A Historia Do Carvao Em SC

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Ayser Guidi natural de Cricima (SC), engenheiro de Minas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e engenheiro de Segurana do Trabalho pela Universidade do Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (UDESC). Trabalhou na Carbonfera Cricima e na Carbonfera Urussanga e lecionou na SATC e na Fundao Universitria de Cricima (FUCRI).

Joice QuadrosNasceu em Santo ngelo (RS) e se formou Bacharel em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Cursou Ps-Graduao em Fundamentos da Educao pela Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). assessora de comunicao de empresas de Cricima (SC), tendo tambm atuado em diversos veculos de comunicao do RS e SC, como Zero Hora e Rede de Comunicaes Eldorado.

Mrio BelolliNatural de Cricima (SC), formou-se bacharel em Histria pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). membro do Instituto Histrico e Geogrfico de Santa Catarina e da Academia Criciumense de Letras. Foi presidente do Conselho Municipal de Cultura e diretor do Departamento de Cultura da Prefeitura Municipal de Cricima.

Mrio Belolli

Joice Quadros

Ayser Guidi

Histria do Carvo de Santa Catarina

1790 1950 VOLUME I

Histria do Carvo de Santa Catarina c 2002 SIECESC - Empresas Rio Deserto Editorao Eletrnica: Hexa Comunicao Integral Diagramao: Alexandre Costa de Souza Capa: Luis Leite Reviso: Suzi Nascimento Fotos e Documentos: Fernando Jorge da Cunha Carneiro, Joo Zanette e Mrio Belolli

662.7409816 B452h Belolli, Mrio et al. Histria do Carvo de Santa Catarina/ Mrio Belolli, Joice Quadros, Ayser Guidi. Cricima: Imprensa Oficial do Estado de Santa Catarina, 2002. 300 p. il. 1.Carvo Histria. 2. Carvo Santa Catarina. I. Quadros, Joice. II. Guidi, Ayser. III. Ttulo

Ficha catalogrfica fornecida pela Biblioteca da SATC

ndiceAgradecimentos Apresentao Regio Carbonfera de Santa Catarina Introduo Captulo I O Carvo na Histria O Cenrio da Histria O Caminho dos Tropeiros Captulo II Comeam os Estudos Captulo III A Primeira Mina e Estrada de Ferro A Comisso White no Brasil As Forjas Domiciliares Captulo IV A Propaganda do Carvo Catarinense Das Experincias Oficializao da Regio Carbonfera Captulo V Chegam os Investidores Prolongamento da Estrada de Ferro Nos Tempos de Henrique Lage Captulo VI Os Primeiros Testes Internacionais com o Carvo Catarinense Deputado Analisa a Utilizao do Carvo Nacional Captulo VII A Modernizao do Setor Carbonfero Captulo VIII Novas Leis Incentivam o Aproveitamento do Carvo Nacional Estado Incentiva a Formao de Empresas de Minerao Projeto Estabelece Regras Indstria Carbonfera I Congresso Brasileiro do Carvo e Outros Combustveis Nacionais Captulo IX Da Eficincia, a Superao s Crticas As Conseqncias da Quebra das Bolsas de Valores 13 17 19 21 23 27 35 40 45 51 55 67 73 83 87 91 93 103 108 109 111 115 121

Captulo X Protecionismo Governamental Eleies da Nova Diretoria Statusde Uma Funo Captulo XI A Influncia do Cdigo de Minas Cooperativa dos Produtores de Carvo Companhias Carbonferas de Santa Catarina em 1942 Captulo XII Plano Siderrgico Nacional Usina de Beneficiamento de Carvo A Indstria do Coque de Santa Catarina Captulo XIII II Guerra Mundial e Sua Influncia Portos de Navegao: Laguna e Imbituba Departamento Nacional da Produo Mineral Comisso de Tcnicos Brasileiros Percorre a Regio Carbonfera Captulo XIV A Iminente Crise do Setor Carbonfero Captulo XV Buscando Solues Para a Crise Captulo XVI Mesa Redonda do Carvo Abertos os Trabalhos da Mesa Redonda Captulo XVII Organizao Sindical Sindicato dos Trabalhadores A Participao da Mulher e do Jovem no Trabalho das Minas de Carvo Captulo XVIII Comemoraes e Homenagens Congresso Eucarstico Regional Captulo XIX Assistncia Social aos Trabalhadores das Minas de Carvo Inaugurao do Posto de Puericultura Hospital dos Mineiros Anbal Alves Bastos Servio Social da Indstria Vilas Operrias Captulo XX Sntese Biogrfica Bibliografia

125 137 139 141 148 151 155 166 169 179 182 186 190 203 213 221 230 245 250 254 259 263 265 268 269 272 275 279 295

AgradecimentosMuitas so as pessoas e entidades s quais devemos agradecer pela oportunidade de produzirmos esta obra. Mas, a uma s deve ser creditado o seu incio: ao senhor Joo Zanette. Pessoalmente, ele insistiu conosco para que contssemos a histria do carvo. Certa vez em que Joice o entrevistava, de prprio punho, ele foi desenhando uma linha do tempo e acrescentando ali todas as empresas mineradoras que foram surgindo com o passar dos anos. Esta histria no pode se perder, insistia ele obstinadamente. Nesta poca, em 1996, a Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC) estava com um projeto de resgate histrico, e Joice foi contratada para escrever a biografia do senhor Joo Zanette. Foram longas tardes de muita conversa com ele e muitas pesquisas historiogrficas e documentais. A partir da, o assunto no parou mais. Chamou-nos para conversar com o presidente do Sindicato da Indstria de Extrao de Carvo do Estado de Santa Catarina (SIECESC), engenheiro Ruy Hlse, e o diretor da Companhia Carbonfera Rio Deserto, Valcir Zanette, quando desencadeou todo o processo de produo desta obra. Convocados para este trabalho, aceitamos o desafio. No incio contamos com a colaborao da jornalista Andressa Fabris e da universitria Rosimeri Zacarias Ghizzo. Na difcil finalizao do Volume I, a dedicao da jornalista Suzi Nascimento e do publicitrio Alexandre Costa de Souza, profissionais da Hexa Comunicao Integral, tornou-se fator diferencial e indispensvel realizao do trabalho. A eles, o nosso muito obrigado.

Para a publicao deste volume, em todos os momentos de nossa caminhada, tivemos a confiana e o apoio constante de Ruy Hlse e Valcir Zanette, sempre nos encorajando a superar as dificuldades, que no foram poucas. Confiantes de que a primeira parte da nossa misso est cumprida, agradecemos a Deus por estarmos aqui, neste momento, e termos esta oportunidade mpar de deixarmos escrita a Histria do Carvo de Santa Catarina. Os Autores

ApresentaoNa condio de presidente do Sindicato da Indstria de Extrao de Carvo do Estado de Santa Catarina (SIECESC), coube-me a honrosa incumbncia de fazer a apresentao do I Volume da Histria do Carvo de Santa Catarina, englobando os fatos ocorridos de 1790 a 1950. O Volume II vir oportunamente abrangendo os acontecimentos que se desenrolaram de 1950 at nossos dias. Podemos afirmar que a primeira tentativa de explorar economicamente o nosso carvo data de 1861 quando o poltico e diplomata baiano Felisberto Caldeira Brandt, o Visconde de Barbacena, recebe do imperador D. Pedro II a concesso para explorar carvo na localidade de Lauro Mller. Daquele ano at 1950, fatos importantes contriburam para, ora dar importncia ao carvo catarinense e tambm projet-lo em profundas crises. Assim foi durante a Primeira Grande Guerra Mundial de 1914 a 1918 e durante a Segunda Guerra de 1939 a 1945, quando em ambos os conflitos o nosso carvo foi valorizado pela impossibilidade de se importar o produto e esquecido aps o trmino destes conflitos. Mister ressaltarmos que, na dcada de 1930, no primeiro Governo de Getlio Vargas, o carvo nacional mereceu amplo apoio pela edio de vrios dispositivos legais que o inseriram como importante insumo no nosso desenvolvimento industrial e como combustvel para acionar as nossas ferrovias e navegao. Dois marcos importantes, embora distantes no tempo entre si, contriburam de forma significativa para o desenvolvimento da indstria carbonfera catarinense. O primeiro, a construo da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, hoje Ferrovia Teresa Cristina, inaugurada em 1884, ligando o Porto de Imbituba

a Lauro Mller e a criao da Cia. Siderrgica Nacional, implantada em 1942, na cidade de Volta Redonda, no Estado do Rio de Janeiro. Com a implantao da Cia. Siderrgica Nacional resultou a instalao da usina de beneficiamento de carvo, em Capivari de Baixo, para a obteno de carvo metalrgico, destinado aos altos fornos de Volta Redonda, e de carvo energtico, que deu origem ao Complexo Termeltrico Jorge Lacerda, a SOTELCA, hoje Tractebel Energia. No fluir destes, cerca de cem anos, desde a iniciativa do Visconde de Barbacena at 1950, o leitor encontrar neste I Volume toda a histria do nosso carvo, onde uma pliade de cidados deu muito de si em prol do carvo catarinense, podendo assim conhecer, avaliar e reverenciar aqueles que batalharam: polticos, homens pblicos, pesquisadores, empresrios e trabalhadores, pelo progresso do Sul catarinense. Ao encerrarmos estas nossas consideraes queremos registrar nosso reconhecimento ao senhor Joo Zanette, empresrio do carvo que, do alto da sua sabedoria lastreada em seus 91 anos, sempre acreditou e lutou pelo nosso carvo, estimulando inclusive o lanamento desta obra. Cabe ainda agradecermos Carbonfera Rio Deserto e ao prprio SIECESC, que conjugaram esforos para que o historiador Mrio Belolli, a jornalista Joice Quadros e o engenheiro Ayser Guidi, atravs da palavra escrita, resgatassem a memria de importante fase da mais tradicional atividade econmica do Sul do Estado.Ruy Hlse Presidente do SIECESC

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Regio Carbonfera do Estado de Santa CatarinaNo Brasil, as principais ocorrncias de carvo mineral localizam-se na Regio Sul e se estendem desde So Paulo, passando pelos Estados do Paran e Santa Catarina, at o Rio Grande do Sul. A Bacia Carbonfera catarinense constitui-se de uma faixa aproximada de cem quilmetros de comprimento e uma largura mdia de vinte quilmetros, entre a Serra Geral a Oeste e o macio grantico da Serra do Mar a Leste, seguindo a orientao Norte-Sul. A explorao do carvo catarinense desenvolve-se na Regio Sul do Estado, onde importantes centros de minerao se afirmam nos municpios de Lauro Mller, Urussanga, Siderpolis, Treviso, Cricima, Forquilhinha, Iara, Morro da Fumaa e Maracaj. No passado recente, em decorrncia de uma produo definida e crescente, essa regio desenvolveu condies estruturais favorveis instalao de importante centro de produo de carvo mineral. Esta produo contribuiu tambm para consolidar os alicerces de novos setores empresariais que, por sua vez, corroboram para um importante aumento demogrfico da Regio Sul catarinense, completando o encadeamento scioeconmico de repercusso nacional e internacional. Em conjunto, atuou o Lavador de Capivari de Baixo, para o melhor aproveitamento do carvo, prestando relevantes servios tcnicos ao desenvolvimento da minerao, de onde partia o produto preparado para os grandes centros consumidores do Pas.13

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Entre outros setores de grande importncia econmica envolvidos desde o incio da explorao do carvo esto a Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina (hoje Ferrovia Teresa Cristina) e os portos martimos de Imbituba e de Laguna. A formao das jazidas, segundo o gelogo Hannfrit Putzer, aconteceu aps a glaciao permo-carbonfera. Nesse perodo, verificado o recuo do gelo no Sul do pas, a vegetao comeou a se desenvolver paulatinamente obrigando os sedimentos gondunicos1 a se depositarem em grandes reas da Bacia do Rio Paran, envolvendo os trs Estados do Sul do Pas. O Sistema Santa Catarina, estabelecido pelo gelogo americano Israel Charles White no incio do sculo XX, ao fazer a correlao entre o Sistema Karoo da frica do Sul, comenta:Esta estreita identidade, no somente dos fsseis dos Sistemas de Santa Catarina e Karoo, mas tambm a semelhana geral da feio estratigrfica e litolgica que se encontra nos dois sistemas, bem como no do Gonduana da ndia, quando ao que se refere aos membros, inferior e superior, certamente vm em apoio da grande probabilidade da hiptese que admite que os Continentes Meridionais devem ter estado unidos durante os perodos permiano e trissico por poro de terra, agora submersa, a que Suess denominou terra Gonduana. 2

Nesta regio, as camadas de carvo, segundo os gelogos Jos Fiuza da Rocha e Evaristo Pena Scorza,depois de se mostrarem em Bom Retiro, reaparecem em Lauro Mller e, numa direo geral Norte-Sul, atravessam as regies de Urussanga, Treviso e Cricima. A estratigrafia revela vrios horizontes carbonferos, que receberam as seguintes denominaes, do mais superficial ao mais profundo: Treviso, Barro Branco, Irapu, Ponte Alta e Bonito. 3

As reservas de carvo mineral de Santa Catarina, de acordo com as mais recentes pesquisas, chegam a 3,2 bilhes de toneladas.

