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(45) 3097-4512 Pronto Atendimento 24h Cascavel, 27 de março de 2020 - Ano XXIV - Nº 2.239 - R$ 3,00 45 99921-0456 45 3333-9999 www.hyundaivetor.com.br [email protected] A porta do elevador Desafio para os gestores públicos em tempos de coronavírus: qual o ming da decisão que permite o deslocamento da sacada do prédio até o botão do elevador e o térreo? Imagine a situação do gestor público diante destas duas opções: a) Flexibilizar o isolamento social assu- mindo o risco de colapsar o sistema de saúde e todas as consequências decorrentes disso, reprisando aqui os horrores vividos na Itália, Espanha e EUA. b) Manter o isolamento assumindo o risco de asfixiar a economia, produzindo a falência das empresas, demissões em massa e convulsão social. Há um caminho entre as duas opções? O Reino Unido procurou, e não encontrou. A dona da coroa e o 1º ministro acabaram ajoe- lhados para o corona; aquela refugiada num castelo medieval, este infectado pelo vírus. E o empresário, como deve se posicionar? Ninguém sabe exatamente o que fazer. Mas o que não fazer, já está claro. Falta de clareza na comunicação com a sociedade pode custar danos irreversíveis para as marcas. O CEO da franquia Gira- ffas perdeu o longo pescoço após dizer que os funcionários deveriam escolher entre o vírus e o emprego. Foi demitido pelo próprio pai, fundador da marca. “Não vamos demitir ninguém”, disse o patriarca. O até então incensado dono da rede Ma- dero de restaurantes está até agora tentando apagar o incêndio na cozinha, por declara- ções que pareciam fazer pouco caso da morte de 7 mil vovôs e vovós. Pronunciamentos públicos ou em redes sociais pedem muita cautela para não pas- sar a impressão que as sempre demonizadas “elites brancas de olhos azuis” se preocupam mais com o bolso do que com a vida humana. Mas também é verdade que a paralisia formada a partir do isolamento social abala o empreendedor em seu âmago. O poeta, artista, músico, pensa de um jeito. O empresário é cartesiano, estatístico, matemático. Pensa de outro jeito. Ninguém do empresariado cometerá suicídio com o coronavírus. Mas quando a greve dos ca- minhoneiros estrangulou a economia, houve empreendedor tirando a própria vida”, dis- se um líder empresarial de Cascavel, pedindo para não ser identificado. RADICAIS. No país em que até os pas- sos de dança de uma bailarina podem virar duelo político, a pandemia também atiçou os radicais por aqui. De um lado os catastrofistas falam em caos social, invocam saques e já seguram os martelos para fincar os últimos pregos no caixão da economia. Uma parte desta tur- ma é composta de terraplanistas sanitários. Na outra ponta, pessoas compartilham imagens horríveis da Europa, depoimentos dramáticos e preconizam o fim da humani- dade. Uma parte desta turma milita na turma do “quanto pior melhor”. Ambas as leituras levam ao pânico, fator que somente lubrifi- cam a passagem desta para uma pior. É neste cenário contaminado que o pre- feito Paranhos, pressionado de todos os lados, irá apontar caminhos para uma lenta, gradual e segura retomada da economia nes- ta sexta-feira. Que os deuses o iluminem... MP faz séria advertência l Cinco promotores de Justiça notifi- caram o prefeito Paranhos, ontem após ele anunciar a possibilidade de rever pro- cedimentos. l Em recomendação administrativa, o Ministério Público pede que seja mantida a política de isolamento social. l “O descumprimento implicará em imediata propositura de tutela inibitória de lícito, bem como de eventual responsabi- lização pessoal por dano moral coletivo”, pontuaram eles, dirigindo-se diretamente ao prefeito. n O isolamento social em debate: quando e como retomar a normalidade?

