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A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal Tribuna da Imprensa (1956-1960) Cristiano Aguiar Lopes 1 Resumo Neste artigo, denominamos “antimudancismo” o movimento político contrário à transferência da capital para Brasília. O antimudancismo, que esteve em evidência na segunda metade dos anos 50 e no início dos anos 60, contou com o apoio de alguns dos principais jornais brasileiros da época. Analisamos matérias do jornal carioca Tribuna da Imprensa sobre a construção de Brasília publicados de 1956 a 1960. O estudo confirma que o antimudancismo da Tribuna da Imprensa foi, muito além de um simples movimento político contrário à mudança da capital, uma bandeira de oposição a JK na tentativa de desestabilizar o governo. Palavras-chave: história da imprensa, Brasília, Tribuna da Imprensa, antimudancismo, mídia e política. Prólogo Lacerda adentrou a redação da Tribuna com o ímpeto de sempre. Mas dessa vez não seguiu para seu escritório, como era de costume. Estacionou na primeira máquina de escrever que encontrou – uma velha Underwood da redação. Era uma tarde muito, muito quente. Porém não mais quente do que todas as outras daquele dezembro de 58. Como que possuído pelo sobrenatural, Lacerda desatou a agredir a máquina com seus velozes dedos... TAC... TAC... TAC... Por toda a redação ouvia-se aquele martelar. Os mais velhos da Tribuna sabiam muito bem o que aquilo significava. Os mais novos pareciam surpresos. E todos se uniam em um pesado silêncio. Apenas o TAC... TAC... TAC..., que ecoava Lavradio afora, centro afora, Rio afora, Brasil afora. Mais alguns TACs e pronto: ali estava o mais cruel ataque à construção de Brasília que a imprensa jamais ousaria publicar... 1 Jornalista, Mestre em Comunicação pela Universidade de Brasília, consultor legislativo da Câmara dos Deputados para as áreas de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. E-mail: [email protected]

A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

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A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal Tribuna da Imprensa (1956-1960)

Cristiano Aguiar Lopes1

Resumo

Neste artigo, denominamos “antimudancismo” o movimento político contrário à transferência da capital para Brasília. O antimudancismo, que esteve em evidência na segunda metade dos anos 50 e no início dos anos 60, contou com o apoio de alguns dos principais jornais brasileiros da época. Analisamos matérias do jornal carioca Tribuna da Imprensa sobre a construção de Brasília publicados de 1956 a 1960. O estudo confirma que o antimudancismo da Tribuna da Imprensa foi, muito além de um simples movimento político contrário à mudança da capital, uma bandeira de oposição a JK na tentativa de desestabilizar o governo. Palavras-chave: história da imprensa, Brasília, Tribuna da Imprensa, antimudancismo, mídia e política.

Prólogo

Lacerda adentrou a redação da Tribuna com o ímpeto de sempre. Mas dessa vez não

seguiu para seu escritório, como era de costume. Estacionou na primeira máquina de escrever

que encontrou – uma velha Underwood da redação. Era uma tarde muito, muito quente.

Porém não mais quente do que todas as outras daquele dezembro de 58. Como que possuído

pelo sobrenatural, Lacerda desatou a agredir a máquina com seus velozes dedos... TAC...

TAC... TAC... Por toda a redação ouvia-se aquele martelar. Os mais velhos da Tribuna

sabiam muito bem o que aquilo significava. Os mais novos pareciam surpresos. E todos se

uniam em um pesado silêncio. Apenas o TAC... TAC... TAC..., que ecoava Lavradio afora,

centro afora, Rio afora, Brasil afora. Mais alguns TACs e pronto: ali estava o mais cruel

ataque à construção de Brasília que a imprensa jamais ousaria publicar...

1 Jornalista, Mestre em Comunicação pela Universidade de Brasília, consultor legislativo da Câmara dos

Deputados para as áreas de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. E-mail:

[email protected]

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“(...) O resultado é uma espécie de pot pourri de dirigismo estatal e de voracidade privatista, que se contemplam numa obra nefasta. A iniciativa privada autêntica é perseguida ou, quando menos, menosprezada. A iniciativa privada que se estimula é precisamente a que não convém: são os grupos privilegiados que se criam e prosperam à sombra de favores cambiais, com endereço certo, são os sócios políticos do Sr. Juscelino Kubitschek de Oliveira – os que ele trouxe de Belo Horizonte e os que adicionou à farândola do triunfo que o Exército garantiu à corrupção. O estatismo que se expande é o do crédito, que se tranca à iniciativa privada e se derrama sobre as despesas governamentais, como a loucura de Brasília e as despesas justas, se isoladamente consideráveis, mas desatinadas, se analisadas dentro do quadro financeiro do país, das obras monumentais que prosseguem arrancando a carne do particular, do cidadão, do contribuinte em suma.”2

Introdução

Brasília estava longe de ser uma unanimidade. Exatamente o oposto, havia muito mais

detratores do que defensores. A grande imprensa era majoritariamente contrária à construção

da nova capital. Do lado dos antimudancistas – membros do movimento político contrário à

transferência da capital do Rio de Janeiro para Brasília - nomes de peso e em grande

quantidade. Como Gustavo Corção (1896-1978), até hoje o maior intelectual da direita

católica brasileira. Como Assis Chateubriand (1892-1968), criador do maior conglomerado de

comunicações já visto do lado de cá do Equador3. Como Samuel Wainer (1910-1980), que

abriu grande espaço em seu jornal A Última Hora para a causa antimudancista.

Mas ninguém foi mais antimudancista, nem mais inimigo do governo de Juscelino

Kubitschek (1902-1976), que Carlos Lacerda (1914-1977). A Tribuna da Imprensa, jornal

personalíssimo que era conhecido como “o jornal do Carlos Lacerda” (BACIU, 1982) durante

o período da “velha tribuna”4, foi o mais ferrenho crítico da transferência da capital para o

2 LACERDA, Carlos. Otimismo: o Nosso e o da Camorra. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 dez. 1958, p.

4 (grifos nossos) 3 Chatô, contudo, se transformou em um mudancista tardio, ao enxergar na nova capital a oportunidade para dois

novos negócios – a TV Brasília e o jornal Correio Braziliense. 4 O período da “velha Tribuna” vai da sua fundação por Carlos Lacerda, em 27 de dezembro de 1949, até sua

venda, em outubro de 1961, quando passou a ser controlada pelo grupo Jornal do Brasil. Trata-se do período

“Lacerdista”, já que após a venda da Tribuna, houve um processo de “deslacerdização” do jornal (BACIU, 1982,

p. 77).

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Planalto Central. Não por acaso, durante muito tempo os desagradáveis redemoinhos que

levantavam poeira, destelhavam casas e incomodavam os primeiros pioneiros de Brasília

foram chamados de “lacerdinhas”.

Artigos, reportagens, charges e editoriais que não poupavam críticas à construção de

Brasília começaram a ser publicados ainda em 1955, quando poucos acreditavam que tal

“desatino” realmente iria se concretizar. Em 1956, quando efetivamente se iniciam os

preparativos para a construção da cidade, os artigos contrários à transferência da capital

passam a ser mais freqüentes e contundentes.

Esse aumento quantitativo e qualitativo nas críticas da Tribuna da Imprensa a Brasília

continua a ocorrer nos anos seguintes, até que em 1960 se transforma em matérias diárias,

muitas com direito a grande destaque na capa do jornal. Letras garrafais e amplas fotos

mostravam as condições precárias da “Brasília às vésperas da mudança”, em uma série de

reportagens realizada antes da inauguração. Depois de 21 de abril, as críticas eram as mesmas,

mas com novos enfoques, com manchetes como “Casacas no barro”5 ou “Ministros também

estão de volta: Brasília não tem mesmo condições”6.

5 Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 abr. 1960, p. 1 6 Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 e 24 abr. 1960, p. 1

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Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 17 fev. 1960, p. 1

Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23/24 abr. 1960, p. 1

Breve histórico da “velha Tribuna”

A história da Tribuna da Imprensa começa antes da sua fundação e em outro jornal, o

Correio da Manhã. Em 1946, Carlos Lacerda, já jornalista aclamado, filiado à União

Democrática Nacional (UDN) e antigetulista de primeira hora, cria no Correio a coluna

“Tribuna da Imprensa”, na qual analisava o processo constituinte que culminaria na

promulgação da Constituição Federal em setembro daquele mesmo ano.

Em 1949, após ser demitido do Correio da Manhã, Lacerda inicia uma campanha de

arrecadação de fundos para abrir um novo jornal, que seria organizado na forma de Sociedade

Anônima. 34 mil acionistas depois – além da valiosa ajuda de um empréstimo tomado no

Banco de Crédito Real sem qualquer garantia material -, Lacerda comprava o prédio na Rua

do Lavradio, 98, e lá instalava uma velha rotativa adquirida da empresa Listas Telefônicas

(RIBEIRO, 2007). Um acordo com os proprietários do Correio da Manhã o autorizou a

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utilizar o nome da sua influente coluna: nascia assim, em 27 de dezembro de 1949, o

vespertino Tribuna da Imprensa.

