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1 Universidade Estadual de Campinas Daniele Cristina Rigolin Orientadora: Profa. Dra. Denise Bértoli Braga A LINGUAGEM VISUAL NOS ARTIGOS DA REVISTA SUPERINTERESSANTE: O QUE MUDOU E COMO OS LEITORES REAGEM A ESSAS MUDANÇAS Campinas, 09/04/2002

A LINGUAGEM VISUAL NOS ARTIGOS DA REVISTA ... Revista Superinteressante, ano 2, no. 5, maio 1988 3 Revista Superinteressante, ano 15, no. 3, março 2001 . 5 SEGUN “De antenas ligadas”

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Universidade Estadual de Campinas

Daniele Cristina Rigolin

Orientadora: Profa. Dra. Denise Bértoli Braga

A LINGUAGEM VISUAL NOS ARTIGOS DA

REVISTA SUPERINTERESSANTE:

O QUE MUDOU E COMO OS LEITORES

REAGEM A ESSAS MUDANÇAS

Campinas, 09/04/2002

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1. INTRODUÇÃO

O foco desta pesquisa é analisar e descrever o processo de visualização da escrita, já

apontado por alguns estudos recentes, como o de Kress (1998), a partir de textos produzidos em

períodos diferentes, mais especificamente, em textos da revista Superinteressante, uma revista de

popularização científica nacionalmente conhecida. Em estudos preliminares que fiz, objetivando

determinar uma fonte específica, constatei que os textos dessa revista apresentam uma grande

diferença visual entre as edições recentes e as antigas, motivo fundamental para esta investigação.

Além disso, a revista Superinteressante também me pareceu adequada como fonte de dados,

porque envolve textos que permitem um trabalho pedagógico na linha sugerida por Kleiman e

Moraes (1999) e Fiad (1996).

Kleiman e Moraes (op. cit.) sugerem que o desenvolvimento do letramento requer a

exposição do aluno a vários tipos de texto em eventos variados. Desta forma, o aluno é colocado

em situação de interação com diversas fontes de informação, levado a se engajar em variadas

práticas sociais de leitura, aprender a observar, perceber, relacionar, comparar, abstrair, criticar,

construir generalizações, falar sobre um determinado assunto tendo como base os textos que

circulam na área de interesse. As autoras propõem que as revistas semanais de informação

possam ser uma alternativa para expor o aluno a práticas variadas, já que estas revistas incluem

reportagens a respeito dos mais variados assuntos e exploram diferentes recursos (encartes

gráficos, quadros, tabelas, mapas, fotos, reproduções, diagramas, imagens). Além de explorar

diversas fontes de conhecimento, o texto jornalístico informativo é atualizado, ou seja, trata de

temas que afetam a sociedade no momento em que é publicado ou de temas que foram

recentemente incorporados por ela, tendo já causado algum tipo de impacto social. Por isso, os

textos jornalísticos, em geral, e as reportagens de revistas semanais, em específico, favorecem a

diversificação das práticas de leitura e interpretação e constituem a base para a aquisição de

conhecimento, atualização e questionamento dos fatos, além de ajudarem o aluno a desenvolver

leituras que não se restringem à decifração de palavras e frases, mas que demandam a

compreensão e reflexão do texto como um todo.

No entanto, para ensinar o aluno a interagir com textos da mídia, parece ser necessário que

o professor entenda e explicite, em sala de aula, os recursos expressivos explorados pelo texto

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escrito nesse meio. A pesquisa proposta, embora de natureza exploratória, pode contribuir para

uma melhor compreensão do processo de visualização da escrita, informação teórica importante

para o professor que precisa formar o aluno para a leitura multi-modal que é demandada por

textos que circulam em vários contextos atuais de uso.

Na esfera prática, a presente investigação se dividia em duas partes distintas. Faria

inicialmente uma análise descritiva das mudanças que ocorreram na apresentação visual de textos

da revista Superinteressante que foram publicados em períodos distantes. Mais especificamente,

contrastaria textos publicados em 1987 e 2001. Essa análise seria norteada pelos estudos de Kress

(1996 e 1998) que discutem uma proposta de gramática do visual.

Nessa parte inicial do estudo, buscaria responder a duas questões:

Contrastando os recursos de diagramação da revista Superinteressante, que mudanças

podem ser detectadas em seus textos publicados em 1987 e em 2001?

Qual a relação existente entre a imagem e o aspecto verbal dos textos publicados em 1987 e

2001 da revista Superinteressante?

Concluída essa fase inicial, buscaria investigar como os leitores que se enquadram no

público previsto para essa revista reagem aos textos atuais e aos mais antigos. Essa investigação

visa a averiguar se o aspecto visual faz parte dos esquemas de leitura adotados por esses leitores.

Na segunda parte do estudo, buscaria responder a mais duas questões:

1) Contrastando os textos antigos e os mais recentes, qual destes dois tipos recebe a

preferência dos leitores?

2) Como os leitores percebem e explicitam as razões que subjazem às suas preferências?

2)ANÁLISE PRELIMINAR DOS DADOS

Durante os procedimentos de análise, busquei identificar com mais clareza e explicar as

diferenças que intuitivamente acreditava existir. Para permitir a comparação entre o aspecto

visual dos textos mais antigos e dos mais recentes, considerei necessário estabelecer algumas

características convergentes. Para isso adotei, a priori, alguns critérios para a seleção dos textos a

serem analisados. Decidi que os textos escolhidos deveriam ser ricos em ilustrações, já que o

aspecto visual constitui a questão central da pesquisa e, em segundo lugar, esses textos deveriam

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tratar de temáticas semelhantes e, ao mesmo tempo, pertencer às mesmas seções da revista ou

estabelecer um paralelo entre a reportagem da revista antiga e a da nova. Posteriormente,

verifiquei se os textos eram, no que tange ao aspecto visual, semelhantes a outros textos

publicados pela revista nos dois momentos históricos pré-estipulados (1988 e 2001). Adotados

esses critérios, escolhi os seguintes pares de textos que constituem o corpus de minha análise

preliminar, de acordo com o quadro 1 apresentado a seguir:

Quadro 1

1988 2001

PRIMEIRO

PAR

“Forno” 1

“Como funcionam os catalisadores dos

automóveis?” 2

SEGUNDO

PAR

“De antenas ligadas” 1 “O direito de morrer” 3

As características semelhantes detectadas entre os textos podem ser visualizadas melhor no

quadro 2 que segue:

Quadro 2

PARES

TEXTOS

SEÇÃO OU

MATÉRIAS

TEMA/

ASSUNTO

TAMANHO

“Forno”

Perguntas

Superintrigantes

Pouco mais

que ¼ da

página

PRIME

IRO

PAR “Como funcionam os

catalisadores dos

automóveis?”

Superintrigante

Tecnologia

Meia página

2 Revista Superinteressante, ano 15, no. 7, julho 2001 1 Revista Superinteressante, ano 2, no. 5, maio 1988 3 Revista Superinteressante, ano 15, no. 3, março 2001

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“De antenas ligadas” 7 páginas SEGUN

DO

PAR “O direito de morrer”

Capa

Textos

Polêmicos 9 páginas

Como indica o quadro 2, o primeiro par de reportagens está localizado na seção

denominada pela antiga revista de “Perguntas Superintrigantes” e na nova, de “Superintrigante” .

Apesar da ligeira alteração no nome da seção, esta manteve seu propósito inicial no decorrer do

tempo: o de responder a um conjunto selecionado de perguntas enviadas à redação da revista

pelos leitores. Ambos os textos selecionados tratam de um assunto semelhante: informar aos

leitores sobre avanços tecnológicos da sua época. O cerne da primeira reportagem é a explicação

do funcionamento do microondas e o da segunda, o funcionamento do catalisador de automóvel.

Assim, no primeiro par, tem-se como características convergentes a temática e a seção onde se

encontram os textos. O terceiro ponto em comum às duas reportagens é o tamanho. Nessas seções

as reportagens são pequenas e ocupam geralmente de um quarto ou metade de uma página na

revista antiga e, na revista mais recente, de metade de uma página até duas páginas. Embora

ambos os textos possam ser considerados curtos em relação aos demais textos publicados tanto na

revista de 1988, quanto na de 2001, a diferença de tamanho entre eles, no entanto, precisa ser

levada em consideração e está discutida em mais detalhes na análise que segue.

Quanto ao segundo par de reportagens, estas estabelecem um paralelo entre si e constituem

o chamariz do público leitor: a reportagem de capa. Diferentemente do que ocorre no primeiro

par, os textos do segundo par não tratam do mesmo assunto, mas em contrapartida, o que consiste

uma característica convergente é o fato de ambas as reportagens selecionadas apresentarem como

assunto central uma discussão polêmica. Isso quer dizer que, apesar do texto apresentado na

revista antiga tratar de tecnologia e o texto da revista mais recente, de medicina, ambos ancoram

uma discussão polêmica, maior recurso utilizado pela imprensa para chamar a atenção do leitor

em potencial. No texto publicado pela revista de 1988, “De antenas ligadas” , porém, a polêmica

que circunda a chamada “ revolução nas comunicações” é bem tênue, pois não há em sua sintaxe

recursos que chamem tanto a atenção do leitor como os utilizados na reportagem “O direito de

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morrer” da revista mais recente. Esta, por sua vez, utilizando-se do grande impacto que as formas

verbais interrogativas, corroboradas por recursos visuais, causam no leitor, expressa claramente o

tom de polêmica existente na reportagem de capa.

O chamariz em forma de polêmica que a reportagem de capa proporciona é gradualmente

acentuado com a evolução das edições ao longo do tempo, dada a modernização da imprensa e

processo de visualização pelos quais a revista Superinteressante passou.

Além desses pontos convergentes, o da semelhança entre as matérias científicas das

reportagens e o do seu caráter polêmico, há ainda o ponto relacionado ao tamanho dos textos

escolhidos. As reportagens de capa da Superinteressante são extensas se comparadas às outras

reportagens. Elas têm geralmente de sete a nove páginas, podendo chegar até quinze páginas

como no caso da revista de outubro de 1992. Nos textos que selecionei, a reportagem de capa da

revista de 1988 ocupa sete páginas, enquanto que a da revista de 2001 ocupa nove páginas. Creio

que aqui não se estabeleça uma diferença e considero, portanto, que a oscilação ao longo do

tempo entre o número de páginas ocupadas por reportagens de capa é normal e, além disso, não

extingue ou altera o caráter desse tipo de reportagem: o de ser o texto principal na revista.

Feitas essas considerações iniciais, farei na seqüência a análise de cada um dos pares de

textos usando as categorias propostas por Kress e van Leeuwen (1996) que julguei pertinente.

2.1) ANÁLISE DO PRIMEIRO PAR DE REPORTAGENS

A primeira reportagem que irei analisar é a de manchete “Forno” (fig, 1) que pertence,

como já dito acima, à seção “Perguntas Superintrigantes” . Fiz tentativas de descrição na análise

do aspecto visual do primeiro par a partir dos conceitos dos autores relativos a “processo” . Essa

análise não foi colocada no quadro esquematizado das páginas 21 e 22 por não permitirem um

contraste entre as duas reportagens, pelo menos no estágio até o momento desenvolvido.

De acordo com os conceitos propostos por Kress e van Leeuwen (1996), pode-se encaixar

essa reportagem no processo que os autores chamam de Processo Simbólico, mais

especificamente, no Processo Simbólico Atributivo. Isto se justifica porque nesse tipo processo o

Transportador, que é o microondas nesta reportagem, é mostrado como não envolvido em

nenhuma ação, ao contrário, está representado em uma cena claramente artificial, em um meio

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não natural e, portanto, inventado. Além disso, está representado estaticamente a fim de reforçar

a idéia de que não faz parte de uma narrativa.

No conjunto total da página, a reportagem está localizada na parte inferior à direita, o que

denota um Valor de Informação. Isso quer dizer que, sinteticamente, a localização desse texto,

em relação às outras composições da página, pode representar uma informação considerada nova

para o leitor, ou melhor, para o Espectador, dada sua posição à direita. Mas não me aprofundarei

na análise deste texto relacionado ao restante dos textos da página, sim na reportagem em si, de

modo preservar o par selecionado.

Figura 1 "Forno" (Superinteressante, maio, 1988: 15)

Começarei pelo que Kress e van Leeuwen (1996) chamam de Representação e Interação,

isto é, a interação entre a imagem e o leitor, a interação entre o produtor e o Espectador da

imagem, ainda melhor dito, a interação que envolve os Participantes Representados (pessoas,

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lugares, coisas representadas em imagens) e os Participantes Interativos (pessoas que se

comunicam com outras por meio de imagens, os produtores e os espectadores dessas imagens).

