A Intervenção Estatal No Carnaval De São Luís Nas Décadas De 70 A 90 - Walselina
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0 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE HISTÓRI A CURSO DE HISTÓRIA WALSELINY DE JESUS RODRIGUES SANTOS A INTERVENÇÃO ESTATAL NO CARNAVAL DE SÃO LUÍS NAS DÉCADAS DE 70 A 90 SÃO LUÍS 2010
A Intervenção Estatal No Carnaval De São Luís Nas Décadas De 70 A 90 - Walselina
A Intervenção Estatal No Carnaval De São Luís Nas Décadas De 70 A 90
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS
EXATAS E NATURAIS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA CURSO DE HISTÓRIA
WALSELINY DE JESUS RODRIGUES SANTOS
A INTERVENÇÃO ESTATAL NO CARNAVAL DE SÃO LUÍS NAS DÉCADAS DE 70 A
90
SÃO LUÍS 2010
WALSELINY DE JESUS RODRIGUES SANTOS
A INTERVENÇÃO ESTATAL NO CARNAVAL DE SÃO LUÍS NAS DÉCADAS DE 70 A
90
Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade
Estadual do Maranhão, para obtenção do grau de Licenciatura em
História.
Orientador: Prof. Msc. Fábio Henrique Monteiro
SÃO LUÍS 2010
SANTOS, Walseliny de Jesus Rodrigues.
A INTERVENÇÃO ESTATAL NO CARNAVAL DE SÃO LUÍS NAS DÉCADAS DE 70 A
90 / Walseliny de Jesus Rodrigues. ______ São Luís,
2010.
45 f.. :il.
1. Carnaval 2. Estado 3. Escola de Samba.
CDU
WALSELINY DE JESUS RODRIGUES SANTOS
A INTERVENÇÃO ESTATAL NO CARNAVAL DE SÃO LUÍS NAS DÉCADAS DE 70 A
90
Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade
Estadual do Maranhão, para obtenção do grau de Licenciatura em
História.
Aprovada em: _______/_______/_______
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
4
5
AGRADECIMENTOS
A Deus pela força concedida para a realização deste trabalho, sem
Ele não teria
conseguido.
A minha família, em especial a minha mãe e meu pai, que me apoiaram
quando
decidi iniciar o curso de História na Cidade de Caxias onde não
conhecia ninguém, e ainda
assim me apoiaram nesta decisão. Agradeço pelas muitas orações que
foram proferidas, e
ainda continuam!
Aos meus amados irmãos: Walsely, Wilney, Wesley e Wilsileny.
Aos meus familiares, primos e tios que me dedicaram carinho e
atenção.
Aos amigos da igreja que muitas vezes escutaram meu pedido de
oração, obrigada
a todos, não citarei nomes para não cometer injustiças, pois sei
que muitos oraram por mim.
A todos os professores do curso de História com quem tanto eu
aprendi, em
especial ao professor Fábio que me deu algumas orientações neste
trabalho, muito obrigada!
Aos amigos da Universidade que jamais esquecerei minhas
amigas: Polyana,
Silma, Marksuel, Luciana Santiago, a vocês amigos que
compartilhamos muitas vezes as
nossas lutas e incertezas, minha eterna gratidão.
Enfim, a todos que torceram por mim!
6
A política cultural que se limita a facilitar o consumo de bens
culturais tende a ser inibitória de atividades criativas e a impor
barreiras à inovação.
Celso Furtado
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RESUMO
Neste estudo pretende-se abordar a intervenção estatal no carnaval
de São Luís nas décadas de
70 a 90, percebendo-se essa atuação através das escolas de samba de
São Luís. Para tanto,
analisa-se as várias formas de atuação do Estado, compreendendo a
sua maneira de atuar de
acordo com seus interesses. Tal enfoque serviu para compreender a
maneira como as escolas
de samba ludovicense se tornam brincadeira preponderante no período
momesco ludovicense,
e como a intervenção estatal é responsável por seu sucesso e também
por sua decadência.
Neste sentido, a pesquisa aponta para o final da década de 80, onde
os interesses estatais já
aspiram outros investimentos, e na década de 90 essa troca de
interesses se configuram e se
consolidam no carnaval de rua, e na agonia das escolas de
samba.
Palavras-Chaves: Carnaval, Estado, Escola de Samba.
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ABSTRACT
In this study it is intended to board the state intervention in the
carnival of São Luís in the
70’s to 90’s, perceiving this actuation through the samba schools
of São Luís.
Therefore, it is analyzed the several forms of actuation of the
state, perceiving its way of
acting according with its interests. Such mention served to
comprehend the way like the
samba schools of São Luís became considerable fun in the momesco
period of São Luís, and
like the state intervention is responsible for its success and also
for its decadence. In this
sense, the research points that, in the final of 80’s, the state
interests already aspire to others
investments, and in the 90’s this change of interests configures
and consolidates in the street
carnival, and in the samba schools agony.
Key-Words: Carnival, State, Samba, School.
DETUR - Departamento de Turismo
FUNC - Fundação Municipal de Cultura
MARATUR - Empresa Maranhense de Turismo
SIC - Secretaria de Indústria e Comércio
UESMA - União das Escolas de Samba
1
INTRODUÇÃO............................................................................................................
11
2 CARNAVAL DO SAMBA – DÉCADA DE 70: AUGE OU DECADÊNCIA? .........
14
2.1 Políticas Cultural Carnavalesca na década de 70
.................................................... 17
3 DÉCADA DE 80: E S C O L A D E S A M B A E O ESTREITAMENTO
DAS
RELAÇÕES POLÍTICAS EM SUAS VÁRIAS FORMAS E MODALIDADES.......
22
3.1 Intervenção Estatal não oficial
.................................................................................
24
3.2 Intervenção Estatal não oficial: Via de mão dupla.
................................................. 27
3.3 Intromissão Estatal e Mudanças de Interesses: Para alguns
crise, outros sucesso..29
4 DÉCADA DE 90 - PROJETO “CARANAVAL DE RUA”
...................................... 31
4.1 Legitimar para
Explorar...........................................................................................
33
CONSIDERAÇÕES FINAIS
....................................................................................
41
1 INTRODUÇÃO
Neste estudo aborda-se a intervenção do Estado no carnaval de São
Luís,
especificamente nas décadas de 70 a 90, percebendo essa atuação
através das escolas de
samba, em décadas que configuram o período áureo de seu prestígio e
expansão. Situa-se o
carnaval de São Luís, segundo MARTINS (2001) em três fases,
carnaval colonial, carnaval
dos autos e carnaval do samba, fases estas com características
distintas.
Entretanto ARAÚJO (2001), que também escreve sobre a mesma
temática,
observa que estas descritas acima, não possuem limites
rigorosamente definidos, mas se
tornam pertinente neste trabalho para balizamento deste estudo
monográfico.
Procurou-se analisar o período determinado por MARTINS (2001), de
carnaval
do samba, onde este apresenta o ano de 1920 como início das
primeiras brincadeiras
carnavalescas animadas ao ritmo do samba, e estas seriam as turmas
de samba.
Posteriormente estas turmas de samba se tornariam as escolas de
samba, portanto ERICEIRA
(2006) destaca que essas transformações se deram de maneira
gradual, e em meados de 1960
esta nomenclatura “escola de samba” se consolida.
“É oportuno reinterar que gradualmente as turmas de samba foram
incorporando novos elementos e se aproximando da estrutura ritual
de desfiles das escolas de samba, ao modificarem o ritmo de suas
baterias e introduzindo outros personagens em seus desfiles...”
(ERICEIRA, 2006, p. 63)
Durante algum tempo, turmas de samba e escola de samba são
confundidas,
todavia ERICEIRA (2006) destaca que o importante não é saber as
principais diferenças de
uma ou outra, mas delinear como os antigos elementos foram
transformados ou sendo
abandonados paulatinamente até assumirem o que se apresenta
atualmente nas escolas de
samba de São Luís.
Neste contexto de transformações, MARTINS (2001) cita que as turmas
de samba
geralmente iniciavam de um grupo de amigos, a procura de novas
alternativas carnavalescas,
e um de seus desdobramentos foi à escola de samba. Especificamente
na década de 70, “as
turmas de samba de São Luís, que vinham percorrendo um caminho
criativo relativamente
autônomo, irão incorporar “novidades” que aproximem da exuberância
do carnaval carioca,
influenciadas pelas imagens televisivas já estavam em expansão.”
(MARTINS, 2001.p.117)
Tais transformações caminham com a organização das escolas de
samba, pois a
12
desde 1950, e ainda que organizado pelo poder público, este até
então não interferia na
espontaneidade das manifestações. Contudo, o mesmo autor observa
que a partir de 1976 fica
visível a perda de espontaneidade do carnaval tradicional, na
medida em que surgem
incentivos oficiais para que as brincadeiras se
apresentassem.
Partindo-se do pressuposto da afirmativa de QUEIROZ (1992) quando
afirma que
o carnaval deve ser estudado levando-se em conta, principalmente,
as condições sócio-
econômicas e culturais de cada povo, e cada grupo que o realiza,
para que seja possível
apreender seu sentido, este trabalho buscou nas obras de ERICEIRA
(2006), e ARAÚJO
(2001) tal característica, pois ambos buscaram a vivência e as
experiências vividas por escolas
de samba de São Luís; a Flor do Samba e Favela do Samba.
