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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X A GINOCRÍTICA COMO EXERCÍCIO DE METACRÍTICA EM NOVAS CARTAS PORTUGUESAS Natália Salomé de Souza 1 Vinícius Carvalho Pereira 2 Resumo: Os estudos feministas vêm ganhando espaço dentro da produção de conhecimento social e acadêmico. Contudo, é possível observar que, na academia, o cânone da crítica é composto majoritariamente por críticos homens, logo a construção cultural e intelectual baseia-se numa tradição falogocêntrica. Neste trabalho, propomos traçar um caminho diverso do da crítica canônica e observar como as mulheres constroem um conhecimento que enseja uma nova perspectiva sociocultural e literária. Nesse sentido, compreendemos a crítica literária feminina segundo o conceito de ginocrítica (SHOWALTER, 1981), o qual prevê uma tradição feminina de crítica que se afasta do falogocentrismo e redefine, por exemplo, o que é o feminino. Para tanto, tomaremos por base os estudos do feminismo da diferença, seguindo o conceito de escrita feminina, de Cixous (2007), e a metáfora dos lábios, de Irigaray (1985). Nesse exercício de crítica feminina, leremos a obra Novas Cartas Portuguesas, de Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno, como um texto ginocrítico da obra Cartas Portuguesas, de Mariana Alcoforado. Ao atribuir a um texto literário a dimensão de crítica literária, traçamos o caminho da ginocrítica, buscando uma nova base teórica e poética que não seja pautada numa herança da crítica dominante. É a crítica como poesia, a poesia como crítica, ou a poesia da crítica. Palavras-Chave: ginocrítica, crítica literária feminista, Novas Cartas Portuguesas. Os estudos feministas vêm ganhando espaço dentro da produção de conhecimento social e acadêmico. Contudo, é possível observar que, na academia, o cânone da crítica é composto majoritariamente por críticos homens, logo a construção cultural e intelectual baseia-se numa tradição falogocêntrica. Por isso, a necessidade de traçar um caminho paralelo ao da crítica canônica e observar como as mulheres constroem um conhecimento que enseja uma nova perspectiva sociocultural e literária. Nesse sentido, Showalter (1981) propõe o conceito de ginocrítica, o qual prevê uma tradição feminina de crítica que se afasta do falogocentrismo e redefine, por exemplo, o que é o feminino. O termo ginocrítica agrupa os estudos literários sobre as mulheres que propõem uma mudança nas bases teóricas da academia. A ginocrítica é, 1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso Cuiabá, Brasil 2 Professor Doutor do Departamento de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso e do Programa de Pós- Graduação em Estudos de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso Cuiabá, Brasil

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A GINOCRÍTICA COMO EXERCÍCIO DE METACRÍTICA EM NOVAS CARTAS

PORTUGUESAS

Natália Salomé de Souza1

Vinícius Carvalho Pereira2

Resumo: Os estudos feministas vêm ganhando espaço dentro da produção de conhecimento

social e acadêmico. Contudo, é possível observar que, na academia, o cânone da crítica é

composto majoritariamente por críticos homens, logo a construção cultural e intelectual baseia-se

numa tradição falogocêntrica. Neste trabalho, propomos traçar um caminho diverso do da crítica

canônica e observar como as mulheres constroem um conhecimento que enseja uma nova

perspectiva sociocultural e literária. Nesse sentido, compreendemos a crítica literária feminina

segundo o conceito de ginocrítica (SHOWALTER, 1981), o qual prevê uma tradição feminina de

crítica que se afasta do falogocentrismo e redefine, por exemplo, o que é o feminino. Para tanto,

tomaremos por base os estudos do feminismo da diferença, seguindo o conceito de escrita

feminina, de Cixous (2007), e a metáfora dos lábios, de Irigaray (1985). Nesse exercício de

crítica feminina, leremos a obra Novas Cartas Portuguesas, de Maria Teresa Horta, Maria Velho

da Costa e Maria Isabel Barreno, como um texto ginocrítico da obra Cartas Portuguesas, de

Mariana Alcoforado. Ao atribuir a um texto literário a dimensão de crítica literária, traçamos o

caminho da ginocrítica, buscando uma nova base teórica e poética que não seja pautada numa

herança da crítica dominante. É a crítica como poesia, a poesia como crítica, ou a poesia da

crítica.