Essa Representação e Interação englobam dois tipos de imagens: a imagem de Demanda e a

imagem de Oferta. O primeiro tipo consiste em um olhar fixo, ou um gesto por parte do

Participante Representado, o qual solicita alguma coisa ao Espectador. O segundo tipo, ao

contrário, oferece o Participante Representado ao Espectador como item de informação, como

objeto de contemplação. Entretanto, ao procurar a Representação e a Interação no texto “Forno” ,

percebi que não há Interação nem Representação, não há Demanda nem Oferta do Participante

Representado, o microondas. Isso ocorre primeiramente porque o Participante Representado (o

Transportador, o microondas) não é humanizado em nenhum grau, característica essencial para

que a Demanda e a Oferta ocorram. Em segundo lugar porque elas são modos de representação

subjetivos e, sendo esse texto científico, construído para ser objetivo e imparcial de acordo com

os valores de nossa cultura, ele não abre espaço para tais modos de subjetividade.

Também para evitar a subjetividade, o microondas é mostrado em long distance. Isso

significa que há uma barreira entre o Espectador e o objeto, o qual está disponível apenas para

contemplação. Ainda para dar ênfase à objetividade, imparcialidade e veracidade à reportagem

“Forno” é utilizada a imagem objetiva do Participante Representado ou Transportador. Esta

imagem existe independente de quem seja ou como esteja o Espectador, ou melhor, segundo

Kress e Leeuwen (1996), as imagens objetivas revelam que há algo para conhecer a respeito dos

Participantes Representados como se fosse necessário violar as leis de representação natural, ao

contrário das imagens subjetivas que possuem pontos de vista naturalizados e apresentados como

cópias fiéis da realidade empírica.

No texto o Participante Representado tem uma posição frontal, um ângulo frontal em

relação ao Espectador. Isso resulta em uma maior objetividade, no sentido que propicia ao

Espectador um envolvimento com o Participante Representado. Em outras palavras, o ângulo

frontal que é o ângulo do máximo envolvimento, imprime ao Espectador uma identificação com a

imagem como se ela fizesse parte de seu mundo.

Todas essas categorias, portanto, fazem com que a imagem ganhe significado objetivo e,

consequentemente, que a reportagem ganhe um tom verídico. Além dessas categorias de

Representação e Interação, há categorias relacionadas à questão de confiabilidade das mensagens.

A verdade e a mentira de um texto podem ser montadas através de detalhes da Modalidade

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socialmente construídos. A Modalidade, segundo Kress e Leeuwen (1996), é um sistema de

deixis social que leva a um tipo de Espectador ou a um grupo social ou cultural definido e

proporciona através de seu sistema de marcadores uma imagem da posição cultural, conceitual e

cognitiva desse Espectador endereçado.

Para uma composição ser considerada um texto multimodal é preciso que ela tenha

características de texto, grosso modo, um conjunto de palavras combinadas de modo a passar

uma mensagem coerente, coesiva, uma informação que forme um todo significativo.

Analogamente, a multimodalidade tem que formar um todo significativo para que uma

composição seja considerada um texto multimodal. Os elementos Representacionais e Interativos

têm que estar muito bem integrados. É claro que alguns elementos podem receber mais ou menos

atenção do Espectador na composição do todo. Há três princípios de composição sugeridos por

Kress e van Leeuwen (op. cit.) para essa composição. São eles:

1) Valor de informação: o local dos elementos (Participantes e sintagmas que relatam uns

aos outros e ao Espectador) tem específicos valores informacionais anexados às várias

zonas da imagem: direita e esquerda, parte superior e parte inferior, centro e margem

2) Saliência: é ela que pode estabelecer uma hierarquia de importância entre os elementos

que são feitos para atrair a atenção do Espectador em diferentes graus: plano de fundo ou

primeiro plano, tamanho, contrastes de tons e cores, diferenças de nitidez etc

3) Estruturação: a presença ou ausência de planos de estruturação (realizado por elementos

que criam linhas divisórias, ou por linhas de estruturação reais) desconecta ou conecta

elementos da imagem, significando que eles pertencem ou não ao mesmo sentido.

No caso da reportagem “Forno” , não há Estruturação significativa, pois não há linhas reais

ou formadas por elementos dividindo alguma parte do texto. No que tange a Saliência, o que

chama mais a atenção na reportagem, ou seja, o que mais pesa no texto, é a foto do microondas

localizada no lado direito da reportagem e constituída de Moldura bem definida, até mesmo

porque não há outros elementos além dos que já estão relacionados ao microondas para competir

pela Saliência como, por exemplo, plano de fundo, cores fortes, contraste de tons e cores, nitidez.

Portanto, a Saliência ocorre em virtude da única imagem do texto, localizada à direita.

Admitindo que o Valor de Informação do lado direito é, em conjunto com outros

elementos, a chave da informação da mensagem, então, a foto do microondas é a chave da

informação da reportagem. Já que a referida reportagem faz uso significante do eixo horizontal, o

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Participante Representado é tido como Novo, como não conhecido e, consequentemente, que

demanda do Espectador uma maior atenção. Talvez isso se deva ao fato de que em 1988, ano em

que a revista foi publicada, o microondas não era tão

Figura 2 (Superinteressante, julho, 2001: 46)

conhecido como é hoje e, portanto é, na reportagem, uma informação Nova e como tal deve estar

no lado direito da composição. De maneira complementar, a informação da esquerda,

essencialmente verbal no texto analisado, é considerada Dada, conhecida do Espectador. Ela

serve, então, como ponto de partida para o entendimento do texto global.

A outra reportagem do primeiro par é a “Como funcionam os catalisadores dos

automóveis?” da seção “Superintrigante” da revista de 2001 (fig. 2).

Para iniciar a análise, começarei dizendo que, como a imagem representa o funcionamento

dos catalisadores dos automóveis e isso é a representação de uma ação ou de um acontecimento,

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o seu Processo é Narrativo, mais especificamente, um Processo de Ação. Nesse processo, há um

Ator que é um Participante Ativo, do qual emana um vetor ou com ele se confunde. Este processo

também se caracteriza pelo fato de ser transacional, ou seja, o Ator pratica uma ação projetada

em alguém ou em algo que, por sua vez, é denominado Objetivo. O Objetivo é, portanto, o

Participante a que o Vetor (a ação) é dirigido, consequentemente, é também o Participante para

quem a ação é feita, dirigida. E se a ação é direcionada a apenas um Objetivo, o processo é

chamado de Unidirecional.

Na imagem “Metamorfose gasosa” , tomarei somente o catalisador para analisar

primeiramente. O tubo de saída do motor manda os gases poluentes ao catalisador para serem

filtrados e saírem convertidos em gases não tóxicos. Quem pratica a ação de passar pelo

catalisador são os gases. Estes são, portanto, Atores do Processo. A ação ou Vetor é dirigida

pelos Atores ao catalisador, depois ao ambiente externo do catalisador e, consequentemente, do

carro. Sendo assim, há dois Objetivos: o catalisador, num primeiro momento, e o ambiente

externo, num momento final. O Vetor é representado, primeiramente pela seta vermelha e,

depois, pela azul escura.

Um zoom, representado indicados pelos números 2 e 3, é feito na estrutura de colméia do

catalisador a fim de proporcionar um maior detalhamento do processo de conversão de gases,

bem como uma melhor visualização da estrutura física do catalisador. Apesar dessas estruturas

corresponderem também a um Processo de Ação, processo este intermediário ao descrito acima,

talvez seja possível dizer que corresponde também a um Processo Analítico. Isso se justifica pelo

fato de o catalisador poder ser um todo, enquanto que as fases indicadas pelos números 2 e 3

podem ser as partes desse todo. Em síntese, pode ser um Processo Analítico porque dois tipos de

Participantes são envolvidos: um Transportador (o todo) e os Atributos Possessivos (as partes).

Quanto à Representação e Interação, começo verificando que não há imagem de Demanda

nem de Oferta, já que para tal é preciso haver um humano ou um objeto ou animal humanizado, o

que não existe na representação da “Metamorfose gasosa” . Com base no sistema de Distância

Social prefiro encaixar essa “Metamorfose” na “ long distance” , muito utilizada em

representações científicas como esta.

No que diz respeito à imagem, a escolha de um ângulo ou de um ponto de vista implica a

possibilidade de expressar atitudes subjetivas com relação aos Participantes Representados, sejam

eles humanos ou não. No esquema do catalisador o ângulo não é frontal nem baixo, mas oblíquo

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e alto e, portanto, o desenho foi feito do ponto de vista de alguém situado à esquerda dos objetos

e acima deles. O resultado desse recurso é um afastamento do que está sendo representado. Como

dizem os autores, o resultado da utilização do ângulo oblíquo é como se este dissesse ao

Espectador “o que você está vendo aqui não faz parte do nosso mundo; é um mundo deles [dos

Participantes Representados], algo com o que nós não estamos envolvidos” 4. Sendo uma

reportagem científica, especificamente de tecnologia, áreas socialmente valorizadas como

objetivas e imparciais, o não envolvimento do Espectador induzido pelo texto expressa essa

valoração e a reafirma. Além disso, o ângulo alto é o ângulo máximo do poder e é orientado para

a teoria (ao contrário do frontal que é o ângulo máximo para o envolvimento e a ação) e, como é

utilizado na “Metamorfose” , esta adquire mais um caráter científico.

Quanto ao significado da composição, analisarei agora os seus sistemas, também

previamente explicados.

A reportagem está situada na parte superior da página da Superinteressante, e a parte

inferior está ocupada por outra reportagem. No sistema do Valor de Informação, em específico no

Dado-Novo, o lado esquerdo é separado do direito por uma linha de Estruturação formada pela

não continuidade da cor azul do plano de fundo do desenho, localizado no lado direito, em

oposição ao fundo branco do texto verbal do lado esquerdo. Na reportagem, este último lado é

ocupado por um texto verbal que contém basicamente uma manchete e duas colunas de texto,

cuja formatação gráfica das linhas consiste na regularidade do lado esquerdo e irregularidade do

lado direito. A armação visual desta matéria tem ainda um desenho esquematizando a

“Metamorfose gasosa” localizado em todo o lado direito do espaço dedicado à reportagem. Essa

posição pode ser interpretada com base nessa estrutura do Dado-Novo. Assim, o texto verbal é

uma informação Dada, de senso comum, já conhecida do Espectador, da mesma forma que é

ponto de partida para a mensagem. Em contrapartida, o desenho ou esquema é algo Novo ao

Espectador, digno de uma atenção maior e chave para a informação. De fato, poucas pessoas

conhecem o funcionamento de um catalisador, sua forma física externa e interna e, talvez por

isso, seu desenho esteja localizado no lugar que significa o Novo.

O esquema da “Metamorfose gasosa” , entretanto, não tem limites regulares, visto que

contém elementos que parecem escapar à área delimitada pelo plano de fundo azul, cor muito

4 KRESS G. & LEUWEN, T. van “Reading images: the grammar of visual design” , London:

Routlegde, 1996: 143

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característica e utilizada para dar um ar científico à representação: note que o plano de fundo é

azul claro; o carro representado na parte inferior do desenho também é azul, mas um pouco mais

escuro; o vetor que emana do carro e se dirige ao catalisador é, mais uma vez, azul assim como o

próprio catalisador que possui um tom de azul mais escuro que o do carro. A cor azul também

imprime sua hegemonia nas esferas que representam átomos de gases, na seta que emana do

catalisador e se dirige ao meio externo e no catalisador que na verdade é cinza, mas bem próximo

do azul.

A Saliência do esquema desenhado se deve, em parte, ao tamanho grande dos Participantes

em relação ao resto do texto, principalmente ao catalisador e ao carro e, em parte, pelo destaque

que o primeiro plano imprime nesses elementos que focaliza. Além disso, o contraste do azul,

que domina a maior parte do desenho, com o marrom, a segunda cor que predomina, salienta e

ajuda a dar peso ao desenho. Todos esses fatores contribuem para que a primeira leitura seja

destinada ao desenho, o que significa obter uma resposta mais curta, rápida e satisfatória para a

pergunta-manchete “como funcionam os catalisadores dos automóveis?” . Além disso, o desenho

tem sua própria manchete e seu lead, que possivelmente imprimem um caráter de autonomia em

relação ao texto verbal. Em outras palavras, estou tentando apontar para um fenômeno que Kress

(2001) descreveu como uma mudança no desenvolvimento da comunicação visual: a

representação visual está cada vez mais suportando sozinha as mensagens e deixando de

complementá-las apenas.

2.1.1) CONCLUSÃO ESQUEMÁTICA DA ANÁLISE PRELIMINAR DO PRIMEIRO

PAR

Depois de estabelecer semelhanças entre as duas reportagens do primeiro par, fiz um

levantamento das diferenças. Para facilitar a visualização, coloquei-as no quadro 3 que segue:

Quadro 3

DIFERENÇAS ENTRE “ FORNO” E “ COMO FUNCIONAM OS CATALISADORES DOS

AUTOMÓVEIS

“ FORNOS” (1988)

“ COMO FUNCIONAM OS

CATALISADORES DOS AUTOMÓVEIS?”

