenciado, são pessoas que

buscam uma “análise dos acontecimentos e uma forma mais extensa para ler

as notícias” (LIMA, 1989, p. 79); diferente das rádios – a primeira transmissão

ocorreu em setembro de 1922 - e dos jornais diários, que davam a notícia pura,

simples e, no caso dos periódicos, por vezes sem imagens do acontecido; as

revistas traziam fotos e informações mais apuradas e interpretadas sobre os

fatos. Essa nova movimentação da imprensa em favor da informação,

deixando de ser um espaço dominado por gêneros literários, fez aumentar a

demanda por fotos factuais dos acontecimentos; que sintetizavam a notícia.

Mas sem deixar de lado a parte cultural e humorística, afinal, um dos papéis

das revistas ilustradas era divertir e entreter o leitor.

A imprensa no Brasil foi se “regularizando”; em 1943, é criado o curso

superior de jornalismo; Tal atividade era exercida por uma “elite de

profissionais formada, principalmente nas Faculdades de Direito, mas a grande

maioria era mal preparada, não tendo sequer concluído o ensino médio”

(RIBEIRO, Ana Paula Goulart. Jornalismo, literatura e política: a modernização

da imprensa carioca. Disponível em:

http://64.233.169.104/search?q=cache:p5tFLfQ_A4YJ:www.cpdoc.fgv.br/revista

/arq/345.pdf+reforma+da+imprensa+1950&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=2&gl=br.

Acessado em 28 Mai. 2009).

Uma série de mudanças foram sendo implementadas na impressa a

partir dos anos 1950, caracterizando assim a reforma da imprensa. Novidade

significativa foi a utilização do Lead (modelo americano para a estruturação do

texto noticioso) e a instalação do Copy Desk nas redações – “grupo de

redatores, cuja função era revisar e, se necessário, reescrever as matérias

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para dar-lhes uma unidade de estilo” (RIBEIRO, idem); criaram-se ainda os

manuais de redação e estilo dos veículos; que

além dos parâmetros da escrita, determinavam também o padrão de apresentação dos textos originais à composição gráfica. Impunham – e impõem até hoje – regras, por exemplo, em relação ao uso de aspas, siglas, números e destaque gráfico. Essas regras não se referiam apenas a uma obediência à gramática, à norma culta da língua, mas também à conveniência da produção industrial. (RIBEIRO, idem)

A apresentação gráfica dos impressos foi modificada para que a notícia

pudesse atrair o leitor; com divisões, títulos, subtítulos, textos e imagens

dispostos de forma harmoniosa na primeira página dos jornais, que era vista

como a vitrine do periódico. Chamadas e resumos passaram a ocupar esse

espaço. Os veículos impressos agora dividiam as notícias com a televisão

(1950), que começava a surgir como meio de comunicação de massa. Mas

esse processo de instalação levou alguns anos para que se concretizasse; até

que os aparelhos de televisão chegassem às massas de fato. De acordo com o

site Microfone: História da televisão Brasileira -

http://www.microfone.jor.br/historiadaTV.htm - no ano de 1970, o Brasil contava

com cerca de 4 milhões de aparelhos, que atingiam, aproximadamente, 25

milhões de pessoas; já que poucas eram as casa que possuíam o aparelho, as

pessoas costumavam se reunir em grupos para assistir aos programas mais

“famosos” da época.

2.3. Anos 1960: O auge do fotojornalismo nacional

O mercado tecnológico avançava; e os impressos não eram mais a

única forma da população ver as notícias. Mas a essa época, a televisão ainda

não dominava completamente o mercado noticioso. E quem tinha mais

consumidor eram as revistas, que traziam as imagens dos acontecimentos do

mundo.

O cenário político e econômico era instável no país, razão que fez com

que dezenas de jornais e revistas que circulavam no país fechassem as portas.

