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A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS OMISSIVOS E A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS MARIA TEREZA TARGINO HORA y

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A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS

OMISSIVOS E A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS

MARIA TEREZA TARGINO HORAy

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CONSELHO EDITORIAL

Fábio Alves dos Santos Jorge Carvalho do Nascimento

José Afonso do NascimentoJosé Eduardo Franco

José Rodorval RamalhoJustino Alves Lima

Luiz Carlos da Silveira FontesLuiz Eduardo Oliveira MenezesMartin Hadsell do Nascimento

Rita de Cácia Santos Souza

www.editoracriacao.com.br

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MARIA TEREZA TARGINO HORA

Aracaju | 2017

Criação Editora

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS OMISSIVOS E A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS

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Projeto gráfico: Adilma MenezesCapa: © Ruslan Gilmanshin | Dreamstime.comColunas gregas

Todos os direitos reservados a Maria Tereza Targino Hora

Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, com finalidade de comercialização ou aproveitamento de lucros ou vantagens, com observância da Lei em vigência. Poderá ser reproduzido texto, entre aspas, desde que haja expressa marcação do nome do autor, título da obra, editora, edição e paginação. A violação dos direitos de autor (Lei nº 9.619/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Hora, Maria Tereza TarginoH812r A responsabilidade civil do Estado por atos omissivos e a

posição dos tribunais pátrios /Maria Tereza Targino Hora. - Aracaju: Criação, 2017.

ISBN 978-85-8413-143-3 136 p.,il. 21 cm 1. Poder público 2. Responsabilidade Civil do Estado. 3. Tribunais

Pátrios I. Título II.Maria Tereza Targino Hora III. Assunto

CDU 347.51

Catalogação – Claudia Stocker – CRB 5/1202

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Ao meu pai por despertar

em mim o entusiasmo pela

Responsabilidade Civil do

Estado.

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“Sei que a vida vale a pena

mesmo que o pão seja caro e

a liberdade pequena”.

(Ferreira Gullar)

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AGRADECIMENTOS

PRIMEIRAMENTE agradeço a Deus por todas as conquistas al-cançadas, por me conceder saúde, paz, paciência, discernimento e coragem para enfrentar e vencer os momentos de dificuldades.

Aos meus pais e irmã, pelo apoio incondicional e incentivo constante em buscar a realização dos meus sonhos, sejam eles quais forem.

A Rafael, pelo suporte e compreensão de que é necessário abdicar de parte do convívio social para alcançar um algo mais profissional.

A todos que contribuíram direta ou indiretamente para a conclusão dessa etapa, mesmo que aqui não citados, os meus mais sinceros agradecimentos.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS 71 INTRODUÇÃO 11

2 RESPONSABILIDADE CIVIL 132.1 Breve histórico. Da responsabilidade civil subjetiva à objetivação 132.2 Conceito 162.3 Função 182.4 Espécies 19

2.4.1 Responsabilidade civil e responsabilidade penal 192.4.2 Responsabilidade civil contratual e extracontratual 212.4.3 Responsabilidade subjetiva e objetiva 23

2.5 Pressupostos do dever de indenizar 282.5.1 Conduta humana 292.5.2 Culpa 312.5.3 Nexo Causal 332.5.4 Dano 35

2.6 Causas excludentes de responsabilidade civil 362.6.1 Legítima defesa 372.6.2 Estado de necessidade 382.6.3 Exercício regular do direito e estrito cumprimento

do dever legal 392.6.4 Caso fortuito e força maior 412.6.5 Culpa exclusiva da vítima e fato de terceiro 42

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3 RESPONSABILIDADE CIVIL E O DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL 45

4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO 494.1 Evolução histórica 50

4.1.1 Fase da Irresponsabilidade 504.1.2 Fase Civilística 514.1.3 Fase Publicística 524.1.4 Teoria do risco administrativo e teoria do risco integral 54

4.2 Responsabilidade Civil do Estado no direito brasileiro 614.3 O artigo 37, §6º da Constituição Federal 63

4.3.1 Elementos 644.3.1.1 Pessoas responsáveis 644.3.1.2 Agentes do Estado 664.3.1.3 A duplicidade de relações jurídicas 69

4.4 Denunciação à lide 744.5 Ação de Regresso 784.6 Responsabilidade das Pessoas Jurídicas de Direito Privado 814.7 Excludentes da Responsabilidade Civil do Estado 844.8 Prescrição da Pretensão da Reparação civil 85

5 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO 915.1 Considerações iniciais 915.2 Responsabilidade subjetiva na omissão 925.3 Responsabilidade objetiva na omissão 965.4 Omissões genérica e específica 99

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6 ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS 1056.1 Danos relacionados a detentos 106

6.1.1 Danos causados por detentos fugitivos 1066.1.2 Danos sofridos por detentos nos presídios –

Caso de Repercussão Geral no STF 1116.2 Danos decorrentes de deslizamentos e enchentes 1156.3 Danos sofridos por alunos dentro de escola pública 1196.4 Danos decorrentes do descumprimento de ordem judicial 123

7 CONCLUSÃO 128REFERÊNCIAS 131

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1 INTRODUÇÃO

O PRESENTE trabalho versará sobre a responsabilidade civil do Estado por omissão no âmbito administrativo. Há vasta contro-vérsia doutrinária e jurisprudencial, de sorte que, em um pri-meiro momento, o que parece pacífico na verdade não o é.

A título exemplificativo, nota-se que o Superior Tribunal de Justiça, nas ementas de seus Acórdãos, menciona ser incontro-verso o entendimento que a responsabilidade civil do Estado é subjetiva nas omissões, muito embora não seja isso o extraído da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, conforme será esmeradamente demonstrado no tópico pertinente.

De início, será feita uma abordagem global acerca da evo-lução da idéia de responsabilidade civil, passando-se da fase subjetiva à consolidação da teoria do risco administrativo. Em seguida, serão estudados os aspectos gerais da responsabilidade, tais como, sua definição, seus elementos básicos e algumas de

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suas espécies, além da análise das causas excludentes da res-ponsabilidade civil.

Igualmente relevante é a menção ao Direito Civil Consti-tucional ou Constitucionalização do Direito Civil, concepção doutrinária que sustenta uma visão unitária do ordenamento jurídico, isto é, uma interação entre os dois ramos do direito (público e privado). Os defensores desse novo fenômeno inovam ao postular que o Código Civil deve ser interpretado segundo a Constituição Federal, em contraponto ao que usualmente era feito pelos juristas.

Em seguida, a presente monografia abordará especifica-mente a evolução do tema em nosso ordenamento jurídico, analisando de forma detalhada as disposições do art. 37, §6º da Constituição Federal bem como aspectos processuais relevantes ligados à matéria em estudo.

Por fim, chegar-se-á ao estudo das teorias sobre a responsa-bilidade civil do Estado por omissão, seus limites e toda a polê-mica doutrinária e jurisprudencial em torno de qual corrente é a mais adequada.

Conforme será minuciosamente analisado, há os que defen-dem a adoção da teoria da culpa, indo de encontro à regra geral disciplinada na Constituição Federal, os que em sentido oposto, acolhem a responsabilização objetiva do Estado e há aqueles que adotam uma posição intermediária, diferenciando duas espécies de omissões, ou seja, a omissão genérica quando se aplicará a responsabilidade subjetiva e a omissão específica que deverá in-cidir a teoria objetiva.

Por fim, com o intuito de enriquecer o debate, serão anali-sados alguns casos concretos julgados pelos Tribunais pátrios, uma vez que tal exame confere ao presente trabalho um aspecto ainda mais prático e esclarecedor.

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2 RESPONSABILIDADE CIVIL

2.1 BREVE HISTÓRICO. DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJE-TIVA À OBJETIVAÇÃO

A RESPONSABILIDADE civil sofreu uma evolução pluridimen-sional vez que o seu alargamento ocorreu em relação a sua histó-ria, área de incidência, profundidade e fundamentos.

Nos primórdios da civilização humana, prevalecia a vingan-ça coletiva, caracterizada pela reação conjunta de um grupo con-tra o seu agressor em razão da ofensa a um de seus componentes.

Após, o instituto evoluiu para a vingança privada, onde os homens faziam justiça pelas próprias mãos com base na Lei de Talião, sintetizadas na expressão “olho por olho, e dente por den-te”, “quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Nesse contex-to, o poder público intervinha apenas com o objetivo de reduzir os abusos, declarando quando e como a vítima poderia usufruir do seu direito de retaliação, o qual consistia na produção contra o infrator de dano idêntico ao que havia sofrido.

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Em seguida, surge a fase da composição voluntária do dano. Nesse período prevalecia o entendimento de que o mais benéfi-co para a vítima seria receber uma compensação em pecúnia ao invés de cobrar a retaliação, pois por meio desta, o dano sofrido não estava efetivamente sendo reparado.

Posteriormente, a composição econômica passa a ser legal ou tarifada, momento em que o Estado passa a fixar o valor da pena a ser paga pelo agressor em razão do caso concreto.

A doutrina ensina que o verdadeiro divisor de águas da res-ponsabilidade civil é a Lex Aquilia de damno. Nesta, restou sedi-mentada a idéia de reparação pecuniária do dano, determinando que o patrimônio do agressor suportasse a sua reparação, com base no valor da res. Ademais, também atrelou a responsabilida-de à ideia de culpa de modo que se o autor do dano agisse sem esta, se isentaria de qualquer responsabilidade.

Salienta Maria Helena Diniz (2007, p.11):

A Lex Aquilia de damno estabeleceu as bases da responsa-bilidade extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo, com base no estabelecimento do seu valor. Esta lei introduziu o damnum iniuria datum, ou melhor, o prejuízo causado a bem alheio, empobrecendo o lesado, sem enriquecer o lesante.

Nesse contexto, o Estado passa a intervir nas relações priva-das ora fixando o valor dos prejuízos de acordo com a gravida-de do dano causado, ora estabelecendo a forma como os danos deveriam ser reparados surgindo, assim, a ação de indenização.

Pois bem, a responsabilidade mediante culpa, a partir de então, passou a ser a regra em todo o Direito Comparado, influenciando as codificações modernas, como por exem-plo, o Código Civil de Napoleão, conhecido como Código da Burguesia, de 1804.

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Ocorre que a teoria clássica da culpa, trazida pelos france-ses, tornou-se insuficiente para regular os novos casos que sur-giam em razão da modernização, motivo pelo qual foi necessário reformular a teoria da responsabilidade civil pautando-a na sua objetivação. Novas hipóteses de indenização dos prejuízos se consolidaram, o que acarretou o surgimento da Teoria do Risco.

Acerca do tema, o doutrinador Flávio Tartuce (2014, p. 306) leciona que

O direito francês, precursor da maior parte das ideias so-cializantes, passou a admitir uma outra modalidade de responsabilidade civil, aquela sem culpa. Dos estudos de Saleilles e Josserand sobre a teoria do risco, surgem, a par-tir do ano 1987, as primeiras publicações sobre a responsa-bilidade civil objetiva.

O autor esclarece ainda que com o advento da Revolução In-dustrial na Europa, precursora do modelo capitalista, estrearam os debates acerca da responsabilização daqueles que realizavam de-terminadas atividades em relação à coletividade. Com fundamento na teoria objetiva, passou a ser clamada a idéia de que todo risco deveria ser garantido, independente da existência de dolo ou cul-pa, com fundamento na ampliação da proteção jurídica à pessoa humana, em especial aos trabalhadores e às vítimas de acidentes sob a ótica de que todo prejuízo deveria ter um responsável legal.

De acordo com a teoria supramencionada, todo e qualquer risco independentemente da prova de culpa deveria ser ressar-cido, bastando para tanto que a vítima provasse que o evento danoso ocorreu.

Nesse sentido, Venosa (2010, p.15) ensina que

As noções de risco e garantia ganham força para substituir a culpa. No final do século XIX surgem as primeiras mani-

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festações ordenadas da teoria objetiva ou do risco. Sob esse prisma, quem, com sua atividade ou meios utilizados, cria um risco deve suportar o prejuízo que sua conduta acar-reta, ainda porque essa atividade de risco lhe proporciona um benefício.

Por fim, imperioso esclarecer que a Teoria da Culpa não foi nulificada pela Teoria do Risco. As duas teorias coexistem de forma harmônica como fundamentos da responsabilidade civil contemporânea.

2.2 CONCEITO

A responsabilidade civil ostenta importância notória para a ciência jurídica nos dias atuais. A essência do instituto está em restaurar o equilíbrio moral e patrimonial desfeito pelo causador do dano, ou seja, deve o responsável, em razão da violação de determinada norma, reestabelecer o statu quo ante do lesado, da forma mais plena possível.

Ao discorrer sobre o tema Sérgio Cavalieri Filho (2005, p.24) afirma que

Em seu sentido etimológico, responsabilidade exprime a idéia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge dessa idéia. Designa o de-ver que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um outro dever jurídico. Em apertada síntese, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário.

Ainda sobre a matéria, o preclaro jurista José de Aguiar Dias (1994, p.2) esclarece que responsabilidade exprime a ideia de

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RESPONSABILIDADE CIVIL y 17

equivalência, de contraprestação, de correspondência e ainda dispõe:

É possível fixar uma noção, sem dúvida imperfeita, de responsabilidade, no sentido de repercussão obrigacional da atividade do homem. Como esta varia até o infinito, é lógico concluir que são também inúmeras as espécies de responsabilidade, conforme o campo em que se apresenta o problema: na moral, nas relações jurídicas, de direito pú-blico ou privado.

Sintetizando a conceituação do instituto, Maria Helena Di-niz (2014, p.31) preconiza que

Com base nessas considerações poder-se-á definir a res-ponsabilidade civil como a aplicação de medidas que obri-guem alguém a reparar o dano moral ou patrimonial cau-sado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou fato de coisa ou animal sob sua guarda, ou ainda de simples imposição legal.

Ora, responsabilidade, nada mais é, que o dever jurídico su-cessivo de reparar o prejuízo causado por uma conduta ilícita em razão da violação de um dever jurídico originário. Assim, toda conduta humana que ao violar dever jurídico originário causar dano a outrem é fonte geradora de responsabilidade civil.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2014,v.III, p.45), a propó-sito, observam que

A palavra “responsabilidade” tem sua origem no verbo lati-no respondere, significando a obrigação que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas da sua atividade, contendo, ainda, a raiz latina spondeo, fórmula através da

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qual se vinculava, no Direito Romano, o devedor nos con-tratos verbais. A acepção que se faz da realidade, portanto, está ligada ao surgimento de uma obrigação derivada, ou seja, um dever jurídico sucessivo, em função da ocorrência de um fato jurídico lato sensu.

Assim, é possível concluir que o respaldo desta obrigação derivada está no princípio da “proibição de ofender”, ou seja, na idéia geral de que a ninguém se deve lesar, expresso pelo Direito Romano por meio da máxima neminem laedere.

2.3 FUNÇÃO

Conforme acima disposto, a responsabilidade civil con-substancia-se no dever do lesante de ressarcir plenamente os prejuízos causados a outrem não só em razão da prática de um ato ilícito, mas também em razão do risco da atividade exercida.

A responsabilidade civil tem como função principal restau-rar o equilíbrio jurídico-econômico anteriormente existente en-tre o agente e a vítima. Ou seja, restabelecer o status quo ante, buscando uma indenização, reparação (dano material) ou uma compensação (dano moral), nos termos do art. 5º incisos V e X da Constituição da República 1.

Certo é que, no fundamento da responsabilidade, impera o princípio do resitutio in integrum, que se traduz na ideia de se restituir a vítima, tanto quanto possível, ao estado em que se

1 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

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encontrava antes da realização do ato ilícito, sob pena de res-ponsabilizá-la pelos prejuízos não indenizados.

Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho (2014, p.27):

O princípio da reparação integral tem sido o objetivo de todos os sistemas jurídicos para se chegar à mais com-pleta reparação dos danos sofridos pela vítima. Muito embora seja um ideal utópico, de difícil concretização, é perseguido insistentemente por se ligar diretamente à própria função de responsabilidade civil.

Nelson Rosenvald (2013, p.67), em sua obra As Funções da Responsabilidade Civil, afirma que a responsabilidade civil assume o papel de neutralizar as consequências do ilícito. En-quanto a responsabilidade permite imputar um fato danoso a um sujeito, o ressarcimento, por sua vez, é capaz de determinar o montante e o modo em que o lesado será compensado, confir-mando a ideia do dano diferencial, qual seja a diferença entre a situação patrimonial do lesado antes do acontecimento do ilícito e a situação verificada logo após a sua ocorrência.

2.4 ESPÉCIES

2.4.1 Responsabilidade civil e responsabilidade penal

A responsabilidade tem como elemento principal uma con-duta violadora de determinado dever jurídico, podendo incidir em qualquer ramificação do Direito. Logo, tanto o dever infrin-gido pelo agente como a sua respectiva norma jurídica irão de-terminar a espécie de responsabilidade a ser aplicada no caso concreto.

O ilícito penal viola uma norma de Direito Público e abrange precipuamente as infrações consideradas mais graves que afe-

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tam direta ou indiretamente toda a sociedade. Já no ilícito civil a norma violada é de Direito Privado e está atrelada a transgres-sões menos graves, não reclamando a rigidez da pena criminal.

Cavalieri Filho (2014, p.29) assim dispõe

Beiling já acentuava que a única diferença entre a ilicitude penal e a civil é somente de quantidade ou de grau;está na maior ou menor gravidade ou imoralidade de um cotejo com outra. O ilícito civil é um minus ou residum em rela-ção ao ilícito penal. Em outras palavras, aquelas condutas humanas mais graves, que atingem bens sociais de maior relevância, são sancionadas pela lei penal, ficando para a lei civil a repressão das condutas menos graves.

No mesmo sentido Cristiano Chaves, Nelson Rosenvald e Felipe Peixoto Braga Neto (2002, p.23) asseveram que

O ilícito civil e penal compartilham a mesma essência: um ato antijurídico praticado por uma pessoa imputável. Ca-berá à discricionariedade do legislador estabelecer em qual área (direito civil, penal ou administrativo) será colocada a reação do ordenamento, sendo corriqueira a reserva ao direito penal das infrações consideradas especialmente graves, que interessam a toda coletividade, fundando um ilícito especial, conhecido por infração criminal.

Muito importante esclarecer que tanto o ilícito civil como o penal são fundados em um juízo de antijuridicidade de uma conduta perante o ordenamento. Contudo, existem distinções substanciais quanto à estrutura da responsabilidade que mere-cem ser destacadas.

Na esfera penal o ato somente será considerado ilícito se violar norma prevista na lei, ou seja, deve haver exata adequa-

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ção entre o tipo penal e a conduta praticada pelo agente, trata-se do princípio da tipicidade formal. Não obstante, para configura-ção do ilícito civil, consoante ensina o art.186 do Código Civil, qualquer conduta antijurídica causadora de prejuízo a outrem poderá ser considerada um fato ilícito pelo julgador.

Ademais, necessário ressaltar que a responsabilidade penal é personalíssima e intransmissível, não podendo ultrapassar a figura do autor do ilícito. O objetivo do direito penal é punir aquele que infringiu o ordenamento bem como desestimular a prática de novos ilícitos, com foco na pessoa do agressor. Já na responsabilidade civil, o lesante deve reparar o dano causado visando a recomposição do equilíbrio patrimonial ora perdido. Como se trata de sanção meramente patrimonial, a reparação civil pode ser transferia aos herdeiros do ofensor até os limites da herança.

Cumpre esclarecer que apesar das distinções elencadas, uma espécie de responsabilidade não exclui a outra. Assim, de-terminado fato pode ser objeto de incidência de mais de uma norma jurídica, ou seja, o ilícito pode infringir, concomitante-mente, norma de direito público e norma de direito privado, configurando-se ilícito penal e civil, respondendo o agente em ambas as searas.

2.4.2 Responsabilidade civil contratual e extracontratual

A responsabilidade civil contratual restará caracterizada quando o dever de indenizar surgir em razão do inadimplemen-to de um vínculo obrigacional preestabelecido. Diferentemente da responsabilidade extracontratual ou aquiliana que surge da lesão a direito subjetivo sem que entre a vítima e o ofensor pree-xista qualquer relação jurídica, mas sim um vínculo legal.

O renomado jurista Sérgio Cavalieri Filho (2014, p.31), ao analisar a matéria, preconiza que

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Em suma: tanto na responsabilidade contratual como na extracontratual há a violação de um dever jurídi-co preexistente. A distinção está na sede desse dever. Haverá responsabilidade contratual quando o dever ju-rídico violado (inadimplemento ou ilícito contratual) estiver previsto no contrato. Haverá, por seu turno, res-ponsabilidade extracontratual se o dever jurídico vio-lado não estiver previsto no contrato, mas sim na lei na ordem jurídica.

Esclarecendo, o ilícito aquiliano ou absoluto advém, da vio-lação a um preceito legal do Direito ou à própria lei, não exis-tindo entre os sujeitos qualquer vínculo obrigacional anterior. Já a responsabilidade contratual encontra fundamento no próprio contrato firmado pelas partes.

Alguns doutrinadores, defensores da teoria unitária ou monista, afirmam que a distinção entre as espécies de res-ponsabilidade ora apresentadas é de discutível utilidade vez que ambas produzem efeitos uniformes pautadas na trans-gressão de um dever jurídico, pouco importando que este tenha como fonte um contrato, um dever jurídico genérico ou a própria lei.

Acerca do tema em análise, o Professor Silvio Rodrigues (2002, p.09) faz a seguinte ponderação

Muitos entendem que as duas responsabilidades são de igual natureza, não havendo por que discipliná-las se-paradamente. E, de fato, tanto na configuração da res-ponsabilidade contratual como na da aquiliana vários pressupostos são comuns. Numa e noutra mister se faz a existência do dano, a culpa do agente e a relação de causalidade entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima ou pelo outro contratante.

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Em contrapartida, o Código Civil de 2002 adotou a teoria clássica ou dualista, com a ressalva de que existem regras pre-vistas na codificação destinadas à responsabilidade contratual, mas que são estendidas à responsabilidade aquiliana, como por exemplo, os artigos 393 e 4022.

Por fim, oportuno mencionar que o Código de Defesa do Consumidor já adota a teoria unitária da responsabilidade civil no que diz respeito à responsabilidade do fornecedor de produ-tos e serviços, ao equiparar todas as vítimas de eventual aciden-te de consumo a consumidores, nos termos do art. 17 do referido Código3.

2.4.3 Responsabilidade subjetiva e objetiva

A teoria da responsabilidade subjetiva trás como pressuposto subjetivo para que o agente seja responsabilizado a comprovação da sua conduta culposa, que abrange não apenas a culpa stricto sensu como também o dolo.

Assim, o dever de indenizar surgirá quando restar provado que o agente agiu com culpa ou dolo, que causou dano a outrem e que foi a sua conduta que gerou o resultado, ou seja, que o nexo causal está presente. Em não havendo culpa, não existirá responsabilidade.