Apesar de nunca ter sido um jornal de grande circulação – no seu ápice, em 1955,

tinha uma tiragem de 40 mil exemplares, enquanto vespertinos como Diário da Noite e O

Globo publicavam 90 mil e 110 mil exemplares, respectivamente (RIBEIRO, 2007) – a

Tribuna da Imprensa era bastante influente. O tamanho do seu prestígio só podia ser igualado

pelo volume de suas dívidas, que iriam atormentar os administradores do periódico até o fim

dos seus dias.

Trata-se de uma publicação sui generis, que não apenas nasceu e cresceu em um

período de profunda transformação do jornalismo brasileiro, como esteve na vanguarda de

uma rápida e intensa profissionalização da imprensa. A Tribuna da Imprensa foi, por

exemplo, pioneira na implementação de normas precisas de escrita, por meio de manuais de

redação. (BARBOSA, 2007). Foi na Tribuna que o modelo dos cinco que (o quê, quem,

quando, onde e por que), bem como o lead, foram inicialmente utilizados no Brasil, em um

processo de transição que se distanciava do modelo literário e panfletário dominante até

então, para se filiar ao modelo americano, no qual a isenção era o padrão-ouro.

Mas a personalidade forte e dominante de Carlos Lacerda à frente da Tribuna, e a clara

motivação política que o levou a fundar o jornal, mantinham um rígido controle editorial,

tornando a Tribuna “um jornal para o Lacerda”. Tanto é verdade que o manual de redação da

Tribuna da Imprensa, símbolo maior da sua modernização, foi inteiramente redigido pelo

próprio Carlos Lacerda. Tinha-se como resultado uma publicação que hesitava entre a

observação imparcial e o mais explícito espírito panfletário. Não era um simples manual de

redação que iria impedir o “jornal que pensa o que diz porque diz o que pensa” de se

posicionar firmemente em relação a determinados temas, deixando em último plano qualquer

pretensão de isenção.

E quando o assunto era oposição, qualquer sombra de isenção era posta rua afora. Se

era para a Tribuna ser antigetulista, que o fosse com toda a gana. Se a oposição era ao

Movimento Militar Constitucionalista, ou ao “golpista preventivo” Marechal Lott, que fosse

plena. E se o objetivo era desestabilizar Juscelino Kubitschek, não importavam os métodos,

apenas os resultados. Apesar do famoso embate entre Carlos Lacerda e Getúlio Vargas, que

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resultou em um atentado contra o primeiro e, talvez, no suicídio do segundo, foi contra JK

que Lacerda teve a chance de exercer seu mais livre e ferino jornalismo de oposição. Por

sincera oposição ideológica. Por clara disputa política de posições. Por ser dono do próprio

jornal. Mas, principalmente, por estar publicando em um breve hiato de grande liberdade de

expressão, espremido entre o fim do longo controle da imprensa da Era getulista e o golpe

militar de 1964. Junte-se tudo isso, e temos trechos como este:

“Houvera uma crise ministerial e êle [Mário Meneguetti, ministro da Agricultura de JK entre outubro de 1956 e abril de 1960] estava por perto. Bota-se êsse, disseram ao Leviano [JK]. E como seria uma leviandade nomeá-lo, nomearam, que o ciclo a ser cumprido é o da leviandade extrema, cinqüenta anos em cinco de leviandades cósmicas”.7

Esse caldeirão de motivações pessoais,

estratégias políticas, oposição ideológica e grande

liberdade de expressão moldaram sobremaneira a

cobertura do governo JK – cobertura essa que muitas

vezes descambava para o completo desrespeito. Afinal,

não é todo dia que vemos um presidente da República

retratado como um rato em uma charge.

ABRAMO, Hilde Weber. Juscelino Candango. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 e 24 abr. 1960, p. 3

Para a Tribuna da Imprensa, Juscelino sequer era um presidente democraticamente

eleito. “Assim como um dos seus antecessores fazia datar o Brasil da sua chegada ao Poder”

diz Lacerda, “o Sr. Kubitschek faz datar a confiança no Brasil da sua ascensão, pelas armas e

pela fraude, à presidência da República”8. Oposição desse tipo, dirigida diretamente a JK e às

suas obras – em especial Brasília – estamparia as páginas da Tribuna por todo o seu governo e

mesmo depois. Apenas em outubro de 1961 quando, premido por dívidas impagáveis, Carlos

7 FILHO, João Duarte. NOVACAP Particular. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 nov. 1958, p. 3 8 LACERDA, Carlos. Otimismo: o Nosso e o da Camorra. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 dez. 1958, p.

4

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Lacerda vende a Tribuna da Imprensa, inicia-se uma guinada definitiva rumo à modernização

do jornal. Mas a nova Tribuna, sem a verve de Lacerda, perde boa parte da sua aura, e segue

sua derrocada, até morrer nos braços de Helio Fernandes que, heroicamente, conseguiu

manter a Tribuna viva até 2008.

Metodologia

O estudo foi conduzida exclusivamente por meio de pesquisa bilbiográfica. A

principal atividade foi a coleta de artigos da Tribuna da Imprensa publicados no período

delimitado entre a promulgação da Lei nº 2.874, de 19 de setembro de 1956, que autorizou o

início das obras de construção de Brasília, e 31 de dezembro de 1960.

A coleta foi realizada em três fases. Na primeira, foi feita uma varredura em

microfilmes de todas as edições da Tribuna da Imprensa publicadas no período pesquisado.

Frente ao grande volume de informações, optamos por utilizar, como guia, uma lista de

artigos sobre a construção de Brasília elaborada por Michelle dos Santos, em sua dissertação

“A construção de Brasília nas tramas de imagens e memórias pela imprensa escrita (1956-

1960)”, defendida no Departamento de História da Universidade de Brasília em setembro de

2008. Tal lista, gerada a partir da coleção de recortes de jornais do Fundo Novacap do

Arquivo Público do Distrito Federal, facilitou sobremaneira a localização dos artigos na

Tribuna da Imprensa. Mas não nos limitamos aos artigos analisados pela autora, e por isso

nosso corpo documental é maior do que o que consta na sua dissertação. Contudo, ainda que

mais ampla, nossa lista também não é composta pela totalidade dos artigos sobre a construção

de Brasília publicados pela Tribuna no período estudado. Trata-se tão somente de uma

amostra composta por matérias que julgamos mais representativas do Cenário de

Representação da Política (CR-P) daquela época. Voltaremos ao conceito de CR-P em breve.

A segunda fase foi a de digitalização dos artigos selecionados. Optamos por digitalizar

não apenas os artigos a serem analisados, mas a imagem em fac-símile da página inteira na

qual eles foram publicados. Assim, é possível vislumbrar com maior clareza diversos

elementos de edição essenciais ao pleno entendimento do grau de importância conferido aos

temas abordados nos textos.

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A terceira fase foi a de transcrição dos textos selecionados. Optamos por realizar essa

transcrição por dois motivos primordiais: a facilidade para a posterior citação de trechos; e a

possibilidade de compartilhamento desses textos via Internet, permitindo inclusive a sua

busca por palavras-chave, bem como a sua indexação por mecanismos de busca na rede. Sem

a transcrição, tanto o compartilhamento quanto a indexação seriam impossíveis, uma vez que

o processo de digitalização guarda somente a imagem em fac-símile, sem o reconhecimento

automático de caracteres. Como o processo de escaneamento dos microfilmes não foi capaz

de gerar imagens em alta resolução, todo o processo de transcrição foi feito manualmente, já

que a utilização de OCR9 geraria textos repletos de falhas e, assim, pouco confiáveis.

Eventuais erros de transcrição são, portanto, de responsabilidade exclusiva do autor.

Ao fim e ao cabo, chegamos a um total de duas charges e 64 textos selecionados,

digitalizados e transcritos10, assim divididos:

- 1956: 3 textos

- 1957: 3 textos

- 1958: 9 textos

- 1959: 2 textos

- 1960: duas charges e 47 textos

O volume consideravelmente maior de textos do ano de 1960 faz parte de uma

deliberada estratégia na construção da amostra. Na pesquisa inicial, pudemos constatar um

número muito maior de artigos sobre a construção de Brasília publicados naquele ano, quando

comparado aos anteriores. Em 17 de fevereiro de 1960, a Tribuna da Imprensa começou a

publicar, quase que diariamente, uma série especial de reportagens intitulada “Brasília às

vésperas da mudança”, na qual denunciava as condições precárias da cidade que, dali a

poucos meses, seria a nova capital do país. Além disso, 1960 era um ano eleitoral, no qual

Carlos Lacerda terminaria sendo eleito, em outubro, governador da Guanabara. Nossa

9 Optical Character Recognition, ou Reconhecimento Óptico de Caracteres. 10 Todas as imagens em fac-símile e os textos transcritos das matérias analisadas estão disponíveis no blog

Museu da Propaganda, no endereço http://museudapropaganda.blogspot.com. Para acessa-los, basta selecionar a

opção “Tribuna da Imprensa” do menu “seções”, ou ir diretamente ao endereço

http://museudapropaganda.blogspot.com/search/label/tribuna

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hipótese principal, com base no conceito de CR-P, era a de que as matérias contrárias à

construção de Brasília publicadas na Tribuna da Imprensa tinham como alvo Juscelino

Kubitschek - e que os ataques desferidos pela Tribuna a JK e a Brasília faziam parte da

construção de um cenário de representação no qual Lacerda seria uma legítima voz do

descontentamento do Rio de Janeiro com a transferência da capital. Portanto, as matérias de

1960 sobre a nova capital mostravam-se essenciais para se colocar nossa hipótese à prova.

