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RESUMO O presente estudo propõe-se a abordar a problemática das disfunções da articulação temporomandibular, estabelecendo uma relação direta com as alterações posturais existentes. Assim, torna-se pertinente o esclarecimento de qual o contri- buto da fisioterapia, e mais especificamente do método das cadeias musculares de Léopold Busquet, nas disfunções da ar- ticulação temporomandibular. PALAVRAS-CHAVE: Articulação temporomandibular, Altera- ções posturais, Fisioterapia, Método das cadeias musculares. ABSTRACT The present study is about the problematic of temporo- mandibular joint disfunction, establishing a direct relationship with existing postural modifications. We show here the contribution of physiotherapy and in deep the temporomandibular joint disfunction from Leopold Bus- quet “chaines musculaires” technique. KEY-WORDS: Temporomandibular joint, Postural modifica- tions, Physiotherapy, “Chaines musculaires” technique. ESPECIALIDADE CONVIDADA ABORDAGEM DA FISIOTERAPIA NA DISFUNÇÃO DA ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR ATRAVÉS DO MÉTODO DAS CADEIAS MUSCULARES PHYSIOTHERAPY OF TEMPOROMANDIBULAR JOINT DISFUNTION THROUGH THE “CHAINES MUSCULAIRES TECNIQUE” Sónia Abrantes . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante Santo Ana Oliveira . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante Santo Luísa Rodrigues . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante Santo 27 Maio de 2011

ABORDAGEMDAFISIOTERAPIA …cadernosorl.com/artigos/2/4.pdfRESUMO Opresenteestudopropõe-seaabordaraproblemáticadas disfunçõesdaarticulaçãotemporomandibular,estabelecendo umarelaçãodiretacomasalteraçõesposturaisexistentes

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RESUMO

O presente estudo propõe-se a abordar a problemática dasdisfunções da articulação temporomandibular, estabelecendouma relação direta com as alterações posturais existentes.

Assim, torna-se pertinente o esclarecimento de qual o contri-buto da fisioterapia, e mais especificamente do método dascadeias musculares de Léopold Busquet, nas disfunções da ar-ticulação temporomandibular.

PALAVRAS-CHAVE: Articulação temporomandibular, Altera-ções posturais, Fisioterapia, Método das cadeias musculares.

ABSTRACT

The present study is about the problematic of temporo-mandibular joint disfunction, establishing a direct relationshipwith existing postural modifications.

We show here the contribution of physiotherapy and in deepthe temporomandibular joint disfunction from Leopold Bus-quet “chaines musculaires” technique.

KEY-WORDS: Temporomandibular joint, Postural modifica-tions, Physiotherapy, “Chaines musculaires” technique.

ESPECIALIDADE CONVIDADA

ABORDAGEM DA FISIOTERAPIANA DISFUNÇÃO DA ARTICULAÇÃOTEMPOROMANDIBULAR ATRAVÉS DOMÉTODO DAS CADEIAS MUSCULARES

PHYSIOTHERAPY OF TEMPOROMANDIBULAR JOINTDISFUNTION THROUGH THE “CHAINES MUSCULAIRESTECNIQUE”Sónia Abrantes . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante SantoAna Oliveira . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante SantoLuísa Rodrigues . Fisioterapeuta do Hospital Cuf Infante Santo

27 Maio de 2011

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Soalho da cavidade oral. © Frank H. Netter, Atlas de Anatomia Hu-mana. FI

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Vista lateral da ATM. © Frank H. Netter, Atlas de AnatomiaHumana. FI

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2 Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO

: :INTRODUÇÃOA crescente incidência de sintomatologia relacionada com al-terações da articulação temporomandibular (ATM) e a neces-sidade de uma eficaz resolução destas questões, temmotivado um número cada vez mais representativo de auto-res a debruçarem-se sobre esta problemática.

Vários são os estudos que referenciam que as alterações pos-turais levam a alterações oclusais e disfunções na ATM, esta-belecendo-se assim uma íntima relação entre disfunçõescraniomandibulares e patologias posturais.

Podemos, por isso, indicar a avaliação e o tratamento globalcomo uma nova alternativa, não se limitando à actuação anível dos sintomas mas incidindo a sua acção na resolução doproblema como um todo, melhorando a função e a harmoniacorporal no seu global.

