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1 A JUDICIALIZAÇÃO DOS CONFLITOS E A PANDEMIA DO COVID 19 1 APRESENTAÇÃO DO TRABALHO Elaine Harzheim Macedo, Coordenadora e Revisora 1 O Grupo de Estudo de Processo Civil, vinculado ao Núcleo de Processo Civil da Ajuris, adequando suas atividades à realidade de uma quarentena, deu prosseguimento ao seu trabalho neste ano de 2020, passando a realizar reuniões virtuais, mas adotando a mesma sistemática de trabalho anterior. Nesse sentido, optou-se para neste primeiro semestre de 2020 debater-se sobre a temática da judicialização dos conflitos no cenário nacional de pandemia, prosseguindo-se, depois da apresentação geral do tema, objeto da reunião inaugural deste semestre, aqui documentado, em reuniões ordinárias que deverão se realizar na sequência, com regularidade quinzenal, quando, então, serão discutidos temas específicos e pontuais, vinculados e desdobrados do tema geral, com preferência ao enfoque basicamente prático, já que a sustentação teórica foi objeto da primeira reunião. 2 PANORAMA SOBRE A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA E O ATUAL CENÁRIO DE PANDEMIA Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthaler 2 1 Doutora em Direito (UNISINOS); Mestre em Direito e Especialista em Direito Processual Civil (PUC/RS). Desembargadora do TJ/RS aposentada e ex-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do RGS. Professora aposentada dos Cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado em Direito da PUC/RS. Professora da Escola Superior da Magistratura/AJURIS e da Escola Superior da Advocacia/ESA-RS. Membro do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS), da Academia Brasileira de Direito Processual Constitucional (ABDPC), do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (IGADE). Advogada. Coordenadora do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris. E-mail: [email protected] 2 Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthaler: Advogada. Mediadora. Conciliadora. Especialista em Processo Civil Brasileiro. Líder do Núcleo Jurídico do Instituto do Câncer Infantil. Presidente da Comissão Especial da Saúde da OABRS. Pós graduada em Psicologia Forense. Facilitadora de Práticas Restaurativas. Psicanalista em formação. Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim Macedo.

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A JUDICIALIZAÇÃO DOS CONFLITOS E A PANDEMIA DO COVID 19

1 APRESENTAÇÃO DO TRABALHO

Elaine Harzheim Macedo,

Coordenadora e Revisora1

O Grupo de Estudo de Processo Civil, vinculado ao Núcleo de Processo Civil da

Ajuris, adequando suas atividades à realidade de uma quarentena, deu prosseguimento ao

seu trabalho neste ano de 2020, passando a realizar reuniões virtuais, mas adotando a

mesma sistemática de trabalho anterior. Nesse sentido, optou-se para neste primeiro

semestre de 2020 debater-se sobre a temática da judicialização dos conflitos no cenário

nacional de pandemia, prosseguindo-se, depois da apresentação geral do tema, objeto da

reunião inaugural deste semestre, aqui documentado, em reuniões ordinárias que deverão se

realizar na sequência, com regularidade quinzenal, quando, então, serão discutidos temas

específicos e pontuais, vinculados e desdobrados do tema geral, com preferência ao

enfoque basicamente prático, já que a sustentação teórica foi objeto da primeira reunião.

2 PANORAMA SOBRE A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA E O

ATUAL CENÁRIO DE PANDEMIA

Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthaler2

1 Doutora em Direito (UNISINOS); Mestre em Direito e Especialista em Direito Processual Civil (PUC/RS).

Desembargadora do TJ/RS aposentada e ex-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do RGS. Professora

aposentada dos Cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado em Direito da PUC/RS. Professora da Escola

Superior da Magistratura/AJURIS e da Escola Superior da Advocacia/ESA-RS. Membro do Instituto dos

Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS), da Academia Brasileira de Direito Processual Constitucional

(ABDPC), do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e

Político (ABRADEP), do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (IGADE). Advogada. Coordenadora do Grupo

de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris. E-mail: [email protected] 2 Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthaler: Advogada. Mediadora. Conciliadora. Especialista em

Processo Civil Brasileiro. Líder do Núcleo Jurídico do Instituto do Câncer Infantil. Presidente da Comissão

Especial da Saúde da OABRS. Pós graduada em Psicologia Forense. Facilitadora de Práticas Restaurativas.

Psicanalista em formação. Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado

pela Dra. Elaine Harzheim Macedo.

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2.1 Introdução

O presente estudo, aborda a judicialização da política através do método filosófico

da realidade num mundo cada vez mais dominado pelas questões globais. Os conceitos

trabalhados pela filosofia demonstram o abismo entre a normatização e a quantidade de

culturas emersas na sociedade pós verdade. A constelação da teoria política, historicamente,

enraizada na concepção medieval, convida o leitor a voltar às raízes históricas da

conceituação política, rememorando certos significados originais importantes e

ressignificando-os.

A secularização, tão bem trabalhada na obra “A Filosofia Política na Sombra da

Secularização”, de Hans-Georg Flinkinger, provoca o debate no contexto nacional e

mundial, através da Organização Mundial de Saúde, de declaração de emergência

internacional de Pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2º), o Covid-19. Mas o qual a

repercussão do assunto na jurisdição e mais especificamente no processo civil brasileiro?

Diuturnamente, estamos observando a repercussão da pandemia nas esferas

público/privadas e na dificuldade de regular padronização dos procedimentos e informações

sobre as repercussões jurídicas da declaração internacional. Num mundo conectado, são

inúmeras notícias que invadem os governos e os lares, acarretando numa infodemia

simultânea à pandemia. O processo, sabe-se, organiza o manejo das situações para que elas

sejam úteis e possam solucionar os conflitos intersubjetivos ou coletivos de interesses dos

envolvidos. O processo civil contemporâneo repensa a justiça e a jurisdição, inclusive, o

cidadão. Trabalhos como o dos juristas Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988)3 já

visavam ao movimento de acesso à justiça prestigiando um processo de resultados. Assim,

a repercussão civil da pandemia já pode ser notada em diversas áreas do sistema judiciário

brasileiro: justiça do trabalho, justiça comum estadual ou federal, justiça militar e justiça

eleitoral. São inúmeros os reflexos e as interfaces da declaração mundial de pandemia nas

organizações de controle internas e externas (internacionais), das pessoas físicas e jurídicas,

obrigando o leitor a lembrar da Teoria Geral do Estado, disciplina que estuda os fenômenos

3 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça, trad. de Ellen Gracie Northfleet, Porto Alegre:

Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988.

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do Estado desde sua origem, formação, estrutura, organização, funcionamento e suas

finalidades.

A Teoria Geral do Estado sistematiza conhecimentos jurídicos, filosóficos,

sociológicos, políticos, históricos, geográficos, antropológicos, econômicos e psicológicos

e corresponde à parte geral do Direito Constitucional, base do Direito Público, disciplina

dos Cursos de Direito e afins.

O caráter multidisciplinar do estudo utiliza ora fenômenos de indução, ora de

dedução, para chegar às conclusões, se identificando com a Ciência Política para alicerçar

ao debate.

A importância da TGE e da ciência política para o direito é fenômeno da

secularização, conceito no dicionário online de Português de “1. Transformação ou

passagem da coisas, fatos, pessoas, crenças e instituições, que estavam sob domínio

religioso para o regime leigo. 2. Transferência de bens ou pessoas do regime religioso ou

monástico, passando os bens ao regime civil, e as pessoas ao regime secular, leigo. 3.

Absolvição do voto de clausura; dispensa dos votos monásticos. 4. Ação ou efeito de

subordinar ao direito civil o que era do direito canônico.”

O pensamento constitucional na política, aqui, é o foco do raciocínio do conceito de

secularização, hoje muito discutido. A bipolaridade histórica do questionamento convida o

leitor a acolher a política como algo desmistificado.

2.2 Da Secularização

Vários autores oferecem referências sobre o conceito, contudo, saeculum significa

século em português, período de cem anos no passado ou projetado, para o futuro. O século

delimita um período dentro de uma linha considerada infinita em relação ao passado e

também ao futuro. Trata-se de uma imagem baseada na ideia de continuidade do tempo,

dentro do qual o momento presente marca apenas o ponto de vista inscrito por nós. O

período de cem anos, no mundo cristão, a contagem do nascimento de Jesus como ponto de

partida evidencia o caráter aleatório desse tempo, diferente da contagem judaica ou da

islâmica, o que denota a perspectiva cultural da expressão. Logo, as normas de orientação

ético-culturais, igualmente, coordenam o ser no mundo e o seu tempo.

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A aplicação do termo século expressa a pretensão do homem de se apoderar do

tempo e de se tornar seu construtor como criador de um mundo seu. A apropriação do

tempo pelo homem é fenômeno importante para a análise do mundo moderno, fiel à

concepção racionalista.

A secularização da visão teológica do tempo causa um anseio existencial

irrecusável. Não por acaso a sociedade moderna ganhou o status de uma sociedade de

consumo e de trabalho que se submete cada vez mais à lógica temporal, que mede o valor

da pessoa e sua biografia social pela produtividade econômica. A essência do tempo é

enigmática e uma preocupação da filosofia. Aristóteles já dedicava ao ser ou não-ser esse

status ontológico.

A magia do tempo nas variadas disciplinas poderia ser aqui narrada pela

racionalidade instrumental, mas isso seria um abuso do tempo disponível do leitor, que

poderia abandonar o texto nessa ampulheta alquímica. No direito, o que nos cabe nesse

momento, é chamar atenção para expressões como cláusulas pétreas, garantias legais, que

apontam essa construção externa do conceito proposto.