Bem, falemos agora um pouco da base teórica escolhida para a análise dos textos

selecionados. Poderíamos ter optado pela metodologia de análise do discurso, que com toda a

certeza traria resultados bastante ricos. Mas uma análise desse tipo nos traria como problema

justamente sua maior virtude: resultados bastante amplos, capazes de revelar facetas

ideológicas, culturais e sociais das mais variadas.

Buscávamos uma análise menos

abrangente, mais centrada na política e, mais

especificamente, na disputa política e no jogo

eleitoral da época. Assim, uma metodologia

baseada no conceito de CR-P nos permitiria

melhor analisar uma vertente que, para nós, é

essencial no entendimento do papel

desempenhado pela Tribuna da Imprensa na

formação da cultura política, sobretudo durante

o período da “velha tribuna”. Afinal, a mídia se

transformou em palco privilegiado das disputas

pelo poder político na contemporaneidade

(LIMA, 2001). Nos anos 50, a importância da

mídia – e sobretudo da imprensa escrita – na

construção da hegemonia no cenário político

brasileiro é notável (LATTMAN-WELTMAN, 1996; RIBEIRO, 2007). E não podemos

esquecer que a Tribuna da Imprensa pertencia a Carlos Lacerda, um homem de intensa

atividade política, que disputou (e venceu) uma eleição a governador durante o período por

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nós pesquisado, e que utilizava sua publicação para fins políticos pessoais de maneira pouco

velada.

Por isso nos valemos do conceito de CR-P. Nas palavras de Lima (2001, p. 181 e

182):

“Dentro da tradição maior representada pelos conceitos de imaginário social e cultura política e tomando o conceito de hegemonia como referência teórica básica (...) o CR-P refere-se a um “cenário de representação” específico da política (...). Se entendermos a palavra “cenário” como significando o espaço, o lugar onde ocorre algum fato, a ação ou parte da ação de uma prática qualquer, é possível afirmar que a hegemonia (...) pode ser decomposta em vários “cenários” específicos que incorporam todas as suas características. Mas qual a característica fundamental desses “cenários”? (...) podemos afirmar que ela [a hegemonia] se constitui e se realiza no espaço em que o sentido da vida e das coisas é construído, isto é, no espaço das representações. Dessa forma, podemos também afirmar que esses “cenários” são, de fato, “cenários de representação” (...) Em nossa articulação conceitual, representação significa não só representar a realidade, mas também constituí-la.”11

A partir dessa linha de argumentação, Lima (2001, p. 182 e 183) chega à seguinte

definição de CR-P: “espaço específico de representação da política nas ‘democracias

representativas’ contemporâneas (...) lugar e objeto da articulação hegemônica total,

construído em processos de longo prazo, na mídia e pela mídia (...)”.

É possível notar, portanto, que no conceito de CR-P é dado um espaço privilegiado

para a análise do papel da mídia como constituidora de representações, como um elemento

capaz de, em certa medida, introduzir valores e modelar condutas individuais e coletivas. Há,

obviamente, que se relativizar essa capacidade constituidora da mídia que, em última

instância, é o seu próprio papel na construção da hegemonia. Claro que há muitos outros

fatores que inflem na formação de uma hegemonia e que, como bem ressalta Lima, a mídia é

também constituída, na medida em que internaliza e reverbera valores a ela extrínsecos. Mas

há um fato inquestionável: a mídia não é simplesmente reflexiva, é também dotada de

capacidade constituidora, e por isso desempenha papel fundamental na construção da

hegemonia.

11 Grifos nossos.

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Então, apresentada a nossa metodologia e explicitado o nosso referencial teórico,

analisemos as matérias selecionadas.

Discussão

1956

Em 1956, apesar de já promulgada a Lei nº 2.874, de 19 de setembro de 1956, que

“dispõe sôbre a mudança da capital e dá outras providências”, as matérias sobre a

transferência da capital para Brasília revelam um misto de incredulidade e de dúvidas quanto

à motivação da escolha pela mudança. Em 1º de novembro, a Tribuna publica um dos únicos

artigos, em todo o período analisado, que se propõem a uma análise mais isenta da

transferência da capital. Citando G. K. Chesterton (1874–1936) e Harold Laski (1893-1950),

o artigo “Sôbre a mudança da capital”, assinado pelo historiador e escritor João Camillo de

Oliveira Tôrres (1915-1973) diz pretender, antes de criticar, “instaurar dúvidas” sobre a

mudança. Mas as críticas vêm logo em seguida:

“(...) espanta-me a idéia de quererem colocar o govêrno do Brasil fora dos centros civilizados, fora do centro povoado e vivo do país. Govêrno sempre se soube, é govêrno de homens sôbre homens e, não, sobre terras. Afinal, que vai fazer o govêrno fora das cidades? (...) Se é uma loucura querer administrar o país de dentro do Rio, uma cidade situada no centro do país [retomando crítica ao excesso de centralização do governo brasileiro], centro humano, demográfico, social, econômico, o que não será da periferia sertaneja?”12

Na crítica de Tôrres, está uma representação que irá se repetir ao longo de boa parte da

cobertura da construção de Brasília: a de que se trata de uma ideia bastante tola transferir a

capital para a “periferia sertaneja”. Uma peculiaridade é a citação a outros exemplos de

transferência de capitais no mundo, algo que encontramos apenas no artigo de Tôrres.

12 TÔRRES, João Camillo de Oliveira.Sôbre a mudança da capital. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 1º.

nov. 1956, p. 4

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“Se isso fôsse seguir os Estados Unidos, a capital iria para Rezende, São José dos Campos, ou qualquer outro lugar entre Rio e São Paulo. Washington não está nos cafundós de Nevada e, sim, logo adiante de Nova York, perto do mar. Desde Tomé de Souza que o Govêrno do Brasil é o fator de civilização, o veículo que nos transmite as idéias da Europa. Ficaria bem em pôrto (...) Cita Chesterton os casos de Constantinopla, Madrid, S. Petersburgo, Cracóvia e Versalhes. Com Exceção de Bizâncio, os demais exemplos foram da mesma época, expressão do mesmo espírito, o abandono das velhas cidades, sedes da tradição e da religião, cheias de povo, em troca de cidades novas, desligadas de qualquer contato mais íntimo com a realidade histórica tradicional. O fenômeno, lembra-nos Chesterton, e êste o tema de seu ensaio, está associado ao aparecimento do absolutismo, e ao abandono das velhas práticas da “monarquia limitada” dos tempos medievais. Antes governava o rei “em côrtes”. Isto é, nas assembléias do povo; depois viria o govêrno do rei “na côrte”, isolado de tudo.”13

Na edição de 29/30 de dezembro do mesmo ano, surge mais uma representação que irá

se repetir em grande parte dos artigos analisados: a corrupção. Na capa, acima da dobra, está a

matéria “Coisas estranhas acontecem com o dinheiro de Brasília”. A matéria denuncia que,

“contrariando a praxe do serviço público, são emitidos cheques ao portador” ao invés de

cheques nominais. Ela não afirma diretamente que houve desvio de verbas, mas mostra que a

emissão de cheques ao portador pode ser, no mínimo, uma brecha que permitiria o mau uso

do dinheiro público durante a construção da nova capital.

“Nos dias 19 e 20 de dezembro, por exemplo, a “Cia Urbanizadora da Nova Capital” emitiu contra o Banco do Brasil dois cheques no valor de Cr$ 1.701.917,60. Só um deles, entretanto, levou o nome do recebedor. O outro, em maior quantia, foi, inexplicavelmente, emitido ao portador.”14

Na mesma edição, outra matéria sobre a construção de Brasília, essa muito mais

explícita em suas críticas. Sob o título “Mudança para Brasília – a mentira carioca de 1956”, o

artigo publicado na seção de Opinião da Tribuna comenta uma reportagem do Estado de São

Paulo, e afirma que a construção da nova capital está sendo feita “na base da improvisação e

da inconseqüência” que caracterizaria o governo de JK, qualificado como um “permanente

13 TÔRRES, João Camillo de Oliveira. Sôbre a mudança da capital. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 1º.

nov. 1956, p. 4

Page 13: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

turista”. Mais uma vez, surge o tema “corrupção”: “Os planos (...) propiciarão negociatas,

darão oportunidade a que ganhem dinheiro, facilmente, aquêles que têm os bons olhos do

govêrno e faro para a tramóia” 15.

1957

A página 2 da edição de 20 de setembro

de 1957 traz em destaque uma foto de Carlos

Lacerda discursando durante a inauguração do

diretório da UDN no Catumbi, bairro da região

central do Rio de Janeiro. A foto ilustra a

matéria “Ainda está por fazer quem nos faça

calar” – o título reproduz um trecho do longo

discurso proferido por Lacerda na ocasião. Era

evidentemente um evento político e Lacerda,

como de costume, aproveitou a oportunidade

para desferir duros golpes contra Juscelino

Kubitschek. Porém um golpe muito bem

dirigido, destinado a insuflar o

descontentamento dos fluminenses e,

principalmente, dos cariocas contra JK e contra

a transferência da capital para Brasília.

