54
1 EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA _ VARA DA COMARCA DE POÇOS DE CALDAS – MG O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, pelo Promotor de Justiça ao final assinado (designação através da Portaria N. 549/2011, da Procuradoria Geral de Justiça – MG 12.03.2011), em função do apurado no anexo Inquérito Civil Número 0382.11.000051-2/CRRG e N. 0518.08.000037-6/PJPC, com fulcro nos arts. 127, 129, III, e 225, da Constituição Federal, na Lei 6938/81, no art. 25, IV, da Lei nº 8.625/93 e na Lei n.º 7.347/85, vem propor a presente: AÇÃO CIVIL PÚBLICA , COM PEDIDO LIMINAR , em face do... 1º) ESTADO DE MINAS GERAIS, Pessoa Jurídica de Direito Público Interno, CNPJ nº 05.475.103/0001-21, a ser citado na pessoa do Advogado Geral do Estado, com endereço na Av. Avenida Afonso Pena, 1901, Funcionários, Belo Horizonte – e, 2º) MUNICÍPIO DE POÇOS DE CALDAS, a ser citado, na pessoa de seu Prefeito Municipal, Paulo César Silva, Avenida Francisco Sales, 343, Centro, Poços de Caldas, CEP. 37.701.703, pelas razões de fato e de direito abaixo expendidas:

Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

1

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA _ VARA DA COMARCA DE POÇOS DE

CALDAS – MG

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, pelo

Promotor de Justiça ao final assinado (designação através da Portaria N. 549/2011,

da Procuradoria Geral de Justiça – MG 12.03.2011), em função do apurado no anexo

Inquérito Civil Número 0382.11.000051-2/CRRG e N. 0518.08.000037-6/PJPC, com

fulcro nos arts. 127, 129, III, e 225, da Constituição Federal, na Lei 6938/81, no art.

25, IV, da Lei nº 8.625/93 e na Lei n.º 7.347/85, vem propor a presente:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO LIMINAR,

em face do...

1º) ESTADO DE MINAS GERAIS, Pessoa Jurídica de Direito Público Interno, CNPJ

nº 05.475.103/0001-21, a ser citado na pessoa do Advogado Geral do Estado, com

endereço na Av. Avenida Afonso Pena, 1901, Funcionários, Belo Horizonte – e,

2º) MUNICÍPIO DE POÇOS DE CALDAS, a ser citado, na pessoa de seu Prefeito

Municipal, Paulo César Silva, Avenida Francisco Sales, 343, Centro, Poços de

Caldas, CEP. 37.701.703, pelas razões de fato e de direito abaixo expendidas:

Page 2: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

2

1. PRESSUPOSTOS FÁTICOS

O Poder Público Municipal de Poços de Caldas, através de atos do Executivo

local (2º Demandado), está dando intento a obras e projetos que redundam em

parcelamento do solo, em área de mananciais de abastecimento público da cidade. A

delimitada região foi indicada por vários atos de representação popular e legislativa,

que influenciaram na confecção do plano diretor do município, como zona rural de

proteção ambiental, portanto espaço territorial especialmente protegido

(art. 224, parágrafo 1º, inciso III da Constituição Federal), configurando-se os atos

do Município em claro retrocesso socioambiental.

Os procedimentos de urbanização, sistema viário, construção do Paço

Municipal e Centro de Convenções, esse último sob investimentos iniciais da empresa

CODEMIG, na ordem de 30 milhões de reais (segundo informações da imprensa),

estão sendo encetados sem obediência a procedimento administrativo de

licenciamento ambiental regular, por parte do Estado de Minas Gerais (1º

Demandado), através do órgão próprio (COPAM/SUPRAM-Sul de Minas) e sequer do

município. Esse último, por imposição de lei municipal, que pressupõe o significativo

impacto ambiental por intervenção na área, e embora tenha determinado a

confecção de estudos técnicos a cargo da Fundação Gorceix, conexionados que

deveriam ser a procedimento de licenciamento, não dispõe de legislação adequada

ou sistema específico que estruture o procedimento de licenciamento mesmo. Não

há sequer definição de órgão licenciador. Não existiu procedimento que autorizasse

empreendimentos no local, através do licenciamento ambiental clássico: licença

prévia, de instalação, operação, previsão de condicionantes, compensações e

medidas mitigatórias, exigidas por órgão habilitado, e sequer obediência aos

princípios da publicidade e informação ambiental.

Não há previsão em procedimento de licenciamento também acerca da forma

de intervenção, análise de projetos, em área onde existem sérios apontamentos de

impropriedade para incremento de urbanização, por suas características geológicas e

Page 3: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

3

hidromorfológicas, conforme prova técnica produzida, e que gerará impactos

negativos de difícil mitigação.

1.1. Definição da área a ser construído Paço Municipal por parte de

Comissão Especial.

Instaurado o anexo inquérito civil em 26 de fevereiro de 2007, visava-se

apurar possíveis danos ambientais em face de empreendimento apresentado pela

Prefeitura Municipal que pretendia construir o chamado Paço Municipal, um

complexo de vários prédios públicos, com abertura de sistema viário, em área ainda

não urbanizada do município de Poços de Caldas.

Inicialmente a Prefeitura Municipal remeteu ao Ministério Público a

documentação que se vê a fls. 03-81/IC, que se refere aos documentos técnicos

produzidos para definição de área de implantação do Paço Municipal. Foi nomeada

uma Comissão Técnica cujos integrantes e cargos exercidos no Judiciário, Executivo,

Legislativo, Ministério Público e órgãos públicos está relacionada a fls. 03/IC.

A Comissão, cuja presidência cabia ao Juiz de Direito de Poços de Caldas, Dr.

Márcio Silva Cunha1, foi formada marcadamente por profissionais representativos dos

órgãos que tinham interesse em construir suas sedes próprias no local, como o

Fórum, o Prédio da Prefeitura Municipal, a Câmara Municipal (tendo essa já

desembolsado um montante de mais de um milhão de reais para um projeto

arquitetônico, encomendado ao Escritório de Arquitetura Oscar Niemeyer), Ministério

Público Estadual, Justiça Federal, Justiça do Trabalho, etc.

