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A Primeira Guerra Mundial- História Completa- Lawrence Sondhaus.pdf

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  • A Primeira Guerra Mundial, deflagrada em 1914, provocou mudanas sem precedentes na Histria. O mapa da Europa foi redesenhado, imprios seculares desmoronaram como castelo de cartas, os EUA afirmaram sua hegemonia, a Unio Sovitica se apresentou ao mundo. Tudo isso comeou com o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do Imprio Austro-Hngaro, pelo bsnio Gavrilo Princip, de 19 anos. As consequncias da guerra vo muito alm de alteraes de fronteiras. O embate revolucionou as relaes de poder dentro das sociedades e, para alm dos mbitos militar, poltico e diplomtico, transformou normas e atitudes sociais, relaes de gnero e relaes de trabalho, o comrcio e as finanas internacionais. Neste livro, o mais abrangente e atual j escrito sobre o tema, o historiador Lawrence Sondhaus faz um relato minucioso das foras envolvidas, da exploso do conflito e das vrias frentes que teve em todo o planeta. uma obra de referncia, escrita com brilho e preciso, para ser lida por todos, graas ao seu estilo narrativo e envolvente. Depois da Primeira Guerra Mundial, o mundo nunca mais foi o mesmo. Nem nossa percepo sobre ela, aps a leitura deste livro.

  • Prefcio

    Oobjetivodeste livroapresentarumaHistriaglobaldaPrimeiraGuerra Mundial, til aos leitores em geral, bem como a estudantes deHistria e historiadores que procurem uma sntese atualizada dostrabalhosmais recentes sobreoassunto. Revoluo o temauniicador, ecada captulo trata de algum aspecto em que a guerra foi a causa, ocatalisador, o desencadeante ou o acelerador para transformaesprofundaseduradouras.Entreelas,osrevolucionriosobjetivosdeguerradamaioriadoscombatentes,arevoluotecnolgicaquetornouoconlitoto mortal para quem vestia farda, o sentimento revolucionrio quecresceu entre os combatentes comuns (manifestado de forma maisdrstica emmotins durante a guerra) e as presses revolucionrias quelevaram ao colapso dos imprios Romanov, Habsburgo e Otomano. Paraalm dos mbitos militar, poltico e diplomtico, o livro aborda efeitostransformadores da guerra sobre normas e atitudes sociais, relaes degneroerelaesdetrabalho,especialmentenasreasurbanasdaEuropaedosEstadosUnidos,esobreocomrcioeasinanasinternacionais,coma ascensodosEstadosUnidos, substituindo aGr-Bretanha como centrodaeconomiaglobal.

    Entreos trabalhosdeHistria geraldaPrimeiraGuerraMundial, estelivro diferente por reletir minhas percepes sobre o imprio dosHabsburgoseasrelaesentreaAlemanhaeaustria-Hungria.AalianaentreasPotnciasCentraisnostornoupossveloinciodaguerra,comotambm deiniu sua forma e seu resultado mais do que a maioria doshistoriadores(principalmenteosqueescrevememingls)enxergaramoureconheceram.AmaioriadoshistoriadoresanglfonosdaPrimeiraGuerraMundial entendeu muito mal a ustria-Hungria e a dinmica entre asPotnciasCentraise,comoconsequncia,emcertamedida,entendeumalaguerra. Entre as obras concorrentes, mesmo aquelas vendidas comoglobais ainda reletem uma forte nfase na frente ocidental ou umamaior profundidade de compreenso da frente ocidental quandocomparadacomosoutrosteatrosdoconlito(asfrentesoriental,italianaedosBlcs,eaaonomaroualmdaEuropa).Esforcei-meparaproduzir

  • um relato sumrio superior, especialmente destes outros teatros, bemcomodaguerranaval.

    Com inteno de tornar o livro o mais til possvel para seu pblico-alvo, inclu recursos que so relacionados narrativa principal do texto,maspodemserseparadosdela.Amaioriadoscaptulostemdetrsacincoboxes que apresentam trechos de documentos primrios ou vozes deindivduos, sendoqueestas incluema representaomaisamplapossveldospapis,patentes,classesegneros,bemcomodospasescombatentese teatros de ao. Sete quadros de Perspectivas trazem exemplos dodebate acadmico sobre aspectosmais controversos da guerra. Cada umdos15captulosincluiumacronologiaeilustraocomlegenda,eterminacom uma lista de sugestes para aprofundar a leitura. O nmero decaptulos possibilita trabalhar cerca de um captulo por semana em umadisciplina oferecida em formato semestral. So relativamente curtos,subdivididos aindamais, e do aos professores uma grande lexibilidadena atribuio de leituras que combinam com suas aulas expositivas outpicos de classe. Por im, cinco ensaios sobre a vida cotidiana lanammais luz sobreaexperinciahumananasreasexaminadas, comoavidanas trincheiras ou a bordo de um submarino. Esses recursos, pontuandoumanarrativa envolvente, tornameste livro atrativo tambmaos leitoresemgeral.

    ***

    AgradecimentosTenhoumadvidadegratidoparacomosmentores,colegaseamigos

    que inluenciaram o meu entendimento da Primeira Guerra Mundial aolongodosanos,eparacomas incontveis interaese conversasquemelevaramaformularmuitasdasideiaseinterpretaesagoraincorporadasneste livro. Em especial, agradeo aos meus colegas da Universidade deIndianpolis, Ted Frantz, Joseph Prestia e Milind Thakar, por seuscomentrios teis sobre as partes relativas a Estados Unidos, Romnia endia, respectivamente. Eu gostaria de agradecer a meu editor, MichaelWatson,porsuasconstrutivassugesteseseupapelgeralnadeiniodoprodutofinal.

    Em maro de 2007, quando comecei a discutir este projeto com a

  • CambridgeUniversityPress,caraa15onmerodeveteranosdaPrimeiraGuerra Mundial ainda vivos, cujo servio documentado antes de 11 denovembro de 1918 inclua uma variedade de papis nas foras armadasdoImprioBritnicoeoutros8pases.Elestinhamentre106a111anos.Nomomentoemqueestelivrofoipublicadoemingls,trspermaneciam,todos com 110 anos de idade: Claude Stanley Choules (Marinha RealBritnica),FlorencePattersonGreen(ForaAreaRealFeminina),eFrankWoodruff Buckles (Exrcito dos Estados Unidos). Hoje em dia nenhumdelesestvivo.Este livrodedicadoaelesememriadetodosaquelesqueserviramcomeles.

  • Introduo

    Graas a Deus, a Grande Guerra! O general Viktor Dankl,comandante designado do 1 Exrcito austro-hngaro, escreveu essaspalavrasem31de julhode1914,odia emque icou claroqueadisputaentreustria-Hungria e Srvia, decorrentedoassassinatodoarquiduqueFrancisco Ferdinando, um ms antes, no seria resolvida paciicamentenemselimitariaaumaguerranosBlcs.Quarentaetrsanoshaviamsepassado desde a ltima guerra em que potncias europeias seenfrentaram e, como muitos oiciais militares europeus da sua gerao,Dankl, na poca com 59 anos, temia servir toda a sua carreira semexperimentar um conlito desse tipo. Em 2 de agosto, em outra anotaoem seu dirio, ao se referir ao conlito que crescia rapidamente como aGuerraMundial, Dankl no podia imaginar o quo preciso se tornaria ortulo: que a ao se estenderia ao Extremo Oriente, ao Pacico Sul e frica Subsaariana; que mais de um milho de homens dos impriosBritnico e Francs entrariam em ao em campos de batalha europeus;queosEstadosUnidosteriamumexrcitodemaisde2milhesdehomensna Frana, apenas quatro anos mais tarde, ou que os pases europeusseriam responsveis por uma minoria de Estados participantes naconfernciadepazps-guerra.1

    APrimeiraGuerraMundialcomoumarevoluoglobal

    Atesecentraldeste livroqueaPrimeiraGuerraMundialeoacordodepazquepsimaelaconstituramumarevoluoglobal.ComoDankleoutrosgenerais,osestadistasquelevaramaEuropaguerranoverode1914nopreviramasconsequnciasrevolucionriasemtodoomundodoconlito cujo incio eles saudaram (ou, pelo menos, izeram muito poucopara desencorajar). Embora o surgimento do governo bolchevique naRssiaviesseaservircomoumlembretedequeomundoaindanoestavaseguro para a democracia, governos autoritrios antiquados, como

  • HohenzollerneHabsburgo,bemcomoRomanov,notinhamlugaremumaEuropaps-guerraquecontavacomnadamenosque11repblicasemummaparedesenhadoapartirdafronteirafranco-germnicaatbemdentroda Rssia, com um aumento lquido de seis Estados independentes e aeliminao de uma grande potncia tradicional, a ustria-Hungria doprprio Dankl. Para alm da Europa, a redistribuio das ex-colniasalemsafetouomapadafrica,dolestedasiaedoPacico,enquantooimdoImprioOtomanogerouoredesenhogeneralizadodasfronteirasnoOriente Mdio e, na Palestina, as razes do moderno conlito rabe-israelense, decorrente das promessas contraditrias feitas pela Gr-Bretanhaduranteaguerraaomovimentosionistaeanacionalistasrabes.

    Maisdoquequestesdefronteiraseterritrio,aguerratambmviriaa revolucionaras relaesdepoderdentrodas sociedadeseuropeias.NaEuropade1914,amaioriadoshomensadultosno tinhadireitosdevotoverdadeiramente signiicativos; alm de Portugal, que tinha acabado dederrubaroseurei,aFranatinhaanicarepblicadaEuropae,entreasoutrascincopotnciaseuropeias,apenasaGr-Bretanhaea Itlia tinhamgovernos parlamentares em pleno funcionamento. Apenas na Gr-Bretanha,esrecentemente, tinhahavidoummovimentosriopedindoaampliao dos direitos das mulheres incluindo o de voto. Enquanto aguerrafortaleceuaposiodostrabalhadoresorganizadoseproporcionouoportunidades de emprego sem precedentes para as mulheres, a maiorparte dessas oportunidades se revelou apenas temporria. No entanto, aEuropadops-guerra,aoestedaRssiasovitica,consistiaemrepblicasdemocrticas e monarquias constitucionais, e nela restava pouca ounenhuma restrio ao sufrgio masculino adulto. Em suas primeiraseleies nacionais do ps-guerra Alemanha e ustria se juntaram Gr-Bretanhaederamsmulheresodireitodevotar (comosEstadosUnidosas seguindo logo depois). Na Rssia do ps-guerra, o governo soviticochegouaconcedersmulheresodireitoaoabortosobdemanda.

    A guerra teve um impacto igualmente dramtico sobre a posio daEuropa no mundo. Os europeus brancos haviam desfrutado de umadominaoinquestionveldomundode1914,ummundoemque40%daraa humana era de origem europeia. No entanto, em 1919, a maisespinhosa questo moral enfrentada pela Conferncia de Paz estavarelacionada incluso ou no no Pacto da Liga das Naes de umadeclarao global da igualdade racial. Apesar de proposto (de forma umpoucocalculista)peloJapo,odebaterefletiaaperdadeestaturasimblicaedemogricadaEuropanomundocomoumtodo.Maisdoqueisso,como

  • exemplo da falibilidade europeia, a Primeira Guerra Mundial lanou assementes do movimento anticolonialista que irrompeu aps a SegundaGuerra, poca em que a exploso populacional no mundo no ocidentalreduziu ainda mais o peso relativo de uma Europa que nunca serecuperara do choquedemogrico daPrimeiraGuerra uma guerra naqualaesmagadoramaioriadosmilhesdemortostinhasidodeeuropeusoudepessoasdeorigemeuropeia.

    ConceituandoaprimeiraguerramundialNos primeiros dias de agosto de 1914, muitos observadores e

    participantes se juntaram a Viktor Dankl no reconhecimento do incio deuma grande guerra ou guerramundial, do tipo que a Europa no viadesde o inal da poca de Napoleo, um sculo antes. As GuerrasNapolenicas, e as guerras por imprio da Europa moderna, tinhamapresentadoumaaoemnvelmundialemalto-marenascolnias,bemcomo nos campos de batalha europeus. Contudo, no inal de agosto, oalcance e a intensidade do conlito em curso, no qual a maioria dosbeligerantes j tinha perdido mais homens em uma nica batalha, oumesmo emumnico dia, do que em guerras inteiras travadas durante osculoXIX ou antes, levaram a maioria a reconhecer que estavatestemunhando algo sem precedentes. Em setembro de 1914, emdeclaraes citadas pela imprensa norte-americana, o bilogo alemo eilsofoErnstHaeckelfezaprimeirarefernciaregistradaaoconlitocomoPrimeiraGuerraMundial, em suaprevisodequea lutaque comeavasetornar[ia]aprimeiraguerramundialnosentidoplenodapalavra. 2Ortulo de Primeira Guerra Mundial s se tornaria corrente depois desetembro de 1939, quando a revistaTime e uma srie de outraspublicaespopularizaramseuusocomocorolriodaexpressoSegundaGuerra Mundial, mas j em 1920 o oicial britnico e jornalista emtempos de paz Charles Court Repington publicou suas memrias daguerra sob o ttuloA Primeira Guerra Mundial, 1914-1918.3 Nos anos doentreguerras, uns poucos descrentes e pessimistas usavam PrimeiraGuerra Mundial em vez da mais comum Grande Guerra ou GuerraMundial,demodoareletirasuaconsternaoporelanotersido,comoWoodrowWilsonesperava,aguerraparaacabarcomtodasasguerras.

