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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES ERICA CUNHA PINTO A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO E A PRODUTIVIDADE ORIENTADOR: Carlos Alberto Cereja de Barros Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

ERICA CUNHA PINTO

A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO

TRABALHO E A PRODUTIVIDADE

ORIENTADOR: Carlos Alberto Cereja de Barros

Rio de Janeiro

2005

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2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

ERICA CUNHA PINTO

A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO

TRABALHO E A PRODUTIVIDADE

Monografia apresentada à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial

para a conclusão do curso de Pós-

Graduação Lato Sensu/Especialização

em Gestão de Recursos Humanos.

Rio de Janeiro

2005

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3

AGRADECIMENTOS

A todos que direta ou indiretamente colaboraram para a realização deste

trabalho acadêmico e em especial para as amigas Juliana Abrantes, Camila

Nicolich e Renata de Almeida pela parceria, confiança e amizade que para

sempre se estenderá.

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4

DEDICATÓRIA

Dedico a Deus pela oportunidade de viver

e buscar todos os dias ser alguém melhor

do que ontem, e aos meus pais pela

educação e pelo que sou.

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5 RESUMO

A presente monografia faz uma retrospectiva da evolução do conceito

de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) até os dias atuais. Analisa a

contribuição dada por alguns pesquisadores nesse campo de estudo e

identifica as suas dimensões. Tem por objetivo demonstrar que um programa

voltado para a qualidade de vida no trabalho pode influenciar no resultado final

do serviço prestado pelo funcionário, ou seja, procura estabelecer uma relação

entre a qualidade de vida no trabalho em seu ambiente laboral e sua

produtividade, abordando os aspectos mais relevantes da relação empregado-

empresa.

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6 METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, que tem por objetivo

desenvolver os aspectos mais relevantes da relação empregado-empresa no

que tange a qualidade de vida no trabalho (QVT), recorrendo-se a livros,

monografias, artigos e periódicos publicados sobre o assunto, cujos conteúdos

serão analisados de maneira descritiva, procurando verificar a inter-relação

entre a qualidade de vida no trabalho e produtividade.

A pesquisa constará das seguintes etapas: identificação das fontes de

pesquisas (livros, revistas, artigos); leitura do material selecionado;

organização dos textos; e, redação da monografia.

Nesse sentido, primeiro desenvolveu-se o por quê e em seguida o

objetivo da investigação, posteriormente buscou-se questões que

fundamentassem a pesquisa como: estabelecer congruência entre qualidade

de vida no trabalho e desempenho; de que forma a qualidade de vida no

trabalho pode influenciar no estado de satisfação e comprometimento dos

colaboradores com a organização, proporcionando a máxima produtividade de

maneira a alcançar os resultados pré-estabelecidos pela direção; analisar se os

programas de qualidade implantados estariam levando em consideração a

saúde do trabalhador; e, de que maneira a qualidade de vida no trabalho

interfere na saúde do trabalhador.

Por último a justificativa da investigação e a elaboração do trabalho.

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7 SUMÁRIO

RESUMO

INTRODUÇÃO .......................................................................................

05

08

1 O TRABALHO 11

2 A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO (QVT)................................. 13

2.1 Origem e evolução................................................................................ 13

2.2 Conceito................................................................................................. 14

2.3 Fatores relacionados à QVT................................................................ 20

3 DETERMINANTES DA QVT.................................................................. 22

3.1 Cultura Organizacional......................................................................... 22

3.2 Infra-estrutura familiar.......................................................................... 23

3.3 Relações interpessoais........................................................................ 26

3.4 Fatores intrapessoais........................................................................... 26

4 AS ORGANIZAÇÕES E QVT 27

4.1 A responsabilidade das organizações com a QVT............................ 27

4.2 A relação entre produtividade e QVT.................................................. 31

5 SUGESTÕES PARA A PROMOÇÃO DA QVT.................................... 36

CONCLUSÃO ........................................................................................ 41

REFERÊNCIAS 46

ANEXO 48

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8 INTRODUÇÃO

Após o período da Administração Científica do Trabalho (Taylorismo),

onde o ser humano era visto como uma máquina, surge - em oposição - na

década de 30, a Escola das Relações Humanas que lançou as bases para o

que hoje se entende como movimento de Qualidade de Vida no Trabalho

(QVT). Sua relevância foi, principalmente, a teorização sobre a importância do

ser humano ser respeitado em seus aspectos físico/orgânico, mental e social.

Nos anos 50, com o corrente sócio-técnica, surgem às tentativas de se

resgatar o trabalho mais digno, mais humano, equilibrando isto com uma

melhor organização técnica. No período que se seguiu, houve uma maior

reflexão sobre os aspectos motivacionais no trabalho.

Já na década de 70, na França, é aprovada sob forma de lei, a

obrigatoriedade de todas as organizações desenvolverem um planejamento

que vise a melhoria da “Qualidade de Vida no Trabalho”. Nesta época,

desenvolve-se a idéia de que as necessidades e as aspirações humanas

também são parte da responsabilidade social do empregador.

Na década de 80, o ponto central dos estudos versou sobre a

necessidade de uma maior participação do empregado nas decisões da

organização.

A década de 90 foi marcada pela necessidade de se ir além dos

cuidados com o empregado dentro da empresa, mas da abrangência dos

cuidados e das orientações para com a saúde geral destes, e dos seus

familiares também. As organizações começaram a entender que a “Qualidade

de Vida no Trabalho” não pode ser dissociada da “Qualidade de Vida” do ser

humano como um todo.

Na análise do trabalho e suas dimensões, deve-se abordar o

trabalhador como um todo, elaborando hipóteses sobre as relações entre as

condições e organização do trabalho e as manifestações expressas ou

indiretas de fadiga, desgaste, desconforto, mal-estar e doenças. Chegando-se

à conclusão, muitas vezes, que os males que acometem o ser humano, são

fruto da associação do trabalho que ele desenvolve com o seu estilo de vida.

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9 Assim, o estudo das doenças ocupacionais e das doenças relacionadas

ao trabalho, oferece importante oportunidade para atuação em prevenção e

melhoria da qualidade de vida no trabalho, no entanto, estas doenças

constituem apenas uma pequena parcela das atuais causas de mortalidade e

morbidade dos empregados, pois, doenças cardiovasculares e outras doenças

crônico-degenerativas, somam a maior parte, ainda que estas possam ter

relação direta ou indireta com males decorrentes da pressão desenvolvida no

ambiente de trabalho.

A responsabilidade sobre uma melhor qualidade de vida não é tarefa

individual, mas deve ser compartilhada com o empregador e o governo, tendo a

sociedade para cobrar estas maiores oportunidades de qualidade de vida no

trabalho, o que em conseqüência, traduz-se em maior eficiência e

produtividade.

Nesse sentido, os Programas de Promoção da Saúde (PPS) têm sido

desenvolvidos em muitas empresas. Os aspectos mais freqüentemente

enfocados são as atividades físicas e recreacionais, dentro das empresas,

trazendo uma grande contribuição ao bem-estar dos empregados, seja para

aqueles funcionários onde sua demanda é excessiva, ou naqueles outros, cuja

capacidade mental está muito acima da demanda. Com isso, há um aumento

da satisfação com o trabalho, uma melhor imagem da corporação, maior

facilidade para o recrutamento de pessoal, um aumento na quantidade e

qualidade da produção, um decréscimo em absenteísmo e turnover, uma

redução nos gastos com saúde e uma menor prevalência de doenças

ocupacionais e acidentes de trabalho.

Essas constatações pretendem ser desenvolvidas ao longo do trabalho

ao se analisar:

· No capítulo I, o conceito de trabalho como condição básica para existência

humana, sua importância para o desenvolvimento de cada indivíduo e as

variáveis produzidas por ele como sofrimento mental e estresse;

· No capítulo II, analisa-se a origem e evolução do conceito de qualidade de

vida nas organizações e os diferentes enfoques dados pelos pesquisadores,

quem embora não tenha uma decisão consensual para a expressão são

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10 unânimes em dizer que atende tanto aos interesses dois indivíduos como

da organização, ou seja, ao mesmo tempo em que melhora a satisfação do

empregado, melhora a produtividade da empresa.

· Já no capitulo III, pretende-se verificar através das características da cultura

organizacional configurada pela prática e valores predominantes na

empresa, infraestrutura familiar, relações interpessoais e fatores

interpessoais, como as pessoas se relacionam com o seu trabalho e

conseqüentemente como esses fatores determinam a QVT.

· No capitulo IV, destina-se a analise da responsabilidade das organizações

com a QVT levando-se em consideração as condições organizacionais e

seus impactos sobre a vida psíquica dois trabalhadores; a função da

organização e à responsabilidade dos sujeitos em torno do bem estar

global; os reflexos das condições de vida neste contexto e por último a

responsabilidade não só do indivíduo mais também da organização na

manutenção da integridade, dignidade e cidadania. Propõem-se ainda a

ratificar a relação direta entre produtividade e QVT partindo-se do pré-

suposto, que o sucesso ou insucesso das organizações depende

diretamente do desempenho das pessoas, que nelas trabalham e por último

fornecer estruturas ou modelos de analise da Qualidade de Vida no

Trabalho.

· O capítulo V procura através de sugestões e exemplos desmistificar e

incentivar a adoção de programas de QVT pelas empresas, demonstrando

que o fracasso do programa esta na maneira em que foi implementado e

ou é resultado da falta de posicionamento estratégico da empresa, da falta

de confiança dos próprios gestores depositam no programa, que é visto

muito mais como gasto do que como investimento, sem a perspectiva de

um diferencial para a competitividade entre as empresas.