Palavras-Chave: ginocrítica, crítica literária feminista, Novas Cartas Portuguesas.

Os estudos feministas vêm ganhando espaço dentro da produção de conhecimento social

e acadêmico. Contudo, é possível observar que, na academia, o cânone da crítica é composto

majoritariamente por críticos homens, logo a construção cultural e intelectual baseia-se numa

tradição falogocêntrica. Por isso, a necessidade de traçar um caminho paralelo ao da crítica

canônica e observar como as mulheres constroem um conhecimento que enseja uma nova

perspectiva sociocultural e literária. Nesse sentido, Showalter (1981) propõe o conceito de

ginocrítica, o qual prevê uma tradição feminina de crítica que se afasta do falogocentrismo e

redefine, por exemplo, o que é o feminino. O termo ginocrítica agrupa os estudos literários sobre

as mulheres que propõem uma mudança nas bases teóricas da academia. A ginocrítica é,

1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso –

Cuiabá, Brasil

2 Professor Doutor do Departamento de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso e do Programa de Pós-

Graduação em Estudos de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso – Cuiabá, Brasil

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portanto, fundamentada numa base feminina ao não se pautar na dominância do falogocentrismo,

de forma a criar essa nova tradição feminina nos estudos literários.

O que se propõe com a ginocrítica é exatamente, a partir da diferença sexual, se voltar

para a escrita feminina e produção literária de mulheres, a fim de traçar uma crítica que tenha por

objetivo estudar as produções literárias femininas, incorporando as diferentes facetas da

construção da mulher – cultural, social, econômica etc. Esses estudos ginocríticos se afastam da

crítica literária tradicional e dão vazão a uma nova possibilidade de crítica, em que a mulher e

sua produção sejam o seu foco. Para Macedo e Amaral (2005), a ginocrítica

força-nos a uma viragem conceptual, na medida em que, ao consideramos

a existência de uma tradição literária feminina separada da tradição

(masculina) existente, deixamos de contar com modelos masculinos

preestabelecidos para nos centrarmos sobre a questão essencial da

diferença (MACEDO; AMARAL, 2005, p.88).

Para Showalter (1981), enquanto a crítica científica lutava para manter-se afastada de

toda e qualquer subjetividade, a ginocrítica “reafirmava a autoridade da experiência”

(SHOWALTER, 1981, p. 181, tradução nossa). É dessa experiência do corpo e de todo o ser

mulher que falamos quando nos ligamos a uma tradição de escrita feminina.

O conceito de escrita feminina fornece uma forma de falar sobre a escrita

das mulheres que reafirma o valor do feminino e identifica o projeto

teórico da crítica feminista como uma análise da diferença.

(SHOWALTER, 1981, p.186, tradução nossa).

Dessa forma, quando Cixous (2007) postula uma escrita feminina que conclama as

mulheres para que escrevam com seus corpos, sem se pautar na definição ordenada pelo

falogocentrismo, ela dá vazão e espaço para que a matéria da ginocrítica se funde. Cixous

metaforicamente introduz a ideia de que a tinta da qual as mulheres se utilizam para escrever é o

leite materno, que se liga ao ápice do estado corpóreo de criação de uma mulher (CIXOUS,

2007).

Para Showalter (1981), a ginocrítica abarca quatro diferentes facetas do feminismo

(biológica, cultural, linguística e psicanalítica), sem deixar que uma se sobreponha a outra.

Quando a ginocrítica se refere a uma base biológica, está falando que “a escrita das mulheres

provém dos nossos corpos, que a nossa diferença sexual é também a nossa fonte” (BURKE,

1978, p.851, tradução nossa); ou seja, é muito mais um local onde procurar uma imanência do

que um destino pré-estabelecido, não deixando de fora outras performatividades que se

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identifiquem com o gênero feminino. Showalter ainda afirma que a “crítica feminista baseada

numa perspectiva biológica geralmente ressalta a importância do corpo como uma fonte

imagética” (SHOWALTER, 1981, p.188, tradução nossa). E é exatamente esta perspectiva da

escrita feminina que norteia o presente estudo, o qual toma o corpo feminino como imagem e

não como essência. Tanto na metáfora dos lábios de Irigaray (2005) quanto na ressignificação da

metáfora do útero a partir dos estudos feministas (PRICE, 1999), temos imagens que propõem o

corpo feminino como fonte de uma feminilidade. No entanto, não se desconsidera aí a carga

cultural, emocional, simbólica e econômica que se relaciona com essas imagens e com os corpos;

o que se propõe é a relação de positividade do corpo feminino.