Com o golpe militar e a forte censura que vigorava no país, vários escritores

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foram exilados e a imprensa ficou totalmente submissa ao governo (FARO,

1999, p. 74). Movimentos de revoltas contra o regime eclodiam pelo país;

partidos políticos foram lançados à ilegalidade. E tudo isso sem ser noticiado,

de forma clara, para a população. Em sinal de protesto, quando alguma

reportagem era impedida de ser publicada, os veículos colocavam receitas de

bolo, desenhos, tarjas ou simplesmente deixavam o espaço em branco;

tentando alertar a sociedade, de alguma forma, que foram censurados. E para

completar o quadro de crise que se abateu sobre a imprensa, houve um

aumento no preço do papel e do dólar; visto que a maior parte do papel

utilizado pelas empresas era importado, mas esse aumento também influenciou

no preço do papel que era produzido nacionalmente. “Assim, enquanto o dólar

para a importação do papel passava de 100 para 620, o quilo do papel nacional

passava de 8,90 para 112 cruzeiros” (SODRÉ, 1999, p. 412).

Quando as empresas jornalísticas começaram a se recuperar, veio o

golpe de 1964; Nelson Sodré conta que o golpe não censurou somente os

veículos impressos, os governantes daquela época pleiteavam também “o

monopólio estatal do rádio e televisão” (1999, p. 447). Baseando-se na idéia de

que essa atitude era para “preservar a soberania do país” (idem).

Nesse ambiente conturbado para os jornais e para as emissoras de

rádio, as revistas ilustradas ganham cada vez mais destaque no mercado

editorial. Falando de variedades, assuntos gerais, modas e assuntos femininos

(BAHIA, 1967, p. 91), essas publicações circulavam com mais “liberdade”

nesse período de repressão; e passaram a publicar grandes reportagens

fotográficas.

Investindo nesse tipo de matéria, publicações como O Cruzeiro e o

Jornal do Brasil alcançaram altas tiragens nessa década. Mas a

“fotorreportagem atinge o auge nos anos 60, com o surgimento da revista

Realidade e do Jornal da Tarde, de São Paulo” (SAKALL, Sérgio. Disponível

em: http://www.sergiosakall.com.br/montagem/fotografia-brasil-anuncios.htm.

Acessado em: 28 Mai. 2009). Isso devido ao material fotográfico que chegava

na época; câmeras menores e com maior alcance das lentes, películas mais

sensíveis que dispensavam o uso do flash e a criação de um estilo fotográfico

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para as reportagens, como, por exemplo, o já citado, “momento decisivo” de

Cartier-Bresson.

Incentivador também foi a criação de uma categoria para homenagear a

fotografia dentro do “Prêmio Esso de Jornalismo”, iniciado em 1955. O

repórter fotográfico, Campanela Neto, registrou - em 1959, na cidade de

Aragarças, atualmente município de Tocantins - a prisão de um grupo de

oficiais da Aeronáutica que tinham se rebelado contra o governo de Jucelino

Kubitschek. A essa imagem, no ano de 1960, “o Prêmio Esso conferiu um voto

de louvor à foto, o que deu origem, a partir do ano seguinte, à categoria

Prêmio Esso de Fotografia” (Disponível em:

http://www.premioesso.com.br/site/noticias/release_2005_03.aspx. Acessado

em 28 Mai. 2009).

“A Realidade valoriza a fotografia em um projeto gráfico ousado e monta

uma equipe de profissionais que fez escola no fotojornalismo brasileiro. (...)

consegue realizar fotos irônicas sobre a situação do Brasil sob regime militar

apesar do controle da censura” (SAKALL, Sérgio. Disponível em:

http://www.sergiosakall.com.br/montagem/fotografia-brasil-anos60.htm.

Acessado em: 28 Mai. 2009).

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CAPÍTULO 3

REVISTA REALIDADE

3.1. Breve histórico da Editora Abril

O fundador da Editora Abril foi Victor Civita. Italiano, viveu a maior parte

de sua vida nos Estados Unidos, onde era empresário do ramo das indústrias

gráficas. Incentivado por seu irmão César, que trabalhava para a Walt Disney

na América Latina, resolveu vir conhecer o Brasil; chegou no Rio de Janeiro em

setembro de 1949, mas optou por São Paulo para montar seu

empreendimento. E não voltou mais para Nova Iorque; enviou uma carta à sua

esposa, Sylvana, dizendo que arrumasse a mudança e viesse para o Brasil

com seus dois filhos, Roberto e Richard Civita.

