A história da alimentação

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  • 5/14/2018 A histria da alimentao

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    A Historio do A lim en tocc3o : bo lizoshistor iogr6f icos

    Ulpiano T.Bezerra de MenesesDepartamento de Historia - FFLCH/USP

    Henrique Carneiro.Doutor em Historia Social / USP

    lntroducooEste texto nco pretende realizar um levantamento ponorornico do

    Histone do climentocoo, muito menos fornecer um repertorio biblioqrolico. Aindelinicdo e plasticidade e a ubiquidcde do tema, sua extensoo universal, amultiplicidade de abordagens, a amplitude (no quantidade enos graus dequalidade) dos trabalhos publicados tornam invi6vel uma biblioqrolio que sepretenda abrangente, ainda que nco exaustiva. E, mesmo, talvez, de utilidadeproblem6tica.

    Assim, 0 objetivo e antes caracterizar um campo de estudos que,nesta segundo metade do seculo. vem assumindo certa personalidade propria,nco so nos dominios do Historic (nosso foco principal de interesse), mas tombernnos demo is ciencios sociais. Longe de nos pretender, com isso, dar statusepisternoloqico a Historio do Alirnentocoo. Nao se trata de aumentar 0 elencodas multiples 'histories' em que a discipline se vem fragmentando, perdendo devista 0principio de que, se a Historic nco tiver como objeto essencial de otencooa sociedade como tal - a sociedade como um todo -, lorcosornentecomprometer6 sua capacidade de produzir conhecimento (00 inves de simplesinlorrnocoo] e entendimento dos fenomenos e seus atributos.

    No entanto, e Iorcoso reconhecer que a pr6tica do Historicorganiza suas necessidades e conveniericios em torno de certos referenciais,plataformas, problemas, recursos, orticulccoes com outras disciplines, hobitos

    Anais do Museu Paulista. Sao Paulo. N.Ser.v.5, p.9-91- jan./dez. 1997

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    - e ate modas -, que constituem efetivamente olqo proximo do nocoo decampo proposta por Bourdieu.

    E a forma

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    culincrio (a 'cozinha'l, os espa

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    tiveram um papel desbravador no fornecimento de dados hlstoricos das plantasalimentfcias. Nao nos esquecornos que muitos herborios do seculo XVI sechamavam justamente 'Historlo das plantas' (D e H istoria S tirpium , de LeonhardtFuchs, 1542) ou "Historic dos frutos" ( F ru gum H is to ria , de Rembert Dodoens,1552L por exemplo.

    As ciencios modernas relacionadas a nutricoo desenvolveram-se apartir do seculo XIX, com um coroter interdisciplinor, reunindo os ovoncos obtidosem diferentes ramos das ciencios naturais juntamente com os da Medicina(Agronomia, tecnologia alimentar, analise quimica de alimentos, Fisiologia,Bioquimica, Toxicologia, Microbiologia, Patologia, Epidemiologia e Cenetico,entre outras). Por volta de 1850 e que corneco a desenvolver-se tal genero deestudos, principalmente na Froncc. na Alemanha e na Holanda, acompanhadode sistemas de coleta de dados, em ambito nacional.

    Os objetivos da pesquisa bioloqico. com enfase na nutricco. foramassim delinidos por Teuteberg (1992: 2):

    "Nutritional research is supposed to examine the processes of digestion within thehuman body and to gather data for an optimal diet which c_anbe modified accordingto age, gender and the amount of work humans do. Of special importance is thesearch for a sound basis for a dietary treatment for diseases of the metabolic, digestive,and excretive processes, and progess towards optimal food conditions, determined byclinical research".

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    Cumpre notar que, por muito tempo, nesta area, os pesquisadoresraramente se interessaram por questoes fora do ambito bioloqico, constituindo umdominio de alta cornperencio. mas excessivamente circunscrito, como nacorocterizocco de Teuteberg a esta dirnensco bioquimica da olirnentocdo. vistaapenas como um processo orqonico e rnetobolico.

    Mas ja no seculo XIX, estudos de Medicina procuravam determinarimplicocoes historicos. Eo caso, por exemplo de Watt, Freeman e Bynum (1881)que, ao estudarem a fome cronico dos marinheiros, trataram de estabelecer aintluencio da nutricdo na historic maritima e naval.

    Doutra parte, a necessidade que outras disciplines sentiram de umapoio bioloqico ho algum tempo cornecou a estabelecer pontes, ainda queossirnetricos. Em 1983, por exernplo. Scrimshaw publicava um artigo destinadoa reolcor a lrnportoncio do conhecimento nutricional para os historiadores. Maistarde apareceram ate mesmo instrumentos de dilusdo, como a obra de HaroldMcGee (1988), que procura transmitir aos nco especialistas relerencios bosicosde Botanica, Zoologia, Fisiologia, Bioquimica, apontando as propriedades dernoterios-primos e suas cornbinocoes (leite, carnes, ovos, olcool. qroos, legumes,etc.], os efeitos de rnetodos e equipamentos de cozinha e assim por diante.

    Desse contacto com as ciencios sociais criaram-se areas deinvestiqccoo e otuocoo interdisciplinar, como, nos Estados Unidos e na Europa,a ja mencionada Antropologia Nutricional (Freedman 1977, Wilson 1979,Fieldhouse 1986). Faia-se tombern de uma Psicofisiologia e de uma Biopsiquiatriada olirnentocoo, assim como de Nutri

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    Ho]e nco se contesta que os grandes problemas de base biol6gica ncopodem ser encaminhados apenas no ambito restrito do nulricoo. Basta apontaralguns temas criticos - fome e patologias alimentares, seguran

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    a orqcnizccdo socioecon6mica do grupo, que implica a possibilidcde de posse,heronco. troca, cornercio. etc. (Ducos apud Clutton-Brock 1989; ver lornbernVialles 1994). Na mesma linha, estudos de dornesticocoo de plantas nco apenasenformam 0 conceito de 'sociedade agricola', como, ainda, e melhor, 0 de'sistemas especilicos de explorccoo agricola', entendidos como sistemas socio-tecnicos (Leaf 1996: 32).

    Em nossos dies se trata correntemente a odocco ou rejeicoo dealimentos como tendo mais a ver com sua considerocoo social do que com suaspropriedades nutritivas. Burguiere (1986: 10) lembra as di l iculdcdes com quecertos alimentos foram introduzidos na Europa, embora posteriormentedesempenhassem papel relevante, por seu valor nutritive. principalmente emtempo de fome. Assim, 0 milho, cuja origem indigena suscitou "une reaction derepugnance", ou a batata, cujo "anoblissement social" se deveu a ocoopromocional de Parmentier. De igual modo, a castanha, alimento de bom teornutirtivo e muito importante na Europa do sudoeste ate 0 sec.XIX, olern de poucocustosa na producco e na demanda de rnoo-de-obro. entra em declinio pelaimagem de pobreza e de atraso com a qual passa a ser associada.

    De mesmo teor, 0 gosto nco pode ser tratado como exclusivoproblema bioloqico - apesar da importoncio fundamental que 0paladar exerce,principalmente como sentinela do organismo; 0 sober amargo, por exemplo, eindicio de olcoloides. substoncio texico que cumpre evitar; j6 0sober doce indicaa presen

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    de vida - alem de favorecerem inurneros tendencies psico-potoloqiccs (Teuteberg1992:6, Garine 1994: 238).o enfoque econ6mico

    Ao contra rio do enfoque examinado ate agora, e no campo doHistoric que se concentam os estudos de alimentos em que predomina 0interesse economico.

    Com efeito, ate mais que no Antropologia, foi no Historlo (ou comprespectiva historical e, secundariamente, no Geografia, que se produziramabundantes trabalhos sobre a obtencco e utilizocoo de um dado alimento, numaepoco ou contexto dodos, explorando-se, ainda, seu processamento, consumo einqestoo. aramazenamento, transporte, cornerciclizccdo e distribuicoo. Noverdade, a producoo, preparo e utilizocoo dos alimentos, como observa Valeri(1977: 347) e "il piu antico e fondamentale processo economico".

    Nos ultimos vinte, trinta anos, como ja se disse em particular quantaa Fronco (Barlosius 1992), foi a descoberto pelos historiadores, do culturamaterial que fomentou os estudos de olirnentocoo. Claro esto que G nocoo de'civilisation molerielle utilizada pela historiografia dos Anna/es e, a seguir, pel aN ou velle H isto ire , nco coincide com as propostas que ho]e caracterizam estecampo (comparar, por exemplo, uma visco tao estreita e tacanha como a dePesez 1988, com 0 quadro amplo, embora por vezes incompleto, troccdo porPoulot 1997). Assim, cumpre reconhecer 0 debito implicito com a categroiamarxista de infraestrutura, 0 que em grande parte [ustihco a forte marcoeconomico de uma Historic que vai preocupar-se com a producco, sobretudo aproducco agricola, a ponto de se ter podido falar de uma Agrohistoria,acoplada a uma historic do abastecimento. Abastecimento, safras, precos.mercados e suas llutuocoes diversas sao algunsitens que mreceram destaque.Em conseqiiencio, afirma-se a necessidade de consultar orcrnentos e dodoscensitorios e investigar as tecnicos de oquisicoo. consumo, circulocoo. tansporte,as carestias e fomes. Contextos, em especial os do urbcnizocoo eindusfticlizocoo. tombem mereceram otencoo particular. (Burnett 1989, Cepede& Lagelle 1954, Teuteberg & Wiegemann 1972).

    Por certo que a distcncio e mais foci! identihcor as lirnitccoes dessaabordagem, que eventualmente ocorreram, quando se ignoraram ou minimizaramcautelas hoje consideradas fundamentais: a necessidade de trabalhar comsistemas e complexos inteiros, ou de considerar vorioveis como 0 cotidiano e asfestas, a olirnentocoo humana e a animal, a producoo domestico e suas formasde distribuicoo (via parentela, vizinhonco etc.). Se as fontes para esteslenornenos "que fogem do contobilidode formal", como se tem apontado, saomais escassas para a Historic. nco ho como negar 0desinteresse das pesquisassocioloqicos, ontropoloqicos e qeoqroliccs. que dispunham de situocoo maislcvorovel, a esse respeito.

    Releva notar que no Antropologia, talvez mais que no Historic, foipossivel conceituar com bastante rigor alguns lenornenos bosicos de corotereconornico. inserindo-os no contexto socio-cultural adequado. E 0 coso dos

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    sistemas agricolas, em que 0 estudo do terminologia revelou graves distorcoesprincipalmente nos taxonomias de base geralmente emocenmco:

    "While 'gardening' and 'farming', 'horticulture' and agriculture' are appropriate todiscussing the development of these activities in Southwest Asia and Europe, even in that'home territory' these terms can imply a greater complexity in food production systemsthat may have existed. The agricultural threshold may lie within the Neolithic rather thanmark its commencement. For the rest of the world, we should iustify the applicability ofwestern terms like 'agriculture' and 'horticulture' before employing them to describerecent or ethnographic practices, and consider adopting new or neutral terms whendiscussing origins" (Helen Leach 1997: 146).

    Um exemplo de inodequocco e dado pela propria autora quando,citando Harris e os estudos de Malinowski sobre horticultores do Oceania, apontacomo enqonoso a expressco produtores'. que deveria ser substituida pela de'porceiros'. em vitude do tipo de relocoo de 'ornitie respectueuse' mantida entreo homem e 0meio ambiente.