Assim sendo, neste trabalho propusemo-nos a realizar umarevisão de literatura que demonstrasse a relação entre altera-ções posturais e disfunções na ATM, de forma a poder tam-bém expor todo um trabalho que é executado pelosfisioterapeutas do Hospital Cuf Infante Santo ao pôr em prá-tica o método das Cadeias Musculares criado pelo fisiotera-peuta Léopold Busquet.

: :ANATOMOFISIOLOGIAA ATM está inserida no sistema estomatognático1. Os dife-rentes tecidos, relativamente à sua origem embrionária e es-trutura funcional, interagem na realização de várias funções,que têm influência sobre a dinamização do complexo sistemacraniano2.

Dos componentes que a constituem salientam-se os esqueléti-cos (mandíbula, osso hioide, ossos do crânio - temporal, maxi-lar e arcadas dentárias), os músculos (Fig. 1) e todo o suprimentonervoso, vascular e ganglionar.

A ATM, é constituída por uma cavidade glenoideia, côndilotemporal, menisco e côndilo mandibular (Fig. 2) em associaçãocom as estruturas músculo-esqueléticas, permite a execução dafunção de mastigação, deglutição, respiração e fonação.

Na dinâmica articular, observam-se movimentos de abertura efecho, didução ou lateralidade, propulsão e retropulsão, sendoefectuados pelos seguintes músculos (Tabela 1).

MOVIMENTOS MÚSCULOS EM ACÇÃO

Abertura

DigástricosMilohióideoGeniohióideoPlatisma

EncerramentoMasséterPterigóideo medial e porção anterior

PropulsãoPterigóideos lateraisMasséter fibras superficiaisTemporal fibras anteriores

RetropulsãoMasséter fibras profundasTemporal fibras posteriores

DiduçãoPterigóideo medial do mesmo ladolateralizado juntamente com fibras inferioresdo Pterigóideo do lado oposto

MOVIMENTOS DA MANDÍBULA

TAB

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Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO 3

: :ALTERAÇÕES POSTURAISASSOCIADAS À DISFUNÇÃODA ATMTal como em outras articulações, os problemas da ATM podemser traumáticos ou crónicos. Por estar amplamente descrita aacção da fisioterapia na intervenção traumática aguda e su-baguda, não iremos abordar esta área de intervenção.

Pela avaliação do paciente, podemos constatar que os pro-blemas crónicos têm frequentemente origem em microtrau-matismos mantidos ao longo do tempo. Neste caso, a ATM évítima, pois as causas da disfunção localizam-se no exteriorda articulação, ou da zona dolorosa, sofrendo as consequên-cias de uma lesão noutra parte do corpo, tendo nesta situa-ção indicação para um tratamento global3.

Pela localização anatómica da ATM, percebemos que esta estádirectamente relacionada com a região craniana, cervical e es-capular, através de um sistema neuromuscular comum1; alte-rações na cinética e/ou postura destas regiões, podemprovocar disfunções na ATM e vice-versa.

AA AAmmeerriiccaann AAccaaddeemmyy ooff OOrrooffaacciiaall PPaaiinn ((cciittaaddoo44)) pprrooppõõeeccoommoo pprroocceeddiimmeennttooss ddee eexxaammee::

• Observação do crânio e da coluna cervical: assimetrias, ta-manho, forma, cor, consistência, postura e movimentos in-voluntários;

• Avaliação da ATM e da coluna cervical: palpação da ATM,amplitude e qualidade do movimento/end feel e a sua as-sociação com a dor; pesquisa de crepitações/ressaltos arti-culares;

• Avaliação da musculatura cervical e dos mastigadores: flaci-dez, edemas e alongamento;

• Avaliação neurovascular: compressão vascular temporal, ca-rótidas, sinais e sintomas referentes aos nervos cranianossensitivo e/ou motor;

• Avaliação intra-oral: disfunções dos tecidos da cavidade oral,análise da oclusão (estática e dinâmica).

A disfunção da ATM, para além de dor na própria articulação,pode causar dor irradiada para a cabeça e ombro. Tambémsão frequentes queixas álgicas no ouvido, zumbidos ou atéperda de audição, nevralgias do trigémeo, trisma, dificuldadeem deglutir devido a espasmos musculares, tonturas, náuseasou vómitos. É de referenciar que o bruxismo e o briquismotêm consequências no desgaste dos dentes e no aumento datensão sobre a ATM, em particular sobre o menisco.

