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Academia Brasileira de Neurocirurgia – Princípios de Neuro‐oncologia Porto Alegre, 2009

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Academia  Brasileira  de 

Neurocirurgia – 

 

 

Princípios de Neuro‐oncologia 

 

 

 

 

 

 

 

Porto Alegre, 2009 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Dr. Gustavo Rassier Isolan 

 

Neurocirurgião do Hospital de Clínicas de Porto Alegre 

Coordenador do Núcleo de Cirurgia da Base do Crânio e Neuro‐oncologia do 

Serviço  de  Neurologia  e  Neurocirurgia  do  Hospital Moinhos  de  Veto  de 

Porto Alegre 

Professor  permanente  da  pós‐graduação  em medicina:  ciências  cirúrgicas 

da Universidade Federal do Rio Grande do sul. 

 

 

 

 

Índice 

  

1. Introdução  

2. Tumores do Sistema Nervoso Central 

3. Manejo dos tumores complexos do SNC 

4. Áreas de conhecimento envolvidas especificamente  no manejo dos tumores do SNC 

5. Equipe  

6. Referências 

7. Casos ilustrativos 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1. Introdução e objetivos

Os tumores que acometem o Sistema Nervoso Central (SNC) correspondem a

um grupo altamente heterogêneo de diferentes entidades patológicas que têm

origem em diferentes estruturas dos sistemas nervosos central e periférico e que

acometem pacientes em diferentes faixas etárias.

Estima-se que a incidência de tumores cerebrais nos Estados Unidos seja de 7 a

19 casos por 100.000 habitantes, sendo que mais de 100.000 pacientes naquele

país vão à óbito portando metástases cerebrais. Acredita-se que a incidência

nos demais países, incluindo Brasil, seja semelhante.

O tratamento da maioria dos tumores que acometem o SNC é cirúrgico, sendo

este procedimento curativo para os tumores benignos e paliativo para os

malignos. Neste último grupo, quimioterapia, radioterapia e/ou radiocirurgia são

indicadas em bases individuais. Devido à complexidade clínica destes pacientes,

nos quais um mesmo sintoma neurológico pode ser indicativo tanto de

crescimento tumoral, necrose tumoral por radioterapia, edema, síndrome

paraneoplásica ou efeitos adversos à terapia adjuvante, o manejo deve sempre

ser multidisciplinar.

Outro aspecto diz respeito aos tumores em áreas eloqüentes ou próximos a

elas. Nos últimos anos, não é mais admissível a seqüela neurológica ser a regra,

principalmente devido a criação de centros de excelência em nosso país, após

cirurgia de tumores do SNC, mesmo aqueles tumores situados em áreas

eloqüentes, tais como área da fala e área motora. O armamentarium

neurocirúrgico moderno conta com estimulação cortical direta para mapeamento

da área motora primária, estimulação subcortical, bem como cirurgia acordada

com estimulação cortical para tumores localizados especificamente na área da

fala. Eletrocorticografia é utilizada em casos selecionados para tumores ou

lesões vasculares tais como cavernomas, que causem epilepsia de difícil

controle

.

2. Tumores do Sistema Nervoso Central

Os achados clínicos clássicos de pacientes com tumores no SNC são

cefaléia, convulsões, déficits neurológicos focais e alterações cognitivas e de

personalidade inespecíficas. No âmbito da medicina geral, deve-se ressaltar que

estes sinais e sintomas podem estar presentes em várias doenças neurológicas,

metabólicas ou psiquiátricas, tendo os achados clínicos em si baixa

especificidade para se estabelecer o diagnóstico de uma neoplasia cerebral e

que, embora os sinais focais possam em alguns casos definir a localização

topográfica da lesão, não têm acurácia para definir o tipo específico de tumor.

Os sinais e sintomas relacionados a neoplasias do SNC são devidos à

invasão ou compressão do tecido cerebral pelo tumor. Tumores de crescimento

lento (meningeomas, gliomas de baixo grau) geralmente apresentam grande

volume quando diagnosticados devido à acomodação do tecido cerebral dentro

da caixa craniana em um determinado período de tempo. Tumores de

crescimento rápido e que desencadeiem edema cerebral, por outro lado, podem

desenvolver achados clínicos mesmo com pequeno volume tumoral.

