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i A INCIDÊNCIA DO ISSQN NO SEGMENTO DE CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA Miqueas Liborio de Jesus* * * Bacharel em Ciências Jurídicas; Pós Graduado em Direito Tributário pela FGV; Fiscal de Tributos no Município de Joinville desde 16/03/98; Vice Presidente das Câmaras de Julgamento da Junta de Recursos Administrativos Tributários do Município de Joinville - JURAT (2004/2005); Membro Julgador da JURAT (2006/2007); Presidente das Câmaras de Julgamento da JURAT; Gerente da Unidade de Fiscalização de Tributos do Município de Joinville; e Professor de Direito Tributário e Legislação Aplicada a Eventos no Instituto de Ensino Superior de Joinville – IESVILLE/ANANGUERA.

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A INCIDÊNCIA DO ISSQN NO SEGMENTO DE CONSTRUÇÃO E

INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

Miqueas Liborio de Jesus**

* Bacharel em Ciências Jurídicas; Pós Graduado em Direito Tributário pela FGV; Fiscal de Tributos no Município de Joinville desde 16/03/98; Vice Presidente das Câmaras de Julgamento da Junta de Recursos Administrativos Tributários do Município de Joinville - JURAT (2004/2005); Membro Julgador da JURAT (2006/2007); Presidente das Câmaras de Julgamento da JURAT; Gerente da Unidade de Fiscalização de Tributos do Município de Joinville; e Professor de Direito Tributário e Legislação Aplicada a Eventos no Instituto de Ensino Superior de Joinville – IESVILLE/ANANGUERA.

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“chamo aqui de servidores das leis aqueles que

ordinariamente são chamados de governantes, não por

amor a novas denominações, mas porque sustento que

desta qualidade dependa sobretudo a salvação ou a ruína

da cidade. De fato, onde a lei está submetida aos

governantes e carece de autoridade, vejo pronta a ruína da

cidade; onde, ao contrário, a lei é senhora dos governantes

e os governantes seus escravos, vejo a salvação da cidade

e a acumulação nela de todos os bens que os deuses

costumam conceder às cidades” (Leis, 715d)

PLATÃO

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iii

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADin Ação Direta de Inconstitucionalidade

CC Código Civil

CFRB Constituição da República Federativa do Brasil

CTN Código Tributário Nacional

Des. Desembargador

DJ Diário da Justiça

DL Decreto-lei

E.C. Emenda Constitucional

EXMO Excelentíssimo

ICMS Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Sobre Prestação de

Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação

IOF Imposto Sobre Operações Financeiras

IPI Imposto Sobre Produtos Industrializados

IPTU Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana

IPVA Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores

IR Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza

ISSQN Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza

ITBI Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivo

ITCMD Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação

LC Lei Complementar

LCF Lei Complementar Federal

LCI Lei de Condomínio e Incorporações

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iv

LF Lei Federal

Min. Ministro

RE Recurso Extraordinário

Rel. Relator

REsp. Recurso Especial

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal Federal

TJRJ Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

TJSC Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina

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SUMÁRIO

RESUMO...........................................................................................................xiii

INTRODUÇÃO................................................................................................... 1

Capítulo 1

DO ESTADO FEDERAL E DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS

1.1. DO ESTADO FEDERAL ................................................................................. 6

1.1.1. Da Federação Brasileira ............................................................................ 7

1.1.2. Da Autonomia Municipal ........................................................................... 9

1.2. DA DEFINIÇÃO DE TRIBUTOS ................................................................... 10

1.2.1. Das espécies de tributos e suas definições .......................................... 12

1.2.1.1. Da definição de imposto........................................................................... 13

1.2.1.2. Da definição de taxa ............................................................................... 13

1.2.1.3. Da definição de contribuição de melhoria ................................................... 15

1.2.1.4. Da definição de empréstimo compulsório ............................................... 15

1.2.1.5. Da definição de contribuições especiais ................................................. 16

1.3. DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS ....................................................... 18

1.3.1. Da competência da união ........................................................................ 19

1.3.2. Da competência dos Estados Membros e do Distrito Federal............... 20

1.3.3. Da competência dos Municípios e do Distrito Federal ......................... 20

1.3.4. Da classificação econômica dos impostos ........................................... 22

1.3.4.1. Dos impostos incidentes sobre o patrimônio e a renda ............................. 24

1.3.4.2. Dos impostos incidentes sobre o comércio exterior ................................ 24

1.3.4.3. Dos impostos incidentes sobre a produção e a circulação ....................... 25

1.3.5. Da classificação jurídica dos impostos.................................................. 25

1.4. DISTINÇÃO ENTRE FATO GERADOR E HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA ..... 28

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Capítulo 2

DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇO DE QUALQUER NATUREZA

2.1. DA TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS NA HISTÓRIA ...................................... 31

2.1.1. Da tributação dos serviços no ordenamento brasileiro ......................... 32

2.2. DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ISSQN .................................................... 35

2.2.1. Da classificação econômica do ISSQN .................................................. 36

2.3. DO CONCEITO DE SERVIÇOS E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ......... 37

2.3.1. Do conceito de serviços ......................................................................... 38

2.3.2. Do conceito de prestação de serviços ................................................... 40

2.4. DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA .......................... 41

2.4.1. Do conteúdo da obrigação de fazer ....................................................... 44

2.5. DA LISTA DE SERVIÇOS ............................................................................ 46

2.5.1. Da interpretação da lista de serviços .................................................... 50

Capítulo 3

DO SEGMENTO DE CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO E

IMOBILIÁRIA

3.1. DA CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO, EM SUA GÊNESE .................... 53

3.1.1. Das múltiplas atividades desenvolvidas . . .. . . . .. . . . .. . . . .. . . . ... . . . . . .. . . . ... 55

3.2. DA INCORPORAÇÃO SOB A ÓTICA DO DIREITO POSITIVO .................. 57

3.2.1. Das obrigações do incorporador ............................................................ 60

3.3. DA INCORPORAÇÃO NO CONTEXTO ATUAL .......................................... 61

3.3.1. Do contrato de incorporação .................................................................. 63

3.3.2. Da função do contrato de incorporação ................................................ 64

3.3.3. Da natureza das obrigações erigidas do contrato ................................ 66

3.4. DA CONSTRUÇÃO ...................................................................................... 67

3.4.1. Da construção por empreitada................................................................ 68

3.4.2. Da construção por administração .......................................................... 70

3.5. DO INCORPORADOR CONSTRUTOR ................................................................... 71

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Capítulo 4

ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL E NA INCORPORAÇÃO

IMOBILIÁRIA

4.1. ORIGEM DO TERMO CONSTRUÇÃO CIVIL .............................................. 73

4.1.1. Acepção de Construção civil para efeito de tributação do ISS ........... 75

4.2. DO ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL ............................................................... 76

4.2.1. Dos serviços tributados .......................................................................... 76

4.2.1.1. Da execução por administração .............................................................. 78

4.2.1.2. Execução por empreitada .............................................................................. 79

4.2.1.3. Da execução por subempreitada ................................................................. 80

4.2.2. Dos serviços não tributados ................................................................... 81

4.3. DO ISS NA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA ................................................. 82

4.3.1. Do posicionamento doutrinário .............................................................. 84

4.3.2. Do posicionamento jurisprudencial ............................................................ 86

4.3.2.1. Da não incidência .................................................................................... 86

4.3.2.2. Da incidência ........................................................................................... 87

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 91

REFERÊNCIAS DAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS ............................................... 96

REFERÊNCIAS DAS FONTES JURISPRUDENCIAIS ....................................... 98

REFERÊNCIAS DAS FONTES LEGISLATIVAS .............................................. 101

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RESUMO

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi concebido sob a

perspectiva de esclarecer a controvertida matéria da incidência do ISSQN sobre o

segmento de construção e incorporação imobiliária, haja vista a ausência de uma

previsão específica, dentro da lista de serviços, para se sujeitar a atividade de

incorporar ao citado imposto, conduzindo o Fisco e o Contribuinte a um embate

constante.

Levando em consideração o universo legal, doutrinário e

jurisprudencial, tem-se como objetivo contribuir de forma científica para a elisão

do conflito, indicando, na medida do possível, a correta tributação e fornecendo

subsídios aos operadores do direito no sentido de uma ampla compreensão da

temática.

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INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, a opinião pública vem sendo sacudida por

mensagens alarmistas sobre um número excessivo de tributos cobrados,

colocando o Brasil em destaque no cenário internacional, despertando a

indignação do contribuinte que dia após dia, vê seu patrimônio sendo expropriado.

Todavia, não basta a indignação, deve-se, acima de tudo, compreender o porquê

da existência da tributação, bem como sua finalidade.

Aristóteles, no século IV a.C., já afirmava que “o homem é

naturalmente um animal político”, sendo por natureza, um animal social, o qual,

vivendo em sociedade, necessita de cooperação de outros da sua espécie, pois,

por si só, não pode prover todas as suas necessidades.

Construindo e hierarquizando a sociedade, o homem se destaca dos

demais animais, por ser racional e inteligente, razões pelas quais adapta-se e

transforma o meio em que vive. Por esse motivo, é perceptível a existência de

dois mundos distintos: o natural e o cultural. O primeiro referente ao que o homem

herdou do Criador. O segundo relativo a tudo que o homem criou. Entre as

criações humanas, merecem destaque as figuras do Estado e a do tributo.

O Estado, como produto da inteligência humana, é concebido como

ente dotado de força superior, ao qual foi incumbida a função de organizar,

disciplinar e proteger a sociedade. No mesmo diapasão, o tributo, concebido

como o instrumento necessário para que o Estado, por meio de seu poder de

imperium, possa obter os recursos necessários à consecução dos objetivos

sociais, realizando o bem comum e o desenvolvimento social.

Comparativamente, nas sociedades animais, constata-se em todas

elas, em função do convívio social: a exigência de uma contraprestação por parte

dos indivíduos, traduzindo-se na entrega de considerável fatia do seu trabalho em

favor do grupo, verificando-se, inclusive, a especialização de alguns em

determinadas atividades à vista da sobrevivência da sociedade, sendo mais

importante a sobrevivência coletiva em detrimento da individual. Tal comando não

resulta da inteligência, mas do instinto de sobrevivência, o que não se verifica na

sociedade humana.

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Em que pese preferir viver em sociedade, o homem acha-se

desprovido de um mecanismo capaz de induzi-lo à contribuição voluntária e

desinteressada, necessitando ser compelido coercitivamente.

Assim, na prática, o tributo é um avanço da humanidade, bastando

lembrar que em tempos, não tão remotos, as contribuições consistiam em

trabalho forçado pela submissão de outros homens e povos que, na maioria das

vezes, laboravam sob chicotadas.

Felizmente, em tempos atuais, a contribuição é mais racional e

lógica, cada um faz o que quer, o que gosta ou pode, mas, do seu patrimônio,

fragmentos vão sendo destacados, quantificados em moeda e encaminhados

para um grande depósito em favor da coletividade, o que em tese, conduz à idéia

de que o tributo é bom. Por outro lado, quando, na prática, se verifica a

quantidade cada dia crescente de tributos, a burocracia, as mudanças constantes

de regras, aliada à distribuição não equânime dos encargos combinada ao fato

daqueles que pouco ou nada pagam, há a sensação de que o tributo é mau.

O tributo não é nem bom e nem mau, é apenas necessário. Depois

que se compreende isso, não mais se discute o porquê de pagar tributos, mas sim

uma forma de aperfeiçoar o sistema.

Uma das ferramentas indicadas ao aperfeiçoamento é o estudo do

Direito Tributário; buscando compreender o liame em que se assenta a tributação;

dando o devido tratamento científico à matéria, na busca de soluções aos casos

concretos; fornecendo instrumentos ao legislador infraconstitucional, bem como

ao Poder Judiciário, encarregado do controle jurisdicional dos conflitos.

Com essas predisposições básicas, passa-se ao tema que norteia o

objeto desta pesquisa, a qual possui por escopo investigar a incidência ou não do

ISSQN sobre o segmento de construção e incorporação, em função da venda

antecipada das frações ideais do terreno, vinculada a uma unidade autônoma a

construir ou em construção.

Desta forma, o objeto específico desta pesquisa acha-se

diretamente relacionado à complexidade que norteia a matéria, posto que envolve

diversas discussões, haja vista que o presente tema, sob o prisma da

Administração Pública e da iniciativa privada, produz grandes conflitos,

ocasionando desgastes para ambas as partes, face às impropriedades na

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interpretação da matéria tributária, no que concerne à sujeição da atividade de

construir e incorporar ao ISSQN.

O aludido conflito se instala quando o fisco procura fazer incidir o

ISS sobre a construção, aludindo que o incorporador/construtor está executando

obras a terceiros, face ao condomínio estabelecido, onde, procurando elidir a

tributação, alega-se que se está vendendo imóveis e que o tributo devido é o ITBI.

Assim, há de se verificar se a venda das unidades autônomas, antes ou durante a

execução, caracteriza ou não hipótese de incidência do ISS?

No mesmo sentido, se a incorporação imobiliária figura entre as

hipóteses de incidência do imposto sobre serviços?

Assim, procurando adentrar ao cerne da celeuma, a investigação do

objeto calcar-se-á no método dedutivo, aliado à pesquisa bibliográfica,

jurisprudencial e legislativa, sendo o conteúdo dividido em quatro capítulos.

No primeiro capítulo, será abordada matéria de ordem geral,

discorrendo sobre a estrutura tributária em que se assenta a República Federativa

do Brasil, demonstrando de forma simplificada as competências tributárias de

cada um dos entes federados, bem como diferenciando o conteúdo da hipótese

de incidência e do fato gerador, por carregar ambas as expressões significações

distintas, cujos efeitos são de grande valia à pesquisa que se apresenta.

Dentro do mesmo contexto, o segundo capítulo, abarcando conteúdo

de cunho específico, aborda a matéria atinente ao imposto sobre serviços de

qualquer natureza, limitando-se, porém, apenas ao aspecto material (hipótese de

incidência), sob o pálio da Magna Carta, da Lei Complementar, bem como da

doutrina e da jurisprudência, haja vista que a problemática em torno do objeto

consiste em conceber ou não a atividade de construção e incorporação como

sujeita ao citado imposto, uma vez que a lista de serviços, à luz da jurisprudência,

é tida como taxativa e o legislador infraconstitucional, ao talhar a lista de serviços,

não positivou a atividade de incorporação entre as hipóteses de incidência, não

sendo esta, portanto, fato gerador do ISSQN.

Sem perder de vista a problemática, o terceiro capítulo trata da

construção e incorporação, desde sua gênese até sua positivação pelo legislador,

explicitando os contornos do exercício da atividade de construir e incorporar de

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forma neutra, sem adentrar na tributação, mas, no entanto, possa, ao cabo da

pesquisa, fornecer subsídios que conduzam à elisão do conflito.

Por fim, o quarto capítulo aborda a incidência do ISSQN no

segmento da construção civil, tomando por hipótese de incidência a execução por

administração, empreitada ou subempreitada de obras de construção civil, no que

se refere à obras novas, explicitando inclusive o conflito que permeia à sujeição

da atividade de construir e incorporar ao supracitado imposto, à luz dos

posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, sobressaindo a aridez da

matéria, de onde exsurgem teses opostas.

Em síntese, visa demonstrar de forma simples e objetiva, dentro da

pesquisa científica, a incidência ou não do Imposto Sobre Serviço de Qualquer

Natureza sobre o segmento de construção e incorporação, em função da venda

antecipada, procurando contribuir para ceifar algumas dúvidas que pairam,

propiciando trazer maior estabilidade nas relações fisco e contribuinte, bem como

suscitar, na medida do possível, o aprofundamento dos estudos, visando

aprimorar a visão e a compreensão de tão importante tema que, de modo direto

ou indireto, está vinculado ao aperfeiçoamento do sistema tributário.

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Capítulo 1

DO ESTADO FEDERAL E DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS

O convívio em sociedade requereu do homem uma entidade com força

superior dotada de mecanismos capazes de criar regras de condutas e impô-las

coercitivamente sobre aqueles que co-habitavam sob seu jugo, controlando-os e

protegendo-os; dessa necessidade nasceu o Estado2. Com o passar do tempo, essa

função precípua de proteção começou a ser superada, passando o Estado a absorver

outras funções como a obrigatoriedade de propiciar saúde, educação e lazer,

passando este a ter como finalidade3 básica a realização do “bem comum”4; assim

entendido como um ideal que promove o bem-estar e conduz a um modelo de

sociedade que permite o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas, ao

mesmo tempo que estimula a compreensão e a prática de valores espirituais.

Originariamente, o custeio das atividades estatais dava-se mediante “a

requisição de bens e serviços de seus súditos, de colaboração gratuita e honorífica

destes no desempenho de funções públicas e do empossamento de bens de inimigos

derrotados em guerra”, conforme observa Kiyoshi Harada5. Todavia, sob a ótica do

Estado moderno, regulado por preceitos legais, o processo de captação de recursos

financeiros se modificou, passando a residir na exploração do patrimônio público, nas

atividades empresariais praticadas pelo Estado e, principalmente, pela arrecadação de

tributos.

2 Paulo Cezar Baria de Castilho, citando Ataliba Nogueira diz que, “o indivíduo não foi feito para o estado, mas sim o estado para o indivíduo, para o seu bem-estar moral e material, para a sua felicidade. Nesta doutrina não existe o estado que cria o direito, mas o estado que descobre, reconhece, determina, aplica, sanciona, pondo ao seu serviço a coação física ... O direito não nasce com o estado, mas com o homem. Escrito ou consuetudinário, mas não deixou nunca de acompanhar o homem. Existe para servir o homem, como também para homem o estado.” E ainda arremata, propalando que “o estado não é o fim do homem; sua missão é de ajudar o homem a conseguir o seu fim. É meio, visa à ordem externa para a prosperidade comum dos homens.” (in Confisco tributário. p. 22-23) 3 Nos dizeres de Paulo Cezar Baria de Castilho, “o Estado existe na verdade para ajudar o homem a buscar a sua felicidade. Não a felicidade individual, pois cada um é autor de seu próprio destino, mas é dever do Estado propiciar as condições sociais e os meios que tornem possíveis a cada um de seus membros atingir a felicidade, de tal modo que ninguém seja excluído da felicidade comum.” (in Confisco tributário. p. 22). 4 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. p. 31. 5 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. p. 32

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Sob esse prisma, o Estado, como ente soberano que é, visando suportar

os gastos crescentes e distribuí-los de forma equânime entre todos os membros da

coletividade, lança mão do seu poder de império e retira de seus súditos fragmentos

de suas riquezas, por intermédio dos tributos, tornando-se estes, na atualidade, a

principal fonte de receita pública.

Desse modo, para o presente estudo, importa lembrar que o Estado

pode apresentar-se sob a roupagem de Estado Unitário, possuindo um governo

centralizado em uma única unidade, ou descentralizado em unidades autônomas, sob

o pálio de Estado Federal.

1.1. DO ESTADO FEDERAL

Sem adentrar aos desígnios que levaram ao surgimento do Estado

Federal, cumpre salientar que os historiadores apontam como referência um acordo

ocorrido no ano de 1.643, na Inglaterra, entre quatro colônias, as quais, devido a suas

situações políticas e jurídicas, uniram-se e criaram a Confederação da Nova Inglaterra,

conforme observa Celso Vedana6, dizendo ainda que, “com esse movimento, as

Colônias adquiriram o status de Estados e se tornaram soberanos com competência

na gestão do poder, jurisdição e direitos (...)”.

Inspirados no referido movimento, no ano de 1.776, treze colônias

inglesas, sediadas na América do Norte, declararam independência, tornando-se

Estados Livres, a cujo respeito Dalmo de Abreu Dallari7, diz que:

Esses precedentes influenciaram para que se chegasse à Declaração de Independência e para que alguns anos depois, em 1.781, fosse assinado um tratado que se tornou conhecido como Artigos de Confederação. O congresso intercolonial passou a denominar-se Os Estados Unidos Reunidos em Congresso, evoluindo depois para Estados Unidos da América.

Das manifestações de vontade de liberdade e independência nasceu

uma nova forma de Estado (Estado Federal8), cujo exercício do poder de Estado acha-

6 VEDANA, Celso. Federalismo: autonomia tributária formal dos municípios. p. 32. 7 DALLARI, Dalmo de Abreu. O estado federal. Série princípios. p. 11.

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se dividido e distribuindo por unidades regionais, harmônicas e independentes, cuja

estabilidade se encontra lastreada em um acordo de ordem interna, comumente

batizado de pacto federativo, preservando, deste modo, a unidade nacional.

Em outras palavras, pode-se dizer que o Estado Federal é o produto

resultante de um acordo, denominado “Pacto Federativo”, firmado por Estados

soberanos que, abrindo mão de suas soberanias, dão origem a um novo Ente, que os

sucede na ordem externa (internacional), permanecendo seus genitores como ente de

direito interno, participando dos princípios vetores do Estado, os quais usufruem de

certa independência e autonomia política, administrativa e financeira; essa última

ligada ao poder de instituir e arrecadar tributos.

1.1.1. Da Federação Brasileira

A forma federada do Estado brasileiro possui, como marco, a

promulgação da Carta Política datada em 24 de fevereiro de 1.891, a qual, ratificando

o fim do regime imperial no Brasil, “estabeleceu que a Nação Brasileira adotava como

forma de governo a República Federativa, e constituía-se, por união perpétua e

indissolúvel das antigas províncias, em Estados Unidos do Brasil (art. 1º)”, conforme

observa José Afonso da Silva9.

A partir deste momento, deixa o Estado Brasileiro de possuir o caráter

unitário, cujo poder, antes centralizado, passa a ser distribuído entre a União e os

Estados Membros. Todavia, há de se registrar que a federação brasileira não resultou

de um pacto entre Estados soberanos, mas sim da divisão do Estado Unitário em

unidades regionais autônomas, cuja formação no transcurso de quase um século não

se modificou, o que somente ocorreu com a promulgação da Constituição de 05 de

8 Roque Antônio Carrazza, explica que “federação (de foedus, foederis, aliança, pacto) é uma associação, uma união institucional de estados, que dá lugar a um novo Estado (o estado Federal), diverso dos que dele participam (Estados-membros). Nela os Estados federados, sem perderem suas personalidades, despem-se de algumas tantas prerrogativas, em benefício da União de Estados. A mais relevante é a soberania.” (in Curso de direito constitucional tributário. p. 89). Não obstante, há de se registrar que, o Estado Federal, segundo a literatura dominante, possui como certidão de nascimento a Constituição dos Estados Unidos da América, datada no ano de 1787, cuja essência inspirou os demais movimentos federalistas que se sucederam, entre eles a que culminou na ruptura do regime imperial brasileiro, no ano de 1.889. 9 SILVA, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. p. 78.

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outubro de 1.988, momento este em que a federação brasileira adquiriu um novo ente,

haja vista ter sido o Município elevado a status de ente federado, dotado de autonomia

frente aos demais, não se encontrando nenhuma outra organização federativa no

mundo com tamanha complexidade, e classificada, por alguns autores, como atípica.

Tal assertiva se verifica da redação contida no art. 1º, “caput” da Magna

Carta, que dispõe:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como Fundamentos:

Desta feita, verifica-se que o Município passou a integrar a federação, o

que lhe permite participar dos princípios vetores do Estado, ao contrário do que

acontecia na vigência das Constituições pretéritas, sobre cujo particular José Afonso

da Silva10 diz:

(...) a característica básica de qualquer Federação está em que o poder governamental se distribui por unidades regionais. Na maioria delas, essa distribuição é dual, formando-se duas órbitas de governo: a central e as regionais (União e Estados Federados) sobre o mesmo território e o mesmo povo. Mas, no Brasil, o sistema constitucional eleva os Municípios à categoria de entidade autônoma, isto é, entidades dotadas de organização e governo próprio e competências exclusivas. Com isto, a Federação brasileira adquire peculiaridade, configurando-se, nela, realmente três esferas Governamentais: a da União (governo federal), a dos Estados Federados (governos estaduais) e a dos Municípios (governos Municipais), além do Distrito Federal, a que a Constituição agora conferiu autonomia.

Neste ponto, há de se dizer que o Município, ao integrar a federação,

com status de ente federado, recebeu em contrapartida certa fatia de autonomia. O

que implica dizer que o Município, além de participar dos princípios vetores da Nação,

recebeu uma fatia do poder de imperium do Estado, igualando-se aos Estados

Membros e à União, não podendo mais sofrer ingerência dentro do seu campo de

atuação, sob pena de quebra do pacto federativo11 e de flagrante

inconstitucionalidade.

10 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional positivo. p. 620. 11 Há de se registrar que a forma federada do Estado, acha-se tralhada no bojo constitucional sob o manto de princípio, sendo vedada qualquer ato que atente contra esta (art. 60, §4º, I, da CF), caracterizando-se como cláusula pétrea. Do mesmo modo ocorre com a autonomia Municipal e dos demais entes. Deste modo, não poderão ser expedidas leis ou normas infraconstitucionais ou mesmo emendas constitucionais, que possam agredir o princípio do federalismo.

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1.1.2. Da competência Municipal

A “priori”, cumpre esclarecer que a competência (legislativa, jurisdicional

e tributária) de cada uma das esferas governamentais acha-se definida na

Constituição da República Federativa do Brasil, que também estabelece o que lhes é

vedado.

No que se refere ao Município, sua competência legislativa e

jurisdicional, encontra-se sedimentada nos artigos 29 e 30 da Magna Carta, sendo que

um dos pontos basilares pertinente à autonomia municipal acha-se prescrito no artigo

29, “caput”, o qual dispõe:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos Membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

Neste ponto, há que se dizer que para efeito do ordenamento municipal,

a Lei Orgânica equipara-se à Constituição da República, prevalecendo inclusive, em

caso de conflitos, entre esta e a Constituição do Estado, lei estadual ou federal e ou

quaisquer outros instrumentos legislativos, desde que respeitadas as competências

talhadas no bojo da Magna Carta.

Não obstante, outro ponto a ser observado, relativo à autonomia

Municipal, refere-se à capacidade de instituir e arrecadar tributos, uma vez que não

seria razoável gozar de certa autonomia e ao mesmo tempo ser dependente financeira

e economicamente dos demais entes federados.

Neste particular, em termos práticos, a autonomia do Município significa

aduzir que o Governo Municipal não está subordinado a qualquer autoridade estadual

ou federal no desempenho de suas atribuições, seja na sua forma organizacional, na

arrecadação dos tributos de sua competência ou mesmo sobre qualquer assunto a

que a Carta Política lhe conferiu, o que implica dizer que as leis municipais prevalecem

sobre as leis Estaduais e Federais, respeitados os limites previstos no Estatuto

Supremo, devendo as três esferas governamentais conviver harmonicamente.