Em 12 de julho de 1950, saia a primeira publicação da Editora Abril: O

Pato Donald. Focando-se no mercado da literatura infantil, lançou vários títulos

como “‘Mickey’, ‘Tio Patinhas’, ‘Luluzinha’, ‘Zé Carioca’, ‘Super Homem’,

‘Turma da Mônica’ e ‘Recreio’” (Disponível em:

http://www.centenariovictorcivita.com.br. Acessado em 28 Mai. 2009). Em

1952, introduz no país uma novidade na área do entretenimento, a fotonovela.

A nova moda era editada na revista Capricho, que chegou a atingir a marca

dos 500 mil exemplares.

A empresa de Civita criava publicações especializadas – como

Manequim (1960) e Quatro Rodas (1961) - e assim foi ganhando espaço no

mercado editorial. Novidade dessa época foi o lançamento da revista Cláudia,

uma publicação feminina diferente das que existiam; a revista “enveredava por

temas ainda tabus, como sexo e contracepção” (Idem).

Expandindo-se no mercado, “Os números da Editora Abril vão de 7

títulos entre 1950 e 1959; subindo para 27 no período de 1960 a 1969 e

alcançando 121 títulos entre 1970 e 1979” (VILLALTA, Daniella. O surgimento

da revista Veja no contexto da modernização brasileira. Disponível em:

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http://reposcom.portcom.intercom.org.br/dspace/bitstream/1904/18628/1/2002_

NP2VILLALTA.pdf. Acessado em 28 Mai. 2009); além de produzir fascículos

em seu parque gráfico; e, Civita, ainda se desdobra em negócios em outros

campos, como hoteleiro e frigorífico.

Com a chegada dos anos de chumbo, a editora lança mais uma

publicação; a revista Realidade.

3.2. Surge a revista Realidade

A revista Realidade é lançada em abril de 1966, sob o slogan de ser “a

revista dos homens e das mulheres inteligentes que querem saber mais a

respeito de tudo” (SATO, 2002). Com periodicidade mensal, circulava por todo

o país; era uma publicação de variedades, abordava os mais diferenciados

temas como política, moda, problemas sociais, além de tabus como sexo e

drogas. Foi criada para o público modernista da década de 1960, pessoas que

passavam por uma transformação cultural, influenciadas pelos movimentos

hippies e estudantil.

Vitor Civita ao apresentar a revista para o público, explicitou as

pretensões e ideais do novo veículo que chegava às bancas:

Pretendemos informar, divertir, estimular e servir a nossos leitores. Queremos comunicar a nossa fé inabalável no Brasil e no seu povo, na liberdade do ser humano, no impulso renovador que hoje varre o País e nas realizações da livre iniciativa. (FARO, 1999, p. 91 – Grifo do autor)

Para garantir sucesso de vendas, o veículo costumava realizar

pesquisas com a população para saber sobre que assuntos deveriam ser

abordados, o resultado já era o esperado por seus idealizadores: “ciência,

grandes problemas brasileiros e assuntos relativos ao sexo e à educação

sexual” (SATO, 2002). E as pesquisas de opinião tornaram-se uma constante

no planejamento editorial da revista; sempre saiam matérias do tipo, o que o

brasileiro pensa sobre o divórcio, como as mulheres vêem a pílula

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anticoncepcional, entre outros questionamentos que pairavam sobre as idéias

dos leitores. (FARO, 1999)

Realidade havia sido criada para ser uma grande revista e competir com

a única publicação do mesmo estilo da época, a revista O cruzeiro. De acordo

com Selmar Alves, “em 1968, a revista Realidade chegou próximo aos 500 mil

exemplares vendidos” (ALVES, p. 9), e Vitor Civita garantiu que a publicação

não atingiu um milhão de exemplares devido a instauração do Ato

Inconstitucional nº 5 naquele ano. O principal objetivo da revista era “discutir os

assuntos de interesse público, criando um espaço de debates sobre questões

que afetavam diretamente a sociedade brasileira” (SPAGNOLO). Com caráter

inovador, trouxe o New Journalism para o Brasil. Um novo estilo de texto

jornalístico, mais dinâmico, com características literárias, mas não contando

uma estória e sim narrando um acontecimento real - “a narrativa é livre e rompe

com o fator da notícia relativo ao formato: introdução, desenvolvimento e

conclusão, verificado no jornalismo tradicional” (ALVES, p. 10). As pautas eram

sempre sobre assuntos de interesse para o leitor, que eram desdobrados em

grandes matérias e fotorreportagens; que tentavam mostra sempre os dois

lados do fato, sempre buscando pela imparcialidade.