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11 1. O TRABALHO

De acordo com ARENDT (1999) o trabalho é uma das condições básicas

para a vida humana. O trabalho produz um mundo artificial de coisas buscando

transcender as vidas individuais. Ao acrescentar objetos ao mundo, o trabalho

possibilita a criação de um ambiente de coisas permanentes com as quais nos

familiarizamos através do uso.

Para Altafulla apud BENITO & SCHMIT (1997), o trabalho pode ser

considerado basicamente como o conjunto de ações que levam à produção de

bens individuais e coletivos, promovendo o desenvolvimento pessoal, familiar e

até de uma nação.

Por outro lado, as variáveis intervenientes no trabalho podem gerar

agressões ao trabalhador, e, neste sentido, DEJOURS (1992) esclarece que a

organização do trabalho pode estabelecer uma relação de dominação da vida

psíquica do sujeito e da ocultação de seus desejos.

A satisfação no trabalho tem importância fundamental na relação

“saúde-trabalho”. De acordo com DEJOURS (1992), a organização do trabalho,

exerce sobre o homem uma ação específica, cujo impacto é o aparelho

psíquico. O sofrimento mental começa quando o homem, no trabalho, já não

pode fazer nenhuma modificação na sua tarefa no sentido de torná-la conforme

as suas necessidades fisiológicas e a seus desejos psicológicos, isto é, quando

a relação homem trabalho é bloqueada.

O homem é um ser que tem necessidades, à medida que uma delas é

satisfeita, logo surge outra em seu lugar, neste sentido Maslow apud

CHIAVENATO (1996), classificou-as em uma escala de importância. Em um

nível inferior colocou as necessidades fisiológicas (dormir, comer, exercitar-se);

acima delas, as necessidades de proteção (estabilidade no emprego,

favoritismo ou discriminação no trabalho); quando as necessidades fisiológicas

e de proteção estão satisfeitas, passam a ser mais importantes as

necessidades sociais; acima destas, as necessidades egocêntricas (auto-

estima, auto-realização, confiança, independência, reputação, status,

aprovação, respeito).

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12 No contexto das sociedades urbanas dos países industrializados, as

necessidades sociais e egocêntricas são raramente satisfeitas. As condições

de vida moderna dão uma limitada possibilidade de satisfação destas

necessidades, deixando-as adormecidas.

Conforme BORGES & JARDIM (1997), um trabalho no qual a pessoa

não gosta do que faz, precisando realizar tarefas em ritmo acelerado, exigindo

pouco ou muito de suas capacidades, submetendo-se a problemas inter-

relacionais com superiores, pode levar ao estresse e à loucura.

DEJOURS (1992), enfatiza que os problemas organizacionais e de

relacionamento contribuem para as tensões no ambiente de trabalho e

menciona, ainda, que “até indivíduos dotados de uma sólida estrutura psíquica

podem ser vítimas de uma paralisia mental induzida pela organização do

trabalho” (p. 45).

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13 2. A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO (QVT)

2.1 Origem e evolução

Segundo RODRIGUES (1999), com outros títulos e em outros contextos,

mas sempre voltada para facilitar ou trazer satisfação e bem-estar ao

trabalhador na execução de suas tarefas, a qualidade de vida sempre foi objeto

de preocupação da raça humana. Historicamente exemplificando, os

ensinamentos de Euclides (300 a.C.) de Alexandria sobre os princípios da

geometria serviram de inspiração para a melhoria do método de trabalho dos

agricultores à margem do Nilo, assim como a Lei das Alavancas, de

Arquimedes, formulada em 287 a.C., veio a diminuir o esforço físico de muitos

trabalhadores.

No século XX, muitos pesquisadores contribuíram para o estudo sobre a

satisfação do indivíduo no trabalho. Entre eles destacamos Helton Mayo, cujas

pesquisas, conforme FERREIRA et al. (1999), HAMPTON (1991) e

RODRIGUES (1999), são altamente relevantes para o estudo do

comportamento humano, da motivação dos indivíduos para a obtenção das

metas organizacionais e da Qualidade de Vida do Trabalhador, principalmente

a partir das pesquisas e estudos efetuados na Western Eletric Company

(Hawrthorne, Chicago) no início dos anos 20, que culminaram com a escola de

Relações Humanas.

Merece igualmente crédito o trabalho de Abrahan H. Maslow, que

concebeu a hierarquia das necessidades, composta de cinco necessidades

fundamentais: fisiológicas, segurança, amor, estima e auto-realização.

Douglas McGregor, autor da Teoria X, por sua vez, considerava, entre

outras coisas, que o compromisso com os objetivos depende das recompensas

à sua consecução, e que o ser humano não só aprende a aceitar as

responsabilidades, como passa a procurá-las, conforme FERREIRA et al.

(1999).

Essa teoria, aliás, na sua essência, busca a integração entre os

objetivos individuais e os organizacionais. Segundo RODRIGUES (1999),

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14 várias das dimensões destacadas por McGregor são analisadas e

consideradas em programas de QVT.

Vale mencionar também Frederick Herzberg. As pesquisas desse autor

detectaram que os entrevistados (engenheiros e contadores) associavam a

insatisfação com o trabalho com seu próprio ambiente e a satisfação do

trabalho ao seu conteúdo.

Assim, os fatores higiênicos - capazes de produzir insatisfação -

compreendem: a política e a administração da empresa, as relações

interpessoais com os supervisores, supervisão, condições de trabalho, salários,

status e segurança no trabalho. Os fatores motivadores - geradores de

satisfação abrangem: realização, reconhecimento, o próprio trabalho,

responsabilidade e progresso ou desenvolvimento (FERREIRA et al., 1999;

RODRIGUES, 1999).

NADLER e LAWLER apud FERNANDES (1996), FRANÇA (1997) e

RODRIGUES (1999) oferecem uma interessante e abrangente visão da

evolução do conceito de QVT, conforme anexo 1.

Vale ressaltar que o desafio imaginado pelos seus idealizadores

persiste, isto é, tornar a QVT uma ferramenta gerencial efetiva e não apenas

mais um modismo, como tantos outros que vêm e vão. E esse desafio torna-se

mais instigante neste momento em que nos vemos às voltas com uma rotina

diária cada vez mais desgastante e massacrante. Quando se pensava que os

seres humanos poderiam finalmente desfrutar do rápido progresso alcançado

em várias ciências, paradoxalmente o que temos visto é o trabalho como um

fim em si mesmo.

2.2 Conceito

São muitas as interpretações para a Qualidade de Vida no Trabalho.

Elas passam pelo foco médico com o diagnóstico de doenças do indivíduo, até

a exigência de elementos estruturais para o desenvolvimento de uma atividade

produtiva. Embora tenha sido uma preocupação do ser humano muito remoto,

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15 a idéia “sempre esteve voltada para facilitar ou trazer satisfação e bem-estar ao

trabalhador na execução de sua tarefa” (RODRIGUES, 1999, p. 76).

Segundo ALBRECHT (1992), a qualidade de vida no trabalho deve ser

definida em termos das percepções dos empregados e deve envolver pelo

menos os seguintes fatores: um trabalho que valha a pena fazer; condições de

trabalho seguras; remuneração e benefícios adequados; estabilidade no

emprego; supervisão competente; "feedback" quanto ao desempenho no

trabalho; oportunidades para aprender e crescer no emprego; uma

possibilidade de promoção com base no mérito; clima social positivo e justiça.

Para FRANÇA (1997),

Qualidade de vida no trabalho (QVT) é o conjunto das ações de uma

empresa que envolve a implantação de melhorias e inovações

gerenciais e tecnológicas no ambiente de trabalho. A construção da

qualidade de vida no trabalho ocorre a partir do momento em que se

olha a empresa e as pessoas como um todo, o que chamamos de

enfoque biopsicossocial. O posicionamento biopsicossocial

representa o fator diferencial para a realização de diagnóstico,

campanhas, criação de serviços e implantação de projetos voltados

para a preservação e desenvolvimento das pessoas, durante o

trabalho na empresa (p. 80).

A mesma pesquisadora esclarece que “a origem do conceito vem da

medicina psicossomática que propõe uma visão integrada, holística do ser

humano, em oposição à abordagem cartesiana que divide o ser humano em

partes” (p. 80). E conclui, ao afirmar que,

No contexto do trabalho esta abordagem pode ser associada à ética

da condição humana. Esta ética busca desde a identificação,

eliminação, neutralização ou controle de riscos ocupacionais

observáveis no ambiente físico, padrões de relações de trabalho,

carga física e mental requerida para cada atividade, implicações

políticas e ideológicas, dinâmica da liderança empresarial e do poder

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16 formal até o significado do trabalho em si, relacionamento e

satisfação no trabalho (FRANÇA, 1997, p. 80).

VIEIRA & HANASHIRO (apud VIEIRA, 1996) conceituam a Qualidade de

Vida no Trabalho como a melhoria nas condições de trabalho, envolvendo

variáveis comportamentais, ambientais e organizacionais na tentativa de

humanização do trabalho e de amenizar os conflitos entre o capital e o

trabalho.