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1.2. DA DEFINIÇÃO DE TRIBUTO

A conceituação legal de tributo acha-se positivada no art. 3º do Código

Tributário Nacional que dispõe:

Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Do supracitado dispositivo legal emergem as características básicas de

todos os tributos, a saber: a) os tributos são prestação compulsória; b) os tributos são

prestações pecuniárias quantificáveis em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir;

c) os tributos não constituem sanção de atos ilícitos; d) os tributos são instituídos por

lei; e, finalmente, e) os tributos são cobrados por atividade administrativa plenamente

vinculada.

Assim, pelo caráter compulsório, entende-se que o pagamento de

tributos não fica ao alvitre do sujeito passivo, podendo este ser compelido, não se

encontrando presente a voluntariedade no que tange ao animus de pagar ou não o

tributo. Assim, uma vez praticado o fato gerador do tributo, surge, conseqüentemente,

a obrigação de entregar ao ente público de direito o quantum devido, materializado no

lançamento.

Hugo de Brito Machado12 esclarece que “embora todas as prestações

jurídicas sejam, em princípio, obrigatórias, a compulsoriedade da prestação tributária

caracteriza-se pela ausência do elemento vontade no suporte fático da incidência da

norma de tributação. O dever de pagar tributo nasce independente da vontade”.

Neste diapasão, deduz-se que o sujeito passivo, em determinadas

circunstâncias, pode até escolher entre praticar ou não o fato gerador da obrigação

tributária, mas, uma vez praticado13 o fato gerador, não há escolha em querer ou não

pagar o tributo.

12 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 58 13 Mister se faz esclarecer, que a faculdade de escolha que detém o sujeito passivo, somente se refere aos fatos geradores que não estão vinculados a nenhuma atividade estatal, em relação ao contribuinte. Neste ponto, refere-se aos impostos, cuja obrigação tributária somente surgirá, se o Sujeito Passivo, exercer determinada atividade, eleita como hipótese de incidência de alguns dos impostos descritos na Constituição, como por exemplo, prestar serviço, comercializar mercadorias, entre outros.

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No que se refere ao aspecto da pecuniariedade, há de se dizer que, via

de regra, o cumprimento das obrigações tributárias se dá em moeda, não se admitindo

o pagamento in natura, ou seja, por qualquer outro meio que não seja moeda,

assegurando deste modo, ao Estado, “os meios financeiros de que necessita para a

consecução de seus objetivos, por isto que a natureza é pecuniária”, conforme salienta

Hugo de Brito Machado14.

Por outro lado, quando o Legislador aludiu que o tributo não constitui

sanção de ato ilícito, procurou com isto diferenciar as multas dos tributos, uma vez que

ambos são compulsórios, pagos em moeda e instituídos por lei.

Sob este prisma, os tributos, ao serem instituídos, devem tomar por

hipótese de incidência um ato ou fato idôneo (lícito), que não resulte de ato contrário a

lei. Hugo de Brito Machado15 observa que “não pode estabelecer como necessário e

suficiente à ocorrência da obrigação de pagar um tributo uma situação que não seja

lícita. Se o faz, não se está instituindo um tributo, mas uma penalidade”.

Não obstante, quando a norma dispõe que os tributos somente podem

ser instituídos por lei, isto decorre dos preceitos do princípio da legalidade, insculpidos

no art. 5º, II, e art. 150, I, da Magna Carta e do art. 97, I, do Código Tributário Nacional,

cujo conteúdo é de cunho inafastável, devendo o ente arrecadador respeitar, haja vista

ser o princípio da legalidade, juntamente com os princípios da impessoalidade,

moralidade, publicidade e da eficiência, o esteio basilar da Administração Pública, nos

termos do art. 37, “caput”, da Magna Carta.

Sob esse prisma, redunda dizer que somente a lei pode instituir um

tributo, resultando assim, num dever para o ente arrecadador e num direito ao Sujeito

Passivo, que saberá a qual tributo estará sujeito e principalmente o quantum de sua

riqueza será expropriado e entregue ao Estado, sabendo ainda em quais sanções

estará em curso, caso descumpra a obrigação ex lege inerente ao tributo.

Por fim, no que tange ser o tributo cobrado mediante atividade

plenamente vinculada, conduz à idéia de que no desempenho da atividade

arrecadatória o agente arrecadador não dispõe da liberdade para apreciar a

conveniência e nem tão pouco a oportunidade de agir; tendo em vista que a lei impõe

o fim a ser alcançado e a forma a ser observada, bem como a competência da

14 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 57. 15 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 60.

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autoridade para agir, vinculando-a determinantemente ao comando legal. Assim, a

Administração Pública está compelida a adotar determinados procedimentos, a

praticar determinados atos, todos previstos em lei, com vista à cobrança dos tributos,

cuja inobservância conduzirá à ineficácia da exigência tributária.

1.2.1. Das espécies de tributos e suas definições

A “priori”, vale esclarecer que a expressão “tributo” designa gênero do

qual são espécies: os impostos, as taxas e a contribuição de melhoria, sob a ótica do

Código Tributário Nacional. Entretanto, à luz do atual sistema tributário constitucional,

acresce-se outras duas espécies: o empréstimo compulsório e as contribuições

especiais.

Esclarece-se que a classificação qüinqüipartide, aqui adotada, não é

pacífica. Autores como Geraldo Ataliba e Roque Antônio Carrazza, defendem a

classificação tripartide (impostos, taxas e contribuições). No entanto, autores como

Ives Gandra Martins, Hugo de Brito Machado e Vitório Cassone, defendem a

existência de cinco espécies tributárias (impostos, taxas, contribuições de melhoria,

contribuições especiais e empréstimo compulsório), sendo esta inclusive referendada

pelo Supremo Tribunal Federal, conforme se sobressai das decisões apostas ao RE n.

146.733-9/SP16 e RE n. 138.284/CE17.

Destarte, a interpretação sistêmica da Magna Carta, conduz a

compreensão de cinco espécies tributárias, muito embora autores como Edvaldo

Pereira de Brito e Valdir de Oliveira Rocha, conforme afirma Vittorio Cassone18, não

reconhecerem o caráter tributário das contribuições especiais.

Desta forma, academicamente e para o efeito didático dessa pesquisa, é

relevante explanar isoladamente cada uma das espécies tributárias

constitucionalizadas, visto que contribui a compreensão desses institutos, levando

ainda, em consideração que, a Magna Carta traz em seu bojo princípios tributários

16 STF. RE n. 146.733-9/SP. Rel. Min. Moreira Alves, j. em 06/11/1992. 17 STF. RE n. 138.284/CE. Rel. Min. Carlos Velloso, j. em 01/07/1992. 18 CASSONE, Vittorio. Direito tributário. p. 83.

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gerais e princípios tributários específicos, como no caso das contribuições especiais,

que facilitam suas respectivas diferenciações.

1.2.1.1. Da definição de imposto

A exemplo do conceito de tributo, o CTN, na qualidade de norma

complementar à Magna Carta, em seu art. 16, traz positivado o conceito de imposto,

dispondo:

Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Dessa definição legal sobressai que o fato gerador dos impostos não se

vincula a nenhuma atividade específica do Estado em relação ao Sujeito Passivo, não

havendo nenhuma oferta estatal de uma utilidade, comodidade ou serviço fruível

diretamente; inexistindo qualquer vinculação entre o pressuposto do fato

previsto na norma instituidora do imposto e a atuação estatal, a cujo respeito

Vitório Cassone19 diz que “o imposto é o tributo pago pelo contribuinte sem que este

receba diretamente, do ente público, contraprestação.”

Assim, quando se estiver diante de um tributo, cuja hipótese de

incidência independer de qualquer atividade estatal específica em relação ao sujeito

passivo, como por exemplo, circular mercadorias, industrializar produtos, prestar

serviços, ser proprietário de imóvel, entre outros, estar-se-á diante de uma espécie

tributária denominada imposto.

1.2.1.2. Da definição de taxa

Prevista no art. 145, II, da Magna Carta, ao contrário do que ocorre com

o conceito de tributo e imposto, inexiste no ordenamento positivo quaisquer

19 CASSONE, Vitório. Direito tributário. p. 86.

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dispositivos que possam traduzir com precisão o conceito de taxa, havendo, outrossim,

disposições que conduzem ao seu entendimento, conforme se sobressai do disposto

no art. 77, do Código Tributário Nacional:

Art. 77. As taxas cobradas pela união, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Em que pese inexistir um conceito legal de taxa, há de se dizer que o

disposto no supracitado artigo traz ilações suficientes que podem diferenciar a taxa dos

demais tributos.

Assim, em virtude de seu fato gerador, a doutrina dominante diz que

taxa é um tributo contraprestacional, cujo pagamento “corresponde a uma

contraprestação do contribuinte ao Estado pelo serviço que lhe presta, ou pela

vantagem que lhe proporciona”, conforme afirma Hugo de Brito Machado20.

Deste modo, as taxas têm como característica, na materialidade de seu

fato gerador, a atuação estatal em relação ao contribuinte, em forma de uma

contraprestação, onde Yoshiaki Ichihara21 afirma que “a taxa é sempre dependente de

uma atuação estatal na forma de: (a) exercício do poder de polícia; ou (b) prestação de

serviços públicos específicos e divisíveis, prestado ao contribuinte ou posto a sua

disposição.”

Nesses termos, as taxas constituem tributos decorrentes da

prestação de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao

contribuinte, ou postos à sua disposição, assim entendido como toda atividade

de oferecimento de utilidade ou comodidade fruível diretamente pelos

administrados, prestada pelo Estado; ou relativos ao exercício regular do poder

de polícia22.

20 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 369. 21 ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. p. 77. 22 “Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, aos costumes, à disciplina, da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.” (Art. 78, da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, que dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.)

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1.2.1.3 – Da definição de contribuição de melhoria

Prevista no art. 145, III, da Magna Carta, a contribuição de melhoria não

encontra no ordenamento positivo sua conceituação. Todavia, cabe explicitar que a

exemplo da taxa, é um tributo vinculado à contraprestação Estatal, divergindo quanto

ao seu objeto, nos termos do art. 81 do CTN, que prescreve:

Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resulte para cada beneficiário.

Neste particular, Hugo de Brito Machado23 conceitua contribuição de

melhoria como o “tributo cujo fato gerador é a valorização de imóvel do contribuinte,

decorrente de obra pública, e tem por finalidade a justa distribuição dos encargos

públicos, fazendo retornar ao Tesouro Público o valor despendido com a realização de

obras públicas, na medida em que destas decorra valorização de imóveis.”

Assim, enquanto a taxa pode ser instituída em razão do exercício do

poder de polícia e ou da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos

e divisíveis prestados ou postos à disposição do contribuinte; a contribuição de

melhoria pode ser instituída em razão da realização de obras públicas e desde que,

destas, resulte valorização do imóvel, à luz do inciso III, do artigo 145 da Magna Carta.

1.2.1.4. Da definição de empréstimo compulsório

O empréstimo compulsório acha-se previsto constitucionalmente no art.

148. Entretanto, no mesmo caminho da taxa e da contribuição de melhoria, não possui

uma definição legal, ficando a cargo da doutrina defini-lo.

Cabe apontar que pairam controvérsias acerca da natureza jurídica do

empréstimo compulsório, cuja temática reside em saber se este é ou não um tributo.

23 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 381.

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Todavia, a doutrina dominante tem aceitado seu escopo tributário conforme afirma

Hugo de Brito Machado24. Entretanto, o citado autor, por sua vez, não acolhe o

empréstimo compulsório como um tributo, por entender à luz da teoria geral do direito

e do conceito universal de tributo, que este, sob o aspecto financeiro e econômico, não

transfere riqueza do setor privado para o Estado. Todavia, para efeitos didáticos,

prefere tratá-lo como um tributo.

Assim, sem adentrar à controvertida matéria, cumpre apenas ter em

mente que o empréstimo compulsório, à luz do conteúdo sedimentado no art. 148 da

Magna Carta, como o próprio nome revela, trata-se de um empréstimo feito de forma

compulsória pelo Estado que, frente a investimento público de caráter urgente e de

relevante interesse nacional (iminência de guerra externa e ou na ocorrência de

calamidade pública), poderá chamar seus súditos a contribuir pecuniariamente de

maneira coativa, obrigando-se nos termos da lei restituí-lo dentro de certo prazo e

condições, o que leva a doutrina a considerá-lo como um tributo sui generis, por se

tratar de uma prestação pecuniária compulsória restituível.

Deste modo, verifica-se à luz do conceito positivado no art. 3º, do CTN,

que o empréstimo compulsório alinha-se ao conceito de tributo, face a sua

compulsoriedade, divergindo apenas no que se infere a sua restituição, por inexistir no

conceito de tributo previsão quanto à restituição da quantia recolhida.

1.2.1.5. Da definição de contribuições especiais

De início, informa-se que as contribuições especiais, acham-se previstas

no art. 149 da Magna Carta. Não obstante, há de se dizer que inexiste uma definição

que possa exprimir sua conceituação. Doutrinariamente, procurando traçar uma

definição, caminham os autores nos estreitos limites conceituais de imposto ou de

taxa. Todavia, nenhum desses conceitos é suficiente para esvaziar a celeuma.

Muito embora não se tenha uma definição específica, as contribuições

especiais segundos os fins a que se destinam, devem ser entendidas como tributo

destinado ao financiamento de gastos específicos, atuando como instrumentos

24 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 66.

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de intervenção do Estado no campo social e econômico, sempre no

cumprimento dos ditames da política de governo, consistindo em prestações

pecuniárias, previstas em lei, instituídas para atender às crescentes despesas

do Estado, que, ampliando suas funções precípuas (prover e manter a justiça,

resguardar a segurança interna e externa etc), passou também a proporcionar

aos seus cidadãos bem-estar, melhor qualidade de vida e proteção contra as

contingências biopsicossociais, promovendo o “bem comum”.

Em que pese à discussão a cerca da matéria, à luz do artigo 149 da

Magna Carta, verifica-se a existência de três espécies de contribuição especiais, a

saber: a) contribuição de intervenção no domínio econômico, conhecida como CIDE,

cuja função correlaciona-se com o desenvolvimento de ações interventivas do Estado

na ordem econômica, regulando-as e protegendo-as; b) contribuições de interesse de

categorias profissionais ou econômicas, assim entendidas, aquelas arrecadadas por

entidades de classe como a Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Regional de

Medicina entre outras, conhecidas como entidades paraestatais, uma vez que atuam

ao lado do Estado, regulando e fiscalizando atividade de interesse público etc; e, c)

contribuições sociais como são rotuladas, cujas bases, encontram-se definidas na

Magna Carta, as quais têm por função o custeio da previdência social, devendo ser

financiada por toda a sociedade, nos termos do artigo 195, “caput”, da Constituição

Federal.

Não obstante, é imperativo destacar que as contribuições especiais

como espécie de tributo devem se submeter às regras gerais do Direito Tributário e

aos princípios da legalidade e da anterioridade (artigo 150, III, “a” e “b”), ressalvado, no

caso das contribuições de seguridade social, o disposto no §6º do artigo 195, cuja

instituição e arrecadação pode se dar no mesmo exercício financeiro, respeitado o

princípio da noventena, o qual dispõe que a exigibilidade somente poderá ocorrer

depois de transcorrido noventa dias da data de publicação da lei que haja instituída ou

modificada, a sistemática de arrecadação.

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1.3. DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS

Partindo da premissa que o Estado Brasileiro acha-se organizado sob a

estrutura de Estado Federal, a função arrecadatória encontra-se fragmentada em três

níveis de governo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), achando-se

normatizada em sede constitucional, mediante a outorga de competência tributária,

coadunada a inúmeros outros princípios tributários que regulam os conflitos de

competência; bem como as limitações do poder de tributar vigorando no ordenamento

pátrio o regime de competências, tanto para os impostos, quanto para as demais

espécies tributárias.

Nesse sentido, o Legislador Constituinte, ao outorgar competência às

pessoas jurídicas de direito público interno para instituir os tributos discriminados na

Constituição, em observância ao “pacto federativo”, distinguiu três modalidades de

competência tributária, a saber: competência tributária comum, competência residual

(remanescente ou extraordinária) e competência privativa.

A competência tributária comum, correlaciona-se com a possibilidade

das três esferas governamentais instituírem tributos com naturezas jurídicas idênticas,

podendo ser criados e arrecadados, em comum, pela União, pelos Estados, pelo

Distrito Federal e pelos Municípios, como nos casos das taxas e das contribuições de

melhorias, previstas nos incisos II e III do artigo 145 da Constituição da República

Federativa do Brasil.

Entretanto, cumpre esclarecer que a instituição e a arrecadação dos

citados tributos, somente pode se dar pelo ente que praticou o fato gerador, não sendo

admitido, por exemplo, que o “poder de polícia” seja realizado pelo Município e que a

União institua e arrecade a taxa tomando por base aquele fato gerador. No mesmo

sentido, ocorre com a contribuição de melhoria, cuja instituição e arrecadação somente

se admite pelo ente que executou a obra da qual decorra a valorização do imóvel.

No que se refere à competência residual (remanescente ou

extraordinária), esta trata da possibilidade de instituição de impostos novos, diferentes

dos previstos na Constituição, desde que não-cumulativos e mediante a edição de lei

complementar, cuja titularidade repousa nas mãos da União, conforme dispõe o art.

154, I e II da Magna Carta.

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Por fim, a competência tributária privativa, é aquela que “ocorre quando

o tributo a ser instituído só pode ser objeto de instituição pela entidade estatal, a que a

Constituição, de forma explícita, designa como tendo a competência tributária para

aquele tipo de tributo”25 o que implica dizer, mesmo que o ente competente não queira

instituir e arrecadar, isto não transfere a competência para outro ente, haja vista que a

Magna Carta ter sido contundente ao dizer que somente aquele ente poderá tributar

aquele fato gerador.

Desse modo, o legislador constituinte, levando em consideração o pacto

federativo e a autonomia financeira dos entes federados, bem como observando o

universo conceitual das várias espécies de tributos, outorgou a cada um dos entes a

competência para tributar determinados fatos geradores, cujo escopo visa preservar a

saúde financeira de cada um destes.

1.3.1. Da competência da União

Levando em consideração os limites conceituais entre competência

privativa, comum e residual (remanescente ou extraordinária), o Legislador

Constituinte, ao talhar no bojo constitucional, determinou que à União competiria

privativamente, nos termos do artigo 153 da Constituição da República Federativa de

1.988, instituir impostos sobre:

Art. 153 - Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

Dentre as competências atribuídas à União, ressalta-se ainda, a

possibilidade desta instituir “empréstimo compulsório” e “contribuições sociais”, nos

termos dos artigos 148 e 149:

25 GASPAR, Walter. Manual de direito tributário. p. 50-51.

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Art. 148 - A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, b. Parágrafo único - A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. Art. 149 - Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

Não obstante, observa-se de acordo com o § 1º26 do artigo 149, que os

Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem instituir contribuições sociais, a

serem cobradas de seus servidores, para o custeio de regime previdenciário em

benefício destes. Sob esse prisma, as contribuições arrecadadas sobre folha e salários

dos servidores públicos, alinham-se aos tributos de competência comum.

Ressalta-se ainda, a possibilidade da União instituir outros impostos

extraordinários (competência residual ou remanescente), conforme dispõe o artigo

154, II:

Art. 154 - A União poderá instituir: I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

1.3.2. Da competência dos Estados Membros e do Distrito Federal

Por sua vez, os Estados Membros e o Distrito Federal possuem a

competência para instituir os impostos sobre a propriedade de veículos automotores

(IPVA), sobre operação de circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços

26 “§ 1º - Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.”

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de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) e sobre

transmissão causa mortis e doação (ITCMD), nos termos do artigo 155 da Magna

Carta.

Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; III - propriedade de veículos automotores.

1.3.3. Da competência dos Municípios e do Distrito Federal

Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir impostos sobre a

propriedade territorial urbana (IPTU), sobre transmissão inter vivos de bens imóveis

(ITBI) e sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN), segundo o que dispõe o art.

156 da Magna Carta:

Art. 156 - Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;

Não obstante, poderão, ainda, segundo as prerrogativas constitucionais,

outorgadas pelo artigo 149-A, instituir contribuição para o custeio da iluminação

pública, comumente conhecida por COSIP, conforme se verifica:

Art. 149-A - Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.

Posto isso, observa-se que não há, aqui, a pretensão de se exaurir a

matéria, mas tão somente demonstrar, sob o prisma constitucional vigente, quais

tributos encontram-se na esfera impositiva dos entes políticos de direito interno, visto

que a presente pesquisa tem por escopo o estudo da possível incidência do ISSQN,

sobre o segmento de construção e incorporação imobiliária.

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1.3.4. Da classificação econômica dos impostos

Segundo explica a doutrina dominante, o legislador, ao criar uma

hipótese de incidência tributária, busca no mundo real um fato com significação

econômica, atribuindo-lhe relevância jurídica, haja vista que por intermédio deste

artifício, “mede-se a capacidade contributiva de cada um pelas riquezas particulares

que podem constituir no patrimônio (riqueza como fim), na renda (acréscimo de

riquezas) ou a própria circulação de riquezas (fluxo dos meios materiais de vida)”,

conforme ensina Zelmo Denari27.

Neste ponto, ensina Bernardo Ribeiro de Moraes28, que:

O legislador, diante de um fato que denota capacidade econômica, cria a hipótese de incidência fiscal, obrigando toda pessoa a ele vinculada a certa obrigação tributária. A hipótese de incidência representa atos ou fatos econômicos, aos quais a lei tributária veio dar relevância jurídica (dependente dos fatos a criação da obrigação tributária).

Deste modo, tem-se entendido que a norma tributária utiliza como

fundamento da hipótese de incidência e para o surgimento da obrigação, certos fatos

do cotidiano da vida econômica, como: renda, exercícios de certas atividades, uma

profissão, o capital, a aquisição de um bem, entre outros, a cujo respeito observa

Amílcar de Araújo Falcão29 que “constitui um critério, um indício para a aferição da

capacidade econômica ou contributiva dos sujeitos aos quais se atribui”, função pela

qual o direito empresta relevo jurídico.

Em que pese à explanação acima, há de se dizer que o conteúdo

econômico das hipóteses de incidência tributárias somente passou a ser observado

com o advento da Emenda Constitucional n. 18/65, e definitivamente com a Carta

Política de 1.967, uma vez que o sistema tributário construído sob a Ordem

Constitucional de 1.946 adotava um critério nominalístico-jurídico “sem levar em conta

o conteúdo econômico”, adotando apenas, “uma nomenclatura jurídica para a

indicação dos impostos”, segundo explica Sérgio Pinto Martins30.

27 DENARI, Zelmo. Curso de direito tributário. p. 84 28 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 90. 29 FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. p. 28. 30 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 31.

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Bernardo Ribeiro de Moraes31 esclarece que a ausência de atribuição

econômica para os fatos geradores da obrigação tributária presente na Ordem

Constitucional de 1.946, advinha da Carta Política de 1.891, a qual se calcava em

“critérios nominalísticos (apresentando o nomem juris ou a roupagem jurídica do

imposto)”. O citado autor acrescenta que o novo sistema, adotado a partir da Emenda

Constitucional n. 18/65, “deixou para segundo plano o aspecto jurídico da

discriminação, (...) colocando em seu lugar o aspecto econômico do imposto”.

Desta feita, os diversos impostos presentes no Sistema Tributário

Nacional sob o império da Constituição de 1.946 foram, a partir da E.C. n. 18/65 e

ratificado pelo Estatuto de 1.967, agrupados em figuras unitárias, levando em

consideração a igualdade de natureza e suas características econômicas (produção32,

circulação33, renda etc), conforme se sobressai da exegese da Lei Federal n. 5.172/66,

a qual foi recepcionada pela Magna Carta de 1.988, com status de lei complementar.

Sérgio Pinto Martins34 diz que, a partir de então:

(...) a discriminação de rendas tributárias, agrupou todos os impostos componentes do sistema tributário em quatro grupos ou categorias econômicas, assim especificadas: imposto sobre o comércio exterior, imposto sobre o patrimônio e a renda, impostos sobre a produção e a circulação e impostos especiais (estes, por suas características ou pela circunstâncias de suas incidências não podiam ser enquadradas em uma única das categorias anteriores).

Observando o sistema tributário nacional regido pela Lei Federal n.

5.172/66, atual Código Tributário Nacional, Zelmo Denari35, Walter Gaspar36 e

31 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 75. 32 Bernardo Ribeiro de Moraes, diz que “Produção vem de produzir (do latim: pro, adiante, na frente, ducer, por colocar - producere: fazer aparecer), que em economia tem o significado de criação de utilidades, de ‘fazer aparece valor’, de criar (fazer aparecer) ou aumentar utilidades econômicas, isto é, tudo quanto satisfaça os desejos humanos. Tem o sentido de criar ou aumentar coisas desejáveis, bens aptos para satisfazerem as necessidades humanas.” (in Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 79). Na mesma esteira, Sérgio Pinto Martins acrescenta dizendo que “Para a existência da produção econômica mister se faz a criação de um bem (utilidade criada aumentada) ou a submissão de um bem a qualquer operação que modifique sua natureza ou a sua finalidade, ou o aperfeiçoamento para o consumo. A operação de industrialização, conseqüentemente, abrange: a transformação de bens, a montagem, o acondicionamento ou a renovação.” (in Manual do imposto sobre serviços. p. 35). 33

“Circulação (do latim: circumlatio, levar ou trazer ao redor, em volta), é a movimentação de bens e serviços em direção ao consumo”, segundo observa Bernardo Ribeiro de Moraes, o qual acrescenta dizendo que a “circulação vem a ser sucessão de trocas que tem o objetivo a movimentação dos bens em direção ao consumo. A circulação é conseqüência (complemento) da produção, implicando no processo de permuta, pois se com a produção criam-se utilidades, com a circulação permutam-se ou transmitem-se a terceiros essas utilidades”. (in Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 78). 34 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviço. p. 32.

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Bernardo Ribeiro de Moraes37, na mesma esteira de Sérgio Pinto Martins, reforçam o

critério da classificação econômica dos impostos, dizendo que a tributação leva em

conta os seguintes elementos: a) patrimônio e renda; b) comércio exterior; c) produção

e circulação, e d) impostos especiais.

Walter Gaspar38 adverte que a classificação supracitada subsiste, em

que pese a supressão dos impostos especiais incidentes sobre a energia elétrica,

combustíveis e lubrificantes, e minerais.

