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A Questão Agrária na Amazônia: um estudo sobre Projetos de Assentamento Diferenciados Introdução No Brasil, o tema da reforma agrária é central na determinação do cenário econômico, social, cultural e político da atualidade. A concentração da terra se apresenta como altamente danosa à sociedade e inibidora do desenvolvimento do país, gerando injustiça, ilegalidade e atraso econômico e social a uma grande parcela da população em todas as regiões do território nacional (MARTINS, 2003). Nos últimos 20 anos o governo federal, que atuou de maneira determinante para a formação da desigual estrutura fundiária na região amazônica (PALMEIRA, 1989), buscou alterar sua atuação no que concerne à reforma agrária na região e reduziu a criação de assentamentos de colonização, passando a reconhecer outras modalidades de gestão da terra e da floresta que promovem a reforma agrária, como os Projetos de Assentamento Agroextrativistas – PAE e Projetos de Desenvolvimento Sustentável – PDS. No entanto, estes assentamentos diferenciados pouco contribuem para a redução do passivo de trabalhadores rurais sem terra que habitam as cidades Amazônicas. A rigor, estes dois modelos que requerem áreas relativamente extensas, regularizam a situação fundiária de quem já mora e utiliza a terra e os recursos naturais. No rol de medidas alternativas propostas nos últimos anos encontra-se o Projeto Casulo de Assentamento – PCA que em áreas reduzidas procura assentar famílias, através da cooperação entre as três esferas administrativas. Discussão Na ocasião em que foram assentadas, 48% e 41% das famílias do Formiguinha e Dom Eliseu, respectivamente, tinham ocupações relacionadas a empregos urbanos, apesar da origem predominantemente rural, a maioria migrantes de tradição camponesa do sul e sudeste brasileiro, no caso do PCA Formiguinha, e do nordeste, no caso do PCA Dom Eliseu. Conforme assinala Sauer (2005: 70), “as histórias de vida das pessoas sem terra são verdadeiros itinerários biográficos, gerando desejos e forçando representações em que a casa e o lugar de moradia são um porto seguro”. Para Oliveira (2007: 68) “reforma agrária constitui-se em um conjunto de ações governamentais realizadas pelos países capitalistas visando modificar a estrutura fundiária de uma região ou de um país todo. Ela é feita através de mudanças na distribuição da propriedade e ou posse da terra e da renda com vista a assegurar melhorias nos ganhos sociais, políticos, culturais, técnicos, econômicos e de reordenação do território”. Por mais que se constatem insuficiências na infraestrutura produtiva e social, a descentralização de medidas para promoção da reforma agrária, corresponsabilizando Estados e Municípios, através do Projeto Casulo constituiu-se avanço significativo. No entanto, a criação de assentamentos desta modalidade perdeu o ritmo que tinha entre 1998 e 2001 e os últimos assentamentos são de 2008 sendo o total de famílias assentadas correspondente a não mais que 22% do projetado. Como retrocesso, hoje o modelo de PCA soa como algo ultrapassado. Referências bibliográficas INCRA. Manual de Operação do Projeto Casulo. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Brasília: 1997. MARTINS, José de S. Expropriação e violência: a questão política no campo. São Paulo: Hucitec, 1982. ___________. Reforma Agrária no governo Fernando Henrique Cardoso. Revista Tempo Social. São Paulo: USP, 2003. ___________. Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. São Paulo: Contexto, 2009. OLIVEIRA, Ariovaldo U. Modo de Produção Capitalista, Agricultura e Reforma Agrária. São Paulo: FFLCH, 2007. PALMEIRA, Moacir. Modernização, Estado e questão agrária. Estud. av. [online]. 1989, vol.3, n.7, pp. 87-108. ISSN 0103-4014. SAUER, Sérgio. O significado do assentamento de reforma agrária. In.: BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Assentamentos em debate. Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural – NEAD, 2005. Objetivos O presente trabalho busca levantar elementos que evidenciem a participação comunitária no processo de gestão e planejamento do espaço dos assentamentos, bem como a ação dos órgãos gestores competentes, alimentando a reflexão quanto à adequação deste modelo para os municípios da Amazônia. João Maciel de Araújo (UFAC) – [email protected]; Joana de Oliveira Dias (UFAC) – [email protected] Metodologia Foram considerados os PCA's Formiguìnha (Pimenta Bueno-RO) e Dom Eliseu (Dom Eliseu-PA). A pesquisa serviu-se de revisão bibliográfica, Ievantamento documental, registros fotográficos e entrevistas semiestruturadas a assentados e gestores públicos realizadas em setembro de 2010. Resultados Obtidos A maioria das famílias que atualmente moram nos assentamentos provém de bairros periféricos dos respectivos municípios. No PCA Dom Eliseu, criado em 2004 não há parcelamento do assentamento, que possui um total de 42,92 hectares, ria sobreviva de programas de repasses de renda e atividades esporádicas realizadas fora do PCA. No PCA Formiguinha, criado em 1999, estão assentadas 84 famílias em lotes de 4 Ha, onde produzem para sua manutenção que é complementada por programas sociais. eliminando sobremaneira a idéia de propriedade sobre a terra e o conseqüente comércio de lotes. São 36 famílias que na prática, aquelas que produzem no lote o fazem em cerca de ½ hectare. Setenta e seis porcento das famílias originárias permanecem no assentamento, embora a maio

A Questão Agrária na Amazônia: um estudo sobre … · João Maciel de Araújo (UFAC) – [email protected]; Joana de Oliveira Dias (UFAC) – [email protected] Metodologia