Evidentemente, independente do padrão de crescimento tumoral,

tumores que comprimam ou invadam “áreas eloqüentes” do SNC podem

desencadear déficits neurológicos focais com pequeno volume tumoral, algumas

vezes como único sintoma.

A cefaléia relacionada à neoplasia cerebral é inespecífica, tendo um

padrão de cefaléia tensional em 77% e de enxaqueca em 8%. Suspeita-se de

neoplasia cerebral em paciente com cefaléia nas seguintes situações: piora da

cefaléia ao tossir, despertar noturno pela cefaléia, novo padrão de cefaléia em

paciente com cefaléia crônica prévia, náuseas, vômitos e déficits neurológicos

focais. Quadro clínico de cefaléia, náusea, vômitos e diminuição do nível de

consciência deve levantar a suspeita de hipertensão Intracraniana (HIC), que é

uma situação de urgência. Além da HIC, os vômitos menos comumente são

causados por compressão ou invasão tumoral do “centro do vômito” no tronco

encefálico. Alterações de comportamento, memória ou diminuição do nível de

consciência estão presentes em 10-20% dos pacientes, devendo-se a

comprometimento do córtex cerebral (principalmente o frontal) ou HIC. As

convulsões, parciais ou generalizadas, estão presentes em 1/3 dos pacientes

com tumores cerebrais e são geralmente devidas a comprometimento do córtex

cerebral.

Após estas considerações listamos abaixo os principais tumores

primários, isto é, aqueles que têm origem no próprio SNC.

Principais tumores cerebrais primários

Tipo Celular de Origem Tumor

Glial

Astrocitoma Astrocitoma Pilocítico

Astrocitoma Anaplásico

Glioblastoma Multiforme

Oligodendroglioma

Tumor ependimal Ependimoma Celular

Ependimoma Anaplásico

Ependimoma Mixopapilar

Tumor do plexo coróide Papiloma do Plexo Coróide

Carcinoma do Plexo Coróide

Não glial

Origem neural progenitor Neuroblastoma

Tumor Primitivo do Neuroectoderma

Pineocitoma, pineoblastoma

Gaglioneuroma

Tumor mesenquimal ou meníngeo Meningioma

Hemangioblastoma

Hemangiopericitoma

Adenoma pituitário Microadenoma

Macroadenoma

Outros tipos de tecido Craniofanringioma

Hamartoma, teratoma.

Tumor de células germinativas

Cisto epidermóide ou dermatóide

Linfoma do sistema nervoso central

Hemangioblastoma,, pericitoma

Mal formação vascular

Mal formação cavernosa

Quanto à localização, os principais tumores primários obedecem as seguintes características topográficas

Localização Tumor

Cerebral (supra-tentorial) Astrocitoma

Meningioma

Oligodendroglioma

Lesão metastática

Linfoma

Cerebelo e Tronco (infra-tentorial) Schwanoma

Meningioma

Tumor Primitivo do Neuroectoderma (PNET)

Tumor de células germinativas (germinoma, teratoma).

Astrocitoma

Meningioma

Cisto Pineal

Ventrículos laterais Astrocitoma

Ependioma

Neurocitoma central

Terceiro Ventrículo Astrocitoma

Cisto colóide

Neurocitoma central

Quarto Ventrículo Glioma no trono

PNET

Ependioma

Hemangioblastoma

Ângulo cerebelo-pontino Schwanoma do acústico

Meningioma

Tumor epidermóide

Região selar Microadenoma e macroadenoma

Meningioma

Craniofanringioma

Glioma (glioma pilocítico do nervo óptico)

Aneurisma

Um outro grupo importante de tumores do SNC soa as metástases. Tumores

cerebrais metastáticos ocorrem em aproximadamente 20-30% de todos

pacientes com câncer sistêmico. Conseqüentemente, aproximadamente 50.000 -

100.000 pacientes por ano desenvolvem esses tumores nos Estados Unidos.

Em 40% das lesões metastáticas sintomáticas, o sítio primário é o pulmão e em

20% é a mama. Melanoma, câncer gastrointestinal e o câncer renal também

metastatizam para o cérebro.

Outro grupo, menos comum, são os tumores que afetam os ossos do crânio, os

quais estão especificados abaixo.

Tumor Localização Achados Clínicos Tratamento

Osteoma Calvária, seio paranasal, órbita

Assintomático, sinusite, proptose.

Imagem – lesão circunscrita com densidade óssea.