2.3 O fenômeno da pós-verdade

A secularização traz a raiz ambígua do tempo vista sob a ótica da teologia,

sociologia e psicanálise. Assim, a ciência política transcende e desencadeia na revisão dos

conceitos de política, soberania, povo, estado-nação e ganha um significado de nova

constelação política. Essa instância transcendente desmascara a ordem liberal e descreve a

pós-verdade que modela a opinião pública, os fatos, às emoções e crenças na cultura

política. A questão da pós- verdade relaciona-se com a dimensão hermenêutica na fala de

Nietzsche (2011), admitindo-se que “não há fatos, apenas versões”. A busca pela verdade,

ressignificada. O cada novo “aqui e agora” político-social. Tal constelação favoreceria a

reformulação e o fortalecimento do conceito de democracia, porque a real dinâmica política

dependeria com maior rigor, da participação ativa dos cidadãos nas decisões políticas.

Revalidar os conceitos de povo-nação, que não são homogêneos diante da realidade das

sociedades multifacetas é provocador. Os limites geofísicos, o idioma e o alcance do poder

político levam à formação de nações modernas com identidade próprias. O conceito de

povo perdeu seus contornos existenciais unívocos e com isso sua força legitimadora. O

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conceito não passa de uma projeção e de fragmento. Na realidade, a maioria dessas

populações é composta de correntes tribais com interesses e orientações religiosas

conflitantes, correntes que jamais se aproximaram dos ideais iluministas ou de

racionalidade. Disso decorre o enfraquecimento do Estado-nação, provocado pela migração

do poder político em direção a organizações ou instituições internacionais. Ademais, dentro

do cenário de pandemia, a imprensa atinge um alcance que extrapola os territórios, além do

conteúdo ser recheado de interesses políticos partidários com as chamadas notícia falsas, ou

fake News.

2.4 A declaração da pandemia pela Organização Mundial da Saúde

Após a declaração internacional da pandemia, em 11 de março de 2020, devido ao

Covid-19, o coronavírus, essas interferências cosmopolitas podem ser vivenciadas dia a dia.

Apesar de todos os apelos internacionais no sentido de promover a democratização, não

conseguimos penetrar na superfície cultural e social de cada região, cujas condições

políticas, por vezes, são avessas a essas orientações gerais.

À luz da dignidade humana, a presente análise teleológica encontra dificuldade

quando apoiada nos direitos fundamentais expressos na Constituição brasileira. Só

conseguiremos romper com o paradigma atual se admitirmos o caráter provisório e sujeitos

a revisões contínuas das dinâmicas político-culturais na exegese diária. A ameaça da

incerteza compensa quando sobrepostas aos desafios vindos da modernização da sociedade.

A reinterpretação dos conceitos políticos e a empiria desencadeiam a revolução de

autorizar a reconstruir todas as razões reformulando os paradigmas científicos das

pesquisas atuais. Qualquer modificação epistemológica, por menor que seja, pode causar a

entropia do sistema como um todo. Essa desordem é que harmoniza os elementos novos e

autoriza o novo dispositivo de flexibilizar o sistema. A pandemia, evidentemente mudou o

cenário interno e externo do Brasil, no Distrito Federal, nos Estados e Municípios, que

estão “parados”, em isolamento social, salvo os serviços e atividades essenciais destacados

nos vários dispositivos normativos. Uma enxurrada de decretos, resoluções e medidas

provisórias sustentam os governos enquanto a saúde contabiliza os infectados, curados e

mortos. A economia já apresenta recessão e a segurança pública enfrenta altos índices de

violência doméstica e social, conforme declaração do chefe da ONU. António Guterres.

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Com a educação em “banho maria”, as aulas online e o trabalho remoto são as únicas

ferramentas para a informação e o trabalho.

Nessa esteira, em tese, o Judiciário, com seu poder normativo implícito e político no

sentido de conduzir a sociedade por determinados parâmetros estabelecidos a partir de

conflitos individuais ou coletivos, segue protagonizando a cena para assegurar o exercício

dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento,

a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem

preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e

internacional, com a solução pacífica das controvérsias, de acordo com a Constituição

Federal.

2.5 A judicialização das políticas públicas

O processo entrópico social é que acarreta a crescente judicialização da política e da

saúde em questão. Não estamos autorizados a mudar e a romper com um modelo, senão de

forma coercitiva senão o sistema não tolera, não sustenta e não reconhece qualquer

atividade diferente do regulamentado.

As demandas judiciais, como sempre, transbordam o sistema já colapsado e

represado, sintoma de um modelo democrático deficiente. A autopoiese, segundo os

filósofos chilenos, Francisco Varela e Humberto Maturana, na obra “Autopoiesis and

cognition: the realization of the living” (1980) é um termo criado em 1970 que designa a

capacidade dos seres vivos de produzirem a si próprios. Portanto, um ser vivo, como

sistema autônomo está constantemente se autoproduzindo, autorregulando, e sempre

mantendo interações com o meio. A judicialização é o maior sintoma dessa emergência

dogmática jurídica e da incontingência social. Por outro lado, cediço que a partir da

constitucionalização dos direitos individuais e coletivos e dos direitos sociais (arts. 5º a 7º

da CF) o processo de judicialização dos conflitos individuais e coletivos tornou-se uma

realidade no Brasil que não tem mais volta. É um novo panorama que encontra seu

fundamento no art. 2º da Constituição, que determina a independência e a harmonia entre

os poderes.

2.6 A multidisciplinaridade

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No exame, a avaliação e definição de um objeto sob diversos olhares de diferentes

disciplinas é o que estamos observando quando abordamos o assunto da pandemia. Cada

especialista, neste caso, faz suas próprias observações considerando seus saberes, sem

estabelecer contato com os diferentes do seu, o que pode acarretar na dissonância crítica de

informações. Um olhar de matemático é diferente do olhar humanista e está tudo bem, eis o

paradoxo; determinar o que é verdadeiro ou falso, sé é que isso é possível e produtivo.

Muitos axiomas, até agora, passaram nos testes sendo aceitos como verdades, até que um

axioma novo invalida um antigo e seja substituído por um novo axioma. Assim funciona o

pensamento lógico.

Ocorre que estamos diante de uma pandemia que desafia todos esses conceitos de

olhares que desnorteiam os olhares de todos. A judicialização da política na pandemia

decorre, justamente, dessas inúmeras possibilidades de visão de mundo e da inconsistência

de algumas probabilidades indecidíveis. O Direito sempre foi uma seara propícia para

quebrar os códigos através da prova por contradição.

O atual cenário nacional, seguindo a evolução em outros países, apresenta um

número crescente de casos do coronavírus, de modo que, a fim de evitar um colapso no

sistema público de saúde, demandam atuações urgentes e efetivas de forma multidisciplinar

que não convergem e acirram os conflitos internos e externos.

Para evitar o risco de contágio e garantir o êxito de cura em eventual circunstância,

deve-se prezar por medidas públicas efetivas e imediatas, através do Poder de Polícia,

restringindo liberdades individuais, regulando a prática de ato ou abstenção de fato, em

razão de interesse público. Além dessa medida, se mostra indispensável um agir estatal,

através de implementação de direitos humanos de segunda dimensão, ao buscar uma

prestação positiva estatal, a fim de garantir a tutela de direitos positivados no ordenamento

jurídico, como direitos fundamentais, a exemplo, de vida, saúde e integridade física. Para

tanto, tem-se por essencial um atuar conjunto e harmônico das funções estatais,

considerando o Poder uno e indivisível em busca de um bem maior a toda a sociedade.

Os três poderes estão em cena: Executivo, Legislativo e Judiciário. Quando se está

diante de um pleito de implementação da política pública perante o Poder Judiciário é

porque houve uma falha na implementação dessa ou, devido à urgência que a medida

demanda, não se pode aguardar todo o ciclo para que o Executivo e Legislativo atuem. É

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hora de organizar o plano de ação. Fazendo uma analogia à luz das famílias, não é hora dos

integrantes da família ficarem brigando enquanto só um trabalha para arrumar a casa e

prover tudo. Todos podem e devem ter funções distintas para que tudo funcione em

harmonia.

Diante de um cenário fático como o atual, as soluções compartilhadas com a

atuação conjunta das três funções estatais, de forma harmônica, possibilitam e aceleram a

superação de problemas, de modo a tornar mais fácil a tomada de decisões.

A Judicialização da pandemia deve ser vista com cautela em situações que não

demandam urgência e podem ser buscadas mediante os trâmites necessários para tanto, seja

por meio da edição de uma lei, após o processo legislativo, seja através do respeito ao ciclo

de implementação de políticas públicas ou do uso do Judiciário, justamente, por faltar

tempo para que tudo ocorra dentro dos padrões tradicionais.

O Judiciário não pode ser visto como mera “boca da lei”, com a função tão

somente de aplicar a lei ao caso concreto, mas sim de efetivar direitos fundamentais, atuar

por meio de medidas indutivas e coercitivas, a fim de integrar as funções estatais em busca

de um bem maior, mas parece que a harmonia dos poderes está desafinada e a discórdia

compromete o desempenho e performance do país.

2.7 Considerações finais parciais

A judicialização da política pública e o atual cenário de pandemia, ao final, podem

ser concluídos através do sentido empírico que nos conduz a revolução. Que o sentido

teleológico da justiça possa revolver em bons novos olhares sobre os conceitos que

ultrapassam a barreira das disciplinas.

Finalmente, difícil não politizar a pandemia, mesmo sendo caso científico de saúde

pública. Não existe nada puramente técnico que seja separado de outros olhares e

disciplinas. Os estados e os munícipios não estão dissociados da união. O país não está

separado de outras nações. As noções e os olhares de cada instituição pública ou privada

são diferentes e os aspectos políticos interferem em todas as áreas da nossa vida. As

ontologias se relacionam e no holismo sobre a pandemia foi rigorosamente evitado o

purismo.