1. PUTZER, Hannfrit. Camadas de carvo mineral e seu comportamento no Sul do Estado de Santa Catarina, Rio de Janeiro, DNPM-MA, Bol. 91, 1952. 2. Apud FIUZA DA ROCHA, Jos & SCORZA, Evaristo Pena. Estratigrafia do carvo em Santa Catarina, Rio de Janeiro, DNPM-MA, Bol. 104, 1940, p. 51. 3. FIUZA DA ROCHA, Jos & SCORZA, Evaristo Pena. op. cit.

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Zona Carbonfera de Santa Catarina

Fonte: Projeto da Siderrgica de Santa Catarina (1965)

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IntroduoO carvo catarinense parte fundamental da histria e da Regio Sul do Estado e para alguns municpios constitui-se na essncia da sua prpria histria. Com viso mercantilista, as cortes portuguesas procuravam na Colnia apenas gemas e metais preciosos, no se interessando por insumos que possibilitassem o surgimento de manufaturas. Ao contrrio, queimem todos os teares, bradava D. Maria I, a Louca. Sob a gide dos governos imperiais, muitos naturalistas europeus e norte-americanos vieram ao Brasil, e vrios deles dedicaram-se ao estudo da nossa geologia e recursos naturais, incluindo-se o carvo. Ao final do Segundo Imprio que surge um esboo de organizao das instituies responsveis pelos estudos dos recursos naturais brasileiros, que seriam aperfeioados at as primeiras dcadas da Repblica. Isso possibilitou a confirmao da existncia e melhor conhecimento do carvo de Santa Catarina. Chegando a haver interesse de capitais estrangeiros na explorao do carvo catarinense, porm foram demovidos pela falta de infra-estrutura que o tornasse economicamente vivel ou por no possuir a mesma qualidade que os carves do Hemisfrio Norte. Os dois conflitos mundiais proporcionaram oportunidade para o surgimento das empresas carbonferas comandadas por investidores brasileiros. Nas duas ocasies o Brasil esteve prestes a assitir ao colapso de atividades vitais para a sua economia, devido escassez de combustvel para os transportes martimo e ferrovirio e para a indstria, mas tanto na Primeira quanto na Segunda Guerra Mundial, a utilizao do carvo de Santa Catarina foi suporte para a vida nacional, evitando maiores conseqncias no contexto social da Nao.17

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A presena do carvo catarinense, nos momentos histricos decisivos do sculo XX, foi possvel graas a providenciais aes de Governo e de brasileiros patriotas. A mudana de diretrizes polticas concebida pela Revoluo de 1930 ocasionou uma srie de medidas de valorizao dos produtos brasileiros e substituio de importaes. Nesse cenrio o carvo de Santa Catarina foi considerado estratgico para a industrializao brasileira, com a criao da Companhia Siderrgica Nacional. Aps a Segunda Guerra, com as facilidades da tecnologia do petrleo e o restabelecimento da importao de carvo dos tradicionais produtores mundiais, viu-se a indstria carbonfera brasileira em meio a uma nova crise. Frente a estes fatos no restou alternativa ao Governo brasileiro seno convocar mesas redondas, com a participao de produtores, consumidores e rgos governamentais, em busca de equacionamento do problema e soluo duradoura para uma poltica do carvo, que culminaria, sobretudo, com a criao de um rgo especfico para o setor.

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Captulo I

O Carvo na HistriaA histria do carvo confunde-se com o desenvolvimento do homem. Na Pr-Histria, o fogo era considerado algo produzido pelos deuses, at que os primitivos observaram que as florestas transformavam-se em pedras negras aps serem incendiadas por um raio, e que estes resduos tambm eram inflamveis. Era o carvo vegetal, que proporcionou mais conforto e facilidade aos homens das cavernas. J no Perodo Neoltico, uma nova descoberta: minerais negros colocados para proteger as fogueiras eram reduzidos a metal quando em contato com a lenha carbonizada. Seguiram-se as idades do cobre, do bronze e do ferro, e o homem foi utilizando o calor do carvo mineral para tornar moldveis as matrias-primas de suas ferramentas. J o Gnesis, primeiro livro de Moiss (Cap. IV, versculo 22), refere-se a Tubal-Cain como o que sabia forjar instrumentos de corte de cobre e ferro. Tambm nos registros da antigidade encontra-se a proteo ao meio ambiente, como em 1588, quando foi proibido o corte de carvalhos nas reas at 23 km da costa ou das margens dos rios navegveis de Kestor (Devon), na Inglaterra. Nessa regio, foram descobertos restos de fornos para produo de ferro datado de 400 a.C. A proibio do uso do carvalho como lenha incentivou a utilizao do carvo mineral. O carvo passava a ser agente direto do que mais tarde seria reconhecida como uma verdadeira revoluo. Em 1668, o engenheiro militar ingls Thomas Savery desenvolveu um motor para bombear gua das minas profundas de carvo. Em 1709, Abraham Darby produzira o primeiro gusa a partir do coque de19

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carvo mineral, em Coalbrockdale (Inglaterra). Com o mesmo objetivo de Thomas Savery, o ferreiro Thomas Newcomen utilizou em 1711 o vapor como base energtica de sua mquina atmosfrica. A criao de Newcomen foi aperfeioada em 1765 pelo escocs James Watt e o engenheiro Matthew Bouton, resultando na mquina a vapor de duplo efeito. Eles instalaram cerca de 500 desses equipamentos para acionar bombas de minas de carvo, mquinas de fiar e tecer, sopradores de altos fornos e inmeros outros instrumentos. Nos transportes, o uso do carvo tambm foi essencial para o desenvolvimento tecnolgico. No incio do sculo XIX, em 1803, Robert Fulton construiu em Paris o primeiro barco a vapor, e em 1825 George Stephenson construiu a primeira ferrovia com locomotiva a vapor.Histria do Brasil - Proena & Lago

Mquina a vapor, um invento de James Watt

Aos poucos, as foras hidrulica, animal e humana eram substitudas pelo poder energtico do carvo mineral, e uma verdadeira revoluo industrial foi acontecendo. A Gr-Bretanha foi pioneira desta revoluo devido s suas ricas reservas de carvo e minrio de ferro e qualidade de seus minerais. O carvo foi determinante neste processo, ajudando a movimentar mquinas produtoras de bens e de transporte. A Revoluo Industrial no conheceu fronteiras, espalhou-se pela Europa Central, tendo a Alemanha como principal seguidora. A produo de bens aconteceu em quantidade infinitamente superior do passado. S no perodo entre 1850 e 1910, a produo de ferro e carvo aumentou vinte e seis vezes, graas ao uso da mquina a vapor. Essa rpida industrializao teve como conseqncia o domnio colonialista para assegurar o suprimento de matrias-primas aos que no as possuam e o consumo de mercados alm-fronteiras, gerando disputas acirradas, que mais tarde iriam explodir na Primeira Guerra Mundial.20

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O Cenrio da HistriaQuando o general francs Napoleo Bonaparte ameaou com suas tropas o reino de Portugal, na primeira dcada de 1800, no imaginou que seu ato teria conseqncias alm-mar nas pacatas aldeias indgenas das tribos dos Js e Tupis-Guaranis. Eles habitavam as terras da Provncia de Santa Catarina, ao Sul de uma das colnias de Portugal espalhadas pelo mundo, que se chamava Brasil. Os indgenas nunca tinham ouvido falar em Napoleo Bonaparte e nem em sonhos poderiam imaginar que a estratgia do general francs de conquistar a Europa teria repercusso, justo ali no meio da selva brasileira. At ento, a nica novidade que atraa a curiosidade e mudava um pouco a rotina na vida da aldeia eram uns homens diferentes deles, os tropeiros, que passavam conduzindo grandes manadas de animais. Mais ao litoral, sabiam da existncia de aglomerados de casas que estavam surgindo, bem diferentes das suas. Eram as pequenas vilas formadas por casais aorianos que estavam povoando o litoral catarinense. Antes, muito antes, seus antepassados contavam de uns homens brancos que chegavam como se tivessem surgido do nada e prendiam os homens ndios, levando-os para um lugar onde as famlias indgenas que ficaram jamais soubessem ou tivessem notcias. Eram os caadores de mo-de-obra escrava para trabalhar nas lavouras de cana-de-acar e nos engenhos portugueses. Havia tambm uns homens que se vestiam de preto, os Padres Jesutas, que procuravam se aproximar dos habitantes indgenas. Enquanto isso ia acontecendo no verde e silencioso cenrio das selvas sul-brasileiras, na Europa o som dos tambores das tropas francesas aumentava a cada momento, j se confundindo com o dos tiros dos canhes, chegando s portas de Portugal. Ao Regente D. Joo de Bragana no restava outra sada, a no ser a do mar. Estava coagido a sair de Lisboa, tanto pelas circunstncias da invaso francesa, como pelas presses do imperialismo ingls. A Inglaterra era a toda poderosa senhora dos mares da poca, estava em avanado estgio do capitalismo industrial e exercia domnio poltico e econmico sobre Portugal, um pas ainda atrelado ao mercantilismo.21

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ento que a Famlia Real Portuguesa se transfere para o Brasil. Aqui chegando, no ms de janeiro de 1808, abre os portos s Naes Amigas, leia-se Inglaterra. Junto com a Famlia Real e com essa deciso de abertura dos portos, vm intelectuais, tcnicos e estudiosos europeus das mais diferentes reas do conhecimento humano. Entre esses, o naturalista alemo Friedrich Sellow1 (1789 - 1831).