O Código Civil adota como regra geral a responsabilidade civil subjetiva conforme se extrai do seu artigo 927, caput, combi-nado com o art. 186 do mesmo diploma legal que dispõem

2 Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente, não se houver por eles responsabilizado.Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar. 3 Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

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Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, ne-gligência ou imprudência, violar direito e causar dano a ou-trem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Em sentido oposto, na responsabilidade objetiva a prova de culpa é totalmente irrelevante, bastando o nexo causal entre o dano sofrido pela vítima e a conduta do agente para que nasça o dever de indenizar.

Carlos Alberto Gonçalves (2014, p.48) leciona que a lei im-põe, para certas pessoas, em determinadas situações, a repara-ção de um dano cometido sem culpa, nessas hipóteses, diz-se que a responsabilidade é legal ou objetiva, porque prescinde da culpa e se satisfaz somente com o dano e o nexo causal. Segundo o autor, esta teoria conhecida como objetiva, ou de risco, tem como postulado que todo dano é indenizável e deve ser pronta-mente reparado por quem a ele se liga por um simples nexo de causalidade, independentemente da comprovação da culpa.

O Código Civil atual muito embora tenha se filiado à respon-sabilidade subjetiva, conforme acima mencionado, foi além ao regular casos específicos de responsabilidade objetiva tais como a responsabilidade pelo fato da coisa e do animal (arts. 936, 937 e 939)4 e responsabilidade pelo fato de outrem (arts.932 e 933)5.

4 Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.Art. 939. O credor que demandar o devedor antes de vencida a dívida, fora dos casos em que a lei o permita, ficará obrigado a esperar o tempo que faltava para o vencimento, a descontar os juros correspondentes, embora estipulados, e a pagar as custas em dobro.5 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão

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Ademais, o mencionado Código inovou ao instituir as cláusulas gerais de responsabilidade objetiva, permitindo que tal espécie de responsabilidade fosse aplicada a um número indeterminado de conflitos em razão da abertura e amplitude dessas normas. Na sua aplicação, caberá ao magistrado a tarefa de elaborar a regra mais apropriada para o caso em concreto.

De acordo com o Professor Gustavo Tepedino (2000, p.10), a adoção da técnica das cláusulas gerais evita que profundas lacunas sejam formadas pela evolução da sociedade, vez que é “impossível ao legislador acompanhar o passo dos acontecimen-tos, e infrutífera a tentativa de tipificar a totalidade das situações jurídicas que, assim como os bens jurídicos objeto do direito, multiplicam-se a cada momento”.

Dentre as cláusulas gerais destacam-se o art. 927, parágrafo único6, que estabelece a responsabilidade objetiva em razão da atividade de risco de forma ampla, bem como o art. 1877 que prevê o abuso de direito como ato ilícito passível de indenização caso gere prejuízo a outrem.

Ainda sobre o tema, demonstra-se oportuna a menção às li-ções do jurista Carlos Alberto Bittar (2003, p. 168-170), defensor da objetivação da responsabilidade civil com base na teoria do risco. Para o doutrinador, tal teoria deveria ser aplicada a todas as atividades perigosas ou de risco, restando para as demais, o sistema da responsabilidade civil clássica, fundado na culpa.

dele; IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.6 Art. 927. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.7 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede mani-festamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

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Dentro do contexto apresentado, as atividades perigosas são aquelas que, por sua própria natureza ou modo de realização, comumente causam prejuízos a outrem, de modo que os seus titulares devem ser responsabilizados independentemente de culpa, pela simples introdução daquelas no meio social – teoria do risco criado. Como exemplos de atividades perigosas pode-se mencionar o transporte de mercadorias, a fabricação e comercia-lização de explosivos, a construção civil, entre outros.

O mencionado autor defende que as atividades perigosas formam uma categoria própria de responsabilidade civil deno-minada especial ou excepcional, que se distingue da responsa-bilidade comum ou subjetiva. Ademais, sustenta que deve ser considerada perigosa toda aquela atividade que contenha em si uma notável potencialidade danosa, tomando como base a nor-malidade média, revelada por meio de estatísticas de informa-ções técnicas e da própria experiência comum.

Compartilhando desse entendimento o E. Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região decidiu

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA - DESCABIMENTO. ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL. A CARACTERIZAÇÃO DE RESPONSABILI-DADE OBJETIVA DEPENDE DO ENQUADRAMENTO TÉCNICO DA ATIVIDADE EMPREENDIDA COMO SENDO PERIGOSA. ARTIGO 927, PARÁGRAFO ÚNI-CO, DO CÓDIGO CIVIL. TRABALHO COM MOTOCI-CLETA. 1. Condenação ao pagamento de indenização por dano moral, baseada na aplicação da responsabili-dade objetiva, pressupõe o enquadramento técnico da atividade empreendida como sendo perigosa. 2. Os tra-balhadores que se utilizam de motocicletas como con-dição para a prestação de serviços enfrentam, cotidiana-mente, grandes riscos com a falta de estrutura da malha

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rodoviária brasileira. O perigo de acidentes é constante, na medida em que o trabalhador se submete, sempre, a fatores de risco superiores àqueles a que estão sujeitos o homem médio. Nesse contexto, revela-se inafastável o enquadramento da atividade como de risco, o que au-toriza o deferimento do título postulado com arrimo na aplicação da responsabilidade objetiva conforme pre-vista no Código Civil. No caso, a atividade normalmente exercida pelo empregado, que se servia de motocicleta para a prestação de serviços, submetia-o, diariamen-te, a superlativos fatores de risco. Precedentes. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (Processo: AIRR - 1565-38.2011.5.18.0082 Data de Julgamento: 22/05/2013, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/05/2013). Recurso da Reclamada conhecido e despro-vido. Recurso do Reclamante conhecido e parcialmente provido. I -(TRT-10 - RO: 987201282110006 DF 00987-2012-821-10-00-6 RO, Relator: Desembargador Douglas Alencar Rodrigues , Data de Julgamento: 04/09/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: 13/09/2013 no DEJT) 8

Por tanto, conclui-se que diante das cláusulas gerais de responsabilidade civil e dos novos casos positivados não só no Código Civil, mas tambem na legislação extravagante, a respon-sabilidade objetiva, atualmente, regula um número superior de casos, restando muito pouco para a responsabilidade subjetiva a qual será aplicada de forma subsidiária, sempre que não existir disposição legal expressa consagrando a teoria objetiva.

8 <Disponível em: http://www.trt14.jus.br>. Acesso em 05/12/2014.

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2.5 PRESSUPOSTOS DO DEVER DE INDENIZAR

O art. 186 do Código Civil, alicerce fundamental da respon-sabilidade civil brasileira, consagrador da máxima de que a nin-guém se deve lesar (neminem laedere), dispõe

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, ne-gligência ou imprudência, violar direito e causar dano a ou-trem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Não há unanimidade na doutrina acerca de quais são os ele-mentos estruturais da responsabilidade civil ou pressupostos do dever de indenizar. Carlos Alberto Gonçalves (2014, p.53), por exemplo, entende que são quatro os pressupostos da responsa-bilidade civil: ação ou omissão; culpa ou dolo do agente; relação de causalidade; dano.

Já Sérgio Cavalieri Filho (2012, p.33) sustenta que são três os elementos: conduta culposa do agente; nexo causal; dano. Outros, como Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2014, v.III, p.69), entendem que os pressupostos são: conduta humana (positiva ou negativa); dano ou prejuízo; nexo de cau-salidade.

No entanto, como bem observa o renomado Flávio Tartuce (2014, p.357), a doutrina majoritária é no sentido de que quatro são os elementos essenciais ou pressupostos gerais da responsa-bilidade civil: ação ou omissão; culpa ou dolo; nexo de causali-dade e dano suportado pela vítima.

Desse modo, com base no entendimento predominante, pas-saremos à análise de cada pressuposto isoladamente.

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2.5.1 Conduta humana

A conduta humana é o primeiro pressuposto da responsabi-lidade civil a ser estudado. Trata-se da ação ou omissão voluntá-ria do agente que venha a causar prejuízo a outrem.

O Código Civil além de disciplinar a responsabilidade de-corrente de ato próprio, prevê também espécies de responsabi-lidade indireta, por ato de terceiro que esteja sob a guarda do indivíduo e por danos causados por animais e objetos que lhe pertençam.

Nesse sentido, destaca-se a doutrina de Cavalieri Filho (2014, p.39)

De regra, só se responde pelo fato aquele que lhe dá causa, por conduta própria. É a responsabilidade direta, por fato próprio cuja justificativa está no próprio princípio infor-mador da teoria da informação. A lei, todavia, algumas ve-zes faz emergir a responsabilidade do fato de outrem ou de terceiro, a quem o responsável está ligado de algum modo, por um dever de guarda, vigilância e cuidado.

O art.932 do Código Civil9 apresenta um rol taxativo de ca-sos em que o sujeito será convocado a responder civilmente pelo fato de terceiro em virtude da existência de um vínculo jurídico o qual acarreta um dever de guarda, vigilância ou custódia.

A responsabilidade pelo fato de outrem nada mais é que a responsabilidade por fato próprio omissivo em razão do des-

9 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

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cumprimento do dever de vigilância imposto. Cria-se, portanto, uma responsabilidade objetiva do garante pelas consequências do ato causado pelo autor do dano material.

Nesse caso, de responsabilidade pelo fato de outrem, Silvio Venosa (2010, p.86) salienta o seguinte:

Não se esqueça de que na responsabilidade por fato de outrem existem duas responsabilidades: a do causador do dano e da pessoa também encarregada de indenizar. É ne-cessário que o agente tenha agido com culpa ou, no caso de incapazes, que tenha ocorrido uma conduta contrária ao Direito, porque não se fala estritamente em culpa destes.

A responsabilidade pode, ainda, decorrer de danos causa-dos por animais ou objetos, é a chamada responsabilidade pelo fato das coisas ou, como preferem alguns autores, responsabili-dade pela guarda das coisas inanimadas.

Atente-se que não se pode falar em responsabilidade civil pelo fato da coisa quando o dano decorre da conduta direta do seu guardião, que segundo a melhor doutrina, é aquele que tem o efetivo poder de comando sobre a coisa no momento do evento danoso, ou seja, que detém a sua guarda intelectual.

Ora, o guardião da coisa ou do animal assume uma obriga-ção de resultado, qual seja a de guardá-los com cautela e segu-rança de modo a garantir que não causem prejuízos a terceiros. Caso demonstrado que tal dever de cautela foi violado, nascerá para o guardião a obrigação de indenizar independente de culpa que somente será afastada diante da configuração de uma das causas de exclusão do próprio nexo causal.

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2.5.2 Culpa

Inicialmente, cumpre elucidar que o pressuposto culpa so-mente estará presente nas hipóteses de responsabilidade civil subjetiva. O mencionado elemento é irrelevante nos casos de responsabilidade objetiva, em que somente se faz necessária a demonstração do nexo causal entre a ação/omissão e o dano ex-perimentado.

O art. 186 do Código Civil estabelece que o ato ilícito so-mente irá se configurar quando o comportamento do agente for culposo. Por ato culposo entende-se a culpa em sentido amplo, que abrange tanto o dolo como a culpa em sentido estrito.

O dolo consiste na vontade consciente do agente em violar o dever jurídico. Já na culpa em sentido estrito, não há intenção de lesar por parte do agente, ou seja, ele não quer que o resul-tado antijurídico se materialize, mas em razão da sua falta de diligência acaba por alcançá-lo.

Como bem assinala Rui Stoco (2007, p. 133), quando há a intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuí-zo a outrem, há o dolo, isto é, o pleno conhecimento do mal e o direto propósito de praticá-lo. Caso não exista essa intenção, mas o prejuízo venha a surgir, por imprudência ou negligência, estaremos diante da culpa stricto sensu.

Ademais, é possível distinguir a culpa em razão de sua gra-vidade. A culpa grave guarda semelhança com o dolo e ocorre quando houver negligência extrema do agente; leve quando a falta puder ser evitada por atenção ordinária, comum ao homem médio; por fim, a culpa levíssima quando a falta somente for evitável por meio de atenção extraordinária do agente, exigindo deste uma habilidade especial ou singular.

O doutrinador Arnaldo Rizzardo (1997, p.23), ao discorrer sobre a culpa, faz a seguinte ponderação

Culpa delitual ou dolo, ou falta intencional, e culpa qua-

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se – delitual, ou simplesmente culpa, envolvem conteúdos diversos, mas refletem, em direito civil, consequências se-melhantes. O legislador brasileiro desprezou a distinção. Nem definiu o conceito de culpa o que agiu com prudên-cia. Mas no texto do art. 159 do CC10 se vislumbram duas espécies. Ao mencionar ação ou omissão voluntária, está conceituando, ou introduzindo a definição de dolo; falan-do em negligência ou imprudência, classifica a culpa.

Outrossim, o Código Civil de 2002 inovou ao possibilitar que o juiz gradue a indenização se houver excessiva despropor-ção entre o dano causado e a gravidade da culpa. Logo, o julga-dor ao fixar o valor do ressarcimento, não deve se ater somente a extensão do prejuízo alegado pelo ofendido, mas também ao “grau de culpa” presente na conduta do ofensor.

De toda sorte, frise-se que para alguns doutrinadores, com destaque para Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2014, v.III, p.70-71), a culpa (em sentindo lato, abrangendo o dolo) não é um ele-mento essencial da responsabilidade civil, sobretudo no novo Código, em razão da existência da responsabilidade objetiva que prescinde desse elemento subjetivo para a sua configuração. Se-gundo eles, a culpa não pode ser considerada pressuposto geral, pois não é revestida de generalidade.

Entretanto, grande parte da doutrina e jurisprudência en-tende que a culpa constitui pressuposto essencial para configu-ração da responsabilidade civil nas hipóteses de aplicação da teoria subjetivista, de modo que a ausência desse elemento im-plica na impossibilidade de responsabilização civil do causador do dano.

10 Art. 159 do Código Civil de 1916 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

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2.5.3 Nexo Causal

O nexo causal é a relação de causa e efeito entre a conduta culposa ou o risco criado e o dano suportado por alguém. Tal pressuposto é elemento indispensável em qualquer modalidade de responsabilidade civil.

Há pelo menos três teorias informadoras para a fixação do nexo de causalidade, a saber: teoria da equivalência das condi-ções – defende que tudo aquilo que concorreu para a realiza-ção do evento pode ser considerada causa; teoria da causalidade adequada – estimula uma adequação do efeito à causa, afastan-do os danos decorrentes de circunstância extraordinárias; e a teoria da causalidade imediata – a relação de causa e efeito entre o fato e o resultado danoso deverá ser direta e imediata.

A doutrina mostra-se oscilante no tocante à teoria adotada pelo Código Civil brasileiro. Parte deles, capitaneados por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2014, v.III, p.146), defendem que o nosso Código segue a teoria da causalidade di-reta ou imediata. Em sentido oposto autores como Sergio Cava-lieri Filho tendem a acolher a teoria da causalidade adequada (2012, p.66).

Diante de tal imprecisão doutrinária, valoroso mencionar os ensinamentos de Rui Stoco (2007, p. 152)

Enfim, independente da teoria que se adote, como a ques-tão só se apresenta ao juiz, caberá a este, na análise do caso concreto, sopesar as provas, interpretá-las como conjunto e estabelecer se houve violação do direito alheio, cujo re-sultado seja danoso, e se existe um nexo causal entre esse comportamento do agente e o dano verificado

Acerca da matéria, o Supremo Tribunal Federal em acórdão clássico, tendo como relator o então Ministro Moreira Alves, po-

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sicionou-se no sentido de que o Código Civil de 2002 teria ado-tado a teoria do dano direto e imediato. Vejamos.

Responsabilidade civil do Estado. Dano decorrente de assalto por quadrilha de que fazia parte preso foragi-do vários meses antes. - A responsabilidade do Estado, embora objetiva por força do disposto no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69 (e, atualmente, no pa-rágrafo 6. do artigo 37 da Carta Magna), não dispensa, obviamente, o requisito, também objetivo, do nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a seus agentes e o dano causado a terceiros. - Em nosso sistema jurídico, como resulta do disposto no artigo 1.060 do Código Civil, a teoria adotada quanto ao nexo de cau-salidade e a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal. Não obstante aquele dispositivo da codificação civil diga respeito a impropriamente denominada responsabilida-de contratual, aplica-se ele também a responsabilidade extracontratual, inclusive a objetiva, até por ser aquela que, sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os inconvenientes das outras duas teorias existen-tes: a da equivalência das condições e a da causalidade adequada. - No caso, em face dos fatos tidos como cer-tos pelo acórdão recorrido, e com base nos quais reco-nheceu ele o nexo de causalidade indispensável para o reconhecimento da responsabilidade objetiva constitu-cional, e inequívoco que o nexo de causalidade inexiste, e, portanto, não pode haver a incidência da responsabi-lidade prevista no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69, a que corresponde o parágrafo 6. do artigo 37 da atual Constituição. Com efeito, o dano decorrente do as-salto por uma quadrilha de que participava um dos eva-

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didos da prisão não foi o efeito necessário da omissão da autoridade pública que o acórdão recorrido teve como causa da fuga dele, mas resultou de concausas, como a formação da quadrilha, e o assalto ocorrido cerca de vinte e um meses após a evasão. Recurso extraordiná-rio conhecido e provido.(STF - RE: 130764 PR , Rela-tor: MOREIRA ALVES, Data de Julgamento: 12/05/1992, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 07-08-1992 PP-11782 EMENT VOL-01669-02 PP-00350 RTJ VOL-00143-01 PP-00270)(grifo nosso) 11

2.5.4 Dano

O dano é essencial à responsabilidade. Sem o dano, não existe o dever de ressarcimento e, em consequência, a respon-sabilidade.

O Ilustre doutrinador Carlos Alberto Bittar (2005, p.09) en-sina que o dano configura a lesão sofrida pelo ofendido em seu conjunto de valores protegidos pelo direito, seja quanto a sua própria pessoa (moral ou fisicamente), seja quanto aos seus bens ou mesmo os seus direitos. Para o autor, o dano “é a perda, ou diminuição, total ou parcial, de elemento, ou de expressão, com-ponente de sua estrutura de bens psíquicos, físicos, morais ou materiais”.

A doutrina divide o dano em material ou patrimonial, moral ou extrapatrimonial ou estético. O dano patrimonial abrange o dano emergente traduzido pela diminuição efetiva no patrimô-nio da vítima e o lucro cessante que consiste na perda do ganho esperável (futuro e certo).

O dano moral corresponde à violação a bens que integram os direitos da personalidade, como a honra, a intimidade, o bom

11 <Disponível em: http://www.stf.jus.br>. Acesso em 02/12/2014.

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nome, a dignidade, entre outros e que acarretam dor, triste, so-frimento e humilhação.

Ademais, é oportuno ainda mencionar que a partir da entra-da em vigor da Constituição de 1988, que previu pela primeira vez, a reparação constitucional do dano moral, a possibilidade de cumulação entre este e o dano material tornou-se indiscu-tível. À luz desse novo entendimento, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula nº. 37, com a seguinte redação: “São cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato”.

O dano estético pode ser compreendido como uma defor-midade física (cicatrizes, aleijão) que causa uma aversão visual. Por muito tempo travou-se grande debate na doutrina e na juris-prudência acerca da sua configuração ou não como uma espécie diversa de dano extrapatrimonial.

Todavia, tal controvérsia resta atualmente superada preva-lecendo o entendimento de que o dano estético é algo distinto do dano moral, correspondendo este último a um abalo psicoló-gico e aquele a um dano visível concretizado pela alteração na formação corporal do indivíduo que causa repulsa aos olhos de terceiros.

O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, editou a Súmula 38712 que estabelece, de maneira clara, a possibilidade de cumu-lação das indenizações dos danos estético e moral. Segundo o entendimento firmado, a acumulação de ambos os danos é ca-bível quando for possível a identificação separada de cada um deles, ainda que sejam decorrentes do mesmo fato.

2.6 CAUSAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

12 Súmula 387 do STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.

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As causas excludentes de responsabilidade são as situações que aniquilam com qualquer ambição indenizatória na medida em que rompem com o nexo de causalidade existente entre a conduta do agente e os pressupostos gerais de responsabilidade civil.

2.6.1 Legítima defesa

A legítima defesa está previsto no artigo 188, I, primeira par-te do Código Civil o qual dispõe que não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa. Para que esta excludente se configure é imprescindível que o agente se utilize de meios mo-derados para afastar o dano ou sua iminência.

Insta anotar que apenas a legítima defesa real e praticada contra o agressor, impede a ação de ressarcimento de danos. Ou seja, se o agente por erro na execução causar danos a terceiros, permanecerá obrigado a reparar os prejuízos causados. Nesse sentindo a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIS-PARO DE ARMA DE FOGO. LESÕES. EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE. LEGÍTIMA DEFESA QUE ATINGE TERCEIRO. ERRO NA EXECUÇÃO. ABERRATIO ICTUS. ABUSO DE DIREITO. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. ESTABELECIMENTO COMERCIAL. FATO DO SERVIÇO. DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. QUANTUM INDENI-ZATÓRIO. ABERRATIO ICTUS. A legítima defesa ocorre quando o agente, usando moderadamente dos meios ne-cessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a di-reito seu ou de outrem. Constitui causa eficaz de exclusão da responsabilidade apenas quando o lesado é o autor da agressão...(TJ-RS - AC: 70046278198 RS , Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Data de Julgamento: 24/10/2012, Nona Câ-

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mara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 26/10/2012) 13

Igualmente, a legítima defesa putativa não exime o sujeito do dever jurídico de indenizar os danos. “Encontra-se em le-gítima defesa putativa o agente que, em face da uma suposta ou imaginária agressão, repele-a utilizando-se moderadamente dos meios necessários para a defesa do seu direito ameaçado” (STOLZE; PAMPLONA FILHO, 2014, v.3, p.161).

2.6.2 Estado de necessidade

O artigo 188, II, do atual Código Civil prescreve que não constitui ato ilícito a deterioração ou destruição de coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de remover perigo iminente, prestes a acontecer.

O parágrafo único do dispositivo em comento assevera ain-da que o ato “somente será legitimo quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável”.

Nesse toar, o estado de necessidade configura-se quando o sujeito agride direito alheio de valor jurídico igual ou inferior àquele que se pretende proteger a fim de remover perigo imi-nente.

O artigo 930 referido Código estabelece ainda que se o pe-rigo for causado por terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

13 <Disponível em: http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em 03/12/2014.

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RESPONSABILIDADE CIVIL y 39

2.6.3 Exercício regular do direito e estrito cumprimento do dever legal

Indica o art. 188, I, segunda parte, do Código atual, que não constitui ato ilícito o praticado no exercício regular de um direito reconhecido. Logo, aquele que atua com respaldo no ordenamento legal, não pode ao mesmo tempo estar operando contra o mesmo.