1.3.4.1. Dos impostos incidentes sobre o patrimônio e renda

Levando em consideração a supracitada classificação feita pelo

Legislador Constituinte de 1967, cujo teor foi recepcionado pelo sistema tributário

constitucional vigente (CTN, Capítulo III, art. 29 a 45), os impostos que incidem sobre o

patrimônio e a renda são: imposto de renda e proventos de qualquer natureza (IR);

imposto sobre propriedade territorial rural (ITR); imposto sobre grandes fortunas (ainda

não instituído); Imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens

ou direitos (ITCMD); Imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA);

imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU); imposto sobre a

transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis (ITBI).

1.3.4.2. Dos impostos incidentes sobre comércio exterior

Entre os impostos incidentes sobre o comércio exterior (CTN, Capítulo II,

art. 19 a 28) acham-se insertos os impostos sobre produtos estrangeiros (II) e sobre

exportação para o exterior de produtos nacionais ou nacionalizados (IE), ambos de

competência privativa da União. 35 DENARI, Zelmo.Curso de direito tributário. p. 84-85. 36 GASPAR, Walter. Manual de direito tributário. p.107. 37 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 75-76. 38 GASPAR, Walter. Manual de direito tributário. p.107.

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1.3.4.3. Dos impostos incidentes sobre a produção e circulação:

Incidindo sobre a produção e a circulação (CTN, Capítulo IV, art. 46 a

73), previu o Legislador Constituinte os impostos sobre produtos industrializados (IPI);

imposto sobre operações de créditos, câmbios e seguro, ou relativo a títulos ou valores

mobiliários (IOF); sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre

prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação

(ICMS); e, sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN), cujas competências

encontram-se centradas nas mãos da União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

1.3.5. Da classificação jurídica dos impostos

Os termos e expressões empregados pelo Legislador acham seus

conceitos e definições no mundo jurídico como ciência que é. Assim, para se

chegar a classificação jurídica dos impostos, deverá se levar em conta o “dado

jurídico por excelência: a norma jurídica. Reforçando a asserção, a norma

jurídica é o ponto de partida indispensável de qualquer classificação que

pretenda ser jurídica”, conforme ensina Roque Antônio Carrazza.39

Geraldo Ataliba40, ensina que “a classificação jurídica dos tributos

tem como único fundamento o dado legislativo, em que se constitui a h.i.,

descrita pelo legislador.”

Assim, para efeito da classificação jurídica dos tributos, há de se

levar em conta a consistência material da “hipótese de incidência”41, segundo os

critérios positivado, visto que na própria lei tributária haverá de ser encontrado o

elemento nuclear decisivo para cada uma das espécies tributária.

Deste modo, a classificação jurídica dos impostos somente será

possível a partir da exegese detalhada das normas jurídicas tributárias vigentes

39 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. p. 472. 40 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. p. 123. 41 Cumpre observar que a expressão “hipótese de incidência” acha-se na obra de Geraldo Ataliba (Hipótese de incidência tributária) sobre a abreviatura de h.i.

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que se encontram a partir da Magna Carta, uma vez que esta, em respeito ao

pacto federativo, outorga competência para cada uma das esferas federadas,

nos termos do que já foi posto ao longo desta pesquisa.

Neste molde, para se chegar a classificação jurídica dos impostos,

primeiramente há de se classificar os diversos tributos existentes, segundo o

aspecto material da hipótese de incidência, levando em consideração a

participação ou não do Estado na materialização do fato gerador.

Diante da assertiva acima, a doutrina dominante classifica

juridicamente os diversos tributos existentes em tributos vinculados e tributos

não vinculados.

Para efeito da classificação dos tributos, em vinculados e não

vinculados, o legislador constitucional ao talhar as competências tributárias,

vinculou o legislador infraconstitucional ordinário, determinando, de modo

expresso, a inserção no cerne da hipótese de incidência, o conceito de um fato

que corresponda ou não a uma atuação estatal. Nesta linha, Geraldo Ataliba42

escreveu:

Pode-se dizer, portanto, que são tributos (1) vinculados aqueles cujas hipóteses de incidência consiste na descrição de uma atuação estatal (ou uma conseqüência desta). Neste caso, a lei põe uma atuação estatal no aspecto material da h.i. São tributos (2) não vinculados aqueles cuja h.i. consiste na descrição de um fato qualquer que não seja atuação estatal. Isto é, a lei põe, como aspecto material da h.i., um fato qualquer não consistente em atividade estatal.

À luz de tais colocações, bem como dos estreitos conceitos dados

as espécies tributárias, segundo a acepção qüinqüipartide adotada nesta

monografia, pode-se aduzir que tributos vinculados são as taxas e a contribuição

de melhoria e tributos não vinculados são os impostos. No que se refere as

contribuições especiais, estas segundo Paulo de Barros Carvalho43, por

“revestirem ora o caráter de tributo vinculado, ora o de imposto, não constituem

categoria à parte, pelo que hão de subsumir-se numa das espécies

enumeradas.”

42 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. p. 131. 43 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. p. 35-36.

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Feitas estas observações, importa relatar que classificação jurídica

dos impostos, segundo ilações de Geraldo Ataliba44, acha-se presente no

ordenamento positivo no § 1º45, do art. 145 da Magna Carta, o qual faz a

distinção entre impostos pessoais e reais, onde o citado autor acrescenta:

Esta classificação é de grande relevo, para fins hermenêuticos. (...). Impondo a Constituição que, sempre que possível os impostos tenham “caráter pessoal”, está postulando incessante empenho do legislador, no sentido de aprimorar a legislação, para ir atendendo às peculiaridades, características e singularidades dos contribuintes, de modo a considerar suas diferenças – de cunho econômico – fazendo com que a carga tributária de cada qual reflita suas condições individuais.

“Imposto pessoal”, é aquele instituído “levando em conta a

situação pessoal do contribuinte, além da matéria tributável (...). De índole

subjetiva, leva em consideração os dados pessoais do contribuinte, para atingi-

lo mais ou menos intensamente, de acordo com a capacidade contributiva,”

segundo Zelmo Denari46. Na mesma esteira, Walter Gaspar47 enfatiza que “a

legislação instituidora de tais tributos, ao graduar o ônus tributário, leva em

consideração peculiaridades inerentes a cada contribuinte, para tributá-los de

acordo com suas capacidades contributivas.”

Geraldo Ataliba48 versando sobre as qualidades jurídicas do sujeito

passivo, diz que esta é utilizada para estabelecer diferenciação de tratamento

legislativo, inclusive do aspecto material da hipótese de incidência, onde o

legislador ao talhar a norma “associa tão intimamente os aspectos pessoal e

material da h.i. que não se pode conhecer este sem considerar

concomitantemente aquele”, consistindo em “estabelecer diferenças na alíquota

ou na base imponível, em função de características pessoais do sujeito passivo,

juridicamente qualificadas.”

44 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. p. 141-142-143. 45 “§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.” 46 DENARI, Zelmo. Curso de direito tributário. p. 89. 47 GASPAR, Walter. Manual de direito tributário. p. 108. 48 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. p. 142.

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Dentro dessa colocação, são exemplos de impostos pessoais o

imposto de renda da pessoa física e o imposto sobre serviços cobrado das

sociedades de profissionais.

“Imposto real”, é aquele “instituído levando em conta a matéria

tributável, sem consideração à condição pessoal do contribuinte. De índole

objetiva, abstrai a capacidade contributiva do contribuinte”, segundo Zelmo

Denari49. Walter Gaspar50, enfatiza que “a capacidade contributiva do

contribuinte é irrelevante para a fixação da matéria tributável. Todos são

tributados da mesma maneira.”

São exemplos de impostos reais, aqueles incidentes sobre o

patrimônio, como o imposto sobre a propriedade territorial urbana (IPTU) e o

imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR).

1.4. DISTINÇÃO ENTRE FATO GERADOR E HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA

Partindo do pressuposto que ao longo deste capítulo o fato gerador foi

intensamente abordado e, em determinadas situações, se empregou a expressão

hipótese de incidência, cumpre no presente tópico demonstrar de forma didática os

limites conceituais entre ambas as expressões, por possuírem significações distintas.

As expressões “fato gerador” e “hipótese de incidência” encontram-se

previstas no ordenamento positivo no artigo 114, da Lei n. 5.172/66, que dispõe:

Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

Há de se observar que dentro do setor doutrinário há severas críticas

acerca do supracitado dispositivo, sob a alegação de que nada gera, a não ser

confusão na mente dos juristas.

Visando elidir a suscitada confusão, os juristas procuraram utilizar a

expressão hipótese de incidência ou hipótese tributária para designar a descrição

legislativa do fato abstrato e fato imponível ou hipótese de incidência realizada, ou

49 DENARI, Zelmo. Curso de direito tributário. p. 89-90. 50 GASPAR, Walter. Manual de direito tributário. p. 108.

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ainda, simplesmente, fato gerador para designar o fato concreto, efetivamente

praticado pelo sujeito passivo da norma.

Neste particular, Hugo de Brito Machado51 diz que:

A expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição, contida na lei, da situação necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador diz da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, é simples previsão, enquanto o fato é a concretização da hipótese, é o acontecimento do que fora previsto.

Sob essa ótica, os juristas procuram conceituar hipótese de incidência e

fato gerador de uma forma didática visando afastar a supramencionada confusão.

Assim, segundo Vittorio Cassone52, hipótese de incidência “é a

descrição que a lei faz de um fato tributário que, quando ocorrer, fará nascer a

obrigação tributária (...)”. Enquanto que fato gerador “é o fato que gera a obrigação

tributária”.

Assim sendo, muito embora a noção de fato gerador, à luz do art. 114 do

CTN, apresente-se como una e indivisível, este há que ser entendida em dois planos

distintos. No primeiro plano, como fato abstrato descrito pela norma como necessário

e suficiente para o nascimento da obrigação tributária, momento este de criação do

tributo. Nesse diapasão ensina Zelmo Denari53 que este “é o momento de previsão

legal do fato gerador, (...) momento em que o fato gerador é só uma definição contida

na lei”.

No que se refere ao segundo plano, este diz respeito ao momento em

que a previsão abstrata sai do campo da disposição normativa e entra na seara da

concreção como evento da vida econômica, instante em que o tributo passa a ser

exigível. Neste particular, leciona Bernardo Ribeiro de Moraes54:

Com a concretização da hipótese de incidência, constitui-se o direito adquirido, tanto para o Poder Público como para o contribuinte, de que a obrigação tributária seja criada de conformidade com todas as características existentes no dia da ocorrência do fato gerador.

Em que pese o relevante debate em torno da matéria, para o presente

estudo importa tão somente ter em mente que, para o surgimento da obrigação

tributária, é imprescindível que haja dois momentos distintos a serem observados,

51 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 114. 52 CASSONE, Vittorio. Fundamentos constitucionais da tributação. p. 148 e 150. 53 DENARI, Zelmo. Curso de direito tributário. p. 176. 54 MORAES, Bernardo Ribeiros de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 90.

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sendo o primeiro, referente à existência prévia de uma dada lei prevendo

hipoteticamente a situação necessária e suficiente para que o tributo seja devido, cuja

previsão dá-se o nome de hipótese de incidência.

No que se refere ao segundo, este diz respeito à concretização

(realização) da hipótese prevista pela norma. É o evento da vida econômica ou do

cotidiano do indivíduo, submetido à norma em que o fato abstrato descrito pela norma,

torna-se concreto (realizado), como por exemplo, comprar, vender, prestar um serviço,

etc, ao qual, chamar-se-á de fato gerador.

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Capítulo 2

DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇO DE QUALQUER NATUREZA

Partindo do pressuposto que a presente pesquisa versa sobre a incidência

do ISSQN sobre o segmento de construção e incorporação imobiliária, cumpre esclarecer

que o presente capítulo limitar-se-á apenas ao aspecto material do imposto (hipótese de

incidência), abstraindo-se as matérias relativas aos aspectos pessoal, quantitativo,

temporal e espacial que, para o presente estudo, tornariam o tema demasiadamente

longo, em que pese à suma relevância.

2.1. DA TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS NA HISTÓRIA

O imposto sobre serviço pronto e acabado como se conhece hoje, é

resultado de um processo evolutivo, longo e gradual do labor humano. Sabe-se

historicamente que nos primórdios, o homem se dedicava a caça, pesca e ao extrativismo

vegetal, como forma de subsistência.

Com o passar do tempo, o homem ao deixar de ser nômade, passa a se

fixar ao solo e reunir-se em grupos. “Começaram a surgir os primeiros prestadores de

serviços, exercendo trabalhos singelos como o trato de animais, a conservação de

utensílios e ferramentas, a edificação, etc”, conforme observa Gilberto Rodrigues

Gonçalves55.

Sem conseguir precisar em que momento histórico os governantes

lançaram mão do instituto da tributação, seja sob a forma de pecúnia e/ou do labor

honorifico dos súditos ou mesmo do trabalho escravo de inimigos vencidos em batalha,

alguns autores, como Bernardo Ribeiro de Moraes56, apontam como marco inicial da

tributação dos serviços, alguns vestígios encontrados no secular Egito, “onde já eram

tributados os tintureiros”, o qual acrescenta, citando Savérito Mandetta e Chagas Bicalho,

que tal espécie de tributo também era percebida na culta Grécia. Observa, ainda, o citado

55 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p.19. 56 MORAES. Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviço. p. 3.

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professor que Roma, como esteio da civilização ocidental, não ficou alheia à tributação

dos serviços, advertindo, porém, que há divergência quanto à época.

Gilberto Rodrigues Gonçalves57 diz que os tributos sobre serviços em

Roma, “guardavam os nomes: chrysgyrum ou lustralis collatio”, cujo respeito observa

Sérgio Pinto Martins58 que se encontravam “isentos do referido imposto os clérigos e os

que faziam trabalhos manuais, como os oleiros e os carpinteiros”.

No transcurso da idade média59 não se vislumbrava maior importância pela

tributação do trabalho humano, preferindo os governantes “onerar o comércio, a

propriedade ou a produção agro-pecuária”.

Todavia, com o romper da Revolução

Francesa, e, principalmente com a Revolução Industrial é que os “prestadores de

serviços começam a se multiplicar e esses fatos não escapam aos poderes tributantes. É

quando passa a ser cobrado um imposto sobre indústria e profissões”, conforme observa

Gilberto Rodrigues Gonçalves60. Cumpre observar que o citado imposto pode ser

considerado o ancestral de alguns impostos cobrados na Europa, em especial o imposto

sobre valor acrescido, instituído na França por volta do ano de 1.95461.

2.1.1. Da tributação dos serviços no ordenamento brasileiro

Segundo Bernardo Ribeiro de Moraes62, no Brasil colônia, os habitantes

eram gravados com onerosos e variados tributos, sem haver, todavia, um tributo

específico sobre serviços, por inexistir condições econômicas favoráveis e por se

encontrar, também ausente, uma organização fiscal, recaindo a tributação sempre sobre

parte da extração ou produção.

Com a vinda da Família Real Portuguesa, perseguida pelo exército

napoleônico, esta situação começou a mudar, em virtude da colônia brasileira, da noite

57 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p. 20. 58 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 19. 59 Segundo Fernando Augusto Ferrante Poças, “foi somente com o desenvolvimento das religiões, principalmente o Cristianismo, que o trabalho começou a ser dignificado, tendo como marco a Revolução Francesa, quando os privilégios da nobreza ociosa foram abolidos, sendo prestigiada a liberdade do exercício de qualquer profissão”. (BELLAN, Daniel Vitor et al. Imposto sobre serviços – de acordo com a lei complementar n.º 116/03. p. 15). 60 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p. 20. 61 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 19. 62 MORAES. Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviço. p. 3-4.

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para o dia ter se tornado a capital do reino, o que acarretou inúmeras responsabilidades e

despesas.

Procurando obter os recursos necessários para a manutenção da máquina

estatal, o Príncipe Regente D. João VI, baixou o alvará de 20 de outubro de 1812, criando

um tributo extraordinário incidente sobre lojas ou armazéns e sobre navios e

embarcações. Preleciona Bernardo R. de Moraes63 que o referido tributo incidia sobre

atividades como: “lojas de ourives, lapidários, correeiros, funileiros, latoeiros, caldeireiros,

cerieiros, estanqueiros de tabaco, boticários”, entre outras, sendo a primeira vez no Brasil

que se tributava de modo direto e ordinário certas profissões ou atividades lucrativas,

embora não fosse um tributo típico sobre serviços.

Fernando A. F. Poças64 diz que “um imposto típico, que incidisse sobre os

serviços de maneira mais abrangente, começa a aparecer quando o ‘imposto sobre lojas’,

criado pela Lei orçamentária n.º 7, de 22.10.1836, recebe nova denominação em 27 de

setembro de 1.860, através da Lei orçamentária n.º 1.174, transformando-se no ‘imposto

sobre indústria e profissões’ (...)”. Bernardo R. de Moraes65 diz o referido imposto adquiriu

novos contornos, passando sua hipótese de incidência a abarcar qualquer atividade

lucrativa, recaindo “sobre o efetivo exercício de qualquer atividade (...), inclusive sobre

determinados serviços”.

Proclamada a República, o “imposto sobre indústria e profissões” migrou,

passando para a titularidade dos Estados, cuja competência poderia ser delegada para

os Municípios, conforme fosse conveniente, o qual sob a ordem constitucional de 1934,

se consolidou privativamente na competência estadual e os Municípios passaram a ter

competência para instituir o “imposto sobre diversões públicas”.

Somente sob o império da Constituição de 1946, o “imposto sobre indústria

e profissões” passou para a titularidade dos Municípios.

Com a promulgação da Emenda Constitucional n. 1866, de 1965, os

impostos sobre transações, sobre indústria e profissões e sobre diversões públicas foram

63

MORAES. Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviço. p. 4. 64 BELLAN, Daniel Vitor et al. Imposto sobre serviços: de acordo com a lei complementar n.º 116/03. p. 16. 65

MORAES. Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviço. p. 5 66 Explica Bernardo Ribeiro do Moraes que “com a reforma tributária de 1965, o Brasil reestruturou o seu regime impositivo, para gasalhar um imposto sobre o valor acrescido, onerando, no objetivo final, as vendas em geral: as vendas de bens materiais, limitada em nosso direito às operações relativas à circulação de mercadorias (mercadorias ou produtos), que ficou com os Estados (ICM); e a venda de bens imateriais (serviços), de competência tributária dos Municípios (ISS)”. (in Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 54-55).

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suprimidos e no lugar destes surgiu o “Imposto sobre serviços de qualquer natureza”,

comumente batizado de ISS, de competência Municipal. Entretanto, para que a

competência municipal fosse exercitada, os contornos do ISS deveriam estar

previamente estabelecidos em lei complementar, para que sua incidência não abarcasse

campos de atuação do imposto sobre circulação de mercadorias (ICM) de competência

estadual.

A aludida lei complementar somente sobreveio em 25 de outubro de 1.966,

quando foi promulgada a Lei n. 5.172, atual Código Tributário Nacional, a qual, em seus

artigos 71, 72 e 73, trazia insculpida respectivamente a hipótese de incidência, a definição

da base de cálculo e o contribuinte do imposto. Todavia, o citado imposto não se achava

finalizado, por pender vários ajustes e adaptações.

Com a promulgação da Constituição de 1.967, a sistemática do ISS não se

alterou, permanecendo sob o condão municipal. Todavia, o inciso II do artigo 25, do

citado diploma constitucional estabelecia que os serviços a serem tributados pelos

Municípios deveriam estar definidos em lei complementar. Em 31 de dezembro de 1.968

foi promulgado o Decreto-Lei n. 406/68; estabelecendo normas gerais aplicáveis ao ICM

e ao ISS; revogando todas as disposições do código tributário nacional; passando este a

disciplinar a base de cálculo, o contribuinte, bem como o local da prestação de serviços,

e, principalmente; impondo uma lista de serviços, contemplando inicialmente 29 hipóteses

de serviços a serem tributados pelo ISSQN, sendo esta ampliada para 66, nos termos do

Decreto-lei n. 834/68, e para 100, segundo dispôs a Lei Complementar n. 56/87.

Promulgada a Constituição da República em 05 de outubro de 1988, o

imposto sobre serviço de qualquer natureza se consolidou, permanecendo

definitivamente na esfera impositiva dos Municípios.

Neste diapasão, o Decreto-Lei n. 406/68, com as alterações conferidas ao

longo do tempo, foi recepcionado com status de lei complementar, sendo revogado quase

que totalmente em 31 de julho de 2.003, data em que foi promulgada a lei complementar

n. 116, cujo diploma trouxe uma nova e extensa lista de serviços, contemplando 196

subitens, os quais na sua maioria, já se achavam previstos na lista anterior, sendo estes

agrupados em 40 categorias e subdivididos de acordo com suas respectivas naturezas.

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35

2.2. DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ISSQN

Tendo em mente a distinção entre fato gerador e hipótese de incidência,

nos termos do que foi posto no capítulo anterior, passa-se, neste capítulo, à hipótese de

incidência do Imposto Sobre Serviço.

Neste contexto, vale destacar que os tributos em geral possuem suas

raízes na Constituição; cabendo esclarecer que esta não cria tributo e sim outorga

competência; explicitando apenas os contornos a serem seguidos pelo legislador

infraconstitucional; determinando, na maioria dos tributos, em especial aos impostos, que

caberia à Lei Complementar, nos termos do artigo 146, III, “a”, da Magna Carta, definir o

respectivo fato gerador, base de cálculo e contribuinte.

Sob este prisma, dispõe o inciso III do artigo 156, da Magna Carta, que os

Municípios e o Distrito Federal podem instituir imposto sobre:

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos nos art. 155, II, definidos em lei complementar;

Desta feita, restou constitucionalizado que podem ser objeto da incidência

do citado imposto os serviços de “qualquer natureza”, cuja expressão revela um campo

de atuação bastante vasto. Guilherme Cezaroti67 fala que o substantivo “serviço”

empregado pela Magna Carta não exprime a capacidade contributiva do sujeito passivo,

“ao contrário dos demais fatos escolhidos pelo legislador constituinte, em que uma

expressão designa o comportamento de pessoas (representadas por um verbo) identifica

o fato gerador.”

Neste ponto, há que se dizer que o Legislador Constituinte, ao indicar a

mencionada hipótese de incidência, deixou de empregar a expressão “prestação de

serviço”, a exemplo do que fez com o imposto sobre operações relativas à circulação de

mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de

comunicação de competência estadual, previsto no inciso II do art. 155, da Magna Carta.

Neste particular, há de se dizer que a interpretação sistêmica do art. 155, II

e do art. 156, III, ambos da Magna Carta, traz o entendimento de que para o surgimento

da obrigação tributária, há de existir a efetiva “prestação”, a cujo respeito José Eduardo

Soares de Melo68 diz que:

67 MACHADO, Rodrigo Brunelli et al.ISS na lei complementar n. 116/2003. p. 43. 68

MELO, José Eduardo Soares de. ISS - aspectos teóricos e práticos. p. 36-37.

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O cerne da materialidade da hipótese de incidência do imposto em comento não se circunscreve a ‘serviços’, mas a uma ‘prestação de serviços’ compreendendo um negócio (jurídico) pertinente a uma obrigação de ‘fazer’ de conformidade com os postulados e diretrizes do direito privado.

Assim, sob o pálio da lei complementar, o legislador infraconstitucional,

dentro das prerrogativas conferidas pelo art. 146, do Magno Texto em observância ao

princípio da legalidade previsto no art. 5º II, da Magna Carta e no art. 97 do CTN,

suplementou o texto constitucional dispondo no art. 1º, “caput”, da LC n. 116/03, que:

Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

Destarte, restou positivado que o ISSQN possui por hipótese de incidência

a “prestação de serviços”, cujas hipóteses devem necessariamente estar previstas na

lista de serviços, não sendo, portanto, qualquer serviço que possui o condão de fazer

surgir a obrigação tributária, mas somente aqueles que o legislador de modo expresso

previu como necessário e suficiente dentro da lista de serviços, ficando estes sujeitos

única e exclusivamente ao imposto sobre serviços.

Deste modo, para o surgimento da obrigação tributária há de existir a

conjugação de dois elementos essenciais, sendo o primeiro relativo à prestação e o

segundo ao serviço, o qual deve necessariamente estar previsto em lei complementar,

sob pena de tornar inócua a exigência tributária.

2.2.1. Da classificação econômica do ISSQN

Nos termos do que foi preconizando no capítulo anterior, a partir da E.C. n.

18/65, os impostos previstos no ordenamento brasileiro passaram a levar em

consideração o conteúdo econômico das hipóteses de incidências, em negação aos

critérios nominalítico (nomem juris do imposto) previstos nas Constituições pretéritas onde

se verificou que o ISSQN restou classificado entre os impostos incidentes sobre a

produção e a circulação.

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Neste ponto, Bernardo Ribeiro de Moraes69 e Sérgio Pinto Martins70,

versando sobre o tema, dizem que o citado imposto incide sobre a circulação, porque

recai sobre a venda (circulação) de serviços (bem de natureza imaterial), observando que

o ISSQN toma por base de cálculo o “preço do serviço” presente apenas na circulação e

ausente na produção, argumentando ainda que o “prestador do serviço” é o contribuinte,

o que somente se dá na fase de circulação de riquezas, visto que a prestação de serviços

indica o fornecimento de trabalho a terceiros mediante pagamento.

À luz das colocações, Vittório Cassone71 assim se expressa:

O ISS é um imposto sobre a circulação de bens que não sejam ‘produtos’ ou ‘mercadorias’, ou melhor, que não sejam bens materiais. Seu objeto é a circulação econômica (venda) de bens imateriais (serviços). Grava-se com o ISS a transferência de bem imaterial a título oneroso. Assim, podemos conceituar Serviços como bem imaterial que esteja na etapa de circulação econômica (colocação à disposição de terceiros, mediante venda). Tal conceito abrange gama enorme de bens, desde o simples trabalho (fornecimentos de trabalho a terceiros) até meros direitos (locação de bens móveis e cessão de direitos).

Assim, restou entendido que o ISSQN recai sobre a circulação de bem

imaterial destinado ao consumo, sendo utilizado no exato momento de sua produção, de

forma que coincida no tempo e no espaço as etapas de produção, circulação e consumo.

2.3. DO CONCEITO DE SERVIÇOS E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

Tendo em vista que o legislador, ao criar uma hipótese de incidência

tributária, busca no mundo real determinados fatos com significação econômica, cuja

realização faz nascer a obrigação tributária. Por intermédio deste mecanismo mede-se a

capacidade contributiva de cada indivíduo pelas riquezas particulares e investigação de

amplitude conceitual do termo serviços, bem como da expressão prestação de serviços

empregada pelo legislador infraconstitucional, como requisitos sine qua non para o

surgimento da obrigação tributária.

69 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 79-81. 70 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 34-35. 71 CASSONE, Vittorio. Direito tributário. p. 336.