Nestas duas agremiações, buscou-se analisar a relação do Estado com
o carnaval,
iniciando o trabalho com a década de 70 onde o carnaval de
passarela passa por um grande
momento, tendo as escolas de samba como destaque, e o grande
interesse do Estado, gerando
um maciço apoio estatal.
Passando pela década de 80, mesmo em meio a crises financeiras em
que o Brasil
passava, as escolas de samba conseguem seu espaço, chegando enfim a
década de 90, onde o
quadro apresentado é diferente, o espaço para o cortejo das escolas
de samba diminui no
cenário carnavalesco, assim como o interesse do Estado pela
brincadeira. Contornos estes, que
se iniciam no final da década de 80, e se consolidam nos anos
90.
Ao longo deste trabalho procurou-se observar que nestas diferentes
épocas o
Estado atuou de várias maneiras, conforme o propósito de interesses
dos poderes públicos.
Neste sentido analisa-se as influências mercadológicas no campo do
turismo que podem ser
percebidos como arcabouço para a variação das atuações de políticas
culturais sobre o
carnaval de São Luís.
Esta pesquisa contou principalmente, com os jornais da época, por
onde
percebemos as transformações pelas quais o carnaval passou quanto à
questão da intervenção
do Estado, assim como outros fatores que contribuíram para essas
mudanças.
Partindo-se dessas abordagens e leituras, este trabalho insere-se
no campo da
história cultural por entender que, “o fato de que as tradições de
uma cultura possam ser
identificáveis não quer dizer que não se transformem que não tenham
sua dinâmica. Nada do
que é cultural pode ser estanque, porque a cultura faz parte de uma
realidade onde a mudança
é um aspecto fundamental”. SANTOS (1984, p. 47)
Esta pesquisa fundamentou-se em artigos, livros, teses, jornais da
década de 70,
13
entre outros. O trabalho está dividido em três capítulos. No
primeiro capítulo através de várias
leituras principalmente de jornais da década de 70, procurou-se
identificar a situação do
carnaval ludovicense, e as políticas públicas implantadas para seu
resgate, assim como a como
a construção das escolas de samba como brincadeira preponderante na
folia de São Luís, e o
interesse do Estado em prover este tipo de brincadeira.
No segundo capítulo: A década de 80 destacou-se o momento paradoxal
vivido
pelas escolas de samba, pois o Brasil neste momento passa por
dificuldades financeiras, mas
as escolas de samba em São Luís conseguem se afirmar no cenário
carnavalesco atingindo seu
auge. Destacando também as relações das escolas de samba e agentes
políticos locais, onde
pode ser caracterizado como intervenção estatal não oficial.
Ainda no segundo capítulo, aborda-se o final da década de 80 como o
início das
dificuldades das escolas de samba no cenário carnavalesco, assim
como a canalização da
maioria das verbas estatais para outros tipos de
brincadeiras.
No terceiro capítulo, destaca-se a década de 90, com a
intensificação das críticas
ao carnaval das escolas de samba como imitadoras decadentes das
escolas de samba carioca,
gerando iniciativas para resgatar o antigo carnaval de São Luís,
intensificando e propagando o
carnaval de rua, como o autêntico carnaval maranhense. Assim também
como o desvio da
atenção e verbas do Estado para o investimento do carnaval de
rua.
A abordagem sobre a década de 90 inclui também a problemática em
torno do
discurso de legitimação sobre o projeto carnaval de rua, assim como
a chegada de elementos
baianos no carnaval maranhense e suas conseqüências no discurso de
defensores do genuíno
carnaval maranhense.
Neste processo de mudanças de interesses por parte do Estado nas
escolas de
samba de São Luís, no decorrer das décadas trabalhadas nesta
pesquisa, procurou-se perceber
também a atuação de membros envolvidos neste tipo de brincadeira e
sua participação
atuante.
2 CARNAVAL DO SAMBA – DÉCADA DE 70: AUGE OU DECADÊNCIA?
O carnaval é uma das maiores festas populares do Brasil, e este nem
sempre teve a
presença estatal na sua organização. Contudo, ao longo dos anos
essa presença passa a existir,
tornando-se atuante e muitas vezes indispensável. Para penetrar no
estudo das relações
estatais com o folguedo carnavalesco, mas precisamente as escolas
de samba, explicita-se que
ao trabalhar com a palavra Estado, e que tal definição varia de
acordo com a perspectiva
adotada por quem escreve, adota-se neste trabalho a visão de que o
Estado é uma organização
complexa que detém o poder político, sendo ele na esfera Municipal
ou Estadual.
Na perspectiva da compreensão do quadro político dominante no
Brasil, assim
como este se relacionava com o tríduo momesco, necessário torna-se
contextualizar o cenário
político em que o país estava inserido na década de 70. Neste
período vigorava no Brasil o
Regime Militar, golpe dado pelos militares no início dos anos 60,
anos de grandes contrastes.
Como característica desse governo destacava-se a propaganda
política massiva, assim como a
censura a tudo que podia pôr em risco o regime militar ou aquilo
que ia contra a posição
político ideológica do governo.
Consequentemente foram anos marcados pelas perseguições e o
desaparecimento
daqueles que ousavam desafiar as idéias deste regime, mas a
resistência existiu a este modelo
político, principalmente por parte de intelectuais, estudantes,
operários e artistas. Conhecida
também como os anos de chumbo brasileiro, a década de 70 também foi
marcada pelo rígido
controle sobre o que se produzia culturalmente no Brasil, prova
disso foi à criação do Ato
Institucional, o AI-5, que fiscalizava e barrava produções que o
regime achava que
prejudicaria suas idéias.
Com isso várias manifestações artísticas foram reprimidas e seus
protagonistas,
em sua grande maioria empurrada para o exílio. E o carnaval como
manifestação cultural e
artística, precisamente as escolas de samba, não fugiam a esse
rígido controle, tudo deveria
passar antecipadamente pelo órgão do governo responsável pela
censura.
“Neste ano as Escolas de Samba Cariocas são obrigadas a mostrarem
antecipadamente aos órgãos policiais censores, os croquis de suas
alegorias, fantasias e letras de seu samba enredo (...)” (A Tribuna
do Norte, 10, jan, 1971).
O recorte jornalístico acima se remete a situação das escolas de
samba do Rio de
Janeiro, e embora houvesse o rígido controle do carnaval, ao que se
percebe este não deixava
de acontecer, mesmo com restrições. Entretanto nos jornais
pesquisados de São Luís da
folguedo momesco ludovicense, levando a crer que tais
interferências foram poucas, a ponto
de não chamar atenção da mídia local.
O carnaval ludovicense na década de 70 compreende dois momentos
distintos que
vão interferir de forma definitiva na forma de fazer carnaval em
São Luís. De 1970 a 1973,
detecta-se em periódicos pesquisados muitas cobranças e queixas de
personagens atuantes no
carnaval ludovicense, denúncias de abandono e falta de organização
por parte dos poderes
públicos, assim como uma deficiente estrutura. Todavia, é
importante ressaltar que de acordo
com as mudanças ocorridas no carnaval, novas necessidades foram
surgindo e novas
cobranças e antigas também, continuaram sendo feitas ao
Estado.
Entretanto segundo Ananias1 a organização do carnaval de São
Luís, a partir de
1950 já ficava a cargo da prefeitura, responsável pela premiação de
acordo com a divisão
entre blocos e escolas de samba, o que sugere que o modelo de
carnaval submetido à
organização estatal já se dava há alguns anos, contudo, essa
intervenção toma várias formas
no decorrer dos anos, o foco principal deste trabalho que pretende
perceber estas nuances.
Outra função de destaque e também de responsabilidade da
prefeitura, era a decoração da
cidade, tornado-se quase como um termômetro do ânimo do folião para
o carnaval de cada
ano, e sempre com lugar de destaque na mídia local, que aprovava ou
reprova o estilo
utilizado, sendo amplamente divulgadas as várias opiniões a
respeito.
Os três anos do início dos anos 70 considerados como decadentes do
carnaval
ludovicense, é marcado por muitas críticas e um discurso saudosista
dos antigos carnavais,
que inclusive vai ser marca registrada até hoje em crônicas de
escritores em vários jornais,
dando ênfase no mito de que o carnaval de São Luís estaria perdendo
o seu lugar como
terceiro do Brasil. Contudo Silva2 destaca que o mito está
relacionado com o sujeito, seja para
contá-lo, para organizá-lo ou para legitimá-lo. E o mesmo autor,
através dos seus estudos
sobre carnaval de São Luís é sensível a percepção de que há uma
tentativa de legitimação por
parte da mídia em passar a idéia de que em São Luís brincava-se o
terceiro melhor carnaval
do país e que tal mito teria sido construído no período dos
cordões. Portanto, o tempo vivido é
considerado sempre melhor que o tempo atual.
Embora o carnaval fosse organizado oficialmente pela prefeitura, as
escolas de
samba na década de 70 recebiam o apoio de empresa privadas, entre
elas alguns jornais da
cidade, que distribuíam troféus aos destaques do carnaval. E mas
que isso, no caso do jornal,
16
O Imparcial, percebe-se algumas intermediações com os poderes
públicos no apoio material
para algumas brincadeiras carnavalescas.