Tal Comissão teria considerado vários fatores intervenientes como distância

geográfica, acesso, topografia, disponibilidade de área para expansão e custo (infra-

estrutura e desapropriação) e estudou várias áreas como a do Country Club (área 1 A fls. 785 deste anexo inquérito civil, 4º Volume, encontra-se manifestada a posição do então Juiz Diretor do Foro da Comarca de Poços de Caldas, Dr. Carlos Alberto Pereira da Silva, sobre a questão, no sentido de questionar as informações prestadas pelo então presidente desse inquérito civil.

Page 4: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

4

01), Av. Silvio Monteiro dos Santos - Shopping Center (área 02), Rodovia

José Aurélio Vilela (área 03), Retiro dos Carneiros (área 04), Rodovia Liliza

Ottoni - Estação Furnas (área 05), Zona Sul -

Av. Alcoa (área 06).

Como se verifica no documento enviado pela Prefeitura Municipal, a Comissão

Especial “após diversas reuniões e aprofundadas discussões, indicou ao

Prefeito Municipal a área localizada na Zona Sul como melhor opção para

implantação do Paço Municipal, tendo prevalecido o entendimento de que o

Paço Municipal tem como principal objetivo atender bem, de modo

confortável, a população, e não como o de indução de crescimento, que

pode ser realizado por outros meios” – Grifos nossos (fls. 04/IC – 1º Volume).

Alteração do perímetro Urbano e Zoneamento para implantação do Paço Municipal

Figura 01 Figura 02

Como se pode observar das imagens acima (figuras 01 e 02), que espelham a

mesma área onde se vê o centro urbano de Poços e a zona rural (zona sul), a

Comissão não fugiu às comparações que se tornaram públicas nessa discussão, que

retratam a polêmica da polarização entre as zonas oeste e sul da cidade de Poços de

Área onde se

pretende a

implantação do

Paço. ZONA SUL

ZONA OESTE

ZONA OESTE

ZONA SUL

Page 5: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

5

Caldas, como próprias ou inadequadas para a indução do crescimento urbano. A

Comissão concluiu que “mapas (sobre a revisão do Plano Diretor) identificam

claramente uma segregação social espacial da Região Sul e da Região Leste do

Município. A implantação de um equipamento público como o Paço

Municipal na Região Sul possibilitará uma demanda por usos específicos,

que acarretará em melhorias sob diversos aspectos, sem a necessidade de

edificação de áreas além daquelas a serem ocupadas por prédios relacionados às

atividades do próprio Paço”. Grifamos

A Comissão veio a dispor, ainda, que “neste mesmo conceito, a implantação

do Paço Municipal na Região Oeste implicaria na consolidação da segregação

espacial existente, visto que a Região Central e a Região Oeste concentram o

maior nível de renda e os imóveis mais valorizados” – fls. 04/IC. Grifamos

Historiando a questão, foi dessa forma, então, que se definiu o incremento da

construção do Paço Municipal na chamada Zona Sul da cidade.

Podem ser conferidos os mapas trazidos a fls. 42/43 do IC anexo (1º Volume),

demonstrando a área escolhida, dentro da zona rural de proteção ambiental. O

croqui de fls. 66/IC – 1º Volume demonstra outras áreas verificadas na região oeste,

e dispensadas pela Comissão.

1.2. Decreto de desapropriação da área indicada pela Comissão em

contrariedade ao Plano Diretor Municipal.

No entanto, à revelia das disposições e princípios do Plano Diretor de Poços de

Caldas, a Zona Sul da cidade de Poços de Caldas, e, mais especificamente a área

destinada à construção do chamado Paço Municipal, começou a ter seu processo de

incremento - e decisão que na prática redunda em processo de consequente

urbanização dessa zona ambiental - através da desapropriação efetivada pelo

Prefeito Municipal Sebastião Navarro.

Page 6: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

6

Em data de 1º de março de 2007, foi assinada pelo então Chefe do Executivo

a escritura pública de desapropriação amigável de imóvel de cerca de 500 mil metros

quadrados, no local entre a chamada Avenida Alcoa e a estrada do Santuário Mãe

Rainha, a 600 metros da citada avenida (documentos a fls. 83/93-IC).

Tal ato veio com base no Decreto N. 8.661, de 12 de dezembro de 2006,

que declarou a área de utilidade pública, para instalação do Paço. O Decreto foi

gerado em contrariedade legal ao disposto na legislação ordinária, qual seja o art. 3º

da Lei 6.766/1979 – Lei do Parcelamento do Solo – que prevê que: “somente será

admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão

urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas

por lei municipal. (Redação dada pela Lei nº 9.785, 29.1.99). Parágrafo único. Não

será permitido o parcelamento do solo: (...) V - em áreas de preservação

ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até

a sua correção.” Grifamos.

Ademais, o Plano Diretor de Poços de Caldas já previa que a chamada Zona

Rural de Proteção Ambiental – ZRPA “compreende as áreas de proteção

ambiental em alto grau, localizadas fora do perímetro urbano, caracterizadas como

bacias de mananciais de abastecimento de água, atuais e potenciais, nas quais não

será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos, com rigoroso

controle de intervenções antrópicas e limitações ao uso e à ocupação do solo, cuja

instalação deverá ser precedida de licenciamento ambiental para avaliação

de impacto ambiental” (art. 6º - inciso IX, da Lei Complementar 74/2006).

O fato é que quando da desapropriação efetivada pelo Executivo local

(via Decreto Nº 8.661, de 12 de dezembro de 2006), constata-se que a área já era

considerada Zona Rural de Proteção de Mananciais, já conforme o Plano Diretor

então vigente que é a Lei Municipal 5.488/94.

Page 7: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

7

Saliente-se que a SUPRAM – Sul de Minas, ao responder a ofício do Ministério

Público, colocava que “[...] a competência para as atividades de impacto local não

listadas nas citadas normas é do município”. Aludia, ainda, a Assessoria Jurídica e a

Superintendente Regional, Dra. Valéria Resende, à necessidade de procedimentos de

reserva legal e autorizações para supressão florestal, citando os dispositivos

necessários, atos esses que, por conclusão lógica deveriam vir no bojo de um

procedimento formal de licenciamento.

O Primeiro Demandado (Estado de Minas Gerais), através de seu órgão

próprio – SUPRAM-SM – ainda defende que para os casos narrados a competência

para o licenciamento é do município.

1.3. Reação da Sociedade Civil Organizada e Entidades de representação

colegiada ou profissional.