A Tribuna da Imprensa deu destaque a um trecho do discurso sobre o tema: “criticou

o líder udenista a construção de Brasília: ‘pelo governo voador, que quer se vingar do carioca

porque não lhe mereceu o voto´”16. Trata-se de uma representação recorrente na Tribuna,

14 Coisas estranhas acontecem com o dinheiro de Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 e 30 dez.

1956, p. 1. 15 Mudança para Brasília – a mentira carioca de 1956. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 e 30 dez. 1956,

p. 4. 16 Ainda está por nascer quem nos faça calar. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 set. 1957, p. 2.

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também ressaltada por Michelle dos Santos (2008) – o esvaziamento político do Rio, gerado

pela construção na nova capital, seria uma retaliação de JK ao seu fraco desempenho eleitoral

durante as eleições presidenciais. Essa mesma representação apareceria apenas alguns dias

depois, em 26 de setembro, e de forma muito mais explícita. O título do artigo é auto-

explicativo: “Brasília, castigo do Rio”.

Mas, mesmo com as obras de construção da capital já em andamento – haviam

começado em fevereiro – a representação da “incredulidade” ainda está presente. Em matéria

também de 26 de setembro, na qual se informa que data da transferência da capital será 21 de

abril de 1960, Brasília é chamada de “cidade de ficção”. A reportagem repercute críticas do

senador udenista Daniel Krieger (1909-1990) à aprovação, pelo Senado Federal, de um

projeto de lei17 que fixava essa data para a transferência da capital – projeto este que se

transformaria na Lei nº 3.273, de 1º. de outubro de 1957: “Não é possível que se construa

nesse prazo (...) uma cidade destinada a servir de capital a um país de 60 milhões de

habitantes. Isso vai exigir um sacrifício extremo da nação brasileira”18. Ainda valendo-se das

palavras de Krieger, a Tribuna da Imprensa aproveita para alertar sobre a possibilidade de

desperdício de recursos públicos e, também, para veladamente criticar as “excentricidades” de

JK, representação essa também recorrente:

“(...) Além do mais, o presidente da República pode se valer dêsse ato do Legislativo para depois dizer: tudo o que fiz recebi (sic) prazo do Congresso, os créditos especiais, o esbanjamento das verbas produzidas por todos os Estados do Brasil que apliquei na capital, foi deliberação expressa do Parlamento. O sr. Fernandes Távora, em aparte, frisou que não se deveria dar ao sr. Juscelino esse ‘bill’ de identidade para êle justificar ‘todas as maluquices que tem praticado’. O sr. Gaspar Veloso, líder do PSD, não gostou da expressão ‘maluquice’ e o Sr. Távora modificou para ‘desacêrto’, embora sem satisfazer de todo o senador paranaense.” 19

O tema desperdício de verbas públicas e desvio de recursos de outros estados para

Brasília ressurge na coluna “Vozes da Cidade” de 18 de dezembro, assinada por José do Rio.

17 PL 1.773, de 1956, do Deputado Emival Caiado (UDN/GO) 18 A capital se muda em abril de 60. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 set. 1957, p. 3. 19 A capital se muda em abril de 60. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 set. 1957, p. 3.

Page 15: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

O autor informa, em pequena nota, que os orçamentos dos Institutos de Previdência têm uma

nova rubrica, chamada Empreendimentos Brasília, que já teria liberado 180 milhões de

cruzeiros para inversão na nova capital. “Enquanto isso”, frisa José do Rio, “os prédios dos

Institutos na velha capital – o Rio – estão caindo aos pedaços.”20

1958

Na mesma linha da representação do

desperdício de verbas públicas está a da

escolha de prioridades para a utilização dos

recursos que, como sabemos, são sempre

escassos. É a linha principal seguida pela

matéria “Brasília financia publicidade oficial:

Fala à Tribuna o senador Alencastro

Guimarães”, com grande destaque na edição

de 30 de abril. E mais uma vez, é utilizada a

dicotomia “verbas destinadas à construção de

Brasília” versus “verbas não utilizadas na

infra-estrutura do Rio de Janeiro”:

“Não vejo, nunca vi, dificuldades de monta na solução de certos problemas capitais do Rio – declarou à TRIBUNA DA IMPRENSA o senador Alencastro Guimarães referindo-se a vários problemas que angustiam a vida da cidade. E prosseguiu: ‘falta de dinheiro não é. Se a União pode despender bilhões na construção da nova capital onde não há praticamente habitantes, poderia com muito mais razão e propriedade aplicar êsses bilhões na velha capital. Se lá o dinheiro rende, recompensa o capital empregado, aqui, com muito mais sucesso, teria a rentabilidade maior e mais rápida. É verdade que aqui o emprêgo desse dinheiro não teria os efeitos publicitários que

20 Vozes da Cidade. Tribuna da Imprensa. Rio de Janeiro, 18 dez. 1957, p. 2.

Page 16: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

produz em Brasília. Essa talvez a razão porque para nós cariocas falta tudo, exceção da abundância de uma paciência infinita” 21

Na mesma página, e em linhas gerais, com a mesma representação, uma pequena

matéria, intitulada “Desvio de verba para Brasília”, na qual se repercute uma denúncia

apresentada por mais um udenista, desta vez o deputado Herbert Levy (1911-2002). O

subtítulo diz: “O Instituto dos Ferroviários de S. Paulo, além de dever enormes quantias ao

Estado, deixou também de pagar a aposentadoria dos seus associados. E tudo isso porque

mandou seus recursos para Brasília. Fazendo esta denúncia na Câmara Federal, o deputado

Herbert Levy citou o caso dos ferroviários da Estrada de Campos do Jordão que há seis mêses

não vêem dinheiro.” 22

E para que tantos gastos? O que exatamente se está construindo no Planalto Central?

De acordo com a Tribuna da Imprensa, palácios para JK. É o que afirma logo na manchete a

matéria “Inaugurado em Brasília o palácio de Kubitschek”, publicada em 1º de julho. Um

palácio, segundo a Tribuna, de requintes nababescos, feito com um orçamento astronômico:

“Foi inaugurado ontem, em Brasília, o Palácio da Alvorada, residência do Sr. Juscelino

Kubitschek e primeiro edifício construído na nova capital. Custou ao Tesouro cêrca de Cr$ 1

bilhão tendo um dos banheiros mais luxuosos da América do Sul, orçado há tempos, em Cr$

15 milhões” 23.

Ao longo de nossa análise dos artigos sobre a construção de Brasília, pudemos

observar que, de 1958 em diante, há uma alternância ou a justaposição de dois argumentos.

De um lado, a construção da nova capital é apresentada como um inesgotável escoadouro de

verbas públicas, que demonstra não haver escassez de dinheiro para obras e políticas

essenciais, mas tão somente uma escolha equivocada de prioridades pelo governo JK. De

outro, um argumento, sempre fundamentado na “gastança” com a construção de Brasília, de

21 Brasília financia publicidade oficial. Fala à Tribuna o senador Alencastro Guimarães. Tribuna da Imprensa,

Rio de Janeiro, 30 abr. 1958, p. 3. 22 Desvio de verba para Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 30 abr. 1958, p. 3. 23 Inaugurado em Brasília o palácio de Kubitschek. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 1º jul. 1958, p. 3.

Page 17: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

que escassez de recursos não pode ser usada como desculpa para qualquer decisão

governamental que vise evitar gastos em outras ações.

É o que vemos, por exemplo, na edição de 9 de julho. A utilização do segundo

argumento é feita logo no título da matéria “Governo que constrói Brasília não pode vetar

reajustamento dos inativos da Previdência Social”. Novamente é dada voz a um udenista para

combater a medida do governo. Mas dessa vez o próprio Carlos Lacerda é o citado:

“Combatendo o veto presidencial ao reajustamento da aposentadoria e pensões dos segurados da previdência social (...) o deputado Carlos Lacerda, líder da UDN, demonstrou ontem, durante a sessão do Congresso Nacional, que as razões do Govêrno não procedem. O govêrno, para vetar a emenda Padilha, disse que esta colocaria em risco a Previdência Social do Brasil, levando-a à falência.” 24

Variações dessas argumentações surgem esporadicamente na Tribuna até que, em 29

de dezembro aparece pela primeira vez, salvo melhor juízo, uma matéria na qual um assunto

bem mais local e específico de Brasília é abordado. Como pudemos ver, toda a cobertura da

construção de Brasília até então havia sido centrada no Rio, tanto do ponto de vista da

atividade jornalística em si quanto da construção dos argumentos que embasavam as inúmeras

críticas à construção da nova capital. Mas o Rio sai do centro da reportagem no artigo

“Especulações imobiliárias encareceram Brasília”. Saem de cena também os udenistas, para

dar lugar a uma crítica que vem de um técnico. Outra inovação, ainda pouco utilizada na

imprensa de então, é o recurso da “chamada de capa”. Na primeira página, há somente o lide

da matéria, em 117 palavras, fechado por um “Leia na pág. 2”.

No interior, críticas do general Djalma Polli Coelho (1892-1954), ex-presidente da

Comissão de Estudos para a Localização da Nova Capital e já falecido àquela época, ao

“rush” imobiliário observado no Planalto Central devido à construção de Brasília. As críticas

estavam contidas em um antigo relatório resgatado pela Tribuna, e cuja data de elaboração

não é citada pela matéria.