É devido a estas tensões permanentes e/ou ao mau posicio-namento dos dentes nas arcadas dentárias, modificando o ali-nhamento da articulação, que poderá ocorrer má oclusão,limitação na abertura da mandíbula ou desvio para um doslados, ressaltos e ruídos articulares.

As goteiras ou os splints de oclusão mostram-se como umagrande ajuda nestas situações4, ao reduzir a carga na ATM eproporcionar um relaxamento músculo-tendinoso.

: :MÉTODO DE CADEIAS MUSCULARESNo modelo biopsicossocial, a disfunção da ATM é uma dascondições que não foge à premência de uma avaliação e in-tervenção multidisciplinar.

Numa visão global desta problemática, é simples perceber por-que é que estas placas oclusais não resolvem o problema porsi só. A prioridade não é unicamente realizar a correção di-recta do que existe, mas sim desparasitar os problemas adi-cionais de tensão.

O padrão das contraturas musculares seguem uma lógica, le-vando a um envolvimento das estruturas mais proximais parazonas mais distais do fulcro do problema. A instalação destepadrão surge de um esforço para reequilibrar as influências pa-rasitárias de outras regiões do corpo sobre a ATM ou vice-versa.

O nosso corpo é um todo, mais que a soma de cada um dossistemas funcionais. Cada unidade funcional desempenha umpapel onde a anatomia se coaduna dentro de uma lógica fun-cional.

Nesta lógica funcional, cada indivíduo desenvolve uma pos-tura. A postura ideal é aquela onde existe um equilíbrio decada segmento corporal com o subjacente, envolvendo umaquantidade mínima de energia e sobrecarga, com a máximaeficiência estrutural e funcional.

Dentro desta filosofia de intervenção insere-se o método dasCadeias Musculares criado pelo fisioterapeuta Léopold Bus-quet. Esta metodologia de exame do paciente por parte do fi-sioterapeuta, evidencia os pontos de tensão/congestão dasdiferentes partes do corpo, que estão integradas segundo cir-cuitos anatómicos através dos quais se propagam as forçasfuncionais do corpo – cadeias musculares.

EEssttee mmééttooddoo ddee ttrraabbaallhhoo mmaannuuaall tteemm ppoorr oobbjjeettiivvoo::

• Libertar as zonas de tensão;

• Devolver a mobilidade tecidular adequada das diferentes ca-deias (circuitos) musculares;

• Restaurar uma melhor função;

• Restabelecer uma melhor estática.

Com este trabalho manual, pretende-se devolver a dinâmicaintrínseca à fisiologia e anatomia das estruturas que estão nabase dos subjetivos dolorosos, disfunções e deformações, po-tencializando os sistemas de auto-regulação e homeostasia donosso corpo.

AAss ccaaddeeiiaass mmuussccuullaarreess eessttããoo oorrggaanniizzaaddaass eemm sseettee ddiiffeerreenn--tteess cciirrccuuiittooss::

• Cadeia estática/músculo-esquelética (Fig. 3);

• Cadeia de flexão (Fig. 4);

• Cadeia de extensão (Fig. 5);

• Cadeia cruzada anterior (abertura) (Fig. 6);

• Cadeia cruzada posterior (fecho) (Fig. 7);

• Cadeia visceral (Fig. 8);

• Cadeia neuromeníngea (Fig. 9).

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4 Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO

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Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO 5

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União das cadeias longitudinais anteriores e posteriores. © BusquetL, “Las Cadenas Musculares” Tomo V.

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um padrão e acabará por envolver estruturas onde primaria-mente não se observava qualquer desequilíbrio ou disfunção.

Não existindo um traumatismo directo sobre as estruturas no-bres das unidades funcionais, estas serão as últimas a seremenvolvidas em padrões de contraturas e/ou tensão. Um mús-culo só se contrai de forma permanente se existir uma causa.É necessário realizar um exame retrospetivo do mecanismo dedesequilíbrio, o qual colocará em evidência a lógica internade tensões adoptadas pelo corpo do paciente.