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(2001)

¼ da página ½ página

Imagem subserviente ao verbal Imagem independente

Ângulo frontal Ângulo oblíquo

Ângulo horizontal Ângulo alto

Ausência de plano de fundo Presença de plano de fundo azul

Baixa modalidade Média modalidade

Participante delimitado na imagem Participantes não delimitados na imagem

Manchete do texto verbal é o tema da

reportagem e o lead é a pergunta do leitor

Manchete é a pergunta do leitor

Seção denominada “Perguntas

Superintrigantes”

Seção denominada “Superintrigante”

“��� ������� � ��������� ��� �� ��� � ���� � �

” escrito em

fonte “Haettenschweiler” , em vermelho, em

itálico e em caixa alta

“ ��������� intrigante” escrito em fonte “Arial” ,

negrito, mas a palavra “ intrigante” em preto e

itálico, e a “super” em vermelho, caixa alta.

Ângulo frontal (envolvimento, praticidade) Ângulo alto e baixo (afastamento, teoria)

A fonte do texto é justificada

A fonte do texto não é regular somente no lado

esquerdo

Moldura regular Moldura irregular

2.2) ANÁLISE PRELIMINAR DO SEGUNDO PAR DE REPORTAGENS

Os textos que analisarei agora são reportagens de capa da revista Superinteressante, como

já foi falado, sendo a matéria “De antenas ligadas” pertencente à revista de maio de 19885 e a

matéria “O direito de morrer” , à revista de março de 20016, marcando, portanto, uma diferença de

treze anos de espaço de tempo de publicação. Esta análise será feita levando-se em consideração

o conjunto de duas páginas de cada vez do texto, pois é através desse bloco de duas páginas que

5 Superinteressante, ano 2, No. 5, maio de 1988 (p. 18-24) 6 Superinteressante, ano 15, No. 3, março de 2001 (p. 42-50)

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os leitores visualizam globalmente o texto. Também para essa análise não definirei todos os

processos a que cada texto, cada figura pertence, pois, além de haver inúmeras opções e

interpretações, todas elas não serão essenciais para a comparação das diferenças entre os dois

textos. Darei ênfase, portanto, aos processos que julgar relevantes para a análise, principalmente

aos elementos de Representação e Interação, de Modalidade e de Significado da Composição.

Figura 3 “De antenas ligadas” (Superinteressante, maio, 1988:18 e 19)

Em “De antenas ligadas” as primeiras duas páginas (Fig. 3) são dedicadas à manchete, ao

lead e à foto de uma antena parabólica e sua pequena legenda. Essas duas páginas são envolvidas

por uma moldura representando a margem de uma tela de televisão que é antiga para os nossos

padrões modernos de tecnologia, já que nos dias de hoje a televisão tende a ter formato de tela de

cinema, ou seja, ser horizontalmente retangular, ter tela plana, cantos quadrados e não mais

cantos arredondados como é representado na revista. Essa representação da margem da tela pode

ser considerada uma moldura, claramente delimitada, tendo a intenção de passar a sensação de

que o leitor está assistindo à televisão quando olha para a revista aberta nessas páginas. A

Dimensão focalizada pela moldura é a close distance, o que significa, como sugerem Kress e van

Leeuwen (1996), que o objeto é mostrado como se o Espectador estivesse interessado por ele.

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Na representação da tela, no lado esquerdo, está a imagem da antena parabólica, enquanto

que o texto verbal, composto pelo nome da matéria a que pertence a reportagem (Tecnologia),

pela manchete e pelo lead, está concentrado no lado direito. Nessa tela, a antena parabólica além

de ocupar sua página, ainda invade mais ou menos 15% da página direita. De acordo com o

sistema Dado-Novo, a figura localizada na esquerda pode ser interpretada como informação

conhecida do Espectador, ao contrário do texto verbal que está localizado na direita e seria, então,

uma informação Nova, merecedora de maior atenção do Espectador.

Essas duas páginas tem outros fatores que contribuem para a ênfase na segunda página. Um

deles é o contraste entre a cor amarela apresentada na manchete e o as cores azul e cinza

predominantes no restante do espaço. Outro fator é que a Saliência recai sobre o tom de azul mais

escuro focalizado nesta segunda página, enquanto que na primeira página o tom de azul é claro e

permeado pelo branco das nuvens. O tom escuro do azul aumenta o contraste com o amarelo da

manchete. Esta ainda ganha ênfase devido ao seu tamanho grande, ao negrito e à caixa alta,

destacando-se das outras letras que estão em preto, são pequenas e não estão em caixa alta.

A close distance com que a representação da antena é dimensionada faz pesar a página em

que a parabólica se localiza, provocando um certo equilíbrio com a página direita. Isso não

significa dizer que a Saliência deixa de recair sobre esta última.

Ainda falando sobre a antena, esta está representada por um ângulo baixo. O efeito que esse

ângulo causa, aliado ao Cenário de um céu ao fundo, é a sensação de que o Espectador está

embaixo da antena e, assim como ela, está voltado para o céu. Outro efeito causado por esse

ângulo é a sensação de poder que o Participante Representado, no caso a antena parabólica,

exerce sobre o Espectador. Talvez esse maior poder destinado à antena esteja relacionado ao

lead7 e, é claro, ao tema da reportagem que é a revolução que as antenas parabólicas – e todo seu

poder - estão causando nas comunicações.

Unindo o Valor do ângulo alto com a Saliência e o Valor de Informação do sistema Dado-

Novo, arriscaria dizer que todos esses elementos estão reunidos para enfatizar o lado direito e,

consequentemente, o texto verbal. Isso ocorre por causa tanto do destaque que a manchete tem,

pelos motivos já explicados, quanto da posição que o ângulo alto provoca no Espectador. Além

disso, a luminosidade forma um vetor que vai da parte inferior da página esquerda em direção à

7 “As parabólicas estão provocando uma revolução nas comunicações de TV do mundo inteiro, abrem espaço a mudanças culturais capazes de influir profundamente no perfil das sociedades do futuro” .

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parte superior da página direita, à manchete. Esse efeito é obtido pela representação, no Cenário

formado pelo céu, de uma intensificação gradual da esquerda para a direita, ou seja, do branco no

lado esquerdo ao azul no lado direito, como se a origem da luz estivesse no lado esquerdo e o

objetivo no lado direito.

Passadas essas duas primeiras páginas, o desenvolvimento aprofundado da reportagem

começa de fato e se estende às cinco páginas seguintes. De modo geral, essas páginas são

caracterizadas pelo fato de não haver plano de fundo, só o fundo branco contrastando com a letra

preta que domina completamente o texto verbal.

Na segunda dupla de páginas (Fig. 4) há uma simetria entre as páginas e as fotos e o texto

verbal. As fotos têm moldura claramente delimitada e se concentram no centro superior das duas

páginas. Como margem, envolvendo esse centro formado pelas fotos, está o texto verbal todo

justificado, ocupando as duas colunas externas por inteiro e as três colunas internas pela metade.

Dado o seu peso, as fotos do centro podem ser consideradas o chamariz das páginas em questão,

mas por si só não carregam a mensagem contida no texto verbal e, por isso, fica difícil afirmar

que, como dizem Kress e van Leeuwen (1996), pelo fato de estarem centralizadas sejam um

núcleo de informação no qual os outros elementos sejam servis de uma ou outra forma. As

imagens constituem sim o peso das duas páginas,

Figura 4 “De antenas ligadas” (Superinteressante, maio, 1988:20 e 21)

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mas não as considero núcleo da informação. São mais apoio do que núcleo da informação, até

mesmo porque as fotos, incluindo suas legendas, não dizem nada mais do que o olho localizado

na página 20 e o outro, na 21, respectivamente: “No final de 1989, 100 mil parabólicas no Brasil”

e “Canal das Forças Armadas é campeão de audiência” . Além disso, o fato de as fotos estarem

localizadas na parte superior e o texto, na inferior, o que implica, respectivamente, em Ideal e

Real, é atenuado primeiramente por causa da característica do sistema Centro-Margem e,

segundo, por causa do caráter tendendo ao mais horizontal que vertical, disposições que

diminuem, conseqüentemente, a ênfase desse sistema.

A Saliência dessa dupla de páginas se dá em sentido horário devido à sua composição

poder ser fixada no sistema Centro-Margem. O primeiro elemento saliente são as fotos

localizadas no centro, mais precisamente, a foto da direita da página 21, devido ser a maior foto

das duas. Em segundo lugar, a saliência caberia às duas fotos do lado esquerdo, já que juntas têm

o tamanho da foto do lado direito. Entre essas duas fotos, a que ganha destaque é a foto amarela

dado ao seu forte contraste de cor em relação ao restante da página. Em seguida viria a foto

superior, devido ao seu naturalismo e seu tamanho razoável. Há ainda o desenho d“O perfil da

antena” , menos saliente por ser menor e menos natural que as fotos. E como o visual denota mais

Saliência que um texto verbal homogêneo como o das páginas analisadas, esse texto fica em

último lugar na competição da Saliência.

Figura 5 “De antenas ligadas” (Superinteressante, maio, 1988: 22 e 23)

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Na terceira dupla de páginas (Fig. 5), não ocorre a mesma coisa que com as duas duplas

anteriores, ou seja, os elementos não estão dispostos nas páginas de modo a formar um só bloco

de informação.

Há na página 22 à direita, na terceira coluna, uma foto cuja legenda é “Antena plana: testes

na França” , e o restante é ocupado por texto verbal. Também nessa página, há um box (“A

tecnologia muda a imagem da aldeia global” ) que ocupa toda a parte inferior e dentro deste há um

desenho exatamente no centro da página invadindo esse box. Devido ao contraste da cor amarela

com o restante do texto, ao seu tamanho grande, ao seu desenho representativo, o box fica com o

maior peso da página. Em relação a toda reportagem, só no box aparece um plano de fundo liso,

amarelo, mas isso não ocorre somente com essa reportagem, pois em todas as reportagens

maiores ou consideradas mais importantes há um box de fundo amarelo. Isso significa que na

Superinteressante de maio de 1988 as reportagens não são feitas independentemente, mas

seguindo um padrão que permeia todas as matérias da revista. Por este box conter texto verbal,

assim como as duas primeiras colunas da parte de cima da página 22 que estou analisando, não

vou interpretar esses dois blocos de informação segundo a estrutura Real-Ideal. Essa estrutura

serve para análises entre imagem-imagem e imagem-verbal, mas talvez não sirva para verbal-

verbal.

Como conclusão, posso dizer que, apesar de ser composta por vários elementos, a página

ainda preserva o formato de colunas, ou seja, não são as colunas que se adaptam aos vários

elementos, mas eles se adaptam às colunas.

É interessante analisar o desenho que está no centro de página. É claramente uma

Demanda, pois são seres humanos que sorriem e fazem gestos para o Espectador, pedindo que

este estabeleça algum contato, mesmo que imaginário, com os Participantes. O sorriso significa

que eles querem que o Espectador estabeleça uma relação de afinidade social, de concordância

com o que estão mostrando ou representando, no caso, a globalização mediada pela televisão.

Nota-se que no desenho em questão, para corroborar a idéia de socialização e Demanda, os

Participantes Representados estão em uma far social distance, ou seja, vê-se os Participantes por

inteiro e também o espaço ao seu redor. Além disso, ela é feita de um ângulo frontal, o que

denota o maior envolvimento possível. Esse desenho não possui Moldura clara, mas é delimitado

pelos elementos ao seu redor, formando imaginariamente uma Moldura verticalmente retangular.

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Na página 23, assim como na maioria das outras anteriores, as duas fotos do músico e o box

azul são delimitados por uma clara moldura. Embora o box se apresente na parte superior direita,

portanto tem Valor de Novo, a ênfase recai sobre as duas fotos do músico. Isso pode ser

explicado por ser ou conter elementos que conotam maior Saliência: foto, ocupação de um espaço

maior que o box, representação realística, “close distance” .

As duas fotos, segundo o sistema Ideal-Real, por estarem localizadas bem no fim da página

podem representar um papel servil em relação ao elemento localizado no topo da página, o texto

verbal.

Na última página da reportagem (Fig. 6) há predominância do texto verbal. Há somente

uma foto no lado superior direito, tirada de um ângulo oblíquo e baixo com uma long distance.

Unindo todos os Valores desses ângulos e de outros elementos, cheguei à conclusão de que todos

convergem para um distanciamento por parte da foto em relação ao Espectador. O fato da foto

estar na parte superior da página significa que a realidade que representa é Ideal, uma realidade

que poderia ocorrer para o Espectador. O fato de estar localizada à direita, significa algo

Figura 6: (Superinteressante, maio, 1988: 1)

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Novo e, por isso, não é gratuitamente que a legenda diz “O gigantesco Jumbotron, na Feira de

Tsukuba: inovações de bom tamanho” . O ângulo oblíquo transmite a idéia de distanciamento do

Espectador em relação aos Participantes Representados.