O estudo das imagens biológicas na escrita feminina é útil e importante

na medida em que nós entendemos que fatores outros que não só da

anatomia estão envolvidos nelas. Ideias do corpo são fundamentais para

entender como mulheres conceituam sua situação na sociedade, mas não

pode existir expressão do corpo que não seja intermediada pelas

estruturas linguística, social e literária. A diferença na prática literária da

mulher, portanto, deve ser buscada (nas palavras de Miller) no ‘corpo de

sua escrita e não na escrita de seu corpo’. (SHOWALTER, 1981, p.189-

190, tradução nossa)

Recuperar nessas imagens do corpo feminino uma escrita do corpo ou um corpo da

escrita procede como ruptura no sistema falogocêntrico da escrita que relegava a mulher – por

não possuir o falo – a um lugar subalterno na sociedade. Uma das limitações do patriarcado é não

compreender que as mulheres possuem outros órgãos, fontes de poder, que podem ter o mesmo

peso simbólico, sem com isso excluir a importância do falo. Mas também sem deixar que o falo

seja borracha que apague a importância dos lábios/útero. É como se, ao propor novas metáforas

do corpo, inserindo o corpo feminino nessas metáforas, deixássemos de nos importar tanto com

se o que teremos é um pênis ou uma vagina, focando-nos no corpo da escrita e na sua

potencialidade de dominar e ultrapassar os binarismos a ponto de se desfazer deles.

Nessa perspectiva, lemos aqui a obra Novas Cartas Portuguesas como exercício

ginocrítico a respeito do clássico Cartas Portuguesas; ou seja, lemos a crítica literária feminista

que essa releitura enseja através de uma textualidade literária híbrida – que mescla em si

diferentes gêneros literários – escrita por mulheres. Ao atribuir a um texto a dimensão de crítica

literária, proponho o traçado do caminho da ginocrítica – buscamos uma nova base teórica e

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poética que não seja pautada numa herança da crítica dominante. É a crítica como poesia, a

poesia como crítica, ou a poesia da crítica.

Nesse exercício de ginocrítica, a obra Novas Cartas Portuguesas, de Maria Teresa Horta,

Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno, lançada pela primeira vez no ano de 1972, em

Portugal, será nossa guia. A obra conta com 120 textos (cartas, poemas, ensaios, textos

narrativos, bilhetes etc.) que foram escritos pelas mãos das três autoras, mas sem que se saiba a

autoria de cada texto específico. O livro das três Marias tem como ponto de partida a obra Cartas

Portuguesas, cuja autoria é atribuída a Mariana Alcoforado – mais conhecida como Sóror

Mariana Alcoforado3 na história da Literatura Portuguesa – e tem como data de publicação o ano

de 1669.

Segundo a história, as cinco cartas que compõem a obra teriam sido enviadas ao oficial

francês Chamilly depois da estadia deste no convento de Beja, onde serviu em Portugal durante a

guerra da Restauração. Estando no mesmo convento onde Mariana Alcoforado vivia desde os

onze anos, os dois teriam desenvolvido um relacionamento que findou com a partida do oficial

para sua terra natal. Mariana, abandonada por seu grande amor, escreve as cartas que, segundo

Massaud Moisés (2006), são dignas de nota:

por sua altitude e invulgaridade, o fato de conterem as cartas a sincera,

franca e escaldante confissão duma mulher que se desnuda interiormente

para o amante cínico, ingrato e ausente, com fúria de fêmea abandonada,

sem qualquer rebuço ou pudor (MOISÉS, 2006, p.50).