Histria do Brasil - Proena & Lago

Embarque da Famlia Real para o Brasil

1. Apud GUIMARES, Djalma. Geologia do Brasil (Memria I), Rio de Janeiro, DNPM-MA, 1964, p. 68. Selow foi companheiro do Prncipe de Wiel-Neuwied em sua expedio especfica Bahia. Em Arapei Chico, coletou restos de vertebrados pleisticnios, mais tarde estudados por P. Couto, tendo sido antes descritos por C. S. Weiss, professor de mineralogia em Berlim. Organizou preciosas colees enviadas aos museus do Rio de Janeiro, Lisboa e Berlim; cerca de duas mil amostras de minerais e rochas brasileiras foram enviadas ao museu alemo. As melhores peas paleontolgicas de Sellow foram entregues ao Museu Nacional, mas infelizmente perdeu-se a maior parte do material. As observaes de Sellow sobre o Rio Grande do Sul e Uruguai foram dadas publicidade em 1830, por C. S. Weiss e com a colaborao de K. J. Bernhardet Kaster. Distinguiu, Sellow, no Sul do Brasil, granitos de duas idades, alm dos vulcanitos cidos, derrames extensos de basalto amigdalide e instruo do mesmo arenito trissico. Refere-se s sries que atualmente receberam os nomes de Maric e Camaqu, a srie carbonfera de Jacu e de um conjunto de rochas fossilficas, entre S. Gabriel e Caiguat, com dentes e crnios de peixes e plantas silicificadas.

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O Caminho dos TropeirosOs caminhos abertos pelos tropeiros so referenciais importantes na histria catarinense. Esses tropeiros conduziam tropas de gado e de cavalos do Rio Grande do Sul at Sorocaba, em So Paulo, e dali para Minas Gerais. Era um transporte lento, onde os caminhos iam-se abrindo naturalmente. Pela sua lentido e condies climticas, obrigavam-se os tropeiros a paradas regulares, erguendo grandes galpes rsticos para seu abrigo, que ficaram conhecidos como pouso das tropas. Esses lugares de pouso foram os embries de muitas cidades, entre elas a de Lages, a partir dali comeando o povoamento do Planalto Central. Esses caminhos foram igualmente embries das rodovias que hoje integram o Estado catarinense. Mas no s para o povoamento e abertura de estradas que so referenciais os tropeiros. Foram eles tambm os primeiros a encontrar o carvo de pedra na regio Sul de Santa Catarina. Os indgenas j conheciam essas pedras que queimavam. A diferena que os tropeiros tomaram conhecimento do seu valor econmico ao levarem adiante a notcia sobres essas pedras que queimavam e souberam que havia despertado o interesse da Corte. Como se pode observar, o carvo de pedra j era um assunto discutido antes mesmo dos estudos de Sellow, em 1827-1828, por isso ele foi convidado a fazer o reconhecimento dessa descoberta. Segundo as informaes mais correntes, os tropeiros serranos que desciam o planalto em demanda ao porto de Laguna, percorrendo uma picada aberta na Serra Geral que atingia a bifurcao do rio Tubaro, deste rio com os de Passa Dois e Bonito, no lugar hoje conhecido por Barro Branco, ao acamparem para preparar as refeies ao cair da tarde, notaram que diversas pedras pretas que havia acercado ao fogo para servirem de trempe ao rstico fogo campeiro2 entraram em combusto e se reduziram a cinzas. A primeira notcia dessa faanha, levada pelos annimos tropeiros cidade histrica de Laguna, onde estavam acostumados a embarcar23

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as suas cargas naquele porto, ocorreu em fins do sculo XVIII. Dali, a notcia se espalhou rapidamente pela provncia catarinense, chegando ao conhecimento tambm dos governantes.

Os Tropeiros leo de Willy Zumblick (1981)

2. MUELLER, Edson. As armas do municpio de Lauro Mller, in. Revista do Instituto Histrico e Geogrfico de Santa Catarina, Florianpolis, n 18. 3 fase, 1999, p. 167.

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Os Primitivos Caminhos de Tropas

Fonte: Amdio Vettoretti - Histria de Tubaro (1992)

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Captulo II

Comeam os EstudosO naturalista alemo Friedrich Sellow, membro da Academia Real de Cincias de Berlim, chegou ao Brasil em 1814. Ele veio como pensionrio de Sua Majestade Imperial, o Rei D. Joo VI, para pesquisar jazidas de ouro, prata e carvo mineral. Por volta de 1827, examina no Rio Grande do Sul as jazidas de ouro de Caapava, de prata em Acegu e as de carvo do Jacu, estendendo seus estudos at o Sul de Santa Catarina,1 onde analisou igualmente os afloramentos carbonferos desta regio. Sellow, aps as concluses de seus estudos, encaminhou-os Corte, que teria despertado o interesse pelas minas de carvo de Santa Catarina. Assim, em 1832 comeou a ser organizada uma pequena empresa para a primeira tentativa de explorao das referidas jazidas do carvo catarinense, quando foi dirigido um memorial ao presidente da provncia, Feliciano Nunes Pires, pedindo auxilio e concesso para a extrao do carvo. Nesse mesmo ano, em 18 de junho, a Comisso de Minas e Bosques rgo do Governo central solicitou mais informaes a Nunes Pires sobre o andamento do processo de minerao da sua provncia. Nesse vai-e-vem dos documentos oficiais percorrendo os gabinetes burocrticos, quando veio a resposta, l pelos meados de 1833, quase um ano depois, a propagada empresa j estava dissolvida. Apesar dos entraves da burocracia, o interesse do poder pblico imperial em relao descoberta das jazidas minerais era evidente. Tanto que continua27

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ram investindo em pesquisas, realizadas em 1833 por Alexandre Davidson. Os estudos foram concludos e enviado relatrio, com amostras de carvo, para o Governo Imperial, acompanhado de ofcio de Nunes Pires, datado de 26 de maro de 1834. O relatrio afirmava que as jazidas eram extensas e o carvo de boa qualidade, mas rendeu apenas mensagens polticas pedindo mais ateno ao assunto. O presidente da provncia, em sua mensagem de 1 de maro de 1835, apresentada Primeira Assemblia da Provncia Catarinense, afirma:... Tem ainda a Provncia um manancial de riqueza na mina de carvo no Termo da Laguna, mas para faz-lo valor depende da aplicao de capitais e indstria e para anim-la se h mister de indagaes mais extensas e mais circunstanciadas do que aquelas que at agora se tem podido fazer, pelas quais apenas se h reconhecido que a mim abundante, fcil de trabalhar e de boa qualidade. Em suma, das informaes havidas a este respeito acham-se na cpia que apresento de um ofcio meu ao Exmo. Ministro dos Negcios do Imprio, a tal respeito.Rel. e fala do presidente da Provncia

Feliciano Nunes Pires

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Algum tempo depois, no incio de 1837, h registro de que Augusto Kersting requereu autorizao para organizar uma companhia destinada a minerar carvo nas imediaes de Laguna, mas desistiu da idia em setembro do mesmo ano, depois de verificar que a distncia das minas aos portos de embarque inviabilizava o empreendimento. Ainda nesse mesmo ano ou, segundo outros autores - um ano mais tarde, esses afloramentos foram examinados pelo francs Guilherme Baulierch, que organizou os primeiros estudos e mapeamento da regio. Concludos os trabalhos, elaborou extenso relatrio ao presidente da provncia de Santa Catarina onde deixou claro seu convencimento da tima qualidade do carvo e da pujana das jazidas. Um registro que se encontra sobre este momento o trecho de uma carta publicada pelo Jornal do Comrcio, do Rio de Janeiro, de 8 de junho de 1843, e reproduzida pelo jornal O Albor, de Laguna, em 10 de julho de 1943. O peridico catarinense, ao dar destaque nota, parece comemorar os cem anos do evento:Agora volta da o Sr. G. Baulierch, que tem trabalhado desde 1837 para reconhecer e determinar a existncia das minas de carvo de pedra no distrito de Laguna, e que acaba de chegar de Ararangu, pela quarta vez explorado por ele para o mencionado fim, munido de todos os esclarecimentos tendentes a provar ainda aos mais cegos e emperrados, no s a existncia do mineral como a facilidade de o extrair, e de trazer ao porto de embarque por gua. Deus queira que de uma vez o acreditem, e que ainda no encontre algum que descubra pretexto para evitar o aproveitamento de tanta riqueza.

O anunciado da descoberta efetiva do carvo de pedra em Santa Catarina corria solto, gerando um clima positivo para torn-lo um produto vendvel. Tanto, que os gabinetes da Provncia e do Imprio comearam a ficar povoados de cartas, relatrios e mapas, com a inteno de buscar certos privilgios e vantagens governamentais objetivando lucros imediatos atravs da extrao do carvo mineral. O ambiente poltico do Pas, entretanto, no era dos mais favorveis. Vale lembrar que em 1831 D. Pedro I renunciou ao trono e retornou a Portugal, passando a Coroa ao seu filho, D. Pedro II, de apenas 5 anos. Em razo da pouca idade do imperador, o Pas passa a ser governado por29

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regncias e mergulha em profunda crise poltica com revoltas se intensificando em grande parte do territrio nacional. quando acontece no Sul a Revoluo Farroupilha (1835 1845), que iniciou no Rio Grande do Sul e trouxe seus ideais republicanos a Santa Catarina, culminando com a proclamao da Repblica Catarinense a Juliana, em 1839, sendo estabelecida na cidade de Laguna com a colaborao do revolucionrio Giuseppe Garibaldi e de sua mulher, a catarinense Ana Maria de Jesus Ribeiro da Silva, a conhecida Herona dos Dois Mundos Anita Garibaldi. Contra esses ideais republicanos estavam os Postos Avanados de Combate a servio do Governo central, como o de Boa Vista, na Regio Serrana de Santa Catarina (Lages), de onde foram transmitidas tambm notcias sobre o carvo de pedra, como se pode observar a seguir:Se estamos mal providos de notcias blicas, tenho de dar-lhe uma que pertence ao domnio da paz, e que disposies para a guerra com que lutamos ajudaro a realizar. de vital interesse para esta provncia e para o Brasil. O presidente igualmente desvelado e prescutador e alm de militar encarregado de promover a prosperidade do Pas que administra, encarregou ao tenente-coronel Carreira, comandante dos Postos Avanados na estrada de Lages, pelo Trombudo, de descobrir e explorar, em lugares que lhe indicou, a existncia de pedreiras de mrmore, e de minas de carvo de pedra nas imediaes da Serra, para o Rodeio Bonito, a 18 lguas pouco mais ou menos desta capital. Vieram amostras do mineral, sobre as quais se fizeram experincias em presena do presidente, extraindo dela e do carvo ingls o gs hidrognio, com resultados iguais, e mesmo para melhor grau, no Rodeio Bonito. Pode-se asseverar que a mina ocupa grande extenso das vrzeas da Serra, porque j se tem visto indcios da existncia do mineral, desde o Ararangu at o rio das Tijucas Grandes, num espao de mais de 40 lguas...3

Sobre essas notcias enviadas pelos soldados do Imprio, em 18 de maro de 1840, o presidente da provncia de Santa Catarina, Antero Jos Ferreira de Brito, endereou um ofcio ao ministro e secretrio de Estado e Negcios do Imprio, Manoel Antnio Galvo, nos seguintes termos:Como tenha anunciado a V. Exa. no meu ofcio n. 11 fez-se a diligncia pelo carvo de pedra, e o tenente-coronel Carreira, comandante dos Postos Avanados na Boa Vista, mandou ao lugar30