Quando uma foto é tirada de um ângulo baixo, assim como a do Jumbotron, significa que o

Participante Representado terá mais poder do que o Espectador. Finalmente a long dostance

imprime uma distância social, colocando uma barreira entre o Espectador e o objeto, um item de

luxo disponível apenas para contemplação.

Na segunda reportagem, “O direito de morrer” , há duas coisas que mais me chamaram

atenção: o modo com que a cor azul foi utilizada e a interferência das imagens na compreensão

do texto. Tanto a utilização da cor quanto das imagens permeiam toda a reportagem, com exceção

da última página. Começarei analisando esses elementos em conjunto.

Figura 7 (Superinteressante, março, 2001: 42 e 43)

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De maneira geral, a reportagem possui letras pretas jogando com as imagens do plano de

fundo azul. Essas imagens são fotos não delimitadas por moldura de um homem de aparência

doente, devido à sua extrema palidez (sua pele foi maquiada de branco), seus olhos semi

fechados, a falta de cabelo, de sobrancelhas e de pêlos. Além disso, está em meio ao azul do

plano de fundo que lhe confere uma perda do contorno de seu corpo, de sua silhueta. Esse homem

aparece como parte do plano de fundo na página 43 (Fig. 7), 44 (Fig. 8) e 46 (Fig. 10). Nessas

duas últimas páginas o que aparece dele é o lado esquerdo frontal da cabeça, sendo que ele está

localizado na parte inferior à esquerda das páginas esquerdas da dupla de páginas, em uma close-

up. Na página 43 (Fig. 7) está localizado à direita da página direita da dupla de páginas,

ocupando todo esse lado, sendo que sua silhueta vai se esvaindo conforme vai adentrando na

página. Aqui ele está praticando uma ação, a de apertar um botão “on-off” presente em seu

pescoço. Essa atitude caracteriza um Processo Narrativo de Ação, segundo a teoria de Kress e

van Leeuwen (1996). O mesmo homem também é representado em primeiro plano, ou melhor,

seus braços e suas mãos apenas.

No primeiro conjunto de páginas o seu braço, contendo uma espécie de sonda com agulha

que os doentes usam, adentra pela parte inferior da página esquerda, atravessa-a e vai de encontro

a um botão “on-off” localizado embaixo da primeira coluna de texto verbal da página direita.

Portanto, neste primeiro conjunto de páginas, tanto no plano de fundo quanto no primeiro plano o

homem pratica uma ação, a de apertar o botão “off” da vida.

No segundo par de páginas (Fig. 8) o mesmo braço também adentra pela página esquerda,

mas antes de chegar até o botão uma outra mão o impede como dizendo “pare” . Essa outra mão

surge da página direita num movimento de baixo para cima e ela tem aparência de saudável,

devido à sua cor mais natural e, além disso, parece ser a mão de um médico, já que aparece a

manga de roupa branca é mostrada.

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Figura 8 (Superinteressante, março, 2001: 44 e 45)

No terceiro par de páginas (Fig. 9), o braço adentra pela página esquerda, só que pela sua

parte superior, e vai até à direita para pegar um comprimido da mão de um médico. Esta última

mão, por sua vez, adentra pela página direita, num ponto mais baixo da metade da página, e vai à

direção à mão do doente, ofertando-lhe o comprimido. No último par, dois braços, e não apenas

um, estão posicionados a partir da página esquerda, novamente, invadindo um pouco da direita.

Aí o Ator está tirando a agulha do braço.

Todas essas imagens do “doente” , seja no plano de fundo ou no primeiro plano, não são

delimitadas por moldura ou pelo texto verbal que está à sua volta, ao contrário, elas invadem o

espaço do texto escrito que, por sua vez, molda-se aos contornos dos braços, da cabeça e do

corpo do “doente” .

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Figura 9 (Superinteressante, março, 2001: 46 e 47)

Para propiciar uma melhor integração entre o texto verbal e o visual a fim de formar um

todo significativo, a Modalidade é extremamente utilizada em toda a reportagem. Assim, por

exemplo, a representação do doente como parte do plano de fundo não é natural, é considerada

menos que o real, dado o seu aspecto etéreo e no que diz respeito à cor, esta é claramente usada

como plano de fundo na composição da reportagem para denotar “ frieza” , “morte” e reforçar a

contextualização do assunto da eutanásia.

Assim, a Modalidade relacionada à luminosidade e à cor tem uma grande importância para

a sensação, a interpretação e a compreensão da reportagem. Essa Modalidade unida ao sistema

Dado-Novo e Ideal-Real sugeridos por Kress e van Leeuwen (1996) resulta num complexo

conjunto de significados. Segundo os autores, “a luminosidade pode contrastar o

secular/mundano com o divino/ideal. A luz, quando é um elemento Dado é interpretada como

concedida e a luz quando é um elemento Novo é assombrosa. A luz pode estar em uma área do

Real vinda de uma fonte mundana, ou pode estar localizada no espaço destinado ao Ideal e,

portanto, ser divina” (op. cit. 1996: 199).

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Sob esse prisma, talvez seja possível fazer uma interpretação de alguns dos possíveis

significados da reportagem que está sendo analisada. Por exemplo, no terceiro par de páginas

(Fig. 9): a luz emana junto com a mão do médico no lado direito inferior, posição que significa

algo Novo e mundano. Seria a cura trazida ao paciente pela surpreendente ciência humana? Essa

luz que nasce da direita vai gradualmente perdendo intensidade à medida que se aproxima do

canto superior da página esquerda, onde o braço do doente adentra na página. Isso significaria

que é senso comum que a cura é concedida pelo divino? De modo complementar, é interessante

perceber que o Doutor Morte, representado numa fotografia pequena de close-up situada no canto

superior direito da página direita, está olhando com um semblante preocupado ou, talvez, de

descrença para a mão doente quase pegando o comprimido oferecido pela mão do médico.

Ao longo do texto há, além do texto verbal não totalmente justificado, um ou outro box

delimitado por uma Moldura. Essa Moldura, constituída por uma linha fina de cor preta, delimita

o box e o separa do resto do texto sem, no entanto, mudar o plano de fundo e a variação de luz

deste. Além disso, o box, tanto quanto o texto verbal, pode ser invadido por imagens e quando

isso acontece, adapta-se a elas.

Os elementos existentes no terceiro par estão presentes no quarto par de páginas (Fig. 10): a

luminosidade, o box, a foto em close up do entrevistado na parte superior à direita, o olho à

esquerda, a imagem do braço do doente. A diferença entre os elementos dos dois pares é que a

luminosidade é invertida: vai da esquerda para a direita, num movimento sincrônico aos braços,

localizados na parte inferior do conjunto de páginas. A ação praticada pelo doente é de suicídio,

simbolizada pela retirada da sonda. Unindo os possíveis significados desses elementos, poderia

dizer que essa ação representa uma ação mundana pratica pelo homem, devido à localização dos

braços – os Atores – na parte inferior. Ao contrário, no lado direito, que representa o Novo, e na

parte superior, que representa o Ideal e até mesmo de divino, há uma foto do pintor americano

Chip Nichols sorrindo ao lado do texto de sua entrevista onde declara “Eu gosto da vida” . Um

misto de dor causada pelo suicídio, uma atitude mundana e esperança, simbolizada pela força que

o pintor americano demonstra frente à sua doença incurável.

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Figura 10 (Superinteressante, março, 2001: 48 e 49)

Na página 45 (Fig. 8) há uma representação, uma espécie de box que, ao contrário dos

outros três presentes no texto, não possui Moldura. Trata-se de uma linha do tempo literalmente

representada por uma espécie de sonda hospitalar resumindo a polêmica sobre a eutanásia ao

longo de cem anos. Por estar do lado direito, a mensagem desse box pode ser considerada Nova.

Ainda falando sobre o sistema Dado-Novo e analisando o primeiro par de páginas, percebi

que o peso visual se dá no lado esquerdo, visto que contém os seguintes elementos de destaque: a

manchete e a imagem do braço do doente. A manchete contribui para o peso porque é

representada com uma fonte grande, sendo que a palavra “morrer” é representada com uma fonte

ainda maior que as outras palavras da manchete. A imagem do braço contribui para o peso da

página devido ao seu tamanho grande, sua palidez e, principalmente, por representar uma ação, a

de apertar o botão “on-off” . O significado da palavra “morrer” , palavra tão destacada na

manchete, é altamente acentuado pela imagem de um braço que não representa apenas uma parte

do corpo, mas que possibilita ao leitor inferir que há uma pessoa por trás e ela está tão doente

quanto aparenta a palidez e a sonda em seu braço. A ação que o braço, ou melhor, que a pessoa

simbolizada por ele pratica, sem dúvida nenhuma, pesa mais do que qualquer elemento da página,

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também pela sua posição no primeiro plano que é, segundo Kress e van Leeuwen (1996), o plano

de maior Saliência. A imagem do braço também se destaca porque é capaz de fazer com que o

texto verbal desvie lhe cedendo espaço, ao invés dela ceder espaço para o texto verbal. Isso

confere um poder maior à imagem e, conseqüentemente, maior liberdade ou vice-versa.

Seguindo o sistema Ideal-Real proposto pelos autores, talvez seja possível afirmar que há

uma relação entre o direito de morrer e a ação de morrer, isso porque a manchete “O direito de

morrer” está disposta na parte superior da página, o que indica uma situação Ideal, enquanto que

a imagem do braço está disposta na parte inferior, a qual indica uma situação Real representada

pela ação de desligar o botão “on-off” da vida, ou seja, praticar a eutanásia.

Quanto à última página da reportagem (Fig. 10), ela apresenta o box “Se Deus quiser” à

esquerda, onde a cor azul do plano de fundo é mais acentuada. Isso poderia significar que,

segundo o sistema Dado-Novo, no que tange à discussão a respeito da Eutanásia, a opinião

religiosa sobre a morte piedosa é conhecida pelo leitor.

Figura 10 (Superinteressante, março, 2001: 50)

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Para equilibrar o peso da página esquerda, na página direita a imagem do homem

representado no plano de fundo sugere um máximo de aproximação e envolvimento por parte do

Espectador, pois, além de ser representado em close up, é também representado de um ângulo

frontal e horizontal, construindo uma imagem de Demanda. Como esta imagem também é de

tamanho grande, ela só não ganha mais destaque porque está num plano de fundo, plano que

conota menor Saliência.

2.2.1) CONCLUSÃO ESQUEMÁTICA DA ANÁLISE PRELIMINAR DO SEGUNDO

PAR

De forma geral, a reportagem “O direito de morrer” se comparada à “De antenas ligadas”

possui muito mais elementos integrados para a composição de um texto, um todo significativo.

Nela, os elementos são convertidos para passar ao leitor a sensação de morte e esperança, temas

centrais de uma discussão sobre a eutanásia, assunto da reportagem.

DIFERENÇAS ENTRE “ DE ANTENAS LIGADAS” E “ O DIREITO DE MORRER”

“ DE ANTENAS L IGADAS” “ O DIREITO DE MORRER”

Texto verbal justificado Texto verbal irregular

Ausência de plano de fundo Presença de plano de fundo com imagens

Imagens delimitadas/formatadas pela

moldura ou pelo texto verbal

Imagens sem delimitação/formatação

Baixa Modalidade Alta Modalidade

Box com rígida delimitação e com marcação

de plano de fundo diferente do resto do texto.

É utilizado como padrão para as grandes

reportagens da revista

Box com delimitação flexível de apenas um

fina linha, ou sem delimitação, com plano de

fundo igual ao resto da matéria.

Imagens não invadem o texto verbal Imagens invadem o texto verbal

Manchete com fonte regular Manchete com fonte irregular (Saliência

dentro da manchete)

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Cor azul nas duas primeiras páginas indica

objetividade técnica

Cor azul de toda a reportagem indica

Demanda, subjetividade

Olho é delimitado por uma linha fina

embaixo e outra em cima; olho é justificado

tem a fonte um pouco maior que a do resto

do texto, ocupa o espaço de uma coluna

Olho não justificado, com fonte bem maior

do que a do texto, ocupa o espaço de mais de

uma coluna e está sempre à direita da página

3. RESUMO DAS TAREFAS REALIZADAS NA SEGUNDA ETAPA DA PESQUISA

Concluída a etapa inicial referente à análise detalhada dos dois pares de reportagens, dei

prosseguimento ao meu estudo buscando preencher algumas lacunas deixadas. Acatando a

sugestão do parecerista do meu primeiro relatório, busquei considerar no corpo da análise a

totalidade da página onde as reportagens foram publicadas. Nessa segunda etapa do estudo,

busquei também investigar, através de entrevistas gravadas, como os leitores que se enquadram

no público previsto para a Superinteressante reagem aos textos atuais e aos mais antigos. Essa

investigação teve como objetivo averiguar se a linguagem visual faz parte das estratégias de

leitura desses leitores e comparar com os resultados da análise feita com base na gramática do

visual. Com base nessas entrevistas, procurei responderei às seguintes questões:

3) Contrastando os textos antigos e os mais recentes, qual destes dois tipos recebe a

preferência dos leitores?