Nota-se com a discussão do autor que o que se deveria enaltecer acerca da obra é uma

suposta atitude de mulher – ou “fêmea” – que, apesar do sofrimento infligido pelo amante,

mantém-se “altiva e invulgar” apesar de seu relacionamento erótico ser considerado imoral à

época. Mas essa elevação da freira-amante é o que torna possível a exploração do corpo de

Mariana pelo cavaleiro, uma vez que o “amor é a única circunstância na qual a mulher é

(ideologicamente) perdoada pela atividade sexual” (MILLETT, 2000, p.37, tradução nossa),

3 Nota-se que a crítica literária tradicional sempre se refere à Mariana Alcoforado como sóror. Entendemos que o

fato de se referir a ela a partir de seu título religioso caminha no sentido de elaborar uma função-autor

(FOUCAULT, 2001) em que se valoriza o amor daquela que deveria negar a carne e, ainda que tenha se rendido aos

prazeres do corpo, acaba se redimindo ao exercer sua função religiosa até o final da vida. Nesse sentido, escolhemos

não tratar Mariana por seu título eclesiástico, mas nomeá-la apenas com seu nome, pois a função-autor

(FOUCAULT, 2001) que pretendemos ressaltar nessa obra é a de mulher, num movimento em que se fortaleça essa

comunidade e não a individualidade da voz-autoral como mestre, indivíduo.

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fazendo com que a invasão do cavaleiro seja conveniente para os dois e ele não precise sofrer as

consequências dessa “profanação” do corpo entregue ao santificado “Filho”. A crítica de

Massaud Moisés é machista por valorizar e confirmar um estereótipo feminino de mulher

hormonal, passional e próximo do animalesco – “fúria de fêmea abandonada” (MOISÉS, 2006,

p.51) –, ao retirar da mulher a sua capacidade de raciocínio, julgamento e poética. A ginocrítica

caminha por outro caminho que não valoriza esse estereótipo e que coloca a mulher na posição

de agente de si, ou seja, exercendo suas faculdades mentais com plenitude evidenciando,

inclusive, a sua atuação consciente da situação cultural e econômica vigente.

As cartas de Mariana Alcoforado foram publicadas primeiro em França, depois na

Alemanha e daí para todo o mundo, despertando o interesse de grandes pensadores e poetas,

como Rainer Maria Rilke, Sthendal, Camilo Castelo Branco, Sptizer, Racine e Rousseau.

Maravilhados com obra de tamanha importância literária, tais escritores mantiveram discussões

sobre a autoria desses textos, em virtude de seu conteúdo: alguns acreditavam que uma

portuguesa não teria faculdade de expressar tão brilhantemente seus sentimentos de forma

literária; outros duvidavam de que uma mulher tivesse a capacidade de escrever um texto de

tanta qualidade e verdade acerca do universo sentimental. Massaud Moisés, que atribui a autoria

das cartas a Mariana Alcoforado, ressalta que “a epistológrafa mergulha cada vez mais num jogo

dilemático, paradoxal, como pede a típica psicologia feminina e a própria essência do Barroco”

(MOISÉS, 2006, p.90). Legitima-se, assim, a autoria de Mariana Alcoforado sobre as cartas,

mas, ao mesmo tempo, mantém-se um estereótipo do que se espera de uma mulher.

Objeto recorrente da crítica literária, a obra foi analisada não apenas em relação à autoria,

mas também em relação à materialidade de seu texto, como no estudo de Dal Farra (2007), que,

entre outras, demonstra as características da epistológrafa delineando-a enquanto personagem

ficcional da obra entre as imagens de “grave pecadora – como aquela que pode ser dita idólatra

ou herege” e de “profanadora, porque Mariana comete a falta dentro dos sagrados muros do

convento” (DAL FARRA, 2007, p.27). Ainda dentro destas imagens, Dal Farra (2007) celebra a

emancipação feminina promovida pelas cartas, pois Mariana quebra a clausura do silêncio para

exercer a sua voz na manifestação do interdito, a fim de expor claramente

as suas prerrogativas de mulher, que levanta contra a ordem instituída. E

ela se mostra ainda mais ousada porque o faz justo através de um

instrumento considerado culturalmente masculino: a escrita, de que ela,

como mulher, se apropria (DAL FARRA, 2007, p.28).

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É curioso notar a ambivalência da crítica literária diante dessa obra: quando advinda de

um homem (como Massaud Moisés, 2006), a discussão se dá em torno de uma representatividade

feminina condizente com o lugar que a mulher pode ocupar na sociedade – ainda que freira

falando de seu pecado amoroso.