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Sobre a virtude da palavra-chave pureza, o livro “O pequeno tratado das grandes

virtudes”, de André Comte-Sponville (2009) ensina. “A pureza não é pura”, mas a pureza

do olhar da autora sobre o tema, foi procurado ser puro no sentido de interesse político

partidário.

Por isso, encerra-se esta parte do trabalho sem a pretensão de descobrir qual a

verdade por trás de toda a repercussão política da pandemia, até porque, existem muitas

verdades e não se acredita que alguma seja mais verdadeira do que outra. Afinal, a verdade

importa?

II PARTE: ESTUDOS DE SITUAÇÕES ESPECÍFICAS

A parte que segue corresponde a alguns aspectos muito específicos, que, na linha do

pensamento proposto – judicialização da pandemia e de suas consequências nas relações

intersubjetivas ou coletivas com enfoque multidisciplinar – passam a ser analisados por

integrantes do grupo, ainda que sem a pretensão de, nesta oportunidade, esgotar a matéria.

São reflexões iniciais a sugerir debate mais aprofundado pelo grupo ou mesmo

individualmente, na perspectiva de contribuir com os operadores e estudiosos do Direito,

especialmente com foco na resolução dos conflitos que desaguam no Poder Judiciário,

exigindo o comprometimento de todos os sujeitos e agentes processuais com a efetividade e

tempestividade do processo.

O tempo do processo não é o tempo do COVID 19, talvez um dos maiores desafios

a ser enfrentado.

3 COMBATE À PANDEMIA COVID-19 E REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL-

COMPETÊNCIAS

Lucas Pahl Schaan Núñez4

4 Advogado. Especialista em Direito Processual Civil pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do

Rio Grande do Sul. MP/RS. Especialista em Direito Tributário pelo IBET/RS. Integrante do Grupo de Estudos

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O Poder Judiciário tem sido provocado para suprir omissões ou conter excessos

praticados pelo Poder Público no âmbito do combate ao avanço da Pandemia Covid-19. Ora

para controlar atos praticados pela autoridade pública que têm resultado em indevidas

restrições ao exercício de atividades essenciais, ora para determinar ao Poder Público que

promova restrições, combatendo decisões administrativas para o relaxamento das medidas

preventivas que possam ensejar danos à incolumidade pública.

Para a correta análise da questão jurídica, é impositiva a observância das repartições

de competência no âmbito Constitucional.

O artigo 23, inciso II, da Constituição Federal, dispõe ser competência comum da

União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios cuidar da saúde. Trata-se da

competência administrativa material, que deve ser exercida de forma coordenada e

conjunta pelos entes federados, como, por exemplo, dispõe a Lei Federal nº 8.080/90,

artigos 16, inciso III, alíneas “c” e “d”, artigo 17, inciso IV, alíneas “a” e “b” e Artigo 18,

inciso IV, alíneas “a” e “b”.

Contudo, a competência administrativa material não afasta a necessidade de

observância da competência legislativa concorrente, disciplinada no artigo 24, inciso XII,

§§ 1º- 4º, da Constituição Federal, que define que compete à União Federal estabelecer

normas gerais, a serem suplementadas pelos estados no que lhes couber, e pelos Municípios

no restritivo âmbito do interesse local, a teor do artigo 30, incisos I e II da Carta da

República.

No exercício de sua competência legislativa, a União Federal editou a Lei nº 13.979,

de 06 de fevereiro de 2020, que estabelece normas gerais para o combate à Covid-19, cujo

artigo 3º, §1º, dispõe que as medidas como isolamento e quarentena somente poderão ser

determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações

estratégicas em saúde, e deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo

indispensável à promoção e à preservação da saúde pública.

Para regulamentar o disposto no artigo §9º do artigo 3º, incluído na Lei 13.979/2020

pela Medida Provisória 926, o Presidente da República editou o Decreto 10.282, de 20 de

março de 2020, que define os serviços públicos e as atividades essenciais. A MP 926 foi

em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim Macedo.

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objeto da ADI 6341, levada para julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no

dia 15 de abril, referendando a medida cautelar anteriormente concedida pelo Ministro

Marco Aurélio, para conferir interpretação conforme a Constituição ao artigo 3º, a fim de

deixar claro que a União pode legislar sobre o tema, mas que o exercício desta competência

deve sempre resguardar a autonomia dos demais entes.

Em razão do entendimento fixado pela Corte Suprema, foi editado o Decreto

Federal nº 10.329, de 28 de abril de 2020, que incluiu o §9º no artigo 3º, do Decreto Federal

10.282, positivando a previsão de que a definição dos serviços essenciais pela União

Federal não afasta a competência ou a tomada de providências normativas e administrativas

pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas competências e

de seus respectivos territórios, para os fins do disposto no art. 3º da Lei nº 13.979, de 2020.

Contudo, em que pese haja autonomia dos entes locais, é fundamental que as ações

de combate à Pandemia sejam realizadas de forma coordenada entre os entes federados e

agências reguladoras, com base em critérios científicos e informações estratégicas de saúde,

para que a atuação do Poder Público seja eficaz, sendo impositiva a observância das balizas

fixadas pela Lei Federal 13.979/2020 na edição das normas estaduais e municipais.

Do contrário, a proliferação de normas positivadas nas três esferas da federação,

com o mesmo âmbito de validade territorial, mas com conteúdos conflitantes, poderá

ensejar antinomias que terão de ser solucionadas pelo Poder Judiciário.

Nestas hipóteses, deve ser observada a regra geral no sentido de que, quando a

União Federal e os Estados, no âmbito de sua competência concorrente, definirem

determinados serviços como essenciais, os municípios não disporão de competência

legislativa para determinar a sua interrupção, uma vez que o exercício, pela União Federal,

da competência para a fixação de normas gerais exerce função de bloqueio, pois as normas

anteriores que lhe forem conflitantes serão suspensas (CF, art. 24, §4º) e as supervenientes

que lhe contrariem serão inconstitucionais.

Contudo, o Poder Judiciário também poderá exercer o controle da legalidade do

Decreto Federal quando configurados abusos pelo Poder Executivo Federal, como, por

exemplo, caso haja a definição de determinados serviços ou atividades como essenciais sem

base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde,

em afronta ao disposto no artigo 3º, §1º, da Lei 13.979.

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Ainda, os Estados, no exercício de sua competência concorrente para suplementar as

normas federais, e os municípios, no exercício de sua competência suplementar fundada em

manifesto interesse local, também poderão classificar serviços como essenciais, desde que

com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em

saúde. Ainda, conforme entendimento da Corte Suprema, eventuais restrições ao exercício

de atividades definidas como essenciais pela União Federal, serão admitidas

excepcionalmente, quando houver comprovada base científica e manifesto interesse local,

devendo os atos normativos fundamentar a sua exposição de motivos com a explicitação

dos aludidos motivos de fato, sob pena de inconstitucionalidade.

Portanto, há que se ter em mente que surgirão conflitos oriundos problemas

relativos à subsunção de determinadas atividades essenciais cuja previsão legal está vertida

em conceitos jurídicos indeterminados, e também de antinomias entre normas Federal,

Estadual e Municipal, competindo ao Poder Judiciário resguardar o exercício das atividades

essenciais, para a garantia da ordem pública, sem, contudo, descurar da necessária cautela

para com a saúde pública, sendo impositiva a análise da legalidade dos atos praticados pelo

Poder Público à luz das evidências científicas e informações estratégicas em saúde.

4 COVID-19 E INTERNAÇÕES

Fernanda Carravetta Vilandi5

Um dos pedidos que poderá bater às portas do Judiciário em pouco tempo é aquele

que diz com a garantia de internação em UTI, para tratamento dos sintomas relativos ao

COVID-19, que, como se sabe, demandam, muitas vezes, a utilização de respiradores e de

outros equipamentos específicos de que estas unidades são munidas, cuja quantidade é

limitada, já havendo notícias de que, em alguns estados da federação6, as vagas estão

esgotadas ou em patamar próximo de seu esgotamento.

5 Juíza de Direito; doutoranda em direito processual civil pela UFRGS; mestre em direito pela UNISINOS;

especialista em direito processual civil pela UFRGS; especialista em direito ambiental pela UFRGS. Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim

Macedo, 6 Veja-se: https://oglobo.globo.com/sociedade/coronavirus-servico/coronavirus-ceara-tem-100-de-leitos-de-

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Coloca-se a questão da viabilidade, do ponto de vista prático, mas também jurídico,

do cumprimento de decisão judicial que determine a internação de paciente em rede

hospitalar cujas vagas estejam esgotadas, sem perspectiva de recebimento dos

equipamentos necessários para fornecer o tratamento adequado a outros enfermos. Assim,

em sendo acolhido pleito deste tipo, para dar cumprimento à decisão, certo é que outro

doente – em condições idênticas ou até mesmo mais delicadas – haverá de deixar de ser

atendido, implicando em possível óbito, solução que atende o direito à saúde de um, à custa

do sacrifício de direito de mesma importância de outrem.

À vista deste panorama, é irrefutável que as condições materiais, fáticas e objetivas

atuem como limitadoras do exercício do direito fundamental à saúde do indivíduo, na

medida em que colidam com direitos fundamentais de mesma hierarquia de outros, em

situação cuja solução refoge ao Estado-juiz, ganhando relevo a máxima da “reserva do

possível”, em que a realidade7 deve ser considerada, afastada a idealização dos fatos.