Assim, não poderá um policial ser responsabilizado civil-mente pelo arrombamento de uma residência em cumprimen-to de ordem judicial tampouco o credor pela inclusão do nome de devedores no cadastro de inadimplentes (SERASA e SPC). Ambas as situações, caso exercidas de forma não abusiva, serão admitidas pelo Direito.

A jurisprudência acerca das excludentes de responsabilida-de ora analisadas é bastante vasta, razão pela qual se transcre-vem as ementas de alguns julgados:

DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RES-PONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE INDENIZAR. CO-MUNICAÇÃO DE FATO CRIMINOSO À AUTORIDADE POLICIAL. ‘NOTÍCIA CRIME’. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. EXCLUSÃO DE ANTIJURIDICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIÇÃO PERANTE O JUÍZO CRIMI-NAL POR FALTA DE PROVAS. IRRELEVÂNCIA. DEVER REPARATÓRIO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MAN-TIDA. 1. Qualquer um do povo tem assegurado o direito de, tomando ciência da existência de fato que possa confi-gurar crime de ação penal pública, noticiá-lo à autoridade policial para que essa possa investigá-lo, até mesmo como forma de cooperação à atividade de polícia judiciária. 2. Não pode o juízo cível realizar a valoração da conduta à luz das normas penais, vale dizer, não pode afirmar se houve ou não o crime de denunciação caluniosa, incumbindo tal

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mister ao juízo criminal, mas é certo que para que exsurja a responsabilidade civil é necessária evidência mínima de que o agente atuou dolosamente no sentido da instauração do inquérito policial, sabendo inocente a vítima.(TJ-MG - AC: 10378110021854001 MG , Relator: Otávio Portes, Data de Julgamento: 21/08/2014, Câmaras Cíveis / 16ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 01/09/2014) 14

CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ES-TADO. ABUSO DE PODER. NÃO CONFIGURAÇÃO. ES-TRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. - Uma das hipóteses de exclusão da responsabilidade estatal decorre do estrito cumprimento do dever legal por parte de agentes públicos quando do exercício do poder de polícia. Nestes casos, o Poder Público somente poderá ser responsabiliza-do caso evidenciada a prática de ato ilícito por seus pre-postos, sob pena de ser obrigado a indenizar quando age no exercício de sua função de prestar segurança pública, investigar e elucidar a prática de infrações criminais. - A parte autora não se desincumbiu de demonstrar a condu-ta arbitrária dos policiais militares ou abuso de poder no exercício da função, ônus que lhe incumbia. No caso em exame, não pode a indenização por dano moral recair sobre o ente público, porquanto não houve nenhum ato ilícito ou abusivo, gerador de dano moral, limitando-se a conduta ao estrito cumprimento do dever legal. - Recurso conhecido e desprovido.(TJ-AM - APL: 02545846720088040001 AM 0254584-67.2008.8.04.0001, Relator: Wellington José de Araújo, Data de Julgamento: 04/11/2013, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 12/11/2013) 15

14 <Disponível em: http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 03/12/2014.15 <Disponível em: http://www.tjam.jus.br>. Acesso em 03/12/2014.

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RESPONSABILIDADE CIVIL y 41

2.6.4 Caso fortuito e força maior

O caso fortuito e a força maior são temas ainda não pacifica-dos na doutrina em razão dos diversos conceitos existentes para cada um dos institutos ou mesmo para os dois, quando conside-rados como expressões unívocas.

De acordo com Maria Helena Diniz (2007, p.113), na força maior, por ser um fato da natureza, pode-se conhecer o moti-vo ou a causa que deu origem ao acontecimento, como um raio que provoca um incêndio, inundação que danifica produtos impedindo a entrega da mercadoria prometida ou mesmo um terremoto que ocasiona grandes prejuízos. Já o caso fortuito tem origem em causa desconhecida, como um cabo elétrico aéreo que sem saber o motivo se rompe e cai sobre fios telefônicos cau-sando incêndio e/ou explosão de caldeira de usina, provocando morte de alguém.

Confirmando a instabilidade doutrinária, Rodolfo Pamplona e Pablo Stolze Gagliano (2014, v.III, p.167) adotam outros crité-rios para definição dos termos “caso fortuito” e “força maior”. Para eles, a característica marcante da força maior é a sua inevi-tabilidade (um terremoto) ao passo que o caso fortuito distingue--se por sua imprevisibilidade (um atropelamento).

Por fim, é importante registrar que o Código Civil de 2002 não se preocupou em diferenciar os institutos, tratando-os como sinônimos fossem, consoante se extrai da simples leitura da nor-ma abaixo transcrita

Art. 393 O devedor não responde pelos prejuízos resultan-tes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica--se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

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2.6.5 Culpa exclusiva da vítima e fato de terceiro

O evento danoso pode derivar da culpa exclusiva ou concor-rente da vítima. No primeiro caso não há nexo de causalidade entre o ato do agente e o dano experimentado pela vítima, fun-cionando aquele apenas como mero instrumento do fato dano-so vez que não existe relação entre a sua conduta e o prejuízo causado.

A culpa concorrente, no entanto, não tem o condão de afas-tar por completo o nexo de causalidade. Nesse caso, tanto o au-tor como a vítima contribuem concomitantemente para a pro-dução do evento lesivo de modo que ambos serão civilmente responsabilizados com base na gravidade de suas condutas.

Acerca do tema veja-se decisão do E. Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACI-DENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO. CULPA CONCORREN-TE. PRELIMINAR DE INÉPCIA RECURSAL. 1. Preliminar de inépcia recursal: o apelante, embora a simplicidade na exposição dos seus argumentos, apresenta sua insurgên-cia indicando com clareza suficiente as razões pelas quais reputa equivocada a sentença e, com base nas provas pro-duzidas nos autos, demonstra os motivos pelos quais pre-tende a reforma da decisão recorrida. 2. Mérito: ambos os condutores deram causa ao sinistro: o do automóvel segu-rado, por empreender deslocamento lateral, da esquerda para a direita, transpondo três faixas da Av. Aureliano de Figueiredo Pinto, desde o retorno realizado no canteiro central da via, para ingressar no prédio do Ministério Pú-blico, sem adotar as cautelas exigíveis; o motociclista por prosseguir em sua marcha, mesmo antevendo a manobra do condutor do automóvel, sem nem mesmo reduzir a

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velocidade da motocicleta, sob o argumento de que tinha “um compromisso” (que, mais tarde, se revelou ser assis-tir a uma partida do Campeonato Brasileiro de Futebol, à noite). Preliminar contra-recursal rejeitada e apelo despro-vido. (Apelação Cível Nº 70057809527, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 20/11/2014).(TJ-RS - AC: 70057809527 RS , Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Data de Julgamento: 20/11/2014, Décima Segunda Câ-mara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 24/11/2014) 16

O fato de terceiro também pode apresentar-se como causa excludente da responsabilidade civil quando a ação/omissão que ocasionou o prejuízo derive exclusivamente de ato de ter-ceiro. Para que isso ocorra, é fundamental que o fato de terceiro não tenha sido ocasionado pelo suposto ofensor bem como que o acontecimento seja imprevisível e inevitável se assemelhando, nesse ponto, às características do caso fortuito.

Gisela Sampaio da Cruz (2005, p.177) ao discorrer sobre o tema acrescenta que

A participação do terceiro na causação do dano pode ocor-rer de maneira total ou parcial. Na primeira hipótese, o dano é causado exclusivamente pelo terceiro; na segun-da hipótese, o terceiro é apenas co-partícipe, ou elemento concorrente no desfecho prejudicial. Apenas no primeiro caso é que se verifica a eliminação do nexo causal, com a consequente exclusão da responsabilidade do agente.

16 <Disponível em: http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em 03/12/2014.

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Não tem sido diferente o enquadramento jurisprudencial:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. RES-PONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. EXPLOSÃO DE BOMBA EM COMPOSIÇÃO FERROVIÁRIA. FATO DE TERCEIRO. CASO FORTUITO. 1. A jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que a colocação de artefato explosivo em composição ferroviária por terceiro deve ser caracterizada como fortuito externo, por se tratar de fato não relacionado com os riscos inerentes à ativida-de explorada. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.(STJ - AgRg no REsp: 1160265 SP 2009/0188099-4, Relator: Ministra MARIA ISABEL GAL-LOTTI, Data de Julgamento: 24/06/2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2014)17

Frise-se que a jurisprudência não admite a excludente em estudo nos contratos de transporte quando o evento estiver re-lacionado à exploração da atividade como, por exemplo, uma colisão automobilística. Trata-se do fortuito interno o qual não exonera a responsabilidade da empresa.

Dispõe, com efeito, a Súmula 187 do Superior Tribunal Fe-deral que “a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”.

17 <Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em 03/12/2014.

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3 RESPONSABILIDADE CIVIL E O DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL

O PROFESSOR Paulo Bonavides ao receber a medalha Teixeira de Freitas, no Instituto dos Advogados Brasileiros em 1998 pro-feriu uma frase que muito reflete o momento jurídico atual, in verbis: “Ontem os Códigos; hoje as Constituições”. Ora, nos dias de hoje a Constituição Federal passa a atuar como centro do or-denamento jurídico, servindo de filtro axiológico para todos os ramos do direito, em outras palavras, toda interpretação jurídica deve ser feita à luz da Constituição Federal de 1988.

Flávio Tartuce aduz (2014, p. 313)

Para explicar essa variação de interpretação, pode ser evo-cada a feliz simbologia utilizada por Ricardo Lorenzetti, pela qual o sistema de Direito Privado é semelhante a um sistema solar, diante do notório Big Ban Legislativo que vivenciamos (explosão das leis). Nesse sistema, o Sol é a Constituição Federal de 1988; o planeta principal o Código

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Civil; e os satélites, os microssistemas ou estatuto, como no caso do Código de Defesa do Consumidor, da Lei do Bem de Família. Essa simbologia demonstra muito bem a concepção do Direito Civil Constitucional e da constitucio-nalização do Direito Civil, pois no centro do ordenamento está a Constituição e não o Código Civil.

Paulo Luiz Netto Lôbo (2005, p. 02), ao tratar da constitucio-nalização do Direito Privado, adiciona que

Na atualidade não se cuida de buscar a demarcação dos espaços distintos e até contrapostos. Antes havia uma dis-junção: hoje, a unidade hermenêutica tendo a Constituição como ápice conformador da elaboração e aplicação da le-gislação civil. A mudança de atitude é substancial: deve o jurista interpretar o Código Civil segundo a Constituição e não a Constituição segundo o Código, como ocorria com frequência (e ainda ocorre). A mudança de atitude também envolve certa dose de humildade epistemológica.

O Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Bar-roso (2011 p. 369) ao discorrer sobre o tema esclarece que o pro-cesso de constitucionalização do direito civil é verificado tanto pela vinda das normas de direito civil para o plano constitucio-nal como também, sobretudo, pela ida da Constituição para a interpretação do direito civil, impondo um conjunto de valores e princípios, dentre eles a função social da propriedade, a boa-fé objetiva e o efetivo equilíbrio contratual.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho (2014, v.I, p.89) pre-conizam

Por tudo isso, a Constituição Federal, consagrando valores como a dignidade da pessoa humana, a valorização social

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RESPONSABILIDADE CIVIL E O DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL y 47

do trabalho, a igualdade e proteção dos filhos, o exercício não abusivo da atividade econômica, deixa de ser um sim-ples documento de boas intenções e passa a ser considera-da um corpo normativo superior que deve ser diretamente aplicado às relações jurídicas em geral, subordinando toda a legislação ordinária.

Com efeito, a Constituição Federal a partir do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) 1 e dos demais princípios constitucionais, em particular os da igualdade (art. 5º, caput) 2 e solidariedade (art.3º, I) 3, determina novo sentido e alcance para os institutos tradicionais do Direito Civil. Nesse sentido, deve a responsabilidade civil ser examinada a partir da personalização do direito privado, que se consubstancia na valorização da pessoa em detrimento da desvalorização do patrimônio.

Felipe P. Braga Netto (2014, p.29-30) elucida que duas pa-lavras podem resumir o fenômeno da constitucionalização do direito civil: repersonalização e despatrimonialização. Isto é, “o intérprete deve ter uma atenção prioritária com a pessoa huma-na, e não com o seu patrimônio. O patrimônio é mero instru-mento de realização de finalidades existenciais e espirituais, não é um fim em si mesmo”.

Assim, pode-se dizer que a constitucionalização do direito civil se origina a partir de uma interação simbiótica entre o Di-reito Constitucional e o Direito Civil, em que estes devem ser in-terpretados como um todo e não de forma isolada, tornando-se,

1 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Muni-cípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como funda-mentos: III - a dignidade da pessoa humana;2 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes;3Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

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por conseguinte, obsoleta a divisão que prevalecia no passado entre público e privado.

Como bem observa o Professor Gustavo Tepedino (2012, p.19) o grande desafio do jurista atualmente consiste na harmo-nização das fontes normativas, a partir dos valores e princípios constitucionais. O Código Civil de 2002 deve contribuir para tal esforço hermenêutico não cabendo ao intérprete “deixar-se levar por eventual sedução de nele imaginar um microclima de conceitos e liberdades patrimoniais descomprometidas com a legalidade constitucional”.

Assim, conclui-se que a codificação civilista bem como os demais ramos do direito, devem ser interpretados à luz da Cons-tituição Federal de 1988, sobretudo em razão da proteção da dignidade da pessoa humana, princípio fundamental do ordena-mento jurídico brasileiro.

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4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

NAS PALAVRAS de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p.618) a responsabilidade extracontratual do estado corresponde à obrigação de reparar os danos causados a terceiros em razão de comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídi-cos, lícitos e ilícitos, atribuíveis aos agentes públicos.

Celso Antônio Bandeira de Melo (2005, p.937) elucida

Entende-se por responsabilidade patrimonial extracon-tratual do Estado a obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decor-rência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos.

Assim, a responsabilidade civil do Estado consiste no dever estatal de indenizar particulares pelos prejuízos causados em

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decorrência da conduta, omissiva ou comissiva, de seus agen-tes públicos quando no exercício da função administrativa ou a pretexto de exercê-las.

Nesse sentido, esclarece Carvalho Filho (2013, p.550) que “o Estado, por si só, não pode causar danos a ninguém. Sendo assim, o cenário concernente ao tema que estudamos se compõe de três sujeitos: o lesado, o Estado e o agente do Estado”.

Após as considerações inicias, passemos à análise da evolu-ção histórica da responsabilidade estatal, com a ressalva de que há uma grande divergência doutrinária no tocante à terminolo-gia das teorias.

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

4.1.1 Fase da Irresponsabilidade

A teoria da irresponsabilidade é a mais antiga das teo-rias e vigeu na época dos Estados absolutistas com respaldo na idéia de soberania dos monarcas que eram considerados representantes de Deus na terra e suas condutas, portanto, decorriam da vontade divina. Retrata perfeitamente esta épo-ca a máxima “The King can do no wrong”, ou seja, o rei não pode errar.

O Estado, portanto, personificado na figura do monarca que era detentor de autoridade incontestável, não tinha qualquer responsabilidade pelos atos praticados pelos seus agentes.

Yussef Said Cahali (2007, p.21) preconiza que

Em realidade, dentro da concepção política do Estado ab-soluto não podia caber a idéia de reparação dos danos cau-sados pelo Poder Público, dado que não se admitia a cons-tituição de direitos contra o Estado soberano, que gozava de imunidade total.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO y 51

Entretanto, acrescenta Cavalieri Filho (2014, p.283) que os administrados tinham apenas ação contra o próprio funcionário causador do dano, jamais contra o Estado e, caso o agente fosse in-solvente, a ação de indenização quase sempre resultava frustrada.

Essa teoria não prevaleceu por muito tempo diante da sua notória injustiça, razão pela qual atualmente está superada. As-sim, as nações civilizadas, de forma geral, admitem a respon-sabilização do Estado pelos danos causados por seus agentes a terceiros, podendo existir diferenças exclusivamente quanto a pontos específicos da matéria.

4.1.2 Fase Civilística

No século XIX, a teoria da irresponsabilidade foi repelida da doutrina e dos tribunais e passou-se a adotar a responsabiliza-ção do Estado nos casos de ação culposa dos seus agentes.

De início, a teoria civilista da culpa fazia distinção entre os atos de império e os atos de gestão. Acerca do tema, Maria Sylvia Di Pietro (2006, p.619) doutrina o seguinte:

Os primeiros seriam os praticados pela Administração com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impos-tos unilateral e coercitivamente ao particular independen-temente de autorização judicial, sendo regidos por um direito especial, exorbitantes ao direito comum, porque os particulares não podem praticar atos semelhantes; os segundos seriam praticados pela Administração em situa-ção de igualdade com os particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para gestão de seus serviços

A partir desta divisão, a responsabilização civil do Estado passou a ser admitida quanto aos atos de gestão, mas não em

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relação aos de império já que estes seriam regidos unicamente pelas normas de direito público. Frise-se que surgiu grande opo-sição a essa teoria em razão da dificuldade prática em distinguir se o ato era de império ou de gestão, ocasionando inúmeras im-precisões e casos mal solucionados.

Muito embora a distinção acima apontada tenha sido aban-donada, alguns autores ainda defendem a teoria civilista e, por conseguinte, que o dever de indenizar do Estado somente irá se configurar quando comprovada a culpa do agente.

4.1.3 Fase Publicística

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p.620) ensina que o pontapé para o surgimento das teorias da responsabilidade do Estado fundadas nos princípios do direito público foi dado pela jurisprudência francesa, com o célebre caso Blanco, ocor-rido em 1873.

No caso acima mencionado, a menina Agnés Blanco foi apanhada por uma vagonete da Cia. Nacional de Manufatura do Fumo ao atravessar uma rua da cidade de Bordeaux. Em decor-rência de tal evento seu pai promoveu ação civil de indenização e ao fundamentá-la, alegou que o Estado era responsável pelos danos causados por seus agentes a terceiros. Foi suscitado o con-flito de competência entre a jurisdição comum e o contencioso administrativo.

Ato contínuo, o Tribunal de Conflitos decidiu que a atribui-ção seria do tribunal administrativo, pois se tratava de apreciar a responsabilidade decorrente de funcionamento do serviço pú-blico. Ademais, entendeu o mencionado Tribunal que a contro-vérsia não poderia ser solucionada pelos princípios do Código Civil, mas sim por regras especiais variáveis conforme a neces-sidade do serviço e com a imposição de conciliar os direitos do Estado e os direitos privados.

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A partir daí, a doutrina publicista buscou solucionar a ques-tão da responsabilidade civil estatal mediante princípios objeti-vos, acarretando o surgimento da teoria da culpa do serviço ou culpa administrativa e da teoria do risco, desdobrada esta última por alguns doutrinadores em teoria do risco administrativo e do risco integral.

Nas lições de Hely Lopes Meirelles (2009, p.657)

A teoria da culpa administrativa representa o primeiro es-tagio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo que a sucedeu, pois leva em conta a falta do serviço para dela inferir a res-ponsabilidade da administração. É o estabelecimento do binômio falta do serviço/culpa da Administração. Já aqui não se indaga da culpa subjetiva do agente administrativo, mas perquire-se a falta objetiva do serviço em si mesmo, como fato gerador da obrigação e indenizar o dano causado a terceiro. Exige-se, também, uma culpa, mas uma culpa especial da administração, a que se convencionou chamar de culpa administrativa.

A teoria da culpa do serviço ou culpa administrativa revo-luciona ao desvincular a responsabilidade do Estado da culpa individual do seu agente. Para aquela, o dever de indenizar sur-giria diante do mau funcionamento, da inexistência ou do retar-damento na prestação do serviço.

Frise-se que cabia à vítima a tarefa árdua de comprovar objetivamente a ocorrência de algumas das hipóteses acima elencadas para fins de obtenção da indenização almejada. Em razão disso, sem afastar por completo a incidência da culpa do serviço, desenvolveu-se a teoria do risco adminis-trativo a qual serviu de pilar para a responsabilidade objeti-va do Estado.

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4.1.4 Teoria do risco administrativo e teoria do risco integral

A teoria do risco administrativo afasta qualquer análise acerca da culpa dos seus agentes ou mesmo da falta do serviço. A obrigação estatal de reparar o prejuízo decorre exclusivamen-te da existência de nexo causal entre o evento danoso e a ativi-dade desempenhada pelo Estado.

Para Maria Sylvia Di Pietro (2006, p.621), a doutrina em análise baseia-se no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais vez que não só os benefícios gerados pela atividade es-tatal devem ser socializados, mas também os prejuízos sofridos por alguns devem ser repartidos entre todos.

Em razão do caráter esclarecedor e didático da decisão pro-ferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais acerca do tema, adequada é a transcrição da sua ementa

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - MORTE DE AGEN-TE PENITENCIÁRIO - VINGANÇA DE DETENTOS - RES-PONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO - TEO-RIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - RELAÇÃO DIRETA ENTRE A FUNÇÃO PÚBLICA DESEMPENHADA PELA VÍTIMA E O CRIME PERPETRADO - NEXO DE CAUSA-LIDADE - COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS E MATE-RIAIS - DEVER DE INDENIZAR - VALORES - FIXAÇÃO - CRITÉRIOS. -- A teoria do risco administrativo surgiu como fundamento da responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, uma vez constatado que o ente público tem mais poder do que o administrado, passou a não se considerar justo que, em caso de prejuízos oriundos da atividade esta-tal, tivesse ele que se emprenhar em comprovar culpa para conquistar o direito à reparação dos danos. Nesse caso, a responsabilidade do Estado independe da prova de culpa,

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO y 55

bastando que se demonstre o fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, atribuída ao ente público, o dano e o nexo causal entre um e outro. - No caso em que o pai da autora foi assassinado, a mando de detentos, em razão da sua qua-lidade de agente penitenciário, isto é, demonstrado que a motivação do crime teve relação direta com a atividade pú-blica exercida pela vítima em prol da coletividade, tem-se caracterizada hipótese de responsabilidade civil objetiva do Estado, fundada na teoria do risco administrativo. - Pri-meiro recurso provido, para redimensionar as indenizações fixadas a título de danos morais e materiais. Recurso adesi-vo prejudicado(TJ-MG - AC: 10073090485811001 MG, Re-lator: Eduardo Andrade, Data de Julgamento: 29/04/2014, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 08/05/2014)(grifo nosso) 1

Esclarecendo, não é necessária a culpa do agente público, mas sim a verificação da existência de prejuízo e a relação de causalidade entre este e a atividade estatal.

Imperioso ressalvar que na teoria do risco administrativo, o Estado não está obrigado a indenizar o dano se restar compro-vada a ocorrência da alguma das excludentes de ilicitude, tais como o caso fortuito, a força maior, o fato exclusivo da vítima ou o fato exclusivo de terceiro. Ora, o Estado somente pode ser responsabilizado por aqueles danos que decorram do risco gera-do pela sua atividade sendo imprescindível, por conseguinte, a comprovação do nexo causal.