Escrita por uma mulher, que alcança dizer com rara precisão os transes

íntimos (via de regra mantidos ocultos ou disfarçados pelo comum das

mulheres), as Cartas ganham maior relevo ainda como documento

“humano” e literário precisamente por não visarem à publicação nem a

ser encaradas como peça literária (MOISÉS, 2006, p.90);

Mas, quando lemos uma crítica produzida por uma mulher (neste trabalho representada

por Dal Farra), temos a visão da subversão da escrita e da imposição da voz, ainda que

levantadas as questões de representação feminina dentro da sociedade patriarcal.

Por meio da redação das suas cartas, a voz de Mariana se faz ouvir, bela,

audaciosa, reclamante, irreverente, debatendo-se contra a sociedade na

qual está inserida por nascimento; voz insurrecta que se rebela contra o

que lhe foi imposto e que, não podendo fugir ao estado de cativeiro em

que se encontra no claustro, reluta produzindo a sua libertação por meio

do engendramento literário de sua dor. (DAL FARRA, 2007, p. 28)

Isto posto, gostaríamos de ressaltar que as reflexões expostas acima são apenas uma

pequena parte de uma vasta fortuna crítica em relação à obra Cartas Portuguesas, cujo

levantamento exaustivo passa ao largo dos objetivos deste artigo. A proposta de estudo que aqui

desenvolvemos é a de ler em Novas Cartas Portuguesas, das três Marias, uma metacrítica

poética de Cartas Portuguesas, ensejando procedimentos ginocríticos.

Segundo Amaral (2010), a obra se torna importante

justamente pelo peso simbólico de que se revestia a figura de Mariana e

pela imagem feminina que delas [das cartas] emergia: o estereótipo da

mulher abandonada, suplicante e submissa, alternando entre a adoração e

o ódio, e praticando um discurso de paixão avassaladora por aquele (o

cavaleiro) que se apaixonara também, mas partira depois, para não mais

regressar. É esta relação de amor e devoção, de subserviência e

autovitimização que as três autoras, três séculos depois, aproveitando-lhe

os contornos mais gerais, vão desmontar e re-montar, estilhaçando

fronteiras e limites, quer das temáticas, quer da própria linguagem.

(AMARAL, 2010, p.4)

Neste sentido, o livro das três Marias, apesar de ter como matriz a obra de Mariana, não

se limita apenas a uma reescrita, irrompendo como ato político e poético subversivo. A

publicação do livro rendeu às autoras um processo judicial e elas tiveram seus volumes

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apreendidos pelo governo salazarista de Marcelo Caetano. A ação judicial se deu em virtude de a

obra ser considerada perniciosa e, portanto, ferir as regras da moral portuguesa da época. É

importante notar que a obra polemiza o papel da mulher na sociedade e seus estereótipos, bem

como faz uma reflexão criticando as investidas da guerra colonial portuguesa ultramarina,

dialogando com um discurso feminino do cânone literário português, o que desencadeou no

processo judicial.

Nas palavras das nós-líricas (SOUZA, 2015)4, encontramos um posicionamento em

relação ao empreendimento de escrita: “Foi dita a gravidade dessa empresa, luta de vida, o que

em nosso tempo e nosso sítio não é tido por legítimo, nem por defesa.” (BARRENO, HORTA,

COSTA, 2010, p.122). Ou seja, essa redescoberta do ser mulher e de mudar a sociedade é uma

luta de vida que, naquele contexto espaciotemporal, não era legitimada.

Na crítica tradicional acerca das Novas Cartas Portuguesas, temos mais uma vez as

palavras de Massaud Moisés (2007), para quem a obra é uma

refacção, atualização e modernização das Cartas de Amor, de Sóror

Mariana Alcoforado, que deram às autoras escandalosa notoriedade,

mercê da polêmica e do processo policial desencadeados (MOISÉS,

2006, p.303).

O crítico apresenta a obra como uma “releitura” e não como uma nova obra que tem

como intertexto as Cartas Portuguesas, sem pretender realizar sua “refacção” ou

“modernização”, mantendo assim a obra dentro da lógica falogocêntrica.