A “reserva do possível” e a absoluta ausência dos equipamentos necessários podem

ser considerados obstáculos reais, a serem tomados em conta nas decisões judiciais (assim

como nas administrativas ou controladoras), nos termos das novas disposições trazidas pela

Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro8, com as recentes alterações. No

aspecto, ao tratarem de questões atinentes à interpretação das normas de direito público,

Maffini e Heinen propõem uma leitura pragmática dos direitos fundamentais, sendo as

escolhas interpretativas realizadas mediante a análise das consequências e da realidade do

uti-para-covid-19-ocupados-24375545; https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2020/04/internacoes-

por-covid-19-em-sp-pressionam-utis.shtml. Acesso em 17/4/2020. 7 O princípio da realidade, classificado por Moreira Neto como um princípio geral do direito, apresenta

especiais conexões, no campo do Direito Administrativo, com os princípios da razoabilidade,

discricionariedade e da motivação. Ele impõe que tanto as normas jurídicas como os seus desdobramentos de

execução, administrativos e judiciais, não se enveredem pela fantasia ou demandem o irrealizável, exigindo

que os comandos da Administração, abstratos ou concretos, detenham todas as condições objetivas para serem

efetivamente cumpridos, de modo a atingir os resultados sociais a que se destinam, sob pena de comprometer

a norma ou o ato irreal, bem assim todo o ordenamento, pois concessões à irrealidade conduzem ao

descumprimento habitual, ao desprestígio da autoridade, à banalização da lei e à desmoralização de todo o

sistema. In: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo: parte geral e parte

especial. Rio de Janeiro: forense, 2009, p. 91. ³ No aspecto, o disposto no artigo 22, incluído pela Lei nº 13.655, de 2018: Art. 22. Na interpretação de

normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as

exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados. § 1º Em decisão

sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão

consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.

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Estado, havendo que se sopesarem os custos sociais de eventual concessão individual, sob

pena de frustração da ideia de segurança jurídica compartilhada.9

De um ponto de vista privado, se pensarmos em entes particulares como

demandados, além das dificuldades práticas que possam ser compartilhadas com aquelas

vividas pelos entes públicos, a situação enquadra-se nas excludentes de caso fortuito ou

força maior, nos termos do artigo 393 do Código Civil (salvo responsabilização expressa

contratada), que tem como seu elemento nuclear mais intenso o da inevitabilidade, e que,

invariavelmente, fica caracterizado pelo estado excepcional de emergência sanitária em que

imersa toda a coletividade mundial, sendo impossível que se evitem ou impeçam os danos

derivados da falta de equipamentos e materiais necessários ao combate deste vírus, já que,

notoriamente, são objeto de disputa em um nível mundial.

5 REFLEXO DA CRISE SOBRE OS CONTRATOS EDUCACIONAIS E OS

MÉTODOS DE COMPOSIÇÃO DE CONFLITOS

Helen Bernasiuk10

A sociedade contemporânea está vivendo um momento atípico, até então sem

precedentes. Em decorrência de determinações atinentes ao isolamento social, ocasionada

pela pandemia da COVID- 19, ocorreu a suspensão e proibição das atividades de escolas e

universidades, o que se reflete na crise sobre os contratos de prestações de serviços

educacionais.

É inegável que muitas famílias já estão sofrendo reduções financeiras (perda de

emprego ou redução abrupta da renda), bem como o fechamento, ainda que temporário das

9 MAFFINI, Rafael; HEINEN, Juliano. Análise acerca da aplicação da Lei de Introdução às Normas do

Direito Brasileiro (na redação dada pela Lei nº 13.655/2018) no que concerne à interpretação das normas de

direito público: operações interpretativas e princípios gerais de direito administrativo. Revista de Direito

Administrativo, Edição Especial – Direito Público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro

– LINDB (Lei nº 13.655/2018), 2018, p. 256. 10 Helen Lentz Ribeiro Bernasiuk. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do

Sul – PUCRS. Especialista em Direito Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Especialista em

Direito Público pela Uniderp – Anhanguera. Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da

Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim Macedo. E-mail: [email protected].

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instituições, ocasionaria redução de certas despesas (como transporte e refeição de

funcionários, água, energia, dentre outros).

Preambularmente, é preciso consignar que os serviços educacionais prestados por

entidades privadas estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. A

esse respeito são os apontamentos de Carlos Cezar Barbosa11:

Dessa forma, a prestação de serviços educacionais pelas entidades privadas,

mediante remuneração, caracteriza relação de consumo, uma vez bem

identificados os sujeitos: instituição privada e aluno, como fornecedor e

consumidor.

Decorre dessa conclusão que a prestação de serviços educacionais remunerados

pela entidade privada delegada se subjuga à normatividade contida no Código de

Defesa do Consumidor, lei de natureza de direito público, que nasceu por

imposição do art. 5ª, XXXII, da Constituição Federal e que prevê ampla proteção

ao consumidor, partindo da presunção de sua vulnerabilidade no mercado de

consumo. Por se tratar de lei de direito público, seu conteúdo normativo é

intransigível.

A aludida submissão impõe ao estabelecimento de ensino a observância de

princípios que devem permear as relações entre fornecedor e consumidor, como

corolário do reconhecimento pelo CDC da vulnerabilidade deste e da conseqüente

intervenção estatal nas relações de consumo.

Há diversos projetos em discussão no âmbito do Congresso Nacional, bem como em

Assembleias Estaduais que buscam a redução das mensalidades, ou a sua suspensão,

enquanto suspensas as aulas presenciais.

Na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei1180/2012 que preconiza sobre o

funcionamento da rede privada de educação durante períodos de calamidade, permite a

renegociação de mensalidades diretamente com as instituições particulares de ensino, bem

como prevê a possibilidade de redução das mensalidades entre 20% e 30%.

No Senado Federal, tramita o Projeto de Lei 1.163/202013, que dispõe acerca da

redução de no mínimo, 30% (trinta por cento) no valor das mensalidades das instituições de

ensino fundamental, médio e superior da rede privada cujo funcionamento esteja suspenso

11 BARBOSA, Carlos Cezar. Responsabilidade Civil do Estado e das Instituições Privadas nas Relações de

Ensino. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 106. 12 Disponível em: https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2242169 . Acesso em abril de

2020. 13 Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141293. Acesso em abril de

2020.

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em razão da emergência de saúde pública de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de

2020.

Desse modo, seria cabível uma redução nos valores das mensalidades, todavia, não

se pode olvidar que a escola possui diversos encargos para sua manutenção, como

pagamento de folha de diversos profissionais, aluguel, dentre outras despesas.

No tocante às universidades, há possibilidade de plena eficácia de realização de

aulas na modalidade on-line, em termos de aproveitamento e carga horária, inclusive pela

maturidade de interação dos alunos.

Todavia, nos casos de educação infantil, a situação traz contornos peculiares. A

educação infantil passa a ser obrigatória a partir dos 04 (quatro) anos de idade, consoante

disposto no art. 06º da Lei de Diretrizes Básicas da Educação, nº 9.394, de 20/12/1996, bem

como em consonância com o disposto no art. 208, I, da Constituição Federal.

Em escolas de educação infantil (com crianças de 0 a 04 anos), muitas já

propuseram redução do valor das mensalidades, inclusive por não ser obrigatória a

matrícula dessas crianças nas instituições. Todavia, a partir dos 04 anos, como a matrícula

se torna obrigatória, há uma maior relutância em concessão de descontos, inclusive, porque

argumentam que os professores estão com carga horária mais elevada para adaptar-se à

nova realidade de ensino on-line.

O Tribunal de Justiça de São Paulo14, ao julgar o Agravo de Instrumento nº

2063767-80.2020.8.26.0000, manteve o indeferimento do pedido liminar de genitores que

pretendiam a redução de 50% dos valores atinentes à mensalidade escolar, em decorrência

da pandemia, cuja ementa se transcreve:

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO

PAULO 22ª CÂMARA DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO

Agravo de Instrumento nº 2063767-80.2020.8.26.0000 - São Paulo - Voto nº

28.787 - O

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL C/C PEDIDO DE

TUTELA ANTECIPADA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ESCOLARES.

DECISÃO QUE INDEFERIU A TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO DA

AUTORA. PRETENSÃO DE DESCONTOS NAS MENSALIDADES

ESCOLARES DE SEU FILHO EM DECORRÊNCIA DOS EFEITOS DA

PANDEMIA COVID-19. AUSENTES OS REQUISITOS LEGAIS

AUTORIZADORES DA CONCESSÃO DA TUTELA. ESCOLA QUE TEM

14 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 2063767-80.2020.8.26.0000. Disponível em:

https://www.tjsp.jus.br. Acesso em abril de 2020.

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FEITO ADAPTAÇÕES PARA ATENDER AOS ALUNOS PELA VIA

ELETRÔNICA E QUE SE COMPROMETEU A REPOR O CONTÉUDO NO

MOMENTO OPORTUNO. AUTORA QUE NÃO COMPROVOU, ADEMAIS,

A MODIFICAÇÃO DA SUA SITUAÇÃO FINANCEIRA A JUSTIFICAR A

ALTERAÇÃO DA BASE CONTRATUAL DESDE JÁ, SEM A OITIVA DA

PARTE ADVERSA. DEMAIS QUESTÕES QUE DEMANDAM DILAÇÃO

PROBATÓRIA. DECISÃO MANTIDA.

- RECURSO DESPROVIDO.