Por exemplo, um paciente que refira problemas de má oclu-são, com o tempo e de forma progressiva terá um desalinha-mento mais acentuado das arcadas dentárias, que incidirásobre o posicionamento dos dentes, com deterioração dosmeniscos da ATM, da própria ATM e em consequência da ten-são sobre os temporais, podendo surgir, em situações extre-mas, artrose temporomandibular6.

Se eliminarmos as tensões que provocam a instalação do pro-blema de má oclusão, a cinética e anatomia da cavidade bucalmelhoram progressivamente. Em situações que seja benéfico acolocação de um aparelho de ortodoncia, todas as resistênciastecidulares da esfera bucal terão sido debeladas, tornando-semais rápida e eficiente a intervenção da ortodoncia.

Dentro de uma abordagem do método das cadeias muscula-res, é elaborado o exame subjetivo e objetivo, através da ob-servação global (estática e dinâmica) e palpação, sendo deseguida traçado um plano de tratamento, visando um trabalhode reequilíbrio ao nível das ATM, crânio, coluna cervical, cin-tura escapular, membros superiores, tronco, cintura pélvica emembros inferiores. Dependendo da necessidade de desblo-queamento do problema ou problemas, que estão na origemdo(s) desequilíbrio(s) observado(s) segue-se uma lógica de in-tervenção. Na maioria dos casos, a intervenção desenvolve-seda profundidade para a periferia e do centro (diafragma torá-cico e eixo sacro-craniano) para as estruturas mais distais.

Numa situação de reequilíbrio muscular das tensões periarti-culares da ATM, é imprescindível trabalhar a cadeia visceral, acoluna cervical, a cintura escapular e as estruturas do soalhobucal, assim como todos os cruzamentos sobre o osso hioidee o crânio7.

A cadeia visceral é frequentemente responsável pelas disfun-ções da ATM, pois as tensões com origem na cavidade visce-ral, propagam-se até à garganta, osso hioide, soalho bucal,base do crânio, apófise estiloide e pterigoide, músculos pteri-goideus e músculos da ATM3.

A libertação das tensões da cadeia visceral, faz-se através demanobras posturais, tendo uma acção directa sobre as zonasde tensão e aderências tecidulares, e uma acção secundária nosistema artério-venoso, linfático e neurológico. A técnica rea-liza-se com uma mobilização manual do plano cutâneo, fi-xando o ponto de tensão/aderência, seguido de penetraçãotecidular, finalizando com o posicionamento em alongamentoda estrutura afetada8.

O osso hioide é a peça chave na estática e mobilidade da man-díbula e consequentes problemas da ATM. Nesta pequena es-trutura em forma de U (Fig. 11), existe uma verdadeiraencruzilhada das cadeias musculares3.

Este osso encontra-se suspenso por várias cadeias de múscu-los, que vão do mento ao esterno e do temporal à omoplata.Para que se respeite o eixo aerodigestivo, ele deve ser umponto de relativa fixação, que se torna necessária nos movi-mentos da mandíbula3.

Da observação das diferentes cadeias, verificamos que a uni-dade funcional da ATM faz parte dos vários trajetos (Fig. 10).No quadrante anterior temos as cadeias de flexão e visceral,no quadrante lateral as cadeias cruzadas (anterior e posterior)e no quadrante posterior as cadeias estática, extensão e neu-romeníngea.

Os movimentos realizados pela mandíbula dependem das di-ferentes cadeias acima referidas. Assim a abertura da boca,acompanhada por um movimento de extensão da cabeça ecoluna cervical4, faz-se sob a influência da cadeia de exten-são. O movimento de encerramento da mandíbula é acom-panhado por um movimento de flexão da coluna cervical,dependendo da cadeia de flexão. A didução, acompanhadapor um movimento de flexão lateral da coluna cervical, faz-sepela influência das cadeias cruzadas. A propulsão associa otrabalho das cadeias de flexão e cruzadas e, por último, a re-tropulsão pelas cadeias de extensão e cruzadas3.