A porta do elevador · 2020-03-27 · (45) 3097-4512 24h Pronto Atendimento Cascavel, 27 de março de 2020 - Ano XXIV - Nº 2.239 - R$ 3,00 45 99921-0456 45 3333-9999 [email protected]

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(45) 3097-4512

Pronto Atendimento24h

Cascavel, 27 de março de 2020 - Ano XXIV - Nº 2.239 - R$ 3,00

45 99921-045645 3333-9999

www.hyundaivetor.com.br

[email protected]

A porta do elevadorDesafio para os gestores públicos em tempos de coronavírus: qual o timing da decisão que permite o deslocamento da sacada do prédio até o botão do elevador e o térreo?

Imagine a situação do gestor público diante destas duas opções:

a) Flexibilizar o isolamento social assu-mindo o risco de colapsar o sistema de saúde e todas as consequências decorrentes disso, reprisando aqui os horrores vividos na Itália, Espanha e EUA.

b) Manter o isolamento assumindo o risco de asfixiar a economia, produzindo a falência das empresas, demissões em massa e convulsão social.

Há um caminho entre as duas opções? O Reino Unido procurou, e não encontrou. A dona da coroa e o 1º ministro acabaram ajoe-lhados para o corona; aquela refugiada num castelo medieval, este infectado pelo vírus. E o empresário, como deve se posicionar? Ninguém sabe exatamente o que fazer. Mas o que não fazer, já está claro.

Falta de clareza na comunicação com a sociedade pode custar danos irreversíveis para as marcas. O CEO da franquia Gira-ffas perdeu o longo pescoço após dizer que os funcionários deveriam escolher entre o vírus e o emprego. Foi demitido pelo próprio pai, fundador da marca. “Não vamos demitir ninguém”, disse o patriarca.

O até então incensado dono da rede Ma-dero de restaurantes está até agora tentando apagar o incêndio na cozinha, por declara-ções que pareciam fazer pouco caso da morte de 7 mil vovôs e vovós.

Pronunciamentos públicos ou em redes

sociais pedem muita cautela para não pas-sar a impressão que as sempre demonizadas “elites brancas de olhos azuis” se preocupam mais com o bolso do que com a vida humana.

Mas também é verdade que a paralisia formada a partir do isolamento social abala o empreendedor em seu âmago.

“O poeta, artista, músico, pensa de um jeito. O empresário é cartesiano, estatístico, matemático. Pensa de outro jeito. Ninguém do empresariado cometerá suicídio com o coronavírus. Mas quando a greve dos ca-minhoneiros estrangulou a economia, houve empreendedor tirando a própria vida”, dis-se um líder empresarial de Cascavel, pedindo para não ser identificado.

RADICAIS. No país em que até os pas-sos de dança de uma bailarina podem virar duelo político, a pandemia também atiçou os radicais por aqui.

De um lado os catastrofistas falam em caos social, invocam saques e já seguram os martelos para fincar os últimos pregos no caixão da economia. Uma parte desta tur-ma é composta de terraplanistas sanitários.

Na outra ponta, pessoas compartilham imagens horríveis da Europa, depoimentos dramáticos e preconizam o fim da humani-dade. Uma parte desta turma milita na turma do “quanto pior melhor”. Ambas as leituras levam ao pânico, fator que somente lubrifi-cam a passagem desta para uma pior.

É neste cenário contaminado que o pre-feito Paranhos, pressionado de todos os lados, irá apontar caminhos para uma lenta, gradual e segura retomada da economia nes-ta sexta-feira. Que os deuses o iluminem...

MP faz sériaadvertêncial Cinco promotores de Justiça notifi-

caram o prefeito Paranhos, ontem após ele anunciar a possibilidade de rever pro-cedimentos. l Em recomendação administrativa, o

Ministério Público pede que seja mantida a política de isolamento social. l “O descumprimento implicará em

imediata propositura de tutela inibitória de lícito, bem como de eventual responsabi-lização pessoal por dano moral coletivo”, pontuaram eles, dirigindo-se diretamente ao prefeito.

n O isolamento social em debate: quando e como retomar a normalidade?