BERGERON (apud FERNANDES, 1996, p. 43) apresenta uma definição

que merece destaque pela sua abrangência, onde a Qualidade de Vida no

Trabalho consiste

na aplicação concreta de uma filosofia humanista pela

introdução de métodos participativos, visando modificar um ou

vários aspectos do meio-ambiente de trabalho, a fim de criar

uma nova situação mais favorável à satisfação dos

empregados e à produtividade da empresa (BERGERON apud

FERNANDES, 1996, p. 43).

GUEST conceitua a Qualidade de Vida no Trabalho como:

um processo pelo qual uma organização tenta revelar o

potencial criativo de seu pessoal, envolvendo-os

[trabalhadores] em decisões que afetam suas vidas no

trabalho. Uma característica marcante do processo é que seus

objetivos não são simplesmente extrínsecos, focando melhora

da produtividade e eficiência em si; elas também são

intrínsecas no que diz respeito ao que o trabalhador vê como

fins de auto-realização e auto-engrandecimento “(GUEST apud

BÚRIGO, 1997, p. 37)”.

ALBUQUERQUE e FRANÇA (1997) consideram que a sociedade vive

novos paradigmas de modos de vida dentro e fora da empresa, gerando, em

conseqüência, novos valores e demandas de Qualidade de Vida no Trabalho.

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17 Para os referidos autores, outras ciências têm dado sua contribuição ao estudo

do QVT, tais como:

· Saúde - nessa área, a ciência tem buscado preservar a integridade física,

mental e social do ser humano e não apenas atuar sobre o controle de

doenças, gerando avanços biomédicos e maior expectativa de vida.

· Ecologia - vê o homem como parte integrante e responsável pela

preservação do sistema dos seres vivos e dos insumos da natureza.

· Ergonomia - estuda as condições de trabalho ligadas à pessoa.

Fundamenta-se na medicina, na psicologia, na motricidade e na tecnologia

industrial, visando ao conforto na operação.

· Psicologia - juntamente com a filosofia, demonstra a influência das atitudes

internas e perspectivas de vida de cada pessoa em seu trabalho e a

importância do significado intrínseco das necessidades individuais para seu

envolvimento com o trabalho.

· Sociologia - resgata a dimensão simbólica do que é compartilhado e

construído socialmente, demonstrando suas implicações nos diversos

contextos culturais e empresariais.

· Economia - enfatiza a consciência de que os bens são finitos e que a

distribuição de bens, recursos e serviços deve envolver de forma

equilibrada a responsabilidade e os direitos da sociedade.

· Administração - procura aumentar a capacidade de mobilizar recursos para

atingir resultados, em ambiente cada vez mais complexo, mutável e

competitivo.

· Engenharia - elabora formas de produção voltadas para a flexibilização da

manufatura, armazenamento de materiais, uso da tecnologia, organização

do trabalho e controle de processos.

Walton apud RODRIGUES (1999), considera que,

a expressão Qualidade de Vida tem sido usada com crescente

freqüência para descrever certos valores ambientais e humanos,

negligenciados pelas sociedades industriais em favor do avanço

tecnológico, da produtividade e do crescimento econômico (p. 81).

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18

Walton apud FERNANDES (1996) propõe, ainda, oito categorias

conceituais, incluindo critérios de QVT:

Em Compensação Justa e Adequada busca-se a obtenção de

remuneração adequada pelo trabalho realizado, assim como o respeito à

eqüidade interna (comparação com outros colegas) e à eqüidade externa

(mercado de trabalho).

Em Condições de Trabalho mede-se as condições prevalecentes no

ambiente de trabalho. Envolve a jornada e carga de Trabalho, materiais e

equipamentos disponibilizados para a execução das tarefas e ambiente

saudável (preservação da saúde do trabalhador). Ou seja, esse tópico analisa

as condições reais oferecidas ao empregado para a consecução das suas

tarefas.

O fator Uso e Desenvolvimento de Capacidades implicam o

aproveitamento do talento humano, ou capital intelectual, como está em voga

atualmente. É forçoso, portanto, reconhecer a necessidade de concessão de

autonomia (empowerment), incentivo à utilização da capacidade plena de cada

indivíduo no desempenho de suas funções e feedbacks constantes acerca dos

resultados obtidos no trabalho e do processo como um todo.

Oportunidade de Crescimento e Segurança abarca as políticas da

instituição no que concerne ao desenvolvimento, crescimento e segurança de

seus empregados, ou seja, possibilidade de carreira, crescimento pessoal e

segurança no emprego. Neste fator pode-se observar, através das ações

implementadas pelas empresas, o quanto à prática empresarial está de fato

sintonizada com o respeito e a valorização dos empregados.

Essencialmente, em Integração Social na Organização pode-se

efetivamente observar se há igualdade de oportunidades, independente da

orientação sexual, classe social, idade e outras formas de discriminação, bem

como se há o cultivo ao bom relacionamento.

Constitucionalismo mede o grau em que os direitos do empregado são

cumpridos na instituição. Implica o respeito aos direitos trabalhistas, à

privacidade pessoal (praticamente inexistente no mundo empresarial moderno),

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19 à liberdade de expressão (altamente em cheque, tendo-se em vista as enormes

dificuldades de trabalho com registro em carteira).

No fator Trabalho e o Espaço Total da Vida deveriam encontrar o

equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho. Todavia, como veremos mais

adiante, estamos muito distantes de uma prática minimamente ideal nesse

campo.

Por fim, em Relevância do Trabalho na Vida investiga-se a percepção

do empregado em relação à imagem da empresa, à responsabilidade social da

instituição na comunidade, à qualidade dos produtos e à prestação dos

serviços. Felizmente, esses aspectos vêm tendo significativos avanços no

campo empresarial.

Para SUCESSO (1998), pode-se dizer, de maneira geral, que a

qualidade de vida no trabalho abrange: renda capaz de satisfazer às

expectativas pessoais e sociais; orgulho pelo trabalho realizado; vida

emocional satisfatória; auto-estima; imagem da empresa/instituição junto à

opinião pública; equilíbrio entre trabalho e lazer; horários e condições de

Trabalho sensatas; oportunidades e perspectivas de carreira; possibilidade de

uso do potencial; respeito aos direitos; e justiça nas recompensas.

Para FERNANDES (1996, p. 43), não existe uma definição consensual

sobre a expressão Qualidade de Vida no Trabalho, porém, nos diferentes

enfoques, observa-se algo comum voltada para a “conciliação dos interesses

dos indivíduos e das organizações, ou seja, ao mesmo tempo em que melhora

a satisfação do trabalhador, melhora a produtividade da empresa”. Para a

mesma pesquisadora no Brasil o advento de programas de Qualidade Total

pode ter despertado o interesse sobre o assunto, em função da abertura de

mercado para a importação de produtos estrangeiros.

Para SILVA e DE MARCHI (1997), a adoção de programas de qualidade

de vida e promoção da saúde proporcionariam ao indivíduo maior resistência

ao estresse, maior estabilidade emocional, maior motivação, maior eficiência

no trabalho, melhor auto-imagem e melhor relacionamento. Por outro lado, as

empresas seriam beneficiadas com uma força de trabalho mais saudável,

menor absenteísmo/rotatividade, menor número de acidentes, menor custo de

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20 saúde assistencial, maior produtividade, melhor imagem e, por último, um

melhor ambiente de trabalho.

Com base nas posições dos diversos autores pesquisados percebe-se

que as condições que melhorariam a Qualidade de Vida no Trabalho são

abordadas de forma a contemplarem, (quando não coincidentes) os seguintes

aspectos: salário adequado e satisfatório; segurança e saúde no trabalho

(condições físicas de trabalho que reduzam ao mínimo o risco de doenças

ocupacionais e acidentes do trabalho); desenvolvimento das capacidades

humanas; autonomia no trabalho; múltiplas habilidades; informação e

perspectivas de crescimento profissional; crescimento profissional com espaço

para o desenvolvimento das potencialidades do trabalhador; integração social e

senso comunitário dentro das organizações; respeito à individualidade de cada

trabalhador; tratamento justo; e espaço de vida no trabalho e fora dele.

2.3 Fatores relacionados a QVT

Para HACKMAN & LAWLER (apud MORAES et al., 1995), os

trabalhadores satisfazem suas necessidades no ambiente laborativo a partir do

momento em que conseguem desenvolver suas tarefas com elevada

variedade, autonomia, identidade e feedback, além da possibilidade de

conviver em grupo e estabelecer laços de amizade. Para os autores, o

processo participativo é um dos objetivos da Qualidade de Vida no Trabalho.

Seguindo o mesmo raciocínio da participação, HUSE & CUMMUNGS

(apud RODRIGUES, 1999, p. 90) apontam para dois fatores responsáveis pela

Qualidade de Vida no Trabalho: “a preocupação com o bem-estar do

trabalhador e com a eficácia organizacional; e a participação dos trabalhadores

nas decisões e problemas de trabalho.”

FAUNE e DUBIN (apud FERNANDES, 1996, p. 43) relacionam

Qualidade de Vida no Trabalho com atribuições do cargo ocupado pelo

trabalhador dentro da organização, dando destaque para “nível de autonomia,

oportunidade para criatividade e reconhecimento pela realização do trabalho”,

como formas de promoção do atendimento das necessidades pessoais.

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21 O desenvolvimento do potencial criativo dos trabalhadores, através da

autonomia de decisão também está relacionado com a Qualidade de Vida no

Trabalho, conforme afirmam NADLER & LAWLER (apud FERNANDES, 1996,

p. 18), destacando que

a qualidade de vida no trabalho é um modo de pensar sobre as

pessoas, trabalho e organizações. [...] Seus elementos

distintivos são: preocupação sobre o impacto do trabalho sobre

as pessoas e a afetividade organizacional; a idéia de

participação na solução de problemas organizacionais e

tomadas de decisão.