24 Governo que constrói Brasília não pode vetar o reajustamento dos inativos da Previdência Social. Tribuna da

Imprensa, Rio de Janeiro, 9 jul. 1958, p. 3.

Page 18: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

“Afirma o general Polli Coelho que, antes da construção de Brasília, era preciso organizar o Distrito Federal. Depois disso é que se poderia pensar na construção da nova Capital. ‘Qualquer pressa – frisa êsse militar – como a que seria incitar logo de construir uma grande cidade, para servir de nova Capital, sómente poderia conduzir a maus resultados. Sómente os aventureiros, que estarão com as suas vistas voltadas para os lucros, poderão cogitar de começar pela construção da grande capital. A mudança da capital não deve dar oportunidade a negócios que venham a enriquecer aventureiros.’” 25

A edição de 29 de dezembro foi

prolífica em matérias contrárias à construção de

Brasília. Além da reportagem sobre a

especulação imobiliária, foi publicado um

artigo do próprio dono do jornal, Carlos

Lacerda, já citado no prólogo deste artigo. Em

“Otimismo: o nosso e o da Camorra”, reaparece

a representação de que se trata de uma tolice a

construção da nova capital. Neste editorial de

Lacerda, um dos mais duros dirigidos ao

governo JK, a decisão de se transferir a capital é

qualificada como “a loucura de Brasília”26 -

daqui tiramos o título deste artigo. Outra

representação bastante evidente, e mais uma

vez repetida, é a do desperdício dos gastos

públicos. Lacerda, fiel à ideologia udenista, acrescenta, contudo, uma nova nuance a essa

representação, ao criticar a escolha do governo pela realização de investimentos com verbas

públicas, em detrimento da livre iniciativa e do estímulo aos investimentos privados:

1959

25 Especulações imobiliárias encareceram Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 dez. 1958, p. 2. 26 Pouco mais de um ano antes, em 3 de setembro de 1957, o jornal Luta Democrática publicou artigo cujo título

era exatamente “A loucura de Brasília”.

Page 19: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

No início do ano, algo raro aparentementeacontece: pela primeira vez, a Tribuna da

Imprensa abre espaço para a opinião de um “governista” sobre Brasília. Trata-se de uma

pequena nota, de apenas 284 palavras, publicada na página 3 do jornal, com o título “Diretor

da NOVACAP diz que Brasília é obra do povo”. A matéria reproduz um pequeno trecho de

entrevista realizada com Íris Meinberg (1908-1973) que, apesar de compor o governo JK, era

filiado à UDN de Carlos Lacerda.

Exatamente devido a essa aparente idiossincrasia se faz necessária uma pequena

contextualização para entender melhor o que significa essa nota. Meinberg iniciou sua

carreira política no Partido Social Democrático (PSD) de JK, em 1945. Em 1950, contudo,

aceitou convite para se filiar à UDN, e foi eleito deputado federal por São Paulo pela legenda.

Foi reeleito para a legislatura de 1955 –1958, mas renunciou em 1956 para assumir o cargo de

diretor da NOVACAP.

Meinberg foi alçado a esse cargo por uma imposição legal, e não por uma escolha de

JK – por isso o “governista” entre aspas. O § 6o do art. 12 da Lei nº 2.874, de 19 de setembro

de 1956, impunha que um terço dos membros do conselho de administração, da diretoria e do

conselho fiscal da NOVACAP fossem escolhidos em lista tríplice de nomes indicados pela

diretoria nacional do maior partido político que integrasse a corrente da oposição no

Congresso Nacional – no caso, a UDN. Essa regra não fazia, obviamente, parte da redação do

projeto de lei do Executivo27 que deu origem à Lei nº 2.874/56. Foi negociada por JK com a

UDN – e principalmente com o deputado Emival Caiado (1918-2004), eleito por Goiás

(COUTO, 2006, p. 72) – para viabilizar um acordo político que levasse à aprovação do

projeto.

Para ocupar a vaga da oposição na diretoria da NOVACAP, a UDN indicou três

nomes: Café Filho (1899-1970), Jales Machado e Íris Meinberg. Café Filho havia sido um dos

próceres do movimento que visava impedir a posse de JK. Jales Machado era ferrenho

opositor do pessedista José Ludovico (1906-1989), então governador de Goiás, que vetou seu

nome. Restou então Íris Meinberg, um ex-pessedista que, por haver sido eleito por Goiás,

27 PL nº 1.234, de 1956.

Page 20: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

estava mais propenso a ver com bons olhos a transferência da nova capital para uma área do

seu estado (OLIVEIRA, S/D).

Portanto o que para um leitor comum era uma entrevista com um governista ou, na

melhor das hipóteses, de um udenista convidado a fazer parte do governo, na verdade era um

espaço aberto a um udenista que, por força da lei, dirigia uma empresa vital na construção da

nova capital. Mas com um quê de maldade a ridicularizar as opiniões de Meinberg. Apesar do

texto da matéria ser bastante objetivo, limitando-se a reproduzir as falas do diretor da

NOVACAP, o subtítulo da matéria – uma frase fora do contexto – soa um tanto ridículo:

“Diretor da NOVACAP diz que Brasília é obra do povo. O Sr. Íris Meinberg afirmou que a

nova capital já está exportando tomates”28. Acrescente-se que, na época, “tomates” era uma

expressão muito comum para se referenciar, em termos chulos, a “testículos”.

A ala mais antimudancista da UDN, e principalmente Carlos Lacerda, considerava

Meinberg um traidor por ter aceitado o cargo na direção da Novacap. A Tribuna da Imprensa

fez uma campanha intensa exigindo que Meinberg se demitisse do cargo, o que terminou

ocorrendo em novembro de 59, apenas alguns meses antes da inauguração de Brasília. Na

despedida de Meinberg, foi entregue a ele um cartão que, de certa forma, conta um pouco da

história dessa pressão exercida por Lacerda:

“Dr. Íris Meinberg

A maledicência de alguns jamais apagará do pensamento dos funcionários da NOVACAP seu passado de tradições gloriosas e sua colaboração imprescindível na obra gigantesca do século - Brasília”29

Na edição de nove de janeiro, uma notinha bastante jocosa na coluna “Vozes da

Cidade” traz novamente a representação do esvaziamento e abandono do Rio de Janeiro, com

a transferência de recursos da cidade para Brasília. Na coluna, José do Rio reproduz um chiste

que se contava nas ruas do Rio de Janeiro na época: “Um funcionário “barnabé” explicando a

seu filho a ausência do Papai Noel: “Meu filho, Juscelino transferiu o homem para Brasília...”

28 Diretor da NOVACAP diz que Brasília é obra do povo. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 7 jan. 1959, p. 3. 29 Trecho extraído de "Um Moisés brasileiro", de Clotilde de Mello Meinberg, edição particular.

Page 21: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

1960

A Tribuna inicia 1960 repetindo a

representação de que a escassez de recursos não

pode ser usada como desculpa para as decisões

governamentais, frente à “gastança” que está

sendo promovida com a construção de Brasília.

Em 23 de janeiro, uma matéria de capa retoma o

argumento utilizado em artigo de 9 de julho de

1958 (“Governo que constrói Brasília não pode

vetar reajustamento dos inativos da Previdência

Social”). Mas se em 1958 o público-alvo eram os

aposentados e pensionistas, agora a matéria é

destinada aos servidores públicos federais.

Meses antes da publicação da matéria, o

governo havia negado um novo plano de

classificação do funcionalismo – o equivalente

hoje a um novo plano de carreira - que redundaria em reajuste nos salários dos funcionários

públicos. Em 23 de janeiro, citando fonte do palácio do Catete, a Tribuna da Imprensa

informa que Cr$ 10 bilhões vão ser gastos na mudança para Brasília, com a transferência dos

deputados, de centenas de funcionários e de mobiliários e equipamentos. Daí conclui logo no

título: “Brasília: dinheiro da Classificação do Funcionalismo pagará mudança”.

Na capa da edição de 22 de fevereiro, uma pequena matéria anuncia: “Novacap: UDN

articula uma lista insuspeita”. Com a saída de Íris Meinberg do cargo de diretor financeiro da

Novacap, a UDN deveria elaborar uma nova lista tríplice, a ser remetida ao presidente da

República, como estabelecia a legislação. Um dos nomes seria escolhido para ser um dos

diretores da empresa. Apesar do sucesso em seu intento de forçar o pedido de exoneração de

Meinberg, recorrendo a acusações de nepotismo e corrupção (STORY, 2006, p. 131), Carlos

Page 22: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Lacerda deixava claro, por meio da Tribuna, o seu descontentamento com o udenista de Goiás

e com o grupo de “colaboracionistas” (udenistas favoráveis à transferência da capital):

“A iniciativa foi tomada depois que os udenistas notaram que diversas listas estavam sendo preparadas pelos deputados contrários às irregularidades, enquanto os “colaboracionistas” entrosavam-se para a indicação de elementos de sua confiança. Essa desagregação de fôrças poderia significar a derrota da maioria do partido, dado aos cuidados a que se entregam estes últimos.’” 30

Na edição do dia seguinte, surge uma representação até hoje presente, e que a

historiografia costuma apontar como um fator decisivo na decisão de JK pela construção de