    O uso da expresso, desde 1939, relete a nossa conceituao daPrimeira Guerra Mundial como precursora da Segunda uma crena

  • universalsuicienteparaacomodarnosvisesopostassobreanaturezada causao (por exemplo, de que a Segunda Guerra Mundial ocorreuporque Alemanha no tinha sido completamente esmagada durante aPrimeira ou porque ela tinha sido desnecessariamente antagonizada namesadepaz,depoisdoconlito),mas,aindamais,anotveldiversidadedelies aprendidas e aplicadas pelos pases, lderes e povos envolvidos.Enquanto, na Alemanha e na Rssia, os regimes nazista e sovitico semostraram muito mais eicientes e cruis do que seus antecessores de1914 namobilizao de seus pases para a guerra e sua conduo at oamargo inal independentemente do custo em vidas humanas , asdemocracias da Europa Ocidental, os domnios britnicos e a ItliademonstrarampoucodesejoderepetirosacriciodesanguedaPrimeiraGuerraMundial e, emvrios aspectos, adaptaram suas estratgias a isso,desastrosamente para Frana e Itlia. Os Estados Unidos, cuja populaoainda no estava pronta para abraar o manto da liderana mundial noinal daPrimeiraGuerra,mobilizaram-separa a causaumageraomaistardeecomgrandefervorapsochoquedePearlHarbor,enquantoseuslderessebeneiciaramdaexperinciade1917e1918namobilizaoderecursos norte-americanos para travar a Segunda Guerra. Dos recursosconsiderveisdosEstadosUnidos,apenasseucontingentefezdiferenanaPrimeira Guerra Mundial, j que a luta terminou antes que a foraindustrialnorte-americanapudesseseraplicada;assim,AlemanhaeJaposubestimaramfatidicamenteacapacidadeblicaeadeterminaonacionaldosEstadosUnidosnaSegundaGuerraMundial.

    APrimeiraGuerraMundialeaguerratotalmodernaNo menos do que na esfera pblica e poltica, a Primeira Guerra

    Mundial produziu respostas radicalmente diferentes para as mesmasliesaprendidasemestratgias, tticaseoperaesmilitares.O impassesangrento das trincheiras na frente ocidental levou a Alemanha adesenvolveraBlitzkrieg(guerra-relmpago),aimdeeliminaraguerradeposies estticas, enquanto a Frana construiu a Linha Maginot natentativa da perfeita guerra de posies estticas. Graas ao exemplo daAlemanha, que partiu do exemplo britnico do inal do vero de 1918,passouasernormanaSegundaGuerraMundialasofensivasdeinfantariaseremapoiadasporumnmerosuicientedetanqueseaviesparaevitaratolarcomohaviaacontecidonaPrimeiraGuerra,excetonoscasosemque

  • a luta se dava dentro ou perto de uma grande cidade, ou no espaoconinadodeuma ilhadoPacico.ASegundaGuerraMundialapresentouversesmais letais de todas as armas e tticas de campode batalha queforam revolucionrias durante a Primeira Guerra, com a destacadaexceodousodegsvenenoso.

    AmagnitudedamorteedadestruiocausadaspelaSegundaGuerraultrapassou emmuito a da Primeira, principalmente para as populaescivis, mas, a partir de agosto de 1914, a Primeira Guerra Mundialtestemunhou atos de brutalidade contra no combatentes quepressagiavamoqueaconteceriaemumaescalamuitomaiorumquartodesculo depois. Das execues sumrias de civis belgas por soldadosalemes e de srvios por austro-hngaros, passando pela perseguio e,inalmente, chegando matana genocida de armnios no ImprioOtomano, ao bombardeio areo de Londres e de outras cidades porzepelins alemes, as populaes civis sofreram atrocidades em um nvelqueaEuropaesuaperiferianoviamdesdequeaGuerradosTrintaAnos(1618-48) marcou o im das guerras religiosas entre catlicos eprotestantes. Enquanto isso, no mar, o afundamento indiscriminado demilhes de toneladas de navios Aliados por submarinos alemes custoumilhares de vidas e prenunciou as campanhas de guerra submarinaindiscriminadadeambososladosnaSegundaGuerraMundial,enquantoobloqueio naval Aliado (principalmente britnico) s Potncias Centraistrouxe desnutrio para as frentes internas daAlemanha e daustria e,no inal das contas, doena e morte prematura de centenas de seusmilharesdecivismaisvulnerveis.impressionantequeaspopulaesdafrente interna no apenas tenham suportado essas diiculdades semprecedentes,mas,namaioriadoscasos,tenhamsetornadomaisirmesemsua determinao medida que a guerra se arrastava. Na verdade,enquanto a fadiga de guerra inalmente desencadeou os colapsosrevolucionrios na Rssia em 1917 e na Alemanha e na ustria-Hungriaem 1918, durante a maior parte da Primeira Guerra Mundial, os civisperseveraram como seus equivalentes dos pases Aliados ocidentais,rejeitando a noo de uma paz negociada que tornaria sem sentido noapenas suasprivaespessoais,mas,mais importante, asmortesde seusilhos, irmos, pais e outros entes queridos. Essa perseverana serviu deaviso para lderes polticos sobre o risco, bem como a recompensa, damobilizao de um pas para um esforo de guerra total na era donacionalismomoderno:aguerranopoderia servencida semesseapoio,mas,umavezqueosgovernosorecebiam,passavaaserumaquestode

  • tudo ou nada, pois seu prprio povo no aceitaria a negociao deconcesses como recompensaparaesses sacricios.A infameobservaoatribuda a Joseph Stalin durante seus Grandes Expurgos da dcada de1930, de que uma morte uma tragdia e um milho de mortes, umaestatstica, poderia facilmente ter sido aplicada ao derramamento desangue da Primeira Guerra, e realmente teria sido impensvel se essasangria no tivesse chegado antes. A Primeira Guerra Mundial umarevoluo global emmuitos aspectos acima de tudo redeiniu o que aspessoaspoderiamaceitar,suportaroujustificar,eporissosedestacacomoum marco na experincia humana pelo tanto que dessensibilizou ahumanidadeparaadesumanidadedaguerramoderna.

    Notas1 Dankl, citado em Holger H. Herwig,The FirstWorldWar: Germany and Austria (London: Arnold,1997),55.

    2FredR.Shapiro,TheYaleBookofQuotations(NewHaven,CT:YaleUniversityPress,2006),329.3CharlesCourtRepington,TheFirstWorldWar,1914-1918(London:Constable,1920).

  • OMUNDOEM1914EASORIGENSDAGUERRA

    GeorgeGranthamBainCollection(LibraryofCongress),21out.1911.

    CasamentodoarquiduqueCarlosedaprincesaZitaem1911.ApsoassassinatodeFranciscoFerdinando,elesetornouherdeirodotronodaustria-Hungria.

    Cronologia

    1878. O Congresso de Berlim altera as fronteiras nosBlcs;oImprioOtomanoenfraquece.1882. formada a Trplice Aliana (Alemanha, ustria-HungriaeItlia).1889-14.ASegundaInternacionalSocialistaseconiguraemumimportantefrumcontraomilitarismo.1892-94. Frana e Rssia concluem uma convenomilitareumtratadodealiana.

  • 1898. O Reichstag alemo aprova o Plano Tirpitz deexpansonaval.1898. A Guerra Hispano-Americana sinaliza aemergnciadosEstadosUnidoscomopotnciaimperial.1899-1902. A Guerra Anglo-Ber expe o isolamentobritnico;AlianaAnglo-Japonesa(1902).1903. Golpe na Srvia instala no poder a dinastiaKarageorgevi,pr-Rssia.1904.AEntenteCordialeuneFranaeGr-Bretanha.1904-5.AGuerraRusso-Japonesapreiguraaguerradetrincheiras.1906. OHMS Dreadnought lanado aomar; intensiica-seacorridanavalanglo-germnica.1907.AEntenteAnglo-RussacompletaaTrpliceEntente.1908.Austria-HungriaanexaaBsnia(ocupadadesde1878).1911-12. AGuerra talo-Turcamarca o primeiro uso deaviesemcombate.1912-13.AsGuerrasdosBlcsenfraquecemaindamaisoImprioOtomanoedesestabilizamaregio.

    Tologooscanhessilenciaramemnovembrode1918,teveincioabatalha a respeito das origens da Primeira Guerra Mundial. Governosvidos por defender as decises que tinham tomado no vero de 1914publicaram compilaes de documentos oiciais, editados de modo aapresentar suas aes sob a luz mais favorvel possvel, ao passo quehistoriadoresdetodosospaseslanaram-setarefadeexplicarascausasdo conlito. A deciso dos vitoriosos de incluir no Tratado de Versalhes

  • uma clusulade culpa reletia a convico,unnimeem1919,dequeaAlemanha tinhasidoresponsvelpelaguerra.Esseveredicto foi rejeitadopor praticamente todos os acadmicos alemes e, durante a dcada de1920,porumamploespectrodehistoriadoresrevisionistasqueeximirama Alemanha e culparam o sistema de alianas e as outras grandespotncias, consideradas em conjunto ou individualmente. Se oantirrevisionismo da dcada de 1950 voltou a imputar aos alemes amaiorparceladeresponsabilidade(veraseguirPerspectivas:asorigensdaguerra),osestudiososdasdcadasseguintesexplorarammaisafundoopapeldecadaumdosbeligerantes,suaspolticasinternas,alinhamentosdiplomticos e objetivos de guerra em 1914. Fatores gerais comonacionalismoeoutrasideologias,acrenaqueosmilitaresdepositavamnaguerradeofensivaeascorridasarmamentistaspr-guerra,tambmforamalvodeescrutniomaisdetalhado.

    AcrisequeresultounaeclosodaPrimeiraGuerraMundialocorreunombitodeumsistemaderelaesinternacionaiscujasrazesremontavamPazdeWestflia(1648),aoinaldaGuerradosTrintaAnos.OgrupodequatroaseispasesmaispoderososdaEuropairmavaourompiaalianasembuscadeseusprpriosinteresses,nombitodeumequilbriogeraldepoder,mas, em perodos de paz, esses pases raramente se dividiam emcampos armados hostis entre si. Isso mudou na dcada anterior delagraodaPrimeiraGuerraMundial, quandoGr-Bretanha, Frana eRssia formaram a Trplice Entente, como resposta Trplice AlianairmadaentreAlemanha, ImprioAustro-Hngaro (ouustria-Hungria) eItlia.ATrpliceAliana,acordomilitarestabelecidoem1882,iguravaem1914 como a mais longeva aliana multilateral em tempos de paz nahistria da Europa, perdurando apesar da vigorosa e recprocaanimosidade entre ustria-Hungria e Itlia, porque ambas consideravamindispensvelaamizadecomaAlemanhanocasodaprimeira, contraaRssia; para a ltima, contra a Frana. A Trplice Entente, em contraste,tinha sido formada por trs acordos separados a conveno militar eAliana Franco-Russa (1892-94), a Entente Cordiale Anglo-Francesa(1904)eaEntenteAnglo-Russa (1907) todasmotivadaspelo temoremrelaoaocrescentepoderioalemo.

    ATrpliceAliana:Alemanha,ImprioAustro-HngaroeItlia

  • PERSPECTIVAS:ASORIGENSDAGUERRA

    O historiador norte-americano Laurence Lafore(1917-85) caracterizou a Europa no perodo pr-guerra como um barril de plvora de tenses, dasquais a mais complicada era a ameaa srvia aoImprioAustro-Hngaro:

    Havia a Alscia-Lorena: caso se iniciasseumaguerraentreAlemanhaeFrana,estasaceitaria a paz se a Alscia-Lorena fossedevolvida[...][e]aAlemanhajamaisadmitiriaa perda das provncias. Havia a rivalidadenaval anglo-germnica: declarada a guerra, aGr-Bretanhanoaceitariaapaz,amenosquea ameaa de uma marinha alem poderosafosse permanentemente extirpada. HaviaConstantinopla:depoisdedeflagradaaguerra,o governo russonoaceitaria apaz antesde[...] satisfazeraambioquehsculos tinhapor Constantinopla. Havia o cerco Alemanha:iniciadaaguerra,opassacataria[...] a paz se o cerco fosse rompido, o queimplicava o esmagamento da Frana e daRssia [...]. Mas [...] havia um problemainegocivel e incontrolvel, suscitado porameaas integridade do Imprio Austro-Hngaro. A composio da monarquia dosHabsburgos a deixava em posiomortalmente vulnervel s atividades dossrvios; ao mesmo tempo, diicultava aeliminao dessas atividades por meio deaorpidaeresoluta[...].FoiesseproblemaocausadordaquelaqueveioaseraPrimeiraGuerraMundial.