1.3.1. Posição técnica da AASMIG – Mãos da Terra.

Ciente desses fatos a Associação Ambiental do Sul de Minas Gerais – AASMIG

(atual ONG Mãos da Terra, com ampla representatividade social na região), em

assembleia extraordinária, deliberou pelo pedido providências à Procuradoria

Geral de Justiça em face de arquivamento do inquérito civil promovido pelo então

Promotor de Justiça Renato Maia, e denunciava situação irregular, qual seja o

aumento do perímetro urbano no local, à revelia do Plano Diretor do Município, com

risco iminente aos mananciais de abastecimento da cidade, e contraposição aos

princípios urbanísticos.

A AASMIG denunciava, dessa forma, a providência de urbanização da área,

busca de valorização da área por aumento do perímetro urbano (loteamentos), e a

intenção de legitimar essa ação através de audiência pública organizada pelo Poder

Executivo (fls. 121/155-IC).

Page 8: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

8

Outro fato apontado pela AASMIG era a proposta de Lei do Novo Perímetro

Urbano, enviado à Câmara Municipal, que motivou audiências públicas realizadas nos

dias 03 e 04 de agosto de 2007, na Câmara Municipal, que previa não só alteração

do perímetro urbano indicado pelo Plano Diretor, mas alterava seu

macrozoneamento. Tudo isso direcionado a possibilitar a inclusão da área

já desapropriada, bem como regularizar legislativamente as questões

anteriormente levantadas e o avanço da malha urbana sobre zona de mananciais,

conforme aprovação de emendas como a Lei Complementar 84, de 26 de julho

de 2007 (fls. 166/IC – 2º Volume).

Em função de oficiamento de seu Presidente, Luiz Antônio de Freitas Júnior, a

AASMIG efetua ainda vários questionamentos aos posicionamentos da Comissão

Especial (referida no item 1.1.) nomeada pelo Decreto 8.536/2006, instituída para

definição da área para instalação do futuro Paço Municipal (fls. 173/184-IC, 1º

Volume anexo).

Em face do colocado pela AASMIG, já em 2007, quando da iniciativa de

mudança daquelas leis, observa-se a incidência do retrocesso ambiental, ao permitir-

se, de forma ilegal, a urbanização em área de proteção ambiental e de mananciais. O

fato é que os direitos socioambientais estabelecidos vinculam o legislador

infraconstitucional no sentido de exigir-se um comportamento positivo para a sua

implementação, impondo-se a proibição de retrocesso. A regulamentação das

políticas públicas, mesmo com o incremento da urbanização e construção de prédios

públicos, embora essenciais à administração, deverão ter seu implemento com o

respeito ao núcleo legal anterior estabelecido por amplo processo de participação,

sob pena de inconstitucionalidade.

Verificou-se que, para atender a um casuísmo (a construção do Paço

Municipal, em terrenos já desapropriados), o próprio legislador municipal, veio

desconstituir pura e simplesmente o grau de concretização social e proteção da área

que ele próprio havia dado.

Page 9: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

9

1.3.2. Posição do Comitê de Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros dos

Rios Mogi-Guaçu e Pardo (CBH – Mogi-Guaçu Pardo) e do Fórum Mineiro

de Comitês de Bacias Hidrográficas – FMCBH.

Outra entidade que se colocou contra esse processo e consequente

construção desse modo na área, da forma como encetada pelo Poder Público

Municipal (2º Demandado), construção dirigida a áreas sensíveis da Zona Sul, sem

licenciamento competente e sem comprovação técnica para tais ações, foi o Comitê

de Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros dos Rios Mogi-Guaçu e Pardo,

sediado em Poços de Caldas, considerado um dos Comitês de Bacia mais atuantes,

preparados tecnicamente e representativos do Estado de Minas Gerais.

Através de seu Presidente Antônio Carlos Sales, além de outras entidades, foi

comunicado ao Ministério Público (documentação que poderá ser conferida a fls.

745, 762, 764/768 do IC), a análise da questão da ocupação por uso urbano de

manancial de abastecimento público passaria por análise da Câmara Técnica de Meio

Ambiente e Turismo, além da Câmara Técnica de Outorga, daquela instituição. Tudo

isso deliberado na 35ª Reunião Ordinária do CBH Mogi-Pardo, em unanimidade por

Plenária. Assim, foi constituída Comissão Especial das Câmaras Técnicas, que depois

de vários trabalhos, concluiu o seguinte:

“1. No primeiro Plano Diretor da cidade de Poços de Caldas, aprovado pela Lei nº 5.488, publicada em 41.01.1994, a área desapropriada para construção do Paço Municipal, Centro de Eventos e Atividades Correlatas era considerada ZRP – Zona Rural de Proteção de Manancial, sendo vedado o parcelamento de solo para fins urbanos; Grifamos

2. A revisão do Plano Diretor da cidade de Poços de Caldas, aprovada através da Lei Complementar nº 074 publicada em 29/12/2006, determinou como ZRP – Zona Rural de Proteção a área em questão, sendo também, vedado o parcelamento de solo para fins urbanos; Grifamos 3. Em 26/7/2007 foi publicada a Lei Complementar nº 84, alterando o perímetro urbano do município de Poços de Caldas, instituindo como Zona de Adensamento Restrito a área desapropriada para a implantação do Paço Municipal, Cidade Judiciária e órgãos de apoio e atividades correlatas; Grifamos

Page 10: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

10

4. O Plano Diretor de Águas do DMAE – Departamento Municipal de Água e Esgoto da cidade de Poços de Caldas, elaborado em 2004, descreve a região pretendida para construção do Paço Municipal, Centro de Eventos e Atividades Correlatas “como alternativa de abastecimento de água para a zona sul”; Grifamos 5. O eixo de crescimento da cidade de Poços de Caldas, de acordo com o atual Plano Diretor é na direção oeste (ZAP – Zona de Adensamento Preferencial), sendo a área sul da cidade, local da desapropriação para implantação do Paço Municipal, enquadrada em sua maioria como zona de adensamento restrito e em menor proporção como zona de adensamento médio e zona especial de interesse social; e Grifamos 6. A área desapropriada está localizada a montante do Jardim Kennedy que sofre recorrentemente com enchentes no período de cheias.”