Escolas de samba – proveitosa a nossa reunião hoje no Imparcial. As
escolas de samba queriam mostrar ao povo que também é uma mensagem
de paz.(...) O desanimo inicial com a falta de verba, a falta de
decoração e o pouco caso dos responsáveis, foi substituído depois
da nossa reunião. (...) A grande alegria também é saber que o
Imparcial e a Gurupi com a colaboração dos irmãos Antonio e
Severino Gaudêncio vão premiar com dois troféus os sambistas. (O
Imparcial, São Luís, 16 de Fev. de 1972) A grande tribo que vai que
vai desfilar êste ano esteve nos visitando e contando suas
dificuldades para poder fazer o carnaval. D. Zelinda, ouvindo O
Imparcial a respeito do fato providenciou logo uma ajuda para as
meninas. (...) (O Imparcial, São Luís, 11 de Fev. 1971)
As duas citações acima corroboram a idéia de um carnaval
desassistido pelo
Estado, e que este contava com ajuda da iniciativa privada no
sentido de divulgação e
organização de eventos, diferente dos benefícios materiais
adquiridos, mas à frente quando as
escolas de samba se sobressaem no carnaval de São Luís e também
agregam ajuda privada,
mas de cunho material.
Entretanto, contrariando a opinião de que o carnaval estaria
morrendo e que
faltavam investimentos para as brincadeiras carnavalescas, a
senhora Zelinda Lima,
representante do órgão responsável pelo gerenciamento do carnaval
de São Luís até então, o
Departamento de Turismo do Estado, no início da década de 70,
responde em um dos mais
populares jornais da cidade que, “a evolução do carnaval era
nítida, haja vista que as antigas
turmas de samba na sua maioria haviam se transformado em escolas de
samba, as antigas
brincadeiras também eram apreciadas, e que naquele ano a Turma do
Quinto ia sair com 200
pessoas, e que nas ruas os fofões e os Baralhos ainda mostravam sua
alegria, e por fim, o
tambor de crioula que havia 2 ou 3, mas que naquele ano 10 estavam
registrados” 3 . Ou seja,
esta induz o leitor a visualizar a evolução do carnaval
ludovicense, e que os problemas do
carnaval estariam em outros fatores:
“E ainda dizem que o carnaval está morrendo! O que há segundo
parece, é a falta de organização nos desfiles, realizados em locais
impróprios e sem obediência de horário (...)”. (O Imparcial, São
Luís, 12 fev. 1971)
A falta de apoio do Estado no tríduo momesco era sentido em todas
as
brincadeiras carnavalescas, o que já se deixou explícito, e
consequentemente nas escolas de
samba que ainda não tinham se tornado expressão máxima do carnaval
de São Luís. No
entanto suas reivindicações estavam sempre na mídia, e torna-se
pertinente, mas a frente
17
destacar características que tornaram as escolas de samba com seus
carnavais de passarela,
preponderantes na folia ludovicense. Portanto no início dos anos
70, dentro do período
consideradas como decadentes do carnaval e sem o respaldo do
Estado, essas agremiações
carnavalescas vivenciam suas agruras com os poderes públicos,
ressaltando que essa relação
de conflito não faz parte somente da década de 70.
No carnaval de 1973 desentendimentos das escolas de samba e o
órgão
responsável pela premiação do desfile, a Coordenadoria de Turismo,
marcou a discussão
daquele ano. Pois, as escolas de samba estavam na iminência do
desfile do carnaval de 73,
mas a premiação do carnaval passado, do ano de 72 ainda não havia
sido pago para as
mesmas. Com isso, algumas escolas de samba ameaçavam não mas
participar do desfile
promovido por este órgão aquele ano.
“Conforme denúncia feita pelo presidente José Alves Costa da Escola
Flor do Samba, uma das ganhadoras do concurso, realizado no
carnaval passado, os prêmios que fizeram jus as escolas de samba
vencedoras, até o momento não foram pagos pela Coordenadoria de
Turismo (...)” (O Imparcial, São Luís, 11, fev. 1973)
Um quadro de decadência e abandono do carnaval de São Luís, e que
segundo a
prefeitura, a falta de dinheiro não possibilitava maiores
investimentos.
Decepção – Mesmo os mais otimistas estão decepcionados com o
carnaval maranhense. (...) O resultado veio na quarta feira de
Cinzas. Não se viu o carnaval Maranhense esse ano. O Dept. de
turismo não teve verbas e sem dinheiro não seria possível fazer
promoção. Particularmente acho que esse fato ver em benefício do
novo prefeito que deve antemão que com seus próprios recursos o
povo não pode fazer carnaval. (O Imparcial, São Luís, 28 de fev.
1971)
2.1 Políticas Culturais Carnavalescas na década de 70
Conforme o delinear do quadro carnavalesco do início dos anos 70, o
governo do
Estado interfere entregando a organização do carnaval de 1974, ao
Departamento de Turismo
- (DETUR), caracterizando um segundo momento do carnaval de São
Luís na década de 70.
Reação que poderia ser enquadrada na busca do conhecimento do
turismo como
investimento, e o início da transformação do carnaval ludovicense
como produto turístico,
tanto que no ano seguinte, autorizado pelo então governador Nunes
Freire, a DETUR –
Departamento da SIC, se transforma em MARATUR (Empresa Maranhense
de Turismo),
18
Os repasses da subvenção para as brincadeiras aquele ano seguiram
alguns
critérios, a principio somente as manifestações classificadas como
brincadeiras de rua
receberiam o incentivo financeiro, o que conseqüentemente as
escolas de samba ficariam de
fora, no entanto como diz o jornal, “numerosas entidades
carnavalescas dessa capital
manifestaram o desejo de receber ajuda da Secretaria de Indústria e
Comércio para as suas
apresentações” 4.
Contudo, para receber a ajuda, as entidades solicitantes teriam que
“provar que
eram vinculadas á Federação das Escolas de samba do Maranhão,
devendo ter também
autorização da Polícia Federal do Maranhão e da Divisão de Costumes
e diversões da
Secretaria de Segurança Pública, o que caracteriza ainda que
pequena, a interferência atuante
da ditadura militar na folia momesca ludovicense” 5.
As escolas de samba receberam o incentivo financeiro prometido pela
DETUR,
levando 26 escolas de samba à passarela aquele ano:
Foram entregues ontem às escolas de samba da capital todos os
cheques que a Secretaria de Indústria e Comércio deu como ajuda
pela participação dessas organizações no carnaval deste ano. (...)
A importância arbritada pela comissão nomeada pela SIC variou entre
500 e 2.000 cruzeiros com o que ainda houve descontentes. Cada um
dos representantes das agremiações contempladas assinou o termo de
compromisso obrigando se a bem empregar o dinheiro e obedecer a
regulamentação oficial do desfile.” (O Imparcial, São Luís 20 de
Fev.1974)
É importante ressaltar o último parágrafo do fragmento jornalístico
acima, pois
segundo ERICEIRA (2005) um dos objetivos do DETUR era também
oferecer dispositivos
que visavam disciplinar os cortejos momescos, ou seja, delimitar um
trajeto previamente
programado para corsos e carros alegóricos, estabelecimento de
início e de término dos
desfiles, concessão de prêmios às brincadeiras vencedoras e
construção de palanques para
julgadores, autoridades e convidados. E o autor continua
lembrando que o itinerário prescrito
por aquele órgão estadual para as denominadas brincadeiras de rua
foi posteriormente
chamado de quadrilátero carnavalesco, por causa do quarteirão
formado pelas quatro ruas por
onde as agremiações passavam.
Para Martins6 a partir de 1976 a perda da espontaneidade do
carnaval tradicional
já era visível, propiciada pelo incentivo oficial para que as
brincadeiras se apresentassem.
Contudo, ERICEIRA (2005) aborda questões onde Canclini
(1998)7 possibilita outra visão a
19
respeito da intervenção estatal, ou seja, os investimentos públicos
ou privados nos produtos e
expressões populares não podem ser compreendidos apenas pela ótica
negativa que supõe tal,
intromissão como deletéria ao que considera a essência do popular.
Pois o sistema capitalista
continua o autor, inviabiliza posturas românticas das culturas
populares, uma vez que muitas
organizações culturais ou atores sociais, como artesãos, necessitam
de apoio de políticas
culturais para garantirem a continuidade de suas produções
simbólicas.
E no caso das escolas de samba, ERCICEIRA (2005) identifica que
o
investimento dos poderes públicos nessa forma de brincar o
carnaval, conduziu as escolas de
samba a assumirem papel de relevância no carnaval de São Luís, com
destaque para o
carnaval de 74, onde segundo o mesmo autor estas conseguiram se
firmar como
manifestações momescas predominantes no carnaval ludovicense.
Observando alguns fatores na trajetória das escolas de samba de São
Luís, pode-
se até permitir a idéia de que essa preponderância sobre as outras
brincadeiras teve sua
construção iniciada em 1971, quando as entidades sambistas se
uniram e criaram a Federação
das Escolas de Samba do Maranhão (FESMA), com o objetivo de se
organizarem e
negociarem suas reivindicações junto ao Estado.