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Aquele abraço

27 de março de 2020

Fundadores: Laidir Dalberto, Jairo Eduardo e Antonio Santos da Luz Para os assinantes

Giovani Mattei, Marlon Müller, Daniel Pegoraro, Rogério Aver,

Rafael Salvatti, Augusto Paludo e Gustavo Ribeiro.

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Rua Jorge Lacerda, 885

Ação e reaçãol O vereador Fernando

Halberg repudiou ação judicial da Bigolin Materiais de Cons-trução. A empresa requereu o afastamento da ordem de fecha-mento e a respectiva abertura das lojas. “O distanciamento social é a maneira mais eficaz de combater a disseminação do vírus. Esperamos que o empre-sário, por conta própria, solicite a desistência da presente ação, e passe a envidar seus esforços para proteger a vida de seus funcionários e familiares que merecem sua atenção nesse mo-

Rainha da sucatal Quando assumiu

o comando da 15º SDP, a delegada Mariana Vieira trazia consigo algumas expectativas da comunidade.l Uma delas era

replicar em maior escala – já que com mais poderes – os ín-dices primeiro-mundistas de elucidação de homicídios que já havia obtido na delegacia especializada.l Mariana foi além. Preo-

cupada em criar um ambiente mais adequado para seus co-legas de trabalho e para o pa-gador de impostos que even-tualmente demande serviços

de segurança, a de-legada transformou o ambiente físico da 15ª.l Uma de suas

vitórias mais cele-bradas ocorreu hoje, quando chegou ao fim um esforço que consumiu meses de

trabalho de sua equipe: o lei-lão de carros apreendidos, al-guns deles há décadas criando Aedes no pátio da delegacia.l Nada menos que 1.600

veículos foram ofertados no leilão on line. 100% foram ar-rematados; 1.590 sucatas fo-ram adquiridas pela Gerdau. Finalmente, uma das áreas mais degradadas da cidade, será limpa e revitalizada.

Delivery em altal O Market Easy, serviço por aplicativo de compras em supermer-

cados e estabelecimentos comerciais como o Canário, foi colocado a teste no isolamento social.l Mesmo multiplicando a equipe por três, os gestores estão com dificul-

dades para atender todos os pedidos. Equipes do aplicativo tem chegado as 6 da manhã nos mercados para separar os produtos. “Tá bombando”, resumiu Maurício, fundador do serviço.

mento”, argumentou Halberg.l Após elencar vários argu-

mentos, o empresário Selvino Bigolin perguntou ao vereador, em nota emitida na última se-gunda-feira, quem irá dar conta do flagelo social das medidas res-tritivas: “Quem vai dar comida para milhões de desempregados e suas famílias? Se não morrer de coronavirus, vai morrer de fome”. l Bigolin encerra a nota com

um apelo: “Não vote no candida-to Fernando Halberg em outu-bro. Ajude a melhorar o nível de nossa Câmara”.

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Quando a equipe do Pitoco chegou ao prédio da Prefeitu-ra de Cascavel, ao crepúsculo da aranhos - Trata-se de uma inspeção sanitária. Precisamos saber se a cidade de origem do visitante tem transmissão co-munitária. Chegando a Cascavel, o cidadão será abordado, emi-timos um relatório individua-lizado, ele recebe uma pulseira no braço que não pode violar. Pulseira vermelha se apresentar algum sintoma, amarela se vier de área de risco. Se andar por aí será identificado. Ideal seria um rastreador na pulseira, mas de momento não é possível.

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ANÁLISE

27 de março de 2020 04 l [email protected]

Somos filhos e netos do medo. É o que sustenta Yuval Harari em sua magnífica trilogia “Sa-piens – uma breve história da humanidade”, “Homo Deus” e “21 lições para o século 21”.

Ele explica de forma bem di-dática: um bando de sapiens, na idade da pedra, encontra uma caverna. É a oportunidade de um abrigo para intempéries. Mas há um problema: quais feras podem habitar o fundo da grota? Quem do bando sapiens irá entrar pri-meiro? Os cautelosos, medrosos ou covardes não assumirão a vanguarda da missão.