Para mais veracidade ao texto, uma das características da revista era

enviar o repórter para conviver com o assunto que seria relatado. Como fez

com os repórteres Henrique Caban e José Hamilton Ribeiro; que foram

designados para fazer a mesma matéria, mas sob prismas opostos. José

Hamilton passou três semanas em uma fábrica em São Paulo, para mostrar

como era a vida de um jovem operário; enquanto isso, Henrique Caban

conviveu com jovens dirigentes empresariais no Rio de Janeiro (FARO, 1999,

141).

Esse forma de fazer jornalismo era comum na redação, grande parte das

matérias eram narrativas vividas pelos repórteres que acompanhavam as

personagens do texto. Por vezes a revista chocou a sociedade e o próprio

governo, quando, em pleno exercício da ditadura, publicou uma entrevista com

Luís Carlos Prestes. A capa da edição de dezembro de 1968 dizia: “Esse é o

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camarada Prestes - Paulo Patarra desceu aos subterrâneos do PC para ouvir,

pela primeira vez desde 1964, Luís Carlos Prestes” (ALVES, p. 9).

Outra reportagem que marcou a trajetória da revista foi relacionada a

Guerra do Vietnã. Ao enviar seu repórter para o front de batalha, José Hamilton

Ribeiro feriu-se gravemente durante o conflito. Junto com seu companheiro de

equipe, o repórter fotográfico Keishaburo Shimamoto, saíram para “buscar a

foto da capa da matéria da revista durante uma batida na chamada “Estrada

sem alegria”, em Quang Tri, no norte do Vietnã do Sul” (XAVIER). Ao passar

sobre uma mina terrestre, José Hamilton perdeu sua perna esquerda e ficou

internado por uma semana antes de voltar ao Brasil. A reportagem feita foi uma

narrativa, que ocupou 12 páginas, em que o jornalista relata todo esse

episódio.

Nos dois primeiros anos da revista, ela foi um fenômeno de vendas

graças às suas inovações, mas a partir de 1969, a revista sofreu com o AI 5 e

teve que se adequar a censura, perdendo seu poder de opinião sobre assuntos

relativos à política. Somando-se ao fato das revistas terem mais duas mídias

concorrentes – o rádio e a televisão – o projeto foi perdendo força. A Editora

Abril, agora apostava em um outro formato de revista, e estava totalmente

dedicada a revista Veja (1968). Em 1976, Realidade saiu de circulação.

3.3 Análise da reportagem fotográfica

Em seus dez anos de existência, a revista Realidade procurou manter o

padrão gráfico e estético. É o primeiro ponto percebido ao analisar duas

edições de épocas diferentes, como a do presente trabalho.

Nota-se, porém, uma diferença nos temas que são abordados nos

distintos períodos, como a edição de novembro de 1967, de número 20 (fig. 1);

e a publicada em janeiro de 1973, número 82 (fig. 2). Mudanças no quadro

político do Brasil se refletiam já na capa da revista. Deve-se levar em conta

também que no ano de 1967 a revista era uma das mais vendidas no país; e no

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ano de 1973, já havia perdido muito do seu fôlego, com o surgimento de outros

títulos e o início do processo de massificação da televisão.

(Fig. 1)

(Fig. 2)

A capa da edição do ano de 1967 tem cunho político. Exibe o desenho

de um busto do ex-presidente Jânio Quadros, e a manchete é instigante,

provoca a curiosidade do leitor: “JÂNIO: afinal, a verdade sobre a renúncia”.

Realidade era uma revista que sempre estava atualizada com os assuntos da

época e procura cumprir em suas matérias um de seus objetivos, que era a

promoção de debates.