Mas tarde ocorre uma divisão interna comandada pela Turma do
Quinto, onde
fundam a União das Escolas de Samba (UESMA). Pois na briga da
presidência da FESMA,
Flor do Samba não abria mão dessa possibilidade, ou seja, uma
escola não queria se submeter
à outra, gerando divisões entre elas.
Embora com todas as divisões, as escolas de samba conseguiam exigir
e
argumentar com o Estado aquilo que lhes achavam de direito, sendo a
única brincadeira
organizada legalmente, possibilitando com mas fluidez o diálogo com
os poderes públicos
que nem sempre era tão fácil.
Ao que parece, o carnaval de 74 pode ser considerado um divisor na
história das
sociedades sambistas de São Luís, alguns diriam que os anos 70
teriam sido esse divisor. Pois
a partir da segunda metade de 70, as escolas de samba iniciam um
processo chamado por
alguns de cariocarização, onde as agremiações sambistas
ludovicenses buscavam nas escolas
de samba do Rio de Janeiro, segundo MARTINS (2001) repetir as
novidades cariocas. E o
meio de viabilização para que o carnaval do Rio de Janeiro servisse
de modelo para todo país,
segundo o estudioso ERICEIRA (2005) teria sido a televisão que
passou a transmitir o
carnaval de passarela carioca todos os anos.
As imagens dos desfiles das escolas de samba de São Luís também
passaram a ser
20
tinha aderido ao modelo do carnaval de passarela, a classe média.
Detentora da maioria dos
televisores da época, considerada até então artigo de luxo.
Contudo, para alguns o advento da televisão não trouxe tantos
benefícios assim
para o carnaval local:
“Depois que passaram a fazer o televisionamento de blocos e escolas
de samba. Findou-se o carnaval de Rua. Os cordões, blocos e escolas
de samba só deixam sua sede quando começa a escurecer e assim mesmo
em caminhões (...) só se ver carnaval de Rua em São Luís quem tem
um aparelho de Televisão”. (Jornal Pequeno, São Luís 06 de Fev.
1971)
A aproximação da classe média das escolas de samba e sua
participação nas
mesmas, segundo ERICEIRA (2005) seria o resultado da complexa
relação social que incluía
investimento governamental, participação de veículos de comunicação
de massa, organização
interna e a adoção de uma nova estrutura de desfiles inspirados no
sucesso alcançado pelas
agremiações cariocas, para o autor, tais fatos acentuaram de
maneira significativa e célere o
interesse de outros atores sociais por essa expressão
carnavalesca8.
Dentro do modismo que despontara entre a classe média, a rivalidade
entre as
escolas de samba A Flor do Samba e a Turma do Quinto marcava essa
dinâmica, ou seja, as
duas escolas, mas procuradas por tais classes, foram estas.
Contudo, segundo ARAÚJO
(2001) a Flor do Samba é que ganha o rótulo de “escola rica” e
Turma do Quinto de “escola
do povo”, e esta última vai ser caracterizada como oposição a tudo
que a Flor representava,
haja vista que membros da família Sarney compunham a Flor do
Samba.
O final dos anos 70 é marcado por algumas discussões, no carnaval
de 77 houve
um aumento considerável da participação de foliões nas escolas de
samba, e
consequentemente a criação de várias agremiações, a ponto do Estado
preocupar-se com a
estrutura interna, e se estas teriam possibilidade de desfilar nos
padrões desejados. Com isso
as escolas de samba foram dividas em três grupos de classificação.
Neste mesmo ano a
MARATUR sugere a união das pequenas escolas. Atitudes que
demonstram a solidificação
do carnaval de passarela no cenário carnavalesco de São Luís.
“A Junção de algumas escolas e a eliminação do grupo C, podem ser
as mudanças a serem sugeridas pela Empresa Maranhense de Turismo
para o próximo ano”. (O Estado do Maranhão, São Luís, 22 de Fev.
1977)
No carnaval de 78, as reivindicações solicitando o aumento da
subvenção a MARATUR
aumentam, e as escolas de samba ameaçam não desfilar, se não fossem
atendidas, e ARAÚJO (2001),
chama atenção para o poder de barganha que aumentava cada vez mais
das escolas de samba. Todo o
8 ERICEIRA, op. cit., p. 123.
21
“cenário” é montado pela MARATUR, na tentativa de colocar as
escolas de samba como seu principal
investimento, a exemplo do Rio de Janeiro, continua o mesmo autor,
no entanto, o Maranhão esbarrara
nas restrições econômicas. Continuando nesse mesmo objetivo de
investimento nas escolas de samba,
a MARATUR transfere o carnaval do centro de São Luís, para o Anel
Viário, gerando celeumas entre
o governo do Estado e Prefeitura.
A década de 70 encerra-se com adequação do espaço a ser escolhido
para o
desfile das escolas de samba, ocasionando conflitos a serem
resolvidos.
O presidente da MARATUR, comentando a mudança do desfile
carnavalesco do centro de São Luís, esclareceu que o povo não deve
confundir desfile oficial com o carnaval maranhense, “pois este
estará em todos os locais, sem qualquer vinculação com a
localização do desfile”. (...) “A mudança para as imediações do
viaduto “Getulio Vargas”, atendeu melhor o interesse das escolas de
samba e blocos desfilantes, que não haviam gostado do outro local
anteriormente fixado.” (O Imparcial, São Luís, 09 de
Fev.1979)
Este cenário permite perceber uma visão não tão romantizada do
Estado em
relação ao incentivo cultural, assim como a criação das políticas
públicas para seu incentivo,
onde este não teria por si só o objetivo de estimular e proteger
brincadeiras que poderiam ficar
no esquecimento. Os anos seguintes também poderão ajudar a
compreender essa relação
22
3 DÉCADA DE 80: ESCOLA DE SAMBA E O ESTREITAMENTO DAS
RELAÇÕES
POLÍTICAS EM SUAS VÁRIAS FORMAS E MODALIDADES.
O Brasil na década de 80 havia se tornado um verdadeiro caldeirão
de
transformações políticas, sociais e culturais. O regime militar já
se mostrava completamente
desgastado, propiciando um profundo processo político. O fim da
ditadura significava a
retomada de uma série de liberdades civis que foram completamente
banidas pelas ações
restritivas impostas pelo governo militar que vigorou durante duas
décadas.
Durante o governo de Figueiredo, o Brasil mergulhou numa das mais
graves crises
econômicas da sua história, sendo a década de 80, chamada por
alguns de “década perdida”.
A inflação era muita alta, a dívida externa assombrosa e as dívidas
públicas do governo
maiores que sua arrecadação.
De forma paradoxal, as escolas de samba de São Luís vivem seu
grande momento
na década de 80, com grande divulgação e adesão de várias classes
populares, em destaque a
classe média, que desde o final da década de 70 já vinha aderindo a
folia das escolas de samba
de São Luís.
O novo contexto em que as escolas de samba estavam inseridas já
não
correspondia ao que era apresentado anteriormente, um novo patamar
de luxo foi alcançado
em suas apresentações, por vezes gerando dificuldades financeiras
para manter o nível
almejado:
“Débito ameaça a Flor do Samba no desfile do Carnaval de 80 na João
Lisboa”. O elevado débito de quase 500 mil cruzeiros no comércio
local, principalmente
junto ao Armazém Abreu e a Cerma, poderá impossibilitar de
uma vez por toda a Flôr do Samba de sair às ruas da cidade neste
carnaval de 80. (...) Segundo informou a mesma fonte, a principal
causa da crise interna formada entre os diretores da Flor, deve-se
ao fato de alguns terem idéias fixas de fazer um carnaval
milionário, que infelizmente tem fugido às nossas realidades
financeiras. (O Estado do Maranhão, São Luís, 06 de fev.
1980)
Percebe-se que o investimento nas escolas de samba ludovicense
tornaram-se
onerosos para o Estado, principalmente no contexto econômico em que
o Brasil vivia aquele
momento, contudo ainda havia interesse por parte dos poderes
públicos em investir no
carnaval de passarela, pois parte dos recursos eram destinadas às
escolas de samba.
Tanto que no trecho acima, há o relato de que a culpa estaria no
acúmulo de
débitos da escola de samba, citada no fragmento jornalístico acima,
no excesso de luxo, e que
23
estatal para manter o padrão pretendido, ou seja, as verbas que as
escolas de samba recebiam
do Estado, eram complementadas com investimentos
“particulares”.
Recursos que somados ao liberado pelo Estado, aos adquiridos com
eventos
promovidos pela agremiação, infere-se que possibilitava as escolas
de samba a promover
desfiles com o luxo que algumas escolas de samba pretendiam.
Lembrando que nem todas
eram adeptas desse modelo luxuoso, algumas agremiações preferiam
investir em um material
alternativo, mas maranhense, entre elas a Turma do Quinto que
sempre buscava utilizar este
tipo de material, buscando uma vertente diferente.
Portanto a notícia do fragmento abaixo corrobora com a idéia
apresentada de
investimentos privados, pois a mesma escola de samba que ameaçava
não desfilar por conta
dos débitos, algumas semanas depois, dá a seguinte declaração em
outro jornal da cidade:
As tradições do povo africano e suas influências no Maranhão é
temática base para o desfile da Flor do Samba este ano. E, segundo
o carnavalesco da escola, Francisco Coimbra, a “Flor do Samba” irá
desfilar na João Lisboa apresentando as fantasias mas luxuosas do
Carnaval Maranhense (..) “Quem gosta de pobreza é intelectual” – já
dizia Joãozinho Trinta, segundo ele, o carnaval é luxo e isso é que
não vai faltar no desfile da “Flor do Samba” (O Imparcial, São
Luís, 17 fev. 1980).