E concluía, a final, no seguinte: “A. Desde a elaboração do primeiro Plano Diretor da cidade de Poços de Caldas a área pretendida para implantação do Paço Municipal, Centro de Eventos e Atividades Correlatas é considerada como área de proteção ambiental; Grifamos B. O Plano Diretor de Águas incluiu a região da área pretendida como área de manancial para futuro abastecimento público; Grifamos C. A implantação do Paço Municipal, Centro de Eventos e Atividades Correlatas será um indutor de crescimento, conforme consta no “Diagnóstico Ambiental / Avaliação de Impactos Ambientais e Medidas Mitigadoras”, elaborado pela FUNDAÇÃO GORCEIX, documento anexo aos autos do inquérito; Grifamos D. A impermeabilização do solo na área pretendida para implantação do Paço Municipal poderá impactar o ciclo hidrológico local e provocar o aumento da vazão e da velocidade de escoamento do Ribeirão Várzea de Caldas e agravar a situação de enchentes que ocorrem no Bairro Jardim Kennedy, quando do período de cheias; E. Faltam estudos que garantam a qualidade e a quantidade da água superficial e subterrânea naquela área após a implantação das construções pretendidas; Grifamos F. Existem alternativas locacionais para a implantação do Paço Municipal, Centro de Eventos e atividades Correlatas; Grifamos G. Mesmo com a alteração do perímetro urbano através da legislação municipal as características da área não serão modificadas; H. A água é um fator limitante ao desenvolvimento de qualquer região, e especialmente, no caso de Poços de Caldas que já apresenta problema de uso da água acima do limite outorgável em uma de suas sub-bacias (rio Lambari), conforme Plano Diretor da Bacia aprovado recentemente pelo CBH.

Page 11: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

11

Diante das constatações e considerações feitas anteriormente, e levando-se em conta os princípios da precaução e da prevenção que devem nortear todas as decisões administrativas de interesse comum, concluímos que: I) Deve-se evitar a implantação de qualquer empreendimento na área desapropriada para implantação do Paço Municipal, Centro de Eventos e Atividades Correlatas e seu entorno. Grifamos II) Existem alternativas locacionais para implantação do empreendimento anteriormente citado e que não interferirão em mananciais de abastecimento público da cidade; Grifamos III) A área desapropriada para a implantação do Paço Municipal, situada na área do Ribeirão Várzea de Caldas (zona sul da cidade), em função da sua localização e importância ambiental, poderia ser transformada em Unidade de Conservação de Proteção Integral, garantindo a manutenção do abastecimento futuro da zona sul e contribuindo com as gerações futuras. IV) O CBH Mogi Pardo como integrante do sistema estadual dos recursos hídricos tem a obrigação de contribuir na promoção do debate desta questão e zelar pela manutenção da disponibilidade e da qualidade da água.” (documentos presentes a fls. 764/768 do IC).

Embora tenha havido contraditório e crítica específica da Prefeitura Municipal,

manifestada pelos respeitáveis profissionais Antônio Carlos Alvisi (Divisão de

Planejamento), Raquel Campedeli Corrêa (que cumula as funções de Presidente do

CODEMA – Conselho Municipal do Meio Ambiente e Diretora do Departamento de

Meio Ambiente do Município de Poços) e Daniel Alcântara Resende (Coordenador da

Divisão de Licenciamento Ambiental) - no sentido que o Comitê se baseava no

parecer de uma única entidade e não tinha atribuição para tal questionamento (fls.

791-IC – 4º Volume anexo) – deve-se registrar, MM. Juiz, que se observa, todas

essas posições foram fruto de discussões colegiadas, que podem ser conferidas nos

documentos anexos.

Houve análise técnica e jurídica, e foram referendadas pelo Fórum Mineiro

de Comitês de Bacias Hidrográficas - FMCBH, que, reunido nos dias 23 e 24 de

março de 2011, em Poços de Caldas, efetuou Moção do CBH Mogi/Pardo endereçada

à SEMAD, e ao Dr. Adriano Magalhães Chaves, Secretário do Meio Ambiente e

presente na reunião, no sentido de que...

Page 12: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

12

“o CBH Mogi Pardo é integrante do Sistema Estadual dos Recursos Hídricos e que tem a

obrigação de contribuir para a gestão dos recursos hídricos no âmbito de sua bacia, zelando

pela manutenção da disponibilidade e da qualidade da água, solicita a presente moção: Que

seja considerado o parecer do CBH dos Afluentes Mineiros dos Rios Mogi-Guaçu e Pardo no

atual trâmite de revisão da AAF concedida pela SUPRAM SM (Varginha) no processo

referente à construção e instalação do denominado “Paço Municipal de Poços de Caldas,

atividades correlatas e Centro de Convenções” em área de manancial de abastecimento

urbano e recarga de aqüífero termal profundo, responsável pelas fontes termais de

Poços de Caldas.

O Parecer da CBH Mogi-Pardo indica que: I) Deve-se evitar a implantação de qualquer

empreendimento da área desapropriada para implantação do “Paço Municipal,

Centro de Eventos e Atividades Correlatas e seu entorno. “II) Existem alternativas

locacionais para implantação do empreendimento anteriormente citado e que não

interferirão em mananciais de abastecimento público da cidade”. Grifos nossos.

(Cópia de ofício e da moção a fls. 872/874 do IC – 5º Volume).

Aqui se questionava também a emissão de AAF – Autorização Ambiental

de Funcionamento, emitida pela SUPRAM - Sul de Minas, pelo

empreendimento específico de construção do Paço Municipal com tantas implicações

socioambientais.2

Ao Estado (ora 1º Demandado), ali representado pela pessoa do Dr.