Para NADLER & LAWLER (apud FERNANDES, 1996) o processo de

participação nos problemas da organização, a reestruturação do trabalho, as

inovações no sistema de recompensas e a melhoria do meio-ambiente de

trabalho são atividades representativas nas tentativas de ampliar a Qualidade

de Vida no Trabalho.

FERNANDES (1996) destaca que os quatro pontos indicados por Nadler

& Lawler são os elementos chave da Qualidade de Vida no Trabalho. Para a

autora, Qualidade de Vida do Trabalho pode ser definida como “a gestão

dinâmica de contingência de fatores físicos, tecnológicos e sócio-psicológicos

que afetam a cultura e renovam o clima organizacional, refletindo-se no bem-

estar do trabalhador e na produtividade das empresas.” (FERNANDES, 1996,

p. 45-46).

Para KANAANE (1995), a Qualidade de Vida no Trabalho está

relacionada com o desenvolvimento organizacional e voltada para aspectos de

satisfação no cargo e valorização do trabalho. Argumenta sua idéia apontando

indicadores da Qualidade de Vida no Trabalho: remuneração justa, ambiente

seguro e saudável, possibilidade de crescimento e segurança, autenticidade,

relevância social, espaço para lazer e família e metas de auto-realização.

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22 3. DETERMINANTES DA QVT

Para FISCHER (2000), as pessoas que valem a pena vão atrás de seus

sonhos e aprendem a arriscar. Não deixam que o medo domine sua força

interior e sua capacidade de transformação. Aceitam o jogo da vida, encaram

os desafios. Principalmente sabem que a vida só tem sentido porque se

sentem capazes de transformar não apenas a si mesmas mas também aqueles

que amam.

SUCESSO (1998) afirma que a escolha da profissão, as características

da cultura organizacional configurada pelos valores e práticas predominantes

na empresa, a infra-estrutura familiar constituem fatores para qualidade de vida

no trabalho. Além disso, as relações interpessoais, os conflitos e em especial a

maneira como a pessoa se relaciona na equipe afetam a satisfação no

trabalho, a auto-estima e a forma como se sente em relação a si mesma. A

história de vida e os fatores relativos às variáveis organizacionais resultam

atitudes dificultadoras e facilitadoras nas relações de trabalho, intensificando a

preocupação e a responsabilidade pela promoção da qualidade de vida.

Qualidade de vida trata da experiência emocional da pessoa com seu

trabalho, no momento em que tantas mudanças sociais e tecnológicas se

instalam de forma intensa e acelerada, abordando, ainda os efeitos desta

realidade no bem-estar da pessoa do ponto de vista emocional e profissional,

enfocando as conseqüências do trabalho sobre a pessoa e seus efeitos nos

resultados da organização.

3.1 Cultura Organizacional

Para RODRIGUES (1999), os valores, as crenças predominantes na

cultura organizacional configuram cenários que determinam em grande parte a

qualidade de vida. A formalidade ou a informalidade no tratamento, a altura das

divisórias, os bloqueios no acesso à diretoria, a diferença na decoração

constituem os primeiros sinais do que é valorizado na empresa.

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23 São muitos os argumentos utilizados para a definição dos privilégios,

desde admitir que a empresa é hierarquizada, que determinadas funções

requerem benefícios específicos e estão habituadas a um padrão de vida mais

elevado, até mascarar a situação através de tentativa de manter em sigilo

alguns benefícios. Pode-se afirmar que tudo aquilo que a empresa tenta manter

em sigilo todos já sabem.

O tratamento diferenciado gera nos que tem privilégios a sensação de

prestígio, contribuindo para aumentar a auto-estima; para aqueles que aspiram

a posições mais elevadas, há uma angustiosa expectativa de promoção; já

para os que não acreditam nessa possibilidade resta o pesado sentimento de

discriminação e injustiça.

Outros valores da cultura organizacional afetam a qualidade de vida: o

atendimento prestado ao cliente externo, a importância real a ele atribuída, a

forma como suas reclamações são analisados e encaminhados, os tratamentos

aos fornecedores, as relações com a comunidade. Tudo isso configura a

imagem da empresa e faz com que as pessoas se orgulhem ou não de a ela

pertencerem.

Soma-se aos problemas decorrentes dos valores predominantes na

cultura organizacional os fatores de natureza interpessoal. Mesmo pessoas que

gostam do que fazem podem experimentar insatisfação em decorrência do

estilo gerencial ou das relações interpessoais no trabalho. Postura autoritária,

desconsideração, gestão centralizadora e ausência de delegação são algumas

das posturas gerenciais apontadas como geradoras de conflitos entre chefes e

subordinados. Entre colegas, observa-se a disputa de prestígios e poder, a

inveja, o ciúme, capazes de gerar insatisfação e conflitos e, num segundo

momento, fazem com que os agraciados se sintam excluídas, perseguidas,

infelizes, sem motivação para o trabalho.

3.2 Infra-estrutura familiar

Nas décadas de 50 e 60, no Brasil, a mulher era presença permanente

no lar, estruturando os serviços domésticos, orientando e disciplinando os filhos

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24 nos deveres escolares ou, no mínimo, assegurando que fossem feitos. Os

filhos eram criados pela mãe, que supria o lar e dava total suporte ao marido. A

participação do homem se restringia ao dinheiro e às ‘broncas nos filhos "por

problemas que a mãe não conseguia resolver”. Esse quadro alterou-se de

forma significativa a partir das duas últimas décadas.

Para LOPES (apud BÚRIGO, 1997), o cenário familiar foi alterado de

forma drástica com a entrada quase total da mulher no mercado de trabalho.

As tarefas domésticas continuam sendo demandadas e nem sempre têm sido

equacionadas via divisão das tarefas entre os membros da família. As refeições

fora de casa e a automação de serviços domésticos são acessíveis apenas às

camadas sociais que contam com salários mais altos. Grande contingente da

população vive outra realidade. A mulher cumpre oito horas de trabalho fora de

casa e após o expediente assume outra jornada. Associa-se a isso a

impossibilidade de manter empregadas domésticas em horário integral, o que

agrava mais o cenário.

De acordo com MOREIRA (apud BÚRIGO, 1997), o custo emocional e

os conflitos decorrentes precisam ser contabilizados. Resultam em

insatisfação, mal-estar e desajustamentos, nem sempre aparecem diretamente,

mas afeta a produtividade, o humor, o envolvimento. Muitos dos conflitos entre

chefes e subordinados decorrem de desencontros na família, levando vários

autores a considerar que é preciso encontrar equilíbrio entre trabalho e família,

especialmente nas empresas que alimentam o conflito, passando mensagens

como: "se você quer progredir na empresa, precisa estar disposto a fazer

sacrifícios".

A escola não se adaptou a essa realidade e vem atuando como no

cenário anterior. Mantém as mesmas estratégias de horário parcial, extensas

tarefas para serem feitas em casa, sem que a criança conte com alguém que a

supervisione ou oriente, além de ter que resistir ao apelo da televisão e do

videogame. Investe pouco na seleção e capacitação de professores quando em

muitos casos os filhos têm em casa bibliotecas mais ricas do que as da escola

ou computadores de última geração.

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25 Pais com nível cultural igual ou muito superior ao dos professores criticam os

conteúdos e a qualidade do ensino.

3.3 Relações interpessoais

As relações interpessoais constituem o outro lado da questão. A raiva e

o medo são emoções que fazem parte do cenário da vida no trabalho. São

sentimentos freqüentemente experimentados em todos os seus disfarces e

máscaras e resultam do desacerto como erros tratados, da desatenção às

perguntas e pedidos de esclarecimento, do tratamento áspero e competitivo

entre colegas, da falta de sinceridade nas relações e do abuso do poder por

parte das lideranças, formais e informais.

É freqüente observar-se que chefes são tratados com diferença e

cortesia, enquanto os demais são tratados com indiferença e até descaso.

Contribuições dadas por ocupantes de funções elementares são recusadas,

mas a mesma sugestão vinda de cima é acatada e elogiada. Mantém-se ainda

o vício de adular os de cima, competir com os colegas de mesmo nível

hierárquico, pisar nos de baixo.

Qualidade de vida não decorre apenas de salário acima do mercado e

de invejável plano de benefícios. Para VIEIRA (1996), resulta do tratamento

humano, da gentileza, da leveza nas relações, da possibilidade de expressão

de pontos de vista divergentes, do relacionamento sincero, do respeito aos

ausentes e do orgulho pelo que se faz. Atenção, elogios e consideração

constituem ingredientes indispensáveis quando se busca lealdade, qualidade e

produtividade.

3.4 Fatores intrapessoais

No ambiente de trabalho, tudo gira em cenário de atitudes, emoções e

sentimentos de enorme diversidade, representando a forma particular de cada

indivíduo lidar com toda essa realidade, criando nas relações do dia-a-dia uma

atmosfera singular de cada organização ou mesmo de cada departamento.

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26 Cada setor vive um clima diferente, refletindo a forma de tratamento particular

entre membros, uma maneira própria de discutir seus problemas, a forma como

os líderes conduzem o trabalho e as pessoas.