No carnaval de 1980, a organização do tríduo momesco ludovicense
volta para a
prefeitura de São Luís, para tanto, é criado a Companhia Municipal
de Turismo (COMTUR)
órgão responsável em gerir o carnaval.
A princípio o responsável por esta pasta, alega poucas verbas,
entretanto, a
prefeitura passa a idéia de que mesmo com as dificuldades, esta
providenciaria o que fosse
necessário “para que fosse apresentado o melhor carnaval de São
Luís aquele ano”.
“Para o carnaval de 80, o Presidente da Companhia apresentou ao
prefeito Mauro Fecury, após minucioso levantamento, um orçamento de
2.311.000,00 incluindo decoração, ajuda financeira (992 mil),
iluminação, arquibancadas 9, despesas com concursos de Rei Momo e
Rainha do carnaval, prêmios, troféus, etc. Américo continua
otimista e espera realizar um dos melhores carnavais”.
Algumas providências foram tomadas para que o carnaval de 80
tivesse a estrutura
que a prefeitura entendia ser melhor, entre elas a volta do
carnaval para o centro da cidade,
assim como a construção da arquibancada, pois no ano anterior, tal
responsabilidade ficara a
cargo da empresa TV Difusora, que alegava não ter condições para
construir.
24
Embora várias brincadeiras fossem apresentadas na passarela, o
ponto auge dos
desfiles era a apresentação das escolas de samba. Ao que se
percebe, toda infra- estrutura era
montada pensando nas necessidades das escolas das escolas de
samba.
Além de todas estas atribuições citadas acima, ao Estado também
cabia a função
de confeccionar Lp’s, onde divulgava o samba enredo de algumas
escolas de samba e que
também servia de renda alternativa para as agremiações.
O carnaval maranhense de 80 está pronto. Se a companhia tivesse
dinheiro faríamos o melhor carnaval do Brasil, disse ontem o
presidente da Companhia Municipal de Turismo (...) Hoje o
presidente da Companhia entrega os discos de samba enredo às
escolas que dele fizeram parte em presença do prefeito Mauro Fecury
e todo seu secretariado. (O Estado do Maranhão, São Luís, 13 de
fev. 1980)
Mas do que divulgar samba enredo, tal promoção ainda cabia no
projeto de tornar
o carnaval de São Luís em produto turístico, pois como principal
atração do carnaval
ludovicense, as escolas de samba, eram trabalhadas para que
pudessem atrair um turismo
ainda incipiente em São Luís.
Tais investimentos denotam a relação oficial que existia entre o
Estado e as escolas
de samba, contudo as formas de relacionamento do Estado com o
carnaval de São Luís,
também possui características que eram pautadas em relações não
oficiais, haja vista que as
escolas de samba recebiam apoio de membros ligados ao Estado, que
interferiam de algum
modo, apoiando não somente no campo material, mas em vários
assuntos, para alguns, até nos
resultados dos desfiles oficiais.
Fato que pode ser relacionado com a fala de alguns entrevistados
por ERICEIRA
(2005) em sua obra, quando estes mencionavam que “forças ocultas”
apoiavam algumas
agremiações, interferindo e se posicionado ao lado destas,
configurando uma linha político-
partidária, seguida por algumas escolas de samba de São Luís.
3.1 Intervenção Estatal não oficial
É notório que nos anos 80, a idéia do Estado como provedor e
mantenedor da folia
momesca em São Luís continua. No entanto chamamos atenção para a
ênfase nas redes de
relações das escolas de samba com agentes políticos locais e
parentescos, relações que não se
iniciam nos anos 80, mas só se intensificam, com o principal
objetivo de defender seus
interesses e adquirir benefícios.
25
Para entender, de forma, mas apropriada como o Estado podia atuar
de maneira a
ser considerada não oficial, episódios como o espaço a ser
escolhido para o desfile das
agremiações e as outras brincadeiras carnavalescas no ano de 1980,
registra a relevância que
sociedades sambistas alcançaram, e denota a complexidade da relação
escola de samba e
Estado.
No ano anterior, o desfile oficial, as apresentações de blocos,
escola de samba e
outras brincadeiras foram deslocadas do chamado “quadrilátero
carnavalesco”, que tinha
como palco principal as ruas estreitas do centro de São Luís, para
o Anel Viário. Todavia, no
entender do então prefeito, Mauro Fecury essa troca não foi bem
sucedida, pois de certa forma
ele compreendia que trazer o carnaval para as ruas do centro de São
Luís, traria também uma
maior participação da população, assim como uma maior
acessibilidade dos turistas a festa
momesca.
“(...) Logo pela manhã vários blocos de sujos eram organizados nos
bairros e, de lá desciam em direção ao centro da cidade,
propiciando grande movimentação carnavalesca. Cada um brinca como
pode nos blocos de sujos, fazendo com que se tenha um carnaval mais
autêntico, mais povo, do jeito que o prefeito Mauro Fecury
pretendia ter. Ao determinar a volta dos desfiles das grandes
escolas para o centro da cidade”. (O Estado do Maranhão, São Luís,
18 fev. 1980).
Para algumas escolas de Samba o Anel Viário atendia as suas
necessidades, ou
seja, comportava a quantidade de membros que desfilava nas escolas
de samba, e que
aumentava consideravelmente, e comportava também os carros
alegóricos.
Neste contexto, compreende-se que estas redes de relações eram
extremamente
importantes em ser mantidas pelas Escolas de Samba, pois nesse
episódio alcançou quem as
representasse na Câmara Municipal, pois algumas agremiações
preferiam que a passarela
permanecesse no Anel Viário.
Em destaque, a frase do então Vereador Manoel Ribeiro que
contrariado com a
decisão do prefeito, proferiu: “só nos resta brincar em qualquer
lugar da cidade”, e que para
ERICEIRA (2005) esta frase possui um “significado simbólico
relevante, por ter sido
enunciado por um agente político, o que confirmava a participação
de membros de grupos
políticos nos desfiles das escolas de samba, os quais advogavam os
interesses dos seus grupos
carnavalescos”.
Ainda assim, as escolas de samba não admitiam publicamente que
pudessem ser
beneficiadas por seus patronos, ou padrinhos políticos. Ao mesmo
tempo que as escolas de
samba recebiam apoio de forma oficial do Estado com cotas de
subsídio para ajudar nas
lhes eram pertinentes, conforme comentário acima. (ERICEIRA, 2005,
p. 155)
Configurando essa realidade, a participação da família Sarney
também é registrada
no carnaval de passarela de São Luís, participando por alguns anos
da Flor do Samba. No
entanto o modismo do carnaval de passarela alcança outros
personagens políticos que se
envolvem com este tipo de brincadeira.
Entretanto torna-se pertinente observar que não se tratava só de
modismo o apoio
de políticos a estas agremiações, muitas vezes as escolas de samba
foram utilizadas como
manobras políticas e curral eleitoral, pois conforme ANANIAS
(2001), com o fortalecimento
das eleições municipais nos anos 80, principalmente de vereadores,
tais entidades tornaram-se
lugares privilegiados na formação de tais “currais eleitorais
urbanos”.
Em se tratando de grupo político e parentescos envolvidos de
maneira tida como
não oficial o grupo dominante, liderado por Sarney se sobressai por
conta do seu
posicionamento na política, pois revisando parte da vida política
de Sarney, este foi diversas
vezes deputado, foi governador do Maranhão entre 1966 e 1971,
senador pelo Maranhão entre
1971 e 1985, presidente da República de 1985 a 1990. Participante
das “Diretas já”, Sarney
tornou-se presidente do Brasil em 1985, passando a ter destaque
nacional, e acarretando mais
vigilância e críticas a Flor do Samba, que possuía ligação com o
grupo político dominante.
Ressalta-se que denúncias de favorecimento eram feitas
constantemente através
dos meios de comunicação, tanto por parte da Turma do Quinto em
relação à Flor e sua
ligação com o grupo Sarney, como também ao contrário.
Entretanto ERICEIRA (2005) desataca que essa dicotomia,
posição-oposição era
também reconhecida na relação que a Turma do Quinto mantinha com
Cafeteira e Ivar
Saldanha, embora, estes alegassem não tirar proveitos políticos de
tais relações.
Todavia, o modo como a Turma do Quinto vivencia a política, traz à
tona
denúncias e temas polêmicos que envolvem o contexto político em que
São Luís estava
inserida, utilizando a composição de samba enredo, e representando
na passarela, como foi no
caso do carnaval de 1987.
Alcantaralândia trazida pela Turma do Quinto promete detonar na
avenida todos os foguetes da classe de mísseis de Alcântara e
mostrar em cerca de sete carros alegóricos o que a cidade histórica
tem de mais importante. (O Estado do Maranhão, São Luís, 22 de
Fev.1987)
A presença de membros da família Sarney na Flor do Samba tem
registro em 1978
27
onde por muitos anos organizou alas para esta escola de samba,
provavelmente com membros
do seu convívio social, já que a Flor do Samba foi a escolhida por
muitos da classe média.