No pior desfecho, o corajoso será devorado pela fera, no fundo da caverna escura. Os vacilan-tes, ou cautelosos, sobreviverão.

Os filhos do medoQue lições extrair de homens primitivos para fazer frente à paúra da pandemia no Brasil?

n “O Grito”, de Edward Munch, é o “retrato” mais famoso do medo

Jairo Eduardo - editor do Pitoco E transmitirão para o DNA de seus descenden-tes os gritos de horror do destemido agonizante.

O medo é também uma arma do marketing político e de algumas religiões/seitas: assustar para coesionar em torno de uma causa ou de um líder populista que saiba mane-jar a paúra. De alguma forma o medo contribuiu para a eleição de Bolsonaro. Medo da vol-ta do PT, medo do comunismo cubano/bolivariano, medo do desfazimento da “família tradi-cional”. Medo de inimigos reais ou imaginários, não importa. O que importa é o medo.

Agora o presidente tem o medo a seu desfavor. É o medo da morte, aquele que vem lá das cavernas, e que foi transmitido

em nosso DNA a partir do sacrifí-cio do “valente”. Mesmo usando aqui neste texto, de forma cau-telosa, palavras escolhidas para não gerar pânico, caso se con-firmem as projeções, viveremos (principalmente nas metrópoles) dias de caverna escura no Brasil.

Há dois vetores principais ali-mentando o medo: o econômico (segurança alimentar) e a morte (instinto de sobrevivência). Para ficar no arco ideológico bolsona-rista, vamos citar Trump e seu trilionário socorro econômico costurado entre Democratas e Republicanos (exemplo político

a ser seguido aqui).

Cada família com ganhos inferiores a 75 mil dólares/ano, equivalente a R$ 31 mil mensais, receberá em casa um cheque de – no mínimo – R$ 6 mil. 350 bi-lhões de dólares serão destinados para micro e pequenas empresas. Se elas não demitirem, o recurso deixa de ser empréstimo, e pas-sa a ser uma doação do governo. Trump, inicialmente vacilante, soube jogar o jogo. E eliminou 50% da paúra. Eliminou o medo da fome. Resta ainda batalhar contra a fobia – justificada – do instinto de sobrevivência.

O Brasil não tem orçamento para enviar R$ 6 mil para cada família. Mas está atrasado nas medidas econômicas que ate-nuem o caos social. A inação re-prisa o terror atávico do homem na caverna: ele não poderá esco-lher qual dos leões irá devorá-lo. Certo mesmo é que suas possibi-lidades de sobrevida aumenta-riam se pudesse lutar com um de cada vez. Não tenha medo, Gue-des! Apresente o plano, Guedes. Implemente o plano, Guedes!

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[email protected] l 0527 de março de 2020

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06 l [email protected] 27 de março de 2020

ÚLTIMA PÁGINA

Confinado no porto

C. G. Jung*

“Naquele ano me privaram da primavera e de muitas coisas... mas eu floresci, levei a primavera dentro de mim, e ninguém nunca mais pode tirá-la de mim”

Sargento - Capitão, o meni-no está preocupado e muito in-quieto devido à quarentena que o porto nos impôs.

Capitão - O que te inquieta, menino? Não tens comida sufi-ciente? Não dormes o suficiente?

Soldado - Não é isso, capi-tão. É que não suporto não poder ir à terra e abraçar minha família.

Capitão - E se te deixassem sair do navio e estivesses con-taminado, suportarias a culpa de infectar alguém que não tem condições de aguentar a doença?

Soldado - Não me perdoaria nunca, mas para mim inventa-ram essa peste.

Capitão - Pode ser, mas e se não foi inventada?

Soldado - Entendo o que queres dizer, mas me sinto priva-do da minha liberdade, capitão, me privaram de algo.

Capitão - E tu te privas ain-da mais de algo.

Soldado - Está de brincadei-ra comigo?

Capitão - De forma alguma. Se te privas de algo sem respon-der de maneira adequada, terás perdido.