Brasília: a instalação da capital na “periferia sertaneja” era uma estratégia para afastar o

governo do conturbado ambiente político do Rio de Janeiro e, assim, silenciar a oposição. De

fato, ainda hoje o suposto isolamento da classe política em Brasília é apontado como um fator

de estímulo a uma pretensa apatia política dos brasileiros. A matéria repercute declarações do

senador Mem de Sá (1905-1989) sobre o tema:

“Com a mudança do Congresso para Brasília a 21 de abril, a Oposição cava o túmulo e à beira dêle se suicida para ser enterrada sem dar muito trabalho (...) Salientou que, no corrente ano, dificilmente o Congresso funcionará, pois a grande esmagadora maioria dos parlamentares, mantendo suas residências no Rio, estarão mais aqui que em Brasília, onde a falta de “quorum” impedirá a votação das leis (...) Até que Brasília se torne suportável, creio que irá propiciar, entre funcionários e parlamentares, a formação de quadros invencíveis para os campeonatos mundiais de bridge, biriba, buraco e outros desportos carteados (...) é ato de alucinação, impôsto pelo arbítrio de uma maioria parlamentar que reflete interesses momentâneos e visa satisfazer a vontade e o capricho do grande senhor da República’” 31

Na edição do dia seguinte, outra reportagem parece complementar a matéria sobre as

declarações de Mem de Sá. A Tribuna alardeia que, além de “inútil”, o Congresso em Brasília

será caríssimo, muito mais caro do que no Rio de Janeiro. Dessa vez os ataques partem de um

deputado do próprio partido do presidente, Nestor Jost (1917 - ): “O país gastará mais de Cr$

80 milhões por ano com as despesas do funcionalismo da Câmara dos Deputados se for

30 Novacap: UDN articula uma lista insuspeita. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 fev. 1960, p. 1. 31 Congresso lá em Brasília será túmulo da Oposição. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 fev. 1960, p. 3.

Page 23: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

aprovada a proposição da Comissão de Finanças reestruturando sem nenhum critério de

equidade os vencimentos dos servidores” 32 diz a matéria, intitulada “Câmara em Brasília

custará mais 80 milhões por ano”. Interessante notar como título e matéria dizem coisas

distintas: enquanto o título nos faz crer que a Câmara será mais cara por funcionar em

Brasília, o texto mostra que na verdade o eventual reajuste nos salários dos servidores será o

verdadeiro responsável pelo aumento de gastos.

Na mesma página, uma pequena nota informava que a UDN havia adiado a escolha da

lista tríplice de nomes a serem indicados como representante da oposição no Conselho Diretor

da Novacap. O adiamento era fruto do intenso conflito entre “colaboracionistas” e

“verdadeiros oposicionistas”, noticiado em 22 de fevereiro no artigo “Novacap: UDN articula

uma lista insuspeita”. O confronto terminou em vitória dos “colaboracionistas”, o que

motivou a publicação de um artigo inflamado e repleto de ironia na edição de 9 de março:

“Como estava previsto, a UDN exibiu ontem com todo o elenco no palco, o espetáculo de sua desagregação como verdadeiro partido oposicionista. Foi um espetáculo de gala, no qual as exceções, numerosas e honrosas, não puderam turbar (...) a UDN passou algumas horas votando, contando votos e cabalando votos para os oposicionistas que vão compor (com esta ou aquela intenção, êste ou aquêle pretexto, esta ou aquela desculpa, não importa) a quadrilha da NOVACAP. As resistências de alguns, repetimos, não conseguiram ofuscar o brilho do espetáculo, nem o conseguiu, muito menos, a tentativa de apresentar nomes marcados por uma atuação de luta pela decência e contra o roubo, nomes que se sabia intransigentes, incapazes de continuar a tradição do sr. Íris Meinberg. (...) e assim terminou o espetáculo. Ou melhor o primeiro ato, pois só um nome para a lista tríplice foi indicado. Os candidatos são muitos, os votados outros tantos, muito grande é o desejo de servir ao povo, fazendo o sacrifício de ajudar os srs. Kubitschek e Israel Pinheiro na NOVACAP. E não foi fácil obter, para três, a maioria absoluta indispensável para concorrer à nomeação presidencial. A disputa continuará e, se alguém pensa que não vale a pena, consulte o sr. Íris Meinberg’” 33

No mesmo dia 9 de março, Brasília volta a ser apresentada como “castigo do Rio” na

matéria “Petebista diz que Rio é a maior vítima de JK”. Na reportagem, é destacada entrevista

dada pelo deputado Elói Dutra (1916-1990), na qual ele afirma que o Distrito Federal é uma

das maiores vítimas do governo de Juscelino. Na conclusão da matéria, Dutra, que havia

32 Câmara em Brasília custará mais 80 milhões por ano. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 fev. 1960, p. 3. 33 Oposição e NOVACAP. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 mar. 1960, p. 4.

Page 24: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

visitado as obras do palácio do Congresso Nacional em Brasília, dá a sua impressão sobre a

nova sede do Legislativo: “O plenário (...) é fundo, escuro, sem ventilação suficiente e em

condições de confinamento tal que não permitem as necessárias condições para que deputados

e senadores trabalhem eficientemente” 34.

A mesma linha segue a matéria “Brasília vai ser capital, mas bom mesmo é o Rio”,

publicada na edição de 14 de março. O artigo, assinado por José Álvaro e sob a retranca “Giro

em sociedade”, ressalta a “falta de classe” da cidade que, daí pouco mais de um mês, abrigaria

a capital federal. “Nem vaidade, nem cultura, em Brasília não há cabeleireiro nem livraria”,

destaca Álvaro, que arremata: “Mesmo quando estiver, em futuro não muito próximo,

funcionando realmente como cidade, Brasília é certinha demais. Tôdo mundo metido em

prédio igual, em lugares previamente designados (...) A esta altura ninguém mais duvida de

que Brasília vai ser mesmo a capital do Brasil. Que seja, mas daqui não saio, que bom

mesmo, é o Rio” 35.

Porém o que realmente chama a atenção em Brasília, não só da Tribuna (mas

principalmente da Tribuna), como de muitos jornais cariocas, é a falta de infra-estrutura para

abrigar o aparato estatal após a transferência da capital. Em 9 de fevereiro, por exemplo, a

Tribuna da Imprensa informa: “Parlamentares vão viver no meio da poeira”. Mais uma vez, a

fonte é o senador Mem de Sá, a quem se atribui a seguinte declaração: ”Os deputados,

senadores e juizes vão viver em meio de obras, de andaimes, aterros, valas, lama ou nuvens

de pó vermelho, com a precariedade de tudo que é improvisado e feito a machado. Sem

assistência médica, dentária e sem o mínimo de confôrto a que a civilização os acostumou” 36.

34 Petebista diz que Rio é a maior vítima de JK. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 mar. 1960, p. 3. 35 Brasília vai ser capital, mas bom mesmo é o Rio. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 14 mar. 1960, p. 7. 36 Parlamentares vão viver no meio da poeira. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 fev. 1960, p. 3.

Page 25: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Essa representação de Brasília como um lugar

agreste, incivilizado e carente das mais básicas

condições de moradia são dominantes em dezenas de

artigos publicados pela Tribuna da Imprensa ao longo

do ano de 1960, principalmente antes da inauguração

da cidade. Brasília é apresentada como um lugar no

qual índios invadem estradas37, situado em uma zona

árida e estéril38, habitado por cobras39 e onde se pode

levar uma flechada a qualquer momento40.

ABRAMO, Hilde Weber. Recepção em Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 fev. 1960, p. 4.

Também chama a atenção da Tribuna o quanto a cidade está incompleta, com algumas

de suas obras fundamentais ainda em andamento. Em fevereiro de 60, dois repórteres do

jornal, Jayme Negreiros e Antônio Andrade, se instalam em Brasília e, a partir do dia 17,

começam a publicar uma série de reportagens, como enviados especiais, sob a retranca

“Brasília às vésperas da mudança”.

A primeira reportagem estampa a capa do jornal, com uma grande foto que ocupa a

parte superior da página, acima do título do jornal, com os dizeres “Brasília às vésperas da

mudança: andaimes, poeira e muito mato”. A legenda explica o andamento das obras

retratadas: “No primeiro plano, está a Avenida das Nações, em Brasília: apenas uma estrada

coberta de cascalho e betume. Ao longe, à direita a silhueta do palácio (inacabado) do

Congresso Nacional. Ao centro e à esquerda, também ao longe, cinco silhuetas menores: são

edifícios, também inacabados, de ministérios. Isto é Brasília a pouco mais de dois meses da

37 SPI adverte Exército: índios invadem estrada para Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 25 jan. 1960,

p. 1. 38 Geógrafo vê Brasília: “Zona árida e estéril”. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 15 fev. 1960, p. 7. 39 Cobras de Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 19 fev. 1960, p. 3. 40 Índios de Brasília já expulsaram um. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 16 mar. 1960, p. 5.