Já no ano de 1973, mesmo enfrentando a censura e o “desinteresse” da

editora – por estar voltada para a revista Veja – a revista não abandona seus

princípios; e fala sobre um tabu da época: a vida dos jovens. A chamada da

capa é uma afirmação que faz o leitor pensar; a revista estampa a frase:

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“Nossos jovens são quadrados”, mas exibe a imagem de um boneco com

roupas e acessórios modernos; levando o leitor a achar que há alguma idéia

errada, contraditória. Em vista que o momento cultural que o país atravessava,

desconstruía a idéia de um “jovem quadrado” e despertava assim o interesse

pela revista.

Mesmo com seis anos de diferença entre as edições a revista preservou

algumas seções como economia, que explicava a situação do país; aventura,

onde eram contadas histórias inusitadas; perfil, na qual se falava de algum

personagem que estava em destaque no cenário nacional; e a seção ensaio,

que era feita pelos fotógrafos.

Como a fotorreportagem era um dos seus diferenciais no mercado, essa

seção ocupava cerca de 10 páginas da revista. Por vezes, mais páginas do que

a matéria de capa; como no caso da edição de número 82, de 1973, em que a

matéria de capa ocupa 7 páginas e a seção ensaio abrange 11 páginas da

revista. Os repórteres fotográficos tinham grande prestígio dentro da redação,

tanto que a ensaio de 1967, publicou as melhores fotos segundo a opinião de

cada fotógrafo; mesmo que não tivessem valor noticioso e fossem apreciadas

somente pela estética.

Cada página é ocupada por duas fotos de cada fotógrafo, uma em cores

e a outra em preto e branco. As imagens variam de tamanho e posição na

página, de acordo com o corte feito pelo seu idealizador. Há também uma curta

declaração, de cada um deles, junto às fotos. Vê-se aí a autonomia que

possuíam, não seguiam nenhum padrão, cada um escrevia o que desejava.

Geraldo Mori optou por um texto que explicava o motivo da escolha de

tais fotografias; que foram dispostas uma sobre a outra e tendo exatamente o

mesmo tamanho (18,5cm de largura x 10cm de altura – fig. 3). No texto,

Geraldo conta que escolheu as fotos em função da emoção.

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(Fig. 3)

Ao ver duas freiras assistindo uma

família no sertão sergipano, fiquei

feliz; em Recife, vendo um garoto

pobremente vestido e com um sorriso

tão lindo, não consegui ficar feliz. Mas

achei que o certo era dividir com todos

o que eu vi: a alegria e a tristeza.

(MORI, Geraldo. Revista REALIDADE,

1967, p. 155).

Olivier Perroy selecionou fotos de tamanhos distintos (fig.4), uma em

preto e branco medindo 9,3cm x 13,5cm; e outra colorida, medindo 18,5cm x

12cm. Também dispondo-as uma sobre a outra, seu texto foi curtíssimo,

exprimindo um breve comentário sobre a qualidade das fotografias.

(Fig. 4)

Uma boa foto deve falar por si, sem

explicações. (PERROY, Olivier.

Revista REALIDADE. 1967, p. 157)

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Esses dois casos exemplificam bem como os fotógrafos escolhem suas

fotos. O primeiro pela emoção que a imagem pode causar no leitor; e o

segundo pela questão da qualidade em si, estética ou do pensamento que ela

pode produzir.

A primeira fotografia da página de Geraldo Mori (fig. 3), mostra um

menino sorridente, mesmo estando em meio a tanta pobreza e precariedade.

Mas que desperta um sentimento de tristeza no fotógrafo, por estar

presenciando a forma como uma criança vive no sertão do país. A segunda

imagem exibe duas freiras, falando com duas pessoas em janelas; o fotógrafo

relata que ficou feliz ao ver tal cena, porque a ajuda chegara então até aquela

casa. Ao descrever tais sentimentos, Mori, de certa forma, indica um caminho

para o pensamento do leitor; mas que também é livre para outras

interpretações.