Nas palavras de Hely Lopes Meirelles (2009, p.658):

1 <Disponível em: http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 11/12/2014.

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Advirta-se, contudo, que a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova da culpa da Administração, per-mite que o Poder Público demonstre a culpa da vítima para excluir ou atenuar a indenização. Isto porque o risco ad-ministrativo não se confunde com o risco integral. O risco administrativo não significa que a Administração deva in-denizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa, apenas e tão-somente, que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximi-rá integral ou parcialmente da indenização.

Dito isto, oportuno transcrever a seguinte ementa do Tribu-nal de Justiça Catarinense. Vejamos.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DA-NOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. ABORDAGEM POLICIAL. REVISTA PESSOAL. ESTRITO CUMPRIMEN-TO DO DEVER LEGAL. RESISTÊNCIA INJUSTIFICADA DA PARTE AUTORA. TUMULTO E VIOLÊNCIA GENERA-LIZADA ENTRE OS ENVOLVIDOS. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO AFASTADA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO E REEXAME CO-NHECIDOS E PROVIDOS.(TJ-SC - AC: 20110618399 SC 2011.061839-9 (Acórdão), Relator: Rodrigo Cunha, Data de Julgamento: 19/11/2014, Quarta Câmara de Direito Público Julgado) 2

Em relação à teoria do risco integral, a doutrina adverte que

2 <Disponível em: http://www.tj-sc.jus.br>. Acesso em 13/12/2014.

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é a modalidade extrema da teoria do risco administrativo, se-gundo a qual o Estado está obrigado a reparar todo e qualquer dano suportado por terceiro mesmo que estejam presentes as hi-póteses de excludente da responsabilidade do Estado. Para esta teoria basta que se comprove o dano experimentado e o nexo causal entre este e a atividade desempenhada pelo Estado. Ou seja, o dever de reparar nasce pelo simples fato da atividade cau-sadora do prejuízo existir.

Menciona José dos Santos Carvalho Filho (2013, p.553)

Já no risco integral a responsabilidade sequer depende do nexo causal e ocorre até mesmo quando a culpa é da pró-pria vítima. Assim, por exemplo, o Estado teria que inde-nizar o indivíduo que se atirou deliberadamente à frente de uma viatura pública. É evidente que semelhante funda-mento não pode ser aplicado à responsabilidade do Estado, só sendo admitido em situações raríssimas e excepcionais.

Importante ressaltar que alguns doutrinadores não fazem distinção entre a teoria do risco administrativo e a teoria do ris-co integral, com o argumento de que ambas disciplinam a res-ponsabilidade objetiva estatal tratando-se, em verdade, de ex-pressões sinônimas.

Em razão da importância do tema, elencam-se algumas ementas de julgados emanados dos tribunais pátrios, que tra-zem em seu bojo a distinção entre as supramencionadas teorias:

ACÓRDÃO N º 1.0254 /2011 APELAÇÃO CÍVEL. DIREI-TO PROCESSUAL CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE ENER-GIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DANO MATERIAL COMPROVADO. ARTIGO 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DO RISCO INTEGRAL. RECURSO CONHECIDO. IMPRO-

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VIDO. UNANIMIDADE. 1. A responsabilidade civil do Es-tado e das pessoas jurídicas de Direito Privado prestado-ras de serviço público, como o caso em deslinde, é aferida mediante aplicação da teoria da responsabilidade objetiva, prevista na artigo 37, § 6º da Carta Magna; 2. A excludente de culpa exclusiva de terceiro não se aplica ao caso, pois a Apelante, por ser concessionária da prestação de serviço público de fornecimento de energia elétrica, tem o dever de prezar pelo sistema de transmissão, com a finalidade de evitar danos aos seus usuários, haja vista o fato de que deverá arcar com os danos decorrentes da prestação de seus serviços; 3. Aplica-se em caso a teoria do risco inte-gral, de modo a configurar a sua responsabilidade objetiva quanto ao dano causado ainda que não tenha sido culpado por este; 4. Recurso conhecido e improvido. Unanimida-de.(TJ-AL - APL: 00005456620058020001 AL 0000545-66.2005.8.02.0001, Relator: Des. Alcides Gusmão da Silva, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/03/2011) 3

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E LUCROS CESSANTES. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RODOVIA PEDAGIADA. RESPONSABILI-DADE DA CONCESSIONÁRIA AFASTADA. APLICA-ÇÃO DA TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO E NÃO DO RISCO INTEGRAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊN-CIA MANTIDA. Caso em que a parte autora alega que trafegava na BR-392 quando colidiu em um cachorro que se atravessou na pista e não foi passível desviar. A des-peito da revelia, inviável o reconhecimento da responsa-bilidade da concessionária ré, ante a impossibilidade de limpeza da pista e controle permanente da circulação de animais de pequeno porte, os quais, manifestamente in-

3 <Disponível em: http://www.tjal.jus.br>. Acesso em 13/12/2014.

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vadem a rodovia com facilidade e frequência. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004663480, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Vivian Cristina Angonese Spengler, Julgado em 06/05/2014)(TJ-RS - Recurso Cível: 71004663480 RS , Relator: Vi-vian Cristina Angonese Spengler, Data de Julgamento: 06/05/2014, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Pu-blicação: Diário da Justiça do dia 08/05/2014) 4

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO -ATROPELAMENTO POR ÔNIBUS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EM-PRESA-RÉ - RISCO ADMINISTRATIVO E RISCO INTE-GRAL - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - RECURSO DESPROVIDO. - “As pessoas jurídicas de direito priva-do, prestadoras de serviços públicos, concessionárias ou permissionárias, submetem-se à teoria do risco ad-ministrativo e, em situação tal, não há necessidade de se provar a culpa delas, bastando que se demonstre o nexo causal entre o acidente e o dano”. - “No caso, o ônus da prova é invertido, competindo a elas provar a existência de uma das causas de exclusão da respon-sabilidade objetiva, ou seja, culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior”. - “Assim, comprovada a culpa exclusiva da vítima, inexiste responsabilidade ci-vil da concessionária do serviço público de transporte coletivo, porque o art. 37, § 6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade objetiva, mas na modali-dade do risco administrativo, não na do risco integral”.(TJ-MG 200000037056390001 MG 2.0000.00.370563-9/000(1), Relator: EDUARDO BRUM, Data de Julgamen-

4 <Disponível em: http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em 13/12/2014.

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to: 12/11/2002, Data de Publicação: 21/12/2002) 5

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - MORTE DE FILHO - HOMICÍDIO PERPETRADO POR DELIQUENTE EM VIA PÚBLICA - PEDIDO FULCRADO EM FALHA GENÉRICA DO DEVER DE O ESTADO GARANTIR A SEGURANÇA DOS ADMINISTRADOS - ATO DE TERCEIRO - IMPRE-VISIBILIDADE E INEVITABILIDADE - CAUSA EXCLU-DENTE DE RESPONSABILIDADE - DESCABIMENTO DO RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA TEORIA DO RISCO INTEGRAL - SEN-TENÇA MANTIDA. 1 - Para a configuração da responsa-bilidade objetiva dos entes públicos, na forma do art. 36, § 6º, mister se faz a prova da prática do ilícito. 2 - Não é cabível imputar ao Estado responsabilidade pelos da-nos sofridos em razão de morte de filho que foi vítima de homicídio perpetrado por delinqüente desconheci-do em via pública, sob pena de adotar a teoria do risco integral, em que todo dano sofrido pelo administrado implicaria responsabilidade do Estado. 3 - O fato de ter-ceiro, quando imprevisível e inevitável, afasta o nexo de causalidade entre o evento danoso e a alegada falha no serviço público prestado, já que não foi a alegada falha causa direta e eficiente do dano, não se reconhecendo o dever de indenizar. 4 - Sentença mantida.(TJ-MG - AC: 10079084190358001 MG , Relator: Sandra Fonseca, Data de Julgamento: 26/11/2013, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA

CÍVEL, Data de Publicação: 10/12/2013) 6

5 <Disponível em: http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 13/12/2014.6 <Disponível em: http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 14/12/2014.

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4.2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO DIREITO BRASILEIRO

A teoria da irresponsabilidade do Estado jamais fora aplica-da no Brasil. Maria Sylvia di Pietro (2006, p.622) afirma que os nossos doutrinadores e tribunais sempre repudiaram tal orienta-ção mesmo não existindo normas legais expressas nesse sentido.

A Constituição Imperial (1824) e a 1ª Constituição da Repú-blica (1891), muito embora não contivessem dispositivos regu-lando a responsabilidade civil do Estado, já anunciavam a res-ponsabilidade subjetiva do funcionário em decorrência de abuso ou omissão desde que praticados no exercício de suas funções.

Nessa época, entretanto, existiam normas infraconstitucio-nais que estabeleciam a responsabilidade do Estado, como por exemplo, nas hipóteses de danos ocasionados pelas estradas de ferro ou pelos serviços de correios. Em ambos os casos, a juris-prudência era no sentido de que o funcionário deveria respon-der solidariamente com a Administração Pública.

O Código Civil de 1916, acolhendo a teoria subjetivista pre-dominante à sua época, introduziu no direito brasileiro o pri-meiro dispositivo específico acerca da responsabilidade civil do Estado. O artigo 15 da referida codificação tinha os seguintes termos

Art. 15 - As pessoas jurídicas de Direito Público são civil-mente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou falando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra causadores do dano.

Frise-se que muito embora a doutrina dominante vislum-brasse a adoção da teoria da culpa no supracitado artigo, alguns juristas, em razão da redação imprecisa do mesmo, defendiam

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que o Código de 1916 havia consagrado a responsabilização ob-jetiva do Estado.

Ainda em relação ao tema, Hely Lopes Meirelles (2009, p.659) acrescenta que

Temos para nós que o questionado artigo 15 nunca admitiu a responsabilidade sem culpa, exigindo sempre e em todos os casos a demonstração desse elemento subjetivo para a responsabilização do Estado. Nem é outra a observação de Alvino Lima em preciosa tese sobre a matéria,onde sustenta que: “ O Código Civil Brasileiro, seguindo a tradição de nos-so Direito, não se afastou da teoria da culpa, como principio genérico regulador da responsabilidade extracontratual.

Em seguida, a Constituição de 1934, em consonância com o avanço da matéria, acolheu a responsabilização civil solidária do Estado com o seu agente público nos termos do art. 171, in verbis: “os funcionários públicos são responsáveis solidariamen-te com a Fazenda nacional, estadual ou municipal, por quais-quer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos”.

Na Constituição de 1946, a responsabilidade objetiva estatal foi definitivamente introduzida ao ordenamento brasileiro. O art. 194 dispunha que “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”. Pelo pará-grafo único, “caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”.

Assim, a partir da simples leitura do dispositivo acima elen-cado é possível concluir que somente é necessária a compro-vação da culpa na ação de regresso da Administração contra o funcionário, não se exigindo o mesmo requisito para o particular que busca ser indenizado pelo Estado.

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Seguindo a mesma linha, a Constituição de 1967 reproduz a norma em seu artigo 105, apenas adicionando que a ação regres-siva pode ser cabível tanto nos casos de culpa como de dolo do agente público. A Emenda Constitucional 1/69 também mantém a norma em seu artigo 107.

A Constituição atual também adota responsabilidade civil objetiva da Administração, pela modalidade do risco administra-tivo, consoante se extrai do seu artigo art. 37, §6º, in verbis: “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado presta-doras de serviço público responderão pelos danos que seus agen-tes, nessa qualidade, causarem a terceiro, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

O art. 43 do Código Civil de 2002 assim dispõe

Art. 43 - As pessoas jurídicas de direito publico interno são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito re-gressivo contra os causadores de dano, se houver, por parte deles dolo ou culpa.

Assim, observa-se que a codificação civilística muito embo-ra seja mais recente, foi menos abrangente em relação ao dispo-sitivo constitucional, pois não fez referência às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. A omissão, contudo, é irrelevante.

4.3 O ARTIGO 37, §6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O art.37, §6º da Constituição de 1988 possui a seguinte redação

Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qual-quer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,

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impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o respon-sável nos casos de dolo ou culpa.

O exame do supramencionado dispositivo revela que a Cons-tituição Federal adotou, como regra, a teoria da responsabilidade civil objetiva na modalidade do risco administrativo. Assim, o dever de indenizar os danos causados a terceiros independe da comprovação da culpa conforme já explanado anteriormente.

4.3.1 Elementos

O preclaro jurista José dos Santos Carvalho Filho (2013, p.556) preconiza que

O texto do art. 37, §6º, da Constituição de 1988, a despei-to de não alterar a doutrina já consagrada anteriormente, apresenta, em nosso entender, três elementos que mere-cem especial análise para sua perfeita interpretação.

Os componentes elencados pelo ilustre doutrinador como imprescindíveis para a análise da matéria são as pessoas res-ponsáveis, os agentes do estado e a duplicidade das relações jurídicas.

4.3.1.1 Pessoas responsáveis

O dispositivo constitucional em questão faz referência a duas espécies de pessoas jurídicas sujeitas à responsabilidade

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civil objetiva, são elas: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.

Quanto à primeira, não restam dúvidas de que a União, Es-tados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias, asso-ciações e fundações públicas de natureza autárquica são objeti-vamente responsáveis pelos danos que seus agentes causarem a particulares, independentemente da atividade por eles desen-volvida no momento da ocorrência do dano.

Já a segunda categoria engloba aquelas pessoas jurídicas que, muito embora sejam regidas pelo direito privado, por meio de delegação, executam funções de interesse público que, a princípio , caberia ao Estado executar.

Estão contidas nessa categoria as empresas públicas, socie-dades de economia mista e fundações públicas com personali-dade de direito privado, quando estas se dedicarem a prestação de serviços públicos, e os concessionários e permissionários de serviços públicos.

Yussef Said Cahali (2007, p.89) aduz que

Ao deslocar a responsabilidade civil para o âmbito do serviço público prestado, desconsiderando, em tese, a natureza jurídica (pública ou privada) da entidade pres-tadora do serviço, o legislador buscou de alguma forma superar o dissídio que grassava no direito anterior, quan-do se discutia a aplicabilidade do art. 107 da Constitui-ção de 1969 às empresas públicas, sociedades de econo-mia mista, fundações governamentais, permissionárias e concessionárias de serviços públicos e empreiteiras de obras públicas. E fê-lo com inegável acerto, referendando o entendimento que já vínhamos preconizando já na primeira edição deste trabalho.

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Assim, para efeito de qualificação da responsabilidade pou-co importa se os serviços públicos serão prestados diretamente pelo Estado, ou transferidos aos particulares, mediante conces-são ou permissão. Em ambos as hipóteses, aplicar-se-á a teoria objetiva do risco administrativo.

Nesse sentido a célebre Maria Sylvia Di Pietro (2006, p.624) nos ensina que

A norma constitucional veio por fim às divergências dou-trinárias quanto à incidência de responsabilidade objetiva quando se tratasse de entidades de direito privado presta-doras de serviços públicos (fundações governamentais de direito privado, empresas públicas, sociedades de econo-mia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviço público).

4.3.1.2 Agentes do Estado

O artigo 37, §6º, da Constituição dispõe que o Estado será civilmente responsável pelos danos que seus agentes, nessa qua-lidade, causem a terceiros. Para que haja imputação da respon-sabilidade ao Estado é necessário que o agente público esteja no exercício de suas funções ou ainda no pretexto de exercê-las, não bastando para tanto a simples qualidade de agente.

José dos Santos Carvalho Filho (2013, p.558), acerca da ma-téria, doutrina que

A expressão nessa qualidade tem razão de ser, porque só pode o Estado ser responsabilizado se o preposto estatal estiver no exercício de suas funções ou, ao menos, se es-teja conduzindo ao pretexto de exercê-la. Desse modo, se causar dano a terceiro no correr de sua vida privada, sua responsabilidade é pessoal e regida pelo Direito Civil.

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Ocorre que, conforma acima mencionado, mesmo fora do serviço (férias, licença, folga), a conduta do agente público pode, em situações específicas, ocasionar a responsabilidade civil do Estado.

Por exemplo, é comum na jurisprudência casos em que po-liciais em dias de folga causam danos a terceiros com arma da corporação. O entendimento majoritário é no sentido de que há verdadeira hipótese de responsabilidade estatal. Vejamos.

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO RE-GIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPON-SABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO. ATO OMISSIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. AGENTE PÚBLICO FORA DE SERVIÇO. CRIME PRATICADO COM ARMA DA CORPORAÇÃO. ART. 37, § 6º, DA CF/88. 1. Ocorrência de relação causal entre a omissão, consubstan-ciada no dever de vigilância do patrimônio público ao se permitir a saída de policial em dia de folga, portando o revólver da corporação, e o ato ilícito praticado por este servidor. 2. Responsabilidade extracontratual do Estado ca-racterizada. 3. Inexistência de argumento capaz de infirmar o entendimento adotado pela decisão agravada. 4. Agravo regimental improvido.(STF - RE: 213525 SP , Relator: Min. ELLEN GRACIE, Data de Julgamento: 09/12/2008, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-025 DIVULG 05-02-2009 PUBLIC 06-02-2009 EMENT VOL-02347-05 PP-00947)AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁ-RIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. POLI-CIAL MILITAR EM PERÍODO DE FOLGA. DISPARO DE ARMA DE FOGO PERTENCENTE À CORPORAÇÃO. RES-PONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DO REEXAME DE PROVAS. SÚMU-LA 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO

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REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.(STF - RE-AgR: 508114 SP , Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 16/09/2008, Primeira Turma, Data de Publi-cação: DJe-211 DIVULG 06-11-2008 PUBLIC 07-11-2008 EMENT VOL-02340-05 PP-00932) 7

Ademais, o termo “agente” deve ser compreendido no sentido mais amplo possível, alcançando desde o Presidente da República até o mais simples trabalhador e abrange os agentes políticos admi-nistrativos sejam eles contratados ou estatutários, os estagiários, os terceirizados, os agentes em colaboração e até mesmo os voluntários.

Outra questão interessante diz respeito ao funcionário de fato, ou seja, aquele que não é agente público tampouco se encontra no exercício de função administrativa, mas aparenta exercê-la. Em nome do princípio da aparência, da boa-fé dos administrados, da seguran-ça jurídica e da presunção de legalidade dos atos administrativos, os danos por ele causados também devem ser reparados pelo Estado.

Felipe Peixoto Braga Netto (2014, p.110) ao discorrer sobre o tema aponta o seguinte exemplo:

Pensemos num tabelião cuja delegação estatal encontrava--se irregular (houve concurso público e o antigo tabelião se recusou a sair). O cidadão não pode ser prejudicado por questões semelhantes, cuja presunção é de que ele não saiba nem tenha motivos pra saber. Se, pior ainda, um ci-dadão é atendido em hospital público por alguém que se presume ser o médico de plantão. Descobre-se depois, que se tratava de indivíduo com problemas mentais que costu-meiramente se passava por médico. Em qualquer dos dois casos – e seria fácil imaginar muitos outros – a responsabi-

lidade do Estado por eventuais danos é evidente.

7 <Disponível em: http://www.stf.jus.br>. Acesso em 17/12/2014.

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4.3.1.3 A duplicidade de relações jurídicas

A norma constitucional em análise apresenta claramente duas relações jurídicas com fundamentos jurídicos diferencia-dos. Consoante já fora destrinchado anteriormente, a primeira parte do artigo regula a relação jurídica entre o Estado e o pre-judicado, tendo como base jurídica a responsabilidade objetiva do Estado.

Em sentindo contrário, a parte final do dispositivo discipli-na a relação jurídica entre o Estado e seu agente, fundamentada na responsabilidade subjetiva. Nessa hipótese, se comprovado que o agente agiu com dolo ou culpa, caberá o direito de regres-so em favor do Estado.

É justamente essa duplicidade de relação jurídica que acarreta na discussão sobre quem deverá figurar no polo passivo nas ações de responsabilidade civil do Estado. A maioria dos juristas, no entanto, defende que cabe ao particular decidir em face de quem a ação será proposta, ou seja, se em face unicamen-te do Estado, do agente público e do Estado ou somente contra o agente público, devendo nestas duas últimas hipóteses, de-monstrar o dolo/culpa.

Partilhando deste entendimento, Felipe P. Braga Netto (2014, p.112) sustenta que o cidadão é livre para propor a ação seja contra o agente público ou, se preferir, em face de ambos, tendo em vista a solidariedade da obrigação.

No mesmo sentido, Gustavo Tepedino (2006, p.109) expõe

Igualmente criticável seria a rejeição da propositura de ação indenizatória diretamente contra o funcionário (no caso, o médico servidor público), com base na culpa, em detrimento da ação contra a Administração Pública. A hi-pótese ocorre com frequência, sobretudo quando a prova da culpa ou dolo se mostra evidente e a execução contra

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o patrimônio do agente se apresente, para o autor, mais atraente (imagine-se o não implausível contraste: de um lado, o robusto patrimônio do médico faltoso e, de outro, os cofres endividados de um modesto município).

Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça sustenta essa posição, isto é, cabe à vítima decidir em face de quem a ação in-denizatória será proposta, se em face apenas Estado, apenas do agente público ou de ambos, conforme se extrai do julgamento abaixo

RESPONSABILIDADE CIVIL. SENTENÇA PUBLICA-DA ERRONEAMENTE. CONDENAÇÃO DO ESTADO A MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INFORMAÇÃO EQUIVOCADA. AÇÃO INDENIZATÓRIA AJUIZADA EM FACE DA SERVENTUÁRIA.LEGITIMIDADE PASSIVA. DANO MORAL. PROCURADOR DO ESTADO. INEXIS-TÊNCIA. MERO DISSABOR. APLICAÇÃO, ADEMAIS, DOPRINCÍPIO DODUTY TO MITIGATE THE LOSS. BOA--FÉ OBJETIVA. DEVER DE MITIGAR O PRÓPRIO DANO.1. O art. 37, § 6º, da CF-1988 prevê uma garantia para o administrado de buscar a recomposição dos danos sofridos diretamente da pessoa jurídica que, em princípio, é mais solvente que o servidor, independentemente de demonstra-ção de culpa do agente público. Vale dizer, a Constituição, nesse particular, simplesmente impõe ônus maior ao Esta-do decorrente do risco administrativo; não prevê, porém, uma demanda de curso forçado em face da Administração Pública quando o particular livremente dispõe do bônus contraposto. Tampouco confere ao agente público imuni-dade de não ser demandado diretamente por seus atos, o qual, aliás, se ficar comprovado dolo ou culpa, responderá de outra forma, em regresso, perante a Administração.