4) Como os leitores percebem e explicitam as razões que subjazem às suas preferências?

Foram entrevistados dez leitores universitários, sendo sete do sexo feminino e três do

masculino, com idades entre 19 e 23 anos. As entrevistas foram semi-estruturadas e as perguntas

formuladas a todos os leitores, seguindo a ordem descrita abaixo:

1) Você gostou dos textos? O que você achou?

2) Comparando o primeiro par de textos, o do forno de microondas e o do catalisador, no

que diz respeito à linguagem visual, o que você percebeu? Há diferenças entre as

reportagens?

3) Qual desses textos você gostou mais de ler, achou mais bonito, chamou-lhe a atenção?

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4) Por que o outro texto lhe agradou menos?

5) Quanto ao segundo par de reportagens, “de antenas ligadas” e “o direito de morrer” ,

qual o texto que você mais gostou de ler?

6) Por que o outro texto do segundo par lhe agradou menos?

7) Se houvesse correntes teóricas dizendo que a imprensa mudou muito e outras, que não

mudou, qual dessas correntes é a mais representativa das reportagens lidas da

Superinteressante? Por quê?

Feita a transcrição das entrevistas, dei início a análise dos dados. Verifiquei quais foram os

pontos mais comuns nas respostas dadas, explicitando as avaliações apresentadas pelos leitores.

Busquei estabelecer um paralelo com a linha teórica de Kress e van Leewen (1996) considerada

no estudo.

Para o desenvolvimento e redação final desta pesquisa também contei com os resultados de

discussões da apresentação de um painel de título “O aspecto visual em artigos da revista

Superinteressante: o que mudou e como os leitores reagem a essas mudanças” , no X Congresso

Interno de Iniciação Científica da UNICAMP, realizado nos dias 25 e 26 de setembro de 2002.

Obtive muitas contribuições, principalmente no que diz respeito ao letramento do aluno e sua

formação como cidadão crítico, mais especificamente no que talvez possa chamar de letramento

visual. Prevejo discutir tais questões em mais detalhes no 5o CELSUL (Círculo de Estudos

Lingüísticos do Sul) a ser realizado nos dias 17 e 18 de outubro, onde estarei participando do GT

“A textualidade multimodal e a integração de linguagens alfabéticas e visuais” . Com o mesmo

intuito, participarei com um trabalho de mesmo título deste relatório, nos dias 30 e 31 de outubro

e 1o de novembro de 2002, do Seminário de Teses em Andamento (SETA) que recentemente

abriu espaço para a discussão de pesquisas de IC.

4. ANÁLISE DAS ENTREVISTAS COM LEITORES EM POTENCIAL DA REVISTA

SUPERINTERESSANTE

Como previsto nas considerações metodológicas da pesquisa, foi pedido para cada leitor

selecionado ler as quatro reportagens publicadas na Superinteressante e, posteriormente,

comparecer a um local pré-determinado para eu os entrevistar.

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Os textos foram lidos em fotocópias coloridas, sendo que no momento da entrevista foram

apresentadas ao leitor as revistas, fontes originais, para consulta. Além das perguntas já

apresentadas, foram, quando necessário, acrescentadas algumas perguntas circunstanciais, ou

seja, perguntas que visavam a um detalhamento maior das respostas às questões essenciais ou,

ainda, perguntas que visavam ao esclarecimento de falas do leitor consideradas dúbias ou

confusas. As questões iniciais foram colocadas levando em consideração todas as características

gerais do texto e não somente as que dizem respeito à linguagem visual, já que o objetivo deste

estudo não foi o de direcionar as respostas, mas obter o máximo de fidelidade possível. Somente

nas últimas perguntas foram requeridas repostas acerca do visual. O propósito das entrevistas,

bem como o assunto da pesquisa, foram somente esclarecidos após o término de cada entrevista,

caso o leitor tivesse curiosidade.

Neste relatório apresentarei um resumo das respostas de cada leitor entrevistado,

entendendo que isso poderá ser útil para fundamentar as considerações acerca da relação entre as

mudanças de linguagem nos textos da revista Superinteressante e o letramento.

- Avaliação feita pelo leitor 1:

No que concerne à primeira questão (Você gostou dos textos? O que você achou?), a

resposta da primeira leitora entrevistada foi de que gostou da reportagem “Forno” , mas não

entendeu realmente como funciona o microondas, devido ao uso de termos muito técnicos. O

texto 2 não chamou muito a sua atenção, porque ela não gosta de assuntos desta área científica. O

texto 3 causou-lhe um estranhamento logo de início, motivo pelo qual procurou saber a data em

que a revista foi publicada. A leitora considerou o texto atual, porque vê hoje muitas das

projeções científicas feitas pela reportagem como, por exemplo, o surgimento do que chamamos

atualmente “TV a cabo” . O texto 4 foi o que a leitora gostou mais, porque “não conseguia parar

de ler para saber (...) as opiniões de cada um sobre a eutanásia” . Mas a entrevistada disse logo

depois que percebeu que, apesar do texto apresentar opiniões tanto a favor quanto contra a

eutanásia, bem como seus prós e contras, conduz o leitor, na verdade, a ser a favor, “a maioria do

texto vai te conduzindo para ser a favor da eutanásia” , visto que ele apresentou muito mais dados

favoráveis a eutanásia. Mesmo assim, esse texto foi considerado importante, pois trata de um

assunto tão pouco – ou quase nada – discutido no Brasil. Um outro motivo, ainda, que contribuiu

para que o texto 4 fosse o preferido por essa leitora foi o fato de ter sido construído como uma

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reportagem que vai além da apresentação de apenas informações de curiosidade ou puramente

técnicas como as outras, já que aborda também questões a respeito da vida e da morte e questões

éticas como, por exemplo, médicos que cuidam de um paciente terminal mais pelo dinheiro do

que pela própria medicina ou por querer realmente encontrar a cura.

À segunda questão (Comparando o primeiro par de textos, o do forno de microondas e o do

catalisador, no que diz respeito à linguagem visual, o que você percebeu? Há diferenças entre as

reportagens? O que você gostou mais?), a leitora começou respondendo que o texto 2 é bem

melhor e mais elaborado. Justifica essa afirmação dizendo que o texto 1 apresenta uma simples

foto de um microondas, enquanto que no 2 há uma ilustração, um gráfico que explica o

funcionamento do catalisador, mostrando como entram os gases, como acontece a transformação

em gases não poluentes e como saem filtrados. Portanto, a ilustração do texto 2 enfatiza o

funcionamento do aparelho, o que acontece em seu interior, e a do texto 1 enfatiza apenas uma

foto de um microondas e não o que ocorre em seu interior.

Em face à terceira questão (Qual desses textos você gostou mais de ler, achou mais bonito,

chamou-lhe a atenção?), a entrevistada respondeu que gostou mais do texto 2 e explicou que sua

leitura fluiu mais devido ao conhecimento prévio que tinha a respeito do assunto tratado, à sua

familiarização com o tema. Essa familiarização, entretanto, não ocorreu com o texto 1 e a leitora,

mesmo o relendo, não entendeu o funcionamento do microondas completamente. Mas ela chama

atenção para o fato de que gostou mais do texto 2 em relação à leitura, e não ao assunto.

Como a entrevistada já havia dito quais os motivos pelo qual gostara menos de ler a

reportagem “Forno” e dito também que fora a reportagem sobre a eutanásia sua preferida, as

perguntas de número 4 (Por que o outro texto lhe agradou menos?) e 5 (Quanto ao segundo par

de reportagens, “De antenas ligadas” e “O direito de morrer” , qual o texto que você mais gostou

de ler?) serviram apenas para confirmação das respostas.

À sexta questão (Por que o outro texto do segundo par lhe agradou menos?) a leitora

respondeu que preferiu o assunto polêmico sobre a eutanásia às explicações puramente técnicas

das parabólicas. Além disso, outros fatores contribuíram para sua preferência pelo texto 2 como,

por exemplo, o título, indicador de um texto polêmico, e o visual, principalmente o plano de

fundo azul. Segundo a entrevistada, a parte visual do texto 2 é muito melhor e mais interessante,

a começar pelo plano de fundo azul, cor que além de extrema beleza, trouxe-lhe paz. A

representação das mãos do médico e do paciente em meio ao texto também foi muito agradável à

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leitora. Em relação ao texto verbal, o da reportagem recente é considerado melhor, visto que

possibilita uma leitura mais rápida e mais envolvente. A diferença apontada entre o visual antigo

e o novo diz respeito à diagramação, ao “ jeito que eles [os editores] colocam as coisas” . Na

revista de 2001 o visual é mais bonito e mais agradável aos olhos. Já na reportagem antiga o

visual é considerado tradicional, ou seja, não há texto correndo entre as imagens como acontece

no texto 4. Ocorre uma dicotomia muito forte entre texto e imagem, fazendo com que sejam

apresentados separadamente, sem se misturarem, sem se integrarem.

Como resposta à pergunta (Mais alguma observação em relação ao visual ou ao assunto?), a

leitora fez uma observação a respeito do texto 3 restrita à questão do assunto. Disse que a

incomodou muito o fato do texto apresentar somente informações técnicas e não abordar questões

sociais como a influência que a televisão exerce nas pessoas, ou o que iria mudar para as pessoas

se tivessem acesso à antena parabólica, ou a exclusão de uma parcela da população, classes D e

E, ao acesso a essas tecnologias de comunicação. A entrevistada disse ainda que, se a reportagem

abordasse um pouco temas sociais como os na linha sugerida, talvez se interessaria e gostaria

mais do texto.

A última questão teve como objetivo fazer com que os entrevistados refletissem sobre as

diferenças visuais ocorridas nessas reportagens publicadas pela revista Superinteressante num

intervalo de tempo de treze anos. Uma parte da pergunta não é verdadeira, a que eu afirmo que há

correntes teóricas que sustentam que a imprensa sofreu poucas mudanças, mas mesmo assim a

coloco em contraste com a afirmação de que a corrente de Kress (1998) aponta para as mudanças

ocorridas no visual da imprensa européia, visando colocar as duas opções como sendo viáveis.

Ao expor a leitora a essa última pergunta (Se houvesse correntes teóricas dizendo que a imprensa

mudou muito e outras, que não mudou, qual dessas correntes é a mais representativa das

reportagens lidas da Superinteressante? Por quê?), ela respondeu dizendo que em relação à

linguagem visual a mudança é muito clara. Isso se deve, primeiramente, ao desenvolvimento

tecnológico dos recursos necessários para a confecção da revista, ou seja, fotos que cederam

lugar a gráficos e esquemas feitos por computador. A revista mais recente é também, segundo a

leitora, bem mais colorida. Nos textos 1 e 3, os recentes, as figuras estão no meio do texto verbal,

ao contrário dos textos 2 e 4, mais antigos, cuja disposição entre imagem e texto é mais

“quadrada” , dividida em blocos (o das imagens e o do texto verbal), as imagens não vão para

dentro do texto. Até mesmo as letras mudaram de uma revista para outra. As letras utilizadas em

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1988 denunciam que se trata de uma reportagem mais antiga e agradam menos que as de 2001.

Embora percebendo a diferença, a leitora não soube explicar o porquê. Ela concluiu que a revista

mais nova está mais bonita, mais atraente, despertando no leitor a vontade de ler mais. Vontade

esta acentuada quando a manchete da reportagem já traz a pergunta como em “Como funcionam

os catalisadores dos automóveis” , coisa que não acontece em “Forno” , em que a pergunta, “Como

funciona o forno de microondas” , só aparece no lead.

- Avaliação feita pelo leitor 2:

Esta leitora não gostou do texto 3, devido às muitas e detalhadas informações técnicas de

difícil entendimento que constróem esse texto. Em busca de compreensão, ela fez releituras e

considerou o texto inapropriado para a imprensa, uma vez que esta se preocupa em atingir seu

público alvo trabalhando com maior clareza textual. Em contrapartida, o texto 4 foi o que gostou

mais, leu mais rápida e prazerosamente, porque tem uma disposição gráfica mais bonita, clara e

dinâmica, bem diferente da diagramação do outro texto que “parece tudo meio quadrado” e até as

colunas são estritamente lineares. Além disso, no texto 3, a leitora percebeu que muitas vezes há

uma considerável separação espacial entre uma imagem e seu respectivo texto verbal, o que não

está acostumada a ler nas revistas atuais, cujas imagens e texto vêem sempre juntos. “O que é

normal na disposição de hoje não acontece muito aqui” na revista de 1988. A leitora cita, ainda,

que logo após a reportagem há um pequeno texto fazendo a propaganda de coisas sobre o espaço

e a astronomia. Hoje em dia não há mais propagandas em um pequeno espaço de página logo

abaixo do fim de uma reportagem, sobretudo de capa, só porque há uma pequena semelhança

entre essa propaganda e essa reportagem. Atualmente as revistas costumam separar, segundo a

entrevistada, textos de repórteres diferentes, o que não é recorrente em “De antenas ligadas” . O

que agradou em “O direito de morrer” foi a linha do tempo que conta resumidamente a história da

eutanásia. O fato de as imagens perpassarem o texto que se adapta a elas foi considerado muito

interessante e agradável. Portanto, “a imagem está mais no primeiro plano do que aquilo que está

escrito, ao contrário daqui [texto 3]” , cujo apelo visual é insuficiente, causando o efeito de que há

letra demais. Já em “O direito de morrer” a composição é mais equilibrada e faz com que o texto

ganhe fluência. No que diz respeito ao assunto, a reportagem mais antiga é vista como “colagem

de informação técnica” , enquanto que a nova articula um tema polêmico.

