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CLÍNICA www.jornaldentistry.pt 14 TRATAMENTO ORTODÔNTICO DE CAMUFLAGEM DE MÁ OCLUSÃO DE CLASSE III COM RECURSO A ELÁSTICOS INTERMAXILARES Dra. Susana Melo Médica dentista, Clínica Dentária dos Carvalhos, prática clínica em ortodontia. O tratamento da má oclusão de Classe III constitui um desafio clínico para o profissional, podendo envolver um tratamento ortopédico nos pacientes em fase de cresci- mento e/ou um tratamento ortodôntico cirúrgico-ortog- nático em pacientes adultos, ou um tratamento ortodôn- tico com camuflagem e compensação dento-alveolar do problema esquelético subjacente. Este artigo tem como objetivo apresentar um tratamento ortodôntico de uma paciente com má oclusão de Classe III, com recurso a for- ças elásticas intermaxilares. RESUMO Introdução A má oclusão de Classe III apresenta uma prevalência relativamente baixa comparativamente com as restantes más oclusões, rondando dos 1,5% a 5,3% na população europeia 1 . A má oclusão de Classe III caracteriza-se por uma mesioclusão molar e canina, que raramente atinge a dimen- são de um pré-molar, e uma sobremordida horizontal incisi- va invertida ou topo-a-topo. Esta má oclusão poderá ter na base da sua etiologia um componente esquelético (resultan- te de uma desarmonia envolvendo o terço médio e inferior da face e por vezes a base craniana), um componente fun- cional (resultante de um deslizamento mandibular anterior e/ou lateral) e/ou um componente dentário 2 . O tratamento da má oclusão de Classe III constitui um desafio clínico para o profissional, podendo envolver um tra- tamento ortopédico nos pacientes em fase de crescimento e/ou um tratamento ortodôntico cirúrgico-ortognático em pacientes adultos. Outra opção terapêutica para os casos esqueléticos menos severos poderá passar pelo tratamento ortodôntico com camuflagem e compensação dento-alveo- lar do problema esquelético subjacente 2 . Este artigo tem como objetivo apresentar um tratamento ortodôntico de uma paciente com má oclusão de Classe III, com recurso a forças elásticas intermaxilares. Caso Clínico A paciente R.B., de 38 anos de idade, recorreu à Consulta de Ortodontia da Clínica Dentária dos Carvalhos apresentado a seguinte queixa principal: “Encaixo os dentes ao contrário”. Após avaliação clínica e estudo ortodôntico, verificou-se que a paciente apresentava: tipo Classe III, causado maio- ritariamente por uma retromaxilia; altura facial inferior aumentada; mesofacial; ângulo naso-labial aumentado; sul- co lábio-mentoniano pouco marcado; relação molar e canina de Classe III em posição de intercuspidação máxima (PIM); sobremordida horizontal invertida em PIM e topo-a-topo em relação cêntrica (RC) (Figuras 1 e 2). O plano de tratamento compreendeu a utilização de apa- relho ortodôntico auto-ligado do Sistema Damon® com tor- que standard maxilar e mandibular, tendo sido planeado e dividido em quatro fases: Fase I - 12 semanas Arcos .014 CuNiTi maxilar e mandibular para alinha- mento e nivelamento; Aplicação de levantes de mordida nos incisivos centrais mandibulares com o propósito de obter alguma desoclu- são dentária; Elásticos bilaterais de 5/16” e 2 oz com vetor de Classe III, com o objetivo de descruzar a mordida cruzada anterior. Fase II – 36 semanas Primeiros arcos - 12 semanas Arcos .014x.025 CuNiTi maxilar e mandibular; Elásticos bilaterais de 5/16” e 3 oz com vetor de Classe III; Segundo arco - 10 semanas Arco .016x.025 CuNiTi mandibular; Terceiro arco - 10 semanas Arco .019x.025 TMA maxilar; Documentação fotográfica per tratamento (Figuras 3a,3b e 3c); Recolagem de determinados brackets; Quartos arcos – 4 semanas Arco 014x.025 CuNiTi maxilar e mandibular; Fase III – 16 semanas Primeiro arco- 8 semanas Arco .019x.025 maxilar com pré torque negativo para posicionamento anterior das raízes dos incisivos maxilares; Segundos arcos - 8 semanas Arcos .019x.025 SS maxilar e .016x.025 SS mandi- bular para encerramento de espaços remanescentes posteriores; Elásticos bilaterais de ¼” e 3 oz com vetor de Classe III; Elástico corrente médio de 33 a 43 para fechamento dos espaços remanescentes anteriores. Fase IV - 8 semanas Arco .019x.025 TMA maxilar; Contenção: Maxila: Placa de Hawley; Mandíbula: Contenção fixa colada do 3.3. ao 4.3. Considerações Finais No final do tratamento ortodôntico verificou-se uma melhoria global na harmonia do perfil da paciente, com diminuição significativa do ângulo naso-labial e aumento de volume na região geniana (Figuras 4a, 4b e 4c). Intrao- ralmente é possível verificar uma neutroclusão dos sectores laterais com correção das sobremordidas horizontal e verti- cal (Figuras 5a, 5b e 5c). Numa análise mais cuidada e através das áreas de sobre- posição de Ricketts, é possível verificar os movimentos orto- dônticos efetuados culminaram na correção da má oclusão. Verifica-se, então, que ocorreu retro-inclinação dos incisivos mandibulares e uma pró-inclinação e intrusão dos incisivos maxilares (Figuras 6a e 6b). Para o sucesso dos movimentos ortodônticos efetuados, em muito contribuiu a cooperação da paciente na utilização de elásticos de Classe III. Dentro dos efeitos dos elásticos de Classe III salientam-se a protrusão e pró-inclinação dos incisivos maxilares, retrusão e retro-inclinação dos incisivos mandibulares e rotação horária da mandíbula. Estes efei- tos contribuíram para a correção da má-oclusão de Classe III. Como consequência das alterações dentoalveolares que Fig. 1a, 1b e 1c. Fotografias extra-orais frontais e de perfil iniciais. Traçado cefalométrico inicial em RC. l A R T I GO O R I G I N A L l O J o r n a l D e n t i s t r y