  • Fonte:LaurenceLafore,TheLongFuse:An Interpretationof theOriginsofWorldWarI,2ed.(Filadlfia,PA:Lippincott,1971),267-68.

    ***

    Fritz Fischer (1908-99) notabilizou-se como oprimeiro acadmico alemo importante a atribuir Alemanha a culpa pela ecloso da guerra, e tambmcomo estudioso socialista defensor da primazia dasconsideraes internas nas decises de polticaexterna,particularmenteasdaAlemanhapr-guerra:

    O objetivo [alemo] era consolidar aposio das classes dominantes com umabem-sucedidapolticaexternaimperialista;naverdade, esperava-se que uma guerraresolvesse as crescentes tenses sociais. Aoenvolver as massas no grande conlito, aspartesdanaoqueatento semantinhamapartadas seriam integradas ao Estadomonrquico. Em 1912, em todo caso, a criseinterna era evidente [...]. O dinamismo comque, aliada a componentes internos, aliderana imperial tinha iniciado em 1897uma poltica mundial vigorou seminterrupo at 1914, j que a esperana deento era de uma Grande Alemanha e apreservao do sistema conservador. Asilusescriadasem1897levaramsilusesde1914.

    Fonte: Fritz Fischer,Warof Illusions: GermanPolicies from1911 to 1914 ,trad.Marian Jackson (NovaYork:W.W.Norton,1975), viii-ix. (1975,W.W.Norton&Co.,Inc.eChatto&WindusLtd.UsosobpermissodaW.W.Norton&Co.)

  • AAlemanha alcanou a uniicaopoltica sob os auspcios daPrssiagraas liderana de Otto von Bismarck, cujas vitoriosas guerras contraDinamarca (1864),ustria (1866) e Frana (1870-71) levaram criaodoSegundoReich, tendo como imperadoro rei prussianoGuilherme I. Sepor um lado anexou territrios da Dinamarca (Schleswig-Holstein) e daFrana (Alscia-Lorena), Bismarck fez da ustria (a partir de 1867,ustria-Hungria) o aliadomais prximo da Alemanha e o alicerce de umsistemadealianasps-1871cujopropsitoeramanteraFrana isolada.A constituio da Alemanha Imperial dava sustentao a um chancelerforte, que prestava contas ao imperador, e no a umamaioria legislativa.Bismarckcriouocargoparasimesmoenelesemantevede1871a1890;ao longo dos 28 anos seguintes, a funo foi exercida por sete homensmenos competentes, dos quais os mais notveis foram Bernhard vonBlow(1900-9),queantesdesetornarchanceleratuoucomoministrodoExterior(verboxOlugaraosoldaAlemanhaaseguir)eTheobaldvonBethmann Hollweg (1909-17). O Reichstag avaliava projetos de leiapresentados pelo chanceler por meio da Bundesrat, cmara superiorcomposta por representantes nomeados pelos governos dos estadosgermnicos, mas no podia legislar. Equilibrando esses aspectosautoritrios, a Constituio de 1871 fez daAlemanha a segunda potnciaeuropeia depois da Frana a realizar eleies com base no sufrgiouniversal masculino. Uma vibrante cultura poltica inclua seis grandespartidos,dosquaisoPartidoSocialDemocrata(SPD,nasiglaemingls)eoPartidoCatlicodeCentro, precursor daUnioDemocrataCrist ( CDU, nasigla em ingls) ps-Segunda Guerra Mundial, teriam importnciaduradoura. Entre 1890 e 1913, a populao alem aumentou de 49milhespara67milhesdehabitanteseasreasurbanasduplicaramdetamanho.OProduto InternoBruto (PIB)per capita icava atrs apenas deEstados Unidos, Gr-Bretanha e domnios britnicos e a produoindustrial do pas ultrapassava a da Gr-Bretanha. Do ponto de vistapoltico,essasmudanasfortaleceramoSPD,partidodapredileodamaiorpartedacrescenteclasseoperriadopas,queganhou foraaindaqueaconstituiodeBismarckno tenhapromovidoumanovadivisodistritalpara dar conta das mudanas na populao. Na eleio de 1912, oSPDobteve35%dovotopopularduasvezesmaisquequalqueroutropartido e assegurou 27% das cadeiras do Reichstag. A ascenso do SPDpreocupavaoimperadorGuilhermeIIeoslderesconservadores,porqueopartido apoiava reformas que fariam da Alemanha uma verdadeiramonarquiaconstitucionaletambmseopunhaagressivapolticaexterna

  • do pas, votando sistematicamente contra o investimento de recursos noexrcito mais poderoso e na segunda maior frota naval da Europa. Aesquadramaisprejudicoudoquebeneiciouos interessesestratgicosdaAlemanha, impelindo a Gr-Bretanha a se bandear para o lado de seustradicionaisrivais,FranaeRssia,almdeconsumirmaisdeumterodooramento destinado defesa nacional. Somente em 1913, o Reichstagreverteu essa tendncia, aprovando um aumento de 18%do contingenteemperodos de paz do exrcito alemo, que agora passava a contar com890milhomens.

    OLUGARAOSOLDAALEMANHA

    Em seu primeiro discurso no Reichstag, em 6 dedezembrode1897,BernhardvonBlow(1849-1929),ministro do Exterior alemo de 1897 a 1900 echanceler de 1900 a 1909, rebateu de maneiraligeiramenteveladaemordazabazia inglesadequeosolnuncasepenoImprioBritnico.DefendendooinciodoimperialismoalemonaChinaatomadadeJiaozhou, em retaliao ao assassinato de doismissionrios catlicos alemes na China em 6 denovembro , ele airmou que a Alemanha tambmdeviaterseulugaraosol:

    Os dias em que os alemes concediam aterraaumvizinho,aoutroomarereservavampara si o cu, onde reina a doutrina pura esses dias chegaram ao im. A nosso ver, tarefa primordial fomentar e cultivar osinteresses danossamarinha, nosso comrcioe nossa indstria, principalmente no Oriente.Uma diviso de nossos cruzadores foidespachadaparaocuparoportode Jiaozhou,de modo a assegurar plena reparao peloassassinatodemissionrioscatlicosalemesegarantirmaiorseguranacontraarepetio

  • deeventoscomoessenofuturo.[...] Devemos exigir que missionrios,

    comerciantes e mercadorias alemes, bemcomo a bandeira e as embarcaes alems,sejam tratados na China com o mesmorespeito de que desfrutam outras potncias.Ficamos felizes de respeitar os interesses deoutras potncias na China, desde quetenhamos a certeza de que os nossosinteresses tambm recebero oreconhecimentoquemerecem.Emsuma,noqueremos fazer sombra a ningum, mastambmexigimosnossolugaraosol.

    Fiis tradio das polticas alems,empreenderemos todos os esforos paraproteger nossos direitos e interesses na sia[...] sem aspereza desnecessria, mastampoucosemfraqueza.

    Fonte: Bernhard von Blow on Germanys place in the sun (1897),traduzido por Adam Blauhut paraGerman History in Documents andimages, disponvel em http://germanhistorydocs.ghi-dc.org/sub_document.cfm?document_id=783, deStenographischeBerichteberdieVerhandlungendesReichstags,Vol.1,IXLP,5sesso,Berlim,1898,60.

    Depois que a derrota para a Prssia em 1866 deu im a seu papeltradicional nas questes alems, o Imprio Austraco transformou-se naMonarquia Dual da ustria-Hungria. Da por diante, Francisco Jos(imperadordesde1848)comandouumEstadodeestruturasingular,compoltica externa comum e exrcito e marinha nicos, mas com doisprimeiros-ministros e gabinetes separados, com parlamentos em Viena eBudapeste. ustria e Hungria mantinham suas prprias leis, cidadania emilitares da reserva independentes, e renegociavam suas relaeseconmicas a cada dez anos. Esse compromisso de 1867 tinha comointuito fomentar a paz interna no multinacional domnio habsburgo, ao

  • elevar os hngaros tnicos (magiares) a um status de igualdade com osaustracos alemes tradicionalmente dominantes; porm, uma vez queestesltimoscompunhamapenas25%dossditosdeFrancisco Joseosmagiares respondiam por 20% da populao, a medida mais exclua doque inclua. Para a ustria-Hungria, mais do que para qualquer outrapotncia europeia, poltica interna e poltica externa eraminextricavelmenteindissociveis.OPIBpercapitadaMonarquiaDualicavaatrsdetodasaspotnciaseuropeiasanoseraRssia,emetadedesuastransaes econmicas era realizada com a Alemanha, o que deixava austria-Hungria na desconfortvel posio de aliado dependente. Masambas as nacionalidades dominantes apoiavam os laos estreitos com oSegundoReich(oqueosaustracosalemesviamcomoalgoquasetobomquanto fazer parte da Alemanha; j para os magiares era a melhorgarantia contra uma invaso russa a partir do leste). O movimento pan-eslavista, apoiado pela Rssia, desfrutava de grande simpatia junto intelligentsiadasnacionalidadeseslavasquecompunhamquasemetadedapopulao total de 52milhes de habitantes (em1913), e a presena demilhes de italianos, romenos e srvios no Imprio afetava suas relaescomessespasesvizinhos.Cadaumadasmetadesdo Imprioencaravasua prpria maneira o problema da nacionalidade, mas nem uma nemoutraeracapazdeoferecermuitaesperanaparaofuturo.AustriadavaatodasassuasnacionalidadesacessoaoParlamentoviasufrgiouniversalmasculino, instaurado em 1907, mas acabou tendo 22 partidos noReichsrat de 1911, o que impossibilitava os primeiros-ministros deformaremumamaioriaparagovernar.Emcontraste,apolticahngaraderestrio ao votomantinha o poder nasmos dosmagiares e, exceto porum nmero ixo de assentos reservados aos croatas, o restante dapopulaono contava com representaopoltica. FranciscoFerdinando,sobrinho e herdeiro do j idoso Francisco Jos, esperava reduzir adependncia da ustria-Hungria em relao Alemanha e reorganizar oImprioparadarpoderes aos eslavosdo sul como terceira forapoltica.Essas ideiasgranjearam-lhea inimizadedemuitosaustracosalemes,dequase todos os magiares e daqueles eslavos (especialmente os srvios)que temiamuma revitalizaodo Imprio.O exrcito austro-hngaronotinhamuitapopularidadejuntoaopblicoenementreospolticos,e,comoresultado, a Monarquia Dual tinha o menor exrcito per capita entre aspotncias europeias um contingente em tempos de paz de apenas 400mil homens. Por outro lado, uma marinha de guerra pequena, masrespeitvelumadasinstituiesverdadeiramenteintegradasdoImprio

  • desfrutava demelhor reputao e, por volta de 1912, recebiamais de20%dototaldooramentodestinadodefesa.

    AItliaalcanouaunidadenacionalnamesmadcadaqueaAlemanha;oreinodaSardenha-PiemontedesempenhouomesmopapeldaPrssiaeomonarcasardo-piemontsVtorEmanuelIItornou-serei.Assemelhanasacabama.OcorrespondenteitalianodeBismarck,CamiloBensodiCavour,contou com a Frana na guerra de 1859 para expulsar a ustria de boaparte dos territrios do norte da Itlia e com os revolucionrios deGiuseppe Garibaldi para assegurar, no sul, o controle de Npoles e daSiclia.QuandoCavourmorreu,poucodepoisdaproclamaodaUniicaoem1861,VenezaaindaestavaemmosaustracaseopapaaindareinavaemRoma.SeussucessoresadquiriramVenezaaliando-sePrssiacontraaustriaem1866adespeitodaderrotaparaaustriaemterraemareanexaramRomaapsaderrotadoprotetordopapa,Napoleo III,paraaPrssia, em1870.Depoisdisso,os italianos icarampoucovontade comrelao a sua nada gloriosa uniicao. At sua morte, em 1882, orepublicano Garibaldi foi o mais idolatrado dos heris do pas, mas,felizmenteparaamonarquia,participouapenasporumbreveperododocenriopolticoitaliano,emmeadosdadcadade1870,apesardetersidoeleito para o Parlamento por eleitores de diversos distritos. O PartidoLiberal, centrista, dominou o Parlamento de 1870 a 1914; amaior partedos republicanos, caso de Garibaldi, aceitou com relutncia a monarquiaconstitucional italiana ao estilo britnico, ao passo que muitos catlicosconservadores deram ouvidos ao apelo do papa Pio IX para protestarcontra a anexao de Roma, boicotando totalmente a poltica italiana. Aquesto dostatus do papavis--vis oEstado italiano impassequedurouat que o Tratado de Latro de Mussolini estabelecesse a Cidade doVaticano tambm afetava o reino em termos internacionais. Visitantesoiciais de pases com populao catlica numerosa, incluindo aliados daprpriaItlia,Alemanhaeustria-Hungria, tinhamdeserhospedadosemoutras cidades que no Roma. Polticos italianos ambiciosos, que viam aFranacomooprincipalrivaldeseupas,defenderamaTrpliceAlianae,depoisde1882,formularampolticasnavaisecoloniaisquedependiamdoapoiodiplomticoalemo,aceitandocomopartedabarganhaaalianacomos austracos e que a ustria mantivesse a posse de territrios italianostnicosnosAlpes (oTiroldoSulouTrentino)enomarAdritico.Onorteindustrializado da Itlia impulsionou oPIB per capita a um nvelsigniicativamentemaisaltodoqueodaustria-Hungria,masopaseraomenospopulosoentreasgrandespotncias(35milhesdehabitantesem

  • 1913) e o de menor poderio blico. Na verdade, com apenas 250 milhomens,ocontingenteitalianoeraomenorentreasgrandespotnciasdaEuropaexceodaGr-Bretanha,etodasasoutras,anoseraustria-Hungria, tinhammarinhas de guerramais fortes. A Itlia perdeu a f naTrpliceAlianadepoisde1900,quandoadeterioraodasrelaesanglo-germnicas fezpairaroespectrodaguerracomoImprioBritnico,mas,s vsperas da Primeira Guerra Mundial, a Guerra talo-Turca (1911-1912) prejudicou as relaes da Itlia com os trs membros da TrpliceEntenteeresultounarenovaodaTrpliceAlianaem1912.