    Nesse quadro poder-se-ia supor que a otencoo dada a cultura materialteria produzido bons estudos sobre espocos. utensilios ou equipamentosenvolvidos no olimentocco. Isto, porern. nco ocorreu, nern de forma sistematica,nem abrangente. Ha, sirn. explorocoes tecnoloqiccs, como as de Braudel(1970), ou inventories rnonoqroiicos. muitas vezes puramente descritivos eclossiiicotorios. como, por exemplo, os raros estudos sobre talheres (Giblin 1987,Strung 1976) ou sobre equipamentos de aparato de determinados periodo(Rainwater 1983), etc .. Mas e so recentemente que a Antropologia e aSociologia, olern do Hislorio, introduziram nos estudos de olirnentocco dirnensoesdo artefato alem do econornico. Convern assinalar, todavia, 0 numero coda vezmaior de estudos vinculados as tecnologias de producco, dada a irnportoncioassumida entre nos pelos alimentos sinteticos. pela bio-tecnologia, etc.(relerencios em Mennell et alii 1992: 71-2).o enfoque social

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    o enfoque social, como se pode ter opreendido acima, ereconhecido ho]e como inerente a qualquer estudo de qualquer aspecto doolirnentocco. Com efeito, a rede de interrelocoes que 0 alimentoobrigatoriamente evoca transforma-o, no expressco de Johan Pottier (1996:238), num "most powerful instrument for expressing and shaping interactions ... arepository of condensed social meanings".

    Embora esse entendimento possa ter raizes ia no propro constituiccodo Sociologia e do Geografia Humana, e sem duvido no segundo metade doseculo que se consolida este enfoque, 0 qual, a partir do deccdo de 70, vaiceder a primazia 00 cultural.

    Duos obras podem ser apontadas para amostrar as grandes linhas. Aprimeira e 0 estudo clossico sobre a batata, de R.Salaman (1a.ed. 1949), querepresenta os trabalhos centrados no alimentol olirnentocoo mas procuramdesvendar seus conteudos sociais. Como vem no titulo, 0que 0autor pretende etrabalhar "a historic e a Inlluencio social do batata". Seu eixo de otencoo,portanto, e um alimento, sua origem, seu transplante para a Europa, as condicoes

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    e diliculdcdes de sua oceitccoo e dilusco. os aspectos de suprimento e asllutuocoes no resposta a fomes e corencics. nos quais desempenhou popelfundamental, como no famoso coso do Irlanda no seculo passado ..

    Uma segundo obra sao os dois trabalhos de Sidney Mintz sobre 0ocucor (1986, 1996). No verdade, 0 que ele est6 efetivamente estudando e asociedade capitalista, num espoco de quase dois seculos. utilizando-se do historicdo ccucor como plataforma de observocoo. 0 vasto panorama que ele montouse compos das conclusoes a que pode chegar examinando as condicoes deproducoo do ccucor nos colonies, as repercussoes de sua dependencio dotrabalho escravo (um dos 'pecados do escrovidoo'] e a explorccoo moraldecorrente, as funcoes nutricionais, medicinais e luxu6rias do acucor, seu popelno imagin6rio enos clossiiicocoes sociais e no emergente sociedade de consumoe a construcco de uma nova subjetividode, a orqonizccoo do mercado, nco socomo mercadoria, mas tornbem como primeira necessidade exotica, produzidaem massa, para uma cia sse oper6ria. Em sumo, como i6 se disse. 0 ocucorfuncionou como uma met6fora para articular os diversos agentes socia is e darinteligibilidade a interocoo entre eles.Num contexto socio-politico poderiamos incluir os trabalhosrelativamente raros que consideram 0 tema sob 0 ongulo do poder, como noestudo que John Super (1988) fez do popel do olimentocoo no processo deconquista e colonizocoo do America espanhola, no seculo XVII, ou, enkio,aqueles que giram em torno das politicos alimentares (McMillan, ed. 1991).o enfoque cultural

    Este enfoque nco ignora a necessidade fisica do olirnentocoo. masdesloca decisivamente a otencoo dos alimentos para as formas de prepar6-lo e,sobretudo, consumi-Ios como espa

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    Para sumarizar, em suas variantes, 0essencial do perspectiva cultural,compensa reproduzir 0 que propos Stephen Mennel, quando se refere 00 quechama de cu lt u ra cu linar ia , desenvolvendo pistas abertas por Norbert Elias:

    "Culinary culture, by extension, includes everything that we mean by the 'cuisine' ofsociety or social group, but a lot more besides. /t refers not iust to what foods are eatenand how they are cooked - whether simply or by increasingly elaborate methods -but also to the attitudes that are brought to cooking and eating. Those attitudes includethe place of cooking and eating in people's patterns of sociability (eating out, incompany, or in private); people's enthusiasm or lack of it towards food; their feelings,conversely of repugnance towards certain foods or methods of preparation; the place offood, cooking and eating in a group of society's sense of collective identity, and so on.Because culture is 'learned, shared and transmitted', in my view we can only understand'the cultural controls of perception' by studying how they develop and are transmittedover time. An anthropology or sociology of food must also be a history of food" (Mennell1992 279; v.lornbern1987).

    o enfoque lllosoilco.Resto falar de um enfoque de desenvolvimento recente e, ainda, sem

    muita densidade. Duos linhas podem ser mencionadasA primeira, mais geral, e exemplificada pelo livro de Elizabeth Telfer

    (1996) que se intitula, precisamente, Food for thought. Philosophy and food. Taistitulo e subtitulo prometem mais do que oferecem. (No entanto muitas das questoesaqui tratadas tornbern ocorrem em trabalhos dos mais diversos campos). A autoraacentua os aspectos de prazer, noo-necesssidode, no olirnentocco, assim comoos preconceitos contra a dimensoo corporal do homem e, a partir do; comentaposicoes de iilosolos. de Plotoo e Arist6teles a Kant e Stuart Mill. Discorre sobreo valor do prazer de comer, as obriqocoes implicitas, as virtudes morais dohospitalidade e do temperanc,:a. Coletoneos como a organizada por Curtin eHeldke (1992) tornbern se alocam aqui.A outra linha e repesentada pela coletoneo de Ben Mephan [ed.,1996) sobre a etico do olimentocoo. Questoes abordadas: a fome enquantoproblema etico. a seguranc,:a alimentar, orespeito a vida animal e as condicoesambientais, a moralidade das modernas biotecnologias, os aspectos culturais doetico do olirnentocoo. etc.

    A Contribuicco das Ciencios Sociais

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    Iornbern aqui 0que se pretende nco poderia ser um quadro delinido.nem um balanc,:o critico sistematico, muito menos uma listagem biblioqrolicosubstancial. Pretende-se, tao somente, assinalar trccos que registrem acontribuicoo que as disciplines sociais trouxeram para 0 conhecimento de umtema multifacetado como a olirnentocoo.

    Desde j a convern esclarecer que as compcrtirnentocoes entreAntropologia, Sociologia, Geografia, etc., sao ortificiois e destinam-se apenas aacentuar comodamente algumas caracteristicas especilicos dominantes e ncorecortes epistemol6gicos e metodol6gicos rigorosos e consistentes. Nessa mesma

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    otico. deve-se salientar a perspectiva hislorico que caracteriza muito desta literatura- 0que faz que 0esboco a seguir tornbern obron]o. implicitamente, a Historio.

    Convern ainda esclarecer que nco se abriu espoco proprio para aPsicologia, pois muitas de suas contribuicoes fundamentais encontram-seaticuladas a outros temas ou contextos disciplinares, aqui citados [selecoo dealimentos, dietas, patologias, etc.].Antropologio

    A Antropologia, sem duvido. pode ser considerada a disciplina quemais se preocupou com nosso tema, que recolheu 0maior acervo de inlorrnoccoe que exerceu, sobre as demo is disciplines, inclusive a Historic. a intluencio maisconsider6vel. Para se ter uma ideio do amplitude, diversidade e consistencio doproducoo ontropoloqico. basta compulsar, por exemplo, a revisoo biblioqrolico,i6 nco tao recente, feita por Ellen Messer (1984) e que se organiza segundotemas tao diversificados como os estudos ecoloqicos e de abordagem materialista(energia, coletores-cocodores, problemas bioculturais), principios de selecco dealimentos, clossilicocoo e construcco diet6ria (atributos sensiveis .do alimento;dirnensoes cultuais, sirnbolicos e cognitivas), estudos sernioticos. identidade,etnia, encuhurccco. estrutura diet6ria, fatores econornicos. Ou enloo. para se teruma visoo de conjunto. segundo outros pard metros, pode-se examinar umacoletdnea, como aquela organizada por Carole Counihan e Penny van Esterik(1997), que reproduz textos 'cl6ssicos' como os de Margaret Mead, Claude Levi-Strauss, Roland Barthes, Mary Douglas, Jean Soler, Anna Meigs, Anna Freud, JackGoody, Marshal Sahlins e muitos outros mais. Doutra parte, um livro como 0 deStephen Mennell, Anne Murcott e Anneke van Otterloo (eds.1992), olern deconstituir um bom exemplo do trdnsito de dupla moo de direcoo entre aAntropologia e a Sociologia (sem excluir a Historic], cobre uma gama extenso detemas, sobre os quais oferece uma sintese biblioqrolico de interesse: as conexoesentre alimento, nutricoo e soude: desordens alimentares; desigualdades deconsumo por classe, genero, idade, nocco: relocoo do alimento com as esferaspublica e privada, perspectiva ontropoloqico e historico sobre as culturasculin6rias; 0 impacto do colonialismo e das rniqrocoes sobre a olirnentocoo: atronslorrnocoo das tecnologias de producco e suas conseqiienclos socia is, etc.

    Os ontropoloqos. desde 0seculo XIX, se empenharam em desenvolveruma etnografia sistem6tica dos hobitos alimentares e em buscar interpret6-losculturalmente. A primeira fase do Antropologia caracterizou-se por umcomparativismo das diferentes trcdicoes culturais. A onolise dos tabus, onde sedestacam os alimentares, foi desde os primordios do Antropologia Cultural umterreno fertil para especulocoes sobre 0significado sirnbolico do olirnentocoo. Nointerior do extenso obra The golden boug h, de James Frazer, publicado pelaprimeira vez em 1890, desenvolveu-se a interpretocco destes temas,particularmente no livro T abo o an d the p erils of the so ul. 0resultado de interessessemelhantes 00 de Frazer foi estimular 0 mapeamento dos diversos hobitosalimentares, cujo especiolizccoo, de car6ter local, regional e, mesmo,continental, foi devidamente fixada. A olirnentccoo serviu, ainda, paraproposicoo de '6reas culturais': exemplos de qualidade sao comuns no

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    Alemanha, como, entre tantos outros, os levantamentos de Moriz Heyne (1901)ou os de Eckstein et a lii (1938).

    Em tempos mais recentes, os estudos onlropoloqicos de olimentoccopodem ser considerados segundo matrizes dilerentes. ecoando tronslormccoesglobais que ocorreram no seio do discipline, Ate os anos 60, imperava uma perspectiva funcionalista acentuada.E olios de uma discipula de Malinowski, Audrey Richards ( 1 9 3 1 2 ) , um estudopioneiro de olirnentocoo que toma os Bemba, uma tribo Bantu do Africa Central,como relerencio. A autora nco apenas retrata a producoo. preparo e consumodo alimento, mas os insere num contexto socio-pslcoloqico. levando em contadiferenciais como ciclos de vida, grupos e estuturas socia is, modalidadesdiversas de interocdo. etc. Infelizmente, esse rico modelo nco parece ter tido adilusdo que merecia.

    Somente nos decodes de 60 e 70, no yoga do estruturalismo, e queos estudos ontopoloqicos sobre olirnentocoo deslancham e se define um podroode cnolise cultural. Claude Fischler (1990: 17) 0 caraceriza com felicidade, empoucas palavras: "While the functionalists looked at food, the structuralistsexamined cuisine". 0 alimento passa a ser investigado como sistema cltural eabordado linguisticamente.