Constantemente a Flor do Samba era acusada pela escola Turma do
Quinto,
considerada a escola do Povo e dos intelectuais, de se beneficiar
com estas redes de relações,
não só no campo material, mais como também na manipulação de
resultados dos desfiles
oficiais, assim como também a Flor do Samba acusava a Turma do
Quinto.
Contudo verifica-se que havia um favorecimento, e este acontecia
nas duas
escolas, pois havia constantemente a alternância de títulos entre
elas. Tanto que no carnaval
de 83, a Escola de Samba, Favela do Samba do Bairro Sacavém,
ameaçava não desfilar no
concurso oficial naquele ano, por conta de conchavos que
beneficiariam a Turma do Quinto.
“(...) a diretoria da Favela do Samba vem mantendo reuniões para
decidir esta manhã, se aquela Escola de Samba participará ou não do
desfile oficial. Adoval Nunes levantou suspeitas da Comissão
julgadora instituída pela comissão organizadora do carnaval,
afirmando que o presidente desta, Américo Azevedo traçou o seu
esquema para dá a Turma do Quinto como Campeã (...) (O Imparcial,
15 Fev. 1983).
Desse modo constata-se que esta intervenção por parte do Estado,
onde pode-se
chamar de não oficial, se dava por rede de relações e que
interferia em vários âmbitos do
carnaval, política e carnaval não andavam dissociados.
Porém, ERICEIRA (2005) chama à atenção do esforço do já bem
conceituado e
influente jornal O Estado do Maranhão, em naturalizar a
participação de membros da família
Sarney na Flor do Samba, colocando-os como simples brincantes da
escola.
3.2 Intervenção Estatal não oficial: Via de mão dupla.
Faz-se necessário abordar os dois lados desta modalidade de
intervenção estatal
não oficial. Analisando essa relação, verifica-se que ao mesmo
tempo, em que algumas
escolas de samba mantinham rede de relacionamento privilegiadas,
com representantes
políticos locais que pudessem intervir por elas, ao aceitarem tal
intermediação, estas
agremiações comprometiam-se com o grupo político.
E em cada desfile oficial se vivenciava os benefícios materiais e
conchavos
28
não participou do desfile oficial, alegando motivos que, segundo
pesquisas pode ser
considerado contraditório ao ser confrontado com a história da
trajetória desta agremiação no
carnaval ludovicense.
Vivenciando esta relação de mão dupla, a Flor do Samba retira-se da
passarela no
carnaval de 86, citando vários motivos, conforme parte do trecho
jornalístico abaixo, no
entanto, se percebe que tais declarações podem ser analisadas por
um ângulo diferente ao da
justificativa oficial, para o momento político que São Luís
vive naquele momento:
“A decoração e a arquibancada ficaram prontas há mas de uma semana
e o sistema de som - funcionando perfeitamente – garante a animação
dos foliões (...) Mas quando, na noite de domingo se realizar o
desfile oficial das escolas de samba da cidade, uma grande ausência
ali certamente será notada e sentida. Afinal a Flor do Samba – que
ao lado da Turma do Quinto, forma a dupla de escolas mas populares
da Ilha – alegando motivos diversos, decidiu não participar do
desfile, optando por fazer sua folia nas ruas do Desterro (...) A
atitude inédita em 11 anos de participação da escola no desfile foi
justificada em nota oficial da diretoria como decorrência de um
compromisso dos membros da Flor, em contribuir, por todos os meios
possíveis, para garantir a autenticidade “dessa legítima festa
popular brasileira com a sua característica própria de São Luís. Na
nota, o presidente da escola, Zé Alves “Piranha” – em nome de toda
diretoria e dos demais integrantes da Flor – afirma que o desfile
competitivo tem sido, “sem dúvida” desde a sua instituição, como
produto de importação carioca, “fator de descaracterização da
festa, no que ela possui de alegoria, descontração e naturalidade.
(...) (O Estado do Maranhão, São Luís, 13 de fev. 1986)
Contestando o último parágrafo da declaração oficial da direção da
Flor do Samba,
do informe jornalístico acima, rememoramos uma de muitas notas
sobre a Flor em carnavais
passados:
Das 10 Escolas do grupo “A” que irão desfilar, a Flor do Samba foi
a que mas investiu em fantasias. Segundo o carnavalesco da Escola,
Francisco Coimbra não haverá outra com tanto luxo como a Flor que
apresentará ao público 45 fantasias de destaque no valor calculado
de 100 mil cruzeiros cada – a maior atração da escola. (O
Imparcial, São Luís, 10 de fev. 1981).
Considerando o contexto político em São Luís naquele momento, este
não
favorecia ao grupo político ligado a Flor do Samba. Nas eleições
municipais de 85, João
Castelo rompe com o grupo Sarney, onde buscou uma atuação
independente, elegendo
Gardênia Gonçalves para a prefeitura de São Luís.
29
“Em 1986, o que aconteceu? Houve eleição em 1985, aí você vê como a
política tem a participação no carnaval. Houve eleição para
prefeito, quem ganhou? Dona Gardênia, os Sarneys que comandavam a
Flor do Samba, tiraram a escola da passarela. A escola não desfilou
em 1986 e foi uma reação política... A Flor do Samba não desfilou.
Tendo como patrono Fernando Sarney, a escola fez uma reunião e
disse: a gente não vai participar do desfile, por que é o primeiro
carnaval da Gardênia”.
Contudo a justificativa mantida e tida como oficial foi a veiculada
no jornal
escrito, mas elementos apresentados trazem questionamentos sobre a
motivação real da
ausência a Flor do Samba no carnaval de 86, e traz à tona a via de
mão dupla nas relações ou
intervenções não oficiais do Estado.
3.3 Intromissão Estatal e Mudanças de Interesses: Para alguns
crise, outros sucesso.
Discorrendo-se um olhar sobre a década de 80, de fato as escolas de
samba
viveram seu apogeu nestes anos, embora o Brasil neste mesmo
período, também passasse por
algumas transformações significantes. A crise econômica que na
década de 80 tem proporções
enormes tem seu auge no ano de 83, e conseqüência, deixa alguns
vestígios no carnaval de
São Luís:
Muitas seriam as causas a serem apontadas, para justificar o
fracasso. A principal fica por conta da recessão econômica. Sem
dinheiro no bolso e enfrentando um custo de vida insuportável (...)
Ao lado disso o poder público teve uma participação medíocre e os
recursos dispendiosos – CR$ 12 milhões – foram insuficientes
a
julgar pelos enfeites pobres colocados na Praça Deodoro (O
Imparcial, São Luís, 19 fev. 1983).
Não é de admirar que no fragmento jornalístico acima citado, o
poder público seja
criticado pelas poucas verbas destinadas ao carnaval, haja vista,
que o momento econômico
não era muito animador no Brasil.
O final da década de 80 é marcado pela retomada da discussão do
espaço físico a
ser realizado o desfile oficial das agremiações ludovicenses, pois
algumas alegaram serem
prejudicadas ao desfilarem nas ruas estreitas do Centro de São Luís
pois, os adereços e os
foliões não eram acomodados de forma satisfatória.
Em 1988 foi realizado o último desfile na Praça Deodoro, no ano
seguinte o então
governador entrega as arquibancadas no Anel Viário, corroborando
com a idéia de que é
interesse público e dever do Estado sustentar o carnaval.
30
No entanto os últimos anos da década de 80, a crise econômica teve
proporções
maiores, impossibilitando o Estado de acompanhar o padrão
estabelecido pelas escolas de
samba de São Luís, pois estas se tornam o foco principal do
carnaval, deixando algumas
brincadeiras carnavalescas no ostracismo. Neste momento às críticas
ao carnaval de passarela
se intensificam, pois para alguns estas se tornaram caricaturas das
escolas de samba carioca.
“A redução de algumas brincadeiras que faziam parte do tríduo
momesco ludovicense contribuiu para que, na década de 90, alguns
intelectuais começassem a levantar a bandeira do carnaval de rua.
Para os expoentes que faziam parte da Fundação Municipal de Cultura
(FUNC), o concurso carnavalesco realizado na passarela do samba, já
estava ultrapassado, além de ser o principal “culpado” pela
decadência do Carnaval de São Luís. O espetáculo do carnaval, cuja
espontaneidade e encontro são suas principais características, se
torna motivo de brigas políticas” (SILVA, 2009, p. 108)
Acumulando-se os fatos como a falta de verbas, uma estrutura de
desfile que as
próprias escolas não conseguiram sustentar economicamente e o
descontentamento por parte
de integrantes das próprias agremiações sobre o modelo adotado
pelas escolas de samba de
São Luís segundo o carioca, Joel Jacinto (2007) aponta que tal
estrutura seria difícil de ser
mantida.
Convém ressaltar que ERICEIRA (2005) destaca como claudicante o
carnaval
carioca, ou seja, a partir da década de 1980 a hegemonia do
carnaval carioca passou a ter
concorrência dos carnavais de Salvador, Recife e Olinda, tanto na
mídia quanto na indústria
turística. Cidades estas que poderiam ser consideradas exemplos
exitosos na regionalização
dos seus folguedos, discussão em volga em São Luís.