    PrintsandPhotographsDivision(LibraryofCongress),c.1915.

    Filhodemeinglesa,GuilhermeIIfoiimperadoralemode1888a1918.

    ATrpliceEntente:Gr-Bretanha,FranaeRssiaSob aPax Britannica da Era Vitoriana, a Gr-Bretanha atuara como

    potnciahegemnicaglobal,airmandoapossedeumquartodasupercieterrestredoplaneta,preponderandonosoceanoscomamaiorfrotanaval

  • domundoedominandoaeconomiacomumsetorindustrialcujaproduosuperou,duranteanos,adetodososoutrospasescombinados.Conianteemseuisolamentoesplndido,aGr-Bretanhatambmexerciaemlargamedidaoqueos especialistas em relaes internacionais chamamdesoftpower, ou poder suave, no apenas por conta de seu sistemaparlamentarmuitoadmiradoeseusconceitosdedireitos individuais,mastambmgraasaumatremenda inlunciasobreaculturamundial, tantono nvel de elite como em suas formasmais populares. Essas conquistas,tomadas em conjunto, suscitaram uma reao internacional que incluauma complexamistura de admirao, inveja e, em alguns casos, franca etotalhostilidade.Noplanointernacional,aGuerraAnglo-Ber(1899-1902)salientou o isolamento da Gr-Bretanha, para desconforto dos lderesbritnicos,que,depoisdisso,rapidamentesemobilizaramparaestabeleceruma aliana com o Japo (1902), a Entente Cordiale com a Frana e areaproximaocomaRssia(1907)estesdoisltimosacordoslanaramas bases para a Trplice Entente. OPIB per capita da Gr-Bretanhacontinuava sendo o maior da Europa, mas tinha icado para trs nacomparao com os Estados Unidos, e sua envelhecida base industrialtinha sido sobrepujada pela Alemanha em reas fundamentais como aproduo de ao. Contudo, inovaes da Marinha Real como o navio deguerraHMSDreadnought(couraado)(1906)emodelosdecruzadoresdebatalha permitiram que a Gr-Bretanha enfrentasse com xito a ameaanaval alem. O governo liberal de Herbert Asquith (primeiro-ministro de1908 a 1916) inanciou a expanso naval e um ambicioso programa debem-estar social. Em1909, o ento chanceler do Tesouro (cargoequivalenteaodeministrodasFinanas)DavidLloydGeorgeintroduziuoOramento do Povo, que propunha uma indita cobrana de impostosdos ricos. A medida no foi aprovada pela Cmara dos Lordes,majoritariamente conservadora, e os liberais revidaram com a LeiParlamentarde1911,eliminandoopoderdevetodoslordes.Apartirda,todo e qualquer projeto de lei que fosse aprovado pela Cmara dosComunsemtrssessesconsecutivas tornava-se lei,oqueabriucaminhoparaa resoluodavelhaquestodoHomeRule (governoautnomo)daIrlanda(ondeviviamquase5milhesdototalde46milhesdehabitantesdaGr-Bretanhapr-guerra),queos liberaishaviamuitodefendiameaoqual os conservadores se opunham. O Partido Trabalhista, terceira foraemergentenapolticabritnica,apoiouosliberaisnasquestesdareformaedaIrlanda,masnenhumdostrspartidosteveacoragemdeencamparosufrgio feminino, cujosproponentespassaram,depoisde1910, a adotar

  • tticas cada vez mais violentas. s vsperas da guerra, o governoautnomo foi inalmenteaprovadoem formade lei e entrouemvigor emsetembro de 1914. Mas com a ecloso da guerra, os trmites foramsuspensosporAsquithenquantodurasseoconlito,medidaqueenfureceuamaioriacatlicadaIrlandaefortaleceuosrevolucionriosdentrodela.AimdevenceracorridanavalcomaAlemanha,entre1907e1913aGr-Bretanha aumentou em 57% os gastos com a marinha de guerra; nomesmoperodo, os gastos como exrcitode200mil voluntrios subiramapenas 6%. O relativo declnio da Gr-Bretanha na Europa aumentou aimportnciaestratgicadeseuimprio(veraseoDomniosecolnias).

    Em1914, a Frana eraprovavelmente amais vulnervel das grandespotncias exceo feita ustria-Hungria ,mas sua parceria cada vezmais intensa com a Gr-Bretanha sob a Entente Cordiale, a rpidarecuperao da Rssia aps a derrota na Guerra Russo-Japonesa e areaproximao anglo-russa de 1907 tinham melhorado em muito suasituao estratgica. O isolamento que a Frana enfrentara durante aGuerra Franco-Prussiana (1870-1871) e a oicializao da ConvenoMilitarFranco-Russa(1892)eramcoisadopassado.ATerceiraRepblica,estabelecida aps a derrota de Napoleo III em Sedan, em 1870, contavacomuma legislatura forte eumpresidente fraco e eleitopor via indireta,sacriicandoaestabilidadeparasepoupardodestinodasduasrepblicasfrancesas anteriores (que deram lugar s monarquias napolenicas em1804e1852).Entre1871e1914,ocargodeprimeiro-ministromudoudemos49vezes.Napolticaexterna,aTerceiraRepblicafoirevolucionria,pelomenos no sentido revisionista, no que tangia ao seu posicionamentoacerca da Alscia-Lorena. Nenhum poltico francs que admitissepublicamenteaceitaraanexaodasprovnciasporBismarcktinhachancede ser eleito. O conservador exrcito francs estava profundamenteabaladopeloCasoDreyfus(1894-1906),emqueocapitoAlfredDreyfus,o nico oicial judeu do exrcito, foi acusado de repassar segredos aosalemes. O caso revelou um profundo abismo poltico e social entrecatlicos conservadores e secularistas liberais; estes, triunfantes aps aexoneraoeprisodeDreyfus,jogaramnolixoaConcordatadeNapoleode 1801, obtendo assim a separao entre Igreja e Estado, e izerampresses exigindo um exrcitomais igualitrio, com dois anos de serviomilitar obrigatrio. Essas medidas ajudaram a provocar uma reaoconservadoranaseleieslegislativasde1910,eacrisefranco-germnicaem funo do Marrocos, no ano seguinte, prenunciou um renascimentonacionalista. Voltou ao primeiro plano a questo da Alscia-Lorena,

  • personiicada por Raymond Poincar (presidente de 1913 a 1920),nascidonaLorenaeparaquemodestinodasduasprovnciasperdidaseraa base de um antigermanismo visceral. Entre as potncias europeias, aFrana tinha o terceiro maior PIB per capita, pouca coisa atrs daAlemanha, mas, por conta de tendncias demogricas, os franceses noestavamemposiodelutarsozinhoscontraosalemes,emparteporquea Frana foi o primeiro pas cuja populao tinha praticado em amplaescala o controle de natalidade. No inal do sculoXIX, a Frana tinha amenortaxadenatalidadedaEuropae,em1913,suapopulaoestavanacasados40milhesdehabitantes,apenasdoismilhesamaisdoqueem1890. Um ano antes da ecloso da guerra, a Frana aumentou seucontingentedetemposdepazpara700milhomens(aAlemanhatinha890mil),mas recorrendo a um perodo de serviomilitar obrigatrio de trsanos(naAlemanha,eramdois)eaumentandoosgastoscomadefesapara36% do oramento nacional (na Alemanha, eram 20%). Os aliados daFrana no apoiariam uma tentativa de recuperar a Alscia-Lorena pormeiodeumaguerraviolenta,mas,emcasodeconlitogeneralizado,nemaFrana nem seus aliados aceitariam a paz se as provncias continuassememmosalems.

    ARssiaczaristaeaFranarepublicana,emtermosideolgicososmaisimprovveis dos parceiros, s vsperas da Primeira Guerra Mundialtinhama alianamais irme e os laosmais estreitos.ARssia entrounosculoXXcomoaltimamonarquiaabsolutistadocontinente,bemcomoamais atrasada economia europeia. O pas estava se industrializandorapidamente,graas,emparte,aemprstimosdaFrana,mas40%deseucomrcioexteriorera realizadocomaAlemanha,omaior importadordosgrosrussos.EmtermosdePIBpercapita,aRssiaicavaatrsatmesmoeporamplamargemdaustria-Hungria,eapenas7%dos175milhesdesditosdoczarNicolauIIviviamemreasurbanas.Poucoscamponesestinham prosperado aps a abolio da servido em 1861, e odescontentamento do campesinato, somado ao desagrado da pequena esobrecarregada classe operria do pas, levou a uma revoluo contraNicolauem1905,duranteaguerraperdidacontraoJapo.Oczarsalvouotrono aceitando uma monarquia constitucional limitada. O primeiro-ministrorusso(comoochanceleralemo)sprecisavaresponderporsuasaesaomonarca;joParlamento,ouDuma,convocadopelaprimeiravezem 1906, foi eleito com tantas restries de poder e limitaes deautoridade que deixava sem representao a maioria dos camponeses edos operrios. Nicolau encontrou seu homem forte em Piotr Stolypin

  • (primeiro-ministrode1906a1911),cujoassassinatoem1911deixouumvcuo jamais preenchido. Em 1907, a Rssia deu im sua longevarivalidade com a Gr-Bretanha em um acordo que delineava suasrespectivas esferas de interesse desde a Prsia, passando pela siaCentral at o ExtremoOriente. Na esteira da sua derrota para o Japo, aentente russa com a Gr-Bretanha deixava apenas os Blcs como rotapara futura expanso. O pan-eslavismo russo despertou sentimentos nasnaeseslavas emergentesdosBlcs Srvia,MontenegroeBulgria ,que tinham em comum a religio Ortodoxa Oriental russa. A RssiatambmtinhaamigosnaRomniaenaGrcia,naesortodoxas,masnoeslavas,etodaaregioaadmiravaporseupapelhistricocomoprincipalinimigadaTurquiaotomana.Ospan-eslavistas russos tambm instigaramrevolucionrios entre as nacionalidades eslavas que viviam na ustria-Hungria. A Monarquia Dual retaliou oferecendo refgio e apoio aosrevolucionrios russos, incluindo Lenin, Trotski, Stalin e boa parte doslderes bolcheviques de 1917, todos eles vivendo no Imprio Austro-Hngaro em 1914, bem como o socialista polons Jzef Pilsudski, quecomandou uma legio polonesa ao lado das tropas austro-hngaras nafronteiracomaRssiapoucodepoisdo inciodaguerra.Oexrcito russode 1,3 milho de homens, o maior do mundo, tinha sido destroado pormotinsduranteaguerracomoJapo,eamaiorpartedasembarcaesdeguerratinhasidoafundada.Exrcitoemarinhaserecuperaramempoucotempo,emboraopasaindanodispusessedabaseindustrialparamant-losadequadamente.Em1914,ograuemqueAlemanhaeImprioAustro-Hngaro subestimavam a Rssia talvez tenha sido o maior trunfoestratgicorusso.

    GeorgeGranthamBainCollection(LibraryofCongress).

  • OsbritnicoscontavamcomopoderblicodonavioHMSDreadnought.

    OImprioOtomanoeasguerrasnosBlcsDesdequeos turcosotomanos tomaramConstantinoplaederrubaram

    oImprioBizantino,em1453,aregiosudestedaEuropaconhecidacomoBlcs(otermofazreferncia cordilheiradosBlcsnolestedaSrviaeBulgria) passou a servir como ponte entre a Europa e o OrienteMdiomuulmano.Aps seuapogeudepoderem1683,quandoosexrcitosdosultocercaramViena,os turcos foramprogressivamenteperdendo forae territrio: para os austracos nos Blcs ocidentais, para os russos noCucaso e em torno do mar Negro e, por im, para movimentosnacionalistas ou autonomistas locais (s vezes apoiados por vriascombinaesdegrandespotncias)nosulenolestedosBlcsenonorteda frica. No sem justiicativa, os polticos do sculoXIX apelidaram oImprioOtomanodeodoentedaEuropa.