Por sua vez, a edição anotada de Novas Cartas Portuguesas conta com a “Breve

Introdução”, de Ana Luisa Amaral. Nesse trecho, a autora descreve a obra e a insere nos

contextos de sua publicação e dos dias atuais, discorrendo sobre a importância que a obra teve

mundialmente. Nessa exposição, ressalta que o processo movido contra Maria Teresa Horta,

Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno fez com que houvesse um movimento global em

prol delas, e a sua repercussão mundial foi considerada a “Primeira causa feminista

internacional” (AMARAL, 2010, p.9). Podemos encontrar esta força feminina na materialidade

da própria obra, como lemos no poema Eis-nos, em Novas Cartas Portuguesas.

Diária é a escolha

o movimento insano

4 O uso do termo “nós-líricas” faz mais sentindo nessa obra devido à sua autoria difusa e coletiva que, nos

encaminhamentos desta discussão, cumpre uma função-autor (FOUCAULT, 2001) de coletividade feminina.

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o sossego manso e mais pesado

daquilo que desperta e não quebramos

daquilo que rasgamos

e dobramos

carta por carta em seu perfil exacto

Fêmeas somos

fiéis à nossa imagem

oposição sedenta que vestimos

mulheres pois sem procurar vantagem

(BARRENO; HORTA; COSTA, 2010, p.105-107)

As vozes-líricas inserem-se num novo perfil feminino que só diz respeito a elas mesmas e

que não é definido dentro de uma lógica única de significantes, pois as escolhas de mudança, as

transformações da mulher, ocorrem a cada novo momento, como nas palavras das nós-líricas:

“Diária é a escolha/ o movimento insano”, ou seja, não há definição que não possa ser

modificada, não há estaticidade no movimento de ser mulher. Redefinirem-se dentro do que faz

sentido para elas próprias é parte da forma feminina de apreender a vida.

As mulheres compartilham um mundo que as nós-líricas apresentam no poema a partir da

repetição de “daquilo que”. Essa reiteração nos faz entender que “aquilo” refere-se a alguma

coisa que é compartilhada apenas entre elas, como mulheres, e que não é necessariamente

acessível àqueles que leem o texto. Nesse excerto do livro, sem evidenciar a questão da autoria

do texto matriz, mas problematizando a sua representatividade feminina, as vozes-líricas rasgam

e dobram as cartas que tentam aprisioná-las dentro de um estereótipo de mulher. Dessa forma,

podemos inferir que a obra caminha num movimento oposto àquele definido por Massaud

Moisés (2006) – aqui tomado como representante da crítica dominante: não há refacção de

Cartas Portuguesas, pois estas são novas cartas, novas mulheres – não aquelas que

representavam a mulher portuguesa para a sociedade do falo.

Novas Cartas Portuguesas, escrita a seis mãos femininas, será entendida aqui como

ginocrítica traçando uma subversão interpretativa da crítica. A obra tem a força de encorajar e

estabelecer a ginocrítica, sem que, com isso, a delineie milimetricamente, pois o espaço da

ginocrítica é o do movimento constante (“o movimento insano”). Não tentaremos, dessa forma,

definir padrões e cânones, para não cair na lógica patriarcal do falo, uma vez que é exatamente

essa lógica que a ginocrítica não quer ter como referência. Observaremos nesse artigo como se

manifesta a questão do gênero epistolar.

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O gênero epistolar que dá nome às obras é ponto importante no exercício ginocrítico

perpetrado em Novas Cartas Portuguesas. Em princípio, esse gênero é praticado socialmente

com o objetivo principal de comunicar algo a outrem que não compartilha do mesmo tempo e

espaço que o locutor. Portanto, uma carta se reveste de uma importância momentânea que só terá

sentido para emissor e receptor, haja vista a dimensão íntima em que circulam as epístolas, com

claros nomes de remetente e destinatário a circunscrever o ato comunicativo. Mas, segundo

Rocha (1965), o formato epistolar, no que concerne à literatura, perde tais características

pragmáticas para servir apenas de pretexto para que se discorra sobre algum tema, como nas

palavras do eu-lírico de Cartas Portuguesas: “Descobri que lhe queria menos do que à minha

paixão” (ALCOFORADO, 2007, p. 66). Homem amado como pretexto para a paixão; carta,

pretexto para fazer poesia. Ou ainda: carta – pretexto para falar de literatura.