Na área que compreende a cintura escapular até ao crânio, ascadeias musculares são compostas pelas estruturas denomi-nadas na seguinte tabela (2):

6 Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO

Cadeia EstáticaFoice do cerebelo e cérebroLigamento cervical posteriorAponevrose do trapézio superior e médioAponevrose cervical profundaMenínges medulares parietais e visceraisAponevrose pré-traquealAponevrose bucofaríngea/retrofaríngeaAponevrose pré-vertebral

Cadeia de FlexãoLongo da cabeça e da cervicalPequeno recto lateral da cabeçaTriangular de esternoPequeno peitoralSubclávioEsternohióideoTirohióideoEsternocleidohióideoGeniohióideoGenioglossoEstilohióideoMasséterPterigóideo internoTemporal

Cadeia de ExtensãoTransverso (pescoço) cervicalTransverso espinhosoSemiespinhosos cervical e crânianoEsplénios da cabeça e cervicalAngular da omoplataGrande e pequeno recto da cabeça

Cadeia Cruzada AnteriorOmohióideoDigástricoMilohióideoTemporalEsternocleidomastóideo

Cadeia Cruzada PosteriorEsplénio da cabeça e da cervicalRomboideAngular da omoplataTrapézioGrande e pequeno oblíquo da cabeçaEscalenos

MÚSCULOS DAS VÁRIAS CADEIAS MUSCULARES

TAB

2

A relação biomecânica dos movimentos associados a estas vá-rias zonas, é indicativo de uma sinergia funcional entre a ATMe o sistema crânio-cervical5 e vice-versa.

Percebemos então, caso existam alterações posturais a nívelcraniano, coluna cervical, cintura escapular ou noutras zonasdo corpo (cifoses, lordoses e escolioses), o seu efeito seguirá

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Assim se compreende, que tensões nestas estruturas, origi-nem problemas na ATM e por conseguinte, em funções comoa fonação, deglutição, respiração, colocação e funcionamentoda língua.

O trabalho envolvendo o tecido conjuntivo e reequilíbrio dashiperprogramações das cadeias musculares na zona cervical,cintura escapular e soalho bucal através de uma distensão des-tas estruturas segundo os padrões dessas cadeias, respeitandosempre os limites tecidulares, liberta estas tensões com umaacção que perdura no tempo. O organismo, após estes estí-mulos, reage no sentido do realinhamento com homeostasiaenergética e funcional.

Por último, mas não menos importante, este método passapor um trabalho sobre as estruturas cranianas. O seu iníciofaz-se num ponto mais distante, mas um ponto-chave da ca-deia neuromeníngea (Fig. 9), o sacro. A intervenção sobre ocrânio e suas estruturas, desenvolve-se através das informa-ções captadas pela mão do fisioterapeuta, que pelo seu saberproduzam um efeito ampliador das tensões existentes. Não énossa intenção trabalhar os ossos do crânio, mas sim a suaplasticidade.

O nosso objectivo, como em qualquer outra parte do corpo,não é corrigir a deformação do crânio, mas sim aliviar as ten-sões e disfunções, que induzem e fixam essas dores e defor-mações, levando a desgastes, muitas vezes irreversíveis, masque mais não são que consequências de tensões parasitárias.

O osso, pelas suas necessidades metabólicas, encontra-se en-volvido por líquido a uma temperatura mais ou menos estável,conferindo-lhe uma maior resistência. Ao observarmos a es-trutura alvéolo/trabecular do osso, verificamos que esta res-ponde às linhas de maior tensão, conferindo ao osso duaspropriedades em simultâneo: plasticidade e resistência2.

Outra característica importante da caixa craniana é as suas su-turas, linhas por onde são absorvidas pressões externas, au-mentando a resistência ao traumatismo, mantendo aintegridade do crânio e do seu conteúdo2. Os ossos do crânio,são talvez a prova mais marcante de que “a função faz o

Influência das cadeias cervicais sobre o osso hioide. © Perlemuter, L;Waligora, J. Cahiers d’ Anatomie. FI

G 11

orgão”, mas também a anatomia, pois todas as necessidadesfuncionais estão patentes na engenhosa anatomia de cadauma das peças do crânio e no seu próprio encaixe, no con-junto da caixa craniana.

Exemplo destas deformações e por outro lado, sinal da plas-ticidade óssea, são aqueles pacientes em que se observa umaescoliose craniana (Fig. 12). Nestas situações podemos verifi-car assimetrias sobre a mandíbula, seios perinasais, fossa or-bicular, ATM, canal auditivo, ouvido interno e fossapterigopalatina.