Secretário Estadual do Meio Ambiente, fazendo-se menção à “manifesta

complexidade na proposta do empreendimento”, que “transcendem à competência

2 A chamada AAF – Autorização Ambiental de Funcionamento – é prevista da Deliberação Normativa –DN, do COPAM n.

74, de 09 de setembro de 2004. O artigo 2º da DN, que prevê a AAF, estabelece que “os empreendimentos e atividades listados no Anexo Único desta Deliberação Normativa, enquadrados nas classes 1 e 2, considerados de impacto ambiental não significativo, ficam dispensados do processo de licenciamento ambiental no nível estadual, mas sujeitos obrigatoriamente à autorização ambiental de funcionamento pelo órgão ambiental estadual competente, mediante cadastro iniciado através de Formulário Integrado de Caracterização do Empreendimento preenchido pelo requerente, acompanhado de termo de responsabilidade, assinado pelo titular do empreendimento e de Anotação Responsabilidade Técnica o ou equivalente profissional.” Registre-se que o art. 4º da DN 74/2004, estabelece que “os empreendimentos e atividades modificadoras do meio ambiente não passíveis de licenciamento no nível estadual poderão ser licenciados pelo município na forma em que dispuser sua legislação, ressalvados os de competência do nível federal”. Ocorre que não existe legislação prevendo o procedimento de licenciamento municipal, qual a forma de estabelecimento de compensações, por exemplo, e o órgão responsável. (Grifamos) Ocorre que por disposição de Lei Complementar Municipal que conexiona o EIA ao significativo impacto ambiental, não é caso de AAF, que, como visto remete à existência de impacto ambiental não significativo.

Page 13: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

13

meramente municipal”, foi requerido (fls. 955/956-IC – 5º Volume), se dignasse

determinar o Sr. Superintende Regional da SUPRAM – Sul de Minas (Varginha) dar

concreção ao licenciamento ambiental regular, considerados o porte e potencial

poluidor dos empreendimentos previstos.

Ao reverso, dessa forma, não pode prosperar o argumento manifestado pelo

órgão público municipal (2º Demandado), propulsor dos empreendimentos, de que

se tratam os questionadores de um pequeno grupo de pessoas, que são contra o

desenvolvimento da cidade. O fato é que não teria “esse reduzido grupo” o condão

de tamanha ubiquidade, ou manifesta capilaridade, a envolver tantos e diversos

setores sociais e profissionais, que se manifestam contra o projeto que redundará na

urbanização da Zona Sul da cidade e área de recarga de fontes profundas.3

Voltando à questão da AAF – Autorização Ambiental de Funcionamento

– registre-se que, embora emitida pela SUPRAM-SM, a atividade foi registrada como

“loteamento do solo urbano para fins exclusiva ou predominantemente

residenciais” – O grifo é nosso (fls. 514/515-IC; 3º Volume).

Pela Deliberação Normativa 123/2008 (juntada a fls. 516 do IC, 3º Volume),

ficaram convocados todos os empreendimentos que detinham AAF ao licenciamento

ambiental, em face de estarem no entorno de Unidades de Conservação, como é o

caso do Paço Municipal, que se encontra no entorno da Unidade de Conservação

Serra de São Domingos, que compreende áreas de recarga de fontes termais de

Poços de Caldas. Tal convocação foi manifestada pela SUPRAM à Prefeitura de Poços

(fls. 549/IC). Já em 2008, a Prefeitura Municipal informava (of. 101/2008, fls.

520/IC; 3º Volume), que não vislumbrava a necessidade de firmar termo de

compromisso com o MP, para regularização da questão. O resumo de fls. 542/543-IC 3 A respeito da questão da participação popular importante trazer à colação os fundamentos expendidos por Álvaro Luiz Valery Mirra (MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Participação, processo civil e defesa do meio ambiente. São Paulo: Letras Jurídicas, 2011, p. 129) no sentido de que “essas entidades civis, como anota Claude Lambrechts, desempenham papel essencial, não só por traduzirem uma importante demanda social como, ainda, por constituírem verdadeiro contraponto ao exercício do poder, corrigindo-o ou redirecionando. Por essa razão, as associações civis são consideradas indispensáveis à transparência e à transmissão de informações e à implementação de processos democráticos de decisão, assumindo, nesse campo, a condição de interlocutoras privilegiadas nos procedimentos de negociação, consulta e participação na gestão do meio ambiente”. Grifamos. Nos casos aqui discutidos as entidades que se contrapõem à forma e projetos propostos, embora não tendo atuação exclusiva sobre questões ambientais, instalam como atoras importantes no processo de acesso à Justiça, e participação pública nos processos decisórios. É natural que sejam criticadas, das formas mais variadas, pelo Poder Governamental, que muitas vezes decide de forma isolada e sem legitimidade.

Page 14: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

14

– 3º Volume, mostra a dúvida que o empreendimento (ou empreendimentos) traz na

própria avaliação da SUPRAM-SM.

De outro turno, ao analisar-se a DN COPAM 74/2004, verifica-se que os

empreendimentos previstos para a área, zona rural de proteção ambiental, não estão

relacionados na listagem agregada à própria DN 74; uma vez que tais

empreendimentos de forma alguma podem ser considerados “loteamento do solo

urbano para fins exclusiva ou predominantemente residenciais” .

Apenas para argumentar, reforçando a necessidade do que se chama aqui de

licenciamento ambiental clássico, por parte da SUPRAM-SM, observe-se, por

exemplo, que as pautas das últimas cinco reuniões mensais, de julgamentos de

processos administrativos de licenciamento no COPAM - SUPRAM-SM (75ª, 76ª, 78ª,

79ª e 80ª Reuniões Ordinárias – fls. 1034/1046 – 5º Volume), podem ser

vislumbradas uma série de empreendimentos que, a olho nu, poderiam ser

considerados menos impactantes, ou de interesse local, em relação aos

empreendimentos previstos para a área nessa questão. Portanto, embora não haja

previsão na DN 74/2004, acerca do empreendimento (ou empreendimentos)

específico aqui discutido não se trata de nenhuma incongruência absurda o pedido

de procedimento de licenciamento, por parte do Estado, em face de projetos na área

delimitada, haja vista a imposição, repita-se, de significativo impacto ambiental, com

a necessidade de produção de EIA/RIMA, criada pela própria presunção jurídica da

legislação municipal; que, no caso, não admite prova em contrário (presunção Juris

Et de Jure).

1.3.3. Fundamentos do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB.

Sob outros argumentos, o Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB -

Núcleo Poços de Caldas, tem se manifestado formal e publicamente acerca de sua

posição técnica, no sentido de que a área indicada para a implantação do Paço

Municipal e Câmara dos Vereadores não é própria para tal empreendimento. O

Page 15: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

15

Presidente do IAB de Poços de Caldas Alfredo H. Barbosa Júnior e Luciana Dabdab

Carneiro, Secretária, oficiaram ao então Presidente da Câmara de Poços de Caldas,

Marcus Togni, no sentido de que...