A segunda imagem disposta na página de Perroy (fig. 4) mostra uma

praia e uma menina, saltando livremente com um belo cenário ao fundo; esta

fotografia é boa por ser bela, e registrar um momento sublime da criança, que

parece flutuar. Já a foto da parte superior, apresenta um homem de perfil, em

primeiro plano, sentado sob uma pilha de lixo, observando a cidade ao fundo;

revelando o contraste existente em uma mesma região, onde há pessoas que

vivem nos centros, em belos prédios; e outros, que vivem dos seus restos.

Segundo Ivan Lima, as fotografias em preto e branco causam mais

impacto na percepção do público (1989, p. 79) e percebe-se, na seleção de

ambos os fotógrafos, a opção por fotos em cores para assuntos mais leves,

amênuos, que não sobrecarregam o leitor; enquanto que nas imagens em preto

e branco, assuntos mais graves, explicitando um contraste – a felicidade do

menino cercado de pobreza e o distanciamento da qualidade de vida das

pessoas de uma mesma cidade em relação ao nível sócio-econômico –

revelando ao público a dualidade existente na vida da população, que parece

acentuada ao ser mostrada sem cores.

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A edição seguinte, do ano de 1973, trás em sua seção ensaio (fig. 5) 20

fotografias de Walter Firmo. A fotorreportagem foi feita na Amazônia, em dois

períodos de tempo, no inverno e no verão. O pequeno texto que abre a matéria

dá uma breve explicação sobre o assunto tratado e como foi feita a

reportagem.

(Fig. 5)

A palavra inverno na Amazônia,

significa a época das chuvas – e das

enchentes, que já fizeram o

Amazonas e seus principais

afluentes, em certos anos, subirem

quase 30 metros, desabrigando mais

de 50 000 pessoas. O inverno vai de

novembro a maio do ano seguinte.

De junho a outubro é verão, ou seja,

chove menos e o rio se estreita.

Nessa paisagem mudada, a

população das margens planta e

colhe, aproveitando o solo fertilizado

pelas águas. Em duas viagens ao

município paraense de Prainha, na

margem esquerda do baixo

Amazonas, em maio e outubro do

ano passado, o fotógrafo Walter

Firmo procurou, nos mesmos locais, os

mesmos personagens, documentando

os dois cenários da vida amazônica.

A abertura da matéria exibe quatro fotos, dispostas duas a duas, em um

retângulo de 19cm x 14, 5cm. As imagens, tiradas pelo mesmo ângulo, são

semelhantes aos seus pares; menos pelas alterações naturais que o cenário

sofreu. A legenda, abaixo das imagens, diz: “em maio e outubro, vista aérea de

Prainha e um de seus habitantes, Secondina, de onze anos” (FIRMO, Walter.

Revista Realidade, 1973, p. 25). Todas as 11 páginas da seção são

compostas, somente, por fotos e legendas explicativas, que mostram a

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dualidade da mesma região. É uma típica matéria de cunho social, que

pretende compartilhar com o restante do país os problemas enfrentados por

aquela população nos períodos de seca e enchente.

(Fig. 6) (Fig. 7)

Nas duas páginas seguintes a abertura (fig.. 6 e 7), com apenas uma foto

em cada uma – as demais páginas da matéria apresentam duas fotos cada,

exceto as duas últimas, que repetem o padrão das duas primeiras, com apenas

uma foto – apresenta a mesma família, em sua casa, no verão e no inverno;

dispostas de forma quase idêntica, as pessoas são as mesmas em ambas as

fotos. As fotografias deixam claras as proporções da enchente, já que com a

quase exatidão de elementos a comparação se torna óbvia. A legenda situa o

leitor sobre a família, que mostra sua crença. “Paraíba, dono da palafita,

conforma-se com a sorte e diz que Jesus não permitirá que as águas levem

sua casa” (FIRMO, idem). A mensagem transmitida por esse conjunto de

fotografias é direta e objetiva, comparando a mesma localidade nos diferentes

períodos. A legendas transmite um certo sentimentalismo, esperança de quem

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aguarda um milagre; sentimento que foi notado pelo fotógrafo, através da

convivência que teve com aquelas pessoas.