Page 26: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

mudança”. Logo abaixo da foto, uma pequena coluna vaticina: “Impossível viver em

Brasília”:

“A 64 dias da mudança da capital, estão completamente prontos em Brasília apenas o Palácio da Alvorada, para o sr. Juscelino Kubitschek, e o Palace Hotel, para os privilegiados que possam pagar Cr$ 1 mil pela diária, sem refeições. Os edifícios do Congresso e da Administração não estão prontos e parece impossível concluí-los a tempo. E, o que é igualmente grave: os 15 mil funcionários, cuja transferência está prevista para a primeira etapa, não terão onde morar decentemente, nem onde se abastecer, nem onde nem como atender às necessidades essenciais, suas e de suas famílias, desde a necessidade de alimentar-se à de locomover-se nas enormes distâncias desertas da cidade em construção. Esse é o tema da primeira reportagem da série que os nossos repórteres Jayme Negreiros e Antônio Andrade escreveram, depois de uma visita de oito dias a Brasília, e que começamos a publicar hoje, na página 3.” 41

A série de reportagens era inédita: em toda a cobertura sobre a construção de Brasília

pela imprensa carioca, poucas foram as matérias feitas a partir da observação de repórteres

que efetivamente estiveram na cidade. A abordagem era, quase que invariavelmente, realizada

a partir do Rio de Janeiro, refletindo muito mais a impressão que se tinha de lá sobre o que

estava acontecendo em Brasília do que a realidade de fato. As matérias de Jayme Negreiros e

Antônio Andrade são as primeiras a analisar detalhadamente a situação da cidade que seria,

em poucos dias, a capital do Brasil. E o que a dupla de repórteres encontra é um cenário ainda

mais precário do que se imaginava no Rio – o que eles vêem, e de fato era uma realidade

inegável, é uma Brasília que não tinha, e continuaria a não ter até pelo menos meados dos

anos 60, condições para ser a sede do governo federal.

As matérias da série enfatizam duas representações primordiais: a do quanto Brasília

era agreste, poeirenta e incivilizada; e a de como a nova capital era uma cidade em

construção, com diversas obras ainda longe de serem finalizadas. A matéria que inaugura a

série, por exemplo, utiliza ambas as representações. Uma grande foto, no topo da página e

com o chapéu “dentro do mato”, tem como legenda: “Dentro do mato – que nem jipe

atravessa – fica o palácio do Congresso. Assim é na cidade que será capital do país a 21 de

abril”. A foto ilustra a matéria “Brasília: prontos só o hotel de luxo e um palácio para

41 Impossível viver em Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 17 fev. 1960, p. 1.

Page 27: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Kubitschek sonhar”. No texto, Negreiros e Andrade afirmam que os serviços públicos e

instituições democráticas ainda não têm condições para funcionar. Alguns prédios, como os

dos ministérios, Congresso e os prédios residenciais dos Institutos de Previdência, antes

mesmo de terminados, estariam cobertos de lama e poeira, com paredes rachadas porque o

material seria inferior.

“O exterior do Congresso, como em todos os trechos de Brasília, é só barro, valas com pôças d´água, lama e poeira, já que a urbanização ainda não começou. Também o palácio Federal dos Despachos (...), o Supremo Tribunal Federal (...) e os onze Ministérios (...) não estão terminados (...) não há lavanderia, tinturaria, barbearia, armazém ou mercadinhos. As distâncias entre blocos residenciais são de quilômetros e o único transporte são os escassos e superlotados ônibus (...) Um detalhe não falta em Brasília: propaganda do sr. Juscelino Kubitschek, com seu retrato pendurado em bares, restaurantes, lojas comerciais e até mesmo a legenda “JK 1965” fixada num grande letreiro luminoso na fachada de um órgão oficial – o edifício do Ministério da Fazenda ” 42

A primeira reportagem da série “Brasília às vésperas da mudança” gerou grande

frisson, o que certamente motivou a Tribuna da Imprensa a dar ainda mais destaque ao tema.

O número de correspondências e telefonemas de leitores foi tão grande que motivou a

publicação, na capa da edição de 18 de fevereiro, de uma coluna tratando da repercussão das

matérias sobre Brasília publicadas no dia anterior. Muitos leitores estavam indignados com o

que chamavam de manipulação dos fatos e com uma alegada cobertura tendenciosa da

Tribuna sobre a nova capital:

“Êste seu amigo quase não fez outra coisa, da tarde de ontem à manhã de hoje, senão atender telefonemas sobre a primeira reportagem da série que nossos enviados especiais realizaram em Brasília, do dia 9 ao dia 14 do mês corrente. Jayme Negreiros e Antônio Andrade apenas começaram a contar o que é a cidade faraônica do sr. Kubitschek, a dois meses da mudança. E os protestos são muitos, pelo nosso telefone. Uns dizem que a foto publicada em nossa primeira página de ontem é “do arquivo”, “está superada”, é “uma montagem desonesta”. Outros dizem que a foto foi feita “do Rio, com teleobjetiva”. E os protestantes são unânimes em alegar que apresentamos “a cozinha de Brasília”, que a mostramos “pelos fundos” (...) Veja você os argumentos dos protestantes: são todos argumentos de desespero (...) na inconseqüência do seu mudancismo ingênuo ou “vivo” demais, sob o impacto da

42 Brasília: prontos só o hotel de luxo e um palácio para Kubitschek sonhar. Tribuna da Imprensa, Rio de

Janeiro, 17 fev. 1960, p. 3.

Page 28: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

realidade de Brasília, apreendida pela máquina fotográfica do repórter em tôda a sua nudez” 43

Como imagens valem por mil palavras,

gozam de uma maior aura de isenção do que o

texto escrito e foram os grandes causadores da

polêmica da matéria, a Tribuna tratou de utilizá-

las com ainda mais destaque na série “Brasília às

vésperas da mudança” – sempre retratando obras

inacabadas e o lado “selvagem” da cidade. Em

18 de fevereiro, o prédio do Banco do Brasil. No

dia 19, as cobras de Brasília. Na edição dos dias

20 e 21, os conjuntos residenciais do IAPM, os

ministérios e a orla do Lago Paranoá. No dia 22,

o “mercado” – assim mesmo, entre aspas, com

uma foto que retrata não um mercado, mas uma

suja e desorganizada feira livre. E assim seguem

fotos de favelas, da Catedral, de diversos prédios

residenciais e até de um operário supostamente flechado por um índio.

A série é publicada em 9 matérias, e termina na última edição de fevereiro de 60. Ao

fim, o leitor que havia lido todas as matérias sabia que as donas de casa precisariam andar

quilômetros a pé para fazer compras, que não haveria luz, água encanada e esgoto na data da

inauguração, que o preço do açúcar seria astronômico, que as ligações telefônicas e de rádio

não funcionavam, que a nova capital já tinha 6 mil barracos e 32 mil flagelados, que os

diários oficiais não seriam impressos, que parasitas ameaçavam o povo, que não havia

hospitais...

43 Prezado leitor. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 18 fev. 1960, p. 1.

Page 29: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Mas chega 20 de abril, e estamos a apenas algumas horas da inauguração. O “Brasília

às vésperas da mudança” se torna o “Horas antes da mudança”. E a Tribuna da Imprensa

anuncia: Brasília ainda é poeira.

“Apesar de uma laranjada estar custando Cr$ 80 e um ovo Cr$ 30, da poeira vermelha, que penetra nas roupas, no corpo e na alma da gente, da confusão por falta de acomodações para funcionários, parlamentares e turistas convidados, da ausência de qualquer obra terminada, da falta de luz e de condução, do surto de disenteria e intoxicação provocada pelo excesso de cloro na água, o sr. Osvaldo Penido, presidente da Comissão de Transferência da Capital, afirma que Brasília está preparada para a inauguração.” 44

No dia 22 de abril, são publicadas as primeiras notícias sobre a inauguração de

Brasília. Como era de se esperar, a poeira é a protagonista, segundo a Tribuna. Uma grande

foto ocupa a capa do jornal. Um parlamentar aparece em primeiro plano, e outros dois ao

fundo. Nenhum identificado, e todos vestidos em traje de gala. Ao fundo, apenas um

pedacinho do prédio do Congresso Nacional, engolido por uma imensidão que, mesmo em

uma foto preto-e-branco, sabe-se vermelha. E para que não reste dúvida, a legenda explica,

em caixa alta e negrito: “CASACAS NO BARRO”. Assim termina a cobertura da Tribuna da

Imprensa da mudança da capital. Antimudancistas no litoral, e derrotados. Mudancistas com

os pés no barro, mas vitoriosos. Chegava ao fim um capítulo fundamental da história

brasileira do século XX, e da história da imprensa brasileira de todos os séculos.

Conclusão

A Tribuna da Imprensa foi um dos grandes revolucionários da mída brasileira, e

contribuiu fortemente para a modernização do jornalismo na prolífica década de 50

(LATTMAN-WELTMAN, 1996; BARBOSA, 2007; RIBEIRO, 2007). No lugar do

jornalismo literário até então vigente, fortemente marcado pela opinião em detrimento do fato

e por um intenso proselitismo político, surgia a reportagem, dotada de uma pretensa aura de

isenção diante da realidade. O jornalista não era mais um observador distante, a quem cabia

44 Horas antes da mudança, Brasília ainda é poeira. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 abr. 1960, p. 2.

Page 30: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

analisar ideológica e politicamente uma situação e sobre ela emitir seu parecer, e sim uma

“testemunha ocular da história”, como muito bem resume o bordão de Heron Domingues no

Repórter Esso.

Na cobertura da Tribuna sobre a transferência da capital do Rio de Janeiro para

Brasília, pudemos observar nitidamente o surgimento desse novo jornalismo no Brasil. Há

uma delimitação muito bem estabelecida entre o que é “reportagem” e o que é “opinião” –

não apenas do ponto de vista de estruturação do texto, mas também graficamente, com as

matérias de opinião ocupando um lugar específico e devidamente identificado no jornal.