    Algumas obras publicadas por Claude Levi-Strauss (Le cru et Ie cuit,de 1964; D u m iel aux cendres, de 1967, L 'o ri g in e d e s tuonietes de table, de1968 e L e tria ng le c ulin aire , tornbem de 1968, comec;:am a ter consider6velrepercussoo entre os estudiosos do olirnentocco. Elas nco tratavam apenas dotema, especificamente, mas de estruturas rniloloqicos. Todavia, reconhecendo quee em torno do olirnentocoo que as dilerentes culturas estruturam suo vida pr6tica,assim como parte consider6vel de suos representocoes. Levi-Strauss nco deixou demobilizer a problem6tica alimentor. A dlierenco enre 0 cru e 0 cozido torna-separa ele um dos marcos que fundam a proprio cultura. Seu trionqulo culin6rio (cru,cozido, assado) teve ampla divulqocco e suscitou endosso apaixonado, tontoquanto recusa exacerbada.

    A yoga, nos anos 80, e de estudos de bose materialista, como os deMarvin Harris (1989, ed.or. 1986) e enfatizando aspectos historicos. Alem disso,vai ser inensa e explicita a discussoo de problemas teoricos e metodoloqicosrelativos 00 tema.

    Se quisermos assinalar quais os temas que, nesta ultimo decode. ternprovocado 0 maior investimento do Antropologia, no compo do olimentocoo,independentemente de orientocoes teoriccs. salientariamos as pr6ticas culturais,os processos de oculturocoo, a identidade cultural,

    Se as pr6ticas i6 eram importantes desde os levandamentos dos'modes de vida', agora ganham mais relevo quando 0 que se procura epesquisar, nos hobitos. nos etiquetas, nos maneiras a meso, problemas comoaqueles propostos por Norbert Elias (1990, ed.or. 1939) 00 tratar do 'processocivilizator. Assim, Mennell (1987) procura explorer os usos sociais de aspectosconcretos desta dornesticocco do natureza pela cultura, examinando osmecanismos que 'civilizorn 0 apetite'. 0 controle do corpo, 0 controle dasernocoes em publico, a 'ordern a meso', as hierarquias e os podroes de relocoo,o avanc;:o do individualismo e 0 espcco privado, etc., etc., sao explorados,

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    principalmente entre 0 sec. XVI ate a contemporaneidade, como produtos eveto res de mecanismos sociais (v.Roche 1997: 255-7). V6rios estudos destanatureza tern recortes nacionais, como 0 de Cooper (1986) sobre as maneiraschinesas, ou de Arnaboldi (1986) sobre as francesas.

    As quesroes de identidade tornbern tem sido foco de pesquisa. Quantoa identidade pessoal, h6 vinculocoes com as diversos vertentes de estudo docorpo e da corporalidade (Fischler 1990; Lupton 1996). Mais espoco temmerecido a identidade etnicc. a corocterizocdo e luncoes da 'cornido etnico'(principalmente entre migrantes e minorias): foco do imagin6rio, delimitocoo defronteiras, base de conflitos, Fonte de estereotipos e estigmas ('clemdo-bototo', ou'chucrute'; 'sirio-libones-quibe': 'nos Estados Unidos, 'spaghetti' para os italianose, na Inglaterra, 'frogs' para os franceses, etc.). Entre os inumeros titulos, podemser citados: Kraut (1979), Jerome (1980), Calvo (1982.

    A identidade nacional, por suo vez, tem side vista como de estatutoambiguo. Mennel (1985) [o reconhecera que 0 aparecimento das 'cozinhasnacionais', dos 'estilos nacionais de comer' - e, mais que isso, seureconhecimento publico, tornado possivel pela diiusco de 'historios' e livros decozinha - coincidem com a lorrnocoo. desde 0 lim do sec. XV, no Europa, dossstodos-nocoo, culminada no sec.XIX, seculo privilegiado da gastronomia.Entretanto, nem mesmo para 0 seculo passado e possivel falar de cozinhasessencialmente nacionais, se]o pelo substrato comum historico ou trazido peloscornercio e processos de ccuhurccoo i6 em curso, seia pela reqionclizocco aindamuito marcada dos pcdroes (Murcott 1997). Poucos estudos existem como osde Catherine Palmer (1998), que procurou examinar, no cotidiono, 0funcionamento dos mecanismos da identidade nacional, incluindo a olirnentocdo.

    No proprio espcco das identidades e em relocoo as pr6ticasalimentares se tem associado a problem6tica da encuhurocoo (Fischler 1985 e1988; Widdowson 1981) e, portanto, 0 papel da olirnentocdo na reproducooda sociedade e, principalmente, da familia. Sidney Mintz, opes referir-se aoshobitos alimentares como veiculos de ernocdo profunda, resume seu papelenculturativo:

    "The learning of personal fastidiousness, manual dexterity, cooperation and sharing,restraint and reciprocity are commonly linked to the consumption of food by children.Indeed, getting to eat with the adults as an adult, rather than as a child, may be one ofthe maio: hurdles of growing up in some cultures" (Mintz, 196: 70)

    Para linolizor, cumpre assinalar a criocoo. no interior do campoontropoloqico, de v6rias insfiluicoes agrupando os prolissionois interessados noestudo da olimentocco. algumas de ambito internacional, outras, de vinculccoonacional mas repercussco muito ampla e respons6veis por pesquisas,publicocoes, encontros de especialistas e outras formas de otuocco ccodernico epolitico: US National Academy o f Sciences Committee on Food Habits (1945),International Committee for Anthropological Food and Food Habits (1968),International Commission for the Anthropology of Food and FoodProblems/International Union of Anthropological and Ethnological Sciences,Ethnological Food Research Group (1970), Foundation o f Chinese Dietary Culture(1991), Ajinomoto Foundation for Dietary Culture (1989).

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    Arqueologio

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    No Arqueologia, 0 tema do olirnentocoo tem ocupado espa

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    alcance. A analise isotopico de coloqeno do osso humano, por exemplo, vemsendo utilizada para esclarecer a origem do agricultura no Novo Mundo, poisregistra iniorrnocco sobre consumo alimentar em pcdroes de longa durccoo. 0estudo do desgaste dentorio. por sua vez, revelo nco so dodos preciosos sobredietas, patologias e corencics alimentares, como tornbern sobre tecnicos dernonducccoo. 0 conteudo estomacal, coprolites, residues culinorios, tipos deutensilios e trac;:osdos pcdroes de uso nos artefatos asseguraram 0conhecimentoindividuado de releicoes, de tecnicos de processamento, de voriccoes sazonais,de cornbinocoes alimentares com irnplicocoes nutricionais, de constantes nodistribuicoo p er ca pita etc .. 0 conteudo de concheiros e convertido em indicesnutricionais, que podem, por sua vez, fornecer pistas para vorioveisdemograficas. E assim por diante. Sumarizam os autores:

    "All the methods described in this chapte are. providing archaeology with new tools, notto say with 'food for thought'. The evidence available varies from botanical and animalremains, both large and microscopic, to tools and vessels, plant and animal residues,and art and texts. We can discover what was eaten, in which seasons, and sometimeshow it was prepared. We need to access whether the evidence arrived in thearchaeological record naturally or through human agency and whether the, resourceswere wild or under human comol. Occasionally we encounter the remains of individualmeals left as funerary offerings or as the contents of stomachs or feces. Finally, the humanbody itself contains a record of diet in toothwear and in the chemical signatures left inbones by different foods" (Renfrew & B ohn 1994: 270).

    SociologiaEmbora os grandes nomes do Sociologia, de Marx a Spencer, de

    Durkheim a Weber, de Simmel a Sorokin, tenham incluido em suas obras rellexoessobre olimentocoo. nco desenvolveram um campo sistematico de problemas. Esomente a partir do dilusoo do Sociologia do Cultura que voo surgir os trabalhosde maior continuidade e os verdadeiros especialistas do ramo (para uma visooponorornico do campo, ver Mennell et a lii 1992, Murcott, ed. 1983).

    Como alias e desejovel. a Sociologia partilhou com a Antropologiaum campo comum de interesses - de que tornbern participaram a Geografia ea Histone. Nao obstante, ha certas ares de problemas que ela privilegiou.

    A primeira refere-se a questoes de dilerenciocoo social peloalimento, de status, e, em sumo, de poder. Apesar de se tratar de umaperspectiva corriqueira, nco deixa de apresentar resultados interessantes, 00identilicor as especificidades que, no coso, assume 0 alimento (v.Wiessner &Schiefenhovel 1996).

    Entre as dilerenciocoes sociais, as de genero sao as que mais ternampliado seu campo no pesquisa. 0 eixo tem side a divisoo social do trabalhodornestico. com 0 homem como provedor externo do alimento e a mulher comoprocessadora e responsovel pela reproducco do familia (para exernpliiicor:Charles & Kerr 1988, Murcott 1983 e 1993, Wall 1991). As questoes degenero tornbern tem side vistas de onqulos mais reduzidos, como a ossocioccodo carne a virilidade - 0 que tero implicccoes muito amplas em movimentoscomo 0 vegetarianismo (Twigg 1983, Caplan 1994: 17).

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    Em escala superior, e a ossociocoo do ollrnentocoo 00 campo dopoder que tem sido uma constante. Arjun Appadurai (1981) foriou, mesmo, 0neologismo 'gastropolitica' para caracterizar num estudo sobre hindus, 0 uso doalimento como meio de proteger ou contestar posicoes sociais. Ele lornbernobservou 0conteudo politico dos eventos alimentares festivos: "the marriage feastis a quintessentiollv gastro-political arena" (1981: 502). Young (1971) i6caracterizara a festa como oportunidade impar de dispute de poder: "fightingwith food". E Mary Douglas repetidamente assinalou 0 banquete como recursopara mobilizor lorcos (p.ex. 1972). No ordem internacional, como demonstramCarole Counihan e Penny van Esterik (eds., 1997: 3), a hierarquia de 'primeiromundo' e 'terceiro mundo' se assenta no acesso dilerenciol 00 alimento,especialmente a carne.

    A segundo 6rea de questoes e a comensalidade. Comer e beber[untos sempre foi reconhecido como matriz de scciobilidcde (Mennell et a lii1992: 115-9, Levenstein 1993, Aurell et a lii 1992, Douglas 1984). Dai apreocupccoo em estudar a clirnentocoo e as pr6ticas alimentares como ritos depassagem e incorporccco, de solidariedade e hospitalidade ou exclusoo. deidentidade e sociolizocco, oportunidade de tronsqressoes. de relorcocompromissos e de hierarquias, etc. A irnporloncio visceral do comensabilidadeem certas sociedades antigas - basta atentar para 0 symposion dos gregos -motivou obras de elevado interesse sociol6gico (Pantel 1992, Lombardo 1989,Nielsen 1998).

    Doutro onqulo. os estudos de comensalidade se orientaram para areleicoo como instituicco social, sua natureza e funcionamento, seus icones -como a mesa (Douglas 1972, 1974, Wood 1995, Herpin 1988, Visser 1987,Lucas 1994 etc.].

    Neste contexto, os ovoncos do tecnologia alimentar (com os alimentosindustrializados), a ornpllocoo do hobito de comer fora, 0 aparecimento do fastfood voo comprometer a cozinha dornestico e seus significados sociais (Fischler1979, Mintz 1985, Leidner 1993, Carney 1995). Fischler ate cunhou um termo- 'gastro-anomia'- (1980: 28) para expressar a dessociolizocoo que aliberdade irrestrita de escolha individual est6 provocando, 00 criar aoportunidade de 'comer sem reieicoes'.

    Problema correlato, 0 do '[enter fora' tem sido, por isso mesmo,examinado como performance social (Finkelstein 1989) ou 'teatro das relccoessocia is' (Shelton 1990), estendendo-se tais enfoques 00 estudo do resaurantecomo espcco simbolico e de seus agentes, os cozinheiros, chefs, gar

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    Nourrisson, que jo havia produzido uma tese sobre 0 alcoolismo e 0 anti-alcoolismo no Franc;:asob a 1 1 1 0 . Republica (1988), toma a figura do 'buveur', nosec.XIX, como eixo de suo investiqocco (1990); Harrison (1971) ocupou-se coma bebido entre os vitorianos (e organizou em 1967 uma biblioqrolio critica sobrebebido e sobriedade no Inglaterra, ente 1815-1 872) e Brennan (1991) com abebido como podroo publico de sociobilidcde e com a cultura popular dosec.XVIII. lossiliedes & Gefou-Madianou (eds. 1992) associam 0 olcool aquestoes de qenro. G.E.Vaillant (1983) trocou uma 'historic natual doalcoolismo'. Um nurnero especial do revista Terrains (Boire 1989) apresenta voriosestudos socioloqicos sobre bebidos (clcool. cafe, cho, chocolate), suasinstiluicoes e contextos socia is.