O fundamento foi o de que, muito embora a situação excepcional decorrente da

pandemia, a instituição de ensino propôs a reposição das aulas educacionais contratadas,

inclusive de modo presencial, o que não é possível no momento, em decorrência do decreto

de calamidade pública da cidade de São Paulo. O Desembargador Relator entendeu que,

como a escola estava mantendo as atividades pela forma on-line, isso também ocasionaria

uma demanda maior de custos e adaptações. Outrossim, os genitores não haviam

demonstrado a alegada redução salarial, a justificar a alteração da base contratual.

A pandemia está em curso no Brasil, bem como em diversos países e, ainda não

sabemos quanto tempo irá durar o fechamento das escolas, razão pela qual, é inviável

verificar se as aulas presenciais poderão ser recuperadas ou, ainda, se as aulas na

modalidade on-line são substitutivas das presenciais.

Ademais, a não prestação de serviços educacionais nos moldes em que contratados

não é possível por motivos alheios às escolas.

O princípio da boa-fé, disposto no art. 422 do Código Civil deve nortear as relações

contratuais. A respeito da boa-fé contratual preleciona Jorge Cesa15 que:

À boa fé foi então conduzida e reconduzida uma série de eficácias, prévias à

constituição do vínculo, contemporâneas da execução e até posteriores a

realização da prestação, que, na idéia de confiança, encontraram um de seus mais

importantes fundamentos materiais.

(...)

Os efeitos da boa fé podem, assim, não ser declarados pelas partes, não ser por

elas queridos ou ser por elas totalmente desprezados. Não obstante, participarão

do conteúdo jurídico da relação, assim como participa deste conteúdo toda a

normatividade legal (em sentido estrito) não declarada ou querida pelas partes.

15 |SILVA, Jorge Cesa Ferreira da, A boa-fé e a violação positiva do contrato. RJ: Renovar, 2002 p. 48 e 54.

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Os Projetos de Lei em tramitação que têm por objetivo fixar um percentual fixo de

desconto, podem não levar em consideração a realidade financeira das instituições, o que

por si só pode gerar inúmeros conflitos a serem enfrentados pelo Poder Judiciário.

Não se pode deixar de lembrar que se a redução do valor for além das possibilidades

da escola, ocasionará uma grande quantidade de demissões nas instituições, o que não se

almeja em situações extremas como a que estamos vivenciando. Desse modo, não parece

adequado fixar percentual padrão, porquanto cada escola possui uma realidade financeira

específica, bem como cada família foi atingida de maneira diversa.

Assim, em instituições com crianças menores de 04 anos, em que o ensino não é

obrigatório e já se tem uma redução de custos com alimentação e demais atividades, bem

como não há possibilidade de aula on-line, em razão da tenra idade, parece que a escola

pode propor uma redução do valor da mensalidade, que não afete a sua saúde financeira.

Nas modalidades universitárias, em que a carga horária e o aproveitamento se

mantem integrais, se houver desconto, o percentual deveria ser menor.

Em escolas de educação infantil, a partir de 04 anos, em que é obrigatória a

matrícula e haja a possibilidade de aulas pela modalidade on-line, ainda que não sejam de

aproveitamento integral como na modalidade presencial, a redução deve se dar de forma

proporcional à redução dos custos.

De um lado, tem se verificar que a situação pandêmica foi inesperada para todos,

tendo as escolas tomar medidas para a realização de atividades on-line, bem como diversos

genitores terem sofrido perda de capacidade econômica.

Muito embora a situação de pandemia, os contratos educacionais continuam

vigentes, impondo obrigações para ambas as partes. Desse modo, em não havendo uma

composição entre as instituições de ensino, com certeza diversas demandas ingressarão no

Judiciário, aliás, como já afirmado alhures.

Deste modo, cabe ao intérprete, ao aplicador dos direitos fundamentais, atribuir

importância distinta aos valores por ele densificados. Conforme assinala Ingo Wolfgang

Sarlet16, “sempre atento as circunstâncias do caso concreto, mas também igualmente

16 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais

na perspectiva constitucional. 12. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015. p. 412.

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receptivo às hierarquizações axiológicas levadas a cabo pelo legislador democraticamente

legitimado”.

Por fim, há a necessidade de se verificar os princípios da boa-fé objetiva, lealdade e

cooperação e solidariedade para a solução das controvérsias oriundas da pandemia

ocasionada pelas situações extraordinárias decorrentes da denominada Covid-19. Mostra-se

prudente analisar quais despesas efetivamente diminuíram para a instituição de ensino, bem

como qual impacto disso na mensalidade escolar, observando-se que a manutenção das

instituições de ensino garante, outrossim, empregabilidade.

6 OS IMPACTOS DO CORONAVIRUS (COVID-19) NAS AÇÕES DE EXECUÇÃO

CIVIL

Cíntia dos Santos Gonçalves17

O surto do coronavírus está trazendo impactos não apenas na economia, na saúde,

nas relações sociais, mas também no direito. Com isso, cumpre tecermos algumas

considerações dos efeitos COVID-19 sobre as ações de execução civil, visto que se trata da

realização de um direito que já foi definido pelo Poder Judiciário (título judicial) ou pelo

Legislativo (título extrajudicial).

Inicialmente, cumpre esclarecer que a prestação da tutela jurisdicional envolve além

da atividade de conhecimento, a atividade executiva, que seria a realização prática do

direito material18. Isto é, satisfazer uma prestação devida. Dessa forma, a execução pode ser

espontânea, em que devedor cumpre voluntariamente sua obrigação, ou forçada, em que o

cumprimento da obrigação é obtido por meio de atos executivos praticados pelo Estado.

Assim, o Código de Processo Civil dispõe em seus artigos 513 a 538 quanto ao

cumprimento de sentença, seja este provisório ou definitivo. Sendo que estes títulos

executivos se dão em regra, como fase do mesmo processo em que a sentença foi proferida.

17 Advogada. Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS). Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra.

Elaine Harzheim Macedo E-mail [email protected]. 18 CARPES, Arthur Thompsen. DALL’ALBA, Felipe Camilo, JARDIM, Augusto Tanger (coords.). in.

Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. Vol. 4. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018. p. 11-13.

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Por sua vez, nos artigos 771 a 925 do mesmo diploma legal, este trata sobre as execuções

de títulos executivos extrajudiciais, que são propostos em processos autônomos19.

A partir disso, constata-se que devido à crise pandêmica que se instalou não apenas

em nosso país, mas também no mundo, essa acabou por influenciar na prestação da tutela

jurisdicional. Veja-se que o Conselho Nacional de Justiça por meio da Resolução nº 313 de

19 de março de 2020, visando a dirimir os avanços do Coronavírus, a qual foi seguida pelos

demais tribunais, determinou a suspensão processual até o dia 30 de abril, posteriormente

revista pela Resolução 314 de 20 de abril de 2020 que modifica as regras de suspensão de

prazos processuais, para permitir o prosseguimento regular nos processos eletrônicos e

prorrogar o prazo de suspensão nos processos físicos, até 15 de maio, no âmbito do Poder

Judiciário, sem prejuízo de tal prazo vir a ser reduzido ou ampliado se necessário.

Nesse contexto, pode-se aferir que um dos primeiros efeitos da Pandemia sobre as

ações de execução civil é quanto ao cumprimento das obrigações. Visto que com a

decretação de estado de calamidade pública pelo governo federal, e igualmente, pelos

Estados, houve sérias restrições para funcionamento de determinados estabelecimentos.

Sendo necessário reduzir fluxos, contatos e aglomerações de trabalhadores, o que está

impactando nas atividades de determinadas empresas, que por terem seu faturamento

reduzido, se encontram em dificuldade de manter seus funcionários, o que poderá culminar

em falências e demissões.

Dessa forma, haverá, inegavelmente uma dificuldade no cumprimento das

obrigações, sendo que nesses casos, em que passado o período de suspensão e que o

executado não tenha condições de adimplir sua obrigação, este poderá,

exemplificativamente, se utilizar do previsto no artigo 222, §2º do Código de Processo

Civil para que tenha uma prorrogação do prazo:

Art. 222. Na comarca, seção ou subseção judiciária onde for difícil o transporte, o

juiz poderá prorrogar os prazos por até 2 (dois) meses.

(...)

§ 2º Havendo calamidade pública, o limite previsto no caput para prorrogação de

prazos poderá ser excedido.

19 DIDIER JR., Fredie. CUNHA, Leonardo Carneiro da. BRAGA, Paula Sarno. OLIVEIRA, Rafael

Alexandria. Curso de direito processual civil: Execução. 7ª ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. Jus Podium,

2017. p. 45-49.

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Com base no referido dispositivo, podemos constatar que apesar da regra ser pela

não prorrogação dos prazos, excepcionalmente, ocorrerá situações em que se poderá

exceder o limite legal, como nos casos de calamidade pública.

Todavia, deve-se salientar que o reconhecimento da pandemia, e por conseguinte, da

decretação de estado de calamidade pública não pode ser um meio para o não cumprimento

das obrigações. Assim, o executado deve trazer fundamentos tanto de fato, quanto de

direito que possam embasar seu pedido.

Nessa conjuntura, outro ponto que merece destaque é o fato que devido a crise do

Coronávirus, o judiciário vem limitando as medidas de constrição de bens de devedores.

Com isso, apesar de ser uma das medidas que pode valer-se o exequente, quando

verificado que o executado não efetuou o pagamento no prazo assinalado, e ainda constar

como primeiro na ordem de preferência, conforme o disposto no artigo 835 do CPC,

alguns magistrados vêm indeferindo o pedido de penhora online dos ativos financeiros da

parte executada ou reduzindo o percentual do valor que será penhorado, em virtude do

COVID-19.