“as diretrizes urbanísticas contemporâneas estimulam a utilização e requalificação dos centros

urbanos em especial por setores públicos. Tem isto por objetivo democratizar o acesso a

grande parte da população a área de maior valor e de maior infra-estrutura urbana

(transporte, água, luz, comércio, serviços em geral).” (fls. 662 do Inquérito Civil – 4º

Volume).

A posição do IAB – Poços de Caldas, vai numa linha, preconizada pela

moderna arquitetura urbanística mundial, de não ocupar novos e sensíveis espaços

rurais e ambientalmente relevantes ao abastecimento, mas trabalhar áreas já

urbanizadas, revitalizando-as de forma a proporcionar renda, facilidade de

transporte, democratização de espaços e efetivo desenvolvimento sustentável.

Isso dentro da perspectiva de que os processos de revitalização e novas áreas

urbanas devem apontar para articulações inovadoras entre os atores envolvidos, na

medida em que podem atingir conjuntos urbanos históricos diferentemente

valorizados e que passam por governos locais comprometidos de forma diversa com

os processos de construção e revitalização dos centros urbanos.

Registre-se que todas essas entidades estão procurando participar do

processo de discussão e propõem alternativas locacionais para os

importantes empreendimentos a serem construídos na cidade.

1.3.4. Argumentos da ADISMIG – Agência para o Desenvolvimento

Integrado do Sul e Sudoeste de Minas Gerais.

De outro ponto, também a Agência para o Desenvolvimento Integrado

do Sul e Sudoeste de Minas Gerais – ADISMIG, tem vindo posicionar-se contra

Page 16: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

16

a forma de imposição do projeto de construção do Paço Municipal, Centro de

Convenções e Cidade Judiciária, no local prefigurado na Zona Sul da cidade, em

função das configurações expostas no Plano Diretor, instituindo grupo de trabalho

técnico sobre o assunto (fls. 752/760 – 4º volume do IC).

O Grupo de Trabalho criado pela ADISMIG concluiu que o “não atendimento,

por parte do Executivo Municipal às restrições previstas na Lei Complementar n.

84/07, conduzirão a ocupação de uma área comprovadamente frágil e

inadequada do ponto de vista urbanístico e ambiental a um processo

desregrado e descomprometido do crescimento equilibrado que se pretende para a

cidade”. E mais conclui: “as conseqüências serão graves e atingirão toda a

população do município que sofrerá, em médio e longo prazo, com os impactos

de tal ocupação, tanto do ponto de vista ambiental quanto do urbanístico,

socioeconômico e financeiro” (fls. 12 – Anexo 03 do IC) – Grifamos.

1.3.5. Posições da AELO – Associação das Empresas de Loteamento e

Desenvolvimento Urbano de Poços de Caldas e da ASEAA – Associação

Sulmineira de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, da ONG Planeta

Solidário, do SINDUSCON – Sindicato da Indústria da Construção Civil de

Poços de Caldas e do CREA – Poços de Caldas.

Fazia-se referência ainda ao “trabalho do CETEC e IPT, que indicam que a

região do Córrego Várzeas de Caldas, onde se localiza a área

desapropriada para implantação do futuro Paço Municipal e Centro de

Convenções é uma zona de recarga de água e a sua ocupação por atividades

urbanas impactará de forma negativa a infiltração de água que alimentam as fontes

termais que surgem no centro da cidade (...)”. (fls. 958 do IC – 5º Volume) –

Grifamos.

Page 17: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

17

1.4. Histórico das modificações dirigidas ao Plano Diretor de Poços de

Caldas.

Juntamente a outras entidades aqui citadas a AELO – Associação das

Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano de Poços de Caldas e da ASEAA

– Associação Sulmineira de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, a ONG Planeta

Solidário, do SINDUSCON – Sindicato da Indústria da Construção Civil de Poços de

Caldas e do CREA – Poços de Caldas fazendo referência que a minuta do Plano

Diretor de Poços de Caldas enviada para o Poder Legislativo, aprovada pelo

Executivo Municipal e pelo Fórum de Acompanhamento do Plano Diretor, colocavam

da necessidade de “viabilizar a implantação do Paço Municipal, preferencialmente

na área indicada como zona de Adensamento Preferencial, localizada na

região oeste do município, servindo como equipamento indutor da urbanização”.

(fls. 957/961 do IC – 5º Volume – grifos no original).

Poços de Caldas estabeleceu-se como uma cidade avançada, já na década de

70, no aspecto da discussão de seu planejamento urbano, e, consequentemente,

procurando instituir os preceitos que vieram a ser previstos no Estatuto da Cidade

(Lei Federal 10.257/2001).

Durante a gestão do Prefeito Municipal Haroldo Genofre Junqueira, no final

década de 60, já tiveram início as contratações para consultoria de ordem urbanística

da cidade que tem nas suas fontes termais e nascentes um de seus principais

atrativos turísticos. No final da década de 80 foi elaborado já o primeiro plano diretor

de Poços. A revisão do Plano Diretor foi feita em 2006.

De fato, como bem esclarece a Prefeitura Municipal, a fls. 792/IC – 4º

Volume, “as alterações nos Planos Diretores Municipais ditadas por necessidades

diversas, quer administrativas para acompanhamento da dinâmica natural das

aglomerações urbanas, quer como decorrência de prazo razoável de validade de um

Page 18: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

18

plano diretor, seguem procedimentos que consideram igual oportunidade de

manifestação de todos os setores envolvidos através de audiências públicas”.

No entanto, como está bem disposto no histórico elaborado pela ADISMIG (fls.

04/09 do IC – anexo 03) “os três planos Diretores de Poços de Caldas convergiram,

entre outros aspectos, para uma tendência de crescimento que deveria ser revertida:

a cidade cresce em direção à zona sul. Pelas características daquela região,

decorrentes de sua vulnerabilidade e dos aspectos ambientais da área (área

de recarga de mananciais) e da área de seu entorno, os três planos Diretores

municipais indicaram a necessidade de refrear esta tendência e de buscar

induzir o crescimento da cidade em direção à região oeste da malha urbana do

município”. Grifamos

Certamente a pressão imobiliária, busca por facilidades políticas e a

indisposição para alternativas mais complexas (que demandariam discussão técnicas

e posições administrativas mais ousadas), foram premindo mudanças no Plano

Diretor que possibilitasse a urbanização dessa área que atualmente se encontra livre

de impermeabilização.