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Page 1: A Questão Agrária na Amazônia: um estudo sobre … · João Maciel de Araújo (UFAC) – joaomaci@hotmail.com; Joana de Oliveira Dias (UFAC) – joana.dias@ifac.com Metodologia

A Questão Agrária na Amazônia: um estudo sobre Projetos de Assentamento Diferenciados

Introdução

No Brasil, o tema da reforma agrária é central na determinação do cenário econômico, social, cultural e político da atualidade. A concentração da terra se apresenta como altamente danosa à sociedade e inibidora do desenvolvimento do país, gerando injustiça, ilegalidade e atraso econômico e social a uma grande parcela da população em todas as regiões do território nacional (MARTINS, 2003). Nos últimos 20 anos o governo federal, que atuou de maneira determinante para a formação da desigual estrutura fundiária na região amazônica (PALMEIRA, 1989), buscou alterar sua atuação no que concerne à reforma agrária na região e reduziu a criação de assentamentos de colonização, passando a reconhecer outras modalidades de gestão da terra e da floresta que promovem a reforma agrária, como os Projetos de Assentamento Agroextrativistas – PAE e Projetos de Desenvolvimento Sustentável – PDS. No entanto, estes assentamentos diferenciados pouco contribuem para a redução do passivo de trabalhadores rurais sem terra que habitam as cidades Amazônicas. A rigor, estes dois modelos que requerem áreas relativamente extensas, regularizam a situação fundiária de quem já mora e utiliza a terra e os recursos naturais. No rol de medidas alternativas propostas nos últimos anos encontra-se o Projeto Casulo de Assentamento – PCA que em áreas reduzidas procura assentar famílias, através da cooperação entre as três esferas administrativas.

Discussão

Na ocasião em que foram assentadas, 48% e 41% das famílias do Formiguinha e Dom Eliseu, respectivamente, tinham ocupações relacionadas a empregos urbanos, apesar da origem predominantemente rural, a maioria migrantes de tradição camponesa do sul e sudeste brasileiro, no caso do PCA Formiguinha, e do nordeste, no caso do PCA Dom Eliseu. Conforme assinala Sauer (2005: 70), “as histórias de vida das pessoas sem terra são verdadeiros itinerários biográficos, gerando desejos e forçando representações em que a casa e o lugar de moradia são um porto seguro”.

Para Oliveira (2007: 68) “reforma agrária constitui-se em um conjunto de ações governamentais realizadas pelos países capitalistas visando modificar a estrutura fundiária de uma região ou de um país todo. Ela é feita através de mudanças na distribuição da propriedade e ou posse da terra e da renda com vista a assegurar melhorias nos ganhos sociais, políticos, culturais, técnicos, econômicos e de reordenação do território”. Por mais que se constatem insuficiências na infraestrutura produtiva e social, a descentralização de medidas para promoção da reforma agrária, corresponsabilizando Estados e Municípios, através do Projeto Casulo constituiu-se avanço significativo. No entanto, a criação de assentamentos desta modalidade perdeu o ritmo que tinha entre 1998 e 2001 e os últimos assentamentos são de 2008 sendo o total de famílias assentadas correspondente a não mais que 22% do projetado. Como retrocesso, hoje o modelo de PCA soa como algo ultrapassado.

Referências bibliográficas INCRA. Manual de Operação do Projeto Casulo. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Brasília: 1997.

MARTINS, José de S. Expropriação e violência: a questão política no campo. São Paulo: Hucitec, 1982.

___________. Reforma Agrária no governo Fernando Henrique Cardoso. Revista Tempo Social. São Paulo: USP, 2003.

___________. Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. São Paulo: Contexto, 2009.

OLIVEIRA, Ariovaldo U. Modo de Produção Capitalista, Agricultura e Reforma Agrária. São Paulo: FFLCH, 2007.

PALMEIRA, Moacir. Modernização, Estado e questão agrária. Estud. av. [online]. 1989, vol.3, n.7, pp. 87-108. ISSN 0103-4014.

SAUER, Sérgio. O significado do assentamento de reforma agrária. In.: BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Assentamentos em debate. Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural – NEAD, 2005.

Objetivos

O presente trabalho busca levantar elementos que evidenciem a participação comunitária no processo de gestão e planejamento do espaço dos assentamentos, bem como a ação dos órgãos gestores competentes, alimentando a reflexão quanto à adequação deste modelo para os municípios da Amazônia.

João Maciel de Araújo (UFAC) – [email protected]; Joana de Oliveira Dias (UFAC) – [email protected]

Metodologia Foram considerados os PCA's Formiguìnha (Pimenta Bueno-RO) e Dom Eliseu (Dom Eliseu-PA). A pesquisa serviu-se de revisão bibliográfica, Ievantamento documental, registros fotográficos e entrevistas semiestruturadas a assentados e gestores públicos realizadas em setembro de 2010.

Resultados Obtidos A maioria das famílias que atualmente moram nos assentamentos provém de bairros periféricos dos respectivos municípios. No PCA Dom Eliseu, criado em 2004 não há parcelamento do assentamento, que possui um total de 42,92 hectares,

ria sobreviva de programas de repasses de renda e atividades esporádicas realizadas fora do PCA. No PCA Formiguinha, criado em 1999, estão assentadas 84 famílias em lotes de 4 Ha, onde produzem para sua manutenção que é complementada por programas sociais.

eliminando sobremaneira a idéia de propriedade sobre a terra e o conseqüente comércio de lotes. São 36 famílias que na prática, aquelas que produzem no lote o fazem em cerca de ½ hectare. Setenta e seis porcento das famílias originárias permanecem no assentamento, embora a maio