Nas cartas de Mariana Alcoforado, observa-se que o remetente, embora esteja claramente

marcado no conteúdo enquanto interlocutor, está ausente. Nas cartas das Marias (e nos outros

gêneros que nelas se inserem), o remetente é sempre uma possibilidade aberta, pois, ainda que

muitas vezes o interlocutor seja enunciado, “Considerai, irmãs minhas,” (BARRENO; HORTA;

COSTA, 2010, p.157), “Por isso, irmã, foi a ti escrita a carta” (BARRENO; HORTA; COSTA,

2010, p.241), “Irmãs, vos quero dizer da crueldade” (BARRENO; HORTA; COSTA, 2010,

p.388), não se recupera no texto quem exatamente são essas irmãs, o que nos leva a pressupor

que são todas as mulheres. Esse expediente discursivo em Novas Cartas Portuguesas está em

consonância com a elaboração de Rocha (1965) ao asseverar que, quando se trata de um gênero

epistolar literário, o autor do texto pode até ter um público em mente, mas as suas cartas serão

sempre abertas, ao contrário do autor de uma epístola real, na qual a escolha do remetente

direciona sobremaneira a escrita.

Traçam-se, dessa forma, algumas diferenças epistolares entre Mariana Alcoforado e as

Marias. Ainda que Mariana Alcoforado tenha sido usada para que as Cartas Portuguesas

ganhassem uma “realidade forjada”, o destinatário se faz presente de forma indiscutível: é o

cavaleiro de Chamilly. Este destinatário nos faz pensar que as cartas, em verdade, existiram e

que não visavam à publicação ampla. Elas tratam, afinal, de um foro íntimo.

As Marias, no movimento contrário, corresponderam-se com o intuito de tornar suas

discussões públicas, emprestando pena e tinta às mulheres que com elas se identificaram.

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Segundo Rocha (1965), há uma necessidade de haver algo em comum entre destinatário e

remetente para que o diálogo epistolar seja possível. Enquanto em Cartas Portuguesas a relação

de identidade da carta se dá pelo relacionamento amoroso entre remetente e destinatário, em

Novas Cartas Portuguesas podemos perceber uma proximidade de discussão política e revolução

social, simbólica e literária partida das Cartas Portuguesas de Mariana.

Quando lemos as cartas das Marias, percebemos que elas são, em verdade, rizomas

(DELEUZE; GUATTARI, 1990) e nessa qualidade não apresentam um endereçamento único,

pois a função de um rizoma é sempre encontrar diversas saídas para o que se coloca. Num

movimento vampiresco multidirecional (DELEUZE; GUATTARI, 1990), as autoras se

alimentam de suas próprias cartas – aquelas que trocaram entre si no processo de gestação da

obra e que fazem parte dessa ginocrítica – e das cartas de Mariana, em Cartas Portuguesas, para

terem forças para escreverem as novas: aquelas que ficcionalizam Mariana Alcoforado. Esse

movimento contínuo abre caminhos, passagens, para outras discussões que nunca têm um cerne,

uma porta central e muito menos uma origem. Cartas como rizomas que se multiplicam sem

nunca chegar a um final.

Assim, as autoras de Novas Cartas Portuguesas usam o gênero epistolar não apenas

como um gênero literário, mas também como um gênero de crítica literária. Elas abrem o leque

de possíveis remetentes e, apesar de aludirem ao gênero no título de sua obra, sabemos que,

diferentemente de Cartas Portuguesas, não é só de cartas que é feita esta crítica. No entanto,

encontramos nas cartas endereçadas “às mãos que tecem a obra” – e por extensão a todas as

mãos femininas, – a parte mais central de crítica, onde as eu-líricas (SOUZA, 2015) discorrem e

discutem sobre suas visões de mundo a partir do diálogo intertextual com as cartas de Mariana.

Segunda Carta IV

E não temos misericórdia. Nem branda a voz: jamais o fato lilás te

adoçará o rosto, ou a ti o azul da tinta nas pálpebras te adoçará os olhos.