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2.3.1. Do conceito de serviços

Há de se observar que inexiste um conceito legal de serviço capaz de

designar o alcance dos efeitos tributários, havendo, outrossim, alguns conceitos jurídicos,

que no entanto, destinam-se a fins específicos, a exemplo do disposto no § 2º, do art. 3º,

da Lei n. 8.078, de 11/09/1.990, que dispõe sobre o Código de Defesa do Consumidor:

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

À luz do supracitado dispositivo, verifica-se que o conceito positivado pelo

legislador é suficiente para os fins da relação de consumo, jamais para delimitar o

conteúdo tributário aqui pretendido. No mesmo diapasão, o Código Civil (Lei n. 10.40672),

de 10 de janeiro de 2.002, em seus artigos 593 a 609, trata da prestação de serviços,

sem, no entanto, traçar qualquer conceito.

É sabido que os termos e as expressões utilizadas pela Constituição

encontram a sua definição no direito como um todo, como ciência que é. Entretanto, é na

doutrina que estes conceitos vêm a lume, tornando-se mais claros e evidentes. Neste

sentido, Vittorio Cassone73 diz que “serviço, em sentido comum, é o ato ou efeito de

servir”. Todavia, esta singela definição não é suficiente para esvaziar a dúvida.

Hugo de Brito Machado74, observando o direito português, diz que, na

Academia de Ciências de Lisboa, há trinta e quatro significados para a expressão

serviços75, e que em todos eles “geralmente se vê a idéia de ação que atende a uma

necessidade.” Neste sentido, o citado professor define serviço como “ato ou efeito de

servir, de dar de si algo em forma de trabalho”. Bernardo Ribeiro de Moraes76 o conceitua

como sendo “produto da atividade humana destinada a satisfação de uma necessidade

72

Institui o Código Civil. 73 CASSONE, Vottorio. Direito tributário. p. 336. 74 TÔRRES, Heleno Taveira, et al. Imposto sobre serviços – iss na lei complementar n. 116/03 e na constituição. p. 564 75 Sérgio Pinto Martins, citando De Plácido e Silva, diz que o termo “serviço vem do latim servitium, da condição de escravo, de servir ou trabalhar para o amo”. (in Manual do imposto sobre serviços. p. 31). Não obstante, Hugo de Brito Machado, também citando de Plácido e Silva, observa que a expressão serviço, “designa hoje o próprio trabalho a ser executado, ou que se executou, definindo a obra, o exercício do ofício, o expediente, o mister, a tarefa, a ocupação ou a função. Por essa forma, constitui serviço não somente o desempenho de atividade ou trabalho intelectual como a execução de trabalho ou obra material”. (in Imposto sobre serviços – iss na lei complementar n. 116/03 e na constituição. p. 565) 76 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 84.

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(transporte, espetáculo, consulta médica), mas, que não se apresenta sob a forma de

bem material”. Aires Fernandino Barreto77, partilhando da mesma idéia, diz que:

(...) serviço é uma espécie de trabalho. É o esforço humano que se volta para outra pessoa; é fazer desenvolvimento para outrem. O serviço é, assim, um tipo de trabalho que alguém desempenha para terceiros. Não é esforço desenvolvido em favor do seu próprio prestador, mas de terceiros. Conceitualmente parece que são rigorosamente procedentes essas observações. O conceito de serviço supõe uma relação com outra pessoa, a quem se serve.

Sem prejuízo das supracitadas definições, outros autores, analisando o

citado imposto sob a ótica da classificação econômica dos impostos, trazem em suas

ilações outras definições para o termo “serviços”. Nesta linha, Vittorio Cassone, em trecho

já transcrito no curso desta monografia, diz que o ISS é um imposto sobre circulação de

bens imateriais. Sérgio Pinto Martins78, discorrendo sobre a diferença dos bens que se

acham dentro das etapas do circuito econômico, discorre da seguinte forma:

(...) recebem o nome de: produto, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da ‘produção’, mercadoria, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da circulação, ou serviço, quando tenha a natureza de bem imaterial e esteja na etapa da ‘circulação’.

O autor acima citado esclarece, ainda, que os bens imateriais ou

incorpóreos (res incorporales), são bens:

Que não são corporificados, isto é que não tem existência física ou extensão corpórea, e, sim, são bens que não podem ser apreensíveis por nossos sentidos. Tais bens são os que não se pode ver ou tocar (quae tangi non posunt), como o direito de marca, o direito autoral, o trabalho, o direito de usar e de usufruir um bem móvel, o transporte etc.

Assim, à luz da teoria econômica, entende-se ser o serviço um bem

imaterial na etapa econômica da circulação que não possui corpo e nem forma,

insuscetível de ser palpado, transmitido ao consumidor por ato oneroso, cuja operação

não resulta em um produto material industrial ou agrícola.

Diante disto, conjugando-se o conceito oriundo do conteúdo etimológico da

palavra, arraigado no latim com a teoria da classificação econômica dos impostos para

efeito da tributação, pode-se definir a expressão “serviço79” como bem de natureza

77

BARRETO, Aires Fernandino. ISS na constituição e na lei. p. 29. 78 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviço. p. 39-40. 79

Hugo de Brito Machado, citando João Melo Franco e Herlander Antunes Martins, diz que “serviços – são situações jurídicas atinentes ao direito das obrigações que consistem em ‘acções de homens que satisfazem imediatamente necessidades de outros homens’. (...) em sentido econômico (...) são coisas que (...) não tem consistência material, que constituem bens imateriais, incorpóreos, intangíveis (...)”. (In Imposto sobre serviços – iss na lei complementar n. 116/03 e na constituição. p. 566)

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imaterial, que se encontra na etapa da circulação, oriundo do esforço humano que se

volta para outra pessoa, na execução de determinados trabalhos (físico ou intelectual),

satisfazendo as necessidades do seu contratante, tendo por parte do seu executor o fim

econômico, resultando sempre numa relação jurídica presente no direito das obrigações.

2.3.2. Do conceito de prestação de serviços

Dispõe o art. 1º “caput” da Lei Complementar n. 116/2003, que o ISSQN

tem como fato gerador “a prestação de serviços constante da lista anexa”.

Nesse sentido, há que se dizer que a expressão prestação de serviços se

revela ampla, abarcando desde a simples prestação de trabalho humano até a atividade

prestada pela pessoa jurídica, abrangendo os diversos contratos de prestação de

serviços, como o contrato puro e simples de trabalho, contrato de emprego público, de

prestação de serviços em geral. Sérgio Pinto Martins80, tratando sobre a matéria, relata:

Prestação de serviços é a operação pela qual uma pessoa, em troca do pagamento de um preço (preço do serviço), realiza em favor de outra a transmissão de um bem imaterial (serviço). Prestar serviços é vender bem imaterial, que pode consistir no fornecimento de trabalho, na locação de bens móveis ou na cessão de direitos. (...) a prestação de serviços (...) presume um vendedor (prestador do serviço), um comprador (tomador do serviço) e um preço (preço do serviço).

Na mesma esteira, Bernardo Ribeiro de Moraes81 afirma que a expressão

“prestação de serviços” tem o sentido de “fornecimento de trabalho realizado por uma

pessoa a outra, mediante remuneração, seja qual for a natureza de seu vínculo. Prestar

serviço é servir, é prestar atividade ou trabalho a outrem”.

Assim, a locução prestação de serviços remete à idéia de contrato, regido

pelas teorias do direito civil. Neste particular, o art. 594, do Código Civil de 2002, dispõe:

Art. 594. Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.

Ao possuir a expressão prestação de serviços, a conotação de contrato

regido pelo direito civil, seja ele típico ou atípico, Guilherme Cezaroti82 ensina que “a

prestação de serviço sobre a qual pode incidir o ISS é aquela in commercium, mediante a 80

MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do ISS. p. 40. 81 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p.82. 82 MARTINS, Ives Gandra da Silva (org) et al. ISS. Lei Complementar 116/03. p. 216.

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celebração de um negócio jurídico subjacente, que tenha conotação econômica”. No

mesmo sentido, o citado autor acentua que “o fato gerador do ISS é a prestação, a

terceiro, de uma utilidade (material ou imaterial) prevista em lei complementar com

conteúdo econômico, em caráter negocial.” Neste sentido, em que pese estar relacionada

à idéia contrato, não será passível de tributação o trabalho exercido mediante vínculo

trabalhista, regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e tampouco quaisquer

outros serviços que não estejam sob as asas da lei complementar (não previstos).

Assim, por possuir a expressão “prestação de serviços” a conotação de

contrato, há de se dizer que este é o instrumento jurídico por meio do qual o legislador

atribuiu relevância jurídica para o suporte fático da tributação, sem o qual a obrigação

tributária não há de existir, uma vez que deve necessariamente haver um elo jurídico de

ligação entre o prestador e o tomador do serviço, vinculando-os obrigatoriamente, que se

traduz na circulação de bem imaterial oriundo do esforço humano a terceiro com

conteúdo oneroso.

2.4. DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA

Cumpre observar que a matéria relativa à hipótese de incidência do ISSQN

dentro do Poder Judiciário não é pacífica. Neste ponto, há que se dizer que por mais de

três décadas, o Poder Judiciário, ao tratar sobre a hipótese de incidência do ISSQN, não

se posicionou sobre a possível inconstitucionalidade de alguns dos serviços insertos na

lista de serviços, bem como da natureza jurídica do citado imposto.

Neste galgar, alguns julgados dos Tribunais, em especial do Supremo

Tribunal Federal, em determinadas situações caminharam no sentido de reconhecer a

incidência do imposto sobre serviço levando em consideração o conceito de serviço

irradiado na economia83, como bem de natureza imaterial, interpretando qualquer

atividade prevista na lista de serviços como passível de fazer surgir a obrigação tributária,

respaldando a tributação sob o pálio da taxatividade da lista. Em outros momentos,

83 Em diversas oportunidades, o STF, julgou ser procedente a incidência do ISSQN, à sombra da acepção econômica, abnegando o sentido técnico jurídico de direito privado, entendendo inexistir no direito privado, conceituação específica de serviços, conforme se sobre sai dos seguintes julgados: RE n. 112.947-6-SP; RE n. 115.103-0-SP; 113.383-0-SP; RE n. 106.047; RE n. 100.799; todos disponíveis no endereço eletrônico do Supremo Tribunal Federal.

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interpretando o fato gerador do tributo em comento, somente como resultado direto do

esforço humano os tribunais afastavam a incidência do ISSQN.

Desse modo, por longo tempo, as abordagens do Poder Judiciário, em

linhas gerais, limitaram-se a observar que para a incidência do ISSQN o serviço tributado

deveria estar previsto na lista de serviços, cuja previsão ensejava a sujeição do agente

executor à incidência do imposto sobre serviço, sem se ocupar da sua natureza jurídica à

luz da Magna Carta, bem como da Lei Complementar.

O citado panorama começou a se modificar a partir do ano de 2000,

quando o Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, ao julgar o Recurso

Extraordinário n. 116.121-3-SP, declarou incidentalmente a inconstitucionalidade da

incidência do ISSQN sobre a atividade de “locação de bens móveis”, previstos no item 79

da lista de serviços, ditada pelo Decreto-Lei 406/68, com redação conferida pela Lei

Complementar n. 56/87.

Na ocasião, o STF, na voz do Ministro Octavio Gallotti, na qualidade de

Relator do Recurso Extraordinário n.º 116.121-3/SP84, traçou uma importante dicotomia

entre a “obrigação de dar” e “obrigação de fazer” ao interpretar a hipótese de incidência

do imposto sobre serviço à luz da terminologia constitucional85, como obrigação de fazer,

entendendo que seu significado há de ser buscado no direito civil, restando o citado

acórdão assim ementado:

TRIBUTO – FIGURINO CONSTITUCIONAL. A supremacia da Carta Federal é conducente a glosar-se a cobrança de tributo discrepante daqueles nela previstos. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – CONTRATO DE LOCAÇÃO. A terminologia constitucional do Imposto sobre serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os institutos , as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável – artigo 110 do Código Tributário Nacional.

84 STF. RE. n. 116.121-3/SP. Rel. Min. Octavio Gallotti, j. em 11/10/2000. 85 O STF, versando sobre o conteúdo constitucional, ao julgar a ADIn n.º 293-7/600 – DF (Medida Liminar), na fala do Ministro Celso de Melo, diz que “(...). Uma Constituição escrita não configura mera peça jurídica, nem é simples estrutura de normatividade e nem pode caracterizar um irrelevante acidente histórico na vida dos povos e das nações. Todos os atos estatais que repugnem à Constituição expõem-se à censura jurídica – dos tribunais, especialmente – porque são írritos, nulos e desvestidos de qualquer validade. A Constituição não pode submeter-se à vontade dos poderes constituídos e nem ao império dos fatos e das circunstâncias . A Supremacia de que ela se reveste – enquanto for respeitada – constituirá a garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades não serão jamais ofendidos. (...).” (STF. ADIn. n. 293-7/600/DF. Rel. Min. Celso de Melo, j. em 16/04/1993).

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Neste diapasão, a Suprema Corte, por unanimidade, interpretando a regra

matriz do ISSQN à luz da Magna Carta, bem como, do art. 11086 do CTN conheceu do

recurso e, por maioria de votos, julgou ser inconstitucional a incidência do ISSQN sobre a

locação de bens móveis, propalando que a natureza jurídica do imposto sobre serviço

deve ser entendida como “obrigação de fazer”, cujo entendimento deve ser buscado no

Direito Civil, afastando definitivamente a possibilidade de o imposto sobre serviços incidir

sobre quaisquer outras operações que não resultante da obrigação de fazer.

Em que pese a sentença proferida pela via incidental surtir efeitos somente

entre as partes envolvidas, a supracitada decisão começa a irradiar seus efeitos pelo

ordenamento. A primeira manifestação de ordem legal adveio com o veto aposto pelo

Presidente da República ao sancionar a Lei Complementar n. 116/2003, ao subitem 3.01

da lista de serviços, conforme se denota da mensagem de veto n. 36287, de 31 de julho

de 2003, encaminhada ao Presidente do Senado Federal.

Por sua vez, os Tribunais Estaduais já começam a julgar na linha apontada

pela Suprema Corte, interpretando a hipótese de incidência do ISSQN segundo a

natureza jurídica de obrigação de fazer, conforme vem julgando o Tribunal de Justiça do

Rio de Janeiro88:

ISSQN. Município do Rio de Janeiro. Locação de embarcações (dragas). Não incidência do tributo. Constituindo a locação de embarcações uma obrigação de dar e não de fazer, sobre ela não incide imposto sobre serviços de qualquer natureza (...).

No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça catarinense também já acolhe a

natureza jurídica do imposto sobre serviço como oriunda da obrigação de fazer, o qual, na

voz do Desembargador Luiz Cézar Medeiros, ao tratar da incidência do ISSQN sobre as

operações de leasing (arrendamento mercantil), já firma posicionamento no sentido de se

observar o significado técnico-jurídico previsto na Magna Carta, cuja decisão se encontra

assim ementada89:

TRIBUTÁRIO – ISS – OPERAÇÃO DE LEASING SOBRE BENS MÓVEIS – POSIÇÃO DO STF – NÃO INCIDÊNCIA – EXEGESE DO ART. 156, INC. III DA CF E ART. 110 DO CTN. Ao tratar do Imposto Sobre Serviços de Qualquer natureza, a Constituição Federal pressupôs a “prestação de serviços”, segundo a

86 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. 87 Disponível em www.planalto.gov.br. 88 TJRJ. Apelação Cível n.º 2003.001.23010. Rel. Des. Maria Henqueta Lobo, j. 18/08/2004. 89 TJSC. Apelação Cível n. 2003.002518-9 – Criciúma. Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 23/06/2003.

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conceituação definida no direito privado (CF, art. 156, inc. III, CTN, art. 110). A qualificação de operações não condizentes com o significado técnico-jurídico da expressão “prestação de serviços”, para efeito de tributação municipal do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, pois o tributo em comento somente pode incidir sobre obrigação de fazer (RE n. 116.121-3/SP, Min. Celso de Melo). O leasing financeiro não alberga “prestação de serviços”. Não será por disposição legal que a sua natureza poderá ser alterada. A lei não tem o condão de modificar a essência das coisas ou dos fatos. Definir como prestação de serviço aquilo que essencialmente não o é, se traduz numa forma escamoteada de burlar a limitação constitucional de incidência tributária.

Desta feita, não há dúvidas de que para o Poder Judiciário, a partir destes

julgados, acredita que o imposto sobre serviços de qualquer natureza possui a natureza

jurídica de obrigação de fazer, cujo conteúdo há de ser buscado no direito civil, devendo a

lista de serviços ser interpretada segundo estes ditames, observando-se, porém, que os

subitens previstos na citada lista que não guardem relação com o conteúdo obrigacional

de fazer, serão relegados à hipótese de não incidência.

2.4.1. Do conteúdo da obrigação de fazer

Tendo em vista que o STF, ao interpretar a regra matriz do imposto sobre

serviços, propalou que a natureza jurídica do ISSQN corresponde à obrigação de fazer,

emprestados do direito privado, propriamente no direito das obrigações, há que se buscar

entender, embora em linhas gerais, no que se traduz a sua essência, para efeitos

tributários.

Maria Helena Diniz,90, diz que “a obrigação de fazer é a que se vincula o

devedor à prestação de um serviço como ato positivo, material ou imaterial, seu ou de

terceiro, em benefício do credor ou de terceira pessoa”. No mesmo padrão, Silvio

Rodrigues91 afirma que “na obrigação de fazer o devedor se vincula a determinado

comportamento consistente em praticar um ato, ou realizar uma tarefa, donde decorre

uma vantagem para o credor”.

90 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil. 2º volume: teoria geral das obrigações. p. 102. 91 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Parte geral das obrigações. p. 31.

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Desse modo, para efeito da incidência do imposto sobre serviço, obrigação

de fazer é o vínculo estabelecido entre credor (tomador do serviço) e o devedor

(prestador do serviço), na qual o devedor se compromete a realizar uma dada tarefa92

mediante contraprestação, preço ou tarifa (preço do serviço), de acordo com as

exigências colocadas pelo credor, não podendo dela se afastar.

Não obstante, cabe observar que a obrigação de fazer tributada pelo

ISSQN tanto pode ser aquela de natureza infungível93 (intuitu persanae), que somente

pode ser executada pela pessoa obrigada, bem como pode ser a de natureza fungível94,

ou seja, aquela que pode ser executada por terceira diferente do devedor. Tal assertiva

se justifica pelo fato do imposto sobre serviço incidir, inclusive, sobre as atividades

executadas por intermédio da pessoa jurídica (empresa), caso em que o serviço a ser

prestado se realiza por intermédio de funcionários ou mesmo por executores

subcontratados.

Observa-se que, para efeito de incidência do ISSQN, o produto da

obrigação de fazer será sempre resultado de um ato positivo oneroso, ou seja, de fazer

algo, de confeccionar, de construir e/ou qualquer ato que exprima uma ação no sentido

de produzir um bem (de natureza material ou imaterial) e jamais será o resultado de um

ato negativo, no sentido de abstenção, proibição e/ou não fazer, haja vista inexistir

conteúdo econômico no ato negativo e muito menos expressar capacidade contributiva

do seu agente. 92 Sílvio de Salvo Venosa, “o conteúdo da obrigação de fazer (...), tanto pode ser a prestação de uma atividade física ou material (como, por exemplo, fazer um reparo em máquina, pintar casa, levantar muro), como uma atividade intelectual, artística ou científica (como, por exemplo, escrever obra literária, partitura musical, ou realizar experiência)”. (in Direito civil. teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. p. 99). 93 Segundo Maria Helena Diniz, citada por José Eduardo Soares de Melo, “a obrigação de natureza infungível, por consistir num facere que só pode, ante a natureza da prestação ou por disposição contratual, ser executada pelo próprio devedor, sendo, portanto, intuitu personae uma vez que se levam em conta as qualidades pessoais do obrigado.” (in ISS- aspectos teóricos e práticos, p. 37). Não obstante, Washington de Barros Monteiro, falando sobre as obrigações de fazer intuitu personae, diz que “ao serem contraídas, se leva geralmente em conta a pessoa do devedor, confiando assim o credor na sua reputação, capacidade, habilitação profissional, títulos, experiências, tirocínio e idoneidade. Ainda que se não reclamem aptidões particulares, ainda que a prestação possa ser desempenhada ou satisfeita por qualquer pessoa, se atendem , muitas vezes, à probidade, retidão, pontualidade, confiança e outras condições pessoais do devedor”. (in Curso de direito civil. Direito das obrigações. p. 92). 94 Maria Helena Diniz, mencionada por José Eduardo Soares de Melo, diz que “obrigação de fazer fungível, que é aquela em que a prestação pode ser realizada indiferentemente tanto pelo devedor, como por terceiro, caso em que o credor será livre de mandar executar o ato à custa do devedor.” (in ISS- aspectos teóricos e práticos, p. 37). No mesmo sentido, Washington de Barros Monteiro, tratando da matéria, diz que “o obrigado, sem qualquer inconveniente, pode ser substituído por estranho. Nesses casos, terceira pessoa assume o encargo de realizar a prestação prometida pelo devedor originário, por conta de quem correm as despesas. Para o credor, nenhuma diferença faz que a prestação venha a ser satisfeita por pessoa diversa do devedor primitivo; o que em verdade lhe importa é a utilidade prometida”. (in Curso de direito civil. Direito das obrigações. p. 97).

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Sem prejuízo do exposto acima, vale ainda destacar, para que haja a

incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza que, o resultado da obrigação

de fazer contratada há que se traduzir na entrega futura (obrigação de dar) de um bem

(material ou imaterial). Caso contrário, estar-se-á fora do campo impositivo do citado

imposto, podendo, no entanto, ser fato gerador de quaisquer outros tributos, como no

caso do imposto sobre a transmissão de bens inter vivos (ITBI), previsto no art. 156, II, da

Magna Carta e/ou do imposto sobre a circulação de mercadorias e prestação de serviços

(ICMS), previsto no art. 155, II, da Magna Carta. Nesta linha, Washington de Barros

Monteiro95 tratando da diferenciação de obrigação de dar e fazer, descreve que:

O substractum da diferenciação está em verificar se o dar ou o entregar é ou não conseqüência do fazer. Assim, se o devedor tem de dar ou entregar alguma coisa, não tendo, porém, de fazê-la previamente, a obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente, tem ele de confeccionar a coisa para depois entregá-la, se tem ele de realizar algum ato, do qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer.

Por conseguinte, resta-se afirmar que não é a obrigação de fazer que se

tributa, mas outrossim, o esforço humano (serviços) prestado a terceiro como fim ou

objeto, correspondendo à prestação de um serviço que se materializa sob a roupagem da

obrigação de fazer, fungível ou infungível, com conteúdo oneroso; assim entendido o

negócio jurídico objetivado pelas partes (prestador e tomador), servindo este, como

suporte jurídico da tributação.

2.5. DA LISTA DE SERVIÇOS

Estabelece o art. 156, III, da Magna Carta, que compete aos Municípios

tributar “serviços de qualquer natureza”, desde que previstos em lei complementar,

excetuando-se os serviços insertos na esfera impositiva dos Estados (art. 155, II, CF).

Partindo desta assertiva, verifica-se dentro do campo doutrinário96 a

existência de severas críticas acerca da eleição de serviços a serem tributados pelos

95 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. Direito das obrigações. p. 89. 96 José Eduardo Soares de Melo, diz que “a discriminação de rendas tributárias às pessoas jurídicas de direito público constitui superior princípio constitucional para que possam exercer seus poderes-deveres” e sem perder de vista o tema, assevera dizendo que “os interesses do Congresso nacional não podem jamais sobrepor-se à autonomia municipal, que restará impossibilitada para auferir os valores necessários (ISS) ao atendimento de suas necessidades”. (in ISS – aspectos teóricos e práticos. p. 53 – 54).

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Municípios, mediante a edição de lei complementar, por entender alguns autores que o

citado instrumento de hierarquia inferior à Constituição não poderia tolher a autonomia

municipal. Roque Antonio Carrazza97 entende que, ao se levar em consideração somente

as palavras talhadas no texto constitucional, o Município somente poderá tributar os

serviços previstos em lei complementar, mediante uma lista, acrescentando que:

(...) a grande maioria dos doutrinadores sustenta que diante da “clareza” da parte final do art. 156, III, da Constituição, aos Municípios é facultado tributar, apenas os serviços de qualquer natureza adnumerados em lei complementar. De fato, a interpretação gramatical só pode conduzir a este entendimento.

Diz ainda, o citado autor que:

(...) como querem os grandes mestres da Hermenêutica Jurídica, a interpretação gramatical não é uma verdadeira interpretação, mas um pressuposto de interpretação (Paulo de Barros Carvalho). Só se consegue desvendar o significado, o conteúdo de uma norma jurídica com a interpretação sistêmica, ou seja, levando em conta, no labor exegético, o ordenamento jurídico como um todo.

Em sentido contrário, Hugo de Brito Machado98 afirma conhecer e respeitar

as manifestações doutrinárias que propalam ofensa da autonomia municipal por

interstício da lei complementar. Todavia, diz não pensar desta maneira, asseverando que:

(...) é induvidoso que a Constituição Federal atribuiu aos Municípios competência para tributar somente serviços de qualquer natureza que a lei complementar defina. Não se trata, portanto, de uma limitação imposta pela lei complementar. Na verdade a competência que a Constituição Federal atribui aos Municípios tem, desde logo, o seu desenho a depender de lei complementar.

Partilhando da mesma idéia de Hugo de Brito, José Souto Borges Maior99 é

enfático ao afirmar que a lei complementar não cria limites, os quais já se encontram

talhados no bojo constitucional.

Neste diapasão, verifica-se tratar de uma celeuma onde se têm argumentos

para todas as teses suscitadas, na qual a corrente que defende a agressão à autonomia

municipal partilha da idéia de que a lista de serviços possui caráter meramente

exemplificativo ou sugestivo, podendo os Municípios tributarem quaisquer serviços, desde

que não compreendidos na esfera impositiva da União ou dos Estados Membros.

97 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. p. 885. 98 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. p. 346. 99 TÔRRES, Heleno Taveira et al . Imposto sobre serviços – ISS na lei complementar 116/03 e na constituição. p. 21.

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Roque Antônio Carrazza100 argumenta descrevendo que “a aptidão que o

Município recebeu da Carta Suprema, de modo tão amplo, para instituir o ISS, não pode

ser atrofiada por nenhum ato normativo de inferior hierarquia, (...), sob pena de insanável

inconstitucionalidade”.