Tal como constatamos uma deformidade progressiva das es-truturas ósseas (indiciando a sua plasticidade); será que nãopoderemos minimizar essa própria deformidade através daplasticidade óssea? Será que essa própria assimetria anató-mica não se fará reflectir sobre estruturas funcionais com asquais estão directamente relacionadas? Nós pensamos quesim.

Pacientes que nos referenciam, por exemplo, zumbidos, esta-lidos na ATM, cefaleias occipitais ou da esfera orbital, visãoturva, constatam uma diminuição progressiva destas queixascom a realização do método das cadeias musculares. Esta me-todologia é executada de uma forma suave, respeitando ofuncionamento de todas as estruturas.

Uma outra estrutura frequentemente condicionada pela dis-função da ATM, é o gânglio esfenopalatino ou de Meckel (Fig.13).

Escoliose craniana. © Busquet L, “Las Cadenas Musculares” Tomo V.

FIG

12

O exterior da fossa pterigopalatina está revestido pelo ramoascendente da mandíbula, anteriormente pelo maxilar e atráspela apófise pterigoide. Assim sendo, tensões mantidas naATM, comprometem a troficidade da região, podendo ocorrerdistúrbios nesta estrutura e por conseguinte, nas estruturasque este controla9 (Fig. 14).

A plasticidade dos ossos do crânio, assim como as suas sutu-ras permite a absorção das forças corretivas exercidas pelastécnicas manuais executadas pelo fisioterapeuta, transmi-tindo-se para as trabéculas ósseas, membranas cranianas etodos os tecidos adjacentes a estas estruturas.

Com as suas técnicas manuais, o fisioterapeuta relaxa as ten-sões extracranianas, colocando num segundo tempo a estru-tura em postura de estiramento, conseguindo uma acçãosobre a plasticidade do osso, exercendo um trabalho a nível in-

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tracraniano. O restante trabalho de libertação é o própriocorpo que o faz, pela tendência para a homeostasia. Assim seconsegue uma libertação e equilíbrio tecidular recuperandouma melhor transmissão de forças e restabelecimento dascondições fisiológicas das estruturas cranianas através destetrabalho em profundidade.

Fossa pterigopalatina e o gânglio esfenopalatino ou Meckel. © Busquet L, ”Las Cadenas Musculares” Tomo V. FI

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8 Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO

Aferências do gânglio de Meckel. © Busquet L, “Las Cadenas Musculares” Tomo V. FI

G 14

: :CONCLUSÃOFoi nosso objetivo demonstrar como as estruturas e as fun-ções fisiológicas do nosso corpo, estão inter-relacionadas e in-terdependentes no equilíbrio, como também no desequilíbriofuncional e anatómico.

Ao longo dos anos de trabalho desenvolvido com o método deCadeias Musculares de Léopold Busquet, o núcleo de Fisiotera-peutas do Hospital CUF Infante Santo, tem encontrado moti-vação nos resultados obtidos com a sua prática, levando-nos auma busca constante para o aperfeiçoamento do seu sabernesta problemática.

Ao fazermos uma descrição sucinta e quase simplista das téc-nicas e metodologias descritas neste artigo, pretendemos des-cortinar outras hipóteses para a avaliação e o tratamentodesta tão vasta problemática das disfunções da ATM. Assimcomo relacionar outros problemas, nomeadamente os podo-lógicos, em que se verifica alteração do apoio do pé(plano/cavo) e/ou um mau alinhamento dos membros inferio-res (joelhos valgo/varo), modificando a base de sustentação,podendo estas alterações originar readaptações ascendentescom mudança do centro de gravidade, provocando reajustesna posição da cabeça e do seu ponto de equilíbrio, colocandoem desvantagem a biomecânica da ATM10.

Cabe-nos também observar, que mesmo aqueles pacientesque em termos de estática postural, se verifica uma marcadacomponente genética, terão igualmente benefícios ao se efec-tuar uma libertação tecidular dos esquemas perpetuados ge-neticamente.

Para concluir, gostaríamos de reforçar a ideia que o pacientecom disfunção da ATM deve ser avaliado por uma equipa in-terdisciplinar, em que o papel do fisioterapeuta está relacio-nado com uma atuação a nível das comprovadamenteexistentes alterações posturais.

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Cadernos Otorrinolaringologia . CLÍNICA, INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO 9

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