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indicado por mim, na Vrzea das Razes, tirar uma amostra, que me remeteu em pequena poro, e vai na caixa que contm outra maior, embrulhada em papel, para se no confundir com ela, apesar de ser de um negro mais forte; porm fazendo explorar no Rodeio Bonito antes de chegar ao Papu, achou e mandou-me algumas pedras de outra mina que ele julga de melhor qualidade, e que eu remeto disposio de V. Exa. por mo do capito de fragata Bernardino de Sena e Arajo, comandante do pilot-boat Atrevido Africano para que se possam fazer os exames que se julgarem precisos. Esta segunda mina julga o tenente coronel que ter uma lgua de extenso; mas eu penso que ela geral em toda a serra, ao menos desde o Tubaro at este lugar, e pelas vrzeas prximas fralda da mesma serra; porque aparecendo em dois lugares e muito distantes um do outro, e s aonde h caminhos, ningum pode afirmar que ela no aparea em outros, e que s acertassem em ser as minas nos lugares onde por acaso se abriro as estradas. Se houver carvo em outros lugares, tornar-se- mais provvel que seja mina geral. Em qualquer caso, j nos no pode ficar dvida de que carvo; porque no s se inflama, mas tambm que produz bastante gs hidrognio, como vi, extraindo-se ao mesmo tempo deste carvo e do carvo ingls, e ambos produziram uma luz que durou mais do que parecia corresponder a quantidade exposta destilao; sendo a luz do carvo do Rodeio Bonito, mais clara que a do carvo ingls. Pessoas que tem visto e usado o carvo de pedra da mina do Valongo, prximo cidade do Porto, no reino de Portugal dizem que este uma espcie entre o de Valongo e o ingls. At agora nenhum outro trabalho tem havido para obter estas amostras de carvo, que lhe pega superfcie da terra, ou quebrar alguma pedra maior; e disto devemos concluir que melhor qualidade se achar quando se tratar efetivamente da minerao; mas para no caminharmos sobre hipteses, pode V. Exa. mandar aqui alguma pessoa entendida, e que saiba reconhecer minas desta natureza, que eu farei cobrir com fora essa diligncia, se a esse tempo ainda e estrada no estiver desembaraada dos rebeldes (...) Deus guarde a V. Exa. Desterro, 18 de maro de 1840. Antero Jos Ferreira de Brito - Presidente da Provncia e Bernardo Joaquim de Mattos Secretrio do Governo.4

Alm desse esclarecimento, tornado pblico pelo Governo da Provncia catarinense, os homens do Imprio agora tinham em mos outros documentos que mapeavam a regio. Desta forma, puderam ento apro31

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var leis em favor do assunto, como a de n 243, do ano de 1841, que abriu crdito para o incio do trabalho de minerao. O ministro da Regncia Imperial do Brasil, acatando as decises legislativas, promoveu o seguinte despacho:Noticia-se-lhe a escolha do Dr. Parigot Enquanto a explorao das minas, de que V. Exa. trata, o Governo incumbiu em 27 de novembro do ano passado (1839), a um hbil naturalista belga, o Dr. Jules Parigot, to importante trabalho, tanto nas Provncias de Alagoas, Bahia, So Paulo, Minas Gerais, como nessa que V. Exa. preside, e qual deve brevemente chegar, visto que, na conformidade das instrues, que por aquela ocasio se davam, as exploraes na Provncia de Santa Catarina devem estar terminadas no futuro ms de junho.5

Sob o patrocnio do Governo Central, Jules Parigot compareceu provncia de Santa Catarina e confirmou a boa qualidade do carvo, aps ter realizado um grande trabalho de prospeco nessa regio. Naquela oportunidade, o naturalista belga decidiu, ento, explorar o carvo catarinense, requerendo o privilgio da concesso dos terrenos carbonferos por um prazo elstico de cinqenta anos. Autorizado pelo Governo, Parigot retornou ao seu pas, onde foi promover o carvo brasileiro e solicitar o apoio necessrio dos empresrios ligados ao setor carbonfero para a formao de uma grande empresa, j delineada nos seus arrojados planos. L tratou imediatamente da criao da Companhia Belgo-Brasileira, de acordo com os seus principais desejos e objetivos. Na poca, se expressou o Imperador do Brasil no seu documento entregue a Parigot, em 29 de agosto de 1842:Sendo necessrio progredir, com atividade, nas indagaes relativas s minas de carvo de pedra na Provncia de Santa Catarina, a fim de que se possam prestar Assemblia Geral Legislativa, na sua futura sesso, todos os esclarecimentos de que ela precisa, para resolver este importante objeto, com plenos conhecimentos: Sua Majestade o Imperador h por bem ordenar que V. Merc parta quanto antes para a Blgica e ali faa a escolha dos instrumentos indispensveis para se proceder aos trabalhos de explorao das referidas minas, devendo esses instrumentos ser comprados e pa-

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gos pelo Encarregado de Negcios do Brasil em Bruxelas (...) e contrate os mineiros prticos que tambm forem indispensveis para a execuo daqueles trabalhos..6

O plano de Parigot, segundo a opinio dos membros da comisso tcnica brasileira instituda especialmente para analisar o projeto, s no se realizou por constarem falhas no processo de encaminhamento. O parecer dessa comisso no foi favorvel integralmente ao projeto, por entender que a organizao da empresa mineradora no atendia plenamente aos interesses brasileiros. Entretanto, a Parigot deve-se a existncia, em arquivos oficiais, de dois cadernos: Memria sobre o Carvo de Pedra no Brasil e Minas de Carvo de Pedra em Santa Catarina, ambos elaborados em 1841. Nesse ltimo, escreveu Parigot: H pouco mais ou menos 50 anos que os tropeiros que atravessavam os sertes para chegar, quer aos campos de Vacaria, quer a Lages, quer a Curitiba, acharam, no caminho, pedras pretas que queimavam. Coisa bastante extraordinria, mas esto sem uso algum.7 Ao referir-se ao perodo da descoberta, pode-se concluir que a data aproximada desse evento do ano de 1790. O assunto carvo continuava exaustivamente. Um relatrio apresentado pelo presidente da provncia de Santa Catarina, Joo Jos Coutinho, em 1856, assim se refere ao andamento das minas de carvo de pedra:Alm do novo exame das minas feito pelo mineiro ingls Ebenezer Ebaus, vindo de So Pedro do Sul, em 1850, nada mais existe a respeito da minerao. Tm, todos, reconhecido a riqueza das minas, a boa qualidade do carvo, mas no tem aparecido, at hoje, quem queira verdadeiramente explorar. Suponho que a distncia do porto de embarque, o ponto fundo da barra de Laguna, e mais que tudo, o alto preo das jornadas, pela falta de braos no Brasil, tem sido a causa de no podermos ainda aproveitar dessa riqueza.

Em 1858 o francs Robert Ave-Lallemant conclui sua obra Viagem Pelas Provncias de Santa Catarina, Paran e So Paulo, na qual dedica algumas linhas sobre o carvo mineral:

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...Em Tubaro foram descobertas vrias jazidas de carvo, que correm na serra. At hoje j se contam vinte e uma jazidas, algumas de 12 a 14 ps de espessura e todas muito fceis de explorar. Vi em poder do capito Collao algumas amostras, nas quais se reconhece excelente carvo. O mineiro de carvo de So Jernimo (Rio Grande do Sul), Mr. Johnson, l estivera precisamente ao tempo de minha chegada a Piedade (Nossa Senhora da Piedade do Tubaro) e havia remetido para o Rio de Janeiro algumas toneladas de carvo, que ele considerava de excelente qualidade. Pode-se compar-lo, sem exagero, com bom carvo ingls, sendo impossvel deixar de reconhecer a sua grande significao....

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Apud GUIMARES, Djalma. Geologia do Brasil (Memria I), Rio de Janeiro, DNPM-MA, 1964, p.68. Relatrio e fala no Governo de Santa Catarina (1833-1835). Arquivos dos Estados de So Paulo e Santa Catarina, 1986, p. 37. BOITEUX, Henrique. A Repblica Catarinense, Rio de Janeiro, Imp. Naval, 1927, p. 281. Ibidem. pp. 282 - 283. Apud. DALLALBA, Joo Leonir. Colonos e mineiros no grande Orleans, Florianpolis, ed. Autor, 1986, p. 342. Ibidem, p. 337. Ibidem

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Captulo III

A Primeira Mina e Estrada de FerroDepois de muitos anos e de muitos insucessos, parecia ter chegado a hora decisiva para o incio da explorao do carvo em terras catarinenses. E o primeiro brasileiro que se props a explor-lo foi o baiano Felisberto Caldeira Brant Pontes, o 2 Visconde de Barbacena, de famlia com grande influncia e prestgio em Londres (Inglaterra). Barbacena comeou trazendo ao Brasil o gelogo ingls James Johnson que, alm de realizar experincias com o carvo nacional, poderia ser influncia positiva para atrair a confiana de investidores britnicos. Johnson pesquisou e definiu a rea que deveria ser comprada. Ento, a 6 de fevereiro de 1861, o Visconde de Barbacena concretizou a aquisio, do Governo da Provncia, presidido por Francisco Carlos de Arajo Brusque, de duas lguas quadradas de terras devolutas, na localidade de Passa Dois, e obteve a concesso e permisso para organizar, dentro do prazo de dois anos, uma empresa destinada a lavrar minas de carvo. Caindo nas graas dos governos da Provncia e do Imprio, o Visconde de Barbacena teve os favores desta concesso prorrogada por dez vezes consecutivas. Alm disso, em 1874, pela Lei Imperial 740, de 20 de maio, foi autorizada pelo Governo a construo da Estrada de Ferro, ligando Imbituba a Minas (hoje Lauro Mller), inaugurada em 1 de setembro de 1884. Para sua construo, foi constituda a companhia inglesa The Donna Thereza Christina Railway Company Limited.35

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Dois anos depois de iniciada a construo da estrada de ferro, necessria para o transporte do carvo, o Visconde de Barbacena conseguiu organizar a companhia The Tubaro Coal Mining Company Limited, tambm com capital ingls e sede em Londres, autorizada a operar no Brasil. Finalmente, a 9 de fevereiro de 1886, segue para o Porto de Imbituba o primeiro carregamento de carvo, que anunciado pelo presidente da Provncia, Francisco Jos Rocha, atravs de ofcio enviado ao Governo Imperial:Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelncia que est inaugurado o trfego de carvo das minas do Tubaro. Ontem chegou a Imbituba o primeiro trem com carvo, e amanh deve seguir para Imbituba o vapor Senator para receber o primeiro carregamento, 700 toneladas, mais ou menos, que destinado para Buenos Aires. Tenho convico que este primeiro ser o precursor de transaes mais avultadas.1

Muita festa, muita comemorao e muito prejuzo. O carvo remetido para Buenos Aires (Argentina), custou empresa mineradora 25$000 (vinte e cinco mil ris) a tonelada, considerando apenas o custo de produo, e foi vendido por apenas 6$000 (seis mil ris). Tamanha diferena, mais a concorrncia com o carvo de Cardiff, importado da Inglaterra, levou a empresa paralisao imediata de suas atividades. Prevendo a liquidao da sua empresa, o Visconde de Barbacena associou-se, em 1886, firma Lage & Irmos, representada por Antnio Martins Lage Filho, conceituada empresa com sede no Rio de Janeiro e com tradio em negcios de carvo Cardiff ingls e servios de estiva. Em 17 de novembro de 1887, o Visconde de Barbacena decidiu vender sua parte na sociedade empresa Lage & Irmos, retirando-se dos negcios do carvo. Por sua vez, essa empresa via no carvo catarinense apenas uma possibilidade de investimento futuro e continuou dando prioridade aos seus negcios no Rio de Janeiro. Quanto via frrea, foi construda apenas para o transporte do carvo, numa extenso de 118 quilmetros, tendo custado para os ingleses 5.609:298$000 (cinco mil e seiscentos e nove contos e duzentos e noventa e oito mil ris), precisando de constante manuteno devido s cheias freqentes do rio Tubaro. Sem carvo para transportar e com uma forte enchente em maio de 1887, a companhia quase desativada. Nesse meio tempo, cai o Governo Imperial, em 1889, e proclamada a Repblica.