Dentro dessa contextualização, para o Estado não seria, mas
interessante investir
em algo oneroso e que no momento não trazia tantos retornos. A
discussão em trazer às
brincadeiras de rua de volta, o discurso pela regionalização e
autenticidade do carnaval
maranhense, na tentativa de resgatar os carnavais antigos ganha o
apoio do Estado. Sobre essa
realidade que surge no cenário carnavalesco ludovicense, Ananias
(2001) observa : “O
curioso é que apesar da intromissão política e estatal pertencer ao
modelo da crise para as
escolas, será, com alguns desdobramentos, o sustentáculo do novo
sucesso carnavalesco”.
(ANANIAS, 2001, p. 134)
4 DÉCADA DE 90 – PROJETO “CARANAVAL DE RUA”
Os anos 90 começaram com instabilidade, e assim como os anos 80,
esta também
foi denominada por alguns de “década perdida”. Ainda que essa
última década disponha de
características da política econômica distinta em relação aos anos
80, que para alguns
estudiosos seria consequência de uma política econômica
irresponsável nos últimos dez anos.
A instabilidade de fato, marca o início dos anos 90, pois ocorre o
confisco de
poupanças pelo então presidente Fernando Collor, que acusado de
ligações com um esquema
de corrupção que funcionava em seu governo, foi afastado da
Presidência da República, em
92, e dois anos depois, Fernando Henrique é eleito, tendo o plano
Real como plataforma.
Em 94, a economia se estabiliza e a inflação cai em 98, ano em que
o Brasil é
atingido pela crise financeira internacional, tendo como
conseqüência a desvalorização do real
frente ao dólar. Politicamente inaugura-se um modelo de governo
neoliberal, iniciado no
governo de Fernando Collor de Melo e complementando no governo de
Fernando Henrique
Cardoso.
O carnaval de São Luís nos anos 90 também é marcado por
grandes
transformações, e esta inicia-se com a propagação e intensificação
do discurso que pregava a
regionalização, e a volta do autêntico carnaval maranhense, o
carnaval de rua, que muitos
saudosistas escreviam com orgulho e tristeza, pois julgavam que o
carnaval apresentado, das
escolas de samba, não pertencia ao cenário genuinamente
maranhense.
Portanto, para alguns o carnaval ludovicense estava em crise, e
para alguns
intelectuais (muitos deles advindos das escolas de samba,
produtores culturais, artistas
plásticos ou profissionais com o curso superior) a revitalização do
carnaval ludovicense seria
a resposta ao decadente carnaval de passarela que fugia a cultura
maranhense, “desse modo as
escolas de samba deveriam ser defenestradas, pois seriam elementos
importados de fora,
imitações que teriam descaracterizado o carnaval local”. (ERICEIRA,
2005).
Aliada ao discurso de elemento alienígena no carnaval ludovicense,
outro fator
para o enfraquecimento e críticas ao carnaval de passarela seria a
cariocarização das escolas
de samba de São Luís, ou seja, as condições financeiras totalmente
inferiores as escolas
cariocas, inviabilizava os desfiles luxuosos que eram marcas
registradas do carnaval de
passarela; para alguns as escolas de samba de São Luís não passava
de uma pálida caricatura
32
década de 90 com uma estrutura de desfiles que elas mesmo não
conseguiram sustentar
economicamente segundo Lopes10
Entretanto ERICEIRA (2005) destaca que além de toda a
contextualização em que
estavam inseridas as escolas de samba de São Luís, tal proposta de
regionalização do carnaval
maranhense podia ser inserida também na análise de construções de
identidades regionais no
contexto cultural brasileiro. Pois algumas regiões do Brasil, entre
elas norte e nordeste já
buscavam essa regionalização e eram tidas como exemplo de sucesso,
e para tanto era
necessário eliminar o que não era genuinamente maranhense, ou seja,
as escolas de samba.
Em 1990 no Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho, a
Secretaria da
Cultura promoveram uma série de seminários sob a coordenação de
Jeovah França, onde
tiveram como tema “Carnaval Maranhense Hoje”, onde reuniram todos
aqueles que
incorporaram o discurso de resgate do carnaval genuinamente
maranhense.
Para tanto formularam o “Projeto carnaval de rua” que tinha como
principal
objetivo resgatar as brincadeiras de rua com a criação de um
circuito carnavalesco nas
adjacências da Rua São Pantaleão no Centro de São Luís. Como
conseqüência, no mesmo ano
foi fundada a Associação Maranhense de Blocos Carnavalescos,
formada por diversas
organizações carnavalescas que haviam se desligado da UESMA e da
FESMA.
No primeiro ano de execução do projeto, as escolas de samba ainda
são destaques
no carnaval ludovicense, sendo o ponto auge do período
momesco:
O Carnaval de São Luís atinge o seu ponto máximo, com o desfile das
escolas de samba do grupo A, que começava às 20 horas e só termina
às primeiras horas da manhã de segunda-feira. (O Estado do
Maranhão, 08 de fev. 1991).
Outro fator preponderante até então são as verbas dos poderes
públicos, que eram
destinadas ao carnaval, até então as escolas de samba recebiam a
maior parte, embora o
modelo de carnaval de rua já fosse considerado um sucesso.
Interessante ou contraditório, um
dos jornais escrito da época11, traz como notícia o sucesso do
carnaval de rua, mas na
manchete ao lado, divulga a distribuição das verbas e as escolas de
samba ainda como
maiores beneficiadas:
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Devido a situação crítica das fianças da Prefeitura de São Luís, a
comissão do carnaval do município recorreu ao governo do Estado,
para solicitar os recursos financeiros que serão repassados a todas
as agremiações carnavalescas, num total de Cr$ 15.000.100.00
(quinze milhões e cem mil cruzeiros) como forma de ajudar as
brincadeiras. Às dez escolas de samba do grupo A, e às três do
Grupo B, caberão respectivamente Cr$ 250 e 200 mil (...) (O
Imparcial, 15 de fev. 1991)
Contudo o interesse do Estado volta-se às brincadeiras de rua e,
portanto, os
recursos públicos antes deliberados na sua maioria ao carnaval de
passarela, gradativamente
são deslocados para as brincadeiras de rua que compunham o Projeto
“carnaval de rua”.
No tocante a mudança de interesse em investir no carnaval de rua e
não mais no
carnaval de passarela, este constantemente tenta justificar-se nos
discursos de valorização dos
folguedos carnavalescos de São Luís.
4.1 Legitimar para Explorar
Os mentores intelectuais que desenvolveram o projeto carnaval de
rua, para
legitimar seu discurso estabeleciam vínculos de continuidade com as
expressões carnavalesca
anteriores ao período em que os desfiles de escola de samba se
tornaram preponderantes.
(ERICEIRA, 2005, p. 181).
No entanto o mesmo autor chama à atenção, que este resgate foi
feito
parcialmente, haja vista que muitos estilos musicais e
manifestações carnavalescas
continuavam desaparecidas. Estabelecendo essa relação de legitimar
um discurso incluindo-os
em uma tradição, que muitas vezes não se consegue mapear algo tão
antigo, pois se trata de
algo recente, pode-se, portanto, incluir esta construção no que
Hobsbawm12 conclui de
invenção de tradições, onde determinadas práticas, tomadas em regra
muito antigas,
imemoriais, “tradicionais”, apareceram há relativamente pouco
tempo.
Outra forma de legitimar seu discurso assim como suas ações e
iniciativas
culturais, estes intelectuais consideravam-se porta-vozes do povo,
tomando como exemplo a
entrevista do poeta Godão quando este alerta, “o povo vai acabar
descobrindo que é melhor
brincar no carnaval de rua, com seu bloco cantando três horas, do
que passar 10 minutos em
busca de um título” 13.
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Aproveitado esta mesma fala acima, presume-se que o arcabouço do
projeto
carnaval de rua estava baseado em brincar o carnaval sem disputar
qualquer título, e que a
verdadeira essência do carnaval genuinamente maranhense era
espontâneo, ou seja, o modelo
de carnaval apresentado pelas escolas de samba já era considerado
ultrapassado.
Os poderes públicos, tanto na esfera municipal quanto Estadual
compram o
discurso, contudo afirmar que o Estado investe só pelo discurso de
resgate dos antigos
carnavais é perigoso.
Partindo-se do pressuposto que na década de 70 ocorre uma projeção
do mercado
regional, com destaque para o forró e lambada nas regiões norte e
nordeste, e mas tarde na
década de 90 uma explosão de valorização ao mercado regional, os
poderes públicos do
Maranhão seguiam a tendência de alguns Estados do nordeste que
perceberam que a
regionalização dos seus folguedos se tornaram rotas alternativas de
sucesso, atraindo uma
enorme quantidade de turistas que buscavam o carnaval diferente do
apresentado pelo carioca.
Cidades como Olinda e Salvador demonstraram que um carnaval
regional possibilitava, mas
lucros, e sem investimentos vultosos, como era o caso das escolas
de samba e seu carnaval de
passarela.
No carnaval de 92 o Estado sentencia seu apoio às brincadeiras de
rua com
atitudes que dificultam a apresentação das escolas de samba aquele
ano. A prefeitura negou-se
a construir as arquibancadas para a passarela onde ocorria os
desfiles oficiais, entregando sua
construção a uma empresa terceirizada, e na esfera estadual a
Secretaria de Cultura Estadual
aquele ano, estabeleceu que somente brincadeiras maranhenses fossem
beneficiadas, e as
escolas de samba não estavam inseridas.