Soldado - Então quer dizer,

segundo me dizes, que se me ti-ram algo, para vencer eu devo privar-me de mais alguma coisa por mim mesmo?

Capitão - Exatamente. Eu fiz quarentena há 7 anos.

Soldado - E o que foi que tiveste de te privar?

Capitão - Eu tinha que es-perar mais de 20 dias dentro do barco. Havia meses em que eu ansiava por chegar ao porto e desfrutar da primavera em terra. Houve uma epidemia. No Porto Abril nos proibiram de descer. Os primeiros dias foram duros. Me sentia como vocês.

Soldado - Certo, então en-tende o que se passa comigo...

Capitão - Sim. Logo comecei

a confrontar aquelas imposições utilizando a lógica. Sabia que depois de 21 dias deste compor-tamento se cria um hábito, e em vez de me lamentar e criar hábi-tos desastrosos, comecei a com-portar-me de maneira diferente de todos os demais. Comecei com

o alimento. Me im-pus comer a metade do quanto comia ha-bitualmente. Depois comecei a selecio-nar os alimentos de mais fácil digestão, para não sobrecar-regar o corpo. Pas-sei a me nutrir de alimentos que, por tradição histórica, haviam mantido o homem com saúde.Sargento - Mas e a

cabeça, como fica?Capitão - É o passo seguin-

te. Foi unir a isso uma depuração de pensamentos pouco saudáveis e ter cada vez mais pensamentos elevados e nobres. Me impus ler ao menos uma página a cada dia de um argumento que não co-nhecia. Me impus fazer exercí-cios sobre a ponte do barco. Um velho hindu me havia dito anos antes, que o corpo se potencia-lizava ao reter o alento. Me im-pus fazer profundas respirações completas a cada manhã. Creio que meus pulmões nunca haviam chegado a tamanha capacidade e força. A parte da tarde era a hora das orações, a hora de agradecer a uma entidade qualquer por não

me haver dado, como destino, privações graves durante toda minha vida.

Soldado - Mas e minha fa-mília?

Capitão - O velho hindu me havia aconselhado também a criar o hábito de imaginar a luz entrando em mim e me tornando mais forte. Podia funcionar tam-bém para as pessoas queridas que estavam distantes e, assim, inte-grei também esta prática na mi-nha rotina diária dentro do barco.

Sargento - Eu continuo in-quieto...

Capitão - Em vez de pensar em tudo que não podia fazer, pensava no que faria uma vez chegado à terra firme. Visualiza-va as cenas de cada dia, as vivia intensamente e gozava da espera. Tudo o que podemos obter em seguida não é interessante. Nun-ca. A espera serve para sublimar o desejo e torná-lo mais pode-roso. Eu me privei de alimentos suculentos, de garrafas de rum e outras delícias. Me havia privado de jogar baralho, de dormir mui-to, de praticar o ócio, de pensar apenas no que me privaram.

Sargento - Como acabou, capitão?

Capitão - Eu adquiri todos aqueles hábitos novos. Me dei-xaram baixar do barco muito tempo depois do previsto.

Sargento - Privaram vocês da primavera, então?

Capitão - Sim, naquele ano me privaram da primavera e de muitas coisas mais, mas eu, mes-mo assim, floresci, levei a prima-vera dentro de mim, e ninguém nunca mais pode tirá-la de mim.

* Texto editado de Carl Gustav Jung. Ele foi um psiquiatra e psicote-rapeuta suíço que fundou a psicologia analítica. Jung propôs e desenvolveu os conceitos de personalidade extro-vertida e introvertida, arquétipo e in-consciente coletivo. Seu trabalho tem sido influente na psiquiatria, psicologia, ciência da religião e literatura

“Um navio está seguro no porto, mas não é

para isso que os navios foram feitos....”

(A frase de William Shedd pode ser usada como contraponto retóri-co ao texto de Jung. E mostra quão

difícil é encontrar o caminho do meio, entre uma tese e outra)

Contraponto