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No tocante ao outro par de textos, a leitora considerou que o texto 2, apesar de também ser

um texto técnico, não carrega nos detalhes o que seria muito ruim e desestimulante. O texto 1,

apesar de ser parecido no tamanho com o texto 2, é mais maçante que ele e carrega mais detalhes

de informações técnicas. A leitora alerta que um dos motivos de não ter gostado tanto desses três

textos é não serem temas de seu interesse. Ela preferiria ler um texto que tratasse do

funcionamento do microondas, visto que este aparelho lhe é, ao menos, mais familiar que um

catalisador. Mesmo assim, a leitora ressalta que preferiria que o texto sobre o microondas fosse

menos detalhado e com o gráfico explicativo como o texto sobre o catalisador, além de ter cores

mais atraentes como o plano de fundo azul do texto 4. Segundo a leitora, esse gráfico do

funcionamento dos catalisadores facilita a compreensão do que está sendo explicado

teoricamente. Portanto, levando-se em consideração o gráfico, o dinamismo da diagramação e a

presença de cores em contraposição à falta de colorido, ao design “quadrado” da reportagem do

microondas, a leitora gostou mais do texto 2, mais recente.

Frente à última pergunta, a entrevistada, baseando-se nos textos lidos, disse que ocorreram

sim mudanças, principalmente quanto à linguagem visual, tanto que percebeu que na reportagem

da eutanásia as colunas de texto seguem os limites da imagem e, por isso, a imagem parece ser

dominante ao texto verbal. A preocupação com a linguagem visual, objetivando conquistar

leitores, é muito grande, já que ela é composta primeiramente para, então, o texto ser composto,

adequando-se “ao visual” . Até mesmo a manchete sofreu alterações. A leitora aponta também que

“O direito de morrer” é composta por letras de diferentes tipos, em itálico, bem diferente da “De

antenas ligadas” , cujas letras são uniformes e do mesmo estilo.

Ainda perguntei à leitora se o plano de fundo azul da reportagem da eutanásia tinha

significado algo em sua leitura. Ela me respondeu que no momento da leitura não, mas ao refletir

sobre a questão, disse que a cor a fazia pensar no azul do céu, da morte, da esperança e,

finalmente, do hospital. Disse ainda que se o azul fosse substituído por vermelho consideraria que

a reportagem poderia tratar de morte e chacina ou algo mais forte e não mais um tom natural.

- Avaliação feita pelo leitor 3:

Este leitor também gostou mais da reportagem “O direito de morrer” , porque considerou o

assunto mais interessante, por ele ser mais argumentativo, pela melhor disposição, pelas imagens.

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Quanto ao primeiro par de reportagens, esse leitor gostou mais do texto 2, devido, talvez à sua

diagramação mais dinâmica.

O leitor notou diferenças na linguagem visual. Explicou que a parte gráfica presente no

texto 2 é mais atual por ter sido feita no computador, enquanto que nos textos mais antigos eram

usadas ainda fotos (de microondas, de antenas). Outra característica que notou estar presente nas

duas reportagens mais recentes e não as antigas foi o plano de fundo.

Questionado sobre a última pergunta, o leitor concordou que em alguns casos como o do

visual houve mudanças: o antigo fundo branco deixa de ser usado e surgem fundos de diversas

cores; o único plano de fundo amarelo que existe na revista antiga faz parte de um box e,

portanto, não permeia toda a reportagem; há muitos mapas, gráficos e esquemas atualmente e as

fotos, a base de todas as imagens da revista antiga, são muito pouco utilizadas; as margens das

colunas, antes estritamente regulares, ganham os contornos das imagens, acompanhando-as; a

divisão entre texto e imagem cede lugar à integração desses elementos.

- Avaliação feita pelo leitor 4:

A quarta leitora entrevistada gostou mais, em relação ao primeiro par de textos, da

reportagem “Forno” e explica esse fato pela sua história de letramento, ou seja, o funcionamento

do forno microondas já era de seu conhecimento, já tinha aprendido isso numa aula que assistiu.

Em resposta à segunda pergunta, a entrevistada disse que percebeu sim mudanças entre as

reportagens antigas e novas, principalmente quanto ao visual. No entanto, ela percebeu uma

função didática no uso da imagem e disse que há gráfico explicativo no texto 2 porque, sendo o

catalisador um objeto não tão comum, precisou de um desenho mais detalhado que mostrasse

visualmente o interior da peça. O microondas, por sua vez, sendo um objeto mais conhecido, o

texto 1 necessitou de ilustração apenas. Em relação à linguagem verbal o texto 1 foi considerado

mais fácil e o 2, dado suas inúmeras siglas e termos técnicos, mais difícil, sempre levando-se em

conta que a leitora já tinha domínio sobre o funcionamento do microondas.

Também devido à sua história de letramento, a leitora lê muito sobre a área da saúde, área

de grande interesse, além da de linguagem (sua área de formação). Isso, segundo ela, foi um fator

decisivo para ter gostado mais do texto 4, sobre a eutanásia. Além disso, em uma outra

experiência pessoal, a leitora contou que lhe foi perguntado qual sua opinião a respeito da

eutanásia em uma entrevista para a vaga de professora de inglês. A tecnicismo do texto 3 foi,

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como em outros leitores, indicativo para ela ter gostado menos do que o texto 4, o qual explora

também questões até de ordem moral.

Quando lhe fiz a pergunta sobre a percepção das mudanças entre as reportagens de 1988 e

2001, ela me respondeu que as percebeu e que lhe chamaram a atenção as imagens dos braços

que, aliás, mostram bem a relação médico-paciente, assim como a imagem do botão on-off no

pescoço do paciente, imagens essas que invadem as páginas. A leitora afirma que as imagens

centralizadas em “De antenas ligadas” atrapalham a leitura, pois deixam o texto cortado. No que

se refere ao primeiro par de textos, a imagem em “Forno” cumpre apenas o papel de ilustração,

enquanto que em “Como funcionam os catalisadores dos automóveis” as imagens possuem

explicações e são basicamente um resumo do texto verbal.

Já no fim da entrevista fiz a última pergunta e a leitora respondeu que a imprensa realmente

mudou e disse que se baseou em seus gostos pessoais para fazer essa afirmação, ou seja, ela

gostou mais do textos atuais: o texto 4 e, contraditoriamente ao que havia dito no começo da

entrevista, do texto 2. O segundo texto, porque o gráfico é explicativo e chama mais a atenção do

que a de “Forno” . Além disso, percebeu que as reportagens mais antigas tinham aspecto

“quadrado” , com fotos separadas do verbal, o oposto que nas mais recentes repletas de fotos no

plano de fundo, de imagens dos braços chamando a atenção, de cores, principalmente o

expressivo azul do plano de fundo da reportagem da eutanásia, azul lembrando a área médica,

algo relacionado à saúde.

- Avaliação feita pelo leitor 5:

A entrevistada disse que não gostou do texto das antenas. Um dos motivos foi porque trata

de um assunto que não lhe interesse e por ser muito extensa, fazendo com que o raciocínio se

perca ao longo do texto. As duas reportagens do primeiro par, apesar de também serem técnicas,

o raciocínio não se perde. A preferência ficou, então, com o texto 4. Entre os textos 1 e 2, a

leitora preferiu “Forno” , pois trata de um assunto que interessa mais e está mais presente em seu

cotidiano do que o catalisador.

Ao lhe perguntar se havia percebido diferenças de visual entre os textos antigos e recentes,

a leitora disse que ao lê-las não prestou a atenção nisso e que, mesmo em dúvida, considerou que

não notou mudança alguma. Em resposta à última questão, a entrevistada disse que está mais de

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acordo com a corrente teórica que afirma que não houve tanta mudança na imprensa, que ao ler

os textos não sentiu muita diferença entre eles.

- Avaliação feita pelo leitor 6:

Para a leitora entrevistada, o texto 2, além de explicar textualmente seu funcionamento,

visualiza isso em um gráfico. Esse gráfico é feito no computador, apresentando zoom e várias

setas e facilita o entendimento da informação verbal que está ao lado. Apesar disso, a entrevistada

gostou mais da reportagem “Forno” , porque a entendeu melhor e pelo fato de não entender nada

de carro, enquanto que o microondas faz parte de sua vida.

Comparando os textos, a leitora me apresentou várias diferenças entre eles como, por

exemplo, o surgimento de novos elementos, gráficos de linha do tempo, boxes, entrevistas,

opiniões de vários tipos, utilização de muitas cores. Ela disse que isso é mais atraente e propicia

uma leitura mais agradável, apesar de dificultar um pouco a leitura, no sentido de não saber o que

ler primeiro, ou seja, se é melhor ler o texto todo e depois voltar para ler os apêndices, ou ler

primeiramente os apêndices ou, ainda, intercalar texto principal e secundários. A leitora fez uma

importante consideração, a de que como estamos acostumados hoje a ler revistas

atuais/contemporâneas e, conseqüentemente nos habituamos com sua diagramação, composição,

utilização das cores, manchetes, até mesmo a diferença nos ícones de sinalização de fim de

reportagem, enfim, como nos familiarizamos com o novo jeito de se fazer revista, podemos não

gostar de outros, sejam eles melhores ou piores. Outra coisa que a leitora percebeu, e que também

foi citado por outros leitores, foi o diálogo entre visual e textual que as reportagens mais novas

têm e as mais antigas não. E mais, em “O direito de morrer” é o texto que se adequa às imagens,

enquanto que em “Forno” e “De antenas ligadas” não há nenhum tipo de mistura entre visual e

verbal e as figuras são muito lineares, “quadradas” . Esse diálogo lhe agrada muito e, em sua

opinião é uma das principais mudanças que ocorrem ao longo do tempo nas reportagens da

revista Superinteressante. Explica que a cor azul do plano de fundo do texto 4 causou-lhe um

efeito de hospital ou céu, o que fez com que a reportagem ganhasse um tom mais leve. Além

disso, a composição feita anteriormente com fotos sofreu muita influência da tecnologia

computacional, sobretudo da internet.

- Avaliação feita pelo leitor 7:

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Esta entrevistada gostou mais, no que diz respeito ao primeiro par de reportagens, do texto

2, visto que gosta mais de textos que exploram gráficos, figuras, legendas explicativas, zoom do

que de textos como o 1 que só tem uma simples foto ilustrativa. Além disso, considera que esse

novo tipo de recurso gráfico auxilia na compreensão das informações. Quanto ao segundo par,

pensa que o texto 3 foi muito interessante, porque gosta de assuntos ligados à comunicação. Já o

texto 4 foi interessante pelo fato de se tratar de um tema polêmico e que diz respeito a todo

mundo, além de ser mais bonito visualmente. Este texto 4, do qual a leitora mais gostou, também

lhe foi agradável porque gostou de estar lendo algo que não é tão habitual, uma informação nova.

Quando perguntei se ela havia percebido mudanças quanto à linguagem visual entre as

reportagens, a leitora corroborou o que tinha dito anteriormente sobre gráficos, imagens e

ampliou suas considerações acerca desses elementos. Para ela, um dos motivos para que haja

gráficos explicativos é que possibilitam maior concretude do assunto tratado, o que contribui para

um melhor entendimento do texto. Um segundo motivo é disponibilizar através desses gráficos

(“Metamorfose gasosa” e “O que Deus quiser” ) e imagens informações que deveriam fazer parte

do conhecimento de mundo do leitor, mas que na verdade não fazem. Assim sendo, esses

recursos servem como suporte para o leitor, têm função didática, o que facilita a compreensão

para quem não é especialista no assunto discutido. Já em textos mais tradicionais como “De

antenas ligadas” , as imagens são complementares, e não essenciais, visto que as informações

veiculadas pelas fotos são de conhecimento da maioria dos leitores. A leitora disse que, como a

maioria das fotos em “De antenas ligadas” são de conhecimento dos leitores e, portanto

desnecessária, ao invés de complementarem a reportagem, poluem-na. Além disso, considerou as

fotos de má qualidade, já que destacam árvores e construções quando deveriam destacar as

antenas parabólicas. De forma análoga, considerou desnecessários as ilustrações de canais de

televisão.