A L R TIG O R I G I N TRATAMENTO ORTODÔNTICO DE CAMUFLAGEM ... · clÍnica 14 tratamento ortodÔntico de camuflagem de mÁ oclusÃo de classe iii com recurso a elÁsticos intermaxilares

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CLÍNICA

www.jornalden tistry.pt14

TRATAMENTO ORTODÔNTICO DE CAMUFLAGEM DE MÁ OCLUSÃO DE CLASSE III COM RECURSO A ELÁSTICOS INTERMAXILARES

Dra. Susana MeloMédica dentista, Clínica Dentária dos Carvalhos, prática clínica em ortodontia.

O tratamento da má oclusão de Classe III constitui um desafio clínico para o profissional, podendo envolver um tratamento ortopédico nos pacientes em fase de cresci-mento e/ou um tratamento ortodôntico cirúrgico-ortog-nático em pacientes adultos, ou um tratamento ortodôn-tico com camuflagem e compensação dento-alveolar do problema esquelético subjacente. Este artigo tem como objetivo apresentar um tratamento ortodôntico de uma paciente com má oclusão de Classe III, com recurso a for-ças elásticas intermaxilares.

RESUMO

IntroduçãoA má oclusão de Classe III apresenta uma prevalência

relativamente baixa comparativamente com as restantes más oclusões, rondando dos 1,5% a 5,3% na população europeia1. A má oclusão de Classe III caracteriza-se por uma mesioclusão molar e canina, que raramente atinge a dimen-são de um pré-molar, e uma sobremordida horizontal incisi-va invertida ou topo-a-topo. Esta má oclusão poderá ter na base da sua etiologia um componente esquelético (resultan-te de uma desarmonia envolvendo o terço médio e inferior da face e por vezes a base craniana), um componente fun-cional (resultante de um deslizamento mandibular anterior e/ou lateral) e/ou um componente dentário2.

O tratamento da má oclusão de Classe III constitui um desafio clínico para o profissional, podendo envolver um tra-tamento ortopédico nos pacientes em fase de crescimento e/ou um tratamento ortodôntico cirúrgico-ortognático em pacientes adultos. Outra opção terapêutica para os casos esqueléticos menos severos poderá passar pelo tratamento ortodôntico com camuflagem e compensação dento-alveo-lar do problema esquelético subjacente2.

Este artigo tem como objetivo apresentar um tratamento ortodôntico de uma paciente com má oclusão de Classe III, com recurso a forças elásticas intermaxilares.

Caso ClínicoA paciente R.B., de 38 anos de idade, recorreu à Consulta

de Ortodontia da Clínica Dentária dos Carvalhos apresentado a seguinte queixa principal: “Encaixo os dentes ao contrário”.

Após avaliação clínica e estudo ortodôntico, verificou-se que a paciente apresentava: tipo Classe III, causado maio-ritariamente por uma retromaxilia; altura facial inferior aumentada; mesofacial; ângulo naso-labial aumentado; sul-co lábio-mentoniano pouco marcado; relação molar e canina

de Classe III em posição de intercuspidação máxima (PIM); sobremordida horizontal invertida em PIM e topo-a-topo em relação cêntrica (RC) (Figuras 1 e 2).

O plano de tratamento compreendeu a utilização de apa-relho ortodôntico auto-ligado do Sistema Damon® com tor-que standard maxilar e mandibular, tendo sido planeado e dividido em quatro fases:

• Fase I - 12 semanas – Arcos .014 CuNiTi maxilar e mandibular para alinha-mento e nivelamento; – Aplicação de levantes de mordida nos incisivos centrais mandibulares com o propósito de obter alguma desoclu-são dentária;

– Elásticos bilaterais de 5/16” e 2 oz com vetor de Classe III, com o objetivo de descruzar a mordida cruzada anterior.