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Em 1890, o Governo Provisrio, sob o comando do marechal Deodoro da Fonseca, atravs do Ministrio da Agricultura, em cuja pasta estava frente Francisco Glicrio, interessado em reconhecer as minas de carvo de Santa Catarina e procurar uma soluo para remover as dificuldades financeiras em que se encontrava a Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, nomeou uma Comisso de Estudo composta por Luiz Felipe Gonzaga de Campos, Flavio Ostili de Moraes Rego e Joo Caldeira de Alvarenga Hessener, a fim de estudar in loco o assunto. O relatrio dessa comisso, certamente, influenciou o futuro Governo de Prudente de Morais, que atravs da Lei n 275, de 4 de julho de 1895, isentou os impostos de importao de mquinas e equipamentos para as empresas que se propusessem a investir na explorao do carvo mineral. No dia 28 de setembro desse mesmo ano, era promulgada a Lei Federal n 167, concedendo a Jos Bernardino da Silveira, ou empresa que viesse organizar no municpio de Ararangu o direito exclusivo de explorao de minas de carvo, por um perodo de cinqenta anos. No entanto, antes mesmo dessa lei, outras tentativas aconteceram nessa direo, como diz o jornal A Verdade, de Laguna, de 30 de janeiro de 1881:Veio informar Cmara Municipal desta cidade um requerimento do Sr. Comendador Jos Feliciano Alves de Brito, em que pede ao Governo privilgio para explorar minas de carvo e outros minerais no Ararangu e construir uma linha frrea dali at encontrar alguma estrada de ferro ou um dos portos do mar mais apropriado. A Edilidade, como era de esperar, deu favorvel informao.

Vale ressaltar que, nessa poca, o Sul da Provncia catarinense tornarase ponto atrativo para o investidor brasileiro, devido ao processo de colonizao europia que ali se implantara a partir de 1877. Em meio s florestas comearam a surgir os povoamentos coloniais, oferecendo facilidade implantao de mecanismos industriais e de servios, dentre os quais a construo da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, em conseqncia dos interesses explorao do carvo. Em ltima anlise, tudo indica que esse movimento colonizador teve relao com a implantao do projeto minerao e ferrovia nessa regio, como se pode notar no seu contexto. At porque, sem a presena do colonizador, seria impossvel desenvolver o projeto de Barbacena.37

HISTRIA DO CARVO de Santa Catarina

O desembargador Francisco Vieira Ferreira, responsvel pela implantao das colnias italianas de Azambuja e Urussanga, no Sul do Estado, a partir de 1877, assim se expressa, com referncia ao carvo: Ainda no se tinha explorado o carvo existente nas minas de Cresciuma e Urussanga, nem mesmo do Tubaro. Mas com amostras encontradas em terras da Colnia lembrome de nos havermos aquecido junto a um fogareiro em manh de inverno.2 Um dos colonizadores italianos de Urussanga, Cristvo Pescador, em cartas dirigidas ao jornal Il Tomitano, em 24 de abril de 1883 e 8 de abril de 1884, editado na Provncia de Feltre, Itlia, que recebeu o ttulo I Feltrini al Brasile, confirma a participao de moradores da Colnia nos trabalhos da ferrovia. Depois de descrever o andamento dos trabalhos da construo da igreja e de outras atividades da localidade, afirmou:Alm do que os pedreiros esto ocupados na construo da vizinha ferrovia que se est construindo, de modo que a duras fadigas se encontram artesos. No trecho da segunda carta, diz: A Colnia Feltrina do Brasil (referindo a Urussanga) encontra-se em bom estado, especialmente pelos trabalhos da ferrovia, que duram trs anos, e ganhou-se bastante dinheiro; h quem tenha um dinheirinho e tem quem tenha muito dinheiro; quem tenha pouco e quem no tem mais, mas todos esto mais ou menos bem com vacas, cavalos e mulas. A locomotiva assobia agora no vale do Tubaro; mas dista da sede de Urussanga 25 quilmetros...3Memria do Ararangu J. L. DallAlba

Ponte das Laranjeiras, em Cabeudas, em Laguna

1. Apud. DALL ALBA, Joo Leonir. Colonos e mineiros no grande Orleans, Florianpolis, ed. Autor, 1986, p. 346. 2. FERREIRA, Francisco Vieira. Azambuja e Urussanga, Niteri, Rio de Janeiro, Graf. Dirio Oficial, 1939, p. 70. 3. Apud. SANTOS, Rosely Izabel Correa dos. Terra Prometida Emigrao italiana: mito e realidade, Itaja, Univali, 1998, p. 180.

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HISTRIA DO CARVO de Santa CatarinaSuplemento Polianta Centenria

Locomotiva Visconde de Barbacena

Quanto inaugurao do trfego, existe a verso do primeiro telegrafista da Estrada, Alexandrino Barreto, que afirma:... O trem atravessou a ponte e prosseguiu at a estao local, onde saltamos eu e o meu companheiro, que vimos assistir inaugurao do trfego da Thereza Christina, marcado para o dia 4 de setembro de 1884. H quem diga que essa inaugurao teve lugar a 1 de setembro, mas, eu afirmo que foi dia 4, e o fao de conhecimento prprio, porque assisti ao ato, como telegrafista, e passei o telegrama que o superintendente mandou ao general Beadle, presidente da Companhia em Londres, comunicando a inaugurao do trfego...4

4. Suplemento Polianta Centenria , Correio do Sul, Tubaro, 07.05.1936, p.9 5. Em 1882, o comendador Antnio Martins Lage Filho e seus dois irmos Roberto e Amrico, formaram a firma Lage & Irmos. Neste mesmo ano, o comendador adquiriu no Rio de Janeiro a Ilha do Viana. Nesta Ilha instalou um estaleiro naval, sendo ali construdas pequenas embarcaes, dando origem ao futuro imprio da firma Lage & Irmos. In BOSSLE, Ondina Pereira. Henrique Lage e o desenvolvimento Sul Catarinense, Florianpolis, UFSC, 1981.

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HISTRIA DO CARVO de Santa Catarina

A Comisso White no BrasilNo incio do Governo Rodrigues Alves, em 1902, em cuja pasta do Ministrio da Viao estava o catarinense Lauro Mller, foi promulgada a Lei n 957, de 30 de dezembro. Essa lei, alm de garantir Estrada de Ferro Central do Brasil o consumo do carvo mineral, liberava a importncia de 150.000 contos de ris para os trabalhos de estudos concernentes explorao de minas de carvo. Valor este, elevado para 250.000 no ano seguinte.Histria do Brasil - Proena & Lago

Presidente Rodrigues Alves

O ministro Lauro Mller, valendo-se deste crdito, mandou encaminhar amostras de carvo catarinense para proceder as devidas experincias, conforme a notcia divulgada em 11 de julho de 1903 pelo jornal A Gazeta, do Rio de Janeiro:40

HISTRIA DO CARVO de Santa Catarina

... A experincia foi feita da estao central da Estrada de Ferro (Central do Brasil) a Belm, assistindo a ela os doutores Osrio de Almeida (diretor da Estrada de Ferro Central do Brasil), Silva Freire, Luiz Nbrega, Jos e Alberto de Andrade Pinto, Antnio Lage e seus dois filhos (Antnio e Jorge) e Dr. Nolasco de Almeida (...). A experincia deu timo resultado, sendo todos de opinio ser o carvo de primeira qualidade ....

Com o sucesso das experincias realizadas com o carvo catarinense, o prprio ministro fez questo de comprov-las, embarcando no trem da Estrada de Ferro Central do Brasil. Diz a notcia do jornal O Comrcio, de Laguna, do dia 25 de outubro de 1903:Realizou-se no dia 10 do corrente a experincia definitiva do carvo das minas do Tubaro, na Estrada de Ferro Central do Brasil. O sr. Lauro Mller, ministro da Viao, acompanhado de grande comitiva tomou o trem na Estao Central em viagem para So Paulo. Foi empregado na locomotiva o nosso carvo, cujo resultado foi timo, sendo considerado de superior qualidade. A mquina que serviu de experincia tomou o nome de Tubaro.Grandes Personagens da Nossa Histria leo de Chamberland

Ministro Lauro Mller

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HISTRIA DO CARVO de Santa Catarina

Entusiasmado, o ministro Lauro Mller convida a vir ao Brasil o gelogo americano Israel Charles White de Morgantown, West Virginia, a fim de proceder prospeco e estudos nas minas de carvo brasileiras, em especial as de Santa Catarina. Na oportunidade foi criada, em 23 de junho de 1904, pelo Ministrio da Indstria e Comrcio e Obras Pblicas, a Comisso de Estudos do Carvo Nacional, tendo na sua chefia o prprio gelogo I. C. White, como conhecido mundialmente. Djalma Guimares, em sua obra Geologia do Brasil, sobre esse tema, assim se reporta:A transio da fase de pesquisa geolgica do sculo XIX para o sculo XX foi marcada pela criao da Comisso de Estudos das Minas de Carvo-de-Pedra no Brasil, da qual foi chefe o gelogo americano I.C. White, em 1902. A Comisso White estudou as bacias carbonferas de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, tendo estabelecido as bases para o conhecimento das formaes Gonduanas do Brasil Meridional.6Centenrio da Colonizao Italiana A. N. Marques

Sob a orientao do gelogo e de seus auxiliares so extradas as primeiras amostras do carvo de Santa Catarina para testes e experincias nacionais

6. GUIMARES, Djalma. op. cit. p. 68

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O trabalho de campo de White comeou pelo municpio de Ararangu, no litoral catarinense, onde foi acompanhado pelos engenheiros Francisco de Paula Oliveira, Esdras do Prado Seixas, Benedito Jos dos Santos, Ccero Campos e Carlos Moreira, tendo esse ltimo secretariado os servios de pesquisa e estudos ali realizados pela especializada equipe. Os trabalhos de pesquisa foram feitos numa extensa rea determinada pelo engenheiro agrnomo Polydoro Olavo Santiago, que organizou anteriormente o mapa scioeconmico do Sul do Estado, onde possibilitou a demarcao dos lotes em terras devolutas, ento vendidos aos colonizadores da regio. O ento Distrito de Cricima, que pertencia Ararangu, serviu de sede para essa comisso, tendo White se hospedado na residncia do empresrio e agente dos Correios, Pedro Benedet. Nesse distrito, as terras de Luiz Pirola, localizadas num pequeno afluente do rio Me Luzia, serviram para a realizao dos primeiros trabalhos de prospeco do carvo na referida regio. A seguir, a Comisso White dedicou-se ao estudo de outra rea mais prxima ao centro de Cricima, onde foi aberto um poo de 65 metros de profundidade pelo engenheiro Benedito Jos dos Santos. No leito do rio Cricima foi encontrado um poo de trs metros de profundidade, feito por Joo Batista Targhetta, e, a dois quilmetros do centro, foi encontrado um poo aberto de onde era extrado o carvo empregado nas forjas no uso domstico. Nesse local, o carvo era visivelmente notado, chegando no nvel da gua, atingindo uma espessura de quarenta e um centmetros. Em janeiro de 1906, o gelogo White deu por concludo o trabalho realizado no Brasil, principalmente na Regio Carbonfera de Santa Catarina e, cinco meses depois, retornou ao seu pas. Comisso White, pela contribuio de seus estudos, se deve o estabelecimento dos parmetros cientficos para o aproveitamento do carvo mineral brasileiro. Esses estudos tiveram continuidade pela participao do gelogo Francisco de Paula de Oliveira, que assumiu o seu posto na chefia da referida comisso. Pela repercusso desses estudos, estiveram no Brasil, em 1905, alguns investidores americanos, a fim de adquirirem as minas do Tubaro e o prolongamento da estrada de ferro. Os investimentos partiram, principalmente, do americano Percival Farquhar, que chegou a conquistar o seu intento, isto , o controle das referidas minas, alm do arrendamento