Para FISCHER (2000), grande parte desta forma de reação é

determinada pela história de vida, que configura a maneira como pessoas

lidam com emoções que permeiam as relações interpessoais e afetam a

qualidade de vida. Os valores característicos da cultura familiar provocam tanto

o desenvolvimento da gente empreendedora, estimulada pela novidade e pelo

risco, assumindo a coragem de propor e ousar, quanto à mentalidade de pouca

iniciativa ou temor de arriscar, sentimentos de insegurança diante do novo,

adultos temerosos de lidar com situações novas e imprevisíveis.

De acordo VIEIRA (1996), nem sempre as posturas individuais

facilitadoras predominam nas organizações. Os líderes defrontam-se

permanentemente com as resistências que resultam muitas vezes de

experiências anteriores negativas, tornando o clima marcado pela desconfiança

e pela precaução. Numa grande maioria os empregados trabalham liderados

por chefias centralizadoras e competitivas. Os colegas de trabalho nem sempre

se enxergam como parceiros, disputam prestígio, estima e competem por

interesse.

O autoconhecimento e o conhecimento do outro são componentes

essenciais na compreensão de como a pessoa atua no trabalho, dificultando ou

facilitando as relações. Dentre as dificuldades mais observadas, destacam-se:

falta de objetivos pessoais, dificuldades em priorizar e dificuldade em ouvir.

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27 4. AS ORGANIZAÇÕES E A QVT

4.1 A responsabilidade das organizações com a QVT

Em torno da responsabilidade organizacional com o bem-estar global

dos sujeitos, FRENZEL (1994, p.116) argumenta que este está vinculado a

função social da organização e à responsabilidade dos sujeitos, perguntando:

“o que você tem feito pela qualidade de sua vida no trabalho?”

Mais recentemente e de forma bastante enfática, DE MASI (2000)

questiona a utilidade das organizações pós-industriais e sugere um

posicionamento distinto das mesmas, na contemporaneidade.

A organização pós-industrial é uma completa e radical

transformação mental, graças à qual os operários, os

empregados, os executivos, os profissionais, os dirigentes, os

proprietários e os consumidores devem introjetar um modo

novo de considerar as categorias de tempo, espaço, lucro,

concorrência, solidariedade, qualidade de trabalho e de vida

(DEMASI, 2000, p.32).

Preocupações com o sofrimento humano gerado em contextos de

trabalho levam ao desenvolvimento de estudos e questionamentos sobre as

responsabilidades dessas organizações.

“O poder de ação de que a administração dispõe sobre o destino do

sofrimento – sua orientação no sentido do sofrimento criativo ou sofrimento

patogênico – a investe ao mesmo tempo de uma responsabilidade cívica”

(DEJOURS apud CHANLAT, 1993, p.173).

O trabalho ocupa um papel fundamental na sociedade e, dessa forma,

tornou-se fator importante na avaliação da qualidade de vida. Relativo aos

méritos a ele atribuído verifica-se os seus efeitos sobre a vida humana.

“O trabalho é objeto e móvel de idéias e ideologias, lugar de colaboração

e conflito. Nele o homem se amesquinha e se torna grande aos olhos de seus

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28 pares” (SAMPAIO, 1999, p.11). Mas essa realidade ocorre diante de si mesmo.

No mundo do trabalho, foram priorizadas análises de ordem econômica,

técnicas, ideológicas, sociais e legais. No entanto, CODO (1996) relata que é

uma via real de análise o vínculo subjetivo do trabalhador e seu trabalho no

atual estágio de divisão social do trabalho.

A dinâmica do funcionamento psíquico dos indivíduos no mundo do

trabalho tornou-se conhecida por estudos em psicologia do trabalho de

DEJOURS (1997), cuja análise das condições organizacionais e seus impactos

sobre a vida psíquica são o foco principal.

Tal perspectiva avalia que a característica maior do trabalho

capaz de torná-lo equilibrante ou fatigante para o indivíduo, é a

oportunidade que ele oferece à livre iniciativa do aparelho

psíquico do trabalhador, permitindo ou não a diminuição de sua

tensão psíquica, a saber, da carga psíquica do trabalho

(MORAES, 1995, p.15).

A carga psíquica abaixo ou acima da capacidade de suportar um sujeito

torna-se danosa a este por sub-utilização de seu potencial criativo, mental ou

super exigência de suas habilidades. Todos esses desequilíbrios e desafios da

vida externa são traduzidos para o mundo interno, conturbando ou

desorganizando, de alguma forma, o equilíbrio psíquico e bem-estar do sujeito,

assim como sua saúde integral.

Sob a análise dos fatores organizacionais, aqueles que podem interferir

na dinâmica psíquica dos sujeitos, referem-se segundo DEJOURS (1994),

sobretudo à forma como as pessoas e tarefas estão estruturadas e

fragmentadas no espaço do trabalho. Sendo que condições químicas, físicas e

biológicas do trabalho atingem o corpo do trabalhador. Diante desse contexto

aos trabalhadores resta construírem mecanismos psicológicos de defesa

individuais e coletivos que têm como principal função tornar possível a

permanência do trabalhador em uma realidade concreta permeada pela

pressão e pela rigidez (MORAES, 1995).

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29 Se condições organizacionais patológicas tornam-se fatores de patologia

psíquica individual e coletiva, a caracterização da correlação entre trabalho e

sua função determinante, embora não exclusivo, nos distúrbios mentais, “do

ponto de vista do trabalhador deve-se fazer bem o reconhecimento de que sua

loucura não é tão sua como parecia, é produto das suas condições de vida”

(CODO, 1996, p.21).

É impossível ignorar a responsabilidade organizacional e social sobre a

construção de condições dignas de saúde no trabalho. O autor referenciado

anteriormente argumenta que sua vivência do bem-estar ou mal-estar cujo,

limite é a doença mental, está em questões individuais e coletivas que têm

como principal função tornar possível a permanência do trabalhador em uma

realidade concreta permeada pela pressão e pela rigidez (MORAES, 1995).

Quando o trabalho permite uma identificação do sujeito, passa de uma

condição de sofrimento e tortura, no qual o sujeito sente-se apático e

indiferente ao final de sua produção, para a condição de um artista que

contempla sua obra individualmente, mas produzindo êxtase e admiração

também ao coletivo.

Diante desse contexto cabe enfocar as diversas instâncias, sejam

individuais, organizacionais ou sociais que interatuam na construção de um

espaço simbólico e real de bem-estar, saúde e dignidade humana. Essa

construção passa por um real no qual o sujeito não recorra a fantasias

substitutivas unicamente para negação de sua realização, mas de ancoragem

para ver-se como ser.

Ou enfrentamos a tarefa de construir um trabalho que reconstrua a

nossa cidadania, ou viveremos em busca, mais, e mais dos balcões de

identidade vendidos a cada esquina.

Possivelmente no contexto organizacional, medidas “terapêuticas”

agregariam “terapêuticas grupais”, cujos ganhos seriam inimagináveis. “Chega-

se, assim, à conclusão de que não é, de maneira alguma, o próprio trabalho

que se torna nocivo e perigoso, mas a forma como é organizado e gerenciado

pelos próprios homens” (COHN e MORSIGLIA, apud LADEIRA, 1996, p.73).

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30 Para MAZZILI (1996), o trabalho é imprescindível a qualquer pessoa, ele

determina a própria sobrevivência e o condicionamento social do indivíduo,

constituindo fator de equilíbrio e desenvolvimento do ser humano e, desta

maneira, propiciando poder estruturante tanto da saúde mental quanto física.

“A perspectiva de possuir-se um trabalho saudogênico é

possível dentro de um contexto em que a cultura

organizacional não esteja investindo em processos de

"diabolização” em sentido oposto a simbolização: em sua

origem grega diaballein significa separar, dividir, fragmentar e

symbollein, ao contrário, significa relacionar, juntar, unir”

(SIEVERS, 1997, p.8)”

Ainda segundo DEJOURS (1993), para que haja a possibilidade de

simbolização as empresas não podem prescindir de espaços públicos de

palavra, palavras comuns que não contemplam o individualismo e permitem a

construção de uma nova ética das relações de trabalho.

Dessa forma, lidar-se-ia não mais com uma organização prescrita, ideal,

mas sim com uma organização real. Nem mesmo um trabalhador ideal,

fantasiado por si e pelos gestores, mas um trabalhador real, respeitado em

suas habilidades e potencialidades assim como em suas limitações e

impotências.

Nesse sentido, um encontro mais realístico com o sujeito e o contexto

torna-se um diferencial salutar de inserção no mundo do trabalho. Portanto,

proteger a saúde, promovê-la ou recuperá-la é também responsabilidade da

organização cuja mínima manutenção da integridade, dignidade e cidadania

dos sujeitos é imprescindível. Falar em saúde do trabalhador é preservar

também os ganhos e a própria sobrevivência de uma empresa, e conseguir

assegurá-la em sua função produtiva ou de serviços assim como sua função

social.

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31 4.2 A relação entre produtividade e QVT

A busca da produtividade e qualidade tem constituído fator principal

para as empresas proporcionarem a qualidade de vida dentro das

organizações e não fora dela como mecanismos compensatórios, visto que ao

promover a saúde e o bem estar de seus funcionários, observando tarefas,

desempenhos, desenvolvimento do profissional, elementos que a QVT

gerencia, obtém-se aumento da motivação, da satisfação e do desempenho

dos trabalhadores.