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2. Assim, há de se franquear ao particular a possibilidade de ajuizar a ação diretamente contra o servidor, suposto causador do dano, contra o Estado ou contra ambos, se as-sim desejar. A avaliação quanto ao ajuizamento da ação contra o servidor público ou contra o Estado deve ser de-cisão do suposto lesado. Se, por um lado, o particular abre mão do sistema de responsabilidade objetiva do Estado, por outro também não se sujeita ao regime de precatórios. Doutrina e precedentes do STF e do STJ.3. A publicação de certidão equivocada de ter sido o Esta-do condenado a multa por litigância de má-fé gera, quando muito, mero aborrecimento ao Procurador que atuou no feito, mesmo porque é situação absolutamente corriquei-ra no âmbito forense incorreções na comunicação de atos processuais, notadamente em razão do volume de proces-sos que tramitam no Judiciário. Ademais, não é exatamen-te um fato excepcional que, verdadeiramente, o Estado tem sido amiúde condenado por demandas temerárias ou por recalcitrância injustificada, circunstância que, na cons-ciência coletiva dos partícipes do cenário forense, torna desconexa a causa de aplicação da multa a uma concreta conduta maliciosa do Procurador.4. Não fosse por isso, é incontroverso nos autos que o re-corrente, depois da publicação equivocada, manejou em-bargos contra a sentença sem nada mencionar quanto ao erro, não fez também nenhuma menção na apelação que se seguiu e não requereu administrativamente a correção da publicação. Assim, aplica-se magistério de doutrina de vanguarda e a jurisprudência que têm reconhecido como decorrência da boa-fé objetiva o princípio do Duty to miti-gate the loss, um dever de mitigar o próprio dano, segundo o qual a parte que invoca violações a um dever legal ou contratual deve proceder a medidas possíveis e razoáveis

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para limitar seu prejuízo. É consectário direto dos deveres conexos à boa-fé o encargo de que a parte a quem a perda aproveita não se mantenha inerte diante da possibilidade de agravamento desnecessário do próprio dano, na espe-rança de se ressarcir posteriormente com uma ação indeni-zatória, comportamento esse que afronta, a toda evidência, os deveres de cooperação e de eticidade.5. Recurso especial não provido (Resp 1325862/PR. Re-lator Ministro Luis Felipe Salomão. Data do julgamento 05.09.2013. Quarta Turma) 8

Não obstante a jurisprudência do Superior Tribunal de Jus-tiça seja firme no sentido de que caba à vítima eleger contra quem demandar no caso de responsabilidade civil do Estado, no âmbito do Supremo Tribunal Federal a questão não parece estar pacificada. A Corte Suprema possui decisões onde sustenta que a vítima somente pode ajuizar a ação reparatória contra o Esta-do. Vejamos.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. RES-PONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO: § 6º DO ART. 37 DA MAGNA CARTA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. AGENTE PÚBLICO (EX-PREFEITO). PRÁTICA DE ATO PRÓPRIO DA FUNÇÃO. DECRETO DE INTER-VENÇÃO. O § 6º do artigo 37 da Magna Carta autoriza a proposição de que somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito privado que pres-tem serviços públicos, é que poderão responder, objetiva-mente, pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns. Esse mes-

8 <Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em 14/01/2015.

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mo dispositivo constitucional consagra, ainda, dupla ga-rantia: uma, em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado que preste serviço público, dado que bem maior, praticamente certa, a possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido. Outra garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente responde administra-tiva e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (Rext 327904/SP. Relator Carlos Britto. Data do julgamento 15.98.2006. Primeira Turma)AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁ-RIO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. RESPONSABI-LIDADE OBJETIVA DO ESTADO: § 6O DO ART. 37 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. AGENTE PÚBLICO. ILEGI-TIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da RE n. 327.904, Re-lator o Ministro Carlos Britto, DJ de 8.9.06, fixou entendi-mento no sentido de que “somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos, é que poderão responder, objetivamente, pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns”. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - RE: 470996 RO , Relator: Min. EROS GRAU, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-171 DI-VULG 10-09-2009 PUBLIC 11-09-2009 EMENT VOL-02373-02 PP-00444) 9

9 <Disponívelem:http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=responsabilidade+-do+estado+-+ilegitimidade+do+agente&idtopico=T10000001>.Acesso em: 14/01/2015.

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O posicionamento do STF é fundamentado na tese da du-pla garantia a qual estabelece a existência de uma garantia tanto em favor do particular que pode demandar diretamente contra o Estado, como também outra estipulada em favor do agente pú-blico, que somente irá responder subjetivamente na hipótese de ação regressiva promovida pela Administração Pública.

4.4 DENUNCIAÇÃO À LIDE

A denunciação à lide está prevista no Código de Processo Civil como uma modalidade de intervenção de terceiros e pode ser definida como uma espécie de ação regressiva a qual pode ser proposta tanto pelo autor como pelo réu, sendo citado como denunciado aquele contra quem o denunciante possui uma pre-tensão indenizatória que somente virá a se configurar caso este venha a sucumbir na ação principal.

Inicialmente necessário registrar que a matéria é bastante controvertida, vez que não há unanimidade entre os doutrinado-res bem como no âmbito jurisprudencial acerca da obrigatorie-dade ou mesmo possibilidade de denunciação à lide nas hipóte-ses de ação reparatória em face do Estado.

Na vigência do CPC de 1973 havia dúvidas sobre a obriga-toriedade da denunciação, em atenção ao disposto no art. 70, III do CPC que dispunha que a mesma deveria ser feita sempre que alguém estiver pela lei ou pelo contrato obrigado a indenizar, pela via regressiva, o prejuízo daquele que perder a demanda.

Ocorre que, mesmo na constância do código anterior, pre-dominava o entendimento de que a denunciação à lide não seria obrigatória, e que a parte que deixasse de fazê-la não perderia, por sua omissão, o direito de regresso, podendo sempre exercê--lo por meio de ação autônoma.

O CPC atual, por sua vez, afastou a controvérsia anterior, ao deixar expresso que a parte que não fizer a denunciação, ou

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não puder fazê-la, ou a tiver indeferida, poderá exercer o direito de regresso em ação autônoma. É o que dispõe o art. 125, §1º: “O direito regressivo será exercido por ação autônoma quando a denunciação da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida”.

A doutrina administrativa majoritária10 defende não ser ca-bível a denunciação à lide do servidor nos casos de responsabi-lidade civil do Estado, sendo inaplicáveis as regras processuais ordinárias, vez que o dispositivo mencionado somente deve in-cidir nas hipóteses normais de responsabilidade civil, e não na responsabilidade civil estatal, tendo em vista que esta possui tratamento específico no art. 37,§6º da Constituição Federal. José dos Santos Carvalho Filho (2013, p.583), partilhando deste entendimento, ao discorrer sobre o assunto, dispõe o seguinte

O pedido do lesado escora-se na teoria da responsabilida-de objetiva do Estado, ao passo que o pedido deste contra o seu agente é calcado na responsabilidade subjetiva. Por fim, não teria cabimento desfazer indiretamente o benefi-cio que a Constituição outorgou ao lesado: se foi ele dis-pensado de provar a culpa do agente, não teria cabimento que, no mesmo processo, fosse obrigado a aguardar o con-flito entre o Estado e seu agente, fundado exatamente na culpa. Essa, a nosso ver, é a melhor doutrina a respeito do assunto.

Não obstante a existência das posições acima elenca-das, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é fir-me no sentido de que a denunciação à lide do servidor não é obrigatória, cabendo ao magistrado, diante do caso concreto,

10 Têm esse entendimento Hely Lopes Meirelles (2009, p. 666); Celso Antônio Bandeira de Mello (2006, p.979); Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2011, p.781).

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avaliar se o ingresso do agente público ocasionará prejuízo à celeridade ou à economia processual. Sendo assim, mesmo que terceiro não venha a ingressar na ação reparatória na qualidade de denunciado, poderá o Estado, a qualquer tempo, exercer o direito de regresso contra o mesmo, caso saia perdedor da ação. Vejamos alguns julgados.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚ-MULA 282/STF. DENUNCIAÇÃO À LIDE. NÃO OBRIGA-TORIEDADE. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGI-MENTAL NÃO PROVIDO. 1. O prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infracons-titucionais tidos como violados, entretanto, é imprescindí-vel que no aresto recorrido a questão tenha sido discutida e decidida fundamentadamente, sob pena de não preenchi-mento do requisito do prequestionamento, indispensável para o conhecimento do recurso. Incidência das Súm. 282/STF. 2. A orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a denunciação à lide do art. 70, inc. III, do CPC, em razão dos princípios da economia e da celeridade processual, não é obrigatória. 3. Agravo regimental não provido.(STJ - AgRg no REsp: 1406741 RJ 2013/0328235-1, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 26/11/2013, T2 - SEGUN-DA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/12/2013)RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. RESPONSA-BILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. MORTE DE-CORRENTE DE ERRO MÉDICO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. NÃO OBRIGATORIEDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Nas ações de indenização fundadas na responsabilidade civil objetiva do Estado (CF/88, art. 37, § 6º), não é obriga-

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tória a denunciação à lide do agente supostamente respon-sável pelo ato lesivo (CPC, art. 70, III). 2. A denunciação à lide do servidor público nos casos de indenização fundada na responsabilidade objetiva do Estado não deve ser con-siderada como obrigatória, pois impõe ao autor manifesto prejuízo à celeridade na prestação jurisdicional. Haveria em um mesmo processo, além da discussão sobre a res-ponsabilidade objetiva referente à lide originária, a neces-sidade da verificação da responsabilidade subjetiva entre o ente público e o agente causador do dano, a qual é des-necessária e irrelevante para o eventual ressarcimento do particular. Ademais, o direito de regresso do ente público em relação ao servidor, nos casos de dolo ou culpa, é asse-gurado no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, o qual per-manece inalterado ainda que inadmitida a denunciação da lide. 3. Recurso especial desprovido.(STJ - REsp: 1089955 RJ 2008/0205464-4, Relator: Ministra DENISE ARRUDA, Data de Julgamento: 03/11/2009, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/11/2009) 11.

Por fim, vale ressaltar que o Estado pode vir a ser deman-dado com base do Código de Defesa do Consumidor e, nessa hipótese, a denunciação à lide é descabida por força do art. 8812 da referida codificação, que categoricamente veda a utilização do instituto.

11 <Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em 14/01/2015.12 Art. 88. Na hipótese do art. 13, parágrafo único deste código, a ação de regresso poderá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a denunciação da lide.

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4.5 AÇÃO DE REGRESSO

A ação regressiva é a medida judicial cabível para que o Es-tado recupere os valores despendidos na demanda indenizatória movida pelo particular, em razão da conduta culposa ou dolosa do agente público causador do prejuízo.

A doutrina, em regra, aponta como requisito para a propo-situra da ação de regresso não apenas o trânsito em julgado da condenação, mas também exige o efetivo pagamento da indeni-zação sob o argumento de que caso a referida ação fosse ajuiza-da antes, acarretaria em enriquecimento ilícito estatal, conduta repelida pelo ordenamento jurídico brasileiro.

O renomado autor Diógenes Gasparini (2011, p.1123), ao discorrer sobre o tema, esclarece ainda que o primeiro requisito apontado - sentença condenatória transitada em julgado - pode até não existir caso a satisfação do prejuízo ocorra pela via ami-gável, devendo, as demais condições - o pagamento ao lesado e a culpa/dolo do agente público - ficarem cabalmente comprovados.

Frise-se que como a ação civil tem o objetivo claro de reparar os danos patrimoniais causados ao Estado, a ação regressiva em face do agente público transmite-se aos seus herdeiros e suces-sores, podendo inclusive ser instaurada após o fim do exercício do cargo ou função nos termos do art. 122, §3º da Lei 8112/90 13.

Ademais, imperioso ressaltar que a jurisprudência dos Tribunais Superiores, com fundamento no art. 37, §5º da CR-FB/8814, é firme no sentido de que a ação de ressarcimento dos

13 Art. 122.  A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros. § 3o  A obrigação de reparar o dano estende-se aos sucessores e contra eles será executada, até o limite do valor da herança recebida.14 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoa-lidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: § 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.

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prejuízos causados ao erário pode ser proposta a qualquer tem-po, isto é, não se submete ao instituto da prescrição, conforme ementas abaixo destacadas.

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMEN-TO. DIREITO ADMINISTRATIVO. DANO AO ERÁRIO. ARTIGO 37, § 5º, DA CF. IMPRESCRITIBILIDADE. PRE-CEDENTES. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DA CAU-SA PELO PLENÁRIO E ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE DANO CONCRETO PARA SE IMPOR A CONDENAÇÃO AO RESSARCIMENTO EM RA-ZÃO DO DANO CAUSADO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLI-CA. SUBMISSÃO DA MATÉRIA A REEXAME PELO PLE-NÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO, DETERMINANDO-SE O PRO-CESSAMENTO DO RECURSO OBSTADO NA ORIGEM. 1. O Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência assente no sentido da imprescritibilidade das ações de ressarci-mentos de danos ao erário. Precedentes: MS n.º 26210/DF, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, 10.10.2008; RE n.º 578.428/RS-AgR, Segunda Turma, Rela-tor o Ministro Ayres Britto, DJe 14.11.2011; RE n.º 646.741/RS-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Men-des, DJe 22.10.2012; AI n.º 712.435/SP-AgR, Primeira Tur-ma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJe 12.4.2012 (...) STF - AI: 819135 SP , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julga-mento: 28/05/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-161 DIVULG 16-08-2013 PUBLIC 19-08-2013) 15(grifo noss)ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBI-

15 <Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24806434/agreg-no-agravo-de--instrumento-ai-819135-sp-stf>. Acesso em: 14/01/2015.

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DADE ADMINISTRATIVA. RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO PÚBLICO. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. A ação de ressarcimento dos prejuízos causados ao erário é im-prescritível, mesmo se cumulada com a ação de improbi-dade administrativa (art. 37, § 5º, da CF). 2. Recurso espe-cial não provido.(STJ - REsp: 1292531 SP 2011/0246765-0, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 03/09/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2013) 16

Por fim, não obstante a clareza do art. 37, §5º da CRFB/88 no tocante ao direito/dever do Estado de propor a ação regressiva contra o agente público culpado, na grande maioria dos casos o poder público permanece inerte, isto é, a referida ação simples-mente não é ajuizada.

Felipe P. Braga Netto (2014, p.215) ao realizar uma análise crítica acerca da questão defende que sob o ângulo ético-jurídi-co, é inadmissível que existindo condenação do Estado por ato culposo do agente a ação regressiva não seja ajuizada.

Sustenta o autor que nessas hipóteses há uma renúncia, não autorizada pela Constituição, a verbas públicas em uma afronta direta ao princípio da indisponibilidade da coisa pública, sendo necessário, portanto, que as ações de regresso sejam ao menos propostas, para que eventuais valores pagos possam ser reavidos quando restar confirmado o nexo causal entre o dano e a condu-ta do agente público.

16 <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24200975/recurso-especial-resp--1292531-sp-2011-0246765-0-stj>.Acesso em: 14/01/2015.

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4.6 RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO

Conforme anteriormente explicitado, uma das inovações trazidas pela Constituição de 1988 no tocante à responsabili-dade extracontratual do Estado foi a previsão de que as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos de-vem responder objetivamente pelos danos causados, nos termos do art. 37, §6º, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qual-quer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pe-los danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o respon-sável nos casos de dolo ou culpa (grifo nosso).

Assim, não há dúvidas quanto à aplicação da teoria da responsabilidade objetiva do Estado nos casos de prejuízos causados pelas prestadoras de serviço público, o que inclui tanto as empresas públicas e sociedades de economia mista que prestam serviços públicos (mas não as exploradoras de atividades econômicas) como as pessoas privadas delegatá-rias de serviços públicos (concessionárias, permissionárias e autorizadas).

No entanto, existe certa dissensão quanto à existência ou não de responsabilidade do Estado pelos atos cometidos pelos seus prestadores de serviços e, em respondendo, se essa respon-sabilidade residiria no campo subsidiário ou solidário.

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Em relação à divergência apontada, Sérgio Cavalieri Filho (2014, p. 305) entende que as entidades de direito privado, pres-tadoras de serviço público, devem responder em nome próprio com o seu patrimônio e não o Estado por elas e nem com elas, sob o fundamento de que as referidas entidades são seres distin-tos do ente estatal, sujeitos de direitos e obrigações, agindo por sua conta e risco e, por essa razão, devem responder por suas próprias obrigações.

Em sentido contrário o eminente jurista Gustavo Tepedino (1999, p. 197), com fundamento no Código de Defesa do Con-sumidor defende que as prestações de serviços públicos consti-tuem uma relação consumerística, atraindo a solidariedade dos diversos entes públicos e privados que se apresentem como for-necedores dos serviços prestados direta ou indiretamente pela atividade estatal.

Em que pese as posições acima apontadas, o entendi-mento predominante é no sentido de que a responsabilidade civil do Estado nestes casos é subsidiária, isto é, as pessoas jurídicas de direito privado responderão objetivamente até o exaurimento de seu patrimônio pelos danos decorrente de obrigações originadas diretamente da prestação de serviços e, caso a vítima não seja ressarcida em razão da insolvência da pessoa jurídica prestadora do serviço, o Estado poderá ser convocado a indenizar.

Nas palavras de Felipe P. Braga Netto (2014, p.156)

O dano não foi causado pelo Estado, senão mediatamente. A teoria do risco sugere que a empresa que aufere os pro-veitos econômicos da atividade responda objetivamente pelos danos que ela causar. Há, porém a garantir a vítima, o Estado. Se a empresa não possuir patrimônio para fazer frente ao dano, o Estado poderá ser chamado a indenizar. Só, porém, em caráter secundário, subsidiário.

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Ora, se o Estado transfere ao particular parte de suas ativi-dades, isto é, a execução de serviços tipicamente públicos, e este vem a causar prejuízos a terceiros por força do próprio exercício da atividade que a ele foi confiada, não pode o ente estatal afas-tar-se por completo dos ônus daí provenientes, pois indireta-mente concorreu para realização do evento danoso.

O Superior Tribunal de Justiça também firmou entendimen-to nesse sentido. Vejamos.

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRANSPORTE COLETIVO. APEDREJA-MENTO DE ÔNIBUS. RESPONSABILIDADE SUBSI-DIÁRIA. PODER CONCEDENTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMEN-TO. 1. Conforme orientação deste Superior Tribunal de Justiça, há responsabilidade subsidiária do Poder Con-cedente, em situações em que o concessionário/permis-sionário não possuir meios de arcar com a indenização pelos prejuízos a que deu causa. 2. Na espécie, o Tribu-nal de origem entendeu que a conduta omissiva da pres-tadora de serviço - deixar de prestar socorro às vítimas após o apedrejamento do ônibus - caracterizou sua res-ponsabilidade em indenizar, a título de danos morais, a recorrida, cabendo à empresa concedente responder subsidiariamente pelos danos causados, caso ocorra a insolvência da primeira. Aplica-se a Súmula 83/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.(STJ , Re-lator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julga-mento: 15/10/2013, T4 - QUARTA TURMA) 17

17 <Disponível em: http:// www.stj.jus.br>. Acesso em: 16/01/2015.

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4.7 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

As excludentes da responsabilidade civil são situações que quando configuradas afastam o dever de indenizar tendo em vis-ta que rompem o nexo de causalidade existente entre o evento danoso e a conduta comissiva ou omissiva. No campo da res-ponsabilidade civil estatal, à luz da teoria do risco administra-tivo, é perfeitamente possível a aplicação da culpa exclusiva da vítima, do caso fortuito e da força maior, institutos estes traba-lhados no item 2.6.

O Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de es-clarecer que o princípio da responsabilidade objetiva não possui caráter absoluto, já que admite o abrandamento ou mesmo a ex-clusão da própria responsabilidade civil do Estado em hipóte-ses extraordinárias configuradoras de situações liberatórias, tais como, o caso fortuito e a força maior ou que evidenciem a ocor-rência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 – RTJ 55/50 – RTJ 163/1107- 1108, Rel Min. Celso de Mello) 18.

No mesmo julgado, o Ilustre Ministro registrou ainda que os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da respon-sabilidade civil objetiva do Poder Público são: a alteridade do dano, a causalidade material entre o evento danoso e o comportamento positivo ou omissivo do agente público, a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que nessa condição funcional tenha incidido na conduta, independentemen-te da licitude, ou não, do se comportamento e, por último, a ausên-cia de causa excludente da responsabilidade estatal.

Confirmando a possibilidade de aplicação das excludentes de ilicitude no âmbito da responsabilidade civil do Estado, o Superior Tribunal de Justiça em um de seus julgados enfatizou

18 <Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo567.htm >Acesso em: 16/01/2015.

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Com apuração da responsabilidade se relaciona à atividade desenvolvida por pessoa jurídica de direto público - Mu-nicípio de Belo Horizonte -,a hipótese, em se constando os seus requistos, é de aplicação da responsabilidade ob-jetiva (art. 37, §6º, da Constituição da República).Assim, se comprovada a ocorrência do dano e sua relação de cau-salidade com a atividade desenvolvida pela pessoa jurídi-ca de direto público, certa será a obrigação de indenizar. Existem hipóteses nas quais o nexo de causalidade pode ser afastado - caso fortuito,força maior e culpa exclusiva da vítima. É certo, porém, que só se afasta esse nexo causal quando demonstrado, com segurança e consistência, ocor-rência de uma das excludentes mencionadas (STJ, AgRg no AREsp 4.684, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJ 17/04/2012)19 (grifo nosso)

Por fim, importante frisar que a teoria do risco integral, confi-gura uma vertente extremada da doutrina do risco administrativo, sendo descabida a alegação das causas excludentes da responsa-bilidade estatal acima apresentadas. O risco integral é aplicado, por exemplo, nas hipóteses de dano ambiental e dano nuclear, bastando, para sua confirmação, a ocorrência do prejuízo.

4.8 PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DA REPARAÇÃO CIVIL

Inicialmente, cumpre esclarecer que a jurisprudência brasi-leira consolidou-se no sentido de que o prazo prescricional da pretensão de responsabilidade civil contra o Estado é de cinco anos. Ocorre que, até que tal entendimento fosse firmado, houve intensa divergência nos Tribunais.

19 <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21513126/agravo-regimental--no-agravo-em-recurso-especial-agrg-no-aresp-4684-mg-2011-0057349-6-stj>. Acesso em: 16/01/2015.

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Costumeiramente, a matéria vem sendo regida pelo Decreto nº 20.910/32 o qual dispõe em seu art. 1º 20 que qualquer direito ou ação movido contra a Fazenda Pública, seja qual for a sua na-tureza, prescreve em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

O art. 2º do Decreto-Lei nº 4.597/4221 faz menção ao Decre-to supramencionado e acrescenta que a prescrição quinquenal também abrange as dívidas passivas das autarquias ou entida-des e órgãos paraestatais bem como todo e qualquer direito ou ação contra os mesmos.