É assim que, de outro quadrante, advoga o Município (manifestação a fls.

792-IC – 4º Volume) “discutir nesse momento a propriedade das deliberações do

Legislativo Municipal sobre o assunto de tamanho interesse, colocando em dúvida a

capacidade de julgamento e discernimento dos representantes dos vários setores

sociais que têm assento naquela Casa de Lei, bem como dos que se fizeram

representar quando regularmente convidados, parece-nos extemporâneo e eivado de

argumentações meramente baseadas em interpretações parciais e pessoais da

legislação aplicável”.

Não está se questionando a Lei Municipal já votada e estabelecida, mas, para

melhor entender a questão, é importante trazer os fatos expostos pela Comissão

Técnica da ADISMIG (Anexo 03 desse IC apresentado) no sentido de que quando da

Page 19: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

19

confecção da minuta de Plano Diretor enviada à Câmara Municipal em 2006, já

existiam conflitos com a escolha da área para construção do Paço Municipal.

Foi definido que não deveria haver ampliação do perímetro urbano (exceção a

ser feita apenas em casos pontuais), uma vez que o perímetro urbano então

vigente já continha um grande vazio urbano, passível de ocupação, na

zona oeste da cidade. Essa área deveria ter ocupação incentivada pelo Poder

Público, e, como tal, foi denominada de Zona de Adensamento Preferencial –

ZAP (para melhor compreensão essa zona pode ser identificada na zona oeste da

cidade, demonstrada nas figuras 01 e 02 - fls. 04 dessa petição).

Não há dúvida, portanto, que com a aprovação da Lei 74/2006 – Plano

Diretor, de autoria do Executivo, estabeleceu-se novo macrozoneamento do

município, impondo a diretriz que a expansão urbana deveria ser incentivada

para a zona oeste da cidade.

Na época da confecção do Plano Diretor (2004/2005), que envolveu

participação popular, discussões e avaliações técnicas, chegou-se à conclusão que a

área em questão na zona sul, estava indicada como de relevante importância para

captações de água para abastecimento presente e futuro da cidade de Poços de

Caldas.

O Estudo da ADISMIG revela ainda que o atual plano diretor do DMAE

indicava que, não obstante a situação atual de abastecimento da cidade ser

confortável, graças ao bom gerenciamento de águas no município4, deveriam ser

feitas intervenções para aumento da capacidade hídrica para abastecimento nos

próximos 20 anos, sob risco de comprometimento do sistema. Essas realidades

técnicas acabaram por influenciar a definição da área como Zona Rural de

Proteção Ambiental – ZRPA.

4 O sistema de saneamento e de águas de Poços de Caldas é municipalizado a cargo de órgão autônomo que é o DMAE.

Page 20: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

20

As imagens trazidas adiante (figuras 03 e 04 a seguir), demonstram os

córregos e fraturas dessa região, que foi definida no Plano Diretor como “áreas de

proteção de alto grau, localizadas fora do Perímetro Urbano, caracterizadas como

bacias de mananciais de abastecimento de água, atuais e potenciais, nas quais não

será admitido parcelamento do solo para fins urbanos, com rigoroso controle de

intervenções antrópicas e limitações ao uso e à ocupação do solo, cuja instalação

deverá ser precedida de licenciamento para avaliação de impacto

ambiental”. Grifamos

Figura 03 Figura 04

Não existem dúvidas que quando da elaboração do Plano Diretor, finalmente

aprovado, a escolha daquela área para construção do Paço Municipal (Cidade

Administrativa) feriam as diretrizes socioambientais e urbanísticas definidas.

No entanto, como já referido, foi através da Lei Complementar n. 84 de 25

de julho de 2007, o Poder Executivo efetuou a desapropriação da área inserida na

Paço

Page 21: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

21

Zona Rural de Proteção Ambiental, para a construção do Paço Municipal, vindo a

modificar a Lei Complementar 74/2007.5

Como se pode observar do art. 2º - parágrafo 1º - da Lei Complementar

84/2007 (fls. 416 do IC) “fica instituída como Zona de Adensamento Restrito –

ZAR, a área 05, descrita no inciso V deste artigo, destinada exclusivamente à

implantação do Paço Municipal, Cidade Judiciária e órgãos de apoio e atividades

correlatas, sendo vedada qualquer outra destinação.” Grifamos

Criou-se assim, dentro da Zona Rural de Proteção Ambiental, uma Zona

de Adensamento Restrito para possibilitar a construção do Paço.

Importante observar ainda que o parágrafo 2º, do artigo 2º, da Lei

Complementar 84/2007, estabelece que, para efeito do disposto no parágrafo 1º

(construção do Paço), “ficam estabelecidas as seguintes restrições: I. O projeto

para implantação do empreendimento deverá ser submetido ao licenciamento

ambiental no órgão competente, de acordo com o inciso XV do art. 2º da

Resolução CONAMA 001, de 23 de janeiro de 1986”. 6 Grifos nossos.

Dada a incompatibilidade dessa desapropriação o Executivo, em setembro de

2010, propõe nova alteração da Lei Complementar n. 74, para fazer prever na área a

construção de um Centro de Convenções com financiamento da CODEMIG.

5 A Lei Complementar n. 84/2007 “altera os Anexos I, II e III de que trata o art. 2º da Lei Complementar n. 74, de 29.12.2006, e fixa o novo perímetro urbano para o município de Poços de Caldas”. Tal lei encontra-se juntada a fls. 414/417 do IC, Volume 03. 6 Resolução CONAMA 01/86 juntada a fls. 1052-IC – 5º Volume.

Page 22: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

22

1.5. Falta do instrumento do licenciamento ambiental. Carência de

sistematização legal e técnica do município de Poços de Caldas para o

procedimento. Indefinição de competência de atribuições do órgão

licenciador.

Sabe-se que o licenciamento ambiental é o procedimento administrativo pelo

qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e

a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais,

consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer

forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e

regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso (Res. CONAMA 237/97 – art.

1º - inciso I). Grifamos.