Pela qualidade gráfica, segundo a leitora, pode-se perceber que uma reportagem é antiga ou

recente. O que muda também é o tipo de letra, a qualidade das fotos, a presença de recursos já

citados. O layout da reportagem também sofreu mudanças, visando fazer reportagem mais

atrativa e didática para o leitor. A leitora pensa que talvez seja uma tendência das revistas,

especialmente a da Superinteressante, escrever textos científicos mais didáticos e com maior

apoio visual. Ainda em relação às mudanças, a entrevistada chamou a atenção, no texto 4, para o

fato de que o leitor pode ter uma idéia geral do assunto tratado pela reportagem apenas lendo as

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informações do “olho” . Este recurso utilizado pela revista de 2001 não existe na de 1988, cujos

subtítulos respeitam o espaço das colunas. Os boxes passam a transmitir opiniões de entrevistados

ou outras pessoas, informações estas que deixam de estar diluídas no texto para ganharem lugares

de destaque. Tanto o “olho” quanto o box, principalmente se este veicular a opinião de uma

pessoa famosa, instigam o leitor, atraindo-o.

Todos os recursos utilizados pela revista nova passam ao leitor, ao contrário da revista

antiga, a sensação de que é mais organizada.

- Avaliação feita pelo leitor 8:

Para este leitor, todos os textos foram interessantes e por motivos diferentes. Achou a

reportagem sobre as antenas interessante, porque foi possível ver como era a expectativa em

relação à tecnologia na época, há mais de dez anos. As duas pequenas, textos 1 e 2, foram

consideradas curiosas, visto que também trazem informações técnicas, mas num espaço reduzido,

apropriado às leituras rápidas dada a falta de tempo dos leitores, ou seja, o leitor considerou essas

reportagens apropriadas, por concentrar informações científicas em um espaço curto. A

reportagem 4 foi considerada a melhor, por causa de seu texto bem articulado, contendo as duas

posições sobre esse assunto tão polêmico e também por ter um espaço amplo apropriado à

discussão sobre a eutanásia, bem como pelo seu projeto gráfico. Considerou o projeto gráfico

“De antenas ligadas” antigo, visto que tem aparência “quadrada” , muito tradicional, todas as

colunas são retas, as fotos dispostas em diagramas quadriláteros perfeitos. Aliás, a reportagem

não tem mais que texto verbal e fotos, coisa que não acontece na reportagem 4, já que traz um

gráfico representando uma linha do tempo, fotos invadindo o verbal, influenciando na curvatura

das colunas de texto verbal e trazendo um sentido muito mais carregado para o texto no geral. O

box, segundo o leitor,continua fazendo parte da revista mais recente, porém ganha uma outra

disposição, à parte do texto verbal. Atualmente há gráficos informativos, também à parte do

verbal, trazendo informações resumidas das religiões a respeito da eutanásia.

Quanto ao primeiro par de textos, as mudanças também são claras. Segundo o leitor, a

reportagem “do catalisador tem o que ele chama de infográfico” , a “Metamorfose gasosa” ,

gráfico explicando resumidamente o funcionamento dos catalisadores, as trocas gasosas,

enquanto que em “Forno” há uma simples foto frontal de um microondas. Apesar dos atrativos da

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reportagem 2, o leitor gostou mais da reportagem 1, pois o microondas faz mais parte de sua vida

que os catalisadores dos carros.

Apesar de ter dito que as mudanças entre as reportagens serem claras, atenta para o fato de

que um leitor assíduo vai assimilando essas mudanças um pouco passivamente. Muitas vezes elas

só são percebidas pelo leitor quando há comparação entre um exemplar antigo e um novo, uma

situação como a entrevista.

Perguntei a esse leitor se ele prefere a diagramação antiga ou a mais nova e ele me

respondeu que gosta mais da nova, principalmente porque quando não tem tempo para ler uma

reportagem inteira, acessa as informações à parte como quadros, legendas, fotos, e consegue

extrair as informações mais relevantes do texto. Também porque acredita que, mesmo com todos

esses novos recursos, em geral, o texto verbal não perdeu em qualidade. Ele ainda fez uma

consideração sobre as outras reportagens da revista Superinteressante, já que é seu leitor há muito

tempo. Muitas outras reportagens atuais, que não as selecionadas para a pesquisa, apresentam

“excesso de recursos visuais” , poluindo o verbal e dificultando a leitura. “Tem tanta informação

gráfica e tanta informação visual, tanto informação de texto, que você não sabe por onde

começar” . O que ele percebe é que a revista mais antiga privilegia o texto e não o visual. Esse

fato, segundo o leitor, deve-se ao avanço da tecnologia ou à mudança na concepção de texto.

Respondendo à última questão, o leitor diz que concorda mais com a corrente teórica que

diz que a imprensa mudou, até mesmo porque esta foi obrigada, para permanecer no mercado, a

se adaptar às novas tecnologias e também ao aumento da quantidade de informações do mundo

ocidental moderno.

Perguntei a ele se o azul do texto 4 significou alguma coisa. A resposta foi de que teve um

efeito tranqüilizante, preparando-o para a leitura de um tema polêmico. Imaginou que o plano de

fundo não poderia ser, por exemplo, vermelho, pois a reportagem ia ficar muito mais pesada.

- Avaliação feita pelo leitor 9:

Para a entrevistada, o primeiro par de textos foi interessante, mas não gostou do tecnicismo

de que foi composto. Entre os texto 1 e 2, a leitora gostou mais do texto 2, talvez por se tratar de

um assunto inteiramente novo. Quanto ao segundo par de reportagens, a leitora preferiu a

reportagem 4, por motivo de gosto, porque trata de questões de ordem ética, social, moral, o que

faz o leitor refletir sobre a eutanásia. Além disso, gostou de ler sobre um assunto que não é muito

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discutido no Brasil. Mas um motivo especial atraiu a leitora ao texto: já havia pensado sobre a

eutanásia, pois já se deparou com o problema.

A entrevistada respondeu que percebeu, em relação ao primeiro par de textos, que o texto 2

é mais ilustrativo e mais claro. Contudo, o texto 1 é mais completo, com mais detalhes técnicos.

Quanto ao segundo par, ela considerou que o texto 3 é mais detalhado também, enquanto que o 4

poderia ter sido mais explorado, poderia ter tido mais informações. Para a leitora, essa discussão

sem profundidade talvez seja resultado do fato de que hoje em dia não é mais interessante para as

revistas publicarem mais textos tão completos e detalhados.

As diferenças apontadas entre as reportagens antigas e as novas vão desde a quantidade

maior de cores apresentadas no texto 2, passando, no texto 4, pelo forte e agradável azul do plano

de fundo até a quantidade menor de palavras do “olho” que faz com que o leitor leia mais

rapidamente. A quebra das colunas de texto verbal na reportagem 4 causou a ilusão de que o

número de frases e linhas diminuiu, dando a sensação de uma leitura mais rápida. Ao contrário

disso, nas reportagens 1 e 3 não há plano de fundo, os subtítulos têm palavras demais e dividem

uma seção da outra. Em síntese, a leitora resumiu que, quanto ao visual, as reportagens da revista

antiga são feias e as da nova, muito bonitas.

Quando lhe fiz a última questão, a leitora concordou que houve mudança, principalmente

de layout e diagramação nas reportagens que leu. Ela gostou desse tipo de mudança, justificando

que as reportagens ficaram mais bonitas e a leitura, mais agradável. No entanto, a revista perdeu

em conteúdo, ficando mais superficial, tanto que antes havia muitos artigos escritos por

cientistas, além de maior quantidade de livros recomendados para um aprofundamento de um

assunto discutido por uma reportagem.

- Avaliação feita pelo leitor 10:

O último entrevistado observou que as reportagens do primeiro par são muito didáticas,

mas sem aprofundamento do assunto. No texto 2 sentiu que as fotos o ajudaram bastante na

compreensão do conteúdo, enquanto que a foto do microondas do texto 1 não ajudou muito. As

reportagens do segundo par apresentaram, para o leitor, muito mais informações e, no que se

refere ao visual, houve “muito mais diagramas e fotos e explicações mais detalhadas” .

Quando perguntei qual das reportagens do primeiro par ele gostou mais, o leitor respondeu

que foi a reportagem 1, principalmente porque gostou das imagens e de como foram construídos

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os seus detalhes. O gráfico “Metamorfose gasosa” mostra o que não pode ser visto

corriqueiramente (o interior do catalisador e a transformação dos gases) e isso é muito facilitador

para a compreensão da informação. Ao contrário, no texto 2, recursos como este faltaram para

auxiliar na explicação do funcionamento do microondas..

O leitor não soube decidir qual reportagem do segundo par gostou mais e argumentou que

são reportagens de tipo muito diferentes - uma enfatizando os aspectos técnicos das antenas e a

outra discutindo um tema polêmico. Mas fez um comentário sobre a reportagem 4: concluiu, em

princípio, que é um texto imparcial, porque mostra os dois pontos de vista sobre a eutanásia sem

ser tendencioso.

No que se refere à linguagem visual, uma das mudanças apontadas foi a utilização, nas

reportagens mais antigas, de fotografias, e, nas reportagens mais recentes, de imagens feitas no

computador. Além disso, disse que a legenda da foto do microondas não estabelece uma relação

clara com a reportagem, não dando pistas sobre o assunto tratado no texto, o que pode deixar de

despertar curiosidade no leitor, afastando-o. Por outro lado, essa falta de pistas, causada pela

desvinculação da legenda em relação ao texto, pode justamente intrigar o leitor o suficiente para

fazê-lo tentar descobrir o que diz realmente o texto. Outras mudanças apontadas pelo entrevistado

são: o fundo branco do texto 3 em contraste com o plano de fundo azul que talvez possa

transmitir calma do texto 4; as imagens e cenário mais bem trabalhados, ou seja, feitos

especialmente para a reportagem 4 em oposição às simples fotografias utilizadas na 1; gráficos de

linha do tempo, ou esquemas, nas reportagens mais atuais, que resumem uma informação dada

pelo verbal ou o complementam; colunas retas nos textos antigos em contraste com as colunas

que se adaptam às imagens nos textos atuais.

O leitor, respondendo à última questão, disse que do ponto de vista lingüístico não

percebeu grandes mudanças na imprensa, mas que na linguagem visual elas foram visíveis e

mudaram para melhor.

4.1) APRESENTAÇÃO GRÁFICA DOS DADOS DAS ENTREVISTAS

Apresentarei nos quadros abaixo as principais conclusões apontadas pelos dez sujeitos de

pesquisa sobre os pares de textos publicados na revista Superinteressante nos anos de 1988 e

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2001. O quadro 2 diz respeito à preferência dos textos, enquanto que o quadro 3 apresenta os

principais motivos para a escolha dos textos preferidos. O quadro 4 expõe os principais motivos

pelos quais os leitores não gostaram dos textos e, finalmente, o quadro 5 corresponde às

mudanças visuais detectadas pelos leitores.

Quadro 2

TEXTOS PREFERIDOS

“Forno” “Como funcionam os

catalisadores dos automóveis”

“De antenas

ligadas”

“O direito de morrer”

leitores 3 7 - 9

Quadro 3

PRINCIPAIS MOTIVOS PARA TEREM GOSTADO DOS TEXTOS

“Forno” “Como funcionam os

catalisadores dos

automóveis”

“De antenas ligadas” “O direito de morrer”

Microondas faz

parte da vida

(4 leitores)

Gráfico explicativo

- Infográfico

(7 leitores)

Interesse pelo assunto

(1 leitor)

Diagramação mais bonita e/ou

equilibrada

(6 leitores)

Melhor

entendimento

(1 leitor)

Diagramação mais

dinâmica

(1 leitor)

Plano de fundo azul

(4 leitores)

Interesse pelo

assunto

(1 leitor)

Tema familiar

(1 leitor)

Assunto polêmico

(4 leitores)

texto mais completo

(1 leitor)

Maior ilustração

(2 leitores)

Quantidade maior de imagens

(3 leitores)

Assunto novo

(1 leitor)

Gráfico de linha do tempo

(2 leitores)

Mais cores Identificação com o assunto

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(1 leitor) (vivência pessoal)

(2 leitores)

Gosta de legendas,

gráficos, figuras

(1 leitor)

Mãos e braços de médico e

paciente

(2 leitores)

Tratamento de questões éticas,

morais, sociais, religiosas.