    Durante o sculoXIX, o Imprio Otomano buscou semodernizar, mas,sem sua prpria revoluo industrial, dependia da Europa para obterarmas, produtos manufaturados e o conhecimento tcnico especializadoparaaconstruodeferroviaseaexploraodesuasmatrias-primas.Osturcos (como fariam mais tarde chineses e japoneses) concederamhumilhantesprivilgiosextraterritoriaisaosespecialistasestrangeirosquegerenciavamessesprojetos; em1882, depoisqueo sultono conseguiuhonrarseusemprstimos,advidadoEstadootomanopassouasergeridapor europeus. Uma srie de sultes usou seus poderes absolutos para

  • reorganizar, nosmoldes europeus, suas foras armadas, a burocracia, asescolaseosistemajurdico.Essasmedidasgranjearam-lhesainimizadedepoderosos e nobres locais e regionais, lderes islmicos e devotosmuulmanosemgeral,e,emcertosentido,prenunciaramorduoesforode alguns governantes do sculoXX na tentativa de estabelecer Estadosmais seculares. A secularizao colocou particularmente em risco alealdade da populao muulmana no turca do Imprio de maioriarabe e sunita , porque, durante sculos, os sultes turcos tambmtinhamsidoreconhecidoscomocalifas(sucessoresdoprofetaMaom)pelamaioria sunita dos muulmanos do mundo. Ironicamente, os otomanossucumbiramnoaosadversriosdareforma,masadefensoresfrustradosde reformas mais amplas. O movimento dos Jovens Turcos, iniciado em1889, buscou reduzir o sulto a uma igura decorativa e revitalizar oImprio como um Estado nacional turco constitucional e secular.Iniltrando-se aos poucos entre os oiciais do exrcito otomano, os JovensTurcostomaramopoderemumgolpe,em1908.GovernandocomoPartidoUnionista (Comit de Unio e Progresso), implementaram um programaqueincluaigualdadejurdicaparatodasasnacionalidadeseliberdadedereligio,mastambminstituramoturcocomolnguaoicial.EssasmedidasameaaramaspopulaesrabeearmniadoImprio,eespecialmenteoseslavosnapartedosBlcsaindasobdominaoturca.

    PorocasiodogolpedosJovensTurcos,omapadosBlcsvinhadeumperodo de estabilidade desde o Congresso de Berlim (1878), que deureconhecimentoformalindependnciadeSrvia,MontenegroeRomnia;aBulgriapermaneceraautnoma,masaindasobsuseraniaotomana,eaBsnia-Herzegovina ainda era tecnicamente otomana, mas ocupada pelaustria-Hungria. Temendo uma mudana para pior sob o governo dosJovensTurcos,em1908austria-HungriaanexouaBsnia-HerzegovinaeaBulgriadeclarouindependncia.Osturcosaceitaramessasperdas,masbuscaram manter seus territrios balcnicos remanescentes Albnia,Macednia e Trcia , cobiados em conjunto ou em parte por Bulgria,Srvia, Montenegro e Grcia. Depois que os turcos se envolveram naGuerra talo-Turca (1911-1912), esses quatro pases formaram a LigaBalcnicaesemobilizaramparaaguerra.Emoutubrode1912,quandoosturcos izeram as pazes com os italianos, abrindo mo da Lbia, a Ligadeclarouguerra ao ImprioOtomano, iniciando, assim, aprimeiraGuerradosBlcs.Entreasgrandespotncias,aRssiaapoiouaLigaeaustria-Hungria,osotomanos,eastensesentreosdoisimpriosicaramsriasapontodecadaummobilizarparcialmenteseusexrcitos.Quandoaguerra

  • chegouao im, emmaiode1913, as grandespotnciaspermitiramque aSrviaicassecomKosovoeaGrcia,compiro,masdeterminaramqueorestante do territrio albans fosse cedido para um novo pasindependente. A Grcia tambm recebeu Creta e dividiu com a Srvia aMacednia, limitando Trcia os ganhos da Bulgria. Incitados por umaviolenta indignao pblica por conta do magro esplio, apenas ummsdepoisosblgarosdeclararamguerraSrviaeGrcia,naesperanadeassegurar parte daMacednia. Na breve segunda Guerra dos Blcs, osturcos retomaram as hostilidades contra os blgaros, e Montenegrotambminterveio,masaentradadaRomnia(quesemantiveraneutranaprimeiraGuerradosBlcs)semostroudecisiva,oquelevouaBulgriaaabandonar parte de suas conquistas anteriores na Trcia, de modo a sedefender contra uma invaso romena desde o norte. No acordo que deuimaoconlitoemagostode1913,aBulgriarecuperouaTrciaocidentale uma rota de sada para omar Egeu,mas devolveu a Trcia oriental aoImprio Otomano e cedeu Dobruja Romnia. As Guerras dos Blcsdeixaram a regio mais voltil do que nunca. As perdas territoriaisotomanas (tanto na Guerra talo-Turca quanto nas Guerras dos Blcs)tinham reduzido a populao do Imprio a apenas 21 milhes dehabitantes, contra os 39 milhes em 1897, embora os turcos aindagovernassem6milhesdenomuulmanos.

    Em janeiro de 1913, enquanto a primeira Guerra dos Blcs perdiafora, os Jovens Turcos eliminaram seus adversrios remanescentes eestabeleceramumEstadodepartidonico.Entreoslderesdessesegundogolpe estava Ismail EnverBeyefendi (EnverBey), que se tornouministrodaGuerraaos31anosdeidade.SeupapelsubsequentenareconquistadaTrciaorientalnasegundaGuerradosBlcsgranjeou-lheottulodepax,enoinciode1914eleassumiuopapeldechefedoEstado-Maior.Nessasfunes, ele trabalhou em colaborao estreita como general Otto Limanvon Sanders, chefe de uma misso militar alem instalada emConstantinopla emoutubro de 1913.Uma vez que os turcos (pelomenosdesde a Guerra da Crimeia) dependiam da proteo britnica e francesacontra a Rssia, o alinhamento dessas potncias na Trplice EntenteempurrouoImprioOtomanonadireodaAlemanha.Nessenterim,umamisso naval britnica continuou a assessorar a frota turca, quetradicionalmente iava-senaGr-Bretanhaparao fornecimentodenaviosde guerra e arsenal. Em 1914, a marinha de guerra otomana tinha trscouraados em construo em estaleiros britnicos, e o destino dessesnaviostinhaenormepesonosclculosdogovernounionista.

  • ASrviaeosEstadosbalcnicossvsperasdaguerra

    Aindaque,comoconsequnciadasGuerrasdosBlcs,todosospasesbalcnicos tenham aumentado em termos de territrio e populao,nenhumdeles icou satisfeito como resultado.O ImprioAustro-Hngaroestava particularmente alarmado, pois a Srvia dobrou de tamanho,aumentandosuapopulaopara4,5milhesdehabitanteseseuexrcitotestado na batalha para 260 mil homens, e ainda cobiava a Bsnia-Herzegovina(ondeossrvioseramnumerosos,emmeioaumapopulaoheterognea) e uma sada para o mar. Desde que, em 1830, a Srviaobtivera autonomia dentro do Imprio Otomano, o trono do pas sealternava entre a dinastiaKarageorgevi, pr-Rssia, e a dinastiaObrenovi,pr-ustria-Hungria.Estaltimaretornouaopoderem1858,ede maneira geral buscou uma poltica externa que, na viso dos srviosnacionalistas, no era suicientemente ambiciosa. Por im, em 1903, ocapito Dragutin Dimitrijevi e um grupo de jovens oiciais do exrcitoassassinaram o rei Alexandre I e alaram ao trono Pedro Karageorgevi.Aclamado pelo Parlamento srvio como o salvador da ptria, o voltilDimitrijevi ascendeu patente de coronel em 1914, ampliando suainluncianoexrcitograasssuasfunescomoprofessornaacademiade guerra srvia e chefe do servio de inteligncia. Ao mesmo tempo,Dimitrijevi tinha papel ativo na semissecreta Defesa Nacional (NarodnaOdbrana), organizao fundada em 1908 para minar a ustria-Hungria.Mais tarde, agindo sob o codinome revolucionrio Apis, dirigiu o grupoterrorista Unio ouMorte (Ujedinjenje ili Smrt), tambm conhecido comoMoNegra.ComadinastiaKarageorgevidevoltaaotrono,asrelaescoma Rssia melhoraram bastante, mas os srvios icaram profundamentedesapontadosem1908-1909,quandoosrussosnomanifestaramapoioaeles depois que a ustria-Hungria proclamou a anexao da Bsnia-Herzegovina.ASrviamobilizouseuexrcito, levandoaustria-Hungriaaordenarumamobilizaoparcialdesuastropas,masquandoaAlemanhadeclarou apoio ustria-Hungria, aRssia recuou.Depoisdisso, a Srviaprometeudarumbastaaseusesforosesiniciativasdeseuscidadosdesolaparaustria-Hungria.Masnohonrouseucompromisso.Abemdaverdade,ogovernoemBelgradonadafezparaimpediraMoNegraderecrutar e treinar srvios bsnios para pr em prtica tentativas deassassinato de oiciais habsburgos nas terras eslavas do sul do Imprio

  • Austro-Hngaro.ApsummalogradoataqueaocomandantedastropasdaBsnia em 1910, a Mo Negra baleou e feriu um membro do governocroataem1912eogovernadordaCrociaem1913.

    Durante o mesmo perodo, o grupo terrorista lanou sobre a polticainternadaSrviaumaenormesombra.NikolaPai,cincovezesprimeiro-ministroecujoPartidoRadicalgovernouopasaps1903,compartilhavacom Dimitrijevi o ideal de uma Grande Srvia, que inclua a Bsnia-Herzegovinaeasadjacentesterraseslavasdosul,objetivoquespoderiaseralcanadopelodesmembramentodaustria-Hungria.Pai temiaumareao aos ataques terroristas, mas se sentia intimidado demais paratomar qualquer medida contra Dimitrijevi e seus comparsas dentro doexrcito. Na dcada anterior a 1914, o Partido Radical havia tomado adianteira da democratizao da poltica srvia, aomesmo tempo em quefomentavaeexploravasentimentosnacionalistas.Fatidicamente,noverodaquele ano, a crise decorrente do assassinato do arquiduque FranciscoFerdinando, por obra da Mo Negra, coincidiu com uma campanhaeleitoral na Srvia, gerando uma retrica nacionalista que inlamou aopiniopblicaemtodoopaseintensiicouonveldeindignaodooutroladodafronteiracomaustria-Hungria.

    Srvia parte, Montenegro igurava como o mais antiaustraco dospasesbalcnicos.Osmontenegrinoscobiavamumaporopequena,masestrategicamente importante, do territrio da Monarquia Dual, a baa deCattaro (Kotor), na ponta sul da Dalmcia, base fundamental para amarinha de guerra austro-hngara.Montenegro tambm se ressentia dopapel da ustria em dar im primeira Guerra dos Blcs, pormeio daqual osmontenegrinos se viram forados a ceder parte de seus ganhos,conquistados a duras penas, ao novo Estado da Albnia. No caso daBulgria, o ressentimento como resultadoda segundaGuerradosBlcssobrepujava qualquer sentimento de ainidade pan-eslava e ortodoxaoriental que outrora tinha nutrido por srvios, montenegrinos e seusprotetoresrussos.Quandodaeclosodaguerraem1914,oreiFernando IdaBulgria,nascidoemVienana condiodeprncipegermnico, estavapendendoparaoladodaAlemanhaedaustria-Hungria.ARomnia,cujoreiCarlos I eraprimodeGuilherme II, tinhaumaalianacomasPotnciasCentraisque remontava a1883.Depoisda segundaGuerradosBlcs, aprovncia hngara da Transilvnia era o nico territriopredominantemente romeno que no estava sob controle dos romenos,maso temorqueaRomniasentiaemrelaoRssiaeramaiordoqueseu desejo pela Transilvnia, e assim o pas manteve uma cautelosa

  • postura de alinhamento com a Alemanha e ustria-Hungria. Do mesmomodo, os Hohenzollern tinham uma ligao com a Grcia, cujo reiConstantinoIsecasaracomairmdeGuilherme II.DepoisqueaPrimeiraGuerra Mundial teve incio, Constantino se empenhou em manter aneutralidade da Grcia em face da simpatizao crescente da populaogrega em relao Entente (sentimento que se intensiicou ainda maisquandooImprioOtomanoeaBulgriasetornaramaliadosdaAlemanhae ustria-Hungria). Quando da delagrao da guerra, nenhum pasbalcnicoeramaisvulnervelqueaAlbnia,criadaem1913naesteiradaprimeira Guerra dos Blcs, porque nem a ustria-Hungria nem a ItliaqueriamqueaSrviaadquirisseumabaseslidaeumaposioseguranoAdritico.No comeode 1914, as grandes potncias alaram ao posto desoberanodaAlbniaumobscuro rei germnico,GuilhermedeWied,masseus sditosmuulmanos jamais o aceitaram. Ele reinou por apenas seismeses e abdicou pouco depois da ecloso da guerra, deixando para trsum pas catico, emmeio a vizinhos vidos pormergulhar no abismo naesperanadeemergircomseusobjetivosnacionalistasalcanados.