Frise-se que, na vigência do Código Civil de 1916, o prazo prescricional da responsabilidade civil das pessoas de direito privado era de vinte anos uma vez que não existia prazo especí-fico regulando a matéria. Já nas ações contra o Estado, incidia o prazo de cinco anos por força dos decretos acima mencionados.

Ou seja, até então, o prazo prescricional contra a Fazenda Pública era demasiadamente inferior ao que incidia nas deman-das entre particulares.

No entanto, o Código Civil de 2002 passou estipular prazo específico de três anos para os casos de pretensão da reparação civil, na forma do seu art. 206, §3º, V22, gerando dúvidas acerca da derrogação ou não do art. 1º do Decreto 20.910, isto é, se a prescrição contra o Estado passou de cinco para três anos.

De início, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de que o prazo mais exíguo de três anos deveria prevalecer sobre o quinquenal tendo em vista que a tendência no ordenamento

20 Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qual-quer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natu-reza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.21  Art. 2º O Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição qüinqüenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou entidades e órgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições, exigidas em virtude de lei federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os mesmos.22 Art. 206. Prescreve: § 3o Em três anos: V - a pretensão de reparação civil;.

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jurídico brasileiro sempre foi de beneficiar as pessoas jurídicas de direito público, não sendo cabível que as ações ajuizadas por particulares se submetessem a um prazo prescricional inferior. Sobre o tema Felipe P. Braga Netto (2008, p. 142) afirmava que “seria pouco razoável um prazo mais dilatado nas ações de repa-ração de danos propostas contra o Estado, em paralelo com um prazo mais curto para ações propostas contra as pessoas jurídi-cas de direito privado”.

O Superior Tribunal de Justiça em diversos julgados de-fendeu a aplicação da tese acima mencionada: “O prazo pres-cricional de três anos relativo à pretensão de reparação civil prevalece sobre o quinquênio previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32” (STJ, REsp 1.137.354, Rel. Ministro Castro Meira, 2ª T., DJ 18/09/09) 23. No mesmo sentido: “O prazo prescricional de três anos relativo à pretensão de reparação civil – art. 206, §3º, do CC/02 – prevalece sobre o quinquênio previsto no art. 1º do Decreto 20.910/32” (STJ, REsp 1.217.933, Rel. Ministro Herman Benjamim, 2ª T., DJ 25/04/11) 24.

Ocorre que, em verdadeira virada jurisprudencial, o STJ fir-mou o posicionamento no sentido de que as ações que visam discutir a reparação civil contra o Estado prescrevem em cinco anos, na forma do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, conforme se extrai da leitura das seguintes ementas:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ES-TADO. PRAZO PRESCRICIONAL. CINCO ANOS. DECRE-TO 20.910/1932. NÃO INCIDÊNCIA DE PRAZO MENOR PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL. MATÉRIA PACIFICADA EM RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC). 1. A

23 <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6042305/recurso-especial-resp--1137354-rj-2009-0165978-0/relatorio-e-voto-12172981>.Acesso em: 16/01/15.24 <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23034607/recurso-especial-resp--1251993-pr-2011-0100887-0-stj>.Acesso em: 16/01/15.

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Primeira Seção do STJ, em recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC, pacificou entendimento de que a responsabilidade civil da Administração Pública é regida pelo prazo quinquenal do art. 1º do Decreto 20.910/1932, sendo inaplicável o art. 206, § 3º, V, do Código Civil (REsp 1.251.993/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Pri-meira Seção, DJe 19.12.2012). 2. Recurso Especial provido para afastar a ocorrência da prescrição e determinar o re-torno dos autos à origem para que se prossiga no julgamen-to da demanda.(STJ - REsp: 1249793 RS 2011/0089458-7, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamen-to: 22/04/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publica-ção: DJe 22/05/2014)(grifo nosso)ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSA-BILIDADE CIVIL DO ESTADO. DESAPROPRIAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. DANOS MORAIS. PRAZO PRES-CRICIONAL. DECRETO N. 20.910/32. 1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. 1.251.993/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, assentou que o prazo de prescrição quinquenal, previsto no Decreto nº 20.910/32, aplica-se às ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do pra-zo trienal contido do Código Civil de 2002. 2. Agravo re-gimental a que se nega provimento.(STJ - AgRg no REsp: 1252441 RS 2011/0103362-0, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 11/11/2014, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/11/2014) 25

25 <Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=prazo+prescricio-nal+contra+o+estado+&idtopico=T10000002>.Acesso em: 16/01/2015.

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Ademais, há inúmeros precedentes no Supremo Tribunal Federal compartilhando do mesmo entendimento. Vejamos.

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁ-RIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILI-DADE CIVIL DO ESTADO. PRAZO PRESCRICIONAL. RE-CURSO CONTRA ACÓRDÃO DO STJ. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL SURGIDA NA INSTÂNCIA ORDINÁ-RIA. INVIABILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. (...). 2. In casu, o acórdão recorrido assentou: “RESPONSA-BILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRAZO DE PRESCRIÇÃO. As ações propostas contra a Fazenda Pública estão sujeitas ao prazo prescricional de cinco anos. Agravo regimental não provido.” 3. Agravo regimental DESPROVIDO.(STF - ARE: 782050 DF , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Jul-gamento: 28/10/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-223 DIVULG 12-11-2014 PUBLIC 13-11-2014)PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO RE-GIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RES-PONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 1º DO DECRETO N. 20.910/32. NORMA ESPECIAL QUE PREVALECE SOBRE LEI GERAL. PRECEDENTES. 1. Hipótese em que se discu-te o prazo prescricional em ações indenizatórias contra a Fazenda Pública. 2. O acórdão recorrido aplicou, no caso em tela, o prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, V, do novo Código Civil. 3. Entretanto, o entendimento desta Corte é no sentido de que a prescrição contra a Fazenda Pública, mesmo em ações indenizatórias, rege-se pelo De-creto 20.910/1932, que disciplina que o direito à reparação econômica prescreve em cinco anos da data da lesão ao patrimônio material ou imaterial, porquanto é norma espe-cial, que prevalece sobre lei geral (...) Publique-se. Brasília,

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26 de agosto de 2014.Ministro Luís Roberto BarrosoRela-tor(STF - ARE: 819877 DF, Relator: Min. ROBERTO BAR-ROSO, Data de Julgamento: 26/08/2014, Data de Publica-ção: DJe-169 DIVULG 01/09/2014 PUBLIC 02/09/2014) 26

26 <Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=responsabilidade+-civil+do+estado+prazo+prescricional+de+cinco+anos&idtopico=T10000001>.Acesso em: 16/01/2015.

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5 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO

5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAISO DEVER de indenizar do Estado surge em razão tanto de atos comissivos como omissivos. Em relação à primeira hipótese, a doutrina e a jurisprudência, consoante narrado anteriormente, são firmes ao defender que o ordenamento jurídico brasileiro adotou a teoria da responsabilidade objetiva estatal.

Já nos casos em que o dano decorre de uma inação estatal, ainda há muita polêmica acerca de qual teoria deve ser aplicada. Há aqueles que defendem a adoção da teoria da culpa, indo de encontro à regra geral disciplinada na Constituição Federal e os que em sentido contrário, acolhem a responsabilização objetiva do Estado, conforme abaixo passamos a elucidar.

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5.2 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA NA OMISSÃO

Celso Antônio Bandeira de Mello (2008, p. 142), inspirado em Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, defende que a respon-sabilidade estatal em decorrência de um ato omissivo é subjetiva com o argumento de que se o Estado não agiu, não pode ser o autor do dano. Pondera que somente será possível responsabili-zá-lo quando estiver obrigado a impedir o dano, ou seja, quando o Poder Público descumprir dever legal de impedir o evento da-noso. Ele se manifesta da seguinte forma:

Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para im-por-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conse-quências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessaria-mente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilí-cita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligencia, imprudência, imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva.

Nesse mesmo sentido, José dos Santos Carvalho Filho (2013, p.567) entende que a responsabilidade somente poderá ser imputa-da ao Estado quando este permanecer inerte diante do dever legal de evitar que o dano se consume e somente surgirá quando os ele-mentos que caracterizam a culpa estiverem presentes. O renomado autor dispõe ainda que a culpa se origina do descumprimento do dever legal atribuído ao Poder Público de impedir a consumação do dano e resulta desse modo, que, nas omissões estatais, a teoria da responsabilidade objetiva não tem perfeita aplicabilidade.

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No Supremo Tribunal Federal o grande defensor da tese sub-jetivista foi o Ministro Carlos Velloso, hoje aposentado. Vejamos a ementa de um dos julgados da referida Corte por ele relatado em que este posicionamento se mostra presente.

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RES-PONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO MORTO POR OUTRO PRESO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PU-BLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsa-bilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três verten-tes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência --, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. - Detento assassinado por outro preso: responsabilida-de civil do Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, dado que o Estado deve zelar pela integridade física do preso. IV. - R.E. conhecido e não provido.(STF - RE: 372472 RN , Relator: Min. CARLOS VELLOSO, Data de Julgamento: 04/11/2003, Segunda Tur-ma, Data de Publicação: DJ 28-11-2003 PP-00033 EMENT VOL-02134-05 PP-00929)(grifo nosso). 1

Felipe Peixoto Braga Netto (2014, p.182), ao realizar uma análise histórica acerca do tema, enfatiza que nos países ociden-

1 <Disponível em: http://www.stf.jus.br>. Acesso em 21/12/2014.

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tais houve uma manifesta evolução da responsabilidade subjeti-va para a objetiva, contudo o direito brasileiro, quanto à respon-sabilidade do Estado por omissão, traçou o caminho inverso. A seu ver “há alguns anos, aceitava-se com maior naturalidade, a possibilidade do Estado responder objetivamente nas omissões. Hoje, porém, observa-se certa inversão dessa tendência”.

Seguindo a linha dos posicionamentos até então apresenta-dos, a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pre-valece no sentido de que a responsabilidade nos casos de omis-são estatal, em regra, é subjetiva, conforme se extrai de julgados recentes proferidos pela Corte Superior.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABI-LIDADE CIVIL DO ESTADO.ATO OMISSIVO. RESPON-SABILIDADE SUBJETIVA. SÚMULA 83/STJ. ANÁLISE DEPROCESSO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE MO-ROSIDADE. DOLO OU CULPAINEXISTENTE. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência, tanto a do STF como a do STJ, é firme no sentido de que se aplica a teoria da responsabi-lidade subjetiva nos casos de ato omissivo estatal. Incidên-cia da Súmula 83/STJ. 2. A modificação da conclusão a que chegou a Corte de origem, de que não ficou “configurada ineficiência ou morosidade da Administração no proces-samento do pedido administrativo de aposentadoria”,con-clusão esta pautada na análise pormenorizada dos trâmites do referido processo, e de que restou ausente a “comprova-ção de dolo ou culpa por parte da ré na condução do pro-cedimento administrativo”,demandaria reexame do acervo fático-probatório dos autos, inviável em sede de recurso especial, sob pena de violação da Súmula 7 do STJ. 3. A incidência da referida Súmula inviabiliza o conhecimen-to do apelo nobre, tanto pela alínea a quanto pela alínea c do permissivo constitucional. 4. Descabe ao STJ exami-

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nar na via especial, sequer a título de prequestionamen-to, eventual violação de dispositivo constitucional,pois é tarefa reservada ao Supremo Tribunal Federal.Agravo regimental improvido.(STJ - AgRg no AREsp: 243494 PR 2012/0217872-6, Relator: Ministro HUMBERTO MAR-TINS, Data de Julgamento: 05/02/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/02/2013)(grifo nosso) 2

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RESPONSA-BILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. BURACO NA PISTA. MORTE DO MOTORISTA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. OMISSÃO. OCORRÊNCIA DE CULPA. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. PROPORCIONALIDA-DE. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. SÚMULA 54/STJ. PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. HONORÁRIOS AD-VOCATÍCIOS. SÚMULA 284/STF. 1. Não há violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem analisa ade-quada e suficientemente a controvérsia objeto do recurso especial. 2. Na hipótese dos autos, restaram assentados no acórdão os pressupostos da responsabilidade subjeti-va, inclusive a conduta culposa, traduzida na negligência do Poder Público na conservação das rodovias federais. O acolhimento da tese do recorrente, de existir culpa ex-clusiva da vítima, demandaria a incursão no conjunto fático-probatório dos autos, providência obstada pela Sú-mula 7/STJ (...)(STJ - REsp: 1356978 SC 2012/0256419-9, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 05/09/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2013) 3

2 <Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em 21/12/2014.3 <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24199711/recurso-especial-resp--1356978-sc-2012-0256419-9-stj>. Acesso em 21/12/2014.

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5.3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA NA OMISSÃO

Em 1996, sob a relatoria do Ministro Celso de Melo, o Su-premo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordi-nário 109.615, pronunciou a primeira condenação do Estado por ato omissivo com fundamento na responsabilidade objetiva. Pela importância do julgado oportuna é a transcrição de parte do voto proferido pelo ilustre Ministro. Vejamos.

A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Polí-tica de 1946, confere fundamento doutrinário à responsa-bilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Po-der Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemen-te de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público . - Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsa-bilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o even-tus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta co-missiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 1 31/417) (STF - RE: 109615 RJ , Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 28/05/1996, Primeira Turma,

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Data de Publicação: DJ 02-08-1996 PP-25785 EMENT VOL-01835-01 PP-00081) 4

A renomada jurista e atual Ministra do STF, Cármen Lúcia Rocha (1999, p. 381), também entende ser objetiva a responsa-bilidade extracontratual do Estado, cobrindo tanto o campo da ação como da omissão.

Carlos Roberto Gonçalves (2014, p. 165) adepto da corrente objetiva aduz que

A jurisprudência, malgrado alguma divergência, tem en-tendido que a atividade administrativa a que alude o art. 37, §6º, da Constituição Federal abrange tanto a conduta comissiva como a omissiva. No último caso desde que a omissão seja a causa direta e imediata do dano

Da mesma forma entende o jurista Hely Lopes Meirelles (2009, p.662), sob o argumento de que a partir da substituição da respon-sabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica da Administração Pública, tanto a omissão como a ação do Estado estão abrangidas pela teoria objetiva do risco administrativo.

O Professor Gustavo Tepedino (1999, p.191), um dos maio-res defensores da adoção exclusiva da teoria objetiva nos casos de responsabilidade civil do Estado, expõe:

Não é dado ao intérprete restringir onde o legislador não restringiu, sobretudo em se tratando de legislador constituinte – ubi lex non distinguere debemus. A Consti-tuição Federal, ao introduzir a responsabilidade objetiva para os atos da Administração Pública, altera inteiramente a dogmática da responsabilidade neste campo, com base

4 <Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em 26/12/2014.

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em outros princípios axiológicos e normativos, perdendo imediatamente base de validade o art. 15 do Código Civil, que se torna, assim, revogado ou, mais tecnicamente, não recepcionado pelo sistema constitucional.

Sustentam os defensores desta corrente que o art. 43 do Có-digo Civil de 2002 que na prática reproduz o teor do artigo 37, § 6º da Constituição de 1998, introduziu na legislação civil in-fraconstitucional a teoria do risco a qual fundamenta a respon-sabilidade extracontratual do Estado. Assim, com o advento do novo Código, o artigo 15 do Código Civil de 1916, que servia de suporte legal para a responsabilidade subjetiva, acabou sendo revogado, razão pela qual não existiria mais espaço para susten-tar a responsabilidade subjetiva da Administração Pública no ordenamento jurídico brasileiro.

Em consonância com o tema, a própria legislação brasileira adotou esta corrente no Código de Trânsito, mais especificamen-te em seu art. 1º, §3º, o qual responsabiliza objetivamente – por ações ou omissões – o poder público pelos danos causados aos cidadãos, in verbis:

Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código.§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.

Os opositores desta corrente argumentam que a responsabi-lização objetiva do Estado em toda e qualquer hipótese de omis-

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são tornaria o Estado um segurador universal e, por conseguinte, ocasionaria um ônus desproporcional, vez que, nas hipóteses de conduta comissiva, ao menos teoricamente, pode o Estado exer-cer o seu direito/dever constitucional de exigir do funcionário público causador de prejuízo a repetição da quantia que a Fa-zenda Pública teve de adiantar à vítima. Já na responsabilidade por omissão tal reparação torna-se impossível, pois não há como individualizar o polo passivo da ação regressiva, impedindo as-sim o seu ajuizamento.

5.4 OMISSÕES GENÉRICA E ESPECÍFICA

Conforme acima demonstrado, para uma boa parte da doutrina a responsabilidade do Estado por omissão é sempre subjetiva. Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 957) de-fende que

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido respon-sabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo.

Por outro lado, existe a corrente intermediária, capitaneada pelo festejado Sérgio Cavalieri Filho (2014, p.297) o qual defen-de a coexistência da responsabilidade objetiva e subjetiva nas condutas omissivas estatais, sendo que esta última só tem lugar nos casos de omissão genérica da Administração, como se pas-sará a expor, e não em qualquer caso de omissão.

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A par disso, o jurista Guilherme Couto Castro (1999, p.37) sustenta não ser correto dizer que toda hipótese de dano pro-veniente de omissão estatal deverá sempre ser encarada pelo ângulo subjetivo. De acordo com o autor, assim o será quando se tratar de omissão genérica, mas não quando houver omissão específica, pois aí há dever individualizado de agir.

A omissão específica faz surgir a responsabilidade objetiva estatal e ocorre quando o Estado estiver na condição de garante/guardião e em razão de comportamento omissivo faz surgir o evento danoso. Ora, para que reste configurada esta espécie de omissão, é imprescindível que o Estado tenha o dever específico de impedir o resultado. A inércia administrativa é a causa direta e imediata do não impedimento do evento.

Felipe P. Braga Netto (2014, p. 185) dispõe o seguinte:

Será difícil, no atual estado jurisprudencial, responsabilizar o Estado por todos os assaltos ocorridos no país. Porém, se alguém é assaltado em frente a uma delegacia de polícia, estando patente a inação estatal, é possível que o dever de indenizar se faça presente. Quanto mais específica for a omissão, diante do dever de agir, concreto e palpável, que se impõe ao Estado, mais claro será o seu dever não cumprido.

O notável doutrinador, de forma bastante esclarecedora, narra a hipótese de alguém, bêbado, dirigindo, vir a provocar um acidente que destroça famílias, futuros e planos. Deve o Es-tado responder pelos danos? A princípio a resposta é negativa se, porém, “o motorista bêbado foi parado pouco antes numa blitz, e indevidamente liberado, o nexo causal assume um con-torno sólido que autoriza imputar ao Estado a reparação dos da-nos”. Nesse caso, teríamos uma omissão específica do Estado que dá ensejo a sua responsabilização independente de culpa.

Sérgio Cavalieri Filho (2014, p.298), ao discorrer sobre o

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO y 101

tema, enumera alguns exemplos clássicos de omissão especí-fica, são eles: morte de detento em rebelião em presídio (Ap. Civ. 58957/2008, TJRJ); suicídio cometido por paciente inter-nado em hospital público, tendo o médico responsável ciência da intenção suicida do paciente e nada fez para evitar (REsp. 494206/MG); paciente que dá entrada na emergência de hospital público, onde fica internada, não sendo realizados os exames determinados pelo médico,vindo a falecer no dia seguinte (Ap. Civ. 35985/2008, TJRJ); acidente com aluno nas dependências de escola pública – a pequena vítima veio a morrer afogada no horário escolar, em razão de queda em bueiro existente no pátio da escola municipal (Ap. Civ. 3611/1999, TJRJ).

Nesse mesmo sentido, o Tribunal de Justiça Gaúcho, re-centemente, proferiu acórdão interessante pautado na omissão específica estatal. Trata-se, o caso em análise, de ação indeniza-tória movida em face do Estado em razão da expedição de alva-rá por “lapso do escrivão”, a despeito da penhora no rosto dos autos, o que acabou configurando conduta ilícita, causadora de prejuízos ao demandante, vez que este se viu impossibilitado de receber os créditos que possuía frente ao devedor. Vejamos a ementa.

RESPONSABILIDADE CIVIL. RESPONSABILIDADE OB-JETIVA DO ESTADO. OMISSÃO ESPECÍFICA. LIBERA-ÇÃO DE ALVARÁ APESAR DE PENHORA NO ROSTO DOS AUTOS. DANO MATERIAL CONFIGURADO. PRES-CRIÇÃO QÜINQÜENAL. Hipótese em que o cartório judi-cial liberou alvará apesar da existência de penhora no ros-to dos autos, inviabilizando o recebimento do crédito do autor. Responde o ente público objetivamente, nos termos do art. 37, § 6º, da CF, pela omissão específica decorrente da falta de observação da existência de penhora no rosto dos autos. Dano material que deve ser reparado. A prescri-

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ção das ações pessoais contra a Fazenda Pública é de cin-co anos, nos termos do Decreto nº 20.910/32, contados da data do ato ou fato do qual se originaram. APELAÇÃO DO ESTADO DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PRO-VIDA. (Apelação Cível Nº 70054797774, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 26/09/2013)(TJ-RS - AC: 70054797774 RS , Relator: Túlio de Oliveira Martins, Data de Julgamen-to: 26/09/2013, Décima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 18/10/2013) 5(grifo nosso)

Assim, observa-se que em todos os casos narrados que a omissão específica fora aplicada, o Estado possuía meios de con-trolar e evitar o dano, mas não o fez. O prejuízo provém direta-mente da inércia estatal.

Em contrapartida, na omissão genérica, ensejadora da res-ponsabilidade subjetiva, o Estado não tem o dever individua-lizado de evitar o dano. A conduta omissiva estatal, diferente-mente do que ocorre na omissão específica, não é causa direta e imediata do prejuízo, mas sim concorre para ele, sendo indis-pensável que o lesado comprove que a falta do serviço ou sua má prestação cooperou para a ocorrência do dano.

Nessa linha, configura-se julgado no Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro:

AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. MORTE DE MENOR. DENGUE HEMORRÁGICA. RESPONSABILI-DADE CIVIL ESTATAL. OMISSÃO GENÉRICA. EXCLU-SÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE. Autora, que pretende o pagamento de indenização por danos morais, em razão

5 <Disponível em: http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113321259/apelacao-civel-ac--70054797774-rs>. Acesso em 27/12/2014.

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da morte de sua filha, acometida por dengue hemorrágica. Causa de pedir, que se consubstancia na omissão estatal e municipal no tocante à organização e ao planejamento de políticas públicas preventivas e de combate à doença. Enfermidade que assola todo o Estado do Rio de Janeiro, sendo públicas e notórias as campanhas destinadas a sua prevenção e ao seu combate. Necessidade de participação ativa da sociedade para evitar a contaminação e a proli-feração do mosquito transmissor da dengue. Não confi-gurado o dever de agir, individualizado, do ente público. Omissão genérica. Ausência do dever de indenizar. Prece-dentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Es-tadual. Negativa de seguimento do recurso, na forma do caput do art. 557, do Código de Processo Civil.(TJ-RJ - APL: 3272334220108190001 RJ 0327233-42.2010.8.19.0001, Relator: DES. DENISE LEVY TREDLER, Data de Julgamen-to: 08/02/2012, DECIMA NONA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 17/02/2012) 6(grifo nosso)

O caso em apreço diz respeito à ação indenizatória por da-nos morais, ajuizada em razão do óbito da filha da autora por dengue hemorrágica e pela omissão do Estado no que diz respei-to à organização e planejamento de políticas públicas preventi-vas de dengue.