(2 leitores)

Assunto pouco discutido no

Brasil

(2 leitores)

Texto argumentativo

(2 leitores)

Imagens perpassando o texto

(2 leitores)

Gráfico como resumo do

verbal

(1 leitor)

Leitura rápida e prazerosa

(1 leitor)

Informações novas

(1 leitor)

Quadro 4

PRINCIPAIS MOTIVOS PARA NÃO TEREM GOSTADO DOS TEXTOS

“Forno” “Como funcionam os

catalisadores dos

automóveis”

“De antenas ligadas” “O direito de morrer”

Foto não ajuda na

compreensão

Texto menos completo

(1 leitor)

Texto muito técnico

(7 leitores)

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(6 leitores)

Menos cores

(1 leitor)

Não entende de carros

(1 leitor)

Diagramação “quadrada”

(5 leitores)

Informações

técnicas

(1 leitor)

Imagens atrapalham a

leitura

(1 leitor)

Diagramação

“quadrada”

(1 leitor)

Assunto não interessa

(1 leitor)

Apenas texto verbal e fotos

(1 leitor)

Colunas do texto verbal

retas

(2 leitores)

Fotos dispostas em

quadriláteros

(1 leitor)

O não privilégio de

imagens dá um efeito de

excesso de letras

(1 leitor)

Quadro 5

MUDANÇAS ENTRE REPORTAGENS DE 1988 E 2001 APONTADAS PELOS LEITORES

REPORTAGENS DE 1988 REPORTAGENS DE 2001

Visual e verbal não dialogam

(5 leitores)

Diálogo entre visual e verbal

(2 leitores)

Ausência de plano de fundo/ presença de fundo

branco

(4 leitores)

Presença de plano de fundo

(4 leitores)

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Utilização basicamente de fotos

(5 leitores)

Imagens feitas em computador

(3 leitores)

Menos cores

(1 leitor)

Mais cores

(4 leitores)

Colunas lineares

(3 leitores)

Colunas se adaptam às imagens

(3 leitores)

Imagens “quadradas”

(2 leitores)

Letras menos agradáveis

(2 leitores)

Letras mais agradáveis

(3 leitores)

O texto não corre entre as imagens

(1 leitor)

Texto se adapta às imagens

(2 leitores)

Diagramação tradicional

(2 leitores)

Diagramação dinâmica

(3 leitores)

Verbal dominante

(1 leitor)

Visual dominante

(1 leitor)

Baixa qualidade das imagens

(1 leitor)

Alta qualidade das imagens

(1 leitor)

Reportagens não atrativas

(2 leitores)

Reportagens atrativas

(2 leitores)

Letras uniformes e de mesmo tipo

(1 leitor)

Letras não uniformes e de tipos variados

(1 leitor)

Subtítulos com palavras em excesso, separando

seções, respeitando a largura das colunas

(2 leitores)

Olho com menos palavras

(2 leitores)

Maior número de recursos visuais (imagens,

gráficos, esquemas, boxes)

(8 leitores)

Imagens e cenários feitos especialmente para a

reportagem

(1 leitor)

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5. A AQUISIÇÃO DO CONHECIMENTO EM TEXTOS MULTIMODAIS

De acordo com os resultados obtidos nas entrevistas e sintetizados nos quadros acima,

percebi uma tendência dos leitores em considerar a linguagem visual predominante nas

reportagens da revista Superinteressante assim como os estudos de Kress (1998, 2001)

consideraram na imprensa européia. Alguns leitores ressaltaram que as reportagens de 2001 são,

de modo geral, de conteúdo mais simplificado e, portanto, contém menos informações ou

discussões mais superficiais. A nona leitora entrevistada disse que a revista melhorou em

diagramação, mas piorou em conteúdo, tanto que havia na revista antiga muitos artigos escritos

por cientistas e maior quantidade de livros recomendados ao fim de algumas reportagens,

enquanto que na recente os textos de cientistas são quase inexistentes – senão totalmente – e a

quantidade de livros recomendados para um aprofundamento do assunto de uma determinada

reportagem diminuiu consideravelmente. Talvez essa observação seja resultado de uma maior

ênfase na linguagem visual das reportagens recentes ao contrário da ênfase na linguagem verbal

das antigas. Em geral, os leitores entrevistados não deixaram de gostar das matérias recentes.

Para outros leitores, ainda, a linguagem verbal das reportagens de 2001 foi considerada mais

atrativa, devido à maior clareza na articulação das informações.

No que diz respeito ao visual, com exceção de apenas uma leitora, os leitores disseram que

a mudança do visual entre as reportagens de 1988 e as de 2001 é claramente perceptível,

principalmente porque, apesar de todas as reportagens comportarem imagens e texto verbal, o

modo com que esses dois elementos são dispostos é muito diferente. Dessa forma, a maioria dos

entrevistados disse que nas reportagens novas há diálogo entre o verbal e o visual, coisa que não

havia nas de 1988. Além disso, os recursos gráficos que hoje são explorados na imprensa são

bem mais amplos e variados que antigamente, fato explicado por alguns leitores com base no

desenvolvimento tecnológico, principalmente computacional. A falta de diálogo entre o visual e o

verbal tem implicações várias e influencia na leitura. Os leitores disseram que um dos principais

motivos pelos quais não gostaram dos textos de 1988 é sua diagramação “quadrada” , resultado da

não integração de recursos verbais e visuais. Ao analisar o segundo par de textos, dos 10 leitores

entrevistados, 90% deram sua preferência à reportagem “O direito de morrer” , apontando como

motivo dessa preferência a aparência do texto considerada muito bonita e atrativa. Entre o

primeiro par, 70% dos leitores preferiram o texto “Como funcionam os catalisadores dos

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automóveis” , principalmente pelo infográfico que lhes auxiliou na compreensão das informações

e 30% gostaram mais de “Forno” , sendo que a preferência foi justificada pelo fato do assunto ter

lhes sido mais familiar. As colocações feitas pelos leitores parecem indicar que a leitura da

linguagem visual está também presente nas suas práticas de letramento.

De forma geral, todos os leitores, universitários da Universidade Estadual de Campinas,

não tiveram dificuldades na leitura das reportagens, apesar de uma grande parcela deles terem

dito que principalmente o texto “De antenas ligadas” foi o texto com maior informação técnica e,

conseqüentemente, de leitura mais trabalhosa e lenta. Quanto ao texto 1, muitos leitores se

queixaram que a compreensão das informações não foi tão fácil quanto à do funcionamento do

catalisador, dada a falta de um infográfico capaz de resumir visualmente as explicações verbais

de “Forno” .

Foram muitos os pontos em comum apontados pelas entrevistas dos leitores. No entanto,

devido às diversas táticas de leitura adotadas pelos indivíduos, houve também particularidades.

Isso implica que os efeitos de sentido obtido pelas linguagens não serão necessariamente os

mesmos: um leitor pode ser mais sensível à linguagem visual que outro e buscar nela dados que

lhe permitam concluir, por exemplo, que uma reportagem é tendenciosa. Este exemplo é, aliás,

verdadeiro e foi dado pela primeira leitora que entrevistei. Para ela, “O direito de morrer”

apresenta mais elementos argumentativos e verbais favoráveis à eutanásia do que desfavoráveis e,

além disso, coloca um plano de fundo azul, cor que causa uma sensação de paz ou calma

apropriada para a discussão de um assunto tão complicado como a eutanásia. Essa maior

quantidade de argumentos a favor da eutanásia e a cor de fundo azul, segundo a leitora,

condicionam o leitor a uma maior aceitação da eutanásia. Aliás, o plano de fundo azul, o modelo

maquiado de doente, as imagens dos braços que simbolizam a relação médico-paciente, enfim,

toda a linguagem visual utilizada nessa reportagem é em si um argumento pró eutanásia. A partir

das conclusões e explicações dessa leitora pude perceber que ela, mesmo não sabendo justificar

com base teórica sua posição, teve uma leitura crítica da reportagem, sendo muito sensível à

linguagem visual desta.

A segunda entrevistada disse que quando leu a reportagem sobre a eutanásia não lhe

ocorreu qualquer reflexão sobre a cor azul do plano de fundo. Já quando lhe fiz a pergunta sobre

se o azul significou alguma coisa em sua leitura, parou para pensar e concluiu que a cor remetia a

céu, à morte, à esperança, elementos que se relacionavam com o “ tom natural” da leitura da

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reportagem, mesmo esta abordando um assunto tão delicado. Disse ainda que se o azul fosse

substituído por vermelho e mantida a mesma manchete “O direito de morrer” , por exemplo, só de

olhar superficialmente a reportagem, a leitora iria pensar que o assunto seria “chacina” . É

interessante notar que, apesar de a leitora não ter percebido conscientemente as conotações do

plano de fundo azul, notou os seus efeitos e sentiu que a discussão de um assunto delicado como

o da eutanásia ganhou um “ tom leve” . A avaliação desses leitores reforça as colocações de

Calazans (1992), segundo as quais cada cor causa um tipo de reação nos consumidores (leitores,

no neste caso). O azul, por exemplo, tem efeito calmante, ao contrário do vermelho que tem o

efeito oposto. O desencadeamento de emoções pelas cores, segundo Calazans (op. cit.), é

subliminar, ou seja, “é qualquer estímulo abaixo do limiar da consciência, estímulo que – não

obstante – produz efeitos na atividade psíquica” 8. Penso que as considerações apresentadas

podem se relacionar às experiências dos entrevistados, mas o caráter subliminar não é dissociado

das influências culturais. Defendo esse ponto de vista justificando que a cor vermelha para a

nossa cultura é realmente símbolo de uma emoção mais forte, mas tenho dúvidas de que, como

afirma Calazans (1992), uma cor intensa como o vermelho cause aumento da circulação

sangüínea e da força muscular em indivíduos de uma cultura em que essa cor não tenha a mesma

simbologia que a nossa. É claro que somente a calma oriunda da cor azul no texto 4 não é

argumento suficiente para que essas duas leitoras acreditassem que a reportagem condiciona o

leitor a ser favorável à eutanásia, se não tivessem levado em conta todo o conjunto e contexto

dessa reportagem. Em outras palavras, os efeitos do azul do plano de fundo, se for uma

informação subliminar9, só faz sentido se aliado a outros recursos da reportagem, a começar pela

palavra “direito” da manchete. Essa intricada relação dá indícios da complexidade inerente à

comunicação multimodal.

Esse é somente um exemplo de que as leituras de um mesmo texto são várias e levam em

consideração tanto a linguagem verbal como a visual. Sendo assim, considero de suprema

importância para o ensino e aprendizagem de leituras críticas e não somente decodificadoras, que

sejam conhecidos por parte do aluno e dos professores os possíveis caminhos dos efeitos de

sentido gerados pela integração de linguagens que envolve entre outras competências, o domínio

8 CALAZANS, F., Propaganda subliminar multimídia, São Paulo: Summus, 1992, p. 26 9 Uma outra definição apresentada na obra de Calazans é de Jung que “compara a consciência a um holofote que pode ser dirigido e focalizado em uma área de interesse, deixando na sombra subliminar todo o mundo de

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do letramento visual. Isso significa que os diferentes potenciais para a significação podem

implicar uma questão central para o ensino da leitura crítica.

Na linha de desenvolvimento do letramento defendida por Kleiman e Moraes (1999),

considero importante oferecer subsídios sobre a linguagem visual a professores que adotam

textos de mídia na sala de aula, visto que a leitura multimodal é fundamental para tais textos. É

importante que as práticas de ensino despertem no aluno uma maior sensibilidade ao visual, mas

nem por isso deixem de lado os outros campos da linguagem –tratando-os como um só – sem

impor uma leitura padrão como correta e outras não padrão como erradas ou marginais. A

questão central é ressaltar algumas convenções sociais que subjazem ao processo de produção

textual.

É interessante notar que o décimo leitor entrevistado julgou, ao contrário do que as duas

leitoras das quais falamos acima disseram, o texto 4 imparcial. É claro que, como o próprio leitor

afirmou, para uma conclusão final, seria indispensável um estudo mais aprofundado sobre a

reportagem em questão. Esse leitor explica que essa imparcialidade do texto se justifica pelo fato

de o repórter ter sempre apresentado argumentos tanto da posição favorável à eutanásia quanto à

desfavorável, dando à reportagem um caráter não tendencioso. É claro que esse leitor foi bem

mais sensível à informação verbal do texto em questão, até porque sua área de formação é a

Lingüística.

Diante dessas duas leituras possíveis da reportagem “O direito de morrer” , temos que a

primeira leva em consideração a linguagem visual e a segunda não. A questão não é afirmar que

uma leitura é correta e a outra não, mas que o visual interfere muito nas conclusões as quais

chegaram esses três leitores. Segundo Kress e van Leewen (1996), o entendimento de cada texto

depende do entendimento dos meios semióticos que são usados para costurar os elementos

heterogêneos a fim de formar um todo coerente, um texto visual. Portanto, as estruturas visuais

compreendem significados assim como as estruturas lingüísticas. Os dados obtidos na pesquisa

indicam que tais colocações teóricas são intuitivamente percebidas por alguns leitores.

informações não focadas. Contudo, os pensamentos e idéias não iluminados, esquecidos, não deixam de existir” . Idem, p. 26

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