Cirurgia

Condroma Base do crânio, sino paranasal

assintomático, paralisia de nervo craniano.

Cirurgia

Hemangioma Coluna vertebral,

assintomático, cefaléia. Cirurgia

Calvária Imagem – densidade diminuída, trabeculado ou hexagonal.

Cisto Dermóide ou epidermóide

Calvarium, sinos, órbita, base do crânio

assintomático

Imagem – Lesão lítica arredondada, margens escleróticas pontiagudas.

Raramente indicada cirurgia.

Condrosarcoma Base do crânio

paralisia de nervo craniano, dor, sinusite, proptose.

Imagem – Lesão lítica com margem pontiaguda, invasão óssea.

Cirurgia com grande margem; radioterapia ineficaz.

Osteossarcoma Base do crânio, Calvarium

assintomático, paralisia de nervo craniano, dor

Imagem - Lesão lítica com margem pontiaguda, invasão óssea.

Cirurgia com grande margem; radioterapia ineficaz.

Fibrossarcoma Por todo o crânio

assintomático, cefaléia.

Imagem – Lesão lítica com margem pontiaguda, invasão óssea.

Cirurgia com grande margem; radioterapia ineficaz

3. Manejo dos Tumores do Sistema Nervoso Central

O manejo de um paciente portador de tumor cerebral deve ser sempre

multidisciplinar, estando presente na equipe representantes das especialidades

de neurocirurgia, neuro-oncologia, neuroradiologia, radioterapeuta e um

especialista em radiocirurgia estereotáxica para casos selecionados. O

tratamento varia muito dependendo da localização do tumor, tipo histológico, e

co-morbidades associadas. Opções de tratamento cirúrgico podem incluir

ressecção tumoral completa, citoredução tumoral, somente biópsia, instalação

de um shunt ventricular e raramente colocação de implantes radioativos.

Radioterapia e quimioterapia fazem parte dos protocolos de tratamento em

muitos tipos de tumores do SNC.

Tumores localizados em áreas eloqüentes e complexas (área da fala, área

motora primária, tumores próximo à cápsula interna) podem ser abordados

atualmente com mínimo risco morbidade devido ao aprofundamento do

conhecimento de anatomia microcirúrgica e a monitorização neurofisiológica

intra-operatória.

4. Áreas de conhecimento envolvidas especificamente no

manejo dos tumores do SNC

- Neurocirurgia

- Radioterapia e radiocirurgia

- Neuro-oncologia

- Neuro-radiologia

- Neuro-patologia

- Neurofisiologia intra-operatória

- Neuropsicologia

- Anatomia microcirúrgica

5. Equipe

- Neurocirurgião com enfoque multidisciplinar no manejo dos tumores do SNC

- Neurocirurgião com formação em radiocirurgia

- Neuro-oncologista

- Neuro-radiologista

- Neuropsicólogo

- Psico-oncologista

- Neurofisiologista

6. Referências

Abaixo alguns estudos desenvolvidos na área específica de neuro-oncologia

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7. Casos ilustrativos

Paciente Feminina de 31 anos portadora de volumoso glioma de insula a direita.

Exames inferiores evidenciam ressecção tumoral completa. Paciente sem déficit

neurológico pós-operatório. Diagnóstico: glioma grau II

Paciente feminina de 12 anos de idade com tumor no interior do terceiro

ventrículo. Ressecçõa tumoral total sem déficit neurológico pós-operatório

através da via interhemisférica transcalosa tran-fissura coroidéia.

Paciente de 9 anos com epilepsia de difícil controle. Vídeo EEG evidenciou foco temporal cortical e RNM tumor temporal mesial. Lobectomia temporal standard com ressecçõa tumoral completa. Paciente sem déficit pós-operatório

Paciente de 33 anos com volumoso glioma de insula. As imagens mostram tracto cortiço-espinhal na tractograifa e monitorização intra-operatória. Patologia evidencia astrocitoma grau II. Resscçõa tumoral total (>90%) sem déficit neurológico

Paciente com hemangioblastoma da região pineal ressecado pela abordagem infratentorial supracerebelar.

Eletrocorticograifa em tumor próximo a área motora.

Estimulação subcortical em outro caso de glioma de insula.

Neuronavegação para paciente portador de tumor próximo da ínsula

Estimulação cortical direta para mapeamento da área da fala em paciente acordado