Ora, trata-se de típico episódio de omissão genérica, haja vista que a Administração Pública não pode responder objetiva-mente por todos os óbitos ocasionados pela dengue, até porque nenhuma atividade pública seria capaz de garantir a ausência absoluta de manifestação da doença.

Ademais, para que se possa imputar qualquer tipo de res-

6 <Disponível em: http://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21280285/apelacao-apl--3272334220108190001-rj-0327233-4220108190001-tjrj>. Acesso em 27/12/2014.

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ponsabilidade ao Estado, imprescindível é a comprovação do nexo de causalidade, ou seja, que o falecimento da menor de-correu de omissão específica no tocante às políticas de saúde pública preventiva, sob pena de transmudá-lo em um segurador universal.

Certo é que, a cada caso concreto, impõe-se que os elemen-tos da responsabilidade extracontratual, seja ela objetiva ou sub-jetiva, sejam averiguados, com a efetiva demonstração do nexo causal necessário entre a sua ação, ou omissão, e o evento da-noso. Logo, se a conduta da Administração não se constituir em meio apto a dar causa ao prejuízo, não é cabível falar em respon-sabilidade estatal.

Pois bem, diante de todo o exposto, acolhemos na presente monografia a corrente intermediária segundo a qual o art. 37, §6º da Constituição Federal que dispõe acerca da responsabi-lidade objetiva do Estado, não incide apenas nas hipóteses de condutas comissivas, mas também deve ser aplicado nos casos de omissão específica estatal. Em contrapartida, quando restar caracterizada a omissão genérica do Poder Público, isto é, quan-do não for possível exigir deste uma atuação específica no sen-tido de impedir a consumação do dano, a responsabilidade da Administração será subjetiva.

Em suma, como bem observa Cavalieri (2014, p. 299), nos episódios de responsabilidade civil do Estado fundadas na sua omissão, deverá o intérprete estabelecer uma distinção entre “estar o Estado obrigado a praticar uma ação, em razão de espe-cífico dever de agir, ou ter apenas o dever de evitar o resultado”. Se estiver obrigado a agir, estaremos diante de omissão especí-fica e, consoante acima explanado, a responsabilidade será ob-jetiva, sendo suficiente a demonstração do nexo de causalidade entre a omissão e o evento danoso.

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6 ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS

CONFORME demonstrado ao longo do presente trabalho, a res-ponsabilidade civil traz consigo uma enorme flexibilização orgâ-nica, vez que trabalha com cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados de modo que a jurisprudência possui um papel importante no sentido de dar respostas apropriadas e satisfató-rias às necessidades sociais que surgem.

Assim, neste capítulo, com o intuito de trazer o tema do presente trabalho para uma abordagem ainda mais prática, será feita um estudo de casos concretos, com foco na análise da apli-cação das teorias ora trabalhadas pela jurisprudência brasileira. Ademais, é importante esclarecer que os casos apresentados fo-ram escolhidos por terem despertado maior interesse durante o estudo, não sendo o objetivo fazer uma análise minuciosa acerca da jurisprudência de um Tribunal específico.

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6.1 DANOS RELACIONADOS A DETENTOS

Passaremos agora à análise da responsabilidade extracontra-tual do Estado relacionada ao Sistema Penitenciário Brasileiro. É pública e notória a condição degradante em que vivem os de-tentos em nosso País, expostos a todo tipo de doença, superlota-ção, maus tratos, ocorrência de mortes e agressões, dentre tantas outras intempéries.

De fato, diante das condições apontadas, dia-a-dia milhares de indivíduos são vítimas de violações aos direitos fundamentais garantidos pela Carta Magna, tais como o direito á integridade física e moral, em detrimento da dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil e, consequente-mente, do Estado Democrático de Direito.

Sem afastar-se por completo da análise acerca dos direitos e garantias constitucionais inerentes aos presos, o foco principal deste tópico é demonstrar, à luz da jurisprudência pátria, qual o limite da responsabilização da Administração Pública pelos prejuízos sofridos e causados por aqueles que estão legalmente sob tutela do Estado.

6.1.1 Danos causados por detentos fugitivos

Inicialmente, é valioso ressaltar que o Estado na qualidade de guardião do detento responde não apenas pela sua segurança e integridade física, mas também pelos prejuízos que estes even-tualmente vierem a causar a terceiros.

Acerca do tema vale destacar julgado do Supremo Tribunal Federal em que o Estado foi condenado a indenizar as vítimas, em razão do cometimento de crime de estupro praticado por preso fugitivo sob o argumento de que o nexo de causalidade estaria configurado. Vejamos.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FAUTE DU SERVICE PUBLIC CARACTERIZADA. ESTUPRO COMETIDO POR PRESI-DIÁRIO, FUGITIVO CONTUMAZ, NÃO SUBMETIDO À REGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL COMO MANDA A LEI. CONFIGURAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. Impõe-se a responsabilização do Estado quando um condenado sub-metido a regime prisional aberto pratica, em sete ocasiões, falta grave de evasão, sem que as autoridades responsáveis pela execução da pena lhe apliquem a medida de regres-são do regime prisional aplicável à espécie. Tal omissão do Estado constituiu, na espécie, o fator determinante que propiciou ao infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro contra menor de 12 anos de idade, justamente no período em que deveria estar recolhido à prisão. Está configurado o nexo de causalidade, uma vez que se a lei de execução penal tivesse sido corretamente aplicada, o con-denado dificilmente teria continuado a cumprir a pena nas mesmas condições (regime aberto), e, por conseguinte, não teria tido a oportunidade de evadir-se pela oitava vez e co-meter o bárbaro crime de estupro. Recurso extraordinário desprovido.(STF - RE: 409203 RS , Relator: Min. CARLOS VELLOSO, Data de Julgamento: 07/03/2006, Segunda Tur-ma, Data de Publicação: DJ 20-04-2007 PP-00102 EMENT VOL-02272-03 PP-00480 RTJ VOL-00200-02 PP-00982 LE-XSTF v. 29, n. 342, 2007, p. 268-298)1.

Trata-se de caso em que um condenado fugitivo do sistema prisional estadual invadiu a casa das recorridas e, portando uma arma, exigiu-lhes dinheiro. Não atendida a exigência do crimino-

1 <Disponível em: http://www.stf.jus.br > Acesso em: 18/01/2015.

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so, as recorridas (mãe e filha) foram submetidas a ameaças e, uma delas, uma menor com 12 anos de idade, foi estuprada. O Tribu-nal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu por bem condenar o Estado ao pagamento do dano causado sob o argumento de que se aplicava ao caso o princípio da responsabilidade objetiva.

O Ministro Carlos Veloso, aplicando a corrente subjetivista entendeu que, no caso, restou configurada a falta do serviço, mas não o nexo de causalidade. Isto é, não havia relação direta e ime-diata entre a fuga do apenado e o crime cometido, afastando a condenação do Estado ao pagamento de indenização às vítimas.

O Ministro Joaquim Barbosa, primeiro a divergir, explanou que o causador do dano era condenado ao regime aberto e por sete oportunidades anteriores já havia cometido falta grave de evasão, sem que as autoridades responsáveis tomassem alguma providên-cia no sentido de submetê-lo à regressão do regime prisional.

Sustentou ainda que, no caso em análise, o nexo de causa-lidade é evidente vez que se a lei de execução penal tivesse sido aplicada com um mínimo de rigor, o condenado jamais teria con-tinuado a cumprir pena no regime aberto e consequentemente, não teria tido a oportunidade de fugir pela oitava vez e cometer o crime de estupro no horário que deveria estar recolhido.

Após, concluiu que o caso não se assemelhava aos demais em que a jurisprudência da Corte havia afastado a responsabi-lidade civil do Estado. Na maior parte dessas situações havia sempre um elemento sutil que rompia o nexo de causalidade como, por exemplo, o longo período de tempo transcorrido entre a fuga e a prática do crime.

No mesmo sentido, o Ministro Celso de Mello enfatizou que o Tribunal de Justiça gaúcho proferiu decisão que “inter-pretou com absoluta fidelidade a norma constitucional que consagra, em nosso, ordenamento jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público” uma vez que todos os requisitos necessários para configuração do dever de indenizar estavam

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ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS y 109

presentes no caso concreto, quais sejam: a consumação do dano; a omissão administrativa; vínculo causal entre o evento danoso e o comportamento estatal e a ausência de qualquer excludente de responsabilidade civil do Estado.

Frise-se que em sentido contrário, já decidiu a Corte Supre-ma no julgamento do Recurso Extraordinário nº 172.025/RJ2, sob a relatoria do Ministro Ilmar Galvão, publicada em 19 de de-zembro de 1996, que não estava evidenciada a responsabilidade civil do Estado, pois o latrocínio fora praticado pelo preso cerca de três meses após a fuga, inexistindo nexo de causalidade entre o evento criminoso e a conduta omissiva estatal.

O relator fundamentou seu voto com apoio no Recurso Ex-traordinário nº 130764/PR 3 que tratou de situação similar – cri-me cometido por preso foragido tempos depois da evasão – a qual até hoje se mostra atualizada, servindo como precedente para diversas outras decisões proferidas pelos Tribunais bra-sileiros ao analisarem o assunto. Em razão da importância do acórdão, transcrever-se-á sua ementa:

Responsabilidade civil do Estado. Dano decorrente de as-salto por quadrilha de que fazia parte preso foragido vários meses antes. - A responsabilidade do Estado, embora obje-tiva por força do disposto no artigo 107 da Emenda Cons-titucional n. 1/69 (e, atualmente, no parágrafo 6. do artigo 37 da Carta Magna), não dispensa, obviamente, o requisito, também objetivo, do nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a seus agentes e o dano causado a tercei-ros. - Em nosso sistema jurídico, como resulta do disposto no artigo 1.060 do Código Civil, a teoria adotada quanto ao

2 <Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/743384/recurso-extraordinario-re--172025-rj> Acesso em: 18/01/2015.3 <Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14709066/recurso-extraordinario--re-130764-pr> Acesso em: 18/01/2015.

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nexo de causalidade e a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal. Não obstante aquele dispositivo da codificação civil diga respeito a impropriamente denominada responsabilidade contratual, aplica-se ele também a responsabilidade extra-contratual, inclusive a objetiva, até por ser aquela que, sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os in-convenientes das outras duas teorias existentes: a da equiva-lência das condições e a da causalidade adequada. - No caso, em face dos fatos tidos como certos pelo acórdão recorrido, e com base nos quais reconheceu ele o nexo de causalidade indispensável para o reconhecimento da responsabilidade objetiva constitucional, e inequívoco que o nexo de causa-lidade inexiste, e, portanto, não pode haver a incidência da responsabilidade prevista no artigo 107 da Emenda Consti-tucional n. 1/69, a que corresponde o parágrafo 6. do artigo 37 da atual Constituição. Com efeito, o dano decorrente do assalto por uma quadrilha de que participava um dos eva-didos da prisão não foi o efeito necessário da omissão da autoridade pública que o acórdão recorrido teve como causa da fuga dele, mas resultou de concausas, como a formação da quadrilha, e o assalto ocorrido cerca de vinte e um meses após a evasão. Recurso extraordinário conhecido e provido.(STF - RE: 130764 PR , Relator: Min. MOREIRA ALVES, Data de Julgamento: 12/05/1992, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 07-08-1992 PP-11782 EMENT VOL-01669-02 PP-00350 RTJ VOL-00143-01 PP-00270)

A partir da análise jurisprudencial, pode-se concluir que em matéria de presos foragidos, o Estado só responderá pelo crime praticado se o nexo de causalidade for devidamente demons-trado e desde que transcorrido um intervalo de tempo pequeno entre a fuga e o ato lesivo.

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6.1.2 Danos sofridos por detentos nos presídios – Caso de Repercussão Geral no STF

O ordenamento jurídico brasileiro assegura ao preso a in-tegridade física e moral, nos termos do art. 5º, XLIX da Consti-tuição Federal, sendo dever do Estado garantir tal direito funda-mental, mantendo, para tanto, vigilância constante e eficiente.

No caso de morte ou lesão à integridade física dos detentos dentro dos presídios, haverá omissão específica do Estado, pois na condição de guardião dos seus presos tem, conforme expla-nado acima, o dever constitucional de protegê-los. Ora, quando o Estado insere o administrado em uma situação de risco como, por exemplo, no sistema prisional, assume um dever especial de agir, sendo que se assim não o faz, a sua inércia configura-se como a causa direta e imediata de não evitar o resultado de modo que deverá responder objetivamente pelos danos causados.

Nesse ponto, é forte a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a sufragar esse entendimento. Vejamos.

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMEN-TO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.MORTE DE PRESO SOB CUSTÓDIA DO ESTADO.RESPONSABI-LIDADE DO ESTADO. AGRAVO IMPROVIDO.I- O Tribu-nal possui o entendimento de que o Estado se responsa-biliza pela integridade física do preso sob a sua custódia, devendo reparar eventuais danos. Precedentes. II - Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo acórdão recor-rido quanto à existência de nexo causal entre a omissão do Estado e o resultado morte, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF. III - Agravo regimental improvido” (AI nº 799.789/GO-AgR, Primeira Turma, Rela-tor o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 1º/2/11)

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AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMEN-TO. CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MORTE DE PRESO SOB CUSTÓDIA DO ESTADO. CONDUTA OMISSIVA. RESPONSABILIDA-DE OBJETIVA. NEXO CAUSAL. IMPOSSIBILIDADE DO REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO RE-GIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.(STF - AI: 830196 PE , Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 23/03/2011, Primeira Turma, Data de Publi-cação: DJe-067 DIVULG 07-04-2011 PUBLIC 08-04-2011 EMENT VOL-02499-02 PP-00424)RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MORTE DE PRESO SOB CUSTÓDIA DO ESTADO. CONDUTA OMIS-SIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AGRAVO RE-GIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” (RE nº 594.902/DF-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe 2/12/10). 4

Ora, o Estado responde objetivamente, pois tem o dever le-gal de manter a ordem e assegurar a incolumidade física dos seus apenados, seja no refeitório, seja dentro das celas, seja no pátio ou no âmbito de quaisquer das dependências do estabele-cimento prisional, pouco importando se o autor da lesão é um agente público ou outro prisioneiro. Tratando especificamente sobre o tema, o Ilustre doutrinador Rui Stoco ( 2007, p.1125) traz a seguinte lição

4 <Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=morte+de+preso+so-b+cust%C3%B3dia+do+estado> Acesso em: 19/01/2015.

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Assim, se um detento fere, mutila ou mata outro detento, o Estado responde objetivamente, pois cada detento está sempre sujeito e exposto a situações agudas de risco, ine-rente e próprio do ambiente das prisões onde convivem pessoas de alta periculosidade e, porque no ócio e confina-dos, estão sempre exarcebados e inquietos. Tais comportamentos dos reclusos, porque objeto de ciên-cia própria e amplamente estudados e identificados, são do perfeito conhecimento das autoridades, que, por isso, têm todos os meios de se precatar. Portanto, o Estado, no exercício do poder que a lei lhe con-fere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade como pu-nição, segregação, prevenção e objetivo de ressocialização tem o dever de guarda e incolumidade sobre os seus con-denados e encarcerados. O confinamento de pessoa condenada pelo Estado-juiz por parte do Poder Executivo pressupõe a entrega dessa pessoa à guarda e vigilância da Administração carcerária. Desse modo, qualquer lesão que esses presos sofram por ação dos agentes públicos, por ação de outros reclusos ou de terceiros, leva à presunção absoluta (jure et de jure) da responsabilidade do Estado, não admitindo a alegação de ausência de culpa.

Conforme demonstrado a partir da orientação doutrinária e jurisprudencial majoritária acima apontada, não há duvidas que os casos de morte e lesão física de detentos dentro dos presídios devem ser solucionados à luz da responsabilidade objetiva do Estado, já que a omissão estatal é específica, em razão da viola-ção a um dever especial de agir.

Finalmente, cumpre ressaltar que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral decidiu, em

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30/03/2016, que a morte de detento em estabelecimento peni-tenciário gera responsabilidade civil do Estado quando houver inobservância do seu dever específico de proteção.

No narrado, o Estado do Rio Grande do Sul foi condenado ao pagamento de indenização pela morte de um detento ocor-rida na Penitenciária Estadual de Jacuí. Segundo a necropsia, a morte ocorreu por asfixia mecânica (enforcamento), entretanto, não foi conclusivo se em decorrência de homicídio ou suicídio.

O recurso extraordinário fora interposto pelo ente estatal contra acórdão5 em que a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça/RS reconheceu a responsabilidade do Estado pela morte de detento em estabelecimento penitenciário. Em suas razões de recurso, o recorrente sustentou que não deveria ser responsabi-lizado por omissão, uma vez que não restou comprovada se a causa da morte do detento ( homicídio ou suicídio) e ainda que

5  APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE DE DETENTO EM ESTABELECIMENTO PENITENCIÁRIO. ASFIXIA MECÂNICA. EVIDÊNCIAS TANTO DE HOMICÍDIO QUANTO DE SUICÍDIO. OMISSÃO ESPECÍFICA DO ESTADO. APLICAÇÃO DA TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO. RES-PONSABILIDADE OBJETIVA. QUANTUM INDENIZATÓRIO REDUZIDO. MANUTENÇÃO DO PENSIO-NAMENTO. VERBA HONORÁRIA SUCUMBENCIAL REDIMENSIONADA. - Conforme o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, responde o Estado objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, sendo desnecessária a comprovação de dolo ou culpa. Por se tratar de omissão do Estado, a responsabilidade será objetiva, se a omissão for específica, e subjetiva, se a omissão for genérica. No caso em análise, a omissão é específica, pois o Estado deve zelar pela integridade física dos internos em estabelecimentos penitenciários que estão sob sua custódia, tendo falhado nesse ínterim. - O quantum indenizatório arbitrado pelo juiz singular para fins reparatórios por danos deve ser reduzido tendo em vista os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, portanto, vai fixado em R$ 38.000,00 para cada autor, acrescidos de correção monetária na forma estabelecida em sentença e juros moratórios de 6% ao ano até a entrada em vigor do CC/2002 e, após, de 12% ao ano, conforme art. 406 do CC/2002 art. 161, § 1 º, do CTN. - O pensionamento é proporcional e razoável, merecendo ser mantida, considerando-se a remuneração auferida pelo detento como pintor de paredes, atividade que exercia antes de ser detido em presídio. - A verba honorária merece reforma, pois não devem ser arbitrados em valor que avilte a profissão de advogado, devendo ser fixada em 10% sobre o valor da condenação. À UNANIMIDADE, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AOS APELOS. (Apelação e Reexame Necessário Nº70029820529, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 13/05/2010)<Disponível em: http://www.tjrs.jus.br> Acesso em: 19/01/2015

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“não há como impor ao Estado o dever absoluto de guarda da integridade física dos presos”.

Por unanimidade, os ministros negaram provimento ao re-curso e, ao final do julgamento, fixaram a seguinte tese de reper-cussão geral: “Em caso de inobservância de seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte de detento”.

6.2 DANOS DECORRENTES DE DESLIZAMENTOS E ENCHENTES

Inicialmente, cumpre esclarecer que o Poder Público não pode ser responsabilizado pelos danos ocasionados por desliza-mentos e enchentes quando os casos de sua ocorrência forem provenientes exclusivamente de caso fortuito ou força maior, sob pena de colocar o Estado na condição de segurador universal.

Ocorre que, em não raras ocasiões, os danos causados não decorrem tão somente de eventos inevitáveis ou imprevisíveis, isto é, a Administração Pública, por meio de uma conduta omis-siva, concorre para a configuração do prejuízo, razão pela qual a sua responsabilidade não poderá ser afastada, vez que, se tivesse agido, os prejuízos não seriam verificados.

Assim, se o caso fortuito ou a força maior forem a única causa do dano, não há como responsabilizar o Estado por uma eventual omissão, pois esta não terá relação direta e imediata com o evento danoso.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no julga-mento da Apelação nº 0253563-97.2012.8.19.00016, sob a rela-toria do Desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira condenou a Fundação GEO RIO, pessoa jurídica de direito priva-do prestadora de serviço público, a indenizar o irmão da vítima

6  <Disponível em: http://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/116622763/apelacao-apl--2535639720128190001-rj-0253563-9720128190001> Acesso em: 19/01/2015.

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que veio a falecer ao ser atingido por uma pedra que deslizou de encosta na cidade do Rio de Janeiro.

A apelada sustentou a incidência da responsabilidade sub-jetiva por se tratar de omissão de serviço público bem como a ausência de prova da culpa.

O Desembargador Relator, seguindo a corrente objetivista, sustentou que a culpa não constitui elementar da responsabili-dade civil do Estado tendo em vista que a própria Constituição Federal sem efetuar distinções, prevê que a ação ou omissão que eventualmente causem danos a terceiros enseja a responsabili-zação objetiva da pessoa jurídica de direito público, bastando ao lesado comprovar o dano e o nexo causal.

Também afirmou que a prova dos autos, especialmente a documental, comprovava de forma cristalina o acidente e o nexo causal, consistente em deslizamento de pedra de grande volume – segundo os noticiários com mais de duas toneladas de peso – que esmagou a vítima.

Ademais, ressaltou que não existiu nos autos prova do caso fortuito tampouco prova no sentido de que houve fiscalização no morro onde deslizou a pedra, e caso houvesse restaria ca-racterizada a péssima prestação do serviço da concessionária ao deixar de perceber a situação crítica da encosta, quando deveria realizar suas atividades de forma cautelosa a fim de impedir aci-dentes. Afinal, esta era sua atividade.

Ora, estamos diante de uma hipótese de omissão específica da empresa Apelada vez que, conforme explanado acima, fora contratada especificamente para realizar a verificação e repara-ção das encostas de modo a impedir que situações trágicas como a ora analisada pudessem ocorrer. Neste caso, a prestadora tinha o dever de evitar o dano, mas se omitiu, sendo a sua conduta a causa direta e imediata do evento danoso, devendo responder objetivamente pelos prejuízos causados.

Finalmente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro concluiu

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que a falha na prestação do serviço, qual seja não realizar a pre-venção de acidentes, não rompe o nexo de causalidade, e carac-teriza, assim, o dever de indenizar.