Por outro lado, os autores que entendem que a lista de serviços não agride

a autonomia municipal propalam que a própria Constituição cria os limites e não a lei

complementar, estando esta, portanto, em harmonia com o Texto Constitucional, dizendo

que a lista de serviços é taxativa e exaustiva, não podendo o ente competente criar

hipóteses não relacionadas na norma complementar.

Em que pese os doutrinadores divergirem quanto ao aspecto taxativo ou

exemplificativo da lista de serviços, há que se dizer que todos são uníssonos em aceitar a

exigência da lei complementar, à luz do art. 146, III, “a”, da Magna Carta, como

instrumento tendente a elidir conflitos de competência, indicando os serviços a serem

tributados pelo Município, uma vez que o ISSQN possui “materialidades assemelhadas,

afetas à União, Estados e Distrito Federal”, conforme observa José Eduardo Soares de

Melo101, a cujo respeito José Souto Borges Maior102 enfatiza:

A mencionada lei só tem sentido e congruência com a sistemática constitucional se havida como processo técnico de obviar conflitos de competência tributária, porque a cláusula da 1ª. parte do dispositivo - serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência dos estados – já de si reúne todos os requisitos para a contenção da competência impositiva dos Municípios dentro do seu confinamento constitucional. Até mesmo a listagem de serviços tributários pelo Município tem função de prevenir conflitos com a competência das outras pessoas constitucionais, já que é impossível evitá-los.

Assim, a unanimidade entre os citados autores reside somente em

conceberem a validade da listagem de serviços com a finalidade de atuar como

instrumento limitador de conflitos naquelas zonas cinzentas, compreendidas entre o

imposto sobre serviços e o imposto sobre produtos industrializados (IPI) e ou imposto

sobre a circulação de mercadorias e de prestação de serviços (ICMS), cuja incidência

não se consegue definir com precisão o campo de atuação dos respectivos impostos,

persistindo a celeuma nos demais casos, aludindo alguns que a lista de serviços não têm

razão de existir, pois se assim o for, conforme observa Roque Antônio Carrazza103, teria

100 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. p. 887. 101 MELO, José Eduardo Soares de. ISS – aspectos teóricos e práticos. p. 55. 102 TÔRRES, Heleno Taveira et al . Imposto sobre serviços – ISS na lei complementar 116/03 e na constituição. p. 23. 103 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. p. 886.

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que se sustentar, “contra todas as evidências jurídicas, que a União pode até mesmo

esvaziar a competência que os Municípios receberam da Carta Constitucional para

tributarem, por via de imposto, os serviços de qualquer natureza.”

Diante do relevante debate, o Poder Judiciário, sem adentrar à

controvertida matéria da limitação à autonomia municipal, em diversas oportunidades já

se posicionou no sentido de que os Municípios somente poderão tributar os serviços

previamente definidos em lei complementar, ressaltando o caráter taxativo104 da lista de

serviços, como se sobressai dos Julgados da Suprema Corte.

Seguindo o posicionamento do Guardião Constitucional, o Superior

Tribunal de Justiça, sem maiores delongas, abraçou o caráter taxativo da lista de

serviços, conforme se verifica da decisão proferida no Recurso Especial n 35.164/RJ105,

cujo acórdão restou assim ementado:

TRIBUTÁRIO – ISS: DL N. 406/68 – SERVIÇO DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA. 1 – A jurisprudência do STF e desta Corte, desenvolveu-se no sentido de entender ser taxativa a lista de serviços do DL n. 406/68. 2 – Inadmissibilidade de interpretação extensiva ou analógica. 3 – Recurso especial não conhecido.

Destarte, a jurisprudência dos tribunais superiores106 sedimentou-se no

sentido de ser a lista de serviços, editada pela Lei Complementar, taxativa, ou seja, os

Municípios ao criarem as hipóteses de incidência do ISSQN, por interstício de lei ordinária

104 O Supremo Tribunal Federal, nos idos das décadas de 70 e 80, em diversos julgados decidiu ser a lista de serviços taxativa, dizendo que os Municípios não poderiam tributar serviços não previsto na lei complementar, conforme se sobressai da decisão prolatada em 11/10/1977, pela primeira turma, que ao julgar o Recurso Extraordinário n. 87.628/RJ, em que foi relator o Ministro Cunha Peixoto, o qual ao versar sobre a incidência do ISSQN sobre serviço de aplicação de injeção, propalou que a lista de serviços editada pelo Decreto-Lei n. 406/68, possuía caráter taxativo, sendo impossível se tributar atividade não prevista, dizendo, para que o tributo fosse devido, deveria a atividade estar expressamente prevista na lista de serviços. No mesmo sentido, já havia sido o posicionamento da Segunda Turma, que ao proferir decisão ao RE n. 75.952, em 29/10/1973, em que foi relator o Ministro Carlos Thompson Flores, também ressaltou o caráter taxativo da lista. Nos demais julgados que se sucederam, o Supremo Tribunal Federal, não mais se afastou de tal posicionamento, fechando a questão da taxatividade da lista, conforme se verifica das ementas dos acórdãos: RE n. 87.931/SP. Primeira Turma. Rel Min. Cunha Peixoto, j. 11/10/1977; RE n. 91737/MG. Segunda Turma. Rel. Min. Décio Miranda, j. 14/11/1980; RE n. 96.963-2/PR. Primeira Turma. Rel. Min. Alfredo Buzaid, j. 19/04/1983, entre outros. 105 STJ. REsp. n. 35164/RJ. Rel. Min. Eliana Calmon, j. 16/12/1999. 106 O Ministro José Delgado, na qualidade de relator, em seu voto no agravo regimental no agravo de instrumento n. 639.029 – MG, julgado em 08/03/2005, relacionou os seguintes julgados do STJ, versando sobre o caráter taxativo da lista: “REsp nº 436109/SC, 1ª Turma, DJ de 18/11/2002, Rel. Min. GARCIA VIEIRA; REsp nº 68876/MG, 2ª Turma, DJ de 01/08/2000, Rel. Min. PAULO GALLOTTI; REsp nº 41848/MG, 2ª Turma, DJ de 09/06/1997, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS; RE n° 104571/PE, Rel. Min. OSCAR CORRÊA, RTJ 113/1387; RE nº 105844/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO, DJ de 17/09/1993; RE nº 96963/PR, Rel. Min. ALFREDO BUZAID, DJ de 13/05/1983.”

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editada pela Câmara Municipal, deverão somente considerar aquelas hipóteses descritas

previamente na lei complementar.

Assim, à luz das disposições jurisprudenciais, os Municípios, ao criarem as

hipóteses de incidência, deverão respeitar expressamente o caráter taxativo da lista de

serviços ditada pela Lei Complementar, sob pena de flagrante inconstitucionalidade.

2.5.1. Da interpretação da lista de serviços

Muito embora tenha a jurisprudência se consolidado no sentido de acolher

a taxatividade da lista de serviços, dispôs que, mesmo sendo esta taxativa, os Municípios

poderiam se socorrerem da interpretação extensiva, dentro de cada um dos itens, para

abraçar serviços semelhantes, entendendo não haver ofensa ao art. 108, §1º, do CTN,

conforme se verifica da seguinte ementa107:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. LISTA DE SERVIÇOS. TAXATIVIDADE. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. POSSIBILIDADE. 1. Embora taxativa, em sua enumeração, a lista de serviços admite interpretação extensiva, dentro de cada item, para permitir a incidência do ISS sobre serviços correlatos àqueles previstos expressamente. Precedentes do STF e desta Corte. 2. Esse entendimento não ofende a regra do art. 108, § 1º, do CTN, que veda o emprego da analogia para a cobrança de tributo não previsto em lei. Na hipótese, não se cuida de analogia, mas de recurso à interpretação extensiva, de resto autorizada pela própria norma de tributação, já que muitos dos itens da lista de serviços apresentam expressões do tipo "congêneres", "semelhantes", "qualquer natureza", "qualquer espécie", dentre outras tantas. 3. Não se pode confundir analogia com interpretação analógica ou extensiva. A analogia é técnica de integração, vale dizer, recurso de que se vale o operador do direito diante de uma lacuna no ordenamento jurídico. Já a interpretação, seja ela extensiva ou analógica, objetiva desvendar o sentido e o alcance da norma, para então definir-lhe, com certeza, a sua extensão. A norma existe, sendo o método interpretativo necessário, apenas, para precisar-lhe os contornos. 4. Recurso especial improvido.

Segundo a assertiva exarada na ementa, pode-se, por intermédio da

interpretação analógica, tributar atividades cujas nomenclaturas não se acham contidas

107 STJ. REsp. n. 121.428/RJ. Segunda Turma. Rel. Min. Castro Meira, j. 01/06/2004.

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expressamente na lista. Neste ponto, a Segunda Turma do STJ, ao julgar o REsp n.

567.592/PR108, assim já se posicionou:

TRIBUTÁRIO – ISS – LISTA DE SERVIÇO. 1. A jurisprudência sedimentada é no sentido de entender como taxativa a enumeração da lista de serviços que acompanha a LC 56/87. 2. Embora taxativa, admite a lista interpretação extensiva para abrigar serviços idênticos aos expressamente previstos, mas com diferente nomenclatura. 3. Tarifas em cobrança, que se incluem na expressão “serviços prestados pela atividade bancária” (item 95 da lista). 4. Recurso especial improvido.

Desse modo, a utilização de tal recurso se sobressai pela impossibilidade

de o legislador complementar fixar todas as espécies e derivações de um mesmo serviço

dentro da lista de serviços, preferindo incorporar ao final de determinados itens a

expressão “congênere”, cláusula esta que permite ao aplicador da norma lançar mão do

recurso da interpretação extensiva, para assim alcançar atividades passíveis de

tributação, cuja percepção escapou do legislador, observando que o § 4º do art. 1º, da Lei

Complementar n. 116/2003, dispõe que :

§ 4º A incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado.

Assim, não se faz necessário que o nome do serviço prestado esteja

especificamente contido na lista, bastando, outrossim, que sua essência esteja. Neste

ponto, Sérgio Pinto Martins109 diz que:

(...) quando são usados os seguintes termos: ‘dedetização, desinsetização, imunização, higienização desratização, pulverição e congêneres’. Neste item, estão incluídas atividades de descupinização, que são espécies do gênero imunização ou são congêneres aos itens mencionados.

Desta feita, há de se dizer que inexiste o emprego da analogia, criando

hipótese de incidência não prevista na lei complementar, mas, outrossim, o emprego da

interpretação analógica ou extensiva à luz da expressão congênere positivada pelo

legislador infraconstitucional, face à impossibilidade de se talhar no bojo da lei todas as

nomenclaturas de serviços executados.

Em que pese o relevante debate acerca da temática, no que tange ao

caráter taxativo ou exemplificativo da lista de serviços, bem como da possibilidade de

108 STJ. REsp. n. 567.592/PR. Segunda Turma. Rel. Min. Eliana Calmon, j. em 04/11/2003. 109 Martins, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 320.

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interpretação analógica sedimentada nos tribunais, há de se registrar que a matéria, no

mundo jurídico, continua em discussão, não sendo pacífica.

Assim, para o presente estudo, há de se ter em mente que apenas poderão

ser objeto de sujeição ao ISSQN aqueles serviços especificamente previstos na

legislação ordinária municipal e desde que guardem relação com o conteúdo obrigacional

de fazer e seja produto do esforço humano que se volta em favor de terceira pessoa, e

ainda, que corresponda aos previstos Lei Complementar, sob pena da

inconstitucionalidade da obrigação tributária.

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Capítulo 3

DO SEGMENTO DE CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

Para verificar se a atividade de construção e incorporação imobiliária

enquadra-se, ou não, na hipótese de incidência tributária do imposto sobre serviço de

qualquer natureza (ISSQN), previsto no art. 156, III, da Magna Carta de 1.988, bem como

entre as atividades eleitas pela lista de serviços da Lei Complementar n. 116/2003, torna-

se necessário buscar compreender a forma como a atividade surgiu e se sedimentou,

bem como sua natureza jurídica, sob a ótica doutrinária e do direito positivo.

Assim, para se entender o conjunto normativo em que se sedimenta a

atividade de incorporação imobiliária, mister se faz uma pequena digressão histórica,

buscando compreender a forma como nasceu e se desenvolveu a atividade de

incorporação imobiliária, bem como do incorporador.

3.1 – DA CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÃO, EM SUA GÊNESE

Com a explosão demográfica, nos grandes centros urbanos, surgiu a

necessidade de se suprir o déficit habitacional, criando um terreno fértil para o setor da

construção civil. Como proposta tendente a pôr fim ao supracitado impasse, despontou a

construção de edifícios verticais, cujo objetivo era a venda de apartamento, contribuindo

para a proliferação de edificações nas grandes cidades.

Nesse terreno fértil, surgiu a atividade de incorporação imobiliária,

desenvolvida por indivíduos comumente batizados de incorporadores, os quais exerciam

uma atividade peculiar, entrelaçada a empreendimentos imobiliários, vivendo na

clandestinidade, sem que os juristas e os pretórios deles se ocupassem, em virtude da

inexistência normativa que delimitassem seus direitos e obrigações, até que sua

presença despertou a atenção do legislador, face as imposições das necessidades

sociais, segundo explica Caio Mário da Silva Pereira110.

110 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. p. 231.

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Assim, a atividade de construção e incorporação imobiliária, pronta e

acabada, como se tem hoje é produto de um longo e gradual desenvolvimento da

atividade, que surgiu em um período em que inexistia conteúdo normativo regulando o

segmento.

Neste particular, para uma melhor compreensão da atividade, mister se faz

buscar a gênese da atividade de incorporação. Caio Mário111, fazendo alusão à crise

financeira que acometia o segmento imobiliário, em que o empreendedor dispunha da

idéia de executar um empreendimento, sem, no entanto, dispor de recursos financeiros e,

muitas vezes, nem tampouco do próprio terreno, sobre o qual necessariamente se

ergueria a obra; diz que este “procura o proprietário de um terreno bem situado e incute-

lhe a idéia de realizar ali a edificação de um prédio coletivo”, obtendo deste uma proposta

em que “estipulam as condições em que este aliena seu imóvel”.

Ajustado o primeiro passo, segundo as explicações de Cáio Mário112, o

incorporador procura um arquiteto que:

(...) lhe dá o projeto. O construtor lhe fornece o orçamento. De posse dos dados que lhe permitem calcular o aspecto econômico do negócio (participação do proprietário, custo da obra, benefício do construtor e lucro), oferece à venda as unidades. Aos candidatos à aquisição não dá um documento seu, definitivo ou provisório, mas deles recebe uma “proposta” de compra, em que vêm especificadas as condições de pagamento e outras minúcias. Somente quando já conta com um número de subscritores suficientes para suportar os encargos da obra é que o incorporador a inicia. Se dá sua execução por empreitada, contrata com o empreiteiro; se por administração, ajusta com o responsável técnico e contrata o calculista, contrata os operários, contrata o fornecimento de matérias etc. Vendidas todas as unidades, promove a regularização da transferência de domínio, reunindo em uma escritura única o vendedor e compradores que ele nunca viu, aos quais são transmitidas as respectivas quotas ideais do terreno. Normalmente, os contratos com o construtor, fornecedores, empreiteiros de serviços e empregados são feitos em nome dos adquirentes, que o incorporador é encarregado de representar. Quando o edifício está concluído, obtém o “habite-se” das autoridades municipais, acerta suas contas com cada adquirente e lhe entrega as chaves de sua unidade. Normalmente, é o incorporador que promove a lavra da escritura de convenção do condomínio.

O esquema apresentado acima, nem sempre se desenvolvia na mesma

seqüência. Às vezes, o incorporador poderia ser o próprio construtor e, em outras, o

111 Pereira. Caio Mário da Silva .Condomínio e incorporações. p. 231-232. 112 Pereira. Caio Mário da Silva .Condomínio e incorporações. p. 231-232.

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proprietário do terreno, podendo ainda, ajustar com o dono do terreno, a edificação

mediante a permuta de parte do prédio, conforme adverte Caio Mário113.

Caio Mário, como visto, descreve passo a passo a forma como

originariamente a atividade de incorporação imobiliária surgiu para o mundo negocial.

Nesse ponto, pode-se afirmar que a referida atividade surgiu como negócio tendente a

contornar as dificuldades financeiras que assolavam o segmento em que empreendedores,

devido à falta de capital para executar seu empreendimento, criaram uma nova modalidade

de aquisição de imóveis, mesclando a venda do terreno com a construção do bem,

atividade esta, inovadora à época, a qual, face ao seu dinamismo, superou o tempo e se

consolidou, tornando-se um dos negócios mas difundidos dentro do setor imobiliário.

3.1.1. Das múltiplas atividades desenvolvidas

Tendo em vista o esquema apresentado por Caio Mário, verifica-se que

originariamente a atividade exercida pelo incorporador114 se traduzia na junção de múltiplas

atividades, convivendo em um mesmo corpo várias figuras típicas, como a de corretor,

mandatário, gestor e construtor.

Rodrigo Azevedo Toscano de Brito115, parafraseando Caio Mário, diz que:

(...) o incorporador era visto como um corretor, pois, de uma forma ou de outra, aproxima as pessoas interessadas na realização do empreendimento. Também era visto como um mandatário, pois tinha poderes outorgados por terceiros para realizar contratações alusivas às futuras unidades condominiais autônomas.Também se dizia que o incorporador era um gestor de negócios, uma vez que encaminhava a construção por empreitada. Poderia também ser visto como um industrial da construção civil. Igualmente, (...) o incorporador também poderia ser um banqueiro financiador, (...). Enfim, poderia ser visto, (...) como um comerciante, tendo em vista sua atividade de venda com intuito de lucro.

Observando a magnitude que a atividade alcançou dentro da economia,

principalmente na sociedade como um todo, somada à inexistência de sólidos

113 Pereira. Caio Mário da Silva .Condomínio e incorporações, p. 233. 114 Hely Lopes Meirelles, diz que “a figura do incorporador apresenta-se multiforme, ora mediando o negócio, ora financiando o empreendimento, ora construindo o edifício, ora adquirindo apartamentos para revenda futura – mas, em todas essa modalidades, a sua constante é ser o elemento propulsor (...).” (in Direito de construir, p. 210/211). 115 BRITO, Rodrigo Azevedo Toscano de. Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor. p. 179.

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pronunciamentos do judiciário, tornando difícil a exata caracterização da atuação do

incorporador, ficando o negócio de incorporação imobiliária sem uma tipicidade específica

dentro dos contratos nominados, Caio Mário116 adverte:

Quem se vale da idéia de corretagem fica aquém da sua atividade. Quem se utiliza do mandato não enfeixa a sua produção. Ele não chega a ser um industrial na acepção do termo. A comissão mercantil é insuficiente, porque se de um lado há uma proximidade quando a incorporação envolve atos por conta de terceiros e não em nome próprio, por outro lado abraça uma atuação de nítida representação. Falham, pois, todos os esforços de enquadramento da incorporação e do incorporador nas linhas contratuais clássicas.

Partindo dessa premissa, e tendo em vista o universo de atividades

desenvolvidas simultaneamente, Caio Mário, lançando mão das teorias do direito de

empresa e, levando em consideração que a atividade de incorporação imobiliária

caracterizava-se pelo exercício de uma atividade econômica, somada à profissionalidade

e à organização dos fatores de produção; procurou caracterizar o incorporador como

empresário, comparando, a até então inominada atividade, com uma sociedade anônima,

justificando que a analogia empregada residia no fato de o fundador ou incorporador da

sociedade anônima, assim como o incorporador imobiliário, no desenvolvimento de suas

atividades, serem o pai da idéia e de sua criação, explicando117:

(...) não existe sociedade anônima, não existe edifício; alguém tem a idéia da constituição de uma ou da construção de outra; promove os contatos, aproxima os interessados; obtém capital; elabora planos; faz contratos; consegue a redação de documentos, e tira de seus esforços, de suas boas relações, de sua capacidade de empreendimento, de sua imaginação, de sua experiência a sociedade por ações ou o edifício em condomínio. Em um e outro caso, o incorporador tudo faz visando a um benefício, ou tem o fito de lucro, que até na forma de realização os aproxima, pois que na sociedade anônima é representado por ações (...) e, no condomínio, por unidade do próprio edifício, ou percentagem no custo das mesmas.

No mesmo sentido, segue propalando que na incorporação havia uma

seqüência de atos (mandato, compra e venda, corretagem, entre outros), que tudo tendia

ao lucro, o que corroborava a caracterização como empresário. Todavia, a problemática

continuava sem solução, pois ainda persistia a inexistência de normas que regulassem as

responsabilidades e os deveres sob as quais estaria submetido o agente incorporador,

cuja caracterização como corretor, por aproximar os interesses, agenciando negócios, era

116 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações, p. 234-235. 117 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações, p. 244.

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insuficiente, não podendo lhe ser oposta por analogia o regulamento da atividade de

corretagem.

Na mesma esteira, a condição de mandatário também se mostrava

insuficiente, pois nem toda a atuação do agente incorporador era a de mandatário.

Quando este assim agisse, estaria sujeito às regras atinentes à matéria, regida pelo

código civil. Todavia, adverte-se que a experiência se mostrou ineficaz, carecendo as

obrigações do incorporador118 enquanto mandatário serem mais bem definidas,

subordinadas a um sistema punitivo mais rigoroso, tendente a resguardar os adquirentes

de unidades de eventuais perdas e conseqüente desorientação quando o incorporador

agisse de má-fé.

3.2 – DA INCORPORAÇÃO SOB A ÓTICA DO DIREITO POSITIVO

Ao Estado compete, em observância às relações que se instauram no seio

da sociedade, editar normas119 que tendem a elidir conflitos, promovendo a pacificação

social.

Partindo dessa premissa, o legislador nacional de 1.964, levando em

consideração a importância que a atividade de incorporação imobiliária alcançou dentro

da economia e para a população, observando ainda, o desamparo em que se

encontravam os adquirentes das unidades autônomas, face à má-fé de alguns indivíduos

que se aproveitando da inexistência de uma regulamentação específica que delimitasse

as responsabilidades e deveres do agente incorporador, por interstício da Lei n.º 4.591120

118 Rodrigo Azevedo, parafraseando Caio Mário, diz que “o incorporador não pode ser analisado isoladamente como um corretor, ou como um mandatário, ou gestor de negócios apenas. Ele é mais que isso, vale dizer, nele se congregam um pouco de cada uma dessas atividades, é o grande idealizador do projeto, ou seja, o propulsor do investimento.” (in Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 179/180.) 119 Paulo Dourado de Gusmão, diz que “o direito é construído tendo por base elementos fornecidos pela realidade social. (...). Lenta, gradual, é a introdução na ordem jurídica de novos princípios e de normas exigidos pelas novas situações histórico-social, devido ser o direito, por natureza, conservador. Daí o desajustamento freqüente que existe entre a ordem jurídica e a ordem social. (...). Não deve o direito, como fenômeno social que é, se afastar muito da opinião pública, sob pena de não ser espontaneamente observado, pois do contrário exigirá vigilância maior por parte do poder público, aumentando o serviço dos órgãos de fiscalização, da Polícia e do Judiciário. Se inobservar as tradições e os valores tradicionais, criará áreas de atrito que deduzirão a sua eficácia.” (in Introdução ao estudo do direito, p. 34) 120 Dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias.

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de 16 de dezembro de 1.964, tratou de regular a atividade, dispondo no parágrafo único

do artigo 28 que:

(...) considera-se incorporação imobiliária a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para a alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas (vetado).

No mesmo sentido, o supracitado diploma legal em seu artigo 29, assim

definiu o incorporador:

Art. 29. Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que, embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, (vetado) em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas.

Interpretando sistematicamente os artigos 28 e 29 da Lei121 de

Condomínios e Incorporações, verifica-se que a incorporação imobiliária é atividade

praticada por determinada pessoa (vide artigo 31 LCI) com o escopo de promover122 e

realizar a construção de uma dada edificação a ser construída ou em construção,

compostas por unidades autônomas, cuja finalidade é a alienação total ou parcial das

mesmas, o que deve se dar antes da conclusão da obra (expedição do certificado de

“habite-se”), as quais necessariamente estarão vinculadas à fração ideal do terreno.

Por oportuno, considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica,

comerciante ou não, construtor123 ou não, que expõe à venda a fração ideal de terreno

sobre a qual irá se assentar uma unidade autônoma de edificação, em construção ou a

121 Cabe esclarecer que o Projeto de Lei que se converteu na Lei de Condomínios e Incorporações, ressalvadas as modificações introduzidas pelo Legislador, é de autoria de Caio Mário da Silva Pereira, onde Rodrigo Azevedo, diz que o citado Professor convidado para “preparar um projeto que versasse sobre o assunto, o fez com muita propriedade, como tem sido a opinião uníssona dos juristas brasileiros”. (in Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 180.) 122 Segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, promover significa, “dar impulso a”; “fazer avançar”; “causar, originar”. “Diligenciar para que se realize”. (in Miniaurélio século XXI: O minidicionário da língua portuguesa, p. 561). Assim, promover quer dizer, criar condições necessárias para que algo se concretize. 123 Rodrigo Azevedo Toscano de Brito, lembra que não “há relação de interdependência entre o construtor e o incorporador para que se tenha a incorporação imobiliária. Com efeito, pode haver um incorporador-construtor, é possível também que o incorporador contrate diretamente com o construtor a realização da obra e, podem, ainda, os próprios adquirentes, diretamente, contratar o construtor. Isso para que se tenha uma idéia exata de que não é necessário que o incorporador seja também construtor, muito embora, atualmente, seja mais comum essa situação”. (in Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 185.)

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construir, em regime de condomínio124, o que vale dizer, com o domínio pertencendo a

várias pessoas, em sistema de co-propriedade, cuja venda se opera de forma

antecipada, antes da expedição do “certificado de habite-se”125 pelas autoridades

administrativas municipais, comprometendo-se perante os adquirentes em impulsionar a

construção e, sob sua orientação e coordenação, levar à cabo a incorporação126, que se

traduz na fusão da obra concluída ao terreno em um único corpo, na qual se

comprometeu a entregar, sob certo preço, prazo e condição, nos termos em que se

obrigou.

Não obstante, a condição de incorporador também será estendida “aos

proprietários e titulares de direitos aquisitivos que contratem a construção de edifícios

que se destinem à constituição em condomínio, sempre que se iniciarem as alienações

antes da conclusão da obra”, regra esta preconizada no artigo 30 da Lei n. 4.591/64,

sendo oportuno destacar que, para se falar em incorporação, a edificação deve estar por

construir, ou em andamento. Caso a compra e venda se refira à edificação já concluída,

cujo “habite-se” já tenha sido expedido, não mais se falará em incorporação e sim em

uma transação de compra e venda de imóveis qualquer.