Assim, a título de exemplo, na Execução de Título Extrajudicial nº 8010106-

39.2015.8.11.0045 em trâmite no Juizado Especial Cível e Criminal de Lucas do Rio

Verde-MT20, a juíza optou por determinar uma redução da penhora sob os rendimentos do

devedor de 30%, como era usualmente aplicado, para 10%, tendo em vista a situação de

calamidade pública decretada em razão do coronavírus.

Não obstante, na Execução de Título Extrajudicial nº 7035835-74.2019.8.22.000121

em trâmite na 6ª Vara Civel de Rondônia, o juiz indeferiu o pedido de penhora online, sob

o fundamento de que ainda que a execução se opere em benefício do credor, a menor

onerosidade ao credoe deve ser observado, principalmente em períodos de exceção, como

ocorre neste periodo de pandemia do Coronavírus:

Embora a execução se opere em benefício do credor, a menor onerosidade ao

devedor é princípio que deve ser observado. No atual momento o

bloqueio/penhora de valores em conta bancária é medida que fere a razoabilidade,

uma vez que as pessoas necessitam de liquidez para fazer frente às despesas que

podem surgir no período de exceção.

20 Disponível em: https://www.tjmt.jus.br. Acesso em 17 de abril de 2020. 21 Disponível em: https://www.tjro.jus.br. Acesso em 17 de abril de 2020.

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A pandemia do COVID-19 exige sacrifícios de todos, de forma que indefiro o

pedido de bloqueio nas contas bancárias da executada, sem prejuízo de rever a

decisão quando cessar o período de calamidade pública. Intime-se a exequente

para que se manifeste sobre o bem oferecido à penhora. A executada fica ciente

de que a oferta somente vale neste processo, devendo ser apresentada também, se

for o caso, no outro processo indicado na petição. Porto Velho/RO, terça-feira, 24

de março de 2020 . José Antonio Barretto Juiz de Direito Fórum Cível da

Comarca de Porto Velho Avenida Pinheiro Machado, nº 777, Bairro Olaria, CEP

76801-235, Porto Velho, - de 685 a 1147 - lado ímpar

Neste cenário, uma alternativa que poderia auxiliar a redução dos impactos dessa

pandemia nas ações de execução civil, seria a celebração de acordo, visto que o artigo 190

do Código de Processo Civil traz essa possibilidade, no alinhamento da norma fundamental

expressa no art. 3º, § 3º, do mesmo estatuto processual.

Assim, ainda que se tenha um árduo caminho para celebração de convenções no

âmbito da execução civil, nada obsta que as partes obedecido os critérios para tanto (sejam

titulares da situação jurídica; objeto lícito; seja feito por escrito; autonomia da vontade;

sejam civilmente capazes e o objeto seja autocomponível), possibilitem que o procedimento

se adeque ao objeto da demanda, ou seja, se adapte as peculiaridades da causa, bem como

as partes envolvidas na ação. Como por exemplo, convencionarem quanto à calendarização

da execução para que seja estabelecido os critérios para o cumprimento parcial e

progressivo da obrigação.

A partir disso, percebe-se que, neste momento, deverá haver um equilíbrio deste

conflito, possibilitando, de modo simultâneo, que os interesses do Exequente/Credor,

sempre que possível, sejam resguardados com garantias suficientes para proteger os seus

créditos e que o Executado/Devedor tenha meios para exercer sua atividade, bem como

tenha os recursos necessários para manter sua subsistência.

7 AS DECISÕES JUDICIAIS QUE VEICULAM PROBLEMA ESTRUTURAL EM

ÉPOCA DA PANDEMIA DO COVID-19

Luana Steffens22

22 Mestranda em Direito na área Teoria Geral da Jurisdição e Processo pela Pontifícia Universidade Católica

do Rio Grande do Sul (PUCRS). Pós-graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos

Tributários e pela Escola Superior da Magistratura do Rio Grande do Sul - AJURIS. MBA em Direito

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No momento atual brasileiro da pandemia do COVID-19, vivemos totalmente o

protagonismo dos profissionais da saúde – médicos, enfermeiros, cientistas e pesquisadores

- que se encontram na linha de frente à proteção da saúde da sociedade. Entretanto, quando

o isolamento social passar e a vida retomar o seu curso ‘normal’23, teremos cada vez mais o

protagonismo dos profissionais do Direito (juízes, promotores de justiça, defensores

públicos, advogados e etc.), sem embargo de já estar acontecendo. O Judiciário, nessa

conjuntura, terá uma atuação bastante forte.

É cediço a existência de incontáveis e crescentes decisões judiciais envolvendo

distribuição de medicamentos, equipamentos de proteção aos profissionais de saúde,

autorização de cirurgias eletivas e etc. A judicialização da política pública é natural nesse

momento de medo e apreensão em relação ao futuro, tanto no tocante à economia quanto à

saúde. Não obstante, será quando o pico do isolamento passar que o protagonismo judicial

tornar-se-á muito mais presente, ou seja, ações judiciais discutindo tratamento médico,

outras buscando indenizações pelo não fornecimento de tratamento chegarão muito

rapidamente às Cortes de justiça.

Principalmente em momentos de crise como o que estamos vivendo, decisões

rápidas e certeiras devem ser tomadas. Ordens simultâneas e contraditórias ou interrupção

de programas e atividades em curso podem acarretar inúmeros prejuízos e, até mesmo,

retrocesso. Assim, será que agora é o momento de os atores processuais intervirem nas

escolhas políticas realizadas pelo Poder Executivo? Por outro lado, quando o pico dessa

crise passar e os litígios aportarem mais intensamente ao Judiciário, qual o modelo de

decisão que mais se adapta à concretização da efetividade do processo (tutela adequada,

efetiva e tempestiva do direito material, mediante o processo justo)?

Nesse contexto de crise sanitária, qualquer intervenção do Poder Judiciário

no tocante às escolhas do Executivo acerca da melhor forma de contenção da pandemia

pode acarretar sérios prejuízo, bem como atraso nas melhorias então pretendidas. Agora é o

momento de a sociedade e o próprio Judiciário dar uma maior deferência às opções do

Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Ex-assessora de Desembargador do Tribunal de Justiça do

Estado do Rio Grande do Sul. Membro do Grupo de Pesquisa de Direito e Processo da AJURIS, coordenado

pela prof. Dra. Elaine Harzheim Macedo. Advogada. E-mail: [email protected]. Currículo Lattes:

http://lattes.cnpq.br/0751939826959797 23 Será que existe uma volta ao ‘normal’? Parece-nos que não existe mais a volta a vida normal. Teremos um

novo mundo quando essa pandemia passar!

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24

Executivo. O momento presente exige do órgão jurisdicional maior prudência para a

intervenção nas seleções de políticas públicas efetivadas pelo administrador.

Sobre a questão, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em decisão de lavra do

Des. Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, deferiu liminar no agravo de instrumento nº

5003426-39.2020.4.02.0000/RJ, para que o Judiciário não interviesse na política pública de

saúde estabelecida pelo Município:

(...)Diante da repartição de competências, constitucionalmente garantida, como

corolário do Estado Federativo, e, tendo em vista, a prudência que o delicado

momento exige, ante o novo cenário mundial, deve-se prestigiar, ao menos até o

presente momento, a política pública eleita pelo município agravante, evitando-

se que a intervenção do Poder Judiciário, que, por certo, não detém os

conhecimentos técnicos acerca da melhor forma de contenção da pandemia,

impacte, de forma imprevisível e incalculável, o sistema de saúde municipal.24

Na mesma linha, o artigo publicado pelo Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal

Federal:

(...) Está na ordem do dia a virtude passiva dos juízes e a humildade judicial de

reconhecer, em muitos casos, a ausência de expertise em relação à Covid-19.

É tudo novo para a Ciência, quiçá para o Judiciário. Nesse contexto, impõe-se aos

juízes atenção para as consequências das suas decisões, recomendando-se

prudência redobrada em cenários nos quais os impactos da intervenção judicial

são complexos, incalculáveis ou imprevisíveis.

Antes de decidirem, devem os juízes ouvir os técnicos, porque uma postura

judicial diversa gera decisões passionais que desorganizam o sistema de saúde,

gerando decisões trágicas e caridade injusta.

A novel figura do amigo da Corte (amicus curiae), que pode ser um cientista, um

economista, um médico, foi incorporada ao novo Código de Processo Civil para

coadjuvar os juízes e tribunais nas decisões que exigem conhecimentos que

escapam à formação dos profissionais do Direito.

A participação desses experts é fundamental, na medida em que aqui e ali

vislumbram-se decisões que apreendem máscaras e remédios, internam-se

pessoas cujo tratamento deve ser caseiro, fadigando a disponibilidade de leitos

hospitalares, impede-se a criação de postos próximos aos cidadãos para

receberem o auxílio econômico governamental, entre outras.

Positivamente, não é hora do impulso imoderado, mas do raciocínio prudente,

racional e consequencialista, sob pena de a Justiça, cujo desígnio é dar a cada um

o que é seu, transformar-se num paciente infectado por uma Covid que adoece a

alma e a razão, ferindo de morte, a um só tempo, a vida dos que sofrem e a

esperança dos que intentam viver”.25

24 Decisão que pode ser consultada no seguinte sítio: https://www10.trf2.jus.br/portal/wp-

content/uploads/sites/28/2020/04/decisao-volta-redonda.pdf, excerto extraído da p. 5 da decisão. Acesso em

29 abr. 2020. 25 In O Globo: https://oglobo.globo.com/opiniao-justica-infectada-hora-da-prudencia-24337119?utm_source-

aplicativoOGlobo&utm_medium-aplicativo&utm_campaign-compartilhar. Acesso em 20 abr. 2020.