Como lembrado no item anterior, reforçando a sensibilidade da área, o

parágrafo 2º, do artigo 2º, da Lei Complementar 84/2007, do município de

Poços de Caldas, estabeleceu que para efeito do disposto no parágrafo 1º

(construção do Paço), “ficam estabelecidas as seguintes restrições: I. O projeto para

implantação do empreendimento deverá ser submetido ao licenciamento

ambiental no órgão competente, de acordo com o inciso XV do art. 2º da

Resolução CONAMA 001, de 23 de janeiro de 1986”.

E determinou mais o Legislador Municipal:

“II. O licenciamento ambiental deverá ser elaborado por equipe

multidisciplinar composta necessariamente por especialista em hidrogeologia” e

estabelecia várias condições a serem seguidas dentro do licenciamento previstas nas

alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, e “e” daquela lei municipal.

Page 23: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

23

Não há dúvida de que a referência e conexão expressa à Resolução

CONAMA 01/86, que prevê a avaliação de impactos ambientais, cria a necessidade

de que haja Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto

Ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão competente,

o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente para

qualquer empreendimento na área descrita (art. 2º da Res. CONAMA 01/86).

A citada Resolução, ainda em seu art. Art. 7º, prescreve que “o estudo de

impacto ambiental será realizado por equipe multidisciplinar habilitada, não

dependente direta ou indiretamente do proponente do projeto e que será

responsável tecnicamente pelos resultados apresentados.” Grifamos

O Projeto, visto de uma forma ampla, que é a construção do Paço Municipal, é

proposição específica do Município de Poços de Caldas.

Não há que se falar em EIA-RIMA (ali só veio o EIA) sem

licenciamento formal, e, consequentemente, sem órgão licenciador. Aqui o

próprio empreendedor – Prefeitura Municipal de Poços de Caldas – coloca-se como

fazendo as vezes de órgão licenciador e, também, ao mesmo tempo, em

contrariedade à própria lei municipal, proponente do projeto e, ademais,

contratante (sem licitação, por notória especialidade do contratado) do EIA.

O fato é que o município de Poços de Caldas, mesmo sendo um município

evoluído no plano de estruturação administrativa, não conseguiu fugir a uma

realidade muito comum a vários municípios brasileiros, que é a falta de previsão

legislativa e sistemática no que toca ao licenciamento ambiental, estruturação

técnica mínima e organização do órgão ambiental competente para tanto, que

deverá ser independente da estrutura e comando do Executivo.

Page 24: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

24

Não há disposição legislativa municipal prevendo o procedimento de

licenciamento ambiental, forma, conteúdo, fases, e não há convênio sequer com o

Estado ou com o órgão ambiental licenciador estadual para tal função. Tudo isso,

sem embargo de o Município ter criado uma “Coordenadoria de Divisão de

Licenciamento”, a cargo do profissional Daniel Alcântara Resende, conforme se

depreende do of. de fls. 791-IC, 4º Volume.

A Resolução CONAMA 237, de 19 de dezembro de 1997, que dispõe,

como dito, sobre licenciamento ambiental, competência da União, Estados e

Municípios, Estudos Ambientais, EIA-RIMA, etc. prevê, no artigo 6º, que os

licenciamentos de impacto local ficam a cargo do município. Embora o art. 7º preveja

que “os empreendimentos e atividades serão licenciados num único nível de

competência”, através de convênios, cada vez mais nascem situações de

licenciamento comum entre Estado e União, Estados e Municípios, por exemplo,

dadas as peculiaridades dos impactos, realidade geográfica, necessidade de

avaliações integradas, e a situação das atividades e empreendedores. Não se trata, é

claro, de vários licenciamentos para uma mesma atividade, o que seria exigência

absurda.

O art. 8º da Resolução citada prevê que “o poder público, no exercício de sua

competência de controle, expedirá as seguintes licenças: I – Licença Prévia (LP) -

concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade

aprovando sua localização e concepção, atentando a viabilidade ambiental e

estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas

próximas fases de sua implantação; II – Licença de Instalação - (LI) - autoriza a

instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificidades

constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de

controle ambiental, e demais condicionantes, da qual constituem motivo

determinante”; e a (III) “Licença de Operação (LO) – autoriza a operação da

atividade ou empreendimento, após verificação do efetivo cumprimento do

Page 25: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

25

que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e

condicionantes determinadas para operação”.

As etapas do licenciamento também são descritas no art. 10 da resolução

237/97, enquanto o art. 20 prevê que “os entes federados, para exercerem suas

competências licenciatórias, deverão ter implementados os Conselhos de Meio

Ambiente, com caráter deliberativo e participação social e, ainda, possuir em

seus quadros ou a sua disposição profissionais legalmente habilitados”.

Grifamos

E nem se argumente que o licenciamento ambiental clássico é exigível só para

grandes empreendimentos.

Essas questões específicas sobre a capacidade licenciatória do município foram

tratadas em reunião, na sede do órgão ambiental licenciador estadual, no dia 30 de

março de 2011, quando ali estiveram presentes representantes da sociedade civil,

Comitê de Bacia, o Ministério Público (representado por este signatário), o CODEMA

de Poços de Caldas (representada por sua presidente Raquel Campedeli Correa, e

secretária municipal), e Luciano Junqueira Melo, Superintende da SUPRAM-Sul de

Minas, onde se buscavam alternativas convergentes à questão aqui ora apresentada

ao Judiciário.

Em resposta a questionamento formal do Ministério Público o CODEMA de

Poços de Caldas respondeu (fls. 878/954) que “não foi iniciado processo

administrativo de licenciamento municipal para análise do empreendimento de

construção do Paço Municipal, porque o município não dispõe dessa

ferramenta” (fls. 878). O grifo nosso.

E esclarece: “”b. (...) o Município não dispõe de ferramenta específica

de licenciamento ambiental e sim de leis municipais que elencaram

procedimentos que devem ser observados quando da necessidade de aprovação de

execução de empreendimentos” (fls. 878/IC) – Grifamos.

Page 26: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

26

Esclarece que não está havendo formalização do licenciamento

ambiental, mas discussão da questão, em audiências públicas, visto que o assunto

veio em reunião do CODEMA (fls. 878-IC), levantada por um conselheiro.

A final, a Presidente do CODEMA esclarece que “conforme ata da 75ª reunião

ordinária do CODEMA (anexo IV), este colegiado concorda que o licenciamento

da obra em questão seja redirecionado para a competência do Estado de

molde que fique sob a responsabilidade do COPAM/SUPRAM o julgamento

e condução do processo de