Neste contexto, o artigo 31 da citada lei diz que:

Art. 31. A iniciativa e a responsabilidade das incorporações imobiliárias caberá ao incorporador, que somente poderá ser: a) o proprietário do terreno, o promitente comprador, o cessionário deste ou promitente cessionário com título que satisfaça os requisitos da alínea “a” do artigo 32; b) o construtor (...) ou corretor de imóveis (...).

No que tange ao primeiro rol de possíveis incorporadores descritos na

alínea “a” do citado artigo, não se vislumbram maiores dúvidas, pois estes agem em

124 Segundo Deocleciano Torrieri Guimarões, condomínio é “o estado de coisa indivisa sobre a qual várias pessoas exercem, simultaneamente, o direito de propriedade, sobre o quinhão ideal. (...)”. (in Dicionário técnico jurídico, p. 196.). 125 “Habite-se” – documento expedido pela Administração Municipal, em especial pelo Órgão de Vigilância Sanitária, em que atendendo o disposto na legislação pertinente, considera pronta e acabada a obra, podendo esta, ser habitada ou utilizada para efeitos comerciais ou industriais. Cabe esclarecer que a certidão de “habite-se” não há que ser confundida com a “certidão de conclusão de obras”. Esta ultima, é expedida pelos órgãos de infra-estrutura urbana, cuja essência verifica se a construção atende as regras e condições do projeto, bem como as de engenharia, primando pela segurança. 126 Rodrigo de Azevedo, citando De Plácido e Silva, diz que termo jurídico incorporação, “deriva do latim incorporatio, de incorporare (dar corpo, juntar, unir). (...) “em sentido geral e amplo quer significar a ‘inclusão’, a ‘união’, a ‘introdução’ ou ‘ligação ‘ de uma coisa ‘no corpo de outra’, que ficará pertencendo”. E no mesmo sentido acresce, dizendo que é “esse o sentido no qual se insere a incorporação imobiliária, ou seja, incluir, introduzir uma edificação no corpo de outra coisa, qual seja o terreno para isso destinado”. (in Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 173.)

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nome próprio. Todavia, no que no se refere ao construtor ou ao corretor de imóveis, o

legislador determinou que estes deverão estar investidos de mandato outorgado por

instrumento público para concluir todos os negócios pertinentes à alienação das frações

ideais do terreno, obrigando-se pessoalmente pelos atos que praticarem, uma vez que

estes não praticam atos em nome próprio, mas em nome dos promitentes compradores.

3.2.1. Das obrigações do incorporador

Com efeito, a lei de condomínios e incorporações, instituindo um sistema

rígido de normas, positivou a atividade de construção e incorporação imobiliária,

descrevendo com precisão os deveres e responsabilidades do incorporador, cuja

finalidade é a de coibir abusos praticados por empreiteiros inescrupulosos, que, face à

inexistência normativa da atividade, promoviam o lançamento do projeto de construção,

sem, no entanto, ter a mínima condição de levá-lo a cabo, provocando danos irreparáveis

aos adquirentes, como anota Rodrigo Azevedo127.

Primando pela estabilização normativa da atividade, a lei de condomínios e

incorporações, nos artigos 32 a 47, dispõe sobre os direitos e obrigações do incorporador,

determinando no artigo 32 que o mesmo somente poderá negociar as unidades

autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, uma série

de documentos, os quais, numa linha geral, irão tratar sobre as qualificações dos

proprietários do terreno, do incorporador, que poderá ser qualquer um dos estipulados no

artigo 31, bem como do imóvel sobre o qual será erguido o prédio cuja essência se traduz

na idoneidade do empreendimento, como ensina Rodrigo Azevedo128.

Tendente a trazer uma boa regulamentação à atividade, a lei de

condomínios e incorporações, no seu artigo 34, dispôs que é lícito ao incorporador

desistir de efetivar o empreendimento, podendo este fixar prazo de carência. Essa

hipótese vem no sentido de permitir a desistência no caso do incorporador não conseguir

vender todas as unidades autônomas, o que por si só, inviabilizaria o negócio, devendo

dentro de trinta dias a contar da denúncia, restituir as importâncias eventualmente pagas

127 BRITO, Rodrigo Azevedo Toscano de. Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 146. 128 BRITO, Rodrigo Azevedo Toscano de. Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 187.

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pelos adquirentes. Entretanto, caso queira levar adiante o empreendimento, sem a venda

total das unidades, este responderá pelas unidades não vendidas, respondendo em

igualdade de condições com os demais contratantes pelo custeio da obra (art. 35 § 6º,

parte final, LCI).

O legislador visou, com isto, que não se onerasse as demais unidades

vendidas pelo rateio do custo da obra a ser executada, face às unidades não vendidas,

devendo o idealizador arcar com o ônus destas, haja vista que ao condômino,

individualmente somente caberá a parte que contratou.

3.3. DA INCORPORAÇÃO NO CONTEXTO ATUAL

Com a positivação da atividade de incorporação imobiliária, a preocupação

que persistia sobre as obrigações e deveres do incorporador, pela inexistência de um

contrato típico de incorporação, deixou de existir.

Segundo preconizou o legislador, considera-se incorporação imobiliária a

atividade de promover e realizar a construção, para a alienação total ou parcial da

edificação em unidades autônomas, sendo incorporador aquele que compromete ou

efetiva a venda de frações ideais do terreno sobre a qual irá se assentar a futura

edificação, dividida em unidades autônomas, sob o regime condominial,

responsabilizando-se pessoalmente por levar a cabo o empreendimento, nos termos em

que se obrigou, podendo ser construtor ou não.

Para uma melhor compreensão do segmento de incorporação, mister se

faz, embora sucintamente, remontar o modo em que se processa a atividade de

incorporação imobiliária, levando em conta os antecedentes históricos, bem como a

disposição legal.

Conforme preleciona Caio Mário129, comumente há um indivíduo capitulado

como empreendedor que anseia construir um prédio e vendê-lo em unidades autônomas,

com o fito de lucro, sem no entanto, possuir capital suficiente. No mesmo sentido, existe

um outro indivíduo que deseja um apartamento ou uma casa comercial, e que se

encontra desprovido da quantia pecuniária para a aquisição, mas que no entanto, é

129 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. p. 232.

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proprietário de um terreno de boa localização. De outro lado, acham-se inúmeras

pessoas que almejam adquirir um apartamento, seja para sua própria moradia ou mesmo

para especular no mercado imobiliário por intermédio da locação, os quais possuem o

capital pretendido pelo empreendedor e pelo proprietário do terreno.

Postos em contato, empreendedor e proprietário do terreno acertam os

detalhes do negócio, obtendo o empreendedor autorização expressa para realizar os atos

necessários que concretizarão o empreendimento, entre eles o de alienar o imóvel. A

partir desse acerto, o empreendedor procura um engenheiro ou arquiteto que lhe fornece

o projeto, lhe faça os cálculos do empreendimento (valor da fração ideal do terreno, custo

da obra, encargos tributários, margem de lucro etc) e em seguida, atendendo ao que

dispõe a Lei de Condomínios e Incorporações, em especial o seu artigo 32, promove o

lançamento do projeto, expondo à venda a fração ideal do terreno vinculada130 à futura

unidade autônoma a ser construída.

Face ao lançamento, sob os rigores da lei, que se traduz no ato de tornar

público o empreendimento, aparecerão os primeiros candidatos à aquisição das unidades

autônomas. Nesse momento, firma-se um compromisso131 com cada um dos promitentes

compradores, denominado de contrato de incorporação imobiliária. Neste ato o

comprador promete adquirir uma fração ideal do terreno vinculada a uma unidade

autônoma da edificação a ser construída, dentro de determinado prazo, sob certo preço e

condições. Por outro lado, o incorporador compromete-se a promover a construção, ou

seja, criar condições necessárias para que ela se concretize e, ao seu final, efetivar a

incorporação propriamente dita, que se traduz na fusão da unidade autônoma à fração

ideal do terreno, num único corpo, e transmiti-la, definitivamente, para o adquirente,

juntando na escritura pública o proprietário do terreno e os promitentes compradores.

Nesse sentido, Maria Helena Diniz132 escreve que, “economicamente,

incorporação é um empreendimento que visa obter pela venda antecipada dos

apartamentos, o capital necessário para a construção do prédio.”

130 Segundo o parágrafo único do artigo 29 da LCI, “Presume-se a vinculação entre a alienação das frações do terreno e o negócio de construção, se, ao ser contratada a venda, ou, promessa de venda ou de cessão das frações de terreno, já houver sido aprovado e estiver em vigor, ou pender de aprovação de autoridade administrativa, o respectivo projeto de construção, respondendo o alienante como incorporador”. 131 Estabelece o §2º do artigo 32 da lei n. 4.591/64, que: “Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis e, uma vez registrados, conferem direito real oponível a terceiros, atribuindo direito a adjudicação compulsória perante o incorporador ou a quem o suceder, inclusive na hipótese de insolvência posterior ao término da obra.” 132 DINIZ, Maria Helena. Contratos, p. 12.

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Sob essa ótica, pode-se aduzir que a incorporação imobiliária é a atividade

exercida com intuito lucrativo, operando com recursos de terceiros, por serem captados

dos promissários ou cessionários compradores mediante promessa de alienação, em

que seu agente (incorporador) os aplica na construção de unidades imobiliárias que serão

entregues no futuro, devendo ser observado que o esquema descrito acima não se

desenvolve na mesma ordem, uma vez que, no contexto atual, é comum o incorporador

ser ao mesmo tempo proprietário do terreno e construtor.

3.3.1. Do contrato de incorporação

Tendo em vista a complexidade em que se assenta o instituto da

incorporação imobiliária, os juristas, à luz da Lei n. 4.591/64, passaram a conceituar o

contrato de incorporação imobiliária como “contrato preliminar e pessoal, de natureza

complexa, na qual se reúnem obrigações de dar e fazer, que opera seus efeitos em

etapas sucessivas, até a conclusão da obra e a transferência definitiva das unidades aos

donos e o domínio do terreno e das áreas de utilização comum aos condôminos.”133

No mesmo sentido, Maria Helena Diniz134 acrescenta: “o contrato de

incorporação imobiliária é o titulus adquirendi da propriedade do imóvel, que, para

constituir um direito real oponível a terceiro, requer seu registro na circunscrição

imobiliária competente”.

Arnaldo Rizzardo135, seguindo a escola de Hely Lopes e Maria Helena, diz

que “transparece, ainda, um compromisso particular assumido pelos contratantes: do lado

dos tomadores de apartamentos, de pagarem as prestações e de aquisição futura; do

outro do incorporador, de promessa da construção e venda das unidades, com o

correspondente condomínio do terreno e das partes comuns do edifício.”

Sob uma ótica pragmática, pode-se dizer que o contrato de incorporação

imobiliária possui como característica preponderante à comunhão em um único

instrumento de um feixe de atos, o que leva a padronizá-lo como um contrato de natureza

133 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. p. 210. 134 DINIZ, Maria Helena. Contratos. p. 11-12. 135 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. p. 930.

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complexa136, resultante da comunhão das obrigações de dar e fazer, uma vez que em

primeiro lugar envolve uma promessa de compra e venda, de coisa certa e determinada,

que é a fração ideal do imóvel (terreno). Num segundo momento, a promessa de compra

e venda de coisa futura, que são as unidades autônomas (apartamentos), convivendo

num mesmo corpo múltiplos atos jurídicos que conduzem a contratos137 diversos.

Portanto, o contrato de incorporação imobiliária longe está de se

caracterizar por um só compromisso, necessitando, outrossim, da interação de várias

outras modalidades pactuais.

3.3.2. Da função do contrato de incorporação

Partindo do pressuposto de que a incorporação imobiliária é um instituto

jurídico que se realiza pela aglutinação138 de diversos interesses que se desenvolvem por

meio da sucessão de atos jurídicos, importa relatar, que o incorporador age como um

verdadeiro catalisador de um complexo contratual, pois ora age como mandatário, ora

como empreiteiro ou como administrador.

Neste contexto, o contrato de incorporação imobiliária tem por escopo a

constituição do condomínio de propriedade horizontal, pela venda da fração ideal do

terreno, sobre a qual está vinculada uma unidade autônoma de empreendimento a ser

construído ou em construção, sendo necessário destacar que para se falar em

incorporação é de considerável importância discorrer acerca da comercialização de coisa

136 Segundo Arnaldo Rizzardo, “A incorporação, (...) se desenvolve mediante uma sucessão de atos. Primeiramente, como transparece de seu conceito, o proprietário do terreno, ou a compromissário comprador, ou o terceiro devidamente autorizado, convenciona com os interessados na aquisição das unidades autônomas a venda e a construção do edifício. Desenvolve um conglomerado de ajustes autônomos visando fixar os direitos e as obrigações de cada participante do empreendimento coletivo. Em seguida, formaliza um contrato preliminar de compra e venda de cada unidade autônoma. Um segundo contrato é firmado, que será de prestação de serviços do incorporador. Segue-se um terceiro instrumento, cujo objeto é a construção do edifício. Os três ajustes são distintos, embora admita a celebração em um único momento”. (in - Contratos. p. 930.) 137 Silvio de Salvo Venosa, ensina que preliminarmente, “há um contrato que objetiva a aquisição do terreno; a seguir, ocorre a formalização de contratos preliminares para a aquisição de unidade autônoma e um contrato de prestação de serviços do incorporador. Após, contrata-se a construção do edifício propriamente dita. Esses ajustes podem apresentar algumas nuanças no caso concreto, podendo figurar em um só instrumento ou em instrumentos autônomos”. (in - Direito civil – contratos em espécie. p. 510). 138 DINIZ, Maria Helena. Contratos, p. 12.

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futura, a qual não se encontra em poder do comerciante, traduzindo-se na venda de bem

imaterial.

Com o estabelecimento do condomínio139, a disponibilidade do

empreendimento por parte do incorporador desaparece, não podendo este, em hipótese

alguma, alterar as características do edifício futuro, salvo autorização expressa dos

condôminos. A partir deste momento, o incorporador assume a condição de

administrador ou gestor do empreendimento, agindo em nome dos adquirentes, no que

se refere à construção, coordenando e levando a termo a incorporação.

Ao se estabelecer o condomínio, gera um efeito jurídico de grande valia

para os compromissários adquirentes, pois subtrai do incorporador a disponibilidade para

instituir gravame a qualquer título sobre as unidades autônomas, ou mesmo do terreno,

sendo vedado, deste modo, a ofertada para terceiros, estranhos à incorporação, a título

de garantia real, no que tange as frações ideais do terreno, bem como das unidades

autônomas efetivamente vendidas.

Ao despir-se da liberdade de dispor do empreendimento (pelo registro do

memorial da incorporação, conjugada à venda de qualquer das unidades autônomas e da

fração ideal do terreno), assume o incorporador atribuições análogas ao do administrador

de consórcio140.

A exemplo do que ocorre no consórcio, no instituto da incorporação

imobiliária os adquirentes, ao efetuarem os pagamentos, depositam nas mãos do

incorporador determinada quantia para que este a administre e ao final lhes entregue o

bem almejado.

Sistematicamente, no instituto da incorporação imobiliária existe a figura do

administrador, a quem incumbe a função de centralizador, uma vez que para se chegar

ao objetivo comum, que é a obtenção da unidade autônoma pronta e acabada, existe a

necessidade de alguém coordenar e gerir os meios necessários à consecução dos

139 Preleciona Hely Lopes Meirelles que “o condomínio é o direito de propriedade de duas ou mais pessoas sobre partes ideais de uma mesma coisa indivisa (pro indiviso)”. Não obstante, no que se infere a parte ideal, acrescenta que “cada condômino dispõe dela livremente, sendo-lhe permitido exercer sobre a coisa todos os direitos compatíveis com a indivisão, inclusive reivindicá-la de terceiros que tenha injustamente. Mas como a quota de cada condômino é puramente ideal, não lhe atribui quinhão demarcado no condomínio, pelo quê é vedado a qualquer deles alienar a coisa em si mesma, ou transformá-la em sua substância ou destinação, (...)”. (in Direito de Construir. p. 18-19) 140 Sílvio de Salvo Venosa, ensina que o “vínculo que cada consorciado mantém com os demais é tênue, mas existe, tanto que o destino do grupo consorcial depende do exato cumprimento das obrigações de cada consorciado. Da mesma forma, o destino do empreendimento imobiliário, mormente aquele por administração, depende da correta perfeição dos contratos estabelecidos com cada adquirente.” (in Direito civil – contratos em espécie. p. 511)

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objetivos, cuja função compete ao incorporador, uma vez que da inteligência do parágrafo

único, do art. 28, combinado com o disposto no art. 29, “caput”, da Lei de Condomínios e

Incorporações, entende-se que ao mesmo compete promover e realizar a construção,

coordenando e levando a termo a incorporação.

3.3.3. Da natureza das obrigações erigidas do contrato

Nos termos do que já se colocou ao longo deste capítulo, o contrato de

incorporação imobiliária se revela complexo. Diante de tal quadro, o incorporador, face às

imposições da Lei de Condomínio e Incorporações, assume algumas obrigações perante

os promitentes compradores, cuja natureza jurídica traduz-se em obrigação de dar e

fazer, operando-se em etapas sucessivas até a conclusão da obra, momento em que se

dá pela expedição da “certidão de habite-se”, expedida pelas autoridades Municipais, por

intermédio da qual considera-se pronta e acabada a obra, sendo possível sua habitação.

A obrigação de dar surge no momento em que o incorporador, ao alienar a

fração ideal do terreno, se obriga a transmiti-la ao promissário comprador, juntamente

com a unidade autônoma (em construção ou a construir) pronta e acabada (averbada),

livre e desembaraçada de quaisquer ônus.

No que se infere à obrigação de fazer, esta decorre da própria Lei de

Condomínios e Incorporações ao determinar que compete ao incorporador promover e

realizar a construção, coordenando e levando a termo a incorporação, responsabilizando-

se pela entrega, nos termos da avença.

Muito embora a própria lei determine que o incorporador não execute a

construção, podendo esta ser executada por terceira pessoa, a mesma norma foi

enfática, dizendo que a este incumbe o dever de promover, cujo significado há de ser

entendido como obrigação de criar (fazer) os mecanismos necessários para que o

empreendimento se concretize, mesmo que para tanto deva o mesmo construir por si só

a obra ou subcontratá-la.

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3.4. DA CONSTRUÇÃO

Há de se esclarecer que o contrato de construção141 não é inerente ao

contrato de incorporação, não se confundindo este com aquele, em que pese estarem

intrinsecamente ligados, conforme esclarece Hely Lopes Meirelles142:

(...) o contrato de incorporação de condomínio não se confunde com o contrato de construção. Aquele é a convenção que se faz entre o incorporador e os interessados na formação do condomínio para a realização do empreendimento; este é o ajuste que se realiza entre o incorporador e o construtor para o levantamento do edifício.

Desta forma, a Lei n. 4.591/64 de forma clara e objetiva traz em seu bojo a

regulamentação de duas atividades distintas e autônomas (incorporar e construir), sem

no entanto, tratá-las como unas e indivisíveis, sendo deste modo dois institutos diversos,

não se confundindo a venda da fração ideal do terreno com a obrigação de construir a

unidade autônoma que se acha vinculada.

Assim, a lei de condomínios e incorporações apresenta três possibilidades

em que a construção pode ser concretizada: a) o incorporador pode ser construtor, o que

é muito comum na atualidade; b) o incorporador pode subcontratar a construção; e, c) os

adquirentes podem contratar diretamente com um construtor, pessoa distinta da do

incorporador, conforme se verifica da redação do art. 48, que assim dispõe:

Art. 48. A construção de imóveis, objeto de incorporação nos moldes previstos nesta Lei, poderá ser contratada sob o regime de empreitada ou de administração, conforme adiante definidos e poderá estar incluída no contrato com o incorporador (vetado), ou ser contratada diretamente entre os adquirentes e o construtor.

Nas duas primeiras hipóteses, as unidades imobiliárias podem ser

contratadas pelo preço global (preço do terreno e construção). No entanto, os respectivos

valores devem ser necessariamente discriminados, e, de acordo com o pacto celebrado,

podendo ser paga de uma só vez ou em parcelas sucessivas.

Na última hipótese, o incorporador fica tão somente com a obrigação de

efetuar a incorporação que se traduz na averbação da construção e a respectiva

individualização das unidades autônomas, após a expedição do “habite-se”, e a transferir

141 Rodrigo Azevedo Toscano de Brito, diz “que o contrato de incorporação imobiliária é tipificado justamente por uma série de prestações que se fundem numa unidade complexa (...)”, acrescentando que “uma dessas prestações é proveniente do contrato de construção”. (in Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor. p. 210.) 142 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. p. 212.

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o domínio da coisa, uma vez que a obrigação de construir foi outorgada a terceira pessoa,

podendo, no entanto, de acordo com a avença, atuar como administrador do condomínio.

Sob tais argumentos, pode-se dizer que o contrato de construção será

parte integrante do contrato de incorporação, quando as unidades imobiliárias forem

contratadas por preço global, ficando a cargo do incorporador promover (executar) a

construção. Nesta hipótese, prevendo o contrato de incorporação imobiliária, preço

global, necessário se faz a discriminação, no contrato, do preço da fração do terreno,

assim como o valor da construção, conforme dispõe o artigo 41, “caput”, da LCI:

Art. 41. Quando as unidades imobiliárias forem contratadas pelo incorporador por preço global compreendendo quota do terreno e construção, inclusive com parte de pagamento após a entrega da unidade, discriminar-se-ão, no contrato, o preço da quota de terreno e o da construção.

À sombra de tal disposição, primou o legislador pelo equilíbrio da relação

contratual, elidindo a possibilidade de ser imposta aos adquirentes o custeio das unidades

não vendidas, as quais cabem ao incorporador.

3.4.1. Da construção por empreitada

Dispôs o artigo 48 da Lei de Condomínios e Incorporações que a

construção poderia ser contratada sob o regime de empreitada ou de administração,

podendo estar ou não inserta no contrato de incorporação, sendo que o presente tópico

ocupar-se-á apenas do contrato de empreitada.

Segundo Arnaldo Rizzardo143, contrato por empreitada é:

(...) contrato pelo qual uma das partes obriga-se a executar por si só, ou com o auxílio de outras, mas sem dependência ou subordinação, determinada obra, ou a prestar certo serviço, e a outra a pagar o preço global ou proporcional ao trabalho realizado.

Rodrigo Azevedo144, citando Hely Lopes Meirelles, diz que:

(...) trata-se do ajuste pelo qual o construtor-empreiteiro, pessoa física ou jurídica habilitada a construir, obriga-se a executar determinada obra, com autonomia na condução dos trabalhos, assumindo todos os encargos econômicos do empreendimento, e o proprietário ou comitente –

143 RIZZARDO, Segundo Arnaldo. Contratos. p. 451. 144 BRITO, Rodrigo Azevedo Toscano de. Incorporação imobiliária à luz do código de defesa do consumidor, p. 216.

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empreitador se compromete a pagar um preço fixo, ainda que reajustável, unitário ou global, e a receber a obra concluída, nas condições convencionadas.

À vista de tal assertiva, a peculiaridade do contrato de empreitada está na

ausência de subordinação do construtor/empreiteiro em relação ao contratante. Sob esta

temática, Hely Lopes Meirelles145 esclarece:

A construção por empreitada é, pois, caracterizada pela autonomia do construtor na condução dos trabalhos, pela sua inteira responsabilidade pelos riscos econômicos da obra e pela prévia especificação do material a ser utilizado e dos serviços a serem executados pelo empreiteiro, diversamente do que ocorre na construção por administração, em que o construtor fica na dependência das liberações do dono da obra, que custeia e suporta os encargos financeiros da construção, podendo alterar os trabalhos quanto à sua extensão e escolher os materiais a serem utilizados, dentre os permitidos para a obra em execução.

É necessário esclarecer que o contrato de empreitada acha-se regulado

segundo os preceitos do art. 55, da Lei n. 4.591/64:

Art. 55. Nas incorporações em que a construção seja feita pelo regime de empreitada, esta poderá ser a preço fixo ou a preço ajustável por índices previamente determinado.

À luz de tal disposição, verifica-se que a construção contratada pelo regime

de empreitada abraça dois tipos diversos: a preço fixo ou a preço reajustável.

Ao dispor que o contrato de empreitada poderá ser formulado a preço fixo,

vedou o legislador que o construtor/empreiteiro promovesse modificações no preço

pactuado, independente das variações146 que houver; o que não ocorre no preço

ajustável, caso em que o construtor pode transferir para a parte contratante as oscilações

financeiras que porventura venham a ocorrer. Todavia, os reajustes devem ser nas datas

convencionadas, levando em consideração os índices adotados, previstos no contrato.

145 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. p. 182. 146 Ensina Hely Lopes Meirelles, que “sendo a empreita, como é, um contrato consensual, oneroso, bilateral, perfeito e comutativo, as partes estabelecem, de início, o preço e as obrigações recíprocas e equivalentes que hão de subsistir durante toda a vigência do ajuste”, onde mais adiante assevera dizendo que “quando os ajustes particulares eram feitos dentro da mais ampla liberdade contratual e as variações do mercado só se sujeitavam à lei da oferta e da procura, compreendia-se a imutabilidade do preço da empreitada sob condição de que o contrato era lei entre as partes: pacta sunt servanda. Desde, porém, que o estado se arrogou o poder de interferir no domínio econômico e na fixação dos salários, já não pode prevalecer o princípio da inalterabilidade do contrato (...).” (in Direito de construir. p. 190).

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3.4.2. Da construção por administração

No que se refere ao “contrato de construção por administração”, também

conhecido por contrato a preço de custo, Hely Lopes Meirelles147 ensina que:

(...) é aquele em que o construtor se encarrega da execução de um projeto, mediante remuneração fixa ou percentual sobre o custo da obra, correndo por conta do proprietário todos os encargos econômicos do empreendimento. Nesta modalidade de contrato de construção, o construtor-administrador assume a direção e responsabilidade técnica de todos os trabalhos, incumbindo ao proprietário ou comitente o custeio da construção e as especificações estruturais e de acabamento à obra.

Neste ponto, importante saleintar que o supracitado contrato acha-se

regulado no artigo 58 da Lei de Condomínios e Incorporações, que assim dispõe:

Art. 58. Nas incorporações em que a construção for contratada pelo regime de administração, também chamado “a preço de custo”, será de responsabilidade dos proprietários ou adquirentes o pagamento do custo integral de obra, observadas as seguintes disposições: I – todas as faturas, duplicatas, recibos e quaisquer documentos referentes às transações ou aquisições para construção, serão emitidos em nome do condomínio dos contratantes da construção; II – todas as contribuições dos condôminos para qualquer fim relacionado com a construção serão depositados em contas abertas em nome do condomínio dos contratantes em estabelecimentos bancários, as quais, serão movimentadas pela forma que for fixada no contrato.