De Mariana tiramos o mote, de nós mesmas o motivo, o mosto, a métrica

dos dias. Assim inventamos já de Mariana o gesto, a carta, o aborto; a

mãe que as três tivemos ou nunca lhe damos (...) Geralmente a mulher

que dê provas, o homem que as receba. Para isso, entre tantas outras

coisas, se nasceu macho e fêmea. Que mesmo Mariana ao dizer ter

recebido provas de amor de seu amante, era as suas próprias provas que

gabava, não as dele, valorizando-as assim, entregando-as ao cavaleiro

francês como atestado de seu deslumbrado amor, desvario, fitando dele

receber em troca o mesmo. (...) Mitos defloramos e desfloradas fomos de

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consentido. Porém de consentidas não nos tomem. Me tomem. Me tomes.

Se tome Mariana que em clausura se escrevia, adquirindo assim sua

medida de liberdade e realização através da escrita; mulher que escreve

ostentando-se de fêmea enquanto freira, desautorizando a lei, a ordem, os

usos, o hábito que vestia.

(...) 1/4/71 (BARRENO; HORTA; COSTA, 2010, p.190-197).

Nesse trecho da “Segunda Carta IV”, encontramos as discussões que perpassam Mariana

e todas as mulheres: a ferocidade da verdade feminina que não é abrandada com a beleza, ou

seja, o que é considerado belo não interfere no que é a realidade feminina; o uso do mote de

Mariana para falar da condição da mulher e não especificamente desta mulher a quem se atribui a

autoria das Cartas; as funções designadas a “macho” e “fêmea”; o amor e o sentimento amoroso

que tem fim apenas em si; e a libertação da clausura através da escrita que subverte e não se

prende às leis (impostas ao corpo pela sociedade e pela religião ). As autoras se valem da obra-

mote e do gênero para fazer uma grande crítica social e literária.

Considerações

Na leitura de Novas Cartas Portuguesas como ginocrítica, empreendemos a tentativa de

proceder a uma ruptura do sistema falogocêntrico no qual a crítica literária dominante se baseia.

O traçar de um caminho paralelo ao da crítica dominante através de uma construção de

conhecimento que enseja uma nova perspectiva sociocultural e literária é necessário para que se

possa construir uma tradição feminina dentro dos estudos literários. Dessa forma, ao atribuirmos

a um texto literário de escrita feminina a dimensão de crítica literária, traçamos o caminho da

ginocrítica, buscando uma nova base teórica e poética que não seja pautada numa herança da

crítica dominante. É a crítica como poesia, a poesia como crítica, ou a poesia da crítica.

Referências

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AMARAL, Ana Luisa. Breve Nota. In.: BARRENO, Maria Isabel; HORTA, Maria Teresa,

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BARRENO, Maria Isabel; HORTA, Maria Teresa, COSTA, Maria Velho. Novas Cartas

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3 (Summer 1978).

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Dissertação de Mestrado. Programa de pós-graduação em estudos de linguagens. Instituto de

Linguagens. Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, 2015.

Gynocritics as an exercise of meta-criticism in New Portuguese Letters

Abstract: Feminist studies are gaining ground in the production of social and academic

knowledge. However, within academy the critic canon is still mainly composed by men as

critics, therefore cultural and intellectual productions are based on a phallogocentric tradition. In

this study, we propose to draw an alternative path to canonical criticism and to observe how

women build knowledge that aims at a new sociocultural and literary perspective. In this sense,

we understand feminine literary criticism according to the concept of Gynocritics

(SHOWALTER, 1981), which consists of a female critical that rejects phallogocentrism and

redefines the feminine, for example. Hence, we are grounded on studies about difference

feminism, according to the concept of feminine writing, by Cixous (2007), and the lips metaphor,

by Irigaray (1985). In this exercise of feminine criticism, we will read the book New Portuguese

Letters, by Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa and Maria Isabel Barreno, as a gynocritic

text about the book Portuguese Letters, by Mariana Alcoforado. As we assign a literary text with

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a literary critical dimension, we draw a gynocritic path seeking a new theoretical and poetical

foundation which is not based on the inheritance of dominant criticism. It is criticism as poetry,

poetry as criticism or the poetry of criticism.

Keywords: Gynocritics, Feminist Literary Criticism, New Portuguese Letters.