    , Finalmente, aponte-se 0 grande tema, que esto mobilizando aSociologia do olirnentocoo: 0 consumo. 0 popel central do olirnentccdo nestafaixa foi salientado por Fine, Heasman eWright (eds. 1995). Em orticulocoo 00consumo, alguns temas tern sido introduzidos: a publicidade alimentar, seu coroteralienador e valorizador do que Barry Smart (1994) cunhou de 'gastro-porn'(alimentos sedutores, mas impossiveis de obter e artificial e estereotipicamenteperfeitos); 0 popel do olirnentocco no constituicdo do cultura popularconternporoneo (Bell & Volentine 1997) e no constiluicoo de estilos de vida(Tomlinson 1990); paralelamente, no contracultura (Belasco 1993).

    Finalmente, 0consumo permitiu fornecer um contexto de entendimentopara olterocoes de monta que a olimentocoo vem sofrendo no tocante 0 0 tempo.o tempo das reieicoes. tempo regrado, dos ritmos regulares do cotidiono queintegravam 0 tempo dos consumidores e dos produtores, tempos naturais, vci-sedesintegrando (Aymard et a lii 1993, Palmer 1952). As tecnologias alimentaressuprimem 0 tempo natural, pois mascaram as estocoes. momentos do colendorio.marcos sociais repetitivos (Gofton 1990).Geografia

    A Geografia, como nco poderia deixar de ser, ho muito tempo vemcontribuindo para iluminar os componentes espaciais da problernotico daolirnentocoo. Um artigo como 0 de M. Sorro (1952) do ideio das principaispreocupccoes em meados deste seculo. em que ainda tinham peso especilico aproducoo. transporte e cornerciollzocco dos alimentos (v. Iornbem Geographied e I'a lim en ta tio n 1 98 0).

    Para que se perceba a relevcncio do espac;:o neste compo de estudos,basta lembrar que a maioria dos sta ple fo od s (que alguns especialistas, como Igorde Garine 1994: 239 preferem chamar de cu lt ura l s uper foods) das sociedadesmodernas tern origem em ,expac;:os extern os oqueles em que vieram a dominar: acassava e 0 milho, no Africa Equatorial (origem americana), a batata, paragrupos himalaios, a cassava e as batatas doces no Indonesia e Melanesia eNova Cume: 0 arroz, cuja dispersoo esteve vinculada ao sistema colonial; 0trigo, as especiarias, 0 tomate, a pimento chilli etc.etc.etc. (Santieri & Zazzu1992, Foster & Cordell, eds. 1992). Num outro rumo, aponte-se, ainda, airnportoncio do tema do fome no seu enquadramento espacial (Young 1998).

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    Mais recentemente, a disciplina ampliou a escala de ocorrencia dosfen6menos que investiga: 0 corpo, a coso, a comunidade, a cidade, a reqico.a nocoo e, tinalmente, 0 globo, com suas Iorcos polares de hornoqeneizccco edilerenciocoo (g!oca!isat ion), que redundam seja no universolizocoo de uma redede lanchonetes como a McDonald's , seja no volorizocoo particularistica do'oulentico exotico' (Bell & Valentine 1997: 19). Dentro desse quadro, a'globalizac;oo local' do cultura culin6ria eo fetichismo do mercadoria obrigam aconsiderar os alimentos como materiais e pr6ticas 'des-Iocadas', como fazemCook & Crang (1996). E assim que os autores arrolados por James Watson(ed.1998) procuram, tornbern tomando McDonald's como relerencio, observar 0popel do fa st fo od diante das cozinhas loco is, em Hong Kong, Beijing, Taipei,Toquio e outras rnetropoles asi6ticas.

    Nesse percurso, a Geografia est6 coda vez mais procurandoaprofundar duos questoes, 'que se associam intimamente: 0 consumo e asidentidades regionais e nacionais. Noo e puro jogo de palavras que 0 livro deDavid Bell e Gill Valentine (1997) intitulado Co ns um in g g eo gra ph ie s! tenha porsubtitulo We a re w here we eat .No entanto, e preciso observar que, no -rnoiorio. os estudos deqeoqroios sobre olirnentocco tern convergido para preocupocoes comuns com asdos socioloqos. ontropoloqos e, mesmo, historiadores. Os proprios Bell eValentine, j6 citados, tornbern exploram, 00 lado do espoco. a problem6tica dotempo no olirnentocoo ou, mais precisamente, 0 consumo alimentar como formade orqcnizccoo do tempo, numa direcco semelhante a que foi acima apontadapara a Sociologia: os ritos de passagem no consumo (a primeira gota de olcool,a primeira vez que se cozinhou um prato etc.), a pontuocoo e periodizocoo dovida, a estruturocoo do ritmo temporal, a criocoo do tempo pelo consumo (anoturolizccco das sasonalidades do consumo) e, finalmente, a supressoo dotempo pelas tecnologias alimentares.

    A lnstituicoo de um Campo EspecializadoAs p6ginas precedentes j6 permitiram perceber alguns trocos

    marcantes do Historic nos estudos sobre os problemas do olirnentocco. Tornbernse percebeu que a Historic est6 longe de ser a discipline dominante. lrnpoe-se,porern. examinar mais de perto a natureza, lorrnocdo e fronslorrnocoes do quese poderia ho]e chamar de Histone do Alirnentocoo.

    E dificil situar 0processo constitutivo e acompanhar 0desenvolvimentode um "campo" de estudo historico tao vasto, heteroqeneo e diluso. Nossoeslorco. por isso, ser6 0 de fornecer apenas uma certa cartografia hisroricodesse terntorio. apresentando indicocoes sobre sua condensocco einstituciona Iizccco.Os pontos de partido

    26Os historioqrotos franceses (p.ex. Burguiere 1986) costumam apontar

    como marco referencial para um novo rumo, no Historic do Alimentocco, a obra

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    do polones Adam Maurizius. Maurizio, como veio a ser conhecido, era umbotonico. professor no Escola Tecnico Superior de Lvov. Alem do credito pessoalque Ihe reconhecem alguns historiadores, como Fernand Braudel, tal imagemtalvez se deva em grande parte a propria cvollocooque Maurizio fazia de seulivro, originalmente publicado em 1926 e logo traduzido para 0olernco e parao frances (1932). Partindo do pressuposto de que a historic do civilizocoo e ahistoric do utilizccoo do mundo vegetal se confundem, e mesmo conscientementeexcluindo a olimentocoo de origem animal, Maurizio empreendeu uma vastatentativa de trocor a historic dos alimentos vegetais, desde a pre-historic ate seustempos. Seu objetivo era preencher uma lacuna, pois 0 preocupava alnexistencio. ate entoo. de 'qualquer historic do olirnentocco'. que ele entendia,portanto, equivalente a uma historic do agricultura:

    'J e veu x dire une histo ire d es plantes im portantes au p oint d e vue d e I'ag ricu lture et desi ns tr umen ts a g r ic o le s. I Ine s 'a g it p oin t d e I'h is to ir e d e I' e xp lo ita tio n e t d e I 'a dm in is tr atio ndes terres, car rien ne nous manque a ce poin t de vue 10. M a is les quelques ouvrag esqu i s'in titu le nt his to ire d es a lim en ts et d e I'a lim en ta tio n (B ou rd ea u, Lichterfelt) va len ts ur to ut p ar I'in te ntio n. B ie n p lu s u tile s s on t d es o uv ra ge s ( so uv en t u tilis es ic i) q ui tr aite ntdes plan tes a iim enta ires au point de vue purem ent botanique. Le trava il tte: d eta ill e d eD . Bo is: Les plantes a iim enta ires chez tous les peuples et a travers les og es, tom e I del'E nc yc io pe die b io lo g iq ue lc 'e st en na ii te l a 49 ed itio n d e I'o uvra ge d e A. P allie ux e t D .Bois: Le P otag er d 'un curieux), n 'a m alheureusem ent paru qu 'a un e epooue ne m'ayantpas perm is de I'u tiliser, m ais seu lem ent de I'apprecier extrem ement" (Mourizio1932:14)

    Por certo, 0 rumo de Maurizio, disciplinado e rigoroso, e diverse dashistories que anteriormente apontamos, de variado teor, desde a Antiguidade e 0Renascimento, ou os registros imaginosos como 0 Catalogue des inventeurs deschoses qui se mangent et se boivent (1548) de Ortensio Lando, ou mesmo aqueleque e considerado um dos pontos de partida para 0 reconhecimento do popeldo olimentocoo nos 'histories dos costumes' e do vida privada - a obra de Jean-Pierre Legrand d'Aussy (1782), cuja linhagem sera numerosa, como atesta airnportoncio das cronicos historicos dos costumes, incluindo os hobitos alimentares( e f . Briffault 1846). No entanto, nco se pode ignorar 0 acervo de in lorrnocoosegura e conliovel disponivel, no tempo de Maurizio, e acumulada desde 0seculo passado, seja nos repertories de plantas comestiveis, seja noslevantamentos etnoqroiicos (alguns de ccroter regional e, mesmo, geral) a que janos referimos, se]o. enlirn. nos dodos constantes de uma vasta serie demonografias nacionais ou desenvolvendo-se em torno de certos alimentosespecilicos. A historic do agricultura e um dos pontos de partida do estudosistematico das plantas de usa alimenticio e, entre os autores que escreveramensaios de sislernotizocoo historico sobre as plantas cultivadas, podemos citarHaudricourt & Hedin (1943L Franklin (1948L Anderson (1952) e Chrispeels &Sadava (1977).

    A Inglaterra foi constante nesse interesse pelas questoes alimentares.Ja em 1856, George Dodd se preocupava com a olirnentocco em Londres. Alemdisso, no propria Fran

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    2. As outras tres eramsobre os meios detransporte e locomocao,a evolucao da forja dealde ia nos ultimos cin-quenta anos (OU seja,desde 1870) e as colhei-tas e os fogos de Saojoao e de Quaresma.