Assim como é necessário que os processos produtivos estejam sobre

controle, que a matéria-prima, insumos e peças em processos estejam em

conformidade com as especificações técnicas, que sejam seguidos os

procedimentos de todas as etapas do processo produtivo para que sejam

produzidos e entregues produtos com a qualidade requerida pelo cliente de

forma eficaz e eficiente, é necessário à capacitação e envolvimento das

pessoas que vão realizar todas essas atividades. Se uma delas falhar, todo o

trabalho pode ficar comprometido.

Ora, mas se o trabalhador não tiver condições de trabalho adequadas,

se estiver sofrendo processos de desmotivação estimulados pela empresa

como a falta de feedback construtivo ou de apoio comportamental/psicológico,

conforme conceituado por Mayer (apud FRANÇA, 1997), se estiver com sua

saúde comprometida, as possibilidades de erros tornam-se muito grandes. Não

é possível dissociar a condição humana do processo, como se um não

pudesse interferir no outro.

Logo, a qualidade do produto depende da qualidade de vida das

pessoas que estão envolvidas com as atividades relacionadas aos produtos,

tornando o Gerenciamento da QVT um instrumento importante para alcançar

os objetivos da Qualidade e da empresa como um todo.

WALTON (1973, p. 11-21), ajusta convenientemente produtividade e

QVT ao propor oito categorias conceituais objetivando fornecer uma estrutura

ou modelo de análise das características importantes da qualidade de vida no

trabalho. São elas:

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32 1. Compensação adequada e justa

O trabalho é visto, em primeiro plano, como meio do indivíduo ganhar a

vida, então, a venda deste trabalho deve atingir o padrão subjetivo do

recebedor ou pelo menos ser socialmente satisfatória, sendo que o salário

recebido por certo trabalho deve ter uma relação apropriada com o salário

recebido por outros tipos de trabalho, obtendo-se uma compensação justa e

uma renda adequada.

2. Condições de trabalho seguras e salutares

Horários razoáveis de trabalho, preferencialmente por períodos

padronizados, condições físicas de trabalho minimizem potencialmente

doenças e danos e limites de idade impostos quando o trabalho for muito

destrutivo e nocivo ao bem-estar das pessoas abaixo ou acima de uma certa

idade.

3. Oportunidade imediata para a utilização e desenvolvimento da capacidade

humana

O trabalho tem se tornado fragmentado e extremamente controlado,

sendo que para que haja um potencial utilização e desenvolvimento da

capacidade humana são necessários alguns requisitos, tais como: autonomia

no trabalho, múltipla habilidades, informações e perspectivas, tarefas

completas e planejamento.

4. Oportunidade para crescimento e desenvolvimento contínuo e segurança

Focaliza-se mais a carreira do que as oportunidades e para tornar viável

o processo de desenvolvimento, torna-se necessário que se trabalhe com o

crescimento pessoal, a aplicação de novas habilidades, oportunidades de

progresso e segurança no emprego.

5. Integração social na organização de trabalho

Alguns atributos são fundamentais para a que se estabeleça uma

integração social saudável no trabalho que são importantes para a identidade e

a auto-estima do indivíduo: ausência de preconceito de cor, raça, sexo, religião,

nacionalidade, estilo de vida, aparência física, mobilidade ascendente,

sensação de comunidade e sinceridade interpessoal.

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33 6. O constitucionalismo na organização do trabalho

São elementos importantes que podem propiciar uma melhora na

qualidade de vida no trabalho, tais como as normas que estabelecem os

direitos e deveres dos trabalhadores. Alguns aspectos significativos são: direito

à privacidade, direito de posicionamento, de liberdade de palavra e de

tratamento adequado e justo para os assuntos pertinentes ao trabalho.

7. O trabalho e o espaço total da vida

Refere-se à relação de equilíbrio que deve haver entre o trabalho e os

outros níveis da vida do indivíduo, sendo que diz respeito aos horários e dias

de trabalho, exigências da carreira, tempo para lazer e para a família, assim

como um desenvolvimento profissional que não produza efeitos negativos na

vida pessoal.

8. A relevância social da vida do trabalho

Trata-se do fato de muitas organizações não agirem de modo

socialmente responsável fazendo com que um número crescente de

empregados depreciem o valor de seus trabalhos e carreiras perdendo a auto-

estima.

Nestas etapas constata-se uma filosofia de homem em desenvolvimento

para uma organização em desenvolvimento e o próprio Walton (apud

RODRIGUES, 1999), considera a relação existente entre a produtividade e a

qualidade de vida no trabalho na qual o ponto ótimo para a produtividade não

seria no momento máximo de qualidade de vida no trabalho percebida pelo

trabalhador, mas na sua ascendência e declara, ainda, que a relação entre as

curvas de qualidade de vida no trabalho e produtividade possui declives que

variam de um conjunto de trabalho para outro.

Infere-se, de modo geral, que ganhos na qualidade de vida no trabalho

resultarão em uma maior produtividade e melhor qualidade de produtos ou

serviços, pois segundo TANNENBAUM (1996, p. 78), “o êxito da organização

depende da disposição de seus membros para trabalhar assiduamente e de

maneira construtiva a fim de ajudá-la a atingir seus objetivos”, bem como a

formulação de um trabalho pode ser realizada de modo à, concomitantemente,

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34 aumentar a oportunidade de utilizar e desenvolver as habilidades humanas e

melhorar a produtividade.

Huse e Cummings são mais diretos e objetivos quando se referem à

qualidade de vida no trabalho relacionando-a a produtividade, pois segundo

RODRIGUES (1999), definem a qualidade de vida no trabalho como uma forma

de pensamento que envolve pessoas, trabalho e organização, onde se

destacam dois aspectos distintos:

a) A preocupação com o trabalhador e com a eficácia organizacional; e

b) A participação dos trabalhadores nas decisões e questões relativas ao

trabalho.

A operacionalização desta definição é explicitada através de quatro

aspectos:

1. A participação do trabalhador

Tratam de operacionalizar a participação através de análise e solução de

problemas na produção, envolvendo o trabalhador no processo de tomada de

decisão.

2. O projeto do cargo

Deve atender às necessidades tecnológicas do trabalhador sem

esquecer o enriquecimento do trabalho, onde se fixam as maiores variedades

da tarefa, feedback e grupos de trabalho auto-regulados.

3. Inovação no sistema de recompensa

Visa à minimização das diferenças existentes a nível salarial e de status

entre os trabalhadores.

4. Melhoria no ambiente de trabalho

A melhoria das condições de trabalho envolve flexibilidade de horário,

modificação do local, entre outros que podem tornar os indivíduos mais

satisfeitos e conseqüentemente melhorarem seus serviços.

Mais uma vez observa-se que a qualidade de vida no trabalho afeta a

produtividade, ainda que indiretamente.

Mesmo que as empresas negligenciem o impacto de suas atividades

sobre seus empregados, a falta de qualidade de vida produz impactos

importantes nos resultados da empresa: baixa produtividade, custos de

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35 assistência médica, índice de absenteísmo e rotatividade, indenizações

trabalhistas, insatisfação, baixa motivação e lealdade à empresa. Assim, repita-

se, torna-se importante e um fator de competitividade para empresa gerenciar a

QVT, posto que a qualidade dos produtos e serviços oferecidos será

preponderante para a sobrevivência da organização. E, nesse contexto, a QVT

busca humanizar as relações de trabalho, no sentido de conciliar os interesses

dos trabalhadores e da organização. Muito mais do que linha de pesquisa,

traduz-se na maneira como as pessoas vivenciam o seu dia-a-dia no trabalho.

Para o trabalho a insatisfação e a desmotivação são desastrosos tanto

para as organizações quanto para o trabalhador. As organizações se

constroem ou se destroem pelo desempenho das pessoas que nelas

trabalham. O ser humano, no contexto organizacional, é o diferenciador que

impulsiona e, às vezes, até desestabiliza o desenvolvimento da organização.

Como o trabalho afeta todas dimensões da vida humana: física, afetiva,

intelectual e espiritual a QVT desenvolve e implementa ações dentro dessas

esferas atuando na parte psicológica, através de ações relacionadas à

satisfação e motivação do trabalhador e, na parte física, através de ações

relacionadas às condições do ambiente de trabalho e promoção da saúde.

Contudo, os programas de QVT existem na maioria das empresas brasileiras

como práticas disseminadas nas atividades relacionadas à Saúde e

Segurança, Programas de Recursos Humanos e de Qualidade, com pouca

ligação entre essas atividades, do que como um sistema estruturado, mais

característico de médias e grandes empresas que estão ligadas às pesquisas e

tendências na Gestão de Pessoas.

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36

5. SUGESTÕES PARA A PROMOÇÃO DA QVT

Dar ênfase ao comportamento humano nas organizações é um desafio

que hoje se apresenta como uma das mais valiosas possibilidades e

perspectivas para a implantação de programas de Qualidade e para melhoria

contínua.

LIMONGI & ASSIS (1995) ao discorrerem sobre programas de QVT,

dizem que os mesmos devem demonstrar total compreensão do problema e

que suas propostas devem ser abrangentes e comprometidos com as

condições de vida no trabalho que incluem os aspectos de bem-estar, saúde,

segurança e capacitação para que o colaborador possa realizar suas tarefas

com segurança e que possibilitem que ele faça bom uso da sua energia

pessoal.

Investigando ações e programas de gestão de recursos humanos,

constata-se que muitas empresas brasileiras estão buscando novos

paradigmas, segundo os quais o potencial humano passa a ser fator real de

competência e os cuidados com relação à humanização ocorrem no posto de

trabalho, na qualificação e em situações extensivas à vida pessoal e familiar.