Assim, nessa modalidade contratual148, o construtor se encarrega da

construção, mediante contraprestação fixa ou sob percentual calculado em relação ao

custo da obra, ficando os proprietários com a responsabilidade pelos demais custos do

empreendimento, havendo uma dependência do construtor/empreiteiro da prática de

determinados atos por parte do contratante; o que não se verifica no contrato de

empreitada, devendo as faturas, duplicatas e recibos que se refiram à aquisição de

materiais ou custos relativos à obra, serem emitidos em nome do condomínio.

147 MEIRELLES, Hely Lopes.Direito de construir, p. 193. 148 Hely Lopes Meirelles, diz que na modalidade de contrato de administração, se atribui ao “incorporador ou terceiro, o custeio da obra ocorre por conta dos tomadores de unidades autônomas, que suportam as oscilações de preços e de mais riscos econômicos da construção. (...) Esse o sistema em voga, conhecido por condomínio pelo preço de custo, visto que o preço inicialmente estabelecido é de simples estimativa, sujeitando-se cada condômino a pagar, a final, o custo efetivo da construção. Se o custo exceder o estimado, os condôminos completarão o acrescido; se for inferior à estimativa inicial, o incorporador devolverá o que recebeu em excesso, ou reduzirá o montante ou o número das prestações, se se tratar de aquisição a prazo.” (in Direito de construir, p. 211).

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3.5. DO INCORPORADOR CONSTRUTOR

Na atualidade, é comum o incorporador ser ao mesmo tempo

proprietário do terreno e o construtor. Entretanto, ao acumular as funções de incorporador

e construtor, o empreendedor deve estar habilitado para atuar, devendo achar-se inscrito

junto ao Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura.

Assim, face à Lei de Condomínios e Incorporações, no momento em que

este, obedecendo às disposições legais, efetuar o lançamento do empreendimento e,

conseqüentemente, estabelecer o condomínio vendendo antecipadamente as unidades

autônomas, as regras quanto ao contrato de incorporação e de construção não

desaparecem; embora na visão externa, apareça única e exclusivamente o incorporador

como proprietário do empreendimento.

Nesses termos, quando o incorporador efetua compra de materiais

(cimento, ferro, pedra, material hidráulico, material elétrico etc) necessários à construção,

utiliza de mão de obra de seu quadro de funcionários ou a sub-contrata, está agindo

sempre em nome de terceiros, face ao condomínio estabelecido.

Diante de tal prática, o negócio de incorporação imobiliária deixar

transparecer simplesmente uma pura aquisição de uma propriedade imóvel comum. No

entanto, ao se adentrar no núcleo do negócio, constata-se ser ledo engano. Aquele que

analisa o segmento, tomando por referência apenas os elementos externos, é levado a

concluir que o imóvel pertence única e exclusivamente a uma só pessoa, que no caso é o

incorporador. Este encontra seu nome ostensivamente no empreendimento e todos os

atos de comprar e contratar a execução da obra a serem praticados na sua pessoa,

conforme o que ficar pactuado no contrato de incorporação. Todavia, adverte-se que de

outro modo não poderia, uma vez que a lei de condomínios e incorporações impõe tal

obrigação, face ser o incorporador, o idealizador e o principal responsável pelo

empreendimento.

Caso inverso verificar-se-á quando a análise partir do lado interno para o

externo; em que será encontrada uma pluralidade de proprietários, todos contribuindo

pecuniariamente para a consecução do empreendimento; depositando nas mãos do

incorporador o quantum devido pela execução do empreendimento; assumindo este os

riscos econômicos e retirando desse negócio o lucro almejado, caracterizando o instituto

da empreitada, face a construção para terceiro em virtude do condomínio estabelecido.

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Neste ponto, Walter Gaspar149, diz que:

A atividade do incorporador consiste em construir e, ao mesmo tempo, vender os imóveis ainda em construção. Em nosso entendimento, trata-se de atividade que pouco se diferencia da construção por empreitada. (...). Em ambos os casos, existe um empreiteiro que assume o ônus e apresenta como resultado a obra. (...) a chamada promessa de venda futura nada mais é que uma construção por empreitada, (...).

Levando em consideração as ilações acima, há de se entender o instituto

da incorporação imobiliária, no contexto atual, em dois momentos distintos, posto que a

figura descrita por Caio Mário e positivada pelo legislador não mais atua da mesma, visto

que na origem o incorporador era tido, apenas, como o idealizador do empreendimento,

necessitando ele, de um projetista e de um construtor para levar a cabo sua idéia. No

contexto atual, devido às conveniências financeiras e pela primazia de maiores lucros,

vislumbrou a possibilidade de não mais repassar a terceiros fatias do seu lucro, passando

a acumular funções de idealizar, projetar e construir, combinado ao fato de ser ainda, o

proprietário do terreno, sepultando na prática, aquela figura descrita por Caio Mário e

positivada sob o manto da lei de condomínios e incorporações.

Nestes termos, o contrato de incorporação imobiliária deve ser visto como a

fusão de dois contratos distintos, sendo um de compra e venda das frações ideais do

terreno e outro da construção, fundido em um único instrumento.

No contexto atual, ao se pretender adquirir um imóvel a ser construído (na

planta), sob o regime de incorporação imobiliária, o adquirente não consegue vislumbrar o

conglomerado de ajustes ao qual se está filiando, tendo apenas em mente, que está

adquirindo um imóvel, assim entendido, fração ideal do terreno e unidade autônoma; na

prática, apenas adquire a fração ideal do terreno e contrata, sob o regime de empreitada

a construção da obra, uma vez que o incorporador é também construtor, além de ser,

também o proprietário do terreno.

149 GASPAR, Walter. ISS teoria e prática. p. 174.

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Capitulo 4

DO ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL E NA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

Uma das tormentosas questões, que permeiam o mundo jurídico do direito

tributário, refere-se à tipificação de um dado fato gerador dentro de uma ou outra hipótese

de incidência tributária, cuja ação pode levar o sujeito passivo a recolher mais ou menos

tributos.

Não obstante a possibilidade de se pagar mais ou menos tributos, a

tipificação errônea de um dado fato gerador pode também significar, de acordo com as

circunstâncias, a lapidação de um patrimônio construído ao longo de uma vida; visto que

a diferença do tributo a ser recolhido, apurado mediante procedimento fiscalizatório

regular, vir acrescido de multa, juros e correção monetária.

Deste modo, no presente capítulo, estudar-se-á a incidência do ISSQN no

setor de construção civil, ressaltando as hipóteses de incidência previstas pelo legislador

infraconstitucional. Dando ênfase aos serviços destinados à execução de obras novas,

previstos no subitem 7.02 da lista de serviços, anexa à Lei Complementar n. 116/03,

abstendo-se da análise os demais serviços; pois o norte da presente pesquisa conduz à

exegese da incidência do ISSQN sobre o segmento de construção e incorporação

imobiliária, sendo irrelevante o estudo dos demais subitens, em que pese sua relevância.

4.1. ORIGEM DO TERMO CONSTRUÇÃO CIVIL

Desde os primórdios, o homem se preocupou com sua moradia. Vivendo

em estado de natureza e diante de constantes perigos. O homem procurou abrigo no

âmago da natureza, situação em que segundo Hely Lopes Meirelles150 o homem:

(...) escavou a rocha e habitou a caverna; abateu árvore e fez a choupana; lascou a pedra e construiu a casa; argamassou a areia e ergueu o palácio; forjou o ferro e levantou o arranhacéu, num lento e perene aprimoramento da técnica de construir, que marcou o advento da engenharia e da arquitetura.

150 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. p. 303.

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Neste lento e gradual desenvolvimento, o homem construiu cidades,

urbanizando-se, passando a desenvolver funções sociais (habitar, recrear, circular,

trabalhar etc) e servindo-se da propriedade numa interação cada vez maior das relações

sociais.

Desta interação social adveio a necessidade de regular o direito de

construir. Tal direito transformou a construção, que na sua gênese era tida como uma

atividade leiga e individual, numa atividade técnica e social. Neste contexto, Hely Lopes

Meirelles151 relata que:

A construção evoluiu da homogeneidade da habitação primitiva para a variedade da edificação contemporânea, mas a moradia, a casa, constitui ainda, e continuará sempre, o tema fundamental da Engenharia, da Arquitetura e do Urbanismo, que, como técnicas e artes sociais, almejam o objetivo comum de dar ao homem ambiente de segurança e bem-estar individual e coletivo, tornando os lares mais confortáveis e as cidades mais humanas.

Seguindo suas preleções, o citado autor acrescenta que a “construção,

como atividade técnica, iniciou-se com as obras militares, as fortificações, donde proveio

a designação de ‘engenheiro’ para os que se dedicavam aos engenhos bélicos”.

Com a proliferação das cidades, os profissionais que se dedicavam à arte

de construir sem, no entanto, serem militares, passaram a ser denominados “engenheiros

civis”. Tal expressão se apresentava para se diferenciar dos profissionais militares e,

conseqüentemente, adjetivou a construção de “civil” em negação às construções

militares, conforme anota Gilberto Rodrigues Gonçalves152.

Nesse diapasão, observa Walter Gaspar153 que:

Com o passar do tempo, a expressão “engenharia civil”, acompanhando a necessidade de especialização e de seus novos setores, desmembrou-se em vários campos técnicos especializados (...). O engenheiro deixou de ser “politécnico” (várias técnicas), para especializar-se, aparecendo diversas qualificações para o engenheiro: engenheiro naval, engenheiro agrônomo, engenheiro de minas, engenheiro industrial, engenheiro eletricista, etc. Todavia, o mesmo não ocorreu com a expressão “construção civil”, que permaneceu com o mesmo nome até hoje, embora alcançando sistematicamente maior campo de ação. A construção civil continuou com sua denominação tradicional e com seu objeto próprio (execução material de obra), embora tenha recebido novas técnicas. Portanto, obras de construção civil são as relacionadas com qualquer ramo especializado da engenharia (civil, naval, elétrica, eletrônica, etc), da arquitetura ou do urbanismo.

151 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. p. 304. 152 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p.33. 153 GASPAR, Walter. ISS teoria e prática. p. 168.

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Partindo de tal assertiva, percebe-se que inclusive as obras “militares”

(executadas pelas forças armadas), também acham-se insertas dentro do conceito de

construção civil. Aquilo que na origem era utilizado para diferenciar as construções feitas

por militares, dentro do contexto contemporâneo, encontra-se unido em um único objeto,

sendo mais adequado se falar em obras executadas por militares e não “obras militares”,

cuja expressão conduz à idéia de fortificação (Exército), aeroporto (Força Aérea) e

ancoradouro (Marinha).

4.1.1. Acepção de Construção civil para efeito de tributação do ISS

É na doutrina que melhor se encontra a acepção que conduz ao

entendimento do significado da expressão construção civil, para efeito da incidência do

ISSQN, observando-se a existência de duas acepções: a) estrita e b) genérica.

Enquanto que a acepção estrita acha-se “limitada às obras de edificações

de prédios destinados à habitação, ao trabalho, ao culto, ao ensino e à recreação”, a

acepção genérica “abrange todas as obras de engenharia destinadas à construção,

reforma ou reparação”, conforme explica Gilberto Rodrigues Gonçalves154. No mesmo

diapasão, Bernardo Ribeiro de Moraes155, abordando as duas acepções, identificou a

existência de sete grupos abarcados pela construção civil, segundo seu sentido genérico:

a) primeiro grupo: obras de terra, abrangendo as sondagens, fundações e escavações;

b) segundo grupo: obras de edificação, onde se incluem as construções de edifícios destinados a habitação, ao trabalho, ao ensino, a recreação ou ao culto;

c) terceiro grupo: obras de estradas e de logradouros públicos, atingindo as construções de estradas e de logradouros públicos;

d) quarto grupo: obras de arte, onde se encontram as construções de pontes, viadutos e outras;

e) quinto grupo: obras de terraplenagem e de pavimentação, abrangendo a terraplenagem, aterros e a pavimentação;

f) sexto grupo: obras hidráulicas, que se acham relacionadas com a dinâmica das águas ou de outros líquidos, tendo em vista a direção, o emprego ou o seu aproveitamento;

g) sétimo grupo: obras de instalação, de montagem e de estruturas em geral, abrangendo as obras de assentamento ao solo ou fixadas em edificações.

154 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p. 33. 155 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 241-242.

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Acresce ainda o citado autor, que, num sentido específico, a construção

civil restringe-se apenas ao segundo grupo, referindo-se propriamente às obras de

edificações de edifício, cujo escopo se destina à habitação, ao trabalho entre outros.

Esclarece-se, ainda, que, embora não se tenha feito referência às

atividades de demolição, conservação e reparação, estas, doutrinariamente, são aceitas

como insertas dentro do contexto de construção civil, em que pese o termo demolir ser o

“inverso da construção. Demolir é destruir, derrubar, colocar no chão”, conforme

preleciona Walter Gaspar156.

4.2. DO ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Antes de se adentrar aos serviços tributados pelo ISSQN, no segmento da

construção civil, esclarece-se que a Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, ao

estabelecer uma nova sistemática para os serviços a serem tributados pelos Municípios,

agrupou no item 7 da lista de serviços todos aqueles correlacionados às atividades de

engenharia, arquitetura, geologia, urbanismo, construção civil, limpeza, meio ambiente,

saneamento e outros congêneres e os subdividiu em 22 subitens, dos quais restaram

vetados os serviços que se destinam ao setor de saneamento ambiental (captação de

água e tratamento de esgoto, entre outros), tipificados nos subitens 7.14 e 7.15.

A nova sistemática agrupou os diversos itens que se achavam sob o prisma

da lista anterior ditada pelo Decreto-lei n. 406/68, com redação conferida pela LC 56/87,

dispersos por toda a lista e os classificou segundo a sua natureza.

4.2.1. Dos serviços tributados

A lista de serviços ditada pelo Decreto-lei n. 406/68, com redação conferida

pela Lei Complementar n. 56/87, previa a tributação dos serviços de construção civil, nos

itens 32, 33, 34 e 37:

156 GASPAR, Gaspar. ISS teoria e prática. p. 176.

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32 - execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM); 33 – demolição; 34 - reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM); (...) 37 - escoramento e contenção de encostas e serviços congêneres;

A partir da vigência da Lei Complementar n. 116/03, as atividades de

construção civil passaram a ser previstas nos subitens 7.02, 7.04, 7.05 e 7.17, ostentando

as seguintes redações:

7.02 – Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). (...) 7.04 – Demolição. 7.05 – Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). (...) 7.17 – Escoramento, contenção de encostas e serviços congêneres.

Diante da importância normativa destes subitens no presente estudo,

interessa tão somente a redação contida no subitem 7.02, por discorrer especificamente

da construção civil, na sua acepção específica, assim entendida a construção de

edificações e de edifício, cujo objetivo se destina à habitação, ao trabalho entre outros,

conforme já foi posto ao longo deste capítulo.

Desse modo, a partir deste ponto, a presente pesquisa, no que tange ao

ISS na construção civil, limitar-se-á a discorrer sobre a “execução por administração,

empreitada ou subempreitada de construção civil”. Abstendo-se da exegese o objeto

contratado (serviços de sondagem, pavimentação, escavações, drenagem entre outros),

visto que para o presente estudo, deixariam o tema demasiadamente longo, em que pese

à suma relevância.

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4.2.1.1. Da execução por administração

A execução por administração, também conhecida por execução a “preço

de custo” (vide 3.4.2), é aquela em que o construtor mediante uma remuneração fixa

(taxa de administração), calculada geralmente em relação ao custo da obra, assume,

apenas, a responsabilidade pela execução (prestação de serviços), ficando todos os

encargos econômicos da obra sob responsabilidade do contratante.

Walter Gaspar157 assim define a execução por administração:

Nesse contrato, o construtor (administrador) assume a direção e a responsabilidade técnica da obra cabendo ao comitente-proprietário o custeio da construção. O proprietário paga os materiais e a mão-de-obra, de acordo com os orçamentos apresentados pelo administrador, o qual recebe sua remuneração sob a forma de comissão (taxa de administração ou honorário).

Assim, o construtor apenas presta serviços, não assumindo qualquer

encargo econômico pela obra (aquisição de materiais, contratação de pessoal, etc),

ficando tais responsabilidades a cargo do contratante.

Há casos, no entanto, em que o construtor/administrador fica incumbido de

adquirir os materiais necessários à execução da obra. Neste ponto, Bernardo Ribeiro de

Moraes158 diz que o “administrador-construtor será simples preposto ou mandatário do

dono da obra.” Mesmo que o administrador venha a adquirir alguns materiais, isto não é

suficiente para metamorfosear o contrato de administração para uma outra modalidade.

Ele permanece intacto, pois as aquisições serão sempre em nome do proprietário da

obra, uma vez que a este incumbe o risco econômico do negócio.

Para levar a cabo o empreendimento, o administrador-construtor

providencia estudos sobre os materiais necessários à obra, bem como de alguns serviços

específicos, os quais, porventura, não possa fornecer de acordo com as etapas do

projeto; providencia as concorrências ou compras, que se darão impreterivelmente na

pessoa do comitente-proprietário, conforme observa Bernardo Ribeiro de Moraes159.

A hipótese de incidência do imposto sobre serviços é a execução

(trabalho), sendo a “administração” o instituto jurídico (contrato) que norteará o

procedimento em que a obra será levada a termo, ligando obrigacionalmente o prestador

157 GASPAR, Walter. ISS – teoria e prática. p. 173. 158 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 233. 159 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 233.

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(construtor) e o tomador (proprietário da obra), não sendo a admistração o núcleo central

da tributação, a qual recai única e exclusivamente sobre a execução. Nesse sentido, a

expressão “administração” é o suporte jurídico por meio do qual o esforço humano

(execução) se transmitirá a terceiro, se coadunando à natureza jurídica do imposto, assim

concebida como obrigação de fazer.

4.2.1.2. Execução por empreitada

Na execução por empreitada (vide 3.4.1), o construtor se acha livre de

subordinação, ao contrário do que ocorre na execução de obra por administração. Nessa

modalidade, o construtor age com independência, de forma autônoma. No entanto,

assume todos os encargos econômicos da obra, por ficar com a obrigação de comprar e

contratar, tudo em seu nome.

Bernardo Ribeiro de Moraes160, discorrendo sobre a execução por

empreitada, assim propala:

No contrato de construção por empreitada, o construtor-empreiteiro se obriga a executar determinada obra, sem subordinação ou dependência, assumindo todos os encargos econômicos do empreendimento, ficando com o propiretário-empreiteiro (dono da obra) o direito de receber a obra concluída, nas condições convencionadas.

À luz de tais ilações, Walter Gaspar161, observando o conteúdo do contrato

de empreitada, ressalta três características básicas, a saber:

a) é um contrato de resultado. O que o proprietário exige é a obra concluída, e não a prestação do serviço. O empreiteiro assina o contrato onde se compromete a servir materiais e mão-de-obra e, ao fim de certo tempo, entrega ao proprietário a obra pronta; b) o empreiteiro é autônomo. Na condução da obra, o empreiteiro toma as decisões que são necessárias. Compra os materiais, decide sobre dispensa e contratação de operários, decide sobre o modo de tocar a obra (o que fazer, como fazer, etc); c) o empreiteiro assume o risco. O proprietário contrata a obra pronta, cabendo ao empreiteiro assumir os riscos econômicos do empreendimento.

Nessa espécie contratual, muito já se discutiu acerca da sujeição do

construtor ao imposto sobre circulação de mercadorias (ICMS), por ficar este com a

160

MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 233. 161 GASPAR, Walter. ISS – teoria e prática. p. 174.

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obrigação de comprar (adquirir) os materiais necessários à execução da obra. Entretanto,

deve-se esclarecer que a referida matéria acha-se superada, doutrinária e

jurisprudencialmente, no sentido de se acolher única e exclusivamente a incidência do

ISSQN, visto que a aquisição de materiais para atender às necessidades oriundas da

execução da obra representa apenas práticas secundárias.

Não obstante, José Eduardo Soares de Melo162 expõe que “a empreitada

concerne a uma obrigação de fazer (executar) uma determinada obra (perfeita e acabada),

mediante encomenda, com o emprego de mão-de-obra, e (em muitos casos) a aplicação

de utilização de bens materiais, revelando natureza especifica e infungível”. O citado autor

acrescenta ainda, que não se pode confundir a empreitada com a “simples prestação de

serviços (mera atividade prometida pelo prestador); nem com a compra e venda e com o

fornecimento, que configuram obrigação de dar, em que os bens são genéricos e fungíveis,

e a qualidade dos serviços é secundária.”

Há de se dizer, ainda, que o contrato de construção civil por empreitada,

dependendo da forma como for pactuada a construção, pode ser executado na sua

plenitude ou apenas em etapas e partes, caracterizando uma avença de resultado. Da

mesma sorte, pode ou não envolver o fornecimento de material, não o sendo obrigatório,

mas facultativo, interessando apenas a entrega do objeto e não os meios empregados.

Para efeito de incidência do ISSQN, o fato gerador do imposto é a execução

(ato ou efeito de construir), visto que o núcleo da hipótese de incidência versa sobre o

trabalho despendido em favor de terceiro, sendo a “empreitada” o instrumento que

estabelecerá o liame jurídico, por meio do qual a execução se operará e o labor humano

circulará.

4.2.1.3 – Da execução por subempreitada

Gilberto Rodrigues Gonçalves163 diz que “a subempreitada é um contrato

derivado”, justificando que este está subordinado a um contrato principal, no caso, o de

empreitada. Por sua vez, Sérgio Pinto Martins164 ensina:

162 MELO, José Eduardo Soares de. ISS – aspectos teóricos e práticos. p. 80. 163 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p. 89. 164 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 188.

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A subempreitada envolve a prestação de serviços delegada a terceiros, que, no conjunto, irá construir a obra. É comum na construção civil haver a delegação de serviços a terceiros, como de alvenaria, fundação, hidráulica, pastilhas, azulejos, pisos etc., também chamada, hoje, de “terceirização” dos serviços.

Neste particular, deve-se esclarecer que na subempreitada os contratos

são firmados entre o construtor-empreiteiro e não entre o comitente-proprietário. Sendo

este firmado direto com o proprietário do empreendimento, a figura contratual será outra e

jamais subempreitada.

Para efeito de incidência do ISSQN, o imposto incidirá, também, sobre a

execução, assim entendida como o trabalho realizado, no sentido de obtenção de um

determinado resultado, que, no caso, é a parte da obra terceirizada. Assim, a

subempreitada nada mais é que o mecanismo utilizado para designar que frações da

avença principal foram delegadas a terceira pessoa.

4.2.2. Dos serviços não tributados

O ISSQN, nos termos do que se preconizou no capítulo segundo, é um

tributo que tem por hipótese de incidência a prestação de serviços de qualquer natureza,

assim entendido como a ação (esforço humano) despendida em favor de terceiros, na

satisfação de sua necessidade, pressupondo uma relação jurídica, de conteúdo

obrigacional de fazer. Traduzindo-se, portanto, numa operação pela qual uma pessoa,

em troca de pagamento, realiza, em favor de outra, transmissão de um bem material.

Levando em consideração as ilações anteriores, não há de se falar em

incidência do ISSQN quando o proprietário da obra for construtor e executar os serviços

com recursos próprios e com mão-de-obra de seu quadro de funcionários, assim

entendido contratados com vínculo empregatício, pouco importando o fim a que se

destina o empreendimento. Nesta conjectura, inexiste fato gerador do ISSQN, tendo em

vista que o “auto-serviço” não figura entre as hipóteses permitidas para a incidência do

imposto sobre serviços.

Da mesma forma, os serviços executados pelos funcionários ao patrão

(construtor) que, em tese, poderiam ser entendidos como prestados a terceiros, também,

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não são passíveis de tributação, por ter sido afastada esta hipótese, determinantemente,

nos termos do inciso II, do art. 2º165 da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003.

4.3. DO ISS NA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA

À luz do que foi exposto no terceiro capítulo, verifica-se que a atividade de

incorporação imobiliária é uma atividade empresarial sujeita aos regramentos legais da

Lei n. 4.591/64.

É concebida pela doutrina como atividade complexa, por trazer na sua

estrutura características de corretagem, mandato, construção civil entre outros. Foi

positivada e conceituada pelo legislador no parágrafo único do art. 28, da LCI, como

sendo, em linhas gerais, “a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a

construção, para alienação total ou parcial, de edificação ou conjunto de edificações

compostas de unidades autônomas”.

De difícil entendimento, repousam, como visto no capítulo terceiro, no

mundo doutrinário, inúmeras controvérsias acerca desta atividade, tornando-se ainda

mais acentuada quando o estudo se volta para a figura do incorporador, positivado no

art. 29 da supracitada lei.

Condicionado ao cumprimento de uma série de requisitos legais, o

incorporador caracteriza-se, conforme já estudado, como pessoa física ou jurídica,

comerciante ou não, que aceita propostas, compromisso ou efetiva a venda de frações

ideais do terreno vinculadas a unidades autônomas a serem construídas ou em

construção e coordena e leva a termo o empreendimento, mesmo sendo ou não o

construtor, assumindo a obrigação de fazer e dar coisa certa.

Sobre o assunto, Hely Lopes Meirelles166 é quem melhor define:

A incorporação (...) é a sucessão de atos pelos quais o proprietário do terreno, ou seu compromissário comprador ou terceiro, devidamente autorizado, convenciona com terceiros na aquisição das unidades

165 “Art. 2o O imposto não incide sobre: (...) II – a prestação de serviços em relação de emprego, dos trabalhadores avulsos, dos diretores e membros de conselho consultivo ou de conselho fiscal de sociedades e fundações, bem como dos sócios-gerentes e dos gerentes-delegados; (...)” 166 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. p. 20.

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autônomas. Na prática, o denominado contrato de incorporação de condomínio se apresenta como um conglomerado de ajustes autônomos visando a fixar os direitos e obrigações de cada participante desse empreendimento coletivo (...). Para tal desiderato reúnem num mesmo instrumento um contrato preliminar de compra e venda da unidade autônoma, (...) e um contrato de construção do edifício. Esses ajustes, embora consubstanciados simultaneamente e no mesmo instrumento, são contratos distintos e sujeitos à tributação diversa, não obstante a aparente unificação obrigacional entre os condôminos e o incorporador.

À luz de tal inferência, não resta dúvidas quanto à complexidade que

permeia o segmento levando em consideração, ainda, que, na atualidade, o incorporador

acumula na mesma pessoa as figuras de proprietário do terreno e construtor. Entretanto,

quando se fala em tributação, a situação fica ainda mais nebulosa.