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25

Tal fato, contudo, não revela que o Judiciário não poderá interferir nunca em

políticas públicas. A possibilidade do controle de políticas públicas pelo Judiciário já foi

reconhecida, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da Arguição

de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 45 (ADPF nº 45-9 – Distrito Federal26).

Entretanto, problemas altamente complexos de políticas públicas devem ser julgados por

meio de um processo comparticipativo, marcadamente policêntrico, que seja capaz de

abarcar diversos interesses existentes, mediante uma relação dialógica e contínua para a

concretização de direitos fundamentais e quebrar a lógica processual individual bipolar.

Entram em cena os processos estruturais.

Considerando que os problemas que advirão decorrentes da pandemia da COVID-

19 serão altamente complexos, gerando um estado de desconformidade jurídica geral27,

urge que esses problemas tipicamente estruturais sejam julgados por meio de um processo

no modelo estrutural.

Portanto, esse cenário impacta a formação de um novo modelo processual com

foco na busca de soluções prospectivas, que são muitas vezes alcançadas pelo consenso de

seus participantes e, quando isso não for possível, dará ensejo a múltiplas decisões, em

cascata28.

Assim, mesmo à revelia de normas autorizativas expressas29, há vários exemplos

de processos de caráter estrutural no âmbito do interesse público. A área da saúde, por

exemplo, tem sido fecunda na outorga de medidas estruturais30. Ademais, processos que

26 in http://portal.stf.jus.br/. Acesso em 20 abr. 2020. 27 Segundo Didier Jr. e Zaneti Jr., “um estado de desconformidade estruturada é uma situação de ilicitude

contínua e permanente ou uma situação de desconformidade, ainda que não propriamente ilícita, no sentido de

ser uma situação que não corresponde ao estado de coisas considerado ideal. Como quer que seja, o problema

estrutural se configura a partir de um estado de coisas que necessita de reorganização (ou de reestruturação).

Estado de desconformidade, como dito, não é sinônimo necessariamente de estado de ilicitude ou de estado de

coisa ilícito. Estado de desconformidade é situação de desorganização estrutural, de rompimento com a

normalidade ou com o estado ideal de coisas, que exige uma intervenção (re) estruturante. Essa

desorganização pode, ou não, ser consequência de um conjunto de atos ou condutas ilícitas”. DIDIER JR.,

Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de direito processual civil: processo coletivo, v. 4, 13ª ed., Salvador: Ed.

JusPodivm, 2019, p. 574. 28 ARENHART, Sérgio Cruz. Decisões estruturais no processo civil brasileiro. 2013. Disponível em:

www.academia.edu. Acesso em 22 ago 2019. 29 Nesse sentido, importa destacar o Projeto de Lei 8.058/2014, que tramita na Câmara dos Deputados, e

pretende instituir um processo especial para controle e intervenção em políticas públicas pelo Poder

Judiciário. In

https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=52EE95817C813A89D30A974B

55235047.proposicoesWebExterno1?codteor=1283918&filename=PL+8058/2014. Acesso em 20 abr. 2020. 30 É o caso de decisões que, ao outorgarem certo medicamento a um doente necessitado, fixam, fora dos

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envolvem questões no tocante a políticas públicas são propícios para a aplicação de

técnicas estruturais com o escopo de alcançar maior efetividade ao processo.

A missão atribuída ao Poder Judiciário de “guardião da Constituição” exige a

possibilidade de repensar o exercício da atividade jurisdicional. Desse modo, sem

desconsiderar o papel e os limites do Poder Judiciário na seara da efetivação dos direitos

fundamentais, especialmente onde tal atuação entra em tensão com as ações e omissões dos

demais poderes estatais, entendemos que o modelo de processo estrutural para o

julgamento dos problemas estruturais que advirão da pandemia do COVID19, pode ser um

caminho para uma maior efetividade do processo e realização da tutela do direito material.

O futuro mostrará se essa técnica de decisão revelar-se-á eficaz.

8 COVID-19 NA ESFERA TRABALHISTA

Cristiane Mello31

Na esfera trabalhista, diante da atual conjuntura sócio econômica em razão do

momento epidêmico, as medidas legislativas tomadas vêm acautelar as relações de

emprego, na tentativa de minimizar as consequências de uma paralização total que

acarretará ao setor produtivo, como as prováveis demissões em massa.

Neste viés, foram editadas as Medidas provisórias 927 e 936, que flexibilizam as

tratativas diretas entre empregado e empregador, prevendo entre outras providencias, a

redução da jornada de trabalho, redução de salário e a suspensão dos contratos de trabalho

por até 60 dias, com a comunicação aos Sindicatos no prazo de 10 dias. O STF através do

julgamento da ADI 6363, tendo como Relator o Ministro Lewandowski, entendeu como

limites do pedido, condições para o fornecimento desse produto. Outro caso é a decisão tomada pelo Poder

Judiciário no Estado do Rio Grande do Norte, em relação ao Hospital Estadual de Referência e Atenção à

Mulher de Mossoró (Autos 0800817-45.2013.8.20.0001, 5ª Vara da Fazenda Pública de Natal, In:

http://www.tjrn.jus.br/, acesso em 20 abr. 2020.) 31 Advogada, pós-graduada em Direito Empresarial pela UniRitter - Laureate Internacional Universitier.

Integrante do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim

Macedo.

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válido o ato jurídico realizado exclusivamente entre empregado e empregador, ou seja,

reconheceu os acordos individuais e, bem como defendeu o Ministro Marco Aurélio, em

época de calamidade temos que admitir ao trabalhador assegurar o seu sustento32.

Assim, em que pese a protetividade da esfera trabalhista, o momento excepcional

clama por medidas como essas que de forma equânime e em total consonância com o

princípio da função social previsto no art. 8º do Código de Processo Civil visa ao bem

maior, que, após a saúde, é a natureza alimentar advinda da segurança das relações de

emprego que mantem o bem maior que é a vida, bem como toda as relações em sociedade.

9 A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA E O ENFRENTAMENTO DOS

CONTRATOS AFETADOS PELA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS

Valesca Vanacôr33

9.1 Introdução

O objetivo principal deste estudo é demonstrar a iminente necessidade da

judicialização das políticas públicas, e como ela vem sendo reconhecida pelo Poder

Judiciário, bem como, sob um olhar prático, relacioná-la com as relações contratuais em

razão do atual cenário.

O Brasil vivencia uma das maiores crises mundiais deflagrada pela pandemia do

novo Coronavírus (Covid 19), sendo que o afastamento da polarização política ou da

“guerra política” entre União e os Estados bem como, neste momento, a relativização da

judicialização, priorizando-se sempre que possível soluções consensuais, são medidas que

se impõem!

32 http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=441439&tip=UN

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=442248 33 Advogada nas áreas Cível e Empresarial. Direito Bancário com ênfase em Negociação com suporte jurídico

e Mediadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Integrante do Grupo de Estudos em Direito

Processual Civil da Ajuris, coordenado pela Dra. Elaine Harzheim Macedo.

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Diante deste nefasto cenário fático, as soluções compartilhadas com a atuação

conjunta das três funções estatais, de forma harmônica, possibilitam e aceleram a superação

de problemas, tornando mais fácil a tomada de decisões.

9.2 O cenário atual

Os efeitos da Pandemia têm tomado conta da sociedade em escala mundial.

Já é possível prever que organizações dos mais diversos segmentos irão sofrer

inúmeros prejuízos.

As medidas adotadas pelos governos federal, estaduais e municipais de isolamento

social, vem causando reflexos econômicos à toda população brasileira, visivelmente já

percebidos.

Aqueles que sofrerão os impactos vão desde pessoas físicas a exemplo dos

autônomos como também os empresários, principalmente os micro, pequenos e médios

empreendedores. Constata-se, também os danos advindos da esperada redução de renda.

Outro impacto significativo, será no setor financeiro. Contudo, já se visualiza que

algumas medidas já estão sendo tomadas, como a flexibilização dos bancos quanto ao

recebimento de seus créditos. E por parte do governo, já foram anunciados pacotes de ajuda

financeira emergencial a pessoas físicas e jurídicas.

9.3 As relações contratuais e a judicialização da pandemia

Neste cenário, as relações contratuais, como contratos de locação, de prestação de

serviços, contratos bancários e outros, serão inevitavelmente atingidas e por certo serão

alvo de inúmeros questionamentos judiciais. A saber, nas últimas duas semanas do mês

de abril, foram propostas perante o STF aproximadamente 460 novas demandas

relacionadas à atual pandemia.

Sobre as relações contratuais, neste momento, são debatidos entre os operadores

do direito, temas como: a repressão à elevação abusiva de preços por produtos essenciais

cuja procura disparou diante desta crise, os dilemas que ameaçam a atividade empresarial

de lojistas (em particular, os locatários de pontos comerciais em shopping centers), a

busca pela manutenção do equilíbrio do atuarial dos seguros de saúde em relação à

cobertura de novos exames e novos tratamentos em benefício dos segurados, bem como o

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equilíbrio contratual dos contratos bancários como por exemplo, os de parcelas fixas que

vão necessitar, pelo menos, da suspensão das mesmas, sem que haja renegociação com

aplicação de mais juros.

Diante desta Crise epidêmica, com tantos impactos na vida das pessoas, as

relações contratuais, provocam uma das reações mais imediatas da doutrina para

proporem possíveis soluções jurídicas para a crise, de modo a atrair a incidência da

norma, que seja a mais adequada para recompor o equilíbrio contratual.

Em tal contexto, no que se refere a judicialização, destaca-se, como suporte jurídico,

entre outros, a “Teoria da Imprevisão” que é aplicável quando, acontecimentos

extraordinários, tais como o Coronavírus, tornem a prestação de uma das partes do contrato,

excessivamente onerosa.