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da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina. Aps a realizao desse negcio, Farquhar constituiu a empresa Brazil Railway Company, destinada a ser a holding de um imprio ferrovirio que estava formando, pois j adquirira estradas de ferro, portos e terras no Par, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. Com o objetivo de explorar as minas de carvo, conseguiu, inclusive, um contrato em moeda americana, no qual o Governo se obrigava a comprar o seu carvo. Embora sendo negcio vantajoso, mas, mesmo assim, a referida explorao do mineral catarinense no chegou a ser concretizada. No ano seguinte, Farquhar adquiriu para a empresa Brazil Railway, a Estrada de Ferro So Paulo-Rio Grande, com o objetivo de interligar o Sul do Pas. Como se observa, quando os investidores americanos estiveram no Brasil, em 1906, j estava em curso o remanejamento de verbas no Ministrio da Viao para a construo da ferrovia, principalmente no que diz respeito ao prolongamento do Sul do Estado, conforme registra o Jornal do Comrcio, do Rio de Janeiro, de 11 de junho de 1905, com a transcrio do assunto no jornal O Dia, de Florianpolis, em 1 de julho do mesmo ano:Ao ministro da Viao, Dr. Marcelino Ramos, j se fez entrega do relatrio e planta dos estudos definitivos, e traado do prolongamento da Estrada de Ferro Dona Thereza Christina, em Santa Catarina, na extenso de 61 quilmetros, do pontal de Massiambu a Vila Nova, fazendo juno inicial de Imbituba. A construo desse prolongamento est orada em 2:928:000$000 (dois mil e novecentos e vinte oito contos) ou 48:000$000 (quarenta e oito contos) por quilmetro. Foram feitos reconhecimentos pelos mesmos engenheiros para melhor traado da atual estrada de ferro em direo ao vale dos rios Me Luzia e Ararangu e fronteira do Rio Grande.

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As Forjas Domiciliares

Durante a permanncia da Comisso White em Cricima, notava-se o uso do carvo nas forjas domiciliares. Esse procedimento rotineiro, muitas vezes, chegava a despertar notcias na imprensa catarinense e nacional, como registra o jornal O Comrcio, de Laguna, na data de 18 de dezembro de 1904, evidenciando a importncia do carvo para a economia local: Refere-se o nosso colega (o jornal) A Vrzea que o sr. ngelo Venson, estabelecido com uma importante ferraria em Cresciuma, h vinte anos, que emprega nas suas forjas o carvo extrado naquele mesmo local e o mesmo carvo empregado pelo sr. Frederico Minato em sua mquina de pilar arroz. A pesquisa sobre o carvo interagia os trabalhos da Comisso White com os dos proprietrios das forjas domiciliares. um detalhe que se pode observar no trecho de uma carta enviada pelo engenheiro agrnomo Polydoro Santiago, datada de 21 de agosto de 1914, dirigida a Joo Genovez, filho do ferreiro Pedro Genovez, manifestando o seu interesse pela riqueza mineral do Estado. Assim se expressa:Tenho a sua carta de ontem, em que o amigo me comunica que o senhor seu pai, na viagem que fez a Belluno e Cresciuma encontrou carvo, que lhe parece ser bom, pouco distante da sede do ncleo colonial, mas que s depois de experiment-lo na sua oficina me dar resultado final. Peo-lhe que, por mim, muito agradea ao seu bom pai esta gentileza que me fez, dando-se ao incmodo trabalho de fazer a viagem quelas colnias, e as experincias que est operando. Se o carvo der bom resultado, o senhor seu pai que me mande amostras de uns cinco quilos, a fim de remeter ao Governo. Repetindo os meus agradecimentos ao seu bom pai, queira abra-lo por mim. E ao senhor um abrao do amigo e criado.7

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Sobre esse tema, diz um trecho do editorial do jornal A Imprensa, de Tubaro, de 12 de junho de 1921: ... Muitas vezes, na sua tenda de trabalho, no silncio da sua pobre oficina de ferreiro, o senhor Pedro Genovez, depois de ter ele prprio extrado carvo em Belluno e Cresciuma, fazia experincias, cujos resultados eram sempre satisfatrios. O seu trabalho de pesquisa era o resultado da descoberta do carvo da regio de Cricima, ocorrida durante a Revoluo Federalista de 1893 - a conhecida Revoluo dos Maragatos e Pica-paus.8 Nessa poca, Gicomo Snego encontrou, pela primeira vez, em Cricima, o carvo de pedra. Para torn-lo conhecido na regio entregou algumas amostras do mineral ao auxiliar de ferreiro Benjamim Bristot que, em seguida, as encaminhou ao ferreiro Pedro Genovez, morador de Pedrinhas, municpio de Tubaro, onde o mesmo possua melhores instalaes para se fazerem experincias com esse produto.

Memria do Ararangu J. L. DallAlba

Oficinas de Pedro Genovez, em Pedrinhas

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Como se pode observar, a esperana remota de encontrar carvo da melhor qualidade no Brasil no desanimava os proprietrios de terrenos carbonferos do Estado de Santa Catarina, que continuavam a exigir do Governo uma legislao especfica para o seu aproveitamento. Essa legislao, entretanto, veio atravs da Lei n 1.617, de 30 de dezembro de 1906, que promovia, pela primeira vez, o consumo do carvo nacional na Estrada de Ferro Central do Brasil. Empresa esta, estabelecida na ento Capital da Repblica, Rio de Janeiro. Nos dispositivos das novas leis, decretos e normas, promovidas nos governos de Afonso Pena, Nilo Peanha e Hermes da Fonseca, compreendendo o perodo de 1906 a 1914, destaca-se a Lei n 2.524, de 31 de dezembro de 1911, que determinava ao Governo fiscalizar a entrada de carvo estrangeiro e da aplicao de carvo mineral com iseno de taxa de expediente destinado ao consumo prprio das companhias de navegao nacionais e estrangeiras.9Timido Ensaio Biogrfico J. Pimentel & M. Belolli

Gicomo Snego

Benjamim Bristot

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Para lvaro Luiz Bocayuva Cato, empresrio do setor carbonfero de Santa Catarina, antes do conflito mundial de 1914, a minerao do carvo, no Brasil, sofria, historicamente, influncia marcante pela concorrncia do produto importado (...). Os trabalhos iniciais da lavra s puderam tomar algum desenvolvimento nas ocasies em que faltaram ou escassearam os suprimentos externos.10

Praa central de Cricima no incio do sculo XX. esquerda, o edifcio residencial e comercial do cel. Pedro Benedet, onde foram elaborados os relatrios da Comisso White, a partir de 1904

7. A Imprensa, Tubaro, 12.06.1921 8. Maragatos e Pica-paus: In. Histria do Brasil A. Souto Maior, p. 373. Os castilhistas receberam o apelido de pica-paus (pssaros que tm listras brancas no topete) porque usavam uma divisa branca em seus chapus da campanha. Os maragatos constituem na Espanha remanescentes dos berberes que invadiram a Pennsula Ibrica. O termo maragato usado pelos picapaus como apelido depreciativo de seus inimigos, relaciona-se com a presena de uruguaios entre as tropas de Gumercindo Saraiva. Sugere, portanto, a idia de estrangeiro, de invasor. 9. SNIEC A Legislao sobre o carvo nacional, Rio de Janeiro, 1961, p. 10 10. Revista da ABEM, jun-1986

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A Comisso White, ao instalar-se no pequeno povoado de Cricima, no incio do sculo passado, deu destaque, nacional e internacionalmente, a essa comunidade, que era constituda de uma populao essencialmente europia, de vrias nacionalidades. Isso significou a redescoberta do homem europeu ali instalado, aproximando-o de outros de sua origem. O resultado foi a vinda de trabalhadores experientes em minerao para as minas de carvo de Santa Catarina, a partir de 1914.

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Captulo IV

A Propaganda do Carvo CatarinenseAs dificuldades de importao de carvo mineral durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) acenderam a chama deste minrio no territrio nacional. Aliado a esse interesse, soma-se o rpido avano cientfico e tecnolgico que estava acontecendo no mundo, inclusive no Brasil, que partiu em busca do aperfeioamento de seu nascente parque industrial. Neste contexto, destaca-se igualmente a indstria extrativa do carvo mineral. O ento recente estudo da Comisso White, concluindo que o carvo nacional poderia ser usado como fonte de energia, levou inmeros estudiosos aos ambientes de discusso cientfica, comercial e poltica do pas, com o objetivo comum de encontrar a soluo para o carvo nacional. As opinies eram controvertidas e tentavam encontrar fundamentos nos estudos e anlises realizadas. A imprensa acompanhou toda essa discusso, registrando nesse perodo as decises do Governo Federal de tomar para si a responsabilidade de oferecer a garantia necessria ao desenvolvimento da emergente indstria de extrao do carvo mineral no Pas. Estava iniciada uma interessante fase de propaganda do carvo nacional, sendo, inclusive, exposto em vitrines comerciais na ento Capital da Repblica. O eng. Paulo Lacombe, no seu artigo publicado na revista Brazil Ferro Carril, de 28 de fevereiro de 1917, do Rio de Janeiro, assim se expressa sobre o assunto:51

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Em princpio de 1914, o Dr. Polydoro O. Santiago, catarinense que sempre se interessou pelo carvo de seu Estado, no dispondo de ao e nem de meios para pessoalmente dar impulso pela propaganda ao carvo de Santa Catarina, enviou algumas amostras ao Centro Catarinense, nesta cidade, a fim de que essa agremiao chamasse a si o desenvolvimento da idia da aplicao industrial do carvo brasileiro. O Centro Catarinense, por sua vez, entregou as referidas amostras ao sr. Arthur Watson Sobrinho, que as exps nas vitrines de seu estabelecimento comercial, na Avenida Rio Branco, n 102, esquina da rua do Ouvidor, onde estiveram em exposio durante algum tempo. Podemos afirmar que foi desde ento que comeou a nascer o entusiasmo coletivo pelo carvo nacional.

Apesar dos conselhos desanimadores, o empresrio, assim mesmo, levou adiante a sua proposta em divulgar o carvo catarinense. Na esfera do Governo Federal, nos ltimos dias do ano de 1914, as notcias sobre o carvo de Santa Catarina comeam a merecer destaque nos ambientes de trabalho do Ministrio da Agricultura, Indstria e Comrcio, as quais no demoraram a chegar s mos do prprio ministro, que, por ordem do presidente da Repblica, mandou apurar sobre a convenincia, ou no, de investimentos na explorao do carvo de pedra da Regio Carbonfera do Estado de Santa Catarina.Os Governadores de Santa Catarina C. H. Corra

Eng. Polydoro Olavo Santiago

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No ano seguinte, o jornal O Estado, de Florianpolis, de 25 de agosto, registra uma sondagem, por parte de rgos do Governo, sobre a possvel venda do carvo de Cricima a empresas pblicas de gaseificao:No encaminhamento dessas informaes, sabe-se que quele Ministrio foram lembradas outras jazidas carbonferas situadas no sul do Estado, figurando entre elas a mina de Cresciuma, analisada e julgada uma das mais aproveitveis, no s pela natureza do combustvel, como ainda, principalmente, pela facilidade do transporte (...). H poucos dias, do Rio de Janeiro, telegrafaram para Laguna pedindo informar quantas toneladas mensais poderia a mina de Cresciuma fornecer Repartio da Iluminao Pblica do Rio...