    OdilemadospasesmenoresdaEuropaA diviso das grandes potncias europeias entre Trplice Aliana e

    TrpliceEntenteconferiuaospasesmenoresemaisfracosdorestantedaEuropa um papel relativamente mais importante. A Alemanha jamaisperdeuaoportunidadedepersuadiressespasesaseassociaremaoladoque julgava mais forte, o seu prprio seguindo o luxo ou pegandocarona,no jargodosespecialistasemrelaes internacionais,ao invsde equilibrarem as foras aliando-se aos rivais alemes oupermanecendoemcimadomuro.Almdo ImprioOtomanoedospasesbalcnicos, outrosmenores se sentirampressionados por umaAlemanhaqueno conseguia entenderporque razoessespasesnoenxergavamqueeramaissbiosealiarformalouinformalmenteaoSegundoReich.Quando o rei belgaAlberto visitou a Alemanha emnovembro de 1913, oprprio Guilherme II deixou isso bem claro, e seu chefe do Estado-Maior,HelmuthvonMoltke,o Jovem, foiaindamaisdiretoeabruptoaodeclararcom todas as letras ao adido militar belga que o furor teutonicus vaidevastar tudo assim que tiver incio uma guerra generalizada.1 EssaintimidaofuncionariamuitobemnocasodoTerceiroReich,masrendeupoucos dividendos para o Segundo. Ainda que os lderes alemes do

  • perodo demonstrassem a mesma arrogncia dos lderes da Alemanhanazista um quarto de sculomais tarde, a Alemanha Imperial ainda notinha acumulado o mesmo nvel de poder com relao a outros pasesproeminentesdaEuropa,oquedavaaospasesmenoresoumaisfracosde1914umlequedeopesviveisdequenodisporiamnoinaldadcadade 1930. Alm das grandes potncias e excetuando os Blcs, todos ospases europeus no alinhados de 1914 se manteriam neutros durantetodaaguerra,comexceodeBlgicaePortugal.

    As grandes potncias tinham declarado uma garantia mtua deneutralidadedaBlgicaem1839,quandoreconheceramsuaseparaodaHolandae instalaramnopoderacasagermnicaSaxe-Coburgo-Gotaparareger como monarcas constitucionais. O catolicismo romano era o nicovnculo cultural de uma populao (de 7,5 milhes em 1914)ferrenhamentedivididaentrefalantesdefrancs(osvales)efalantesdealemo(oslamengos).Oterritriodopas,todoaoestedoReno,tinhasidoanexadopelaFranaduranteasGuerrasNapolenicas,etodossupunhamque qualquer futura crise internacional envolvendo a Blgica seriaprecipitada por uma invaso francesa. A Blgica gozava de relaescordiaiscomaAlemanha,eatoinaldejunhode1914seuslderesaindatemiam mais a Frana. Nos anos imediatamente anteriores guerra, aimprensa e a opinio pblica belgas criticavam a Gr-Bretanha mais doquequalqueroutragrandepotncia,tomandoumairmeposiopr-Berdurante a Guerra Anglo-Ber e rejeitando as subsequentes crticasbritnicasmadministraobelgadesuasvastaspossessescoloniaisnoCongo. Entre os trunfos da Blgica, inclua-se uma prspera economiaindustrializada,maisdoquesuicientemente forteparamanteroexrcitode 340 mil homens que o pas era capaz de mobilizar sob uma lei deserviomilitarcompulsrioaprovadaem1913.

    Em contraste com a Blgica, Portugal dispunha apenas da proteobritnica graas mais longeva aliana militar bilateral da histria(remontandoa1373),etinhaumavizinhanarelativamentesegura.OpasfaziafronteiraapenascomaEspanha,quevinhaemdeclniohaviasculose recentemente fora privada de suas colnias remanescentes na guerracontraosEstadosUnidosem1898.Pasdepobrezacrnica,cujapopulaosomava apenas cinco milhes de habitantes, a Espanha alijara do podersuamonarquianuma revoluo em1910 eno ano seguinte adotaraumaconstituio que tomou como modelo a Terceira Repblica Francesa. Afrancoiliarepublicanaportuguesa,combinadaaumtradicionalsentimentopr-britnico, predispunha Portugal a apoiar a Entente. Em 1914, os

  • resquciosdoImprioUltramarinoportugusincluamquatrocolniasqueseriam estrategicamente importantes na guerra mundial vindoura: osfuturos Angola e Moambique, ambos adjacentes s possesses coloniaisnafrica,easilhasatlnticasdeMadeiraeAores.

    EstadosUnidoseJapoDurante as duas dcadas anteriores ao incio da Primeira Guerra

    Mundial, Estados Unidos e Japo juntaram-se ao grupo das grandespotncias, antes limitado a pases europeus. A estruturao de umamodernamarinhade guerra (apartirde1883) abriu caminhoparaumaespetacular vitria na Guerra Hispano-Americana (1898), em que osnorte-americanos adquiriram as Filipinas, Guam e Porto Rico. A aomilitar estadunidense libertou Cuba do controle espanhol e, em 1903, adiplomacia dos canhes ajudou a libertar o Panam da Colmbia; ambostornaram-se dependentes dos Estados Unidos: os cubanos cederam umabase naval na baa de Guantnamo e os panamenhos deram aos norte-americanos o controle da Zona do Canal, onde foi construdo o canal doPanam (1903-1914). Os Estados Unidos tambm anexaram o Hava em1898.Domesmomodo,opoderionavaljaponsfacilitouvitriasnaGuerraSino-Japonesa(1894-1895)enaGuerraRusso-Japonesa(1904-1905),cujoresultado foi a anexao de Taiwan, o sul de Sakhalin e esferas deinluncia na Coreia e na Manchria, incluindo uma base naval em PortArthur. A guerra contra os russos conirmou a ascenso do Japo comograndepotncia,bemcomoexpsasfraquezasdaRssia.OJapoanexoua Coreia em1910, e quatro anos depois usou sua aliana britnica comopretextoparaentrarnaPrimeiraGuerraMundial.Em1905,os japonesesaceitaramqueTheodoreRooseveltatuassecomomediadordoTratadodePortsmouth, que ps ponto inal guerra com os russos, mas depois asrelaes entre Japo e Estados Unidos azedaram. Embora os dois pasesfossemaliados na PrimeiraGuerra, o resultado do conlito os colocou emrotadecolisonoPacfico.

    ApopulaodosEstadosUnidossaltoude5milhesdehabitantesem1800 para 75 milhes em 1900, expanso estimulada por dezenas demilhesdeimigranteseuropeus.Osistemapolticodescentralizadodopaspropiciava a seus cidados poucos benecios,mas um grau de liberdadesemparalelosnomundo, pelomenosparaos estadunidensesbrancosdeascendncia europeia. Combase na fora de umapopulao que cresceu

  • mais30%(chegandoa97milhes)nosprimeiros13anosdonovosculo,em 1913 os Estados Unidos detinham o maiorPIBper capita do mundo,eram os lderes mundiais em produo agrcola, geravam um tero daproduo industrial do mundo e fabricavam mais ao do que os outrosquatromaioresprodutoresmundiais juntos.Ocrescentepodereconmicoinspirou a autoconiana, e depois que o Congresso reduziu as tarifasalfandegriasem1913,opastornou-seomaiorpaladinomundialdolivrecomrcio.Quandoaguerrafoidelagrada,afrotanavaldosEstadosUnidoss perdia em tonelagem para a Gr-Bretanha e a Alemanha; porm, seuexrcito em tempos de paz ainda era bastante pequeno; em 1914, atmesmo a Itlia tinha o dobro de soldados. A poltica norte-americanacontava com um estvel sistema bipartidrio. O Partido Republicano,fundadocombaseemprincpiosantiescravagistas,depoisdaGuerraCivil,se expandiu e tornou-se uma agremiao progressista e favorvel sprticas comerciais, ao passo que o Partido Democrata continuou sendomais forte nos estados predominantemente rurais, em especial no sul dopas. De 1860 a 1908, os republicanos venceram todas as eleiespresidenciais, excetoduas.Ambosospartidos incluam isolacionistas,masemgeralosrepublicanoseramfavorveisaumamarinhadeguerramaisforte e defendiam uma poltica externa mais agressiva, traosfundamentalmentepersoniicadosporTheodoreRoosevelt(queexerceuapresidncia de 1901 a 1909). Presidente do pas durante a guerra, odemocrata WoodrowWilson (1913-1921) chegara Casa Branca quaseque por acaso. Sulista de nascimento, sua carreira como professor deCincia Poltica levou-o Universidade de Princeton, da qual acabou setornando reitor. De l, assegurou sua eleio como governador de NovaJerseyem1910;apenasdoisanosdepois,obteveamaioriadosvotosnumadisputa contra o sucessor republicano de Roosevelt, William H. Taft, e oprprio Roosevelt, que ensaiava um retorno esfera poltica com seuPartido Progressista, de vida efmera. nico acadmico a chegar presidncia dos Estados Unidos, o moralista Wilson corporiicou o quehaviademelhorepiornos mpetosestadunidenses.Elebuscou fazerdosEstados Unidos um pasmelhor, e aps 1917 tentou usar o poder norte-americano para criar um mundo melhor. Suas convices, emborainvariavelmentecontraditrias,eramdefendidascomardor.

    O Japo tinhaadistinodeseronicopasnoocidentalvisadopeloimperialismoocidentalasobreviveraomassacre,modernizar-seeemergircomo grande potncia por seus prprios mritos. Tradicionalmente, osistemadegovernopredominanteno Japoerao feudal, emquea igura

  • do guerreiro samurai desfrutava de grande prestgio. Por tradio, oimperador, tido como um deus pela religio xintosta, no tinha papelpoltico;ogovernantedefatoeraoxogum,chefemilitarhereditrioacujaautoridade se subordinava o samurai. O xogunato isolacionista Tokugawa(1603-1868), ltima dinastia do tipo, foi obrigado a abrir o Japo para omundo exterior em 1853, quando os Estados Unidos enviaram umaesquadra sob o comando do comodoro Matthew Perry para a baa deTquio. Depois que as potncias europeias seguiram o exemplo norte-americano, as humilhantes concesses arrancadas junto aos nipnicosjogaram no descrdito o xogunato e levaram uma faco de samuraisreformistasareconhecerqueoJaposconseguiriasesalvarpormeiodamodernizao.Em1868,tomaramopodersobopretextoderestauraraautoridade do imperador. O governo da Restaurao Meiji aboliu ofeudalismo, abriu empresas e escolas de estilo ocidental e fundou umexrcitoeumamarinhadeguerramodernos,criadosrespectivamentecombasenosmodelosalemoebritnico.EspelhadanaconstituioalemdeBismarck, a constituio japonesa (1889) deu destaque a um primeiro-ministro demo forte, que s devia responsabilidade ao imperador,masum limitadssimo sistema de cidadania dava direito de voto apenas aosjaponeses abastados do sexo masculino. Os camponeses arcaram com ofardodamodernizao,pagandoaltssimosimpostosqueoscondenavamauma existncia de pobreza. Por conta de sua populao relativamentegrande (51 milhes de habitantes em 1913), s vsperas da PrimeiraGuerraMundialoJapotinhaumPIBpercapitaumpoucomenorqueodaRssia e um nvel de industrializao similar, embora detivesse a quintamaior frota naval do mundo e contasse com quase duas vezes maissoldadosqueosEstadosUnidos.Aproduodeaocorrespondiaamenosde 1% da norte-americana, mas na poca da guerra contra a Rssia osjaponeses estavam fabricando sua prpria artilharia pesada parasuplementar as importaes junto ao grupo alemo Krupp. Todos osgrandesnaviosdeguerraempregadoscontraosrussosforamconstrudosna Gr-Bretanha (aliada do Japo desde 1902); apenas mais tarde osestaleiros nipnicos comearam a construir seus prprios navios deguerra, eoprimeiro couraado foi lanados guasem1910.Emmenosde 40 anos, o Japo se transformou de pas feudal isolado em grandepotncia moderna, embora tivesse a menor base industrial entre asgrandespotncias.Aimdesemanterentreasnaesmaispoderosasdomundo, o pas teria de devotar uma poro bem maior de recursos sforasarmadas,econseguiufazerissograascapacidadedeseugoverno

  • autoritrio de extrair o mximo de sua patritica populao, que, adespeito das condies em que vivia, continuava disposta a suportar ofardoemapoioaosobjetivosdanao.Naverdade,manifestaescontraapaz em Tquio ao trmino da Guerra Russo-Japonesa indicavam que opovo no apenas apoiava uma ambiciosa poltica externa, mas preferiafazersacrifciosaindamaioresaaceitarespliosdeguerramenoresqueosprevistos.