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    exponsoo colonial, efeitos no equilibrio orqonico e psico-social) a seqreqocooalimentar e seu car6ter principalmente social etc. No decodo de 30 i6 seanunciavam outras posicoes que tornbern viriam a deixar importante marcornetodoloqico. Cedo, por exemplo Lucien Febvre se interessou por diversosaspectos inexplorados do olirnentocoo, tendo consagrado uma intervencco noPrimeiro Congresso Nacional de Folclore, em 1938, a proposicco de um mapapara as gorduras de cozinha utilizadas no Fronco tema retomado no inicio dosanos 60 no revista Anna/es ESC. por j.j.Hernordinquer (1961). Como diretordo Encyclopedie ttcncoise, Lucien Febvre fundou uma comissao de investiqocoescoletivas para buscar uma converqencio entre a Etnografia e a Historic. AComissao em dois anos (1935-1937) empreendeu quatro lnvestiqccoes, entre asquais uma sobre a olirnentocoo popular (camponesa) trodicionol?o certo e que, em torno do data do dilusoo do livre de Maurizio,surgem inumeros publicocoes, de car6ter historico, a demonstrar, mais que umpotencial latente, interesses e recursos i6 em processo de objetivccoo. Nenhumadelos, diga-se de passagem, tem a pretensoo de panorama global mas, 00contr6rio, domino 0 recortenacional e, ate mesmo, local: Cooper (1929) escrevesobre os hobitos alimentares ingleses no historic e no literatura; Drumond &Wilbraham (1939, 2a.ed.1957) tratam de cinco seculos de dieta inglesa;Ceredo (1934), Espinosa (1939), Escudero (1934), Madones & Cox 1942),Beiarano (1941), Guevara (1946) tomam como objeto a olirnentccoo,respectivamente, no Espanha, no Mexico, em Buenos Aires, no Chile, noColombia, no Venezuela. 0 poo (Ashley 1928) e 0 ocucor (Dorveaux 1917)contam entre os alimentos que atraem otencco.Consolidocoo no Franc;:a:0popel dos Annales

    E com as propostas do 'escola dos Anna/est que, no decode de 60,ganha [isionornio definitiva e explicitamente program6tica nosso compo depesquisa. A primeira vaga de trabalhos est6 marcada pelo conceito entoo vigentede vida material (Barlosius 1992) e privilegiava 0 nivel do econornico e do infra-econornico. 0 nivel do econornico foi conceituado por Fernand Braudel, 0sucessor de Fevbre no direcco dos Anna/es, como aquele do troco, do mercado.Abaixo dele estaria um outro nivel. intro-econornico. que serio 0do vida materiale bioloqico. 0 conceito de cultura material abrangeria os aspectos maisimediatos do sobrevivencio humana: a com ida, a hobitccco. 0vestu6rio. A longadurocoo. concebida como a escala no qual se davam os [enornenos superioresaos eventos e as conjunfurcs, tornou-se a dirnensco no interior do qual novosobjetos tomariam consistencio historiogr6fica. A vida cotidiana, a culturamaterial, as mentalidades, 0corpo, a familia e a morte sao alguns dos temas queemergem a tona das profundezas aparentemente congeladas dos tempos para serevelarem no dioletico do suo tronslorrnocoo e do suo perrnonencio como nocoespl6sticas, sujeitcs a rnudoncos, mesmo que elas cporecorn como imperceptiveispara os proprios protagonistas.

    Em 1961, a revista Anna/es ESC. abriu as p6ginas do suo edicoode moio-junho com a proposta, num texto assinado por Fernand Braudel, de umretour aux enoueies. Embora retorno, ele fazia questoo de declarar que nco se

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    tratava das mesmas investiqccoes empiricas que anteriormente haviam sidoempreendidas por Marc Bloch e Lucien Febvre. sobre 'nobrezos' e 'tecniccs'. Alnvestiqocoo entoo em poutc, nos anunciava ele, se debrucorio sobre dois temas:IA historic, ciencio social otuol'. e IA historic do vida material e doscomportamentos bioloqicos'. No verdcde. e apenas 0 segundo tema que foidesenvolvido naquele nurnero el 00 longo do ana de 19611 nos dois proxirnosnurneros do revista.

    Nesta opresentocco inicial do questoo, opos reafirmar seus eslorcosem prol de uma historic considerada como uma "ciencio do otuo!" el ate mesmo.como uma Iciencio das ciencios do hornern'. ele define 0que ser6 um dos centrosde preocupocco do revista e fecundar6 muitos estudos vindouros: a historic dovida rnoteriol, 'inlro e extro-econornicc'. Mais a frentel iniciando 0 801etim n.1 deinvestiqccoo sobre 'vide material e comportamentos bioloqicos'. e 0 proprioBraudel quem continuava buscando defLnir tal dominic, para 0 qual diversospontos de vista se oferecem: os do propria Historic. mas tombern os doCeoqroiio. do Antropoloqio. do Socioloqio, do Ecorornic. do Demografial doFolclore. do Pre-historial do linquistico, do Medicinal do Estatistica. Diante de talcomplexidade ele prop6e que coda discipline coloque 0 problema nos seusproprios termos.

    Ele proprio. no entonto. entende por vida material "c in q s ec te urs a ss ezproches: fa lim en ta tion; Ie log em ent et Ie vetetnen t; les n iveaux de vie; lestechniqu es; les d onn ees b io log iqu es". "L a vie m aterie lle va ainsi r - escreve ele(Braudel 1961 0:547) - des choses au corps II .

    Diferentemente do vida econornico ou sociol, a vida material se situanum outro polornor, onde quase nco ho consciencio do parte dos atores. E comouma 'inho-htstoric'. portonto, ou uma 'mho-inlroestruluro'. que se apresentava essahistoric dos 'olirnentos. vestimentas e hobitocoes'. Enquanto 10 vida economicalas instituicoes. a sociedcde. as crenccs. as ideios. a politico relacionam-se asIotencoes e viqiloncios'. a vida material relaciona-se aos 'hobitos. heroncos eescolhas lonqinquos'.o rnetodo para 0 estudo do vida material devia ser Ireqressivo'.Segundo Braudell era preciso partir do conhecimento preciso das cilros que adocurnentocoo conternporoneo oferec ia para se poder medir e comparar.

    A enquete prossegue com um artigo de Robert Philippe quecircunscreve ainda mais 0 dominio do vida material que a revista se prop6eabordar. 0 artigo intitula-se: C om menr;ons par Ilhis to ire de Iia lim en ta tion iapresentada como um vasto dominio com caminhos j6 trocodos. Duosodvertencios sao dodos: apoiar-se sobre os dodos do atualidade e nco incorrernum 'deterrninisrno olirnentor'. de querer explicar a historic inteira dos homens apartir dos alimentos.Dois regimes sao sugeridos como modelos antipodas: os monotonese os variados. Esta distincoo alimentar e a que separa socialmente as dietasem todas as epocos. 0 caminho que e proposto. em sequido. e 0 estudo nosregimes alimentares de como se combinam os elementos nutritivos e se saoestabelecidos ou nco "equilibrios bioloqicos" em coda grupo ou sociedade.No nivel do corencio so haveria desequilibrio, ou se]o, [orne, compreendidacomo desnutricoo.

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    3. A saber: 0abasreci-mento de seis frotas es-panholas entre 1542 e1642; a corte cia Sueciae seus serviclores ern1573; luna cxpedicaoconjunta portuguesa eespanhola para a Africado Norte em 1)7R: C)Hospital dos incuraveisern Genova em 1608-1609; urna familianobre na mesma cidadeentre 1614 e HilS; 0Colegio Borromeo dePavia, entre 1609 e1618; tres despensascivis na Inglaterra erndistintas epocas C;enfim, urn cornhoioque deveria transportar2 mil soldados e 608cavaleiros de Napolespara a Espanha.

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    Aplicando a primeira odvertencio, 0 primeiro estudo do enquetealimentar sera sobre a atualidade: En France auiourd'hui: donnees quantitatives surles consommations alimentaires, de JJ Hernordinquer. Dos outros dois artigos -Une operation pilote: I'etude du ravitaillement de Paris au temps de icvoistet, deRobert Philippe e Regimes alimentaires d'autrefois: proportions et calcule en calories,de Fronk Spooner - 0primeiro trata de um estudo, a partir de um colculo realizadopor Lavoisier sobre 0 total de viveres consumidos em Paris e os seus precos globais,que conclui por uma deteriorocoo no olimentocoo parisiense no primeira metade doseculo XIX, No segundo artigo, expressando um objetivo comum desse primeironurnero do revista dedicado a olirnenlccoo. trata-se de se esbocor "une methodeuniforme de calcul qui permette les comparaisons entre regimes alimentaires, dans Ietemps et dans i'escoce" (Spooner 1961: 568L 0 que sera feito, no artigo emquestoo. otroves do cornporocoo de sete diferentes registros de despensc-o nurnero seguinte dos Annales ESC, correspondente a julho-agostode 1961, traz um Boletim nQ2 do 'Historic do Vida Material', que inclui um novoartigo teorico de Fernand Braudel: Alimentation et categories de I'histoire, em queele discute os eventos e as' conjunturas curtas e longas no historic do olirnentocco- que IIse decompose regulierement comme une histoire quelconque en trancheschronologiques de plus ou moins grande epoisseiu". Compraz-se em apontar " 1 0vraie longue duree" como a camada mais propicia que "nous libere presque de1 0 pesanteur precise du temps" (Braudel 1961 b: 723),

    A meloloro do pesca, que ele usa para a Historic. indica ondeBraudel ve os grandes peixes. Alroves do ornpllocoo das mol has do rede sepodero aumentar tombern a dirnensoo do pescaria e se falar, por exemplo, doinlluencio ainda atual do "revolucoo neolitico". Consequenternente ele elogiaAdam Maurizio e seu livro clossico. cuja licco permaneceria "volido, util eindispensovel" para os historiadores, completando-se 0 estudo das plantascoletadas no Pre-Historia com uma investiqocco do uso moderno, nos grandesfomes, dessas mesma plantas, como sobrevivencios de proticos milenares,

    Publica-se tornbern nesse numero a reedicoo de um artigo de LucienFebvre sobre a distribuicoo regional das diferentes gorduras usadas no cozinhano Fran

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    olirnentccoo a partir de dois artigos sobre 0 consumo de carne no Alemanha,desde a Idade Media ate 0seculo XIX, em TM orie ou hypothese de trava il? Jean-Paul Aron enfoca a Iormocco das concepcoes sobre a biologia alimentar,especialmente a analise do fisiologia do diqestco. a nocoo de regime e 0conceito de rocco alimentar, em Bio log ie et a lim enta tion au XV/lIe s iecle et audebu t du X/Xe siecle e Roland Barthes em Pour une psycho-socio log ie deI 'a limen ta tion cont emporaine , analisa aspectos do siqnilicocco das dilerencosculturais em relocoo a olirnentocoo (pergunta-se, por exemplo por que osamericanos consumiam quase duos vezes mais ocucor do que os franceses),introduzindo elementos de uma semiologia do olirnentocco, no qual os alimentossao vistos como signos de um sistema de cornunicccoo.

    A enouete termina, meio abruptamente e sem um bolonco. ncocumprindo as promessas de abrir novos dossies. como 0do cafe ou 0das plantasviojontes. 0 milho e a batata, embora a revista continue a publicar artigosesparsos sobre a olirnenlocoo no historic. Em 1970, sera publicado como umC ahier des Annales 0 livro organizado par jeonjocques Hernordinquer (1970),Pour u n e h is to ir e d e i'a lim e n ta tio n , que retoma a historic do olirnentocoo como umobjeto rnultidisciplinor e presente em praticamente todos os aspectqs do historiosocial e economico Mas e somente em 1975, a partir de um debate realizadono Segundo Congresso Nacional dos Historiadores Economistas Franceses,realizado em 1973, que a revista Anna les ES C. voltoro a dedicar mais dometade de um nurnero 00 tema do olirnentccco. desta vez sob a denomincccode "Dossie do Historic do Consumo", publicando 17 artigos sobre 0 tema, umdos quais, P our I'h istoire d e I'a lim en ta tio n: qu elqu es rem arqu es d e m etho de, deMaurice Aymard, coloca criticamente importantes questoes rnetodoloqiccs.Segundo ele, opes 0apelo lonccdo pelos Annales , em 1961, Ires grandes viasse abriram para a historic do olirnenrocoo: a de uma psico-sociologia doolirnentocoo. ou se]c. lidos valores, regras e simbolos" do olimentocoo; arnccroeconomico, que buscaria enquadrar estatisticamente a olirnentocco, pormeio de estudos de consumo, populocoo, precos e cornercio exterior; e,finalmente, a do estudo do valor nutritivo e das corencios. quantitativas equalitativas, do olimenlocoo dos tempos passados, considerada como a linha depesquisas "mais evidente, mas nco a mais fad".

    Estas considerccoes de Aymard, que foram retomadas por comentaristasdo historiografia francesa (Barlosius, Flandrin & Montanari, Hernordinquer, Revel,Burguiere), expressam tendencies de ocorrencia mais ampla.