No Brasil, há pouco mais de dez anos, falar em QVT não passava de

simples utopia. Hoje, percebe-se que esse quadro mudou substancialmente,

não em função de um “modismo”, mas por determinantes de sobrevivência

num cenário competitivo. Tanto que, SILVA & DE MARCHI (1997) destacam

que no Brasil os programas de QVT têm despertado grande interesse nos

últimos anos e que as empresas perceberam que QVT está inteiramente ligada

à maior produtividade e vantagem competitiva.

A indústria de plásticos Vulcan, por exemplo, tem um bem sucedido

programa de QVT. O diretor de Recursos Humanos atribui o sucesso do projeto

ao entendimento, por parte da empresa, da importância de ter empregados

saudáveis, em condições não só de produzir, mas de integrar uma comunidade

de trabalho, pré-requisito para que cresçam na organização. Além de

programas de medicina ocupacional, que atendem à legislação cada vez mais

rigorosa, a Vulcan desenvolve os de medicina assistencial, que substituem o

Page 37: A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO … CUNHA PINTO.pdf · organização do trabalho pode estabelecer uma relação de dominação da vida psíquica do sujeito e da ocultação

37 deficiente sistema público de saúde e são extensivos às famílias dos

empregados. A empresa realiza campanhas de combate ao fumo, ao álcool e

às drogas, de esclarecimento sobre os riscos de doenças coronarianas e

relacionadas com a postura, saúde bucal e obesidade, através da distribuição

de folhetos.

O BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social é

uma organização que utiliza os programas de saúde física e mental como

forma de promover maior integração entre os funcionários e melhorar o

rendimento no trabalho. Desenvolvido no centro de treinamento da

organização, sob supervisão da Cipa - Comissão Interna de Prevenção de

Acidentes, o Projeto Saúde é extensivo a inativos e pensionistas de todo o

Grupo BNDES. O Projeto Saúde do BNDES alcança alto grau de aceitação

entre os funcionários, que em horário de almoço ou após o expediente se

dedicam a atividades que vão da antiginástica, relaxamento/alongamento e

meditação ao desenvolvimento de aptidões artísticas nas sessões de desenho

a mão livre e com o lado direito do cérebro. Orientados por especialistas, os

participantes soltam a imaginação, se realizam e se livram do estresse.

Paralelamente ao cuidado com a saúde mental dos funcionários, o Projeto

Saúde do banco desenvolve também atividades para melhorar a condição

física além de campanhas de vacinação e palestras com especialistas. Um dos

pontos altos do projeto são as reuniões dos Vigilantes do Peso que, muito mais

do que prescrever um regime para emagrecer, orientam sobre a forma mais

saudável de alimentação, promovem o bem-estar e aumentam a auto-estima.

No entanto, ocorre que as iniciativas para promover a QVT em muitas

empresas vêm fracassando devido à falta de um posicionamento estratégico,

sendo tratado mais como gastos do que como investimentos, sem a

perspectiva de um diferencial para a competitividade entre as empresas

(FRANÇA, 1997).

Muitas estratégias inadequadas de implantação do conceito qualidade

de vida no trabalho geralmente são oportunistas e imediatistas, e não passam

de modismo freqüentemente experimentado. Isto porque, tendo como central a

idéia de que é necessário medir para melhorar, assim como nos programas de

Page 38: A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO … CUNHA PINTO.pdf · organização do trabalho pode estabelecer uma relação de dominação da vida psíquica do sujeito e da ocultação

38 qualidade, o mesmo deve ser adotado para os programas de qualidade de vida

no trabalho. Entretanto, poucas empresas se preocupam em avaliar de forma

sistemática a satisfação dos seus empregados.

Significa dizer que não basta reproduzir em uma determinada

organização um modelo de programa de QVT já implementado em uma outra

empresa ou descrito na literatura, pois as realidades cada organização e os

anseios de seus funcionários são distintos. É necessário que o Departamento

de Recursos Humanos realize um levantamento das necessidades e fatores

motivacionais dos seus agentes internos, pois as sondagens de opinião interna

são uma importante ferramenta para detectar a percepção dos funcionários

sobre os fatores intervenientes na qualidade de vida e na organização do

trabalho. Esse posicionamento é defendido por VELLOZO (1996) que entende

que em cada organização existe um processo particular que deve ser analisado

cuidadosamente, onde a QVT como uma política de trabalho que deve ser

definida e adotada após minucioso levantamento de necessidades,

devidamente analisadas de forma consciente e comprometida com as

mudanças que se fizerem necessárias. Em empresas cujo estágio

organizacional seja pouco desenvolvido, dificilmente um programa de QVT será

efetivo sem o apoio de uma nova filosofia gerencial, sem o aval e o apoio da

administração superior, ou seja, os responsáveis pela área de recursos

humanos das organizações têm que convencer a todos – especialmente as

principais lideranças – que QVT é de responsabilidade de todos e não apenas

de alguns, mesmo porque iniciativas e/ou esforços particulares, ainda que da

área própria, não terão capacidade de obter resultados efetivos.

FERNANDES (1996), SILVA & DEMARCHI (1997), entre outros,

também consideram que as diferenças sejam respeitadas e ouvidas e que as

sugestões sejam discutidas, analisadas e colocadas em prática.

Isto porque o público interno é considerado a parte mais importante da

empresa, especialmente na implantação dos programas. Mas a negligência de

alguns administradores e empresários tem subestimando a necessidade de

uma estratégia orientada pelo monitoramento de itens de controle de gestão de

RH. Dessa postura decorre o gerenciamento improvisado com ações e medida

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39 sem base quantificável, com conseqüências diretas não só sobre o

desempenho da organização, mas também no nível de satisfação dos

trabalhadores.

Convém lembrar que QVT, na prática, não dispensa em absoluto a

teoria, ou seja, é preciso a fundamentação advinda de conhecimentos

interdisciplinares e em especial ligada à ciência comportamental, pois não se

pode implantar um programa de QVT sem um forte apoio teórico e técnico

sobre o tema. Por outro lado, mesmo que cada experiência de implantação de

projetos de QVT seja única, é possível, a título de sistematização, se

estabelecer algumas fases que, independentemente das características

particulares, se aplicam a todas as empresas.

Uma sugestão é a utilização de terapias alternativas, como, por

exemplo, à cromoterapia, que é o estudo da utilização de cores adequadas a

cada ambiente. Através das cores pode-se atuar sobre o psiquismo dos

indivíduos, nos ambientes das empresas, para: a ativação das faculdades da

mente direcionada para atividades específicas; utilização das cores na

prevenção de acidentes do trabalho; na produção do bem-estar espiritual e da

harmonia no relacionamento pessoal.

Pode-se citar, ainda, atividades específicas passíveis de serem incluídas

no cotidiano organizacional, que aconteceriam em 15 a 20 minutos diários, tais

como aqueles que resultariam em aprendizado para controle de elementos

estressores, buscando, portanto, um equilíbrio físico, social, psíquico e

emocional. São atividades que facilitem o despertar do prazer em trabalhar, tais

como Tai Chi Chuan, ginástica laboral, massoterapia, musicoterapia,

relaxamento, apoio psicológico ou psicoterápico etc.

Na Psicologia Organizacional, discute-se o homem e a sua

adaptabilidade ao trabalho. Hoje, as empresas procuram soluções que possam

gerar, primeiro, satisfação daquele que faz, segundo, sua integração com o

meio ambiente e, depois, sua produtividade e o seu desempenho. Se não

forem consideradas estas questões – que não podem estar separadas e sim

caminhar juntas – nada valerá ou terá importância nas novas relações entre

homem e trabalho.

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40 Dessa forma, um programa de Qualidade de Vida deve incluir

comunicações abertas, justiça interna e externa no sistema de recompensas,

preocupação com a segurança dos empregados e a participação no

planejamento do trabalho. O resultado do investimento em QVT é um ambiente

mais humanizado, e tem por objetivo atender tanto às aspirações mais altas

quanto às mais básicas, procurando encorajar o desenvolvimento das

habilidades e capacidades dos trabalhadores, considerando o espaço que o

trabalho ocupa na vida das pessoas e, por sua vez, não deve prejudicar a

capacidade delas de desempenharem outros papéis na sociedade.

Page 41: A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO … CUNHA PINTO.pdf · organização do trabalho pode estabelecer uma relação de dominação da vida psíquica do sujeito e da ocultação

41 CONCLUSÃO

Ao longo dos tempos as relações de trabalho sofreram modificações e

as organizações começaram a entender que a “qualidade de vida no trabalho”

não pode ser dissociada da “qualidade de vida” do ser humano como um todo.

A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tem sido uma preocupação do homem

desde o início de sua existência, com o objetivo de facilitar ou trazer satisfação

e bem estar ao trabalhador na execução de sua tarefa. Atualmente grande

parte é passada dentro das organizações, e, portanto o trabalho ocupa um

espaço cada vez mais importante na vida das pessoas, mesmo quando o

trabalho é aceito como um dever, busca-se por meio dele, a realização dos

sonhos pessoais e de auto-expressão.

O conceito de QVT pode apresentar diferentes enfoques, que vão desde

acrescentar valores ambientais e humanos, tentando justificar as negligências

das sociedades industriais em favor do avanço tecnológico, da produtividade e

do crescimento econômico, a aspectos mais voltados para a saúde das

pessoas ou ainda, para o ser humano como diferencial estratégico da empresa,

tendo motivação, participação, poder e autonomia como fatores importantes na

compreensão do processo.