    DomniosecolniasOs denominados domnios britnicos de governo autnomo

    Austrlia, Canad, Nova Zelndia e frica do Sul desempenhariam umpapel singulare importantenaPrimeiraGuerraMundial,participandodoconlito na condio de parceiros e no apenas de dependentes dametrpole. Considerados em conjunto, estavam entre os pases maisprsperos do planeta, com um PIBper capita coletivo que s perdia paraEstados Unidos e Gr-Bretanha. Juntamente com as colnias do ImprioBritnico (com destaque para a ndia) e as colnias francesas (emparticularasdafrica), forneceramrecursossigniicativosparaoesforodeguerradaEntente.

    Os domnios britnicos tinham seus prprios parlamentos e partidospolticos, gabinetes e primeiros-ministros, mas, at o Estatuto deWestminster (1931), seus governos dispunham apenas de podereslimitados para conduzir a poltica externa e no eram totalmenteindependentes para decidir se tomariam ou no parte em um conlitoarmado.QuandoaInglaterraentravanumaguerra,seusdomniostambmestavamemguerra,emboracontassemcomumaimportanteprerrogativade que as colnias no dispunham: no eram formalmente obrigados aenviar tropas a terras estrangeiras para lutar pela metrpole. Assim, osgovernos dos domnios tinham voz ativa para decidir com quantossoldadoscontribuiriam,ondeequando.Odomniomaisantigo,oCanadautnomodesde1867tinhaumapopulaode7,8milhesdehabitantesem 1914, mas contava com apenas trs mil soldados regulares em seuexrcito voluntrio permanente, suplementado por uma numerosa erelativamente desorganizada milcia, em que homens de 18 a 60 anosestavam aptos a servir. Em caso de emergncia imperial, a milciacanadensepodiasermobilizadaedespachadaparaterrasestrangeirasaolado das tropas regulares e complementada via convocao se o nmero

  • de voluntrios se mostrasse insuiciente. Em 1913, cerca de 55 milcanadensesreceberamtreinamentodemilcia.Quandoaguerraeclodiu,oCanad honraria seu compromisso enviando unidades regularessuplementadas por voluntrios recrutados pormeio de sua estrutura demilcia.

    AAustrlia, alada condiodedomnio em1901, implementou, dezanos depois, um sistema que exigia quemeninos e jovens entre 12 e 25anos se submetessem a um treinamento militar anual obrigatrio dosquaisosrapazesentre18e25anospodiamsermobilizadosparacombateemcasodeguerra.O intuitodosistemaeradarAustrlia(pasquemalchegava a cinco milhes de habitantes em 1914) condies dearregimentar oito batalhes totalizando cerca de 250mil homens, mas aforatreinadaativade1914incluaapenasostrsprimeirosgrupos,todosformados por soldadosmenores de 21 anos um exrcito demeninosque a Austrlia optaria por no enviar para o estrangeiro. Em vez disso,criou-seumexrcitovoluntrioseparado,aForaImperialAustraliana(AIF,nasiglaemingls),paraatuarnaEuropa,eaForaExpedicionriaNavaleMilitar Australiana, bemmenor, para atuar no Pacico contra as colniasalems. ANova Zelndia, autnomadesde 1907, tambmhavia institudotreinamentomilitarobrigatrioparaoshomens, jdesdeaadolescnciade acordo com a Lei de Defesa de 1909, o treinamento era compulsrioparatodososhomensentre14e21anos.Noverode1914,opasde1,1milhodehabitantescumpririasuasobrigaesparacomaGr-Bretanhadespachandodestacamentosdeseuexrcito.

    AUnioSul-Africana,que recebeuostatus dedomnioem1910, tinhauma populao de seis milhes de habitantes; a minoria branca de 1,3milho desfrutava de superioridade formal e jurdica com relao aosquatromilhesdenegrose700milsul-africanosindianosemestios(decor).OpastinhaumaestruturamilitarsemelhantedoCanad,comumpequenoexrcito regular, aForadeDefesadaUnio, suplementadaporuma milcia a que estavam aptos a servir homens de 17 a 60 anos deidade.Amilciapodiasersupridapormeioderecrutamentoe,aocontrriodo Canad, inclua certo nmero de incorporados para compensar aimpopularidade geral do servio militar entre os africneres, cujosindependentes Estado Livre de Orange e Repblica Sul-Africana(Transvaal) tinhamsido integrados forafricadoSulbritnica,comoresultadodarecenteGuerraAnglo-Ber.Depoisdedelagradaaguerra,africa do Sul s enviaria tropas para a Europa depois que suas forastivessemconquistadoacolniavizinhadoSudoesteAfricanoAlemo.

  • Em termos de populao, os 20 milhes de sditos britnicos dosquatro domnios nem de longe se comparavam aos 380 milhes dascolniasbritnicas,maisdedois terosdosquais viviamna ndia.Amaisnumerosa tropacolonial,oexrcito indiano, contavacom150milhomensarregimentados com base em recrutamento voluntrio, por isso incluanmeros desproporcionais de povos do sul da sia com orgulhosastradiesmarciais, caso dos gurkhas doNepal e dos rajputs do Rajasto.Entre as provncias indianas que enviaram para o servio militar maissoldadosatdoqueprecisavaminclua-seoPunjab(quecedeuumgrandenmero de siques), ao passo que o sul da ndia contribuiu com poucoshomenseapopulosaBengalapraticamentenoenviouumhomemsequer.Aoimeaocabo,duranteaPrimeiraGuerraMundial,andiamobilizou1,4milho de homens, dos quais 1 milho serviram em terras estrangeiras,incluindo 580 mil combatentes. As colnias britnicas na frica negracontriburamcomumnmerobemmenordesoldados,integrantesdaRealFora de Fronteira da frica Ocidental ( RWAFF, na sigla em ingls),arregimentadaemSerraLeoa,Nigria,GmbiaeCostadoOuro(Gana),oudos Fuzileiros Africanos do Rei (KAR, na sigla em ingls), formada porcontingentes nativos de Qunia, Uganda e Niassalndia (atual Malau).Durante a guerra, nenhum desses dois regimentos coloniais sairia docontinente, mas ambos desempenharam papel importante na campanhaAliadacontraascolniasalemsnafrica.

    OImprioColonialFrancstinhaumapopulaodeapenas60milhesdehabitantes em1914, epor isso serapotencialmente capazde suprirmenos de um quarto do nmero de homens que a ndia britnica podiafornecersozinha.Oexrcitodafrica,arregimentadonascolniasdonortedo continente (Arglia, Tunsia e Marrocos), inclua unidades separadaspara soldados oriundos da vasta colnia francesa na Arglia e dapopulao rabe e berbere, embora, em 1914, essa restrio tenha sidomais ou menos abolida, permitindo, por exemplo, que cavalarianosfranceses se integrassemaos sipahis (regimentosde cavalaria)rabes,ouque alguns soldados da infantaria rabe lutassem ao lado doszouavesfranceses. Os habitantes das colnias francesas eram em sua maioriarecrutas servindo sob as mesmas obrigaes em vigor na Frana. Osrabes incluam alguns combatentes escolhidos por recrutamentocompulsrio (introduzidonaArgliaem1913),masamaiorpartedos33mil argelinos muulmanos que serviram em 1914 era de voluntrios. Oexrcito dafrica inclua tambma LegioEstrangeira, composta apenasdevoluntriosecondenadosmilitarescumprindopenanaInfantariaLeve

  • Africana. As tropas arregimentadas no restante do Imprio Francs,juntamente com os soldados franceses servindo nessas colnias, eramchamadas de tropas coloniais (troupes coloniales). Como os soldados dafrica negra britnica, eram organizadas em unidades de fuzilaria, dasquaisasmaisnotveiseramosTirailleurssngalais(compostanoapenasdesoldadosdoSenegal,masdetodaafricaOcidentalfrancesaedafricaCentral), osTirailleurs malagaches (de Madagascar) e osTirailleursindochinois (da Indochina). Devido crnica escassez de homens noexrcitofrancs,durantetodaaguerra,suasunidadesafricanastomarampartedoscombatesemsoloeuropeu.

    Almdaspossessesbritnicasefrancesas,amaiorcolniaafricana,oCongoBelga,tambmproduziusuamaiortropaemtemposdepaz.AForcePublique congolesa era um tpico exrcito colonial no que tangia a seutamanhomodestoapenas17milhomensem1914,paraumacolniade7milhesdehabitanteseaostermosdeservio,comoforaproissionaldevoluntriosdelongadurao.Comoastropasdafricanegrabritnica,essas forastomariampartenaaonaPrimeiraGuerraMundial lutandocontra as colnias alems na frica. Sem exceo, as foras coloniais dasia e da frica eram comandadas por expatriados europeus ou oiciaisdesignadosapartirdoexrcitoregulardametrpole.

    Tradicionalmente, os europeus tinham valorizado suas colniasultramarinas por conta de seus recursos econmicos, de incio metaispreciosos e produtos agrcolas a ser comercializados, e mais tarde umalista cada vez maior de matrias-primas. Mas, na era industrial, aimportncia relativa das colnias entrou em declnio, o que se relete noalargamentodoabismoentreoPIBpercapitadaspotnciascoloniaiseodesuas colnias. Nas economias desenvolvidas das metrpoles, aindustrializao incrementou a tal ponto as taxas de produtividade que oPIB per capita continuou em ascenso mesmo em uma poca decrescimentodapopulao;emcontraste,namaiorpartedaspossessesdeultramar (os domnios britnicos foram uma expressiva exceo) aprodutividade no conseguiu melhorar suicientemente rpido para darsustentao a um ritmo de crescimento similar noPIB per capita, o quecausou estagnao ou atmesmo queda. Em 1913, a Gr-Bretanha tinhaumPIBpercapitamais de sete vezes acima do de seu vasto imprio pr-guerra (excetuando os domnios), ao passo que, no caso da Frana, onmeroeramaisdecincovezessuperioraodesuascolnias.Umavezquea produtividade das colnias estava mais abaixo do que nunca emcomparao s metrpoles, em termos prticos, isso signiicava que

  • sobravapoucoexcedenteaserexploradodepoisqueademandalocalerasuprida. Ademais, em virtude da distncia dametrpole, aps o incio daguerra icou dicil transportar esse pequeno excedente at a Europa. 2Assim, entre aspossessesultramarinas, asque tiveramomaior impactona guerra foram os domnios britnicos onde a produtividadesobrepujavaadistnciadaEuropaeonorte francsdafricaondeaproximidadecomaEuropafalavamaisaltoqueabaixaprodutividade.

    Nacionalismo,darwinismoecultoofensivaAs grandes potncias da Europa, as potncias emergentes no

    europeias, os pases perifricos, os domnios britnicos e as colniastinham um denominador comum: seu comportamento anterior guerratinha sido moldado pelo nacionalismo que emergira um sculo antes naRevoluo Francesa e nas Guerras Napolenicas. Durante o sculo XIX, obenignonacionalismoculturaldaeraromnticatinhasetransformadoemum nacionalismo racial mais tarde aguado e deinido pelo darwinismo,depois da fatdica deciso de Charles Darwin de usar imagens evocabulrio blico para articular conceitos naturais e biolgicos emAorigem das espcies (1859) eA descendncia do homem (1871). Depoisdisso,conceitosbsicosdodarwinismo, taiscomoasobrevivnciadomaisapto e a luta pela existncia, propiciaram um alicerce cientico paraideologias agressivas e, de forma geral, o nacionalismo racial cienticodeu esteio unidade nacional na causa da grandeza nacional. Essepensamento infectou os intelectuais europeus, de uma ponta a outra doespectro ideolgico. O darwinismo no afetou a Frana tanto quanto asoutras grandes potncias, mas, mesmo l, mile Zola, heri da esquerdafrancesa,declarouem1891que

    aguerraaprpriavida!NaNatureza,nadaexistequenotenhanascido,crescidoousemultiplicadopormeiodo combate.necessrio comerou ser comidoparaqueomundopossa viver. Somente as naes guerreiras prosperaram; umanaomorre assimque sedesarma.3

    Na verdade, o que alguns acadmicos rotularam de militarismo, etentaramgeneralizaremtermossociais,econmicosepolticos,originou-senas dcadas anteriores a 1914 como uma manifestao distinta donacionalismoracialdarwinista.