    Assim, pode-se falar, nesta fase de irnplonlccoo de um campo novo, deuma tonica mccro-econornico. preocupada com questoes oqrorios. cominsuliciencios tecnoloqiccs, as crises, as tomes, os ingredientes dernoqrolicos eclirnoticos. as curvas de precos e 0comercio internacional. Os olernoes Schmollere Abel sao impotantes relerencios externas .. A agricultura sobressaia como fococentralizador, mas tomada, muitas vezes, como acesso para horizontes ainda maisamplos. Nessa direcoo e que Barlosius (1992:95-6) toma 0 nascimento docapitalismo como tema do obra de E.Le Roy Ladurie (1966), nco diretamentevinculado aos Annales , sobre os camponeses do Languedoc e endossa 0parecerde Igger: "Here, perhaps for the first time a serious attempt has been made to writea history o f material culture" (ib.: 95). Pena que esta visoo do cultura material tenha

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    sido tao intensamente topico e conceitualmente limitada (dos 18 boletins, entre1961 e 1989, 15 foram reservados para a historic dos alimentos). Mesmo comrelocoo aos artefatos, as abordagens nos parecem, agora, de uma certa pobreza,amarradas as irnplicocoes imediatas de car6ter econornico.

    Subproduto deste eslorco ser6 0A tla s d es c ult ur es v iv tie te s, de jacquesBertin, jeonjccques Hernordinquer, Michel Keul e W.G.L. Randles (1971), que,como definiu Pierre Chaunu (1976: 522), ecoando 0 entusiasmo de Maurizio,abrange "dez mil anos, a terra inteira e as 18 plantas fundamentais queasseguram 90% do alimento vegetal hurnono".

    A seguir, cobrindo os anos 60 e 70, explora-se 0 consumo, maisque a producco. 0 que traz 00 primeiro plano a nutrlcoo. A procura eexplorocco de dodos estatisticos e intensiva e as fontes proviroo do area fiscal,de hospitais e mosteiros, de registros sobre rocoes de marinheiros, soldados,oper6rios e prisioneiros. Hoje se cobra com facilidade a utilizocoo a-critica dosdodos, sua incdequocco [requente, assim como os vieses do docurnentocco,que nco foram suficientemente percebidos (p.ex., nco se comem moterios-primos, mas alimentos preparados).A reocco oeste cientificismo se consubstancia numa terceiraperspectiva, a psico-sociol. que desloca 0 foco para" 0 comer e aquele quecome. Se um historiador, jean-Paul Aron [e. outro, mais tarde, jean-Louis Flandrin),sao relerencios capitais para esta orientocoo, e preciso mencionar a repercusscodo artigo acima mencionado de Barthes (1961), que coincidia g rosso m od o compropostas que a Antropologia - e principalmente a Antopologia estruturalista -cornecovo a veicular nos anos 60 e 70, mas que deixaram marcos definitivas nosanos 80. Sem duvido suqestoes como ados gustemas ou a eloborocoo de umcodiqo alimentar de molde loqocenlrico nco foram absorvidas, como j6 seobservou acima, mas a preocupocoo com 0 sentido vai dar consistencio aosestudos do sensibilidode alimentar, do gosto, do gastronomia e alinhar os estudosde olimentccoo nos correntes das histories das mentalidades.Ramif ica.:;:oes. lrrodiccoo. lnstifucionolizocoo.

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    A Inglaterra e a Alemanha, tornbern j6 se mencionou, de ho muitocultivavam interesse por assuntos associados a olimeruocoo. acompanhados deperto pela Holanda e Begica. Nomes como Wilhelm Abel (1974, 1978),Gunter Wiegel mann (1967), Gustav Schmoller (1981) ou ChristiannVandenbroeke (1975) noo podem ser esquecidos. Ainda que em escala maisatenuada, a ltolio igualmente deve ser incluida neste rol. Nestes poises, compressoes muitas vezes diretas recebidas dos historiadores dos Annales , mastornbern de forma independente, consolidam-se os mesmos pad roes ocodernicosde investiqocdo historico do terno] 6 se pode agora falar no 'especialista'.

    Derek j.Oddy e john Burnett (1992), 00 fazerem um boloncohistoriogr6fico do producco inglesa, salientam 0 popel que a Universidade deLondres, por interrnedio do Hi st or ia n s and Nu t rit ion is ts S em ina r do Queen ElizabethCollege (mais tarde do King's College), desde 1963, exerceu, dentro e fora doInglaterra. Ressaltam, igualmente, alguns focos privilegiados no historio doolirnenlocoo britonico: 0 periodo mais estudado e 0que sucede a indusftiolizocoo

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    e 0 Cingulo preferencial e a analise do abastecimento, das commodi t ies , doconsumo, do s tatus nutricional, do distrlbulcoo, dos orc;amentos e dos gastosalimentares e, num segundo plano, do cozinha, dos pratos e dos hororios dereleicoo. 0 abastecimento esta sempre associado 6 urbonizocoo Outro temarecorrente no historiografia inglesa sao as bebidas, olcoolicos e nco olcoolicos,que envolvem questoes tao diversas, como a dilusco colonial do cho, os aspectossociais do alcoolismo e do temperanc;a etc .. No limiar do decode de 90, noprelocio do 3Q edicoo de uma obra famosa, Plenty and want. A S ocia l H istory o ffood in Eng land from 1815 to the presen t days, originalmente publicada em1966, John Burnett reconhecia que no espcco de vinte anos a Historio doAlirnentocoo tornara-se uma area de pesquisa academicamente reconhecida e quenenhum estudo serio do mudanc;a econornico e social dos ultirnos dois seculos noInglaterra ousaria omitir "reference to the changing ways in which food has beengrown, manufactured, distributed, and consumed" (Burnett 1989: VII).

    A dilusoo dos estudos de Hist6ria do Alirnentocco no restante doEuropa enos Estados Unidos e outras pia gas foi em grande parte marcada poreste quadro de institucionolizocdo.Um dos indicadores do rnofurocoo de um dominio especifico deconhecimento cientilico e a presence de publicocoes especializadas - nco solivros e artigos, mas principalmente periodicos occdernicos - , a orqonizoccode entidades e grupos de especialistas, a prornocco de serninorios, coloquios.congressos e a lorrnolizocco de cursos e plataformas de ensino. E importante,aqui, dar algumas pistas sobre ossociocoes, encontros e peri6dicos.

    Espac;o relevante de otuocoo destas instituicoes, assim como deuniversidades e outros organismos de pesquisa, e que testemunham 0 grau deenraizamento de uma Hist6ria do Alirnentocoo, sao os encontros, de variadanatureza (congressos, serninorios. coloquios]. e que se tern multiplicado. Para daruma ideic. sem qualquer pretensoo de listagem exaustiva, mencionem-se osprincipais temas, acrescentando que quase todos tiveram suas atas publicadas[noo se incluiram aqui aqueles encontros de coroter geral ou especializadamentebiol6gico, econornico, s6cio-antropologico, embora neles se encontre sempre apresence de questoes hist6ricas):

    L e s el dans Ie tra fic m aritim e interna tional du M oyen Ag e a n os io uts ( Pa ri s, 1 96 1) .C hang ing food ha bits ( Lon dr e s, 1 96 4)L es p ro blem es d e I'a lim en ta tio n. 93 e.C on gres d es S ocieies S ava ntes ( Tou rs , 1 96 8 )Pr at iq u es e t d is co u rs a lim en ta jr es a 1 0 Renaissance ( Tou rs , 1 97 9)Mang er et boire au M oyen Age (N ic e, 198 2)Cul tura e s tor ia de l l' a limen tazione (Im pe ria, 1(01)L ' al imen ta z ione ne ll 'an ti ch i ta (P arm a, 1 98 5)H om o Edens (V eron a, 198 7)H is to ir e e t a nim a l ( Tou lo u s e 1 987)Cu is in es , r eg im e s a lim e nta ir es , e sp ac es ieqionou (Nancy, 1987)A m anger des yeux: I'es thetique de 1 0 nourri ture (L au s an ne , 1 98 7)F irst S im pos iu m on E uro pea n F ood H isto ry (M u ns te r, 1 98 9).La Soc iab il it e a ta b le . C omm en sa lite e t c on viv ia lite a tra ve rs le s 6 ge s (R ou en , 1990)V oedin g en G enees ku nd e. A lim enta tio n et m ed ecine (B ru xe la s, 1 99 0)'A t av u la e t ra z ze ra . c u lt ur a d el l'a lim en ta z io n e n e i p a es i d e l Med it er ra n eo (T ra pa n i, 1 99 0)L 'a nim a l d an s l'A ntiq uite r om a in e (N an te s, 1991)L a prod uction d u vin et d e I'h uile en M editerra nee (T oul on , 1 99 1) .

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    Nao h6 nenhuma revista especializada, s tr ic to s en s u/ na Historic daAlirnentccoo. como existem para outros dominios (sobretudo a nulricoo]. Noentanto, a revista Food & Foodways / criada em 1985 e contando entre seusdiretores e membros do corpo editorial com muitos historiadores (Steven L.Kaplan,Jean-Lous Flandrin, Maurice Aymard, Claude Grignon etc.), serve de ponto deconverqencio para os cientistas socia is, principalmente estabelecendo umaproficua coloborocco de historiadores e oritropoloqos dedicados aoconhecimento da 'history and culture of human nourishment.' Em todos os tempose quadrantes - 0 que tem estendido 9S investiqccoes para bem longe dodominio europeu, incluindo 0 Oriente, a Africa, 0 mundo 6rabe, as Americas.

    Corccterizccoo Morfologica da Bibliografia

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    o car6ter caudaloso, heteroqeneo e diiuso da biblioqrotio de Historioda Alimentocco [o foi por muitas vezes assinalado, ate aqui. Se quisermos dealguma forma caracteriz6-la sinteticamente, levando em conta sobretudo aproducoo recente, talvez a solucoo mais pr6tica .se]o buscar um criterioloxonornico que privilegie os aspectos morloloqicos.

    De inicio, cum pre salientar que 0 volume e diversidade daspublicccoes nco motivou, entre os especialistas, tentativas de registr6-las emrepertories biblioqrohcos gerais, monogr6ficos ou seletivos. Sao, assim,rarissimas as cornpilocoes. como a B ib lio fe co g a str on om ic al de Andre Simon(1953), ou 0 guia F ood and drink in British H istory de William Henry Chaloner(1960). Nenhum bclonco existe, que se possa comparar aos que sao comunsno campo da Antropologia e Sociologia (como Freedman 1981 e 1983, Messer1984 ou Wilson 1979), embora, com ireqiiencio. tais levantamentos tornbernincluam obras especificamente historiccs, como e 0caso de The sociolog y of food(Mennell, Murcott & van Otterloo 1992). Ali6s, algumas obras de car6ter geralou monoqrolico contam com biblioqrolios tao extensas que podem ser utilizadascomo repertories genericos (p.ex. Garine 1990).

    Nesse quadro, nco se poderia esperar a existencio de numerosostrabalhos de cunho histonoqrolico. Por isso, mais ainda sobressai a utilidcde dacobertura europeio assegurada pela coletoneo que Hans j.Ieuteberq organizou(1992) com material apresentado no sirnposio E uro pea n F oo d H isto ry : a researchreview, sediado na Universidade de Munster, em 1989. Em 16 capitulos, saocriticamente sumarizadas pesquisas relativas a olirnentocoo em periodosespecilicos de 14 poises ou reqioes da Europa (Inglat~rra, Irlanda, Holanda,Belgica, Fran

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    Sao tombern pouco numerosas as obras gerais, que pretendemabarcar 0 horizonte do Historic do Alirnentocoo como um todo, mas aspublicocoes lern-se multiplicado nestes ultimos anos. Raros sao os trabalhosdevidos a um unico autor, como os livros de Gottschalk (1948), Reay Tannahill(1973) ou Carson 1.A.Ritchie (1996, ed.or. 1981), todos de grande cceitoccopopular, ou 0 encorpado volume do 'hlstorio natural e moral' do olirnentocoo. deMaguellonne Toussaint-Samat (1987), muito rico de inlormocoes. mas por vezessuperficial e, quase sempre, europocentrico.

    j6 jean-Louis Flandrin e Massimo Montanari (orgs. 1996) preferiramreunir cerca de cinquenta pesquisadores, numa antologia enciclopedico de maisde 900 p6ginas, a tim de abordar cronologicamente os hobitos alimentares dohumanidade, desde a Pre-historic ate os tempos correntes, passando pelasgrandes civilizocoes do Proximo Oriente, os gregos, romanos, borboros. a IdadeMedia, as culturas hebraica, islornlco. grega ortodoxa, a epoco moderna econternporonec. procurando englobar aspectos ecoornicos, demogr6ficos esirnbolicos da producoo e consumo, as dilerenccs entre cidade e campo, arteculin6ria, gastronomia e dietetico releicoes e maneiras a mesa, os regionalismose sincretismos , a 'rnocdonoldizocco' dos costumes, etc., etc .. Clore est6 quealgumas destas contribuicoes oscilam na qualidade, mas 0 resultado geral ebastante sotislotorio e esta obra pode ser considerada, presentemente, a melhorrelerencio geral para 0 campo em questco. como um todo.