O mesmo jornal, ao abordar outras notcias sobre o tema, fez referncia, tambm, s experincias levadas a efeito na ento Capital da Repblica, com o carvo catarinense, afirmando:Mais uma confirmao do valor industrial do carvo de pedra de Santa Catarina, nos trazem as ltimas notcias do Rio de Janeiro, alm das j valiosas experincias feitas por diversas vezes sobre a hulha situada prximo estao de Lauro Mller, sendo a mais concluinte e prtica a do trem da Estrada de Ferro Central do Brasil, do Rio e So Paulo, temos agora as belas e positivas experincias feitas com a hulha de Cresciuma. Isto significa que no Sul de Santa Catarina existem pujantes jazidas aptas a satisfazer, por completo, todas as exigncias da indstria moderna. Assim que temos hulha, apropriadssima produo de gs de iluminao, para motores, servios de forjas tipo New-Catles e combustvel direto semelhante ao Cardiff. O que nos falta? apenas iniciativa, quer a de particulares, quer de parte do Governo da Unio e do Estado. As definitivas experincias agora feitas com a hulha do afloramento de Cresciuma e o estado prspero da lavoura dessa regio, impem aos nossos dirigentes o dever de solicitar da Unio que esta exija da Companhia So Paulo-Rio Grande, arrendatria da Estrada de Ferro Dona Thereza Christina, a construo do prolongamento desta via frrea, a que se obrigou pelo contrato de 1910, muito principalmente para o Sul.

Essas experincias confirmavam a cada dia a qualidade do carvo catarinense. O jornal O Albor, de Laguna, em 26 de outubro de 1915, destacava a sua preocupao quanto ao transporte para os centros consumidores:

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Pelo vapor Mayrink seguiu para o Rio de Janeiro a terceira expedio de carvo nacional, que vai ser experimentado na Estrada de Ferro Dona Leopoldina. Conforme j dissemos em edio anterior, tornase fcil e econmica a expedio do carvo de Cresciuma pelo canal, que pela via frrea Dona Teresa Cristina. A distncia das minas ao canal de 25 quilmetros e o percurso de 20 quilmetros, apesar da nordestina que ressoava, foi feita em 15 horas. Por aqui se vem as vantagens que trar a continuao das obras do canal, que alm de ser estratgico, facilitar as relaes com o vizinho Estado do Sul e contribuir muito para o melhoramento das nossas economias internas.

O carvo nacional e sua propaganda faz parte do ttulo do jornal Correio da Manh, do Rio de Janeiro, de 10 de setembro de 1917, que d destaque a uma carta enviada pelo 1 tenente e engenheiro-maquinista naval, Jos Gomes Couto, em agradecimento pela veiculao de suas experincias realizadas com o carvo nacional, em cujo teor assim se expressa:...Agora, que homens do valor do Dr. Paulo de Frontin e outros se acham frente de empresas organizadas, construindo estradas de ferro e, simultaneamente, iniciando a explorao do carvo, no se faz mister falar tanto nesse assunto, mas sim, aguardar o fim deste ano que corre para ver realizadas as profecias dos verdadeiros propagandistas do nosso mineral negro, que nunca duvidaram da existncia e valor das jazidas. Delas, fato, que alguns estrangeiros se empenharam, e ainda no desanimaram, em depreciar, mas, as respostas positivas j comearam a aparecer com esse telegrama do sr. presidente da Repblica, que, conduzido por uma locomotiva, tipo grande, percorreu sem acidentes e com a velocidade de 73 quilmetros hora, a distncia que separa a Barra do Pirahy, da Vargem Alegre...Foto cedida por Joo Carlos de Campos

Embarcaes do Ponto (1906)

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Das Experincias Oficializao da Regio CarbonferaAs experincias com o carvo de Santa Catarina continuavam aceleradas. Acredita-se, pelo menos, que cerca de uma centena de toneladas de carvo catarinense serviu para os referidos testes na poca. Por exemplo, no dia 10 de julho de 1915 foram embarcadas 25 toneladas no porto de Imbituba, atravs do paquete Itaipava, completando assim a quantidade de 100 toneladas, conforme citao no jornal O Estado, de Florianpolis, edio de 24 de julho de 1915. Cada experincia realizada se constitua num momento solene, que reunia autoridades governamentais, tcnicos e tambm empresrios dos mais variados setores do Pas, todos imbudos na soluo do grave problema do combustvel nacional. Nessas demonstraes de convencimento, em maio de 1915, o tenente-maquinista da Armada Brasileira, Jos Gomes Couto, permitiu queimar o carvo por um processo mecnico, que facilmente eliminava as cinzas. As amostras do carvo catarinense foram obtidas por intermdio do empresrio Arthur Watson Sobrinho, a quem o presidente do Centro Catarinense, do Rio de Janeiro, solicitou para tambm poder assistir ao grande evento. O Centro Catarinense era a entidade que representava os interesses do Estado na Capital da Repblica. A pedido dessa entidade, o governador de Santa Catarina, Felipe Schmidt, enviou trs toneladas de carvo de Cricima, com as quais se realizaram as experincias nas caldeiras do empresrio Cozzetti, na rua Treze de Maio, n 31, em 16 de julho. Estavam presentes ao acontecimento, alm do prprio governador, que representou tambm o chefe da nao, Rivadavia Corra, prefeito da cidade do Rio de Janeiro, almirante Alexandrino de Alencar, ministro da Marinha, e outras autoridades. Outras experincias foram realizadas em lanchas e tambm em pequenas caldeiras, cujo trabalho foi orientado pelo tenente Gomes Couto.55

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J no dia 5 de julho, na presena do presidente da Comisso do Carvo do Clube de Engenharia, contra-almirante Jos Carlos de Carvalho, e de outros tcnicos e empresrios, tinha sido realizada a experincia na barca Comendador Lage, cedida Companhia Grelhas Econmicas do Brasil, com 5 toneladas de carvo de Cricima. Essa experincia foi registrada numa revista especializada sob o ttulo O aproveitamento do combustvel nacional. Enquanto se iniciava o desenvolvimento da extrao do carvo mineral na Regio Carbonfera de Santa Catarina, simultaneamente as empresas nacionais de transporte ferrovirio e de navegao buscavam aliados para o experimento do novo combustvel brasileiro. Diante dessa realidade de escassez do carvo importado, os jornais davam destaque s experincias:Pouco depois do meio-dia entrou em nosso porto, vindo de Florianpolis e escalas, o paquete nacional ANNA, no qual foi feita a maior experincia do carvo nacional, pois aquele veio de Laguna at aqui, em sete dias, queimando exclusivamente o combustvel das minas de Urussanga, do Estado de Santa Catarina, de propriedade do Dr. Pio Corra (...). O Dr. Pio, para bem demonstrar a enorme riqueza que possumos e no explorada, retirou trinta toneladas de carvo daquela mina, transportou-o em carros de bois at a estrada de ferro, e da at o litoral. A ofereceu companhia proprietria do ANNA o carvo, para vir at ao Rio. Desde Laguna at aqui foi o carvo queimado e com os melhores resultados, segundo nos declarou o comandante daquele paquete, capito Arthur Lopes Calado. As duas horas da tarde chegou a bordo uma comisso de tcnicos, composta dos senhores: Drs. Pacheco Leo, diretor do Jardim Botnico; Jos Bevilqua, do Ministrio da Guerra; Luiz Felipe Gonzaga de Campos, diretor do Servio Geolgico Brasileiro; Jlio Koeller, inspetor geral da Viao Martima e Fluvial; comandante Taylor do Ministrio da Marinha; J. Lallement, diretor da Companhia de Navegao Hoepcke; Gasto de Azevedo Villela, David Draper, Tobias Moscoso, Joseph de Jaegher (e outros).1

Essas personalidades, ao chegarem a bordo do paquete ANNA, foram recebidas pelo empresrio e naturalista Manoel Pio Corra, pelo comandante do paquete, Arthur Lopes Calado, pelo maquinista-chefe, capito Victor Petters e seu auxiliar, comissrio de bordo, Carlos Souza Martins, que lhes apresentou o novo combustvel de Santa Catarina. A bordo do navio ANNA essa comisso de alto nvel tcnico pde constatar e observar as experincias feitas com o carvo das minas de Urussanga. Propositadamente realizou-se uma viagem pelos mares do Rio de Janeiro, atracando posteriormente no Armazm 11 do cais, deixando as melhores impresses sobre o uso desse carvo mineral.56

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A excurso pelas guas cariocas teve completa cobertura da imprensa da Capital Federal. Ali compareceram os seguintes jornalistas: Drio de Mendona e Paulo Pereira, do Jornal do Comrcio; Eustquio Alves, do jornal A Noite; Noronha dos Santos, do jornal A Lanterna; Mrio Antunes, do jornal Gazeta de Notcias; e Roberto de Macedo, do jornal A Razo.A Razo, Rio de Janeiro, 25.04.1917

Paquete ANNA

Mais tarde, pelo sucesso de sua odissia, Pio Corra promove novas experincias, desta vez, tambm com o carvo de Cricima. O primeiro foi a bordo do vapor MAX da Companhia de Navegao Hoepcke, fazendo inmeras viagens pelas guas atlnticas do Sul, no percurso de Laguna a Florianpolis, j conquistando um mercado mais seguro. Fazendo valer o seu prestgio junto ao Ministrio da Marinha, Pio Corra conseguiu realizar suas experincias com o uso do carvo tambm extrado de Cricima, a bordo do contra-torpedeiro Mato-Grosso, sob a direo do capito de Mar e Guerra, Motta Porto. At ento, jamais, em qualquer poca, ningum, nem mesmo ferreiros, fez qualquer uso do carvo de Urussanga. Foi, pois, uma verdadeira temeridade o emprego a bordo de um paquete de passageiro de um combustvel do qual no se conhecia sequer uma anlise.2 O carvo de Urussanga tambm foi utilizado pela primeira vez numa locomotiva da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, cuja empresa colocou disposio dos empreendedores um trem especial de carga, que fez o percurso entre as estaes de Palmeira e Laguna, numa distncia aproximada de 65 quilmetros. Essas experincias se processavam de forma constante em diversos navios da frota brasileira, aps sofrerem adaptao para o uso do combustvel slido nacional, conforme se observa no noticirio carioca:57

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...Acabam de ser efetuadas experincias preliminares de uma nova disposio de grelhas para a utilizao do carvo nacional no vapor Mercedes, do Lloyd Brasileiro. Essas experincias foram presididas pelo comandante e diretor-tcnico daquela empresa. Pelos resultados obtidos, verifica-se que a nova grelha precisa apenas de pequenas modificaes para prestar timos servios na queima daquele combustvel nos navios de nossa Marinha Mercante. Tais modificaes sero feitas, e as experincias definitivas sero efetuadas dentro de pouco dias. O resultado j conseguido foi animador.... 3

Nessa mesma poca, outras informaes chegavam atravs da imprensa, com relao aos novos mtodos utilizados para o aproveitamento do carvo mineral, conforme registra o jornal A Gazeta, do Rio de Janeiro, na edio de 23 de setembro de 1917:O Especial do Diretor da Central veio desde a Barra do Pirahy at a estao inicial puxado por uma mquina Brodck, j transformada para o consumo do carvo nacional pulverizado. Tivemos assim no s a curiosidade de observar, de perto, todos os maquinismos apropriados para aquele fim, como tambm o ensejo de conversar com o senhor Francisco Sellmann, maquinista-mecnico da Estrada. Disse-nos o senhor Sellmann que o emprego da hulha nacional tem dado os melhores e surpreendentes resultados no s quanto fora calorfica que a mesma produz, como tambm pelo dado econmico, quanto ao consumo (...), a diferena de consumo do carvo pulverizado para o carvo bruto de seis quilos (...), enquanto um quilmetro, pelo processo antigo, consumia dezoito quilos de carvo de pedra, atualmente a mesma distncia absorveu doze quilos...