    Nessa atmosfera, Bertha von Suttner (ver box Uma voz no ermo) eoutrospaciistaseuropeusencararamumatarefaimpossvel.Atmesmoo

  • prmiodapazoutorgadoanualmenteapartirde1901emreconhecimentoa seu trabalho surgiu graas generosidade do inventor da dinamite,AlfredNobel.Nocenriopolticoeuropeu,apenasossocialistasadvogavamabertamenteapazeacooperaoe,nombitodecadapas,seuspartidospolticostendiamouaseisolarporcontadesuaforaeleitoral(casodo SPDalemo) ou a ser ignorados por causa de sua fraqueza eleitoral (caso doPartidoTrabalhistaBritnico).ASegundaInternacionalSocialista(fundadaem1889)reletiaaprofundadivisodomovimentoentremoderados,queapoiavam os ideais de Marx, mas no seus mtodos revolucionrios, eradicais, que insistiam (de maneira problemtica para a causa paciista)emqueamudanagenuna realmente capazdebeneiciaroproletariadodeveria vir por meio da insurreio violenta. Apenas na Alemanha ossocialistas eram fortes o bastante para preocupar os lderesgovernamentais, emesmooSPD depoisdeseoporsistematicamenteaosgastosnavaisemilitaresaolongodosanospr-guerravotariaafavordecrditos de guerra na atmosfera de crise do vero de 1914. Em meio CrisedeJulho,aSegundaInternacionalviuseusonhodeumagrevegeralmundial a im de impedir a mobilizao dos exrcitos ser esmagadopela dura realidade de que, para a vasta maioria dos trabalhadoreseuropeus, a identidadenacionaleramais importantequea identidadedeclasse.

    No chega a surpreender que o pensamento militar pr-guerrareletisseoespritonacionalistaedarwinistadapoca,quesemanifestounocultoofensivaqueafetoutodasasforasarmadasnaviradadosculo.Ocultoofensivatinhasuasrazesnomodoprussiano-germnicodefazerguerra, nascido nas reformas militares que a Prssia adotou depois desofrer uma derrota acachapante nas mos da Frana de Napoleo, em1806. Carl vonClausewitz (1770-1831) serviu comoprofeta desse credo,seu livro pstumoVom Kriege [Da guerra], de 1832, era a sagradaescritura, e o marechal de campo Helmuth von Moltke, o Velho (1800-1891),foioMessias.ApsostriunfosdeMoltkecontraaustria(1866)eaFrana(1870-1871)nasGuerrasdaUniicaoAlem,aobrafoitraduzidaeestudadaemtodaaEuropa,quasesemprecomumprefciodarwinista.No prefcio que escreveu a uma reimpresso pr-guerra da traduoinglesaoriginaldeVomKriege(publicadaem1873comottuloOnWar),ocoronel F. N. Maude declarou que o que Darwin conquistou para aBiologia em termos gerais, Clausewitz fez para a Histria de vida dasnaesquasemeiosculoantesdele,poisambosprovaramaexistnciadamesma leiemcadacaso[...]asobrevivnciadomaisapto. 4Moltke, como

  • Napoleo, buscava destruir os exrcitos inimigos em batalhas decisivas.Admiradores do exemplo prussiano-germnico tambm adotaram aofensiva, tratando com desleixo (em algumas tradues, eliminando) apartemaislongadolivro,queversavasobreguerradefensiva.Ogeneraleescritor militar alemo Colmar von der Goltz, principal intrpretedarwinista de Clausewitz, acelerou a tendncia com seubest-sellerinternacionalDas Volk in Waffen [O pas em armas], de 1883.Paradoxalmente, os pasesmais fracos no tinhammenos probabilidadesqueos fortesdeadotaraguerraofensiva,oque lhesdavaesperanasdequesuavitalidadefossepostaprovanocampodebatalha.Assim,oculto ofensiva teve especial relevncia para as duas potnciasmilitaresmaisvulnerveis da Europa, a ustria-Hungria e a Frana. Franz Conrad vonHtzendorf,instrutordaEscoladeGuerraemViena(1888-1892)antesdese tornar chefe do Estado-Maior da ustria-Hungria (1906-1917), eFerdinand Foch, instrutor (1895-1901) e comandante (1907-1911) daEscoladeGuerraemParisantesdesetornarsupremocomandanteAliadoem 1918, defendiam estratgias ofensivas que se mostraramcompletamente inadequadas a situaes enfrentadas por seus pases naPrimeira Guerra Mundial. Os resultados seriam fatais para a ustria-HungriaequaseletaisparaaFrana.

    O culto ofensiva persistiu a despeito das evidncias fornecidas pelaGuerraAnglo-Ber, aGuerraRusso-JaponesaeasGuerrasdosBlcs,dequeastecnologiasemergentesprivilegiavamaguerradefensiva.AGuerraAnglo-Ber foi a primeira em que ambas as partes beligerantesempregaraminfantariaarmada,principalmentecomfuzisderepetio,eopoder de fogo da infantaria tinha sido claramente decisivo. A artilhariarpidaeaplvorasemfumaa,quetinhamrevolucionadoocombatenavalnadcadade1880,tambmizeramsuaprimeiraaparioemcampanhasemterra.Taticamente,ainfantariabritnicafracassavaacadatentativadeinvestida da baioneta, mas obtinha mais xito quando os soldados eramorganizados em formaes abertas e avanavam em pequenos gruposatuando sob cobertura. Futuros comandantes da Fora ExpedicionriaBritnica (BEF) na Primeira Guerra, sir John French e sir Douglas Haig,defenderamcomsucessoaperformancedacavalariaporeleslideradanafrica do Sul, ignorando o fato de que os cavalarianos britnicos tinhamsidomaisteisquandocombatiamdesmontados,empunhandofuzis,comonoscomandosberes.

    A campanha na Manchria durante a Guerra Russo-Japonesaapresentou um nmero inaudito de soldados, o maior emprego de

  • trincheirasatentoeoprimeirousoemlargaescalademetralhadoras.AdecisivaBatalha deMukden (fevereiro amarode 1905) envolveu cercade250milhomensdecadalado,emcontnuaslinhasdetrincheirasqueseestendiam por 145 km. Como na Guerra Anglo-Ber, a infantaria tevemaior xito atuando em formaes abertas e avanando em pequenosgrupossobcobertura,masambososexrcitosrealizavamsucessivamenteinvestidas corpoa corpocomasbaionetasemcampoaberto, aindaqueacustos medonhos, invalidando (pelo menos na opinio de muitosobservadores)asliesaprendidasnafricadoSulnoquediziarespeitonatureza decisiva do poder de fogo da infantaria dispersa. Os japonesesdemonstraram que uma fora de assalto com a disposio de nimo dastropas para absorver perdas de 30%a 40%ainda podia levar amelhor,mesmoemumcampodebatalhaondeatecnologiamodernaaprimeiragerao de metralhadoras favorecia claramente o defensor. Em ltimaanlise, o resultado reforou a viso convencional do culto ofensiva: osjaponesestinhamatacadoevencido,aopassoqueosrussostinhamicadonadefensivaeperderam.

    UMAVOZNOERMO

    TrechododiscursodabaronesaBerthavonSuttner(1843-1914), paciista austraca e vencedora doPrmio Nobel da Paz em 1905, pronunciado em Oslo,Noruega,em18deabrilde1906:

    Oinstintodeautopreservaonasociedadehumana, agindo de maneira quasesubconsciente, como todos os impulsos damente humana, est se rebelando contra osmtodos constantemente reinados deaniquilao e contra a destruio dahumanidade. Complementando esse esforosubconsciente rumo a uma era livre deguerras, h pessoas que vm trabalhandodeliberadamente para esse im, quevislumbramosprincpiosbsicosdeumplano

  • deao,queprocurammtodoscomosquaisalcanaronossoobjetivoassimquepossvel[...].Quando[Theodore]RooseveltmerecebeunaCasaBrancaem17deoutubrode1904,eleme disse, A paz mundial est a caminho,certamenteestacaminho,masapenaspassoa passo. [...] Por mais que o objetivo estejavisvel,pormaisquepossaparecerprximoeao nosso alcance, a estrada at ele deve serpercorrida um passo de cada vez e, ao longodo caminho, h incontveis obstculos aseremsuperados.

    [...] Os defensores do paciismo esto bemconscientes do quo escassos so seusrecursosemtermosdeinlunciapessoaledepoder. Eles sabem que ainda no sonumerosos e que so fracos de autoridade;porm,quandoobservamrealisticamenteasie ao ideal a qual servem, se enxergam comoservidores da maior de todas as causas. DasoluoparaesseproblemadependesenossaEuropa se tornar um exemplo de runas efracasso ou se podemos evitar esse perigo eassimadentrarantesemumaeravindouradepaz e direito, em que lorescer umacivilizaodeglriainimaginvel.

    SoosmuitosaspectosdessaquestoqueasegundaConfernciadeHaia[realizadaentrejulho e outubro de 1907] deveria estardiscutindo ao invs dos tpicos propostos,concernentes s leis e prticas da guerra nomar, o bombardeio de portos, cidades evilarejos, lanamento de minas e assim pordiante.O contedodessa lista deprioridadesdemonstraque,emboraosdefensoresdaatual

  • estrutura da sociedade, que aceita a guerra,venhamaumaconfernciadepazpreparadosparamodiicaranaturezadaguerra,elesestobasicamente tentando manter intacto osistema existente. Contudo, os defensores dopaciismo, dentro e fora da conferncia,defenderoseusobjetivoseexigiroquemaisumpassosejadadonadireodesuametaameta que, para repetir as palavras deRoosevelt,airmaaobrigaodeseugovernoedetodososgovernosdeacelerarachegadadeumtempoemqueaespadanomaisserorbitroentreasnaes.

    Fonte:http://nobelprize.org/nobel_prizes/peace/laureates/1905/suttner-lecture.html.

    Observadores das Guerras dos Blcs elogiaram os blgaros por suadeterminao em atacar posies entrincheiradas e seu uso da baioneta,em particular na Linha atalca, mais parecida com a frente ocidental daPrimeira Guerra Mundial do que qualquer outra coisa na ManchriaduranteaGuerraRusso-Japonesa.ltimalinhaturcadedefesa,apenas32km a oeste de Constantinopla, a Linha atalca consistia em uma frentecontnua de trincheiras de 24 km de extenso, domar Negro aomar deMrmara, sem lancos, e que s dava aos oponentes a possibilidade deataquefrontal.OsqueelogiaramacoragemdosblgarosnaLinhaatalcae o esprito ofensivo de seu comandante, o general Radko RuskovDimitriev,oizeramapesardashorrveisbaixasincluindo90milmortos,feridosedoentesemapenascincodiasdeataquesemnovembrode1912 e seu fracasso na tentativa de romper as linhas inimigas e chegar aConstantinopla. O exrcito blgaro aprendeu com esse banho de sangueque as investidas da infantaria exigiam um robusto apoio de artilharia eintroduziu um inovador fogo de barragem progressivo na tomada deAdrianopla, em maro de 1913, mas poucos analistas estrangeirosperceberam amanobra. Os Aliados s introduziriam o fogo de barragem

  • progressivo na frente ocidental depois de sofrer milhes de baixas emataquesdeinfantarialevadosacabosemoadequadoapoiodeartilharia.

    Umavezqueosobservadoreseparticipantesdasguerrasentre1899a1913 estavam inluenciados por suas perspectivas nacionais e pelamentalidade predominante na poca, a maior parte das lies por elesaplicadasem1914teveclarasimplicaesparaaguerraofensiva.Emborasubestimassemadimensodasbaixasqueumafuturaguerradegrandespropores acarretaria, ainda assim esperavam um grande nmero demortes e tomarammedidas para limitar os danos pormeio demelhoriasnosequipamentoe treinamento.AGuerraAnglo-Berselouodestinodoscoloridos uniformes de campo do exrcito britnico e acelerou umatendnciaquelevoutodasasgrandespotnciasaadotaremacorpardaoua camulagem (exceto a Frana, que adotou o horizon bleu em julho de1914) a tempo das campanhas de abertura da Primeira Guerra. Aexperincia britnica na frica do Sul, onde as demandas de campanharapidamente exauriram seu pequeno exrcito regular, tambm levou osingleses a promovermelhorias em suas formaes de reserva (criando aForaTerritorialem1908parasubstituirastradicionaismilciasacavaloegrupos de voluntrios). A maioria das outras grandes potncias tomoumedidas semelhantes para dar im lacuna entre a capacidade decombatedesuastropasregularesesuasforasdereserva.Seporumladoos exrcitos geralmente subestimavam a importncia da artilharia e dasmetralhadoras,poroutro,nascorridasarmamentistaspr-guerraamaiorpartedelestentouassegurarumasuperioridadequalitativaequantitativadessasarmas.

    Corridaarmamentista,nacionalismo,alianaseodilemadasegurana

    Os anos imediatamente anteriores guerra testemunharam umaumento sem precedentes de gastosmilitares e navais; em 1913, as seisgrandes potncias europeias investiam em armamentos 50% amais queem 1908. Especialistas em relaes internacionais julgam as corridasarmamentistaspr-guerracomoomelhorexemplohistricododilemadaseguranaofenmenoemqueasaesdeumpasparaassegurarsuaprpria segurana causam in