    As coletoneos heteroqeneos. de que a de Hernordinquer (ed. 1970)foi um coso, precoce, tern tido boa fortuna.

    E preciso igualmente mencionar a existencio de verbetes em obrasenciclopediccs ou de capitulos em obras gerais, que constituem tentativas dedelinear 0campo. Nenhum deles se pode considerar plenamente sotistotorio: ReneeValeri (1977), j.F.Revel (1978), Igor de Garine (1990), Andre Burguiere (1986,muito citado, mas excessivamente lrcncccennicol, Daniel Roche (1997), etc.o que domina, porern. a bibhoqroiio, sao as obras de car6terregional e, muito mais ainda, de recorte nacional ou referindo-se a periodos ou'civilizccoes', quase sempre da Europa.

    Assim, Montanari (1993) procurou balizar, a partir dos b6rbaros e dosromanos, a Iormccoo. nos seculos V e VI AD, de uma 'Iinguagem comum'europeio. no dominio do olirnentocoo (Ele lornbern cobriu quadros extensivos doIdade Media, em 1979 e 1988). Fenton & Kisbon (eds.1986) tornbern elegeramos hobitos alimentares no Europa, do Idade Media ao presente, assim comoForster & Foster (1975), a dieta europeio.

    As civilizccoes da Antiguidade nco deixaram de acumular inumeroshistories da olirnentocoo 0 Egito, por exemplo, j6 merecera em 1854 umtratamento especial desse problema, por parte de j.G.Wilkinson, numa obrasobre vida e costumes. Dai em diante, a lista foi-se ampliando, embora compredominio de titulos com car6ter essencialmente descritivo - de que ncoescapam ate mesmo sinteses recentes, como a de Bresciani (1996). Ascivilizocoes cl6ssicas nco hcorn atr6s. Nao so sao correntes histories gerais (comoAndrew Dalby 1996 ou Andre 1980, Blanc & Nercessian 1992), como tornbernas histories de alimentos de grande significa~ao cultural, como os cereais, 0vinhoou 0 azeite (Gastet & Sigarr 1979, Amouretti 1986, Pessanha & Bastian, eds.

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    1991, Tchernia 1986). Alem disso. alguns temas tiveram [orco catalisadora:assim, os podroes de sociobilidcde. como aqueles expressos nos symposia enosbanquetes civicos (Pauline Schmitt Pantel 1992, Fran~ois Lissarrague 1987), acozinha profana e a liturgica (Berthiaume 1982), 0tema literorio Uones 1993).Mencionem-se, tornbern, obras de conjunto, como Brothwell & Brothwell (1985;inclui tratamento rnetodoloqico relotivo 9 Arqueologia da olirnentocco e exam ina,olern do mundo rnediterronico, Asia, Africa sub-soariana e Americas); Wilkins,Harvey & Dobson (1996), organizado em torno de problemas-chave, comocereais e cultivares, carne e peixe, contexto social e religioso, medicina, presencena literatura): Longo & Scarpi (1989) que, olern das questoes tradicionais, tratados i i losolos gregos, de linquistico e olimentocco, mercado, vegetarianismo,patologias nutricionais, agregando aos povos clossicos os vedas, persas eculturas africanas, sem muita preocupocoo com organicidade.

    Quanto as cozinhas nacionais e Iocais (ate cidodes], e especialmenteprodiqo nestes estudos a Inglaterra, onde diversas obras tern-se interessado pelotema, dentre as quais Dodd (1856); Bear (1899); Cooper (1929); Drumond eWilbraham (1939); Blackmon (1962); Fraser 1981; Barker, Oddy e Yudkin(1966); Burnett (1966); Pullar (1970); Wilson (1973); Johnston (1977); Driver(1983); Stead (1985) e Renfrew (1985a e 1985b). Ho ate mesmo uma senepatrocinada pelo orqco de potrimonio cultural ingles (E ng lis h H erita ge ) edenominada Food and cooking in Britain, com mais de sete volumes publicados,e que se estende desde a Pre-historia ate 0seculo x x . Os Estados Unidos ncoficam muito otros: Root & De Rochemart (1976), Levenstein (1988 e 1995),Grover (1987), Aidells & Kelly (1992), Brans (1993), Coe (1993), Mcintosh(1995), etc. Na Fronco. encontramos desde Briffault (1846) e Bourdeau (1841 )ate Dupin (1978) ou Pitte * 1993). E em diversos outros poises. especial mente naAmerica Latina, podemos citar ao menos uma obra que, em geral na primeirametade do seculo x x , procurou estudar a olirnentocoo nacional: na Espanha,Cereceda (1934); no Mexico, Espinosa (1939); na Colombia, Bejarano (1941);no Chile, Madones e Cox (1942); e na Venezuela, Guevara (1946), no Peru,Mayolo (1981). Para completar 0 perfil: Stewart, Trustwell & Wahlqyist (1988),para a Australia; Chang (1978) ou Anderson 1988) para a China. As vezes osestudos sao comparativos, como 0de Mennell (1987), que analisa em paraleloa Fronco, a Inglaterra e a Alemanha.

    A tais obras deveriam ser agregados os livros de receitas, muitasvezes selecionadas e apresentadas com criterios historicos rigorosos (p.ex. Dalby& Grainger 1996).

    Desta vasta biblioqrolio nem todos os estudos estoo envolvidos emproblemas de mudonco e lronlormocoo ou na hisloricizocoo de suas inlormocoes:nota-se, vez por outra, teridencio perceptivel de tratamento sincronico eoutonorno. Nao obstante, ocorrem obras de amplo espectro e grandeconsistencio historico de que boms exemplos sao os dois trabalhos de HarveyLevenstein (1988 e 1995), verdadeiro estudo de historic das mentalidades aamericana (e mais que isso], em que 0 autor lroco um quadro dentro do qual, apartir de 1880, forma-se nos Estados Unidos a conviccoo da comida apropriada,em detrimento do gosto; mas nco e somente 0 plano das representocoes que 0autor explore, mas os grupos de interesses comerciais e profissionais, as

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    1991, Tchernia 1986). Alem disso. alguns temas tiveram forc;:a catalisadora:assim, os podroes de sociobilidode. como aqueles expressos nos symposia enosbanquetes civicos (Pauline Schmitt Pantel 1992, Franc;:ois Lissarrague 1987), acozinha profana e a liturgica (Berthiaume 1982), 0 tema literorio Uones 1993).Mencionem-se, tornbern, obras de conjunto, como Brothwell & Brothwell (1985;inciui tratamento rnetodoloqico relotivo 9 Arqueologia da olirnentocoo e examina,olern do mundo rnediterronico. Asia, Africa sub-saariana e Americas); Wilkins,Harvey & Dobson (1996), organizado em torno de problemas-chave, comocereais e cultivares, carne e peixe, contexto social e religioso, medicina, presenc;:ana literatura): Longo & Scarpi (1989) que, olern das questoes tradicionais, tratados [ilosolos gregos, de linquistico e olirnentocoo. mercado, vegetarianismo,patologias nutricionais, agregando aos povos clossicos os vedas, persas eculturas africanas, sem muita preocupccoo com organicidade.

    Quanto as cozinhas nacionais e locais (ate cidades), e especial menteprodiqo nestes estudos a Inglaterra, onde diversas obras tern-se interessado pelotema, dentre as quais Dodd (1856); Bear (1899); Cooper (1929); Drumond eWilbraham (1939); Blackmon (1962); Fraser 1981; Barker, Oddy e Yudkin(1966); Burnett (1966); Pullar (1970); Wilson (1973).; Johnston (1977); Driver(1983); Stead (1985) e Renfrew (1985a e 1985b). Ha ate mesmo uma senepatrocinada pelo orgao de potrirnonio cultural inqles ( En glis h H erita g e) edenominada Food and cooking in Britain, com mais de sete volumes publicados,e que se estende desde a Pre-historic ate 0 seculo x x . Os Estados Unidos ncoficam muito otros: Root & De Rochemart (1976), Levenstein (1988 e 1995),Grover (1987), Aidells & Kelly (1992), Brans (1993), Coe (1993), Mcintosh(1995), etc. Na Franc;:a, encontramos desde Briffault (1846) e Bourdeau (1841 )ate Dupin (1978) ou Pitte * 1993). E em diversos outros poises. especialmente naAmerica Latina, podemos citar ao menos uma obra que, em geral na primeirametade do seculo XX, procurou estudar a olirnentocdo nacional: na Espanha,Cereceda (1934); no Mexico, Espinosa (1939); na Colombia, Bejarano (1941 );no Chile, Madones e Cox (1942); e na Venezuela, Guevara (1946), no Peru,Mayolo (1981). Para completar 0 perfil: Stewart, Trustwell & Wahlqyist (1988),para a Australia; Chang (1978) ou Anderson 1988) para a China. As vezes osestudos sao comparativos, como 0de Mennell (1987), que analisa em paraleloa Franc;:a, a Inglaterra e a Alemanha.

    A tais obras deveriam ser agregados os livros de receitas, muitasvezes selecionadas e apresentadas com criterios historicos rigorosos (p.ex. Dalby& Grainger 1996).

    Desta vasta biblioqrolio nem todos os estudos estoo envolvidos emproblemas de mudanc;:a e troniormocoo ou na hisloricizocco de suas inlormocoes:nota-se, vez por outra, tendencio perceptivel de tratamento sincronico eoutonorno. Nao obstante, ocorrem obras de amplo espectro e grandeconsistencio historico. de que boms exemplos sao os dois trabalhos de HarveyLevenstein (1988 e 1995), verdadeiro estudo de historic das mentalidades aamericana (e mais que isso), em que 0 autor trac;:a um quadro dentro do qual, apartir de 1880, forma-se nos Estados Unidos a conviccoo da comida apropriada,em detrimento do gosto; mas nco e somente 0 plano das representccoes que 0autor explore. mas os grupos de interesses comerciais e profissionais, as

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    continqencios da Grande Depressao e da I I Guerra Mundial, 0trabalho feminino,a disputa de prestigio entre os excessos conspicuos e as obstinencios conspicuas,a dilusoo do fast food, os paradoxos da obundoncio

    Outra vertente que representa parte consider6vel da biblioqroliohistorico sao as monografias sobre determinados alimentos. Podemos exernpliliccrcom as seguintes histories:

    - do poo (Ashton 1904; Ashley 1928; Jacob 1944; McCance &Widdowson 1956; Shepard & Newton 1957; Basini 1970; Kropoktin 1972;Zilhr & Buhrer 1985; Desportes 1987; Macherel & Zeebroek 1994; Kaplan1996 e 1997);

    - do milho (Birket-Smith 1943; Stoianovitch 1951 e 1966; Temple1963; Warman 1988);- da batata (Salaman 1949; Morineau 1970);- da soja (Saillenpest 1944; Clergeaud 1964);- do queijo (Cheke 1959; Androuet 1981; Volpato 1983);- do sal (Mollat 1968; Bergier 1984; Hocquet 1985; Denton 1982);- do ocucor (Dorveaux 1917; Lippman 1941-42; Deerr 1949-50;Strong 1954; Ely 1963; Hugill 1978; Pancoast 1980; Mintz 1986 e 1996,