Caracterizada como atividade que pressupõe a venda de imóvel, quando

se fala da incidência tributária, assim entendida a de competência municipal, é que a

celeuma se instala, principalmente quando a incidência pretendida é a do ISSQN. Visto

que o fisco ao efetuar o lançamento diz que a venda da fração ideal do terreno, vinculada

a uma unidade autônoma a construir ou em construção, caracteriza a hipótese de

incidência descrita no subitem 7.02 da lista de serviços, anexa à Lei Complementar n.

116/03, acrescentando, que, face ao condomínio estabelecido o incorporador/construtor

não mais está construindo para si e sim para terceiros, uma vez que os adquirentes

assumem o encargo econômico do empreendimento, sendo o compromisso de compra e

venda um contrato de construção, caracterizando uma execução por empreitada ou

administração.

O primeiro argumento suscitado, no sentido de elidir a tributação, norteia-se

no sentido não se tratar de serviços de construção civil para terceiros, mas de construção

de imóveis próprios, cujo tratamento jurídico-legal é diverso da regra matriz do imposto

sobre serviços, não sendo, portanto, passível de tributação pelo ISSQN.

Por outro lado, alega-se também que a incorporação imobiliária não se

encontra inserta entre as hipóteses de incidência, previstas pela lista de serviços e sendo

esta taxativa, não há o que se falar em incidência do imposto sobre serviços de qualquer

natureza.

Não obstante, alude-se ainda, que o contrato de compromisso de compra e

venda trata-se apenas de uma opção (pré-contrato) não se traduzindo em venda

especificamente (alienação), por ser impossível vender o que não existe, alegando que

as vendas somente ocorrerão após a obtenção do “certificado de conclusão de obras” e

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da “certidão de habite-se”, cuja hipótese se sujeita, única e exclusivamente ao Imposto

de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITBI167).

4.3.1. Do posicionamento doutrinário

Nos termos do que se asseverou no tópico anterior, a incidência do ISSQN,

tomando por base a construção e incorporação imobiliária se mostra controvertida. Além

disso, a doutrina exibe a matéria de forma árida, inexistindo autores que discorram com

propriedade sobre o referido conteúdo, havendo, outrossim, algumas remissões, sem, no

entanto, adentrar ao cerne da questão, que se limitam apenas a repetir um ou outro

posicionamento jurisprudencial.

José Eduardo Soares de Melo diante do conteúdo de sua obra da qual esta

pesquisa se serviu, não faz qualquer remissão à incidência ou não do ISSQN sobre o

segmento de construção e incorporação imobiliária.

Sérgio Pinto Martins168, por sua vez, ao se referir à incorporação, apenas

limita-se a dizer que: “O STJ entendeu que a incorporação é uma espécie de execução por

administração e empreitada, sendo incluída no item da lista, pois há a fusão de dois

contratos: compra e venda e empreitada (...).”

Não obstante, em edições anteriores de sua obra, o citado autor já havia feito

remissão no sentido de não incidir o ISSQN sobre a referida atividade, mencionando que

os serviços eram feitos para a própria empresa e não para terceiros, caso em que era

descabida a tributação.

167 Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITBI), acha-se previsto no inciso II, do art. 156, da Constituição da República Federativa do Brasil de 05/10/1.988. A Lei Complementar que trata do ITBI, nos termos em que exige o art. 146, III, “a”, da Magna Carta é a Lei n. 5.172/66 – CTN, a qual, em seus artigos 35 a 42, regula as hipóteses de incidência. Todavia, convém observar que o CTN foi editado sob a égide da Constituição de 1.946, e suas respectivas emendas, época em que, o ITBI, achava-se unificado ao Imposto Sobre a Transmissão Causa Mortis (ITCMD). Por esta razão, os artigos. 35 a 42 tratam dos dois impostos simultaneamente, cabendo ao intérprete identificar os dispositivos que se referem a um ou outro imposto. No que se infere a hipótese de incidência, esta se refere à transmissão, por ato oneroso de bens imóveis inter vivos (art. 156, II, CF/88), excluindo-se a sucessão causa mortis e a doação, cuja competência, por força constitucional é do Estado (art. 155, I), na qual, dispõe o inciso I do art. 35 do CTN, diz que o fato gerador da obrigação tributária é a “transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil”. 168 Martins, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. p. 188.

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Gilberto Rodrigues Gonçalves169, abordando a temática, discorrendo

superficialmente sobre o incorporador e a celeuma que permeia a matéria, bem como

sobre algumas decisões judiciais, conclui pela não incidência, divulgando:

Entendemos que essa dificuldade tem origem justamente no fato de se estar pretendendo a incidência do ISS sobre relação alheia à hipótese legal. Incorporar não é construir, não é prestar o serviço de executar obra de construção civil. Ficamos, pois, com a convicção de que não é exigível o ISS na incorporação, até por falta de previsão legal específica na lista de serviços.

Bernardo Ribeiro de Moraes170, sem maior aprofundamento na matéria,

porém discorrendo sobre a incidência do ISSQN no setor de construção civil posiciona-se

pela tributação, dizendo:

Na incorporação imobiliária, que ocorre com o condomínio, especial (propriedade horizontal ou condomínio em edificações), o incorporador estará sujeito ao ISS, neste item, apenas quando executar a obra (para a qual exige uma taxa de execução).78 Ao se dedicar apenas à administração do condomínio, o incorporador presta atividade aos condôminos, não constituindo esta serviço de execução de obras de construção civil.

Encerrando as argumentações doutrinárias, tem-se Walter Gaspar171, autor

radicado no Município do Rio de Janeiro, berço das principais manifestações no sentido

de acolher a tributação do ISSQN sobre a atividade de construção e incorporação sem

maiores delongas. Gaspar afirmando a tributação, relata que a atividade do incorporador

pouco se distancia da construção por empreitada, e como tal, para fins tributários, não se

diferencia, informando ainda, que o imposto sobre serviço incide normalmente. Descreve

tal situação da seguinte forma:

Situação diametralmente oposta é aquela em que uma pessoa constrói um edifício e, depois da obra pronta, começa a vender as unidades. Nessa hipótese, temos uma obra executada em benefício próprio. Não incide o ISS e, nas vendas, somente incide o ITBI.

Destarte, verifica-se que no campo doutrinário a incidência do imposto

sobre serviços na construção e incorporação imobiliária não é pacífica, cabendo ao Poder

Judiciário a função pacificadora, visto que a ânsia tributante dos agentes arrecadadores,

sempre vai além do permissivo constitucional, procurando na maioria das vezes abraçar

hipótese de incidência não permitidas pela lei.

169 GONÇALVES, Gilberto Rodrigues. ISS na construção civil. p. 85-86. 170 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. p. 249-250. 171 GASPAR, Walter. ISS – teoria e prática. p. 174.

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4.3.2. Do posicionamento jurisprudencial

Desde logo, deve-se dizer que, jurisprudencialmente, há duas correntes

acerca da incidência do ISSQN sobre o segmento de construção e incorporação.

4.3.2.1. Da não incidência

O Superior Tribunal de Justiça ao abordar a tributação do ISSQN sobre a

atividade de construção e incorporação imobiliária, ao julgar o recurso especial n.

1.625/RJ172, afastou a incidência e divulgou:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. I – Comprovado que a parte promovia as construções em terreno de sua propriedade pelo sistema de incorporação, na qualidade de proprietária-incoporadora, não há falar-se em prestação de serviços, pois impossível o contribuinte prestar a si próprio o serviço, desvanecendo, destarte, o fato imponível do ISS. II – Procedentes. III – Recurso desprovido.

Por ocasião da decisão, entendeu STJ que a atividade de construção e

incorporação imobiliária não se sujeita ao ISSQN, por entender que não há prestação

serviços a terceiros, sendo impossível de se tributar o auto-serviço.

Em outra oportunidade, a colenda Segunda Turma do Superior Tribunal de

Justiça, ao julgar o Resp n. 10.054/RJ173, não se furtou em reconhecer a não incidência,

conforme se verifica da seguinte ementa:

TRIBUTÁRIO. ISS. CONSTRUÇÃO CIVIL. NÃO INCIDÊNCIA. - Não está sujeita à incidência do ISS a empresa que, em terreno seu constrói imóveis, por conta própria, para revenda. - Recurso não conhecido.

Na ocasião, verificou-se que o caso sub judice tangia hipótese em que o

sistema de construção em nada se consubstanciava à atividade de incorporação

imobiliária, pois tratava de hipótese em que a empresa construía com recursos próprios,

sem, no entanto, ter alienando o bem ainda na sua fase de construção.

172 STJ. REsp. nº 1.625/RJ. Rel. Min. Geraldo Sobral, j. em 06/03/1991. 173 STJ. REsp. nº 10.054/RJ. Rel. Min. Américo Luz, j. 16/05/1994.

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Assim, para essa corrente jurisprudencial, o fato do incorporador construir

em terreno de sua propriedade, com recursos próprios e para posterior revenda, a

incidência do imposto sobre serviços resta afastada, uma vez que é impossível se tributar

o auto-serviço e por inexistir expressa previsão na lista.

4.3.2.2. Da incidência

Versando sobre a incidência do imposto sobre serviços, tomando por

referência a atividade de incorporação imobiliária, a priori, traz-se à colação um trecho de

sentença proferida pela 6ª. Vara de Fazenda Pública do Município do Rio de Janeiro,

onde, ao se julgar a Ação Ordinária n. 471174, o Excelentíssimo Magistrado,

posicionando-se pela tributação, assim sentenciou:

De tanto se extrai que não paga o ISS aquele que constrói para si, pois não há a possibilidade de tributação sobre serviços de quem o executa para si próprio. Não o pagaria o médico que receita para si, nem o advogado que só atua em causa própria, nem o proprietário do imóvel que o edificou e o vende pronto. Construindo para si, ou para revenda (alienação depois de edificado), não há incidência do ISS. A atividade de incorporador está exatamente na compra do terreno (ou utilização do terreno de terceiros), propondo-se à edificação (empreendimento), vendendo as unidades no curso da obra. Se a venda é feita de coisa edificada, não há ISS; mas se é feita para entrega futura, aí está a atividade do incorporador. Construir para si ou construir para revenda do que foi (...) não enseja o pagamento do ISS. Mas fazer incorporação e vender as unidades em lançamento, fazendo o adquirente integrar aquela incorporação, regida por lei própria, inocultavelmente o alienante da cessão é incorporador, e pela sua atividade, é contribuinte do imposto municipal.

Em grau de primeira instância, entendeu-se que o incorporador que

constrói com recursos próprios, em terreno de sua propriedade, realizando a venda

(alienação) após ter concluído o empreendimento, não se sujeitaria à incidência do ISS,

devendo ser esclarecido que nesta hipótese não se trata de incorporação, visto que

inexiste alienação antes ou durante a execução do empreendimento, nos termos da Lei

de Condomínios e Incorporações. Em situação diversa, onde as alienações são

efetuadas antes ou no decorrer da execução, a hipótese do ISSQN estaria presente.

174 In GASPAR, Walter. ISS – teoria e prática. p. 175.

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Nesse sentido, o STJ, ao dar guarida à sujeição da atividade de construção

e incorporação imobiliária ao ISSQN, entendeu que o contrato de incorporação imobiliária

se constitui pela junção de dois contratos: compra e venda e empreitada, sendo o

construtor-incorporador empreiteiro, conforme se sobressai da decisão proferida no REsp

n. 57.478-1/RJ175, cuja decisão restou assim ementada:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – DECRETO-LEI 406/68 – INCORPORAÇÃO DE IMÓVEIS- INCIDÊNCIA- TABELA ANEXA AO DECRETO-LEI 406/68 – ITEM 32 – Na incorporação, fundem-se dois contratos: compra e venda e empreitada. Assim, o construtor-incorporador é também empreiteiro. Sua atividade constitui execução por administração, empreitada ou subempreitada, de construção civil, correspondendo ao tipo descrito no item 32 da tabela anexa ao Decreto-Lei 406/68. Imposto Sobre Serviços devido. Segurança denegada.

Cumpre esclarecer que o referido item 32, da tabela anexa ao DL n.

406/68, corresponde, na LC n. 116/2003, ao subitem 7.02.

Em seu voto, o Ministro Humberto Gomes de Barros, ao se posicionar pela

incidência do imposto, foi enfático em dizer que:

(...) ao praticar incorporação, o construtor, antes dono do imóvel, passa a edificar no interesse de outras pessoas que serão condôminos, no terreno e nas partes comuns e proprietários exclusivos das unidades (salas, apartamentos, etc.) que comporão o Prédio. Na incorporação, fundem-se dois contratos: o de compra e venda e o de empreitada, pelo qual o construtor – incorporador se obriga, perante o adquirente da fração ideal, a construir o edifício de que ele será um dos proprietários. Não há dúvidas de que o construtor – incorporador é, também empreiteiro. Se assim é, sua atividade constitui “execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de construção civil”.

Sem, no entanto, fazer remissão a Lei de Condomínios e Incorporações, o

Eminente Ministro traçou uma importante dicotomia, cindindo os conglomerados de

ajustes em que se ampara o contrato de incorporação imobiliária em dois instrumentos:

compra e venda, relativa à fração ideal do terreno; e, empreitada, relativa à construção

do edifício (empreendimento), fazendo o ISSQN incidir sobre tal ajuste, tipificando-o

segundo as regras do item 32 do DL n. 406/68.

No mesmo sentido, ao julgar o Recurso Especial n. 41.383-RJ176, a

Colenda Segunda Turma, na voz do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, foi ainda mais

175 STJ. REsp. n.º 57.478-1/RJ. Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. em 03/04/1995. 176 STJ. REsp. n. 41.383/RJ. Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. em 05/12/1.994.

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contundente, afirmando que se o incorporador acumula a função do construtor, e não

sendo a obra executada para si ou para posterior revenda, não há como se afastar a

incidência do ISSQN.

Ao abordar a temática, o Ministro Relator, tratando da incidência do ISSQN

sobre a atividade de construção e incorporação imobiliária, utilizou como razão de decidir

os argumentos exarados na sentença de primeiro grau, a qual transcreveu ipsis littteris, e

na qual o Excelentíssimo Magistrado versou sobre a previsão legal da atividade de

incorporação imobiliária dentro da lista de serviços, antecedida da exegese da atividade

frente á Lei de Condomínios e Incorporações, afirmando que:

O legislador não foi omisso, não deixou de tributar voluntariamente as construções por incorporação. Simplesmente porque a incorporação, em si, não é atividade de construção, podendo todavia o incorporador assumir aquela atividade voluntariamente, ou mesmo as responsabilidades dos ilícitos decorrentes daquela atividade, ante a solidariedade legal estabelecida entre ele, incorporador e o construtor. Então, a evidência, a atividade de incorporação não é fato gerador do ISS, todavia a construção o é quando o incorporador assume as funções de construtor, por esta atividade, quer seja ela realizada sob a forma de empreitada ou administração, está ele obrigado ao tributo.

Desta feita, por unanimidade, a Segunda Turma do STJ decidiu por acolher

a sujeição da atividade de construção e incorporação imobiliária ao ISSQN, em acórdão,

assim ementado:

Tributário. Imposto sobre serviços. Incorporação de imóveis. Lei n.º 4.591/64. Decreto-lei n.º 406/68. Decreto-lei n.º 834/69. I – Se o incorporador assume as funções de construtor, por esta atividade, seja realizada por forma de empreitada ou de administração, está obrigado ao tributo. II – No caso, as instâncias ordinárias entenderam não haver prova de que os imóveis incorporados foram construídos pela autora para si própria ou para venda posterior, hipótese em que a exação não é devida, conclusão essa que não pode ser infirmada por meio do recurso especial, porquanto envolve o reexame da prova (sumula n.º 07-STJ). III – Ofensa ao art. 8º do Decreto-lei n. 406/68 não caracterizada. Dissídio pretoriano não configurado. IV – Recurso especial não conhecido.

Assim, esta corrente jurisprudencial, sedimentada no Superior Tribunal de

Justiça, sem se deter nos conglomerados de ajustes em que se sedimenta a atividade de

construção e incorporação imobiliária, de uma forma simples e objetiva, entende que o

contrato de incorporação imobiliária se divide em dois instrumentos distintos: compra e

venda e subempreitada.

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Desta forma, se o incorporador assumir a função de construtor e vender

(alienar) as frações ideais do terreno, vinculada a unidades autônomas, a construir ou em

construção, estará sujeito ao ISSQN, uma vez que estará executando obra a terceiros,

sob o regime de administração, empreitada ou subempreitada, caracterizando a hipótese

de incidência prevista no subitem 7.02 da lista de serviços.

Observa-se, de acordo com esta corrente jurisprudencial, que o objeto da

tributação não é a incorporação, mas sim a execução da obra. Uma vez que de outro

modo não poderia ser, levando em consideração que a atividade de incorporar, em si,

não carrega elementos de prestação de serviços, não podendo, portanto, se sujeitar à

incidência do citado tributo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As considerações que se seguem têm como supedâneo o escopo

perseguido no presente trabalho, que, de forma razoável e lógica, procurou explicitar os

contornos normativo, doutrinário e jurisprudencial da hipótese de incidência do imposto

sobre serviços de qualquer natureza e do segmento de construção e incorporação, bem

como, da problemática no que concerne à tributação pelo ISSQN da atividade de

construir e incorporar, em função da venda antecipada.

Assim, de forma simples e objetiva, discorreu-se sobre a hipótese de

incidência do ISSQN (aspecto material), assim entendida a previsão legal sine qua non

para o surgimento da obrigação tributária, que deve, necessariamente, anteceder à

concreção (realização) do evento da vida econômica ou do cotidiano do indivíduo, cujo

fato ou ato a norma dotou de relevância jurídica para o surgimento da obrigação tributária.

Importante observar que o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza,

na forma do que foi preconizado no capítulo dois, possui por hipótese de incidência a

“prestação de serviços”. Deve, então, ser compreendido como ato ou efeito de realizar a

outrem, trabalho tendente à satisfação das necessidades da parte contratante.

Pressupõe, sempre, uma relação com outra pessoa, a qual se materializa sob a

roupagem de obrigação de fazer, cuja sujeição fica condicionada à positivação prévia da

atividade dentro da lista de serviços, editada pela legislação ordinária municipal.

Nota-se ainda, segundo as ilações do capítulo três, que a atividade de

incorporação se traduz na alienação (venda) de fração ideal de terreno, sobre a qual se

acha vinculada uma unidade autônoma a ser construída ou em construção, em que o

incorporador se obriga a promover a construção, responsabilizando-se, conforme o caso,

pela entrega, a certo prazo, preço e em determinadas condições.

É relevante, também, considerar que a incorporação é a sucessão de atos

pelos quais o incorporador e compromissário comprador pactuam o interesse na

aquisição de uma unidade autônoma, partilhando no mesmo instrumento a venda de

fração ideal do terreno e a construção do edifício, cujos ajustes ficam sujeitos à tributação

diversa.

Outro ponto de elevada importância se conduz no fato de que a atividade

de incorporar tem o escopo de constituir o condomínio pela comunhão de diversos

proprietários sobre um mesmo bem e partes comum. Desta forma fica o incorporador

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encarregado de representar os condôminos. Deve, para tanto, estar investido de

mandato, uma vez que praticará atos em nome de terceiro e ainda, com a incumbência

de realizar todos os atos necessários à averbação da unidade autônoma ao terreno,

formando um único corpo, transformando-se no imóvel pronto e acabado.

Outro ponto importante a ser ressaltado, diz respeito ao fato de que as

atividades de construção e incorporação são distintas. Desta maneira é facultado ao

incorporador exercer ou não o ofício de construtor, caracterizando-se como um típico

prestador de serviços, no que se refere à construção das unidades autônomas, vendidas

previamente, uma vez que estará construindo a terceiros, visto que pela venda

antecipada, o poder de disponibilidade do incorporador é subtraído e transferido aos

promitentes compradores, tanto que o incorporador não mais poderá modificar o projeto

sem a prévia anuência dos adquirentes.

Posto isto, não há como escusar que o incorporador/construtor em

determinadas circunstâncias, é um típico prestador de serviços, à luz dos conceitos claros

e objetivos da Lei complementar n. 116/03, bem como nos estreitos limites talhados na

Lei de Condomínio e Incorporações. Quando o mesmo vende as frações ideais do

terreno vinculada à unidade autônoma a construir, assume a obrigação de dar coisa

certa; quando assume a condição de construtor, obrigando-se a construir as unidades,

quer por empreitada ou administração, assume a obrigação de fazer, o que se coaduna

ao conceito de prestação de serviços.

Por se tratar do exercício de duas atividades distintas e simultâneas

(incorporar/construir), o incorporador fica sujeito a dois impostos distintos: ITBI e o

ISSQN, ambos de competência municipal. Todavia, esclarece-se que o ISSQN, somente

incidirá em determinadas circunstâncias e o ITBI, em todos os casos. Deve-se, portanto,

esclarecer que a sujeição ao imposto sobre transmissão de bens imóveis inter vivos,

dependerá da legislação de cada Município, visto que a Lei n. 5.172/66, na qualidade de

Lei Complementar (art. 42) deixou ao alvitre do Legislador Municipal eleger o contribuinte

Neste diapasão, há de se dizer que a incidência do ISSQN, à luz do

conteúdo talhado no capítulo dois, somente ocorrerá quando o incorporador assumir a

função de construtor. Entretanto, esclarece-se que somente haverá a sujeição ao imposto

sobre serviços, nos casos em que as alienações ocorrerem antes ou durante a execução

da obra, uma vez que o incorporador se despe da disponibilidade do empreendimento,

passando a exercer a função de construtor, seja por empreitada ou administração, cujo

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custeio da construção é repassado aos adquirentes, caracterizando-se típica prestação

de serviços prevista no subitem 7.02, da lista de serviços, anexa à L.C. n. 116/03.

A problemática quanto à incidência retorna quando do cálculo do imposto

verificar-se que nem todas as unidades foram vendidas, permanecendo algumas com o

incorporador que contribuiu pecuniariamente para a sua concreção. Nesta hipótese, a

questão não se circunscreve à incidência, mas sim, ao aspecto quantitativo do imposto

(base de cálculo), cujo conteúdo não foi objeto da presente pesquisa. Mesmo assim, há

de se dizer que caberá à legislação ordinária municipal prever e disciplinar a matéria,

porque nesta hipótese há a mescla de prestação de serviços a terceiros e a execução de

serviços ao próprio executor (auto-serviço), não sendo passível de tributação, por estar

ausente o pressuposto de transferência de bem imaterial a terceiro (serviço/trabalho).

Não obstante, salienta-se que o ISSQN incidirá somente sobre a

construção (unidade autônoma vendida) e não sobre a venda (alienação) da fração ideal

do terreno, uma vez que esta é fato gerador do imposto sobre transmissão de bens

imóveis inter vivos (ITBI).

Na prática, quando da lavra da escritura pública, com a respectiva

transmissão para o adquirente da fração ideal do terreno averbada à unidade autônoma,

os Municípios exigem o ITBI sobre a integralidade do bem, numa verdadeira ação de bis

in idem, o que é vedado no ordenamento pátrio. Nessa esteira, há de se dizer que, se o

promitente comprador contratou uma prestação de serviços tributada pelo ISSQN, no que

concerne à unidade autônoma (a construir ou em construção), não há se falar na

exigibilidade do ITBI, haja vista que a incidência de um imposto sobre determinado fato

gerador, afasta prima facie, a incidência de outro. Desse modo, o imposto sobre

transmissão deve incidir somente sobre a fração ideal do terreno e dependendo da

legislação municipal, o contribuinte será o adquirente.

Será, ainda, objeto da incidência do ISSQN quando o incorporador, embora

acumulando ou não a função de construtor, assumir a função de administrador do

condomínio, ou seja, comprometer-se em gerir atividades necessárias aos condôminos,

tais como pesquisar preços, contratar prestadores de serviços necessários à execução da

obra entre outros, cuja função recai sobre cada um dos condôminos, os quais, à luz da

Lei de Condomínio e Incorporações, podem se reunir em assembléia e eleger um síndico,

ao qual incumbirá a função de representar o condomínio perante terceiros, nada

obstando, que este possa ser inclusive o próprio incorporador.

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Desse modo, se o incorporador assumir a função de gestor, este estará

sujeito ao ISSQN, por exercer a atividade de administração de bens de terceiros, cuja

tipicidade recai no subitem 17.12 da lista de serviços, anexa à LC n. 116/03.

Não há de se aduzir que a administração é inerente ao contrato de

incorporação, pois conforme visto no capítulo três, a única obrigação do incorporador, no

caso deste não ser o construtor, circunscreve-se ao dever de requerer a averbação da

construção das edificações, para efeito de individualização e discriminação das unidades,

após a concessão do “habite-se” pela autoridade administrativa, e, posteriormente,

providenciar as respectivas transmissões, respondendo o incorporador pelas perdas e

danos que resultem da demora no cumprimento dessa obrigação.

Assim, a administração é avença extraordinária, sendo facultada sua

contratação, a qual uma vez pactuada não escapará à percepção da exigência tributária,

a exemplo do que ocorre com a construção, tendo em vista que o incorporador não está

administrando bens próprios, mas sim bens de terceiros.

Não se cogitará da incidência do ISSQN quando o incorporador, mesmo

acumulando a função de construtor, processar todos os atos preparatórios para o

lançamento do empreendimento à venda, à luz do que dispõe o art. 32 da Lei de

Condomínios e Incorporações, não comprometer por intermédio da alienação, nenhuma

das unidades, e ainda, em terreno de sua propriedade concluir a construção com

recursos próprios ou por intermédio de empréstimos financeiros em seu nome, vendendo

as unidades somente após a conclusão definitiva.

Nessa hipótese, acha-se presente à figura do auto-serviço, ou seja, o

incorporador-construtor executou os serviços a si mesmo, não sendo possível sua

tributação, por se encontrar ausente a transmissão de bem imaterial a terceiro

(trabalho/serviço) que se traduziria na execução da obra. Sob essa conjectura, a única

incidência permitida é a do ITBI, quando da transmissão da propriedade.

Acreditando-se ter alcançado os objetivos perquiridos, no que concerne à

investigação da problemática da incidência ou não do ISS sobre o segmento de

construção e incorporação em função da venda antecipada, há de se registrar que a

matéria não se exaure aqui, havendo muito a ser dito, principalmente quanto ao

embaraçoso tema pertinente ao aspecto quantitativo (base de cálculo), bem como no que

se refere ao aspecto pessoal (sujeito passivo), cujo tema, há de ser explorado em outro

momento oportuno.

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