A cada descoberta de jazidas carbonferas, em Santa Catarina, aumentava a expectativa de progresso entre a sua populao. Aos seus empreendedores cabia, portanto, submeter o seu produto s experincias, que eram realizadas em trens, navios e a iluminao pblica, como registra o jornal A Verdade, de Tubaro, de 9 de maio de 1921:...De experincia em experincia, foi o nosso ouro negro gradativamente se impondo at que hoje no h mais sobra de dvida do seu valor e aproveitamento. Exploradas as jazidas de Lauro Mller e Paulo de Frontin neste Estado, no descansaram os profissionais em descobrir outras jazidas. Assim foi que h cerca de seis meses, em uns terrenos particulares entre Cresciuma e Urussanga, encontraram uma grande jazida. Feita a extrao das primeiras toneladas do precioso mineral para a indispensvel experin-

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cia, esta foi coroada de xito (...). Agora mesmo o paquete MAX da empresa de navegao Hoepcke fez experincia desse carvo, que foi reputado superior ao de todas as minas deste Estado, como a do Rio Grande do Sul e do Paran...

Depois desse sucesso, novas experincias foram feitas no Rio de Janeiro, conforme diz o jornal A Imprensa, de Orleans, de 10 de dezembro de 1922:Na Barra do Pirahy acaba de ser realizada experincia do carvo de Cresciuma, isto , das minas de Ararangu. A mquina 273, queimando carvo pulverizado, fez um percurso de Belm a Barra do Pirahy, no horrio dos trens rpidos, dando magnfico resultado. Viajaram na mquina, os Drs. Tavares Leite, chefe do depsito da Central do Brasil, Ernani Cotrin e Henrique Lage. O pessoal mostrara-se entusiasmado com a experincia, parecendo resolvido o problema do aproveitamento do carvo nacional.

O engenheiro Francisco Lessa, depois de acompanhar outras experincias realizadas pela Estrada de Ferro Central do Brasil, comunicou ao ministro da Viao, sobre o sucesso da viagem. Diz no seu documento:...Tendo a American Locomotive Company introduzido algumas modificaes na locomotiva 370 da Central do Brasil, de modo a torn-la apta queima de carvo nacional, procuramos realizar mais uma experincia de acordo com o programa de V. Exa. partindo da estao inicial da Central num trem rebocando 220 unidades e subindo a serra em debanda da Barra do Pirahy onde acabamos de chegar com xito. Esta mais uma prova de que o problema da combusto do carvo nacional em grelhas adaptadas est completamente resolvido, restando apenas solucionar a parte relativa ao transporte para que nos libertemos da importao do combustvel estrangeiro. Peo a V. Exa. que aceite as minhas congratulaes juntamente com a dos meus companheiros Drs. Edgar Werneck, Csar Grillo, Tavares Leite e Paranhos Fontenelle.4

1. 2. 3. 4.

O Imparcial, Rio de Janeiro, 25. 04. 1917 A Razo, Rio de Janeiro, 25. 04. 1917 O Jornal, Rio de Janeiro, 02. 02. 1917 A Noite, Rio de Janeiro, 07. 12. 1923

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Com a finalidade de oficializar as regies carbonferas do Pas e dar organizao aos servios de pesquisas e, sobretudo, s experincias realizadas com o carvo nacional, ento em andamento, o Governo designou uma comisso chefiada pelo diretor do Servio Geolgico do Ministrio da Agricultura, Luiz Felipe Gonzaga de Campos, para o levantamento das jazidas dos trs Estados do Sul. Concludo o trabalho de campo, em 28 de fevereiro de 1918, o resultado desses estudos foi publicado oficialmente.5 Em Santa Catarina os estudos foram realizados a partir das cabeceiras dos rios Tubaro, Me Luzia, Ronco Dgua e Urussanga, sendo detalhadas passo a passo as camadas carbonferas ali existentes, de acordo com o gelogo, que afirma:Com grande satisfao encontramos dois desses distritos em franco perodo de lavra inicial. Em Tubaro os srs. Lage & Irmos traaram galerias na camada barro branco em conexo com os antigos trabalhos da primitiva companhia inglesa (...). A extrao atualmente de 60 a 70 toneladas dirias, mais do que permite o transporte atualmente feito em carros de bois. Pronta a linha frrea, facilmente obtero 300 ou 400 toneladas de produo diria, e podendo iniciar a lavra de outros campos, que atualmente investigam, por meio de sondagens bem orientadas.6

Depois de descrever as caractersticas do carvo que estava sendo extrado na regio de Lauro Mller, nas cabeceiras do rio Tubaro, a comisso do governo deu incio ao trabalho na regio de Cricima, que tinha no momento uma produo limitada. Mas para aument-la, segundo a opinio de Gonzaga de Campos, dependia exclusivamente da construo de uma estrada de ferro. Entretanto, sem esse meio de transporte e com a produo por ele observada, o estoque de carvo nas cercanias das minas vinha aumentando dia-a-dia. Para atender demanda do Pas, o transporte do carvo de Cricima vinha sendo entregue precariamente atravs do porto intermedirio de embarque de Jaguaruna, instalado na conhecida localidade de Ponto. Ali o carvo chegava por um sistema de transporte ainda rudimentar o carro de boi. Dando destaque qualidade do carvo da regio de Cricima, Gonzaga de Campos afirma:

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Em Cresciuma, h um fato notvel, que constitui verdadeiro marco de progresso, o mais poderoso recurso para acreditar e radicar o emprego do carvo nacional que, em breve, servir de norma a todos os campos de lavra. O carvo extrado quebrado e lavado em aparelhos bem dispostos, de modo a aumentar-lhe de muito o valor comercial. Esta aplicao do enriquecimento por lavagem mostra o alcance da alta mentalidade que tem a direo geral da explorao das jazidas e a da construo do sistema ferrovirio que vai servir quela produtiva regio. No dia que aparecer no mercado o carvo lavado de Cresciuma, comear uma nova poca; e todas as empresas de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul sero obrigadas a seguir a mesma rota que at agora tm evitado por falta de concorrncia. um esforo digno de todos os elogios. O professor David Draper, distinto gelogo, quem primeiro delineou a estrutura da frica do Sul, conhecedor dos campos carbonferos daquele Continente, e que bem viu como pelo enriquecimento se conseguiu fazer um carvo ruim e repetidamente abandonado, um combustvel que satisfaz as necessidades da regio(...) est pessoalmente dirigindo a lavra e a preparao mecnica (...). A camada de carvo explorada, no Snego, no vale do rio Sango ter todas as caractersticas da camada barro branco do Tubaro.7

Na regio de Urussanga, o gelogo Gonzaga de Campos, na sua escalada empreendedora, no havia encontrado ainda a lavra do carvo, e comenta:Existem no Vale do Rio Amrica algumas galerias traadas na camada barro branco que serviram para extrao de talvez perto de uma centena de toneladas, empregadas em experincias e ensaios industriais, em geral coroadas de sucesso (...). No Vale do Rio Deserto, afluente do rio Caet, esto os afloramentos da camada barro branco (...). Do rio Caet (...) temos visto amostras que acusam um carvo igual, seno superior ao do rio Amrica... 8

Depois dos estudos realizados nessa regio, o gelogo seguiu para Treviso. Ali pesquisou algumas camadas de carvo da prpria localidade e tambm dos rios Pio e Morosini, cuja regio, em agosto de 1906, foi tambm pesquisada pela Comisso White. Neste vale do rio Me Luzia tambm foram estudados os veios carbonferos das margens dos rios Jordo e Manin.61

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Esses estudos realizados na Regio Carbonfera de Santa Catarina, por Gonzaga de Campos, foram objeto de destaque na palestra proferida no Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, em 1918, pelo seu presidente Paulo de Frontin:...As experincias feitas nesse sentido foram em todos os pontos favorveis, tendo obtido 500 quilos de coque metalrgico, que foram enviados ao diretor do Servio Mineralgico do Ministrio da Agricultura. No so experincias de laboratrio, como se v pela quantidade obtida. Ao ministro da Agricultura foram tambm remetidas 30 toneladas de carvo para serem enviadas a Sucia, a fim de serem sujeitas transformao em fornos apropriados. Se o xito das experincias j feitas se confirmar, mais uma vez aplicao ter o carvo nacional e a siderrgica brasileira contar com um dos elementos que por completo lhe faltava. Considero superadas as dificuldades inerentes a essa indstria; no lhe falte apoio, quer oficial, quer particular e estar vencida a campanha que, iniciada em 1840, s prejuzos e decepes deu at 1915.9

No local das galerias ou encostas de onde se extraa o carvo, os assuntos principais norteavam-se pelas grandes experincias realizadas com esse mineral. David Draper, engenheiro ingls, encarregado da Companhia Brasileira Carbonfera de Ararangu, ao conceder uma entrevista ao jornal Folha do Sul, de Laguna, em agosto de 1918, para a qual serviu de intrprete o historiador e professor catedrtico Aristides Souto Maior, afirmou:...Os trabalhos foram principiados em 16 de julho findo, com nmero pequeno de trabalhadores. Agora, porm h nmero suficiente. As mquinas esto sendo montadas com os modelos mais modernos, a fim de tratar o carvo, extraindo do mesmo todas as impurezas. Por esse processo, que est sendo adaptado nas minas Dr. Paulo de Frontin o carvo ficar pronto e limpo para ser usado. As minas esto, finalmente, muito adiantadas; e, por todo fim do ano, poderemos tirar duzentas toneladas por dia. Atualmente j se acham extradas, mais de 300 toneladas de carvo, que aguardam, apenas, a montagem das mquinas para o preparo final. Posso garantir que o carvo de Cresciuma bom, no obstante apresenta ainda alguns xistos e no totalmente isento de pirita. Uma vez, porm, que se lhe aperfeioe, limpando de certas e insignificantes impurezas que tem, com o maquinismo que est a chegar, o carvo, que ora estou extraindo, considero timo.62

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A Noite, Rio de Janeiro, 06.09.1921

Gelogo Luiz Felipe Gonzaga de Campos

O gelogo e professor Luiz Felipe Gonzaga de Campos, em discurso proferido aos formandos do Curso de Engenharia da Escola de Ouro Preto, Minas Gerais, destacou o carvo nacional. Pela importncia tcnica e oportuna de suas palavras, o tema foi destaque do jornal Correio da Manh, do Rio de Janeiro, na sua edio de 13 de agosto de 1917, do qual foi extrado o trecho seguinte: ...Habituados com a importao e uso do melhor carvo do mundo, temos tido de lutar com todos os bices do costume, dos interesses comerciais e da rotina, para fazer a implantao do nosso combustvel, carregado de impurezas e portanto de menor poder calorfico. Entretanto hoje, diante da necessidade premente de poupar os recursos naturais, vai o mundo buscar o maior rendimento til no emprego racional dos combustveis: purificando-os, gaseificando ou extraindo os produtos lquidos, de combusto63

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mais econmica. Raras so por toda parte as jazidas de carves nobres e ricos, como os do Sul da Inglaterra, a que nos afeioamos. Ali mesmo so comuns os combustveis com 20 e mais percentual de cinzas. Na Frana e na Alemanha, principalmente durante a guerra, levava-se a poupana das energias at disposies quase proibitivas de queimar o carvo diretamente sobre grelhas e tal como sai das minas. Os recursos aconselhveis so os gasognios, a purificao e o emprego dos produtos da destilao dos alcatres em motores de combusto interna de muito mais alto ren