Contudo, após várias discussões, as agremiações de forma
dificultosa participaram
do desfile oficial aquele ano, cobertas por muitas críticas. Para
outros, esta era o início de uma
nova fase no carnaval de São Luís:
“(...) Na esfera do município, a tradição era deixada de lado
também e o investimento dos recursos dava-se exclusivamente num
macaqueado desfile de passarela, com o rei Momo recebendo do
prefeito as chaves da cidade, que após aberta deixava de fora as
formas tradicionais e peculiares do carnaval de rua de São Luís, de
que tantos já se vangloriaram saudosisticamente. Hoje as propostas
são outras. A Secretaria de Estado da Cultura vem lançar o Plano de
Apoio ao Carnaval de Rua São Luís – 1993, que consiste na postura
encontrada pelo Estado para estabelecer suas políticas culturais,
priorizando fundamentalmente as formas tradicionais do carnaval de
rua maranhense (...) (O Imparcial, São Luís 1º de fev. 1993)
O autor do texto, Jeová França, em um primeiro momento, faz
críticas
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passarela”, mas que os novos tempos trouxeram novas propostas, onde
o governo do Estado
daria prioridade as formas tradicionais do carnaval maranhense, e
de fato, as matérias
jornalísticas que traziam sempre as notícias das verbas
destinadas as escolas de samba, agora
davam destaque aos investimentos do carnaval de rua:
Com a finalidade de dinamizar as formas tradicionais do carnaval
maranhense, foi lançado no dia 26 de janeiro o plano de Apoio ao
Carnaval, pela Secreta Com a finalidade de dinamizar as formas
tradicionais do carnaval maranhense, foi lançado no dia 26 de
janeiro o plano de Apoio ao Carnaval, pela Secretaria Estadual da
Cultura. (...) Segundo análise do integrante da Comissão de
Gerenciamento do Plano, Jose Pereira Godão, essa ação visa
sedimentar o fortalecimento das brincadeiras carnavalescas e ao
mesmo tempo, projetar o carnaval de Rua Maranhense (...). Para a
implantação do Plano foi liberada uma verba no valor de Cr$ 400
milhões pela Secretaria de Cultura (...) Segundo Godão, a verba
será dividida entre as entidades que apresentarem propostas para as
atividades do carnaval de rua (...) (O Imparcial, São Luís, 05 de
fev. 1993).
Há um consenso com ERICEIRA (2005) quando este afirma que após
pesquisas
documentais, no triênio 1991-1993, o projeto carnaval de rua já
tinha total adesão em
investimento do Estado, no entanto as escolas de samba ainda
conseguiam uma pequena
parcela da verba destinada a festa momesca, no entanto estas só
eram liberada após muitas
negociações, o que gerava um certo atraso na arrumação para o
desfile.
No carnaval de 94 intensifica-se o apoio dos poderes públicos ao
carnaval de rua,
em contrapartida o carnaval de passarela é ameaçado mais uma vez de
ficar sem espaço para
apresentar seu desfile, haja vista, que a política cultural do
Estado só disponibilizava recursos
as brincadeiras autênticas, genuinamente maranhenses, e as escolas
de samba não estavam
inseridas neste discurso.
Tanto que na construção da arquibancada custaria muito aos cofres
públicos,
alegavam alguns. Entretanto, ouve a iniciativa privada em construir
as arquibancadas,
juntamente com o comunicólogo José Raimundo Rodrigues, mas
esta foi embargada por está
próximo ao Tribunal de Justiça Federal.
Situação difícil para a prefeitura e o governo do Estado que
passaram a ser
criticados duramente pela mídia e pela população ludovicense; eis
um trecho do texto escrito
em um dos jornais da época no auge dos acontecimentos:
A prefeitura decidiu-se pelo carnaval de rua, ou melhor, pelo
carnaval de bairro, procurando descentralizar a festa e tentar
recuperar, em nome da tradição, a linha do que ela considera a
verdadeira folia carnavalesca maranhense, com suas características
próprias. Daí o choque com as escolas de samba que, nos últimos
anos, trouxeram o carnaval para a avenida, concentrando-o num único
ponto, por
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Seja, porém, como for, o caso é que o samba ultimamente provocou
uma grande celeuma em nosso meio, e de tanto ser determinada para
um local e depois proibida para que fosse construída noutro, de
tanto transferir-se daqui, pra li, ao ritmo das vacilações
administrativas, a passarela é que acabou desfilando, antes mesmo
das escolas de samba, e trazendo uma nova característica para o
carnaval de São Luís. (...) A passarela mexeu com autoridades
municipais, estaduais e federais e todos brincaram com ela,
divertiram-se e divertiram os outros, porque enfim cada qual tem o
seu jeito de fazer carnaval. (O Estado do Maranhão, São Luís, 13 de
fevereiro de 1994).
Mudando de discurso, a MARATUR, no último instante, juntamente com
parceria privada decide construir a arquibancada:
“Apesar do contratempo com a mudança do local inicial para as
proximidades da Praia Grande, as obras de construção da passarela
do samba, onde desfilarão as escolas de samba e grupos
carnavalescos, prosseguem em ritmo acelerado. O engenheiro
responsável pelo projeto Décio Puchchareli, disse que a mudança de
local provocou atraso na implantação de todo conjunto de
arquibancadas. (...) Décio queixa-se agora do novo local por ser
mas estreito que o da avenida, onde a passarela estava sendo
edificada até ser embargada pela Justiça Federal”. (O Estado do
Maranhão, São Luís, 08 de fev. 1994)
Observa-se nesse fato, mas uma vez o desinteresse dos poderes
públicos pelo
carnaval de passarela, entretanto, a manchete jornalística abaixo
torna um tanto contraditória a
política cultural do Estado, principalmente quando ocorre a recusa
na construção da
arquibancada para o carnaval das escolas de samba:
(...) É a nossa contribuição para que o carnaval continue
transmitindo toda a alegria e riqueza cultural das agremiações
maranhenses de beleza ímpar no Brasil. Mas também, o carnaval de
passarela recebeu nossa contribuição através da ajuda para o
deslocamento da passarela devido o embargo do local inicialmente
escolhido. Não poderíamos frustrar o folião que gosta e se prepara
o ano inteiro para desfilar na “Avenida”, vibrando com sua Escola
de samba, blocos, tribos de índios e outras manifestações típicas
do nosso carnaval. O governador é sensível e atento a toda
manifestação cultural do Maranhão e em seu governo sempre colocou
como prioridade a preservação do patrimônio cultural se é que
podemos assim considerá-lo, promovendo apresentações o ano inteiro
das manifestações folclóricas na área do REVIVER – declara Ana
Karina Quental – Presidente da MARATUR. (O estado do Maranhão, São
Luís, 13 de fev. 1994)
A partir das declarações acima feitas pela presidente da MARATUR,
SILVA
(2009) ressalta que embora a passarela seja construída, o que
prevalece é o discurso oficial de
valorização das brincadeiras ditas típicas do Maranhão.
Outras observações podem ser percebidas a partir da afirmação, “o
governador é
sensível e atento a toda manifestação cultural do Maranhão”.
Enquadrada também como
manifestação cultural, o carnaval de passarela na contextualização
apresentada não andava tão
transparece essa dificuldade pelo fato ocorrido, onde os poderes
públicos recusaram-se a
patrocinar a montagem das arquibancadas para a passarela do desfile
aquele ano.
Contudo a própria presidente da MARATUR responde ao
questionamento
observado, “colocou como prioridade a preservação do patrimônio
cultural (...) promovendo
apresentações folclóricas o ano inteiro na área do Reviver”, mas
uma vez corrobora-se o
discurso da prioridade às manifestações folclóricas, mas somente
aquelas genuinamente
maranhenses, pois as escolas de samba não cabiam nas apresentações
o ano inteiro no
Reviver, palco de apresentação de várias brincadeiras
maranhenses.
Entretanto, na mesma reportagem e como último enfoque, a MARATUR
declara
seu apoio ao “Carnaval da Litorânea”, inaugurando em São Luís o
Trio Elétrico, invenção
tipicamente baiana, assim como as músicas que embalavam os foliões
que iam atrás.
Finalizando a sua fala: “ Afinal, os tambores só estão
tocando, convidando a brincar em todos
os ritmos, pois tudo é carnaval” (O Estado do Maranhão, São Luís 13
de fev. 1993).
Até então o discurso priorizado já possui uma conotação diferente,
certa abertura,
“tudo é carnaval”. Preconizava-se a mudança, um novo discurso
balizador que justificará a
mudança de foco, fala-se agora de carnaval das diversidades.
4.2 Mudança de Discurso – Mesmo objetivo
Configurando dois momentos do discurso do retorno ao carnaval
autêntico
maranhense, onde alguns intelectuais envolvidos na cultura
ludovicense, idealizaram o projeto
carnaval de rua, objetivando o retorno dos tempos áureos de São
Luís como terceiro carnaval
do Brasil, tal discurso passará por algumas transformações.
O carnaval de 1995, confirma a popularidade do carnaval dos trios
elétricos aos
moldes do carnaval da Bahia, deslocando uma parcela da população
maranhen