Porém o que, em uma análise mais superficial, poderia parecer uma guinada rumo a uma

crescente isenção, com o jornalista se preocupando mais com fatos que com opiniões, não

resiste a um olhar político mais aguçado, com as ferramentas que o conceito de Cenários de

Representação da Política (CR-P) nos oferece.

A frágil aparência de isenção dada pelo uso de modernas técnicas de reportagem na

cobertura da construção de Brasília – principalmente nos anos 60, com a série “Brasília às

vésperas da mudança” – rui quando analisamos os cenários de representação que vão sendo

construídos ao longo do tempo. A opinião da Tribuna sobre Brasília fica muito bem

explicitada – “faraônica”, “cara”, “fruto da inconsequência e da loucura de JK”, “corrupta”,

“de mau gosto”, “agreste”, “selvagem”, “barrenta”, “longe de estar concluída”.

Fica evidente que o papel constituidor de realidades da Tribuna é bastante exercitado.

E é justamente o que devíamos esperar. O que chamamos de “opinião da Tribuna” é, em

grande parte, a “opinião do dono da Tribuna, Carlos Lacerda”. E na cobertura da construção

de Brasília nos anos de 1956 a 1960, pudemos constatar, com base no material analisado, que

o antimudancismo da Tribuna da Imprensa foi, muito além de um simples movimento

político contrário à mudança da capital, uma bandeira de oposição a JK, habilmente utilizada

por Carlos Lacerda na tentativa de desestabilizar o governo.

Não que o antimudancismo fosse exclusivamente uma bandeira “politiqueira”. A

Tribuna da Imprensa, assim como toda a imprensa carioca, tinha motivos comerciais,

econômicos, políticos e mesmo ideológicos suficientes para se opor fortemente à

transferência da capital do Rio para Brasília. Mas o que vimos nas matérias analisadas foi

uma deliberada estratégia de utilização do antimudancismo como um forte mote político de

Page 31: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

oposição a Juscelino, e como uma estratégia para dar suporte a um claríssimo objetivo de

Lacerda: se eleger governador da Guanabara. O antimudancismo era, ao mesmo tempo, uma

forma de marcar oposição a JK e de se identificar com o eleitorado do Rio de Janeiro,

também, em grande parte, antimudancista. E assim, de forma estratégica e deliberada, a

Tribuna da Imprensa constituiu um CR-P altamente contrário à construção de uma nova

capital, e não mediu esforços para se opor à “loucura de Brasília”.

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Ainda está por nascer quem nos faça calar. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 set. 1957,

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Brasília financia publicidade oficial. Fala à Tribuna o senador Alencastro Guimarães. Tribuna

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Desvio de verba para Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 30 abr. 1958, p. 3.

Inaugurado em Brasília o palácio de Kubitschek. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 1º jul.

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Governo que constrói Brasília não pode vetar o reajustamento dos inativos da Previdência

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Especulações imobiliárias encareceram Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 dez.

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Especulações imobiliárias encareceram Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 29 dez.

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Janeiro, 29 dez. 1958, p. 4 (grifos nossos)

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Diretor da NOVACAP diz que Brasília é obra do povo. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro,

7 jan. 1959, p. 3.

Vozes da Cidade. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 jan. 1959, p. 2.

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1960

Brasília: dinheiro da Classificação do funcionalismo pagará mudança. Tribuna da Imprensa,

Rio de Janeiro, 23 jan. 1960, p. 1.

Advogados: justiça em Brasília será injusta. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 jan.

1960, p. 2.

Brasília: sol deixa Lôbo suado. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 jan. 1960, p. 2.

SPI adverte Exército: índios invadem estrada para Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de

Janeiro, 25 jan. 1960, p. 1.

Rio vai ter maiores delegacias do mundo. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 25 jan. 1960,

p. 2.

Parlamentares vão viver no meio da poeira: Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9

fev. 1960, p. 3.

Geógrafo vê Brasília: “Zona árida e estéril”. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 15 fev.

1960, p. 7.

Impossível viver em Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 17 fev. 1960, p. 1.

Brasília: prontos só o hotel de luxo e um palácio para Kubitschek sonhar. Tribuna da

Imprensa, Rio de Janeiro, 17 fev. 1960, p. 3.

Deputado do PSD critica Brasília: mudança é bacanal. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro,

17 fev. 1960, p. 3.

Prezado leitor. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 18 fev. 1960, p. 1.

Brasília às vésperas da mudança (II). Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 18 fev. 1960, p. 1.

Vozes da Cidade. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 18 fev. 1960, p. 2.

Câmara advertida: Brasília é apenas esboço de cidade. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro,

19 fev. 1960, p. 3.

Financiamento para jornais em Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 19 fev. 1960,

p. 3.

Cobras de Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 19 fev. 1960, p. 3.

Brasília às vésperas da mudança (III) – Donas-de-casa farão quilômetros a pé para comprar

(quando houver mercado). Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 19 fev. 1960, p. 3.

Page 36: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Isto “é” o conjunto IAPM em Brasília, às vésperas da mudança / Ministérios às vésperas da

mudança. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 e 21 fev. 1960, p. 1.

Brasília às vésperas da mudança (IV) – Na hora da mudança, não haverá luz suficiente nem

rede de esgôtos nem abastecimento de água. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 e 21

fev. 1960, p. 3.

Mercado de Brasília às vésperas da mudança. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 fev.

1960, p. 1.

Novacap: UDN articula uma lista insuspeita. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 fev.

1960, p. 1.

Novacap entrega abastecimento de Brasília a intermediário, estimulando alta de preços.

Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 fev. 1960, p. 1.

Brasília isolada: rádio não funciona. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 fev. 1960, p. 1.

Brasília às vésperas da mudança (VI) – Catedral de Brasília não ficará pronta em abril:

construído só o anel de base. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 fev. 1960, p. 3.

Brasília: nem urbs, nem civitas, nem domus. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 fev.

1960, p. 3.

Congresso lá em Brasília será túmulo da Oposição. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23

fev. 1960, p. 3.

Câmara em Brasília custará mais 80 milhões por ano. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro,

24 fev. 1960, p. 3.

Novacap: UDN adia escolha para março. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 fev. 1960,

p. 3.

Nova capital do país vai começar com seis mil barracos e 32 mil flagelados. Tribuna da

Imprensa, Rio de Janeiro, 24 fev. 1960, p. 3.

Brasília às vésperas da mudança (VIII) – “Diários Oficiais” talvez não possam ser impressos

em Brasília até abril. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 fev. 1960, p. 3.

JK desmente Israel sôbre o preço de Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 fev.

1960, p. 3.

Brasília às vésperas da mudança (IX) – Parasitas ameaçam o povo em cidade sem hospitais.

Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 27 e 28 fev. 1960, p. 3.

Page 37: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

Petebista diz que Rio é a maior vítima de JK. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 mar.

1960, p. 3.

Oposição e NOVACAP. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 mar. 1960, p. 4.

Brasília vai ser capital, mas bom mesmo é o Rio. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 14

mar. 1960, p. 7.

Índios de Brasília já expulsaram um. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 16 mar. 1960, p. 5.

Parlamentares vão viver no meio da poeira. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 9 fev. 1960,

p. 3.

Horas antes da mudança, Brasília ainda é poeira. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20

abr. 1960, p. 2.

Casacas no barro. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 abr. 1960, p. 1.

Aeronautas: voar até Brasília é perigoso. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 abr. 1960,

p. 2.

Ministros também estão de volta: Brasília não tem mesmo condições. Tribuna da Imprensa,

Rio de Janeiro, 23 e 24 abr. 1960, p. 1.

Deputados que voltam falam de Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 e 24 abr.

1960, p. 2.

Brasília deixa sem lei tráfego no Rio. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 e 24 abr. 1960,

p. 2.

Ministros abandonam Kubitschek em Brasília. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 25 abr.

1960, p. 1.

JK ameaça ministros: Brasília ou demissão. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 abr.

1960, p. 1.

Casacas de Brasília voltam sujas: poeira. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 26 abr. 1960,

p. 1.

Brasília provoca doença imaginária. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 nov. 1960, p. 5.

(Legislações)

Page 38: A loucura de Brasília: o antimudancismo nas páginas do jornal

SENADO FEDERAL, SUBSECRETARIA DE INFORMAÇÕES. Lei nº 2.874, de 19 de

setembro de 1956, que “dispõe sôbre a mudança da Capital Federal e dá outras

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______________________________________________________. Lei nº 3.273, 1º de

outubro de 1957, que “fixa a data da mudança da Capital Federal e dá outras

providências”. Sistema de Informações do Congresso Nacional. Acesso em 20 jun. 2009.

(Vídeos e áudios)

Brasília segundo Feldman (1980, Vladmir Carvalho e Eugene Feldman). 1 VHS (20 min):

VHS, son., color.

Inquérito 0215, locutor 252, tema: terreno (1974, Projeto NURC-RJ). 1 arquivo de áudio

MP3 (55 minutos).

Agradecimentos

À equipe do Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados

(CEDI), em especial a Wilton Sidou Pimentel e Adalgiso de Oliveira Costa; e à equipe do

Arquivo Público do Distrito Federal (arPDF).