Porém, pode-se observar uma unanimidade entre os estudos, de que um

programa de promoção de qualidade de vida no local de trabalho atende,

simultaneamente, aos interesses tanto do empregado como do empregador.

Para o trabalhador, as razões são óbvias, uma vida melhor e provavelmente

mais longa, com melhor saúde física/mental e, principalmente, mais feliz. Este

estado de maior felicidade advém não apenas do fato de o indivíduo sentir-se

mais disposto e com maior vigor físico, mas, sobretudo e principalmente, da

sensação de bem-estar interior decorrente da melhoria das relações pessoais

que mantém no trabalho, além do fato de passar a vivenciar o trabalho não

como necessidade, obrigação ou tortura, mas como algo prazeroso e

desejável. Já para o empregador as vantagens são advindas de uma melhor

imagem interna e externa da cia, aumento do comprometimento, interesse,

motivação e conseqüentemente aumento da produção e dos lucros e por outro

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42 lado, redução dos custos com assistência médica. Além do que, economiza-se

com assistência médica, levando-se em consideração o prejuízo representado

pelas horas perdidas em decorrência das faltas e dos afastamentos por razões

de doença.

Outro ponto de opinião comum nesse estudo é de que o acirramento

crescente da competitividade empresarial e as rápidas e profundas mudanças

que se processam têm exigido das empresas marcada capacidade de

adaptações às novas realidades com as quais se defrontam e de adequação às

necessidades de alcançar a tão celebrada qualidade total.

Neste contexto, as corporações mais modernas vêm percebendo a

importância de obter algo que as diferencie das concorrentes; vêm percebendo,

também, que este diferencial pode se limitar à introdução de inovações

tecnológicas. Estas estão, via de regra, ao alcance de quem possa pagar por

elas. Percebe-se então que a preocupação com o nível de treinamento e o grau

de competência dos empregados não basta, tem que haver uma maior

preocupação com o ser humano atrás do profissional.

As grandes e modernas corporações preocupam-se com o engajamento

emocional do indivíduo, sua satisfação interior, a percepção que venha a ter de

fazer parte de algo que sente como seu e pelo qual se sinta igualmente

responsável. Os benefícios mais evidentes obtidos pelas empresas que

conseguem alcançar este engajamento emocional dos empregados é estimular

a criatividade e a capacidade deles para vencer obstáculos.

A importância do trabalho para o bem-estar e a saúde das pessoas fica

clara ao lembramos que é trabalhando que passamos a maior parte de nossa

vida enquanto estamos acordados; é no trabalho, ou por meio dele, que

realizamos grande parte de nossas aspirações. Compreensível é, pois, o papel

relevante do trabalho em nossa vida e o reflexo do restante dela sobre a

qualidade do trabalho e o desempenho profissional. Os programas de

qualidade de vida nas empresas contribuem para que o trabalhador passe a

gostar do trabalho e passe, por extensão, o “vestir a camisa" da empresa.

A promoção de saúde das pessoas depende de fatores ligados a elas

mesmas. A adoção de hábitos saudáveis de vida ocorre no plano individual,

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43 mas, também, depende das condições ambientais nas quais estão inseridas,

em especial no local de trabalho. Os padrões individuais de comportamento

perdem a força e tendem a ser abandonados, se não receberem do ambiente

reforço e estímulo. Somente quando o meio em que vive for fonte de suporte e

apoio, o indivíduo conseguirá manter, ao longo da vida, hábitos saudáveis.

O local de trabalho constitui meio de acesso à grande maioria da

população adulta. Isso resulta em vasta audiência "cativa" para o

desenvolvimento de programas de promoção de saúde. As facilidades

operacionais também são razões adicionais a facilitar tais ações no trabalho,

pois geralmente há espaço, canais de comunicação e uma série de outras

facilidades práticas para a implantação. Leve-se em conta a possibilidade de

que as mensagens educativas alcancem também os familiares do trabalhador,

ampliando-se, assim, o universo com o qual se lida, a implantação de

programas nos locais de trabalho, como caminho eficaz e simples para a

promoção de saúde da população de um país, justifica-se tanto sob o enfoque

empresarial como o de saúde pública.

Sendo assim, os estudos em Qualidade de Vida no Trabalho em muito

evoluíram nos últimos anos. Se, por um lado, até algumas décadas atrás o

tema se configurava como uma ferramenta para melhorar o bem estar do

colaborador empresarial, cada vez mais o tema está correlacionado com a

estratégia da empresa com foco na produtividade (e não somente na satisfação

e motivação do funcionário) contribuindo, assim, para geração de uma nova

competência: Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho.

Melhorar a qualidade das condições de saúde no trabalho, a partir do

enfoque discutido nesta pesquisa, acarreta identificar os problemas em cada

situação, com a participação efetiva dos sujeitos do processo de trabalho e

replanejá-lo, o que envolve sempre um processo de negociação. Não há

apenas um modo racional de fazer o trabalho, mas diversos. Diante disso, não

cabe somente aos gestores o papel de pensar e re-planejar. Devem estar

envolvidos também os trabalhadores produtivos para, no limite, acabar com a

separação, advinda da administração racional, entre o planejamento e a

execução de qualquer trabalho.

Page 44: A INTER-RELAÇÃO ENTRE A QUALIDADE DE VIDA NO … CUNHA PINTO.pdf · organização do trabalho pode estabelecer uma relação de dominação da vida psíquica do sujeito e da ocultação

44 Porém, no Brasil, grande parte das empresas fracassa ao tentar

implementar a QVT em virtude da falta de posicionamento estratégico, sendo

tratado mais como gastos do que como investimentos, sem a perspectiva de

um diferencial para competitividade entre as empresas, ou o que é ainda pior,

entendem por QVT, programa de benefícios, enquanto o que deveria se

entender é que, quem faz o resultado das empresas são as pessoas em que

nela trabalham, entretanto essas pessoas estão ficando doentes em

decorrência das relações de trabalho, que ainda são a maioria aqui, relações

estas que se baseiam quase que exclusivamente na exploração dos recursos

físicos e intelectuais de seus funcionários, na tentativa obcecada de atingir as

desejáveis metas.

Com isso, o que se percebe é que a grande maioria das empresas esta

andando na contra-mão do mercado que obtém os maiores lucros no mundo,

pois essas já compreenderam, que o que vai diferencia-las no mercado e

conseqüentemente fazer com que o seu lucro cresça cada vez mais não é só

oferecer um produto de qualidade a um preço competitivo, mas sim a visão do

que o mundo tem dela, a fidelidade, o respeito e a admiração conquistados por

ela perante seus colaboradores e a sociedade, e isso se consegue sendo ético

e para ser ético o objetivo de uma empresa não pode ser o lucro e sim as

pessoas que nela trabalham, pois são elas que precisam produzir para o lucro

exista.

As empresas não podem mais fechar os olhos e acreditar, que relações

de trabalho que não agreguem valor, prazer, identidade, saúde e bem estar

para seus funcionários, ainda sim são capazes de extrair o melhor deles, que

esses funcionários são fiéis a eles, que por uma questão de necessidade eles

vão se submeter a tudo e mesmo doentes, vão conseguir produzir cada vez

mais, porque se não, serão dispensados e outros profissionais poderão

desenvolver este mesmo trabalho por menor custo. Não, isso não é verdade, e

creio que este cenário esta em processo de transição, vide exemplos citados

neste estudo, de empresas que perceberam que programa de QVT não é

sinônimo de aumento de custo modismo ou mera banalidade, e sim programa

de aumento de receita, sucesso e qualidade de vida.

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45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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48 ANEXO I

TABELA 1 - Evolução do conceito de QVT

CONCEPÇÕES

EVOLUTIVAS DO QVT

CARACTERÍSTICAS OU VISÃO

1. QVT como uma variável

(1959 a 1972)

Reação do indivíduo ao trabalho. Investigava-

se como melhorar a qualidade de vida no

trabalho para o indivíduo.

2. QVT como uma abordagem

(1969 a 1974)

O foco era o indivíduo antes do resultado

organizacional; mas, ao mesmo tempo,

buscava-se trazer melhorias tanto ao

empregado como à direção.

3. QVT como um método

(1972 a 1975)

Um conjunto de abordagens, métodos ou

técnicas para melhorar o ambiente de trabalho

e tornar o trabalho mais produtivo e mais

satisfatório. QVT era vista como sinônimo de

grupos autônomos de trabalho, enriquecimento

de cargo ou desenho de novas plantas com

integração social e técnica.

4. QVT como um movimento

(1975 a 1980)

Declaração ideológica sobre a natureza do

trabalho e as relações dos trabalhadores com a

organização. Os termos "administração

participativa" e "democracia industrial" eram

freqüentemente ditos como ideais do

movimento de QVT.

5. QVT como tudo (1979 a

1982)

Como panacéia contra a competição

estrangeira, problemas de qualidade, baixas

taxas de produtividade, problemas de queixas

e outros problemas organizacionais.

6. QVT como nada (futuro) No caso de alguns projetos de QVT

fracassarem no futuro, não passará de um

"modismo" passageiro.

Fonte: NADLER e LAWLER (apud FERNANDES, 1996, p. 42).

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49 FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PROJETO UMA VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

Título da Monografia: A Inter-Relação entre a qualidade de vida no trabalho e

a produtividade.

Autora: Erica Cunha Pinto

Data da entrega:

Avaliado por: Grau:

Rio de Janeiro , ____ de ___________de 2005