    Cannabrava 1981); .- do mel (Crane 1975/76);- da cerveja (King 1947; Monckton 1966; Houaiss 1986; Aidells &

    Kelly 1992);- do vinho (Dion 1959; Scarpi 1991; McGovern, Fleming & Katz1994; Murray & Tecusan 1995; Garrier 1996, Poo 1995, Le vin 1997);- da cachac;:a (Camara Cascudo 1986, enre tantos outros);- do ch6 (Ukers 1935; Waugh 1951; Twining 1956; Forrest 1967;

    Butel 1989);- do cafe (Moreira 1873; Jacob 1953; Camargo & Telles Jr. 1953;

    Magalhaes 1980; Mauro 1991; Ball, ed. 1991, Brignoli & Samper 1994;Roseberry & Gudmundson & Samper Knutschbach, eds., Williams 1994);- da mandioca (Muchnick & Vinck 1984)- da chicha (Mowat 1989);- do mate (Linhares 1969);- do chocolate (Bourgaux 1935; Hardwich 1992; Coe & Coe 1996,

    Camporesi 1996).- da Coca-cola (Pendergast 1993);- da margarina (Stuyvenberg 1969);- dos biscoitos (Corley 1972; Adams 1974);- do hornburquer (Perl 1974)- dos animais como alimentos (Zeuner 1963; Vialles 1994).Alguns destes estudos sobressaem do podroo generico, por seus

    horizontes amplos. Mintz (1986 e 1996) ou Salaman (1949), como j6 seacentuou anteriormente, utilizam, respectivamente, 0 ocucor e a batata, paravastos panoramas historicos. Outros estudos tern como [io condutor problemasespecilicos, como 0 arroz enquanto veiculo de identidade cultural no jopoo(Ohnuki-Tieney 1993) ou a irnportoncio do ch6 na 'dornesticocoo' do estadoturco (Hann 1990), ou 0 cafe como vetor de poder e formador de classes na

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    America Latina (William Gudmundson & Knutschbach, (eds. 1995), Brignoli &Samper (eds., 1994), Williams (1994) ..

    Finalmente, mencionemos a dispersoo de monografias em torno de umsern-numero de problemas especificos - economicos. sociais e culturais - quenos dispensamos de exernplihcor. pois ia foram abundantemente referidosanteriormente, a proposito das questoes de conteudo.

    TopicosFome

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    Um aspecto seminal da historic da olirnentocoo e 0 da historic dafome, cu]o delinicdo oscila entre a apresentada por Sara Millman e Robert W.Kates (1990:3), como sendo uma "inadequacy in individua l d ietary in ta kerela tive to the kind and quantity o f food required for g row th, for activity and formain tenance o f g ood hea lth" e, no polo oposto, a de Amartya K.Sen (1981),para quem, a nco ser nas economias exclusivamente de subisistencic. e a trocaque deve servir de relerencio: assim, formulou 0 citerio de 'failure exchangeentitlement'(FEE) para substituir 0 de 'food availability decline' (FAD): fome e,antes de mais nada, morqinolizocoo social, falhas nos creditos de troca e,portanto, esto no ambito das decisoes humanas e nco dos acidentes climoticosou sistemas formais.

    Outros vertentes entendem as causas estuturais da fome na quebra deum sistema alimentar ( fo od sy stem b rea kd ow n), como em Richards (1939); ou apartir de uma teoria da rnodelizocoo e da cdrninistrccoo do imprevisto ( thinkingon modeling and manag ing haza rds), como em Kates et a lii (1985).

    Como as teorias sobre a fome rebatem-se nas teorias sobre 0crescimento populacional e sua relocoo com 0 crescimento na producco, tresperspectivas teoriccs adicionais costumam ser lreqiienternente apontadas (d.Newman, ed. 1990): a de Thomas Malthus, a de Karl Marx e a de EsterBoserup.

    A teoria malthusiana, como e sabido, considerava que as populccoescresceriam em proqressco geometrica (exponencialmente), enquanto que osmeios de subsistencio apenas em proqressoo oritrnetico (Iinearmente). Marx,discordando com veernencio de Malthus, apresenta uma teoria da populocooespecifica para 0 modo de producoo capitalista, onde locolizoro as raizes dafome e outras formas de rniserio humana como decorrencio das relocoes deopressoo e explorocco do sistema de producoo. Ester Boserup j 1965),apresentou uma teoria que, ao contra rio das previsoes malthusianas, identilicouno crescimento populacional um mecanismo provocador de inovccoestecnoloqicos e, no longo prazo, de melhorias nas condicoes de vida.

    A Revolu

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    afirmam de novo Sara Millman e Robert Kqtes (1990: 9), "the history o f hungeris interwoven with the history of plenty". E significativa a presence de titulosimportantes que associam os dois extremes. como L a fam e e I'a bb on da nza . S to riadell 'alimentazione (1993), de Massimo Montanari, ou Plenty and want. A socia lhistory of food in Eng land from 1815 to the present day (1966), de j.Burnett.

    Com efeito, 0 primeiro excedente e sempre alimentar. A economiahumona e, antes de tudo, ados meios de subsistencio: A divisoo desigual doproduto social e, primariamente, uma divisoo dos niveis de consumo alimentar.Mas nco sao apenos os primodos da escassez ou do cbundoncic. ou dasformas de controle e estrotiiicocoo do consumo alimentar que determinom asformas da olimentocoo humano. A historic do olirnentocoo nco pode,obviamente, reduzir-se somente a historic da fome ou a estotistica estimativo dosniveis de consumo e nutricco de diferentes epocos. Essa caracteristica infra-estrutural da vida das sociedades, seu nivel de consumo de calorias e proteinase as formas de estrotiiicocco social desse consumo, podem ser estudadaseconomicomente como decorrente do regime de producco e dlsiribuicoo. ousocial mente, como parte das Iormocoes sociais e suas instituicoes politicas, maselas se inscrevem no consciencio dos populocoes como um fato q e dimensoesideologicamente multiples e complexas, com profundos siqnilicocoes sirnbolicos,religiosas e profanos.

    Nas suos inurneros vertentes, os estudos sobre a fome tern procuradoresponder a um conjunto limitodo de questoes-chove. Qual tem sido 0desenvolvimento historico da fome, de olirnentocoes carentes ou de consumossotisiotorios nas diversos epocos e reqioes da historio da humanidade? Pode-seofirrnor que, na epoco conternporcneo. a humonidade no seu conjunto alimenta-se mais e melhor do que em epoccs passadas? Tal suposta melhoria terio sidelinearmente progressiva desde 0 final da epoco medieval ate os dios de hoie?

    Se em momentos visiveis, como guerros, pestes. cotostroies climoticos,etc.. verilicorn-se crises alimentares e podem-se medir os niveis agudos deescossez. como mensurar no longa durocco 0 curso da luta pelo olimentocoo.como verilicor os indices de consumo olimentor, os periodos ou ciclos de crises/os quodros nosoloqicos associodos a nutricoes deiicitorios e, enllrn, a inlluenciomais geral do tipo de olimentccoo na constituicco bioloqico das distintospopulocoes ?

    Tois questoes so podem ser respondidos otroves do exame comparadodos niveis historlcos de escassez ou obundcncio na producoo agricola e dasformas de producco e dislribuicoo que constituem 0equilibrio ou 0desequilibrioalimentar numa dada sociedade. Por equilibrio pressupoe-se 0consumo em niveissotisiotorios, quantitativo e quolitotivo. de proteinos. calorias e vitorninos".

    Tal historic cornecou a colher seus dodos e a buscar sisternotizo-los noseculo X I X . Um dos primeiros estudos foil como nos informa Jacques Chonchol(1989: 8)/ 0 de Cornelius Walford que/ em 1878/ apresentou a SociedadeEstatistica de Londres uma analise de mais de 350 surtos de fome historicomenteconhecidos. o tema do fome/ das crises de producco, as oscilccoes de pre

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    5. Tais estimativas de va-lares nutricionais de die-tas passadas precisamscr tratadas com cautela.o uso abusivo dos cal-culos, tao importante naepoca da primeira en-quete da revista Anna-les, foi criticado paroutros historiadores, co-mo relata Teuteberg(1992:12): "After thephysiology of nutritionhad been institutionali-zed in the second half ofthe 19th century, scho-lars tried for the firsttime to convert thequantities of food con-sumed, as determinedstatistically, into caloriesand the three most im-portant nutritions units -protein, fat and carbohy-drates. Although thismethod was little usedat first, it has becomecommon since the mid-dIe of the 20th century.Ernest Labrousse, RobertPhilippe, Frank Spooner,John McKenzie, DerekOddy, Wilhelm Abel.Andrze] Wyczanski andthe present author havedone such nutritionalvalue calculations. AsEva Barlosius, a trainednutritional physiologist,state in this volume, itisastonishing how naivelyand uncritically somehistorians have usedthese physiological cal-culations in a historicalcontext".

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    viu, no implontccoo de uma Historic do Alirnentocoo. Relembre-se 0 que foi ditocom relocoo 00 grupo dos Annales e a irnportoncio dada 00 abastecimento,pobreza e corencics. principalmente no Europa, de 1400 a 1800.Paralelamente, no Alemanha, Wilhelm Abel, que teve boa circulocoo no Franc;:a,procurava sumarizar a pobreza e as crises de fome concentrando-as no Europapre-industrial (1974). No Inglaterra, John Burnett delineava uma historic social,opes 0 influxo do industriolizocoo (1966).

    Pat Caplan (1994: 12) observa que enos grandes disporidodesrelativas a olimenlocoo que melhor se simbolizam as diferenc;:as de classe. Naoe de estranhar, portanto, que 0 tema das rebelioes e desordem social se tenhatransformado numa plataforma estroteqico para entender estrutura e relocoessociais. Vorios trabalhos podem servir de exemplo, principalmente no Inglaterra:F oo d rio ts in En glan d, 1792-1818, de j.Stevenson (1974); D earth and the socialorder in early modern Eng land, de j.Walter e K. Wrightson (1976); Were'hunger' rioters rea lly hung ry? Some demographic evidence, de D.E.Williams(1976); Eng lish hunger and industria l disorders, de WJShelton (1973). Lowe(1986) analisa as revoltas, politicos alimentares, regulamentac;:ao de mercados noInglaterra, Franc;:ae Alemanha setecentistas. .

    Como resultado do interesse continuado dos especialistas, dispoe-seho]e de um acervo relevante de obras de qualidade, pertinentes 00 tema. Citem-se apenas alguns marcos globais ou obras caracterfsticas. Robert I. Rotberg eTheodor K. Rabb (eds. 1985) sao responsoveis por uma coletoneo que constituidos primeiros esforc;:os de orientar interdisciplinarmente os estudos sobre a fome.Lucille F.Newman (ed.ger. 1990) reuniu numa antologia intitulada Hunger inHistory. F ood shortag e, poverty and deprivation, 16 trabalhos apresentadosentre 1986/87 no Brown University, no H ung er H istory S em in ar e que analisamos problemas do fome desde os inicios do sociedade humana e a Antiguidade,ate a sociedade conternporoneo, preocupados com entende-Ios para suuo-losnuma via de solucoo.

    A preccupocco com a quontilicocoo nco encontra respaldo,infelizmente, no dccumentocco disponivel. A fome, alias, e um fen6meno quetende a [icor a sombra. E conhecida a di l iculdode de obter colculos precisos doteor do nutricco dos diversos segmentos sociais das diferentes sociedades. Paraisso, foi indispensovel um esforc;:o teorico para se poder esboc;:ar a cornpcrocoode dodos de distintas procedencios no tempo e no espac;:o, efetuando-seestimativas de cornposicco colorico no ossociocoes de alimentos dilerentes -para 0 que Frank