• Fase II – 36 semanasPrimeiros arcos - 12 semanas – Arcos .014x.025 CuNiTi maxilar e mandibular; – Elásticos bilaterais de 5/16” e 3 oz com vetor de Classe III;

Segundo arco - 10 semanas – Arco .016x.025 CuNiTi mandibular; Terceiro arco - 10 semanas – Arco .019x.025 TMA maxilar; – Documentação fotográfica per tratamento (Figuras 3a,3b e 3c); – Recolagem de determinados brackets;Quartos arcos – 4 semanas – Arco 014x.025 CuNiTi maxilar e mandibular;

• Fase III – 16 semanasPrimeiro arco- 8 semanas – Arco .019x.025 maxilar com pré torque negativo para posicionamento anterior das raízes dos incisivos maxilares;

Segundos arcos - 8 semanas – Arcos .019x.025 SS maxilar e .016x.025 SS mandi-bular para encerramento de espaços remanescentes posteriores; – Elásticos bilaterais de ¼” e 3 oz com vetor de Classe III; – Elástico corrente médio de 33 a 43 para fechamento dos espaços remanescentes anteriores.

• Fase IV - 8 semanas – Arco .019x.025 TMA maxilar;

• Contenção: – Maxila: Placa de Hawley; – Mandíbula: Contenção fixa colada do 3.3. ao 4.3.

Considerações FinaisNo final do tratamento ortodôntico verificou-se uma

melhoria global na harmonia do perfil da paciente, com diminuição significativa do ângulo naso-labial e aumento de volume na região geniana (Figuras 4a, 4b e 4c). Intrao-ralmente é possível verificar uma neutroclusão dos sectores laterais com correção das sobremordidas horizontal e verti-cal (Figuras 5a, 5b e 5c).

Numa análise mais cuidada e através das áreas de sobre-posição de Ricketts, é possível verificar os movimentos orto-dônticos efetuados culminaram na correção da má oclusão. Verifica-se, então, que ocorreu retro-inclinação dos incisivos mandibulares e uma pró-inclinação e intrusão dos incisivos maxilares (Figuras 6a e 6b).

Para o sucesso dos movimentos ortodônticos efetuados, em muito contribuiu a cooperação da paciente na utilização de elásticos de Classe III. Dentro dos efeitos dos elásticos de Classe III salientam-se a protrusão e pró-inclinação dos incisivos maxilares, retrusão e retro-inclinação dos incisivos mandibulares e rotação horária da mandíbula. Estes efei-tos contribuíram para a correção da má-oclusão de Classe III. Como consequência das alterações dentoalveolares que

Fig. 1a, 1b e 1c. Fotografias extra-orais frontais e de perfil iniciais. Traçado cefalométrico inicial em RC.

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Fig. 2a,2b e 2c. Fotografias intraorais iniciais.

Fig. 3a,3b e 3c. Fotografias intraorais aos 8 meses de tratamento.

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ocorreram, verificou-se uma diminuição no ângulo naso-la-bial, protrusão do lábio superior e retrusão do lábio inferior, melhorando significativamente o perfil.

Todavia, a utilização de forças elásticas intermaxilares possui também alguns efeitos adversos que deverão ser monitorizados aquando da sua utilização de forma a que estes possam ser contrariados e minimizados. Poderá ocor-rer uma rotação anti-horária do plano oclusal, que deverá ser cuidadosamente controlada por forma a que não surjam alterações na consonância do sorriso. É também necessário controlar o torque radiculo-vestibular conferido aos incisi-vos mandibulares por forma a que não surjam deiscências ósseas que levarão a recessões gengivais numa zona predo-minantemente estética e visível3.

Poderá debater-se se um tratamento ortodôntico cirúrgi-co-ortognático poderia ou não trazer à paciente uma maior estabilidade e melhor estética facial. Esta não foi a alter-Fig. 4a, 4b e 4c. Fotografias extra-orais frontal e de perfil final. Traçado cefalométrico final.

Fig. 5a,5b e 5c. Fotografias intraorais finais.

nativa selecionada, uma vez que a paciente não sentia a necessidade de alterar a sua face e um tratamento ortodôn-tico cirúrgico-ortognático acarreta um custo mais elevado e maiores riscos, que a paciente não estava disposta a correr. Além disso, do ponto de vista médico, não se considerou absolutamente necessário a realização da cirurgia para o êxito do tratamento. No que respeita à estabilidade, con-sidera-se que a estabilidade do tratamento será conferida pelas corretas sobre-mordidas obtidas, pela ausência de potencial de crescimento mandibular e pela correta utiliza-ção das contenções. n

Referências BibliográficasPedido de referências bibliográficas para [email protected]. 6a e 6b. Terceira e quarta áreas de sobreposição.

PRÉMIO ORTODONTIA 2015CASOS CLÍNICOS DE SUCESSO REGULAMENTO DO PRÉMIO:

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