A teoria da imprevisão está prevista no art. 317 do Código Civil, segundo o qual

“quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da

prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da

parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”.

No mesmo sentido, também está previsto no art. 478, do referido estatuto:

“contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar

excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de

acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do

contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação”.

Nesta direção também caminha o seu artigo 393, que diz que o devedor não

responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não

se houver por eles responsabilizado.

E, por fim, no art. 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõe:

“São direitos básicos do consumidor: (...) V – a modificação das cláusulas contratuais que

estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes

que as tornem excessivamente onerosas”.

Por outro lado, antes da judicialização deve ser considerado o bom senso e a

negociação, pois o momento atual exige cautela. Precisamos da união do país e atuação

coordenada, integrada e solidária das funções estatais, pois a guerra contra o inimigo

invisível global não pode admitir fraquezas dentro ou fora do Estado, representadas pelas

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30

desavenças políticas e discursos populistas, tendo em vista tantas Medidas Provisórias

editadas sem qualquer consenso entre a União, estados e municípios.

Havendo esta união será reduzido consideravelmente tanto os efeitos desastrosos

do conflito político entre União e Estados quanto a excessiva e exagerada "judicialização

da pandemia" com a prevenção e ao combate ao Covid 19. Ao contrário, a principal

vítima será a sociedade brasileira.

O caminho da negociação – especialmente tratando-se de direitos subjetivos e de

conteúdo patrimonial – será o que mais trará benefícios, a exemplo da ABRASCE,

Associação de empresas de shopping center, e a ALSHOP, entidade representante dos

lojistas, que negociaram e firmaram entendimento em relação à isenção dos aluguéis

devidos pelos lojistas durante o período em que seus estabelecimentos permanecerem

fechados341.

Tais soluções merecem respeito, na medida em que evitam a judicialização

desnecessária dessas questões, e vêm ao encontro da norma fundamental do art. 3º, § 3º,

do CPC/2015.

Ao nosso ver, em matéria contratual, se deve analisar, até que ponto as

circunstâncias da disseminação da COVID-19, sem dúvida alarmantes, efetivamente

comprometeram o equilíbrio contratual no caso concreto posto, o que será a rigor, o

critério balizador, seja dos institutos autorizadores da resolução contratual, seja de

eventuais pedidos revisionais.

9.4 A teoria da imprevisão e o princípio pacta sunt servanda

A teoria da imprevisão, no Direito brasileiro, admite a revisão contratual e por outro

lado o princípio do pacta sunt servanda prevê a obrigatoriedade contratual. Tal princípio

não aceita a resolução do contrato em face de prejuízos econômicos advindos de um mau

negócio jurídico.

Já a teoria da imprevisão decorre da expressão latina rebus sic stantibus, que em

uma rápida tradução quer dizer: manutenção do contrato enquanto as coisas estejam assim.

341 In: htpps://site.cndl.org.br/abrasce-e-alshop-fecham-questao-em-relacao-aos-shoppings. Acesso em abril

de 2020.

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31

Ou seja, desde que mantidas as mesmas condições para todas as partes que estavam

presentes na elaboração do contrato.

Trata-se, portanto, de uma exceção ao princípio do pacta sunt servanda. Havendo

excessiva onerosidade à parte decorrente de evento posterior à celebração do contrato,

poderá haver revisão das cláusulas contratuais. Assim, será possível manter o equilíbrio

idêntico ao do momento em que o pacto foi firmado.

9.5 A teoria da imprevisão em tempos de pandemia

Com efeito, resta superado o entendimento engessado de que o contrato jamais

poderá ser revisto. Todo contrato tem uma função social que vai além dos interesses

particulares dos contratantes.

A situação pretérita de quem contratou não é mais a mesma diante do cenário atual

mundial de pandemia. Estamos diante de uma situação excepcional e a revisão contratual

será necessária em muitos casos.

Muitas empresas firmaram contratos levando em conta um cenário econômico e que

hoje mudou drasticamente, abalando as atividades empresariais e impossibilitando-as do

cumprimento dos contratos nos moldes, anteriormente, acordados.

A teoria da imprevisão não necessariamente implica na declaração de nulidade do

contrato, sendo por muitas vezes, a garantia de uma relação de equilíbrio entre os

contratantes.

Não há que se falar que a revisão do contrato estaria em desacordo com o princípio

da segurança jurídica, pois trata-se de um instituo que visa, sobretudo, a harmonizar as

relações jurídicas.

9.6 Conclusões parciais

A judicialização de políticas públicas na esfera do direito constitucional brasileiro

impõe ao Judiciário, cada dia mais, o controle dos atos e omissões dos agentes públicos

responsáveis por implementar políticas públicas que almejam, em seu fim último, atender

os comandos prioritários da Carta Constitucional, especialmente aos objetivos inscritos em

seu artigo 3º.

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Esse parece ser o melhor caminho a ser trilhado na gestão pública, da qual o

Judiciário passa a fazer parte, nos limites constitucionais.

Nesse contexto, cumpre exigir dos gestores a justificação das escolhas

administrativas, não sendo mais possível falar-se em discricionariedade pura e simples.

Concomitantemente, se atribui ao juiz, nesse novo papel avaliativo, preconizado

pela Lei n. 13.655/2018, tal como verificar a adequação, a necessidade e as consequências

de determinar a implementação de uma política pública para assegurar os objetivos

fundamentais do Estado Democrático de Direito, garantindo o direito a uma boa

administração pública justa e de qualidade e que atenda ao fim a que se destina.

Quanto aos contratos afetados pela Pandemia, cuja judicialização poderá ter como

suporte jurídico a aplicação da teoria da imprevisão, esta dependerá da análise do caso

concreto, considerando princípios como: a) autonomia da vontade; b) força obrigatória do

contrato; c) função social do contrato; d) boa-fé objetiva; e) equivalência material.

Por derradeiro, não restam dúvidas de que a pandemia causada pelo Coronavírus e

seus efeitos funcionam como fator de desequilíbrio contratual, passível de ser revisto e

fundamentado na Teoria da Imprevisão, nos demais artigos acima citados e demais

disposições legais.

O presente estudo, oferece alternativas e um pensar e agir diligentes, ainda que

cautelosos para a revisão e ou adequação de obrigações contratuais assumidas para o

enfrentamento deste momento de dificuldades bem como sinaliza a necessidade imperiosa

da judicialização de políticas públicas adequadas, que neste momento de pandemia, nos faz

tanta falta, sugerindo, outrossim, o caminho da composição, da transação, do acordo,

inclusive extrajudicial, para a renegociação de contratos afetados quanto ao seu pleno

cumprimento pela pandemia COVID 19, que alterou o cotidiano de todos, serviços

públicos, atividades privadas, pessoas e famílias.

Entretanto, devemos observar o princípio da boa-fé objetiva para garantir uma

conduta leal dos contratantes no momento das conciliações, soluções de conflitos ou

mediações. A conduta de uma relação contratual leal deve estar embasada no

comportamento equilibrado das partes, no dever de cuidado em relação a outra parte

negocial, no dever da informação do conteúdo negocial, no respeito, na confiança entre as

partes, na colaboração e no dever de agir com honestidade. Por certo que a possibilidade de

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revisões contratuais são uma forma de manter o sistema equilibrado, onde ambas as

partes possam realizar mudanças positivas e pontuais nos contratos firmados como forma

de reestabelecer o equilíbrio contratual para minimizar os efeitos ocasionados pelo o

advento da pandemia de Coronavirus (Covid-19).

10 À GUISA DE CONCLUSÃO DO TRABALHO COLEITVO

Elaine Harzheim Macedo

Não há como negar que o mundo não estava preparado para esta pandemia que

assolou e assola o planeta. Sob nenhum aspecto: saúde, economia, relações intersubjetivas

ou coletivas, entes públicos ou privados, poderes do Estado, mercado, cultura, costumes.

Cores distintas pintam esta nova realidade. O Direito não está imune a esta verdadeira

revolução do e no conhecimento.

A crise chegou quase silenciosamente nas primeiras semanas, pelo menos para o

mundo ocidental, mas foi atravessando os continentes e os oceanos e batendo às portas de

todos nós, ganhando visibilidade planetária e exigindo tomadas de posição, decisões que

praticamente colocaram o cotidiano em choque, cuja urgência é instantânea.

O Direito, o Poder Judiciário, o processo, constituem ciência, espaços e instituições

acomodados a um movimento que opera em dimensão distinta ao da contaminação pelo

COVID 19, linhas paralelas que agem em velocidades distintas. Nesse diapasão, o número

e a especificidade de conflitos que vêm se multiplicando por conta de sua afetação pela

pandemia não permite ainda uma visualização mais detalhada, mais aderente à realidade

que estamos enfrentando e àquela que ainda teremos que enfrentar. Estamos apenas dando

os primeiros passos de uma caminhada que certamente se mostrará muito árdua, mas não

invencível.

Esses estudos iniciais, envolvendo a judicialização de políticas públicas e a

intervenção da jurisdição na superação dos conflitos estabelecidos e a serem estabelecidos a

partir da crise do coronavírus, correspondem às primeiras reflexões, às indagações iniciais.

Ainda que não ofertem a resposta adequada e definitiva, contam com a vantagem de um

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comprometimento com os novos problemas que devem ser resolvidos, devotando-lhes um

olhar sincero e humanístico, preservando na medida do possível a ordem jurídica.

Esta é razão de ser do Grupo de Estudos em Direito Processual Civil, organizado e

mantido pela Escola da Ajuris, comprometido com o Direito como ciência social aplicada.

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