Felipe P. Braga Netto (2008, p.248-250), acerca dessa maté-ria, consigna que se uma enchente causa danos aos moradores, o município deverá responder por eles independente da com-provação de culpa desde que as vítimas comprovem a existência de nexo causal entre a omissão estatal e o evento danoso. Mais adiante elucida ainda que mesmo que o Estado prove que não houve, de modo algum, culpa (ex: o buraco apareceu no dia an-terior, impossibilitando qualquer previsão de obra), ainda assim será responsável, bastando para sua ocorrência à comprovação do dano atrelado ao nexo causal.

O Supremo Tribunal de Justiça ao analisar caso semelhante, aplicou a teoria do risco administrativo, responsabilizando ob-jetivamente o Estado pelo deslizamento de barreira em estrada federal sob o argumento de que houve falha na prestação do ser-viço, conforme ementa abaixo transcrita.

ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDA-DE CIVIL OBJETIVA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. DNER. UNIÃO. FORÇA MAIOR. DESLIZAMENTO DE BARREI-RA. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. LUCROS CES-SANTES. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. 1. Não exime-se o Departamento Nacional de Estradas ‘ DNER, da responsabilidade civil objetiva decorrente de deslizamento de barreira em estrada federal, eis que é responsável pela conservação para o uso da população, havendo falha na prestação do serviço estatal. Inocorrente o alegado motivo de força maior, em consequência de elevadas chuvas no local, porque era previsível a ocorrência destas, bem como necessário o serviço de manutenção das encostas (...) Deste modo, a tese do DNER, motivo de força maior, não deve

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prevalecer, visto que as chuvas não podem ser controla-das, nem sua intensidade, nem suas proporções, mas suas consequência devem ser previstas, fato este que não ocor-reu na referida região, vindo à tona o deslizamento ocor-rido.’ Nesse sentido, o RE 272.839/MT, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJ 08.04.2005 e o RE 425.800/RJ, rel. Min. Cármen Lúcia, DJ 13.06.2008, dentre outros. 5. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário, . Publique-se. Brasília, 12 de fevereiro de 2009. Ministra Ellen Gracie RelatoraSTF - RE: 384450 SC , Relator: ELLEN GRACIE, Data de Julgamento: 12/02/2009, Data de Publi-cação: DJe-039 DIVULG 27/02/2009 PUBLIC 02/03/2009) 7

(grifo nosso)

Com relação aos danos causados por enchentes, a Nona Câ-mara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao julgar em 31 de janeiro de 2014, a Apelação nº700579615008, de relatoria do Desembargador Eugênio Facchini Neto, conde-nou o Estado do Rio Grande do Sul a indenizar o autor da ação por danos materiais e morais decorrentes da enchente do Arroio Feijó que inundou o seu imóvel e tantas outras residências loca-lizadas em suas proximidades.

O Desembargador Relator deixou claro que, no presente caso, a omissão estatal restou configurada, vez que da análise dos documentos que instruem a inicial é possível concluir que, efetivamente, os danos decorrentes da inundação do Arroio Feijó ocorreram pela ausência de obras de dragagem e desasso-reamento no referido local, tendo o próprio Estado confirmado que por mais de oito anos, deixou de realizar tais obras.

Após a comprovação do nexo causal, o Relator passou à aná-

7  <Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3098392/recurso-extraordinario--re-384450> Acesso em: 19/01/2015.8 <Disponível em: http://www.tjrs.jus.br> Acesso em: 19/01/2015.

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lise da exigibilidade da conduta estatal e concluiu ser razoável exigir que, no caso concreto, o Poder Público mantivesse desobs-truído o rio, retirando galhos de árvores ou outros elementos que pudessem, em caso de fortes chuvas, represar a água e fazê--la transbordar. Ademais sustentou que também seria plausível que mantivesse os bueiros e bocas-de-lobo limpos, já que tais procedimentos são de fácil execução e não acarretam custos sig-nificativos para a Administração Pública, evitando-se assim a ocorrência de inundações catastróficas.

Assim, como bem observou o Relator “se fosse dado cum-primento o dever do Estado de manter em condições o fluxo hí-drico no local, não teria o resultado ocorrido, havendo inegável negligência do administrador no manejo da situação”.

Desse modo, resta evidente que a omissão do Estado foi de-cisiva para a configuração do dano, pois tinha plenas condições de, atuando dentro do que lhe seria possível exigir, evitar a ocor-rência da inundação que tanto prejudicou os habitantes da região.

6.3 DANOS SOFRIDOS POR ALUNOS DENTRO DE ESCOLA PÚBLICA

O Ministro Celso de Mello pontificou na Suprema Corte, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 109.615-2 RJ9, ser irrecusável reconhecer que assiste à entidade governamental o dever de garantir a segurança e integridade física de todos os alunos matriculados na rede oficial de ensino, in verbis:

A obrigação de preservar a intangibilidade física dos alu-nos, enquanto estes se encontrarem no recinto do estabe-lecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a to-

9 <Disponível em: http://www.stf.jus.br> Acesso em: 20/01/2015.

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dos os estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno tal como no caso ocorreu , emerge a res-ponsabilidade civil do Poder Público pelos danos causa-dos a quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda, atenção, vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares.(STF, RE nº 109.615/RJ, Rel. Ministro Celso de Mello, Brasília, 28/05/1996).

Assim, não há dúvidas de que a Administração Pública tem

o dever de guarda e vigilância dos alunos matriculados em es-colas públicas, sejam elas federais, estaduais ou municipais, de-vendo responder objetivamente pelos danos eventualmente oca-sionados a eles, ainda que oriundos da sua conduta omissiva.

Ademais, valioso ressaltar que na forma do artigo 932, IV do Código Civil10, os estabelecimentos de ensino são responsá-veis pela reparação civil dos danos, determinando o artigo 933 do Código Civil11 que tal responsabilidade estará configurada ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Frise-se ainda que as escolas são consideradas pelo Código de Defesa do Consumidor, como prestadoras de serviço/fornece-doras e assim sendo, respondem objetivamente pelos danos cau-sados, independentemente da comprovação de culpa nos termos do art. 14 da mencionada codificação12.

10 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educando;11 Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.12    Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

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Pois bem, passaremos agora ao estudo da Apelação Cível nº 518405 SC 2010.051840-5, relatado pelo Desembargador Rodrigo Collaço e julgado em 09 de fevereiro de 2012, em que o Município de Palhoça foi condenado a indenizar os familiares da vítima pelo falecimento de sua filha, vítima de afogamento, ocorrido durante ex-cursão a parque aquático, promovida pela escola da rede municipal.

O Desembargador Relator solucionou a questão à luz da teoria do risco administrativo, segundo a qual, uma vez com-provado o dano e o nexo de causalidade entre esse prejuízo e a omissão do poder público, a parte fica dispensada de comprovar culpa ou dolo do ente municipal.

Ora, o passeio ao parque aquático foi organizado por esco-la pertencente à rede de ensino do Município demandado, da qual a vítima era aluna. Muito embora a excursão não possuísse cunho pedagógico, foi preparada pelos diretores e professores da referida escola, na qualidade de agentes estatais, estando pre-sentes apenas os seus alunos, razão pela qual não pode o poder público se eximir de responsabilidade pelo evento fatídico.

Ademais, não pairam dúvidas que a responsabilidade civil do Município, no caso concreto, decorreu da falha no dever de guarda e preservação da integridade física e moral por parte dos diretores e professores daquela instituição de ensino municipal perante os seus alunos, que ao se omitirem no seu dever legal de vigilância, permitiram que a aluna se afogasse na piscina do parque aquático e viesse a falecer.

Sobre o tema, o renomado Rui Stoco (2007, p.1107) traz à baila importante lição:

Ao receber o estudante menor, confiado ao estabeleci-mento de ensino da rede oficial ou da rede particular para as atividades curriculares, de recreação, aprendizado e formação escolar, a entidade de ensino fica investida no dever de guarda e preservação da integridade física do

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aluno, com a obrigação de empregar a mais diligente vigi-lância, para previnir e evitar qualquer ofensa ou dano aos seus pupilos, que possam resultar do convívio escolar.[...]No que pertine à escola pública, a responsabilidade se filia ao princípio consagrado no art. 37, § 6º, configurando-se pela simples falha na garantia da incolumidade, independentemen-te da verificação de culpa específica de qualquer servidor.Esse dever de guarda persiste enquanto o aluno estiver no interior da escola ou até mesmo fora dela, quando no exer-cício de atividade curricular, em congressos, conclaves, eventos culturais, sob a guarda de prepostos” (grifo nosso)

Recentemente, também foi aplicada a teoria da responsabilida-de estatal objetiva pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar, em 14 de fevereiro de 2012, o Agravo Regimental no Recurso Extraordiná-rio com Agravo nº 663647 PR13, ocasião na qual a Ministra Carmem Lúcia negou provimento ao referido recurso sob o argumento de que a Corte assentou que a teoria do risco administrativo abrange não só as condutas comissivas do Estado, mas também as omissivas.

No caso em análise, uma professora de escola pública veio a sofrer violência física, provocada por disparo de arma de fogo desferido por aluno, dentro do estabelecimento de ensino.

O Tribunal de Justiça do Paraná entendeu que responsabiliza-ção do Estado, in casu, deveria ser analisada à luz da teoria objetiva, pois se pressupõe que o Estado deva zelar pela integridade física de seus servidores, oferecendo-lhe condições dignas de trabalho e se-

13 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. PROFESSORA. TIRO DE ARMA DE FOGO DESFERIDO POR ALUNO. OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA EM LOCAL DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ABRANGÊNCIA DE ATOS OMISSIVOS. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.(STF - ARE: 663647 PR , Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 14/02/2012, Primeira Turma, Data de Publica-ção: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-046 DIVULG 05-03-2012 PUBLIC 06-03-2012)  <Disponível em: http://www.stf.jus.br> Acesso em: 20/01/2015.

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gurança. E ainda defendeu ser evidente que a Administração Públi-ca “responde pelo risco exposto por todos aqueles que estavam na escola e pela falha na garantia da incolumidade física, concretizado com o disparo do revólver calibre 38 contra a professora”.

O Agravante alegou que nos casos de omissão a responsabili-dade deixa de ser objetiva e passa a ser subjetiva, na modalidade falta de serviço tendo em vista “que o Estado não pode ser consi-derado segurador universal, respondendo por qualquer prejuízo que venha a ocorrer a qualquer integrante do corpo social”.

A Ministra Relatora rechaçou a tese do Município sob o argu-mento de que a decisão agrava está em plena consonância com o entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal segundo o qual a responsabilidade objetiva prevista no art. 37, § 6º, da Cons-tituição da República abrange os atos omissivos do Poder Público.

6.4 DANOS DECORRENTES DO DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL

Com relação aos danos decorrentes do descumprimento de ordem judicial pela Administração Pública, interessante decisão foi proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento Recurso Especial nº 686.20814, em 16 de junho de 2005, sob a relatoria do Ministro Luiz Fux.

14 DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. AUSÊN-CIA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. REJEIÇÃO DE RIM TRANSPLANTADO. NEXO CAUSAL. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 07/STJ. 1. Consignado pelo acórdão recorrido que o Estado do Rio de Janeiro fora compelido, por decisão judicial, a fornecer ao recorrido a medicação necessária para evitar a rejeição do rim transplantado, restou inequívoca a sua legitimidade ad causam pas-siva para a ação indenizatória, porquanto, sponte sua estagnou o fornecimento a que restara obri-gado judicialmente, ocasionando o ilicito in foco. 2. Destarte, instado a cumprir a decisão judicial, a sua omissão configurou inequívoca responsabilidade em face da rejeição do órgão transplantado, ante a ausência do medicamento (...)(STJ - REsp: 686208 RJ 2004/0112790-9, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 16/06/2005, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 01.07.2005 p. 414LEXSTJ vol. 192 p. 177) <Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/82090/recur-so-especial-resp-686208-rj-2004-0112790-9> Acesso em: 20/01/2015.

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No caso em análise, o recorrente portador de insuficiência renal crônica, foi submetido à cirurgia de transplante de rim e embora tivesse obtido liminar em mandado de segurança para que o Estado fornecesse remédio para evitar a rejeição, perdeu o órgão transplantado, em virtude de omissão do estado que des-cumpriu a decisão judicial, tendo que retornar à hemodiálise regular.

O Estado do Rio de Janeiro alegou que não era parte legítima para figurar no polo passivo da ação vez que o fornecimento dos medicamentos era de responsabilidade do Hospital Estadual Pedro Ernesto, pessoa jurídica de direito público autônoma bem como a ausência de vínculo direto entre o ente estatal e dano sofrido.

O Desembargador Relator confirmou o entendimento con-substanciado na sentença no sentido de que o Estado do Rio de Janeiro havia sido compelido por decisão judicial a fornecer medicação necessária e, não o fazendo, caracterizada estava sua legitimidade para figurar no polo passivo da ação indenizatória.

E ainda sustentou que a responsabilidade, in casu, surge não só pelo descumprimento do dever legal de prestar assistência farmacêutica a uma pessoa necessitada na forma do que dispõe a Lei 8080/90, mas, sobretudo pela não observância da decisão judicial transitada em julgado, que o havia compelido a prover a medicação necessária após o transplante renal.

Por fim, analisemos decisão do Tribunal de Justiça do Esta-do do Paraná na Apelação nº APCVREEX 3790010 PR 0379001-0. Nessa ocasião o Estado do Paraná foi condenado ao pagamen-to de indenização a título de danos morais e materiais em razão da omissão do Estado para cumprimento da ordem judicial em reintegração de posse.

O Estado resumidamente alegou que tendo em vista o ele-vado número de invasores e do seu comportamento agressivo, era necessário realizar um estudo do local, a fim de que a ordem judicial fosse cumprida com eficiência e segurança.

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O Relator ressalvou que depois de constatada a resistência ao cumprimento da ordem judicial, foi requisitada força poli-cial, indispensável para cumprir a liminar deferida pelo Juízo da Comarca, mediante ofício dirigido ao Senhor Comandante da Corporação Militar baseada naquela região. Ocorre que tal requisição nunca foi cumprida, ampliando de forma induvidosa o número de invasores bem como os prejuízos matérias supor-tados pelos apelados, tais como furto de animais, matanças e outros atos de vandalismo.

Assim, ressaltou ser inegável que o não atendimento à requi-sição judicial, de imediato, como lhe impunha a ordem judicial, foi a causa determinante dos prejuízos ocasionados e afirmou que não fazia sentido em pretender atribuir os danos aos invaso-res, já que o proprietário da fazenda imediatamente procurou a proteção estatal. No entanto, a assistência não foi imediata, nem mesmo ocorreu, resultando em danos morais e materiais, com a posterior venda das terras ao INCRA, pois não tinham mais como suportar a situação.

Nesse mesmo sentido já decidiu a Corte Suprema. Vejamos.

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMEN-TO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR DA-NOS CAUSADOS POR INTEGRANTES DO MST. CARAC-TERIZADA OMISSÃO CULPOSA DAS AUTORIDADES POLICIAIS, QUE NÃO CUMPRIRAM MANDADO JU-DICIAL DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE, TAMPOUCO JUSTIFICARAM SUA INÉRCIA. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO 279 DA SÚ-MULA/STF. A qualificação do tipo de responsabilidade imputável ao Estado, se objetiva ou subjetiva, constitui circunstância de menor relevo quando as instâncias ordi-nárias demonstram, com base no acervo probatório, que a inoperância estatal injustificada foi condição decisiva

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para a produção do resultado danoso. Precedentes: RE 237561, rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 05.04.2002; RE 283989, rel. min. Ilmar Galvão, Pri-meira Turma, DJ 13.09.2002. Agravo regimental a que se nega provimento.(STF - AI: 600652 PR , Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 04/10/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-204 DIVULG 21-10-2011 PUBLIC 24-10-2011 EMENT VOL-02613-02 PP-00339)Responsabilidade civil do Estado por omissão culposa no pre-venir danos causados por terceiros à propriedade privada: ine-xistência de violação do art. 37, § 6º, da Constituição. 1. Para afirmar, no caso, a responsabilidade do Estado não se fundou o acórdão recorrido na infração de um suposto dever genérico e universal de proteção da propriedade privada contra qualquer lesão decorrente da ação de terceiros: aí, sim, é que se teria afir-mação de responsabilidade objetiva do Estado, que a doutrina corrente efetivamente entende não compreendida na hipótese normativa do art. 37, § 6º, da Constituição da República. 2. Par-tiu, ao contrário, o acórdão recorrido da identificação de uma situação concreta e peculiar, na qual - tendo criado risco real e iminente de invasão da determinada propriedade privada - ao Estado se fizeram imputáveis as conseqüências da ocorrência do fato previsível, que não preveniu por omissão ou deficiência do aparelhamento administrativo. 3. Acertado, assim, como ficou, definitivamente, nas instâncias de mérito, a existência da omis-são ou deficiência culposa do serviço policial do Estado nas cir-cunstâncias do caso - agravadas pela criação do risco, também imputável à administração -, e também que a sua culpa foi con-dição sine qua da ação de terceiros - causa imediata dos danos -, a opção por uma das correntes da disceptação doutrinária acerca da regência da hipótese será irrelevante para a decisão da causa. (...).(STF - RE: 237561 RS , Relator: SEPÚLVEDA PERTEN-

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ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS y 127

CE, Data de Julgamento: 18/12/2001, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 05-04-2002 PP-00055 EMENT VOL-02063-03 PP-00498 RTJ VOL-00180-03 PP-01147) 15

A par das considerações apresentadas, é de se tomar como certa a responsabilidade civil do Estado diante das invasões de terra promovidas pelo Movimento Sem Terra desde que confi-gurada hipótese de omissão específica estatal, seja a negativa de enviar forças policias para impedir a invasão, seja quanto esta já ocorreu, deixando de cumprir a liminar de reintegração de posse.

Por fim, frise-se que os danos perpetrados no momento da invasão, quando ainda não há liminar de reintegração de posse, não podem ser imputados ao Poder Público, vez que, neste caso, há uma omissão genérica do Estado que descumpriu com o seu dever geral de segurança, assim como acontece com o furto em via pública. Contudo, o deferimento da liminar faz surgir um dever específico de zelar pela posse do imóvel e o seu descum-primento caracteriza hipótese de omissão específica pela qual o Estado deverá responder objetivamente.

15  <Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=RE+237561> Acesso em: 20/01/2015

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7 CONCLUSÃO

A RESPONSABILIDADE civil do Estado passou por diversas mo-dificações ao decorrer da evolução histórica do Estado Moderno, passando-se da completa irresponsabilidade estatal, consagrada na máxima “the king can do no wrong” à responsabilidade obje-tiva consubstanciada na teoria do risco administrativo.

Conforme demonstrado, não houve a fase da irresponsabi-lidade em nosso ordenamento constitucional vez que tanto a Constituição Imperial de 1824, como a 1ª Constituição Republi-cana de 1891 já previam a responsabilização do Estado fundada na culpa. Em consonância com o progresso do tema, a responsa-bilidade objetiva foi adotada pela primeira vez no ano de 1946 e assim também dispuseram as Constituições posteriores.

Ademais, a Constituição de 1988 revolucionou ao dispor de forma expressa que as pessoas jurídicas de direito privado pres-tadoras de serviço público respondem de forma objetiva pelos danos que causarem a terceiros. Também inovou ao substituir a

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CONCLUSÃO y 129

expressão “funcionário”, que constava nas Constituições ante-riores, pelo termo “agente” o qual possui o sentido o mais amplo possível englobando, inclusive, o “funcionário de fato”, ou seja, aquele que não é agente público nem está no exercício da função administrativa, mas aparenta exercê-la, em nome do princípio da aparência e da boa-fé do particular.

Atualmente, é incontroverso que a responsabilidade civil extracontratual do Estado pelos seus atos comissivos é objetiva, isto é, para que haja o dever de indenizar não há necessidade de comprovação da culpa do agente público, bastando para tanto a prova do nexo causal entre o ato e o evento danoso, nos termos do art. 37, 6º da Constituição Federal.

Pois bem, a polêmica surge quando estamos diante de uma omissão estatal, melhor dizendo, quando o agente público não foi o causador imediato do prejuízo. Certo é que, diferentemente das hipóteses de atos comissivos, o direito positivo não apresen-ta solução normativa direta para tais hipóteses – atos omissivos -, cabendo à doutrina e à jurisprudência essa difícil tarefa.

Sendo assim e diante do exposto, sustentamos ser a corrente intermediária capitaneada pelo Professor Sérgio Cavalieri a mais adequada à resolução dos prejuízos ocasionados por omissão do Estado. As responsabilidades objetivas e subjetivas coexistirão nas hipóteses de condutas omissivas estatais, sendo que a teoria da cul-pa só tem lugar nos casos de omissão genérica da Administração, não devendo ser aplicada indistintamente em todas as ocorrências que envolvam atos omissivos dos agentes públicos.

Ora, será necessária a realização de uma análise do caso concreto a fim de verificar se, naquela situação, o Estado tinha o dever especifico de impedir o dano, ou seja, se a inércia ad-ministrativa foi a causa direta e imediata do não impedimento do evento. Em caso positivo, estaremos diante de uma omissão específica e a responsabilidade não dependerá da comprovação de culpa.

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Consoante apontado ao longo do presente trabalho, o enten-dimento a respeito da incidência da teoria acima apontada aos casos de responsabilidade civil do Estado por omissão ainda não é pacífico, existindo importantes nomes na doutrina bem como relevantes decisões judiciais ora defendendo a aplicação da cor-rente subjetivista ora da teoria objetiva.

Por fim, ressalta-se que há uma linha tradicional na juris-prudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de reconhe-cer a responsabilidade civil sem culpa nas omissões do Estado e, em razão do próprio dinamismo judicial, tal quadro jurispru-dencial pode ser revertido. Certo é que, até o presente momento, não há na Suprema Corte julgados que autorizem a dizer que a responsabilidade é subjetiva nas hipóteses de danos ocasiona-dos por omissão estatal.

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O presente volume abordará a Respon-sabilidade Civil do Estado por omissão no âmbito administrativo, assunto re-corrente na jurisprudência dos Tribu-nais brasileiros. Para isso, a princípio, estudar-se-á a responsabilidade civil sob o ponto de vista geral, englobando sua evolução histórica, peculiaridades e aspectos fundamentais para a sua efe-tiva compreensão, destacando-se as disposições do art. 37, 6º da Constitui-ção Federal de 1988. Da mesma forma, serão estudadas as causas excludentes e atenuantes do dever de indenizar, ten-do em vista que o Estado pode ter sua responsabilidade afastada ou mitigada, a depender da situação. Finalmente, concluindo este estudo, será feita uma abordagem específica acerca da Res-ponsabilidade Civil da Administração Pública nas hipóteses de conduta omis-siva estatal, tema central do presente trabalho, demonstrando toda polêmica doutrinária e jurisprudencial em torno da sua natureza jurídica. Para tornar esse debate mais tangível e palpitante serão analisados alguns casos concretos envolvendo os principais assuntos rela-tivos à omissão presentes em nosso co-tidiano e nos Tribunais pátrios.