As demais páginas da reportagem seguem o mesmo padrão, fotos que

permitem uma comparação rápida entre os períodos de seca e alagamento, e

legendas explicativas sobre a cena apresentada.

Esse tipo de fotografia não depende de um prévio conhecimento do leitor

para compreender o significado que ela transmite, algo que é afirmado por Ivan

Liam, quando diz que as fotografias devem “comunicar apenas pela imagem e

por símbolos próprios dela” (1989, p. 55); diferente das capas das edições, que

contem com um entendimento cultural sobre o momento em que o país

atravessava.

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CONCLUSÃO

Segundo Nadja Peregrino “o apelo ao novo, ao incomum e ao original

enfatiza a novidade ao oferecer para o leitor acontecimentos comuns de forma

surpreendente” (1991, p. 48). Algumas pessoas poderiam até ter conhecimento

sobre o que acontece no Amazonas nas épocas de verão e inverno, mas

somente através da fotorreportagem de Walter Firmo foi que puderam ver a

dimensão do problema. Essas imagens têm valor social e apresentaram uma

região para todo o resto do país; as fotografias têm o poder de intensificar o

real, respaldadas na credibilidade que a imprensa possui.

As fotografias da imprensa são escolhidas para fazer com que o leitor

possa refletir sobre a situação revelada. Como na foto de Geraldo Mori,

mostrando um menino que vive em condições lamentáveis; tal imagem leva a

população a questionar os valores sociais, como a divisão de rendas e o

esquecimento, por parte do governo, de determinadas regiões do Brasil; onde a

ajuda até chega, mas graças à intervenção divina, como representada na

segunda fotografia selecionada por Geraldo, que apresenta ainda um tipo de

repetição. Se dividirmos tal imagem (segunda foto da figura 3) ao meio,

notamos que ela se transforma em duas fotografias distintas, mas com os

mesmos elementos, algo que passa a idéia de repetição de padrões, de que

aquela cena sempre se repete.

Juvenal Zanchetta Júnior afirma que “a fotografia acelerou aquilo que se

convenciona chamar de ‘cultura visual’” (2004, p. 80). A partir de sua

apropriação e disseminação pela imprensa, as pessoas se acostumaram a ver

a notícia; atualmente, todos os veículos impressos usam esse recurso gráfico.

E diante da necessidade de espaços para as fotos, aliado ao desenvolvimento

cultural da população, os meios de comunicação aumentaram e se

qualificaram. Criaram consciência sobre o valor das imagens e sobre a

capacidade de mover a opinião pública.

A fotografia havia se tornado, na década de 1960, elemento fundamental

para a composição das publicações. Através da observação das duas edições

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da revista Realidade, vê-se que todas as matérias tinham, pelo menos, uma

imagem ilustrando o texto.

Mesmo a partir dos anos 1970, com a chegada da televisão como uma

outra fonte informativa com imagens, o fotojornalismo ainda teve seu espaço

garantido nas bancas. Houve o desaparecimento de revistas voltadas para as

fotorreportagens, como é o caso de Realidade, mas a importância das

fotografias jornalísticas mantém seu lugar assegurado nas páginas.

Imagens televisivas são um fluxo corrente, que não são apreendidos em

sua totalidade pelo telespectador; por outro lado, “a fotografia jornalística fixa

um acontecimento e as suas impressões” (LIMA, 1989, p. 35) que ficam

armazenadas na memória do leitor, junto com o sentimento despertado pela

imagem; gerando um tipo de sentimentalismo, mas de consciência de mundo.

Esse trabalho quis mostrar como foi importante o uso de fotografias pela

imprensa para transmitir informações; capaz de despertar no leitor sentimentos,

emoções, impressões e consciência sobre a realidade que não podia ser vista

pela janela. Apresentando um mundo desconhecido, mas que se tornou

próximo, palpável e inteligível através das imagens. Colaborando para o

aumento das publicações e disseminação da cultura entre a população.

Ao resgatar a história e alguns momentos que marcaram a

fotorreportagem, nota-se que sua essência principal não foi alterada, mesmo

com os adventos da tecnologia, seu foco sempre foi causar uma reflexão crítica

na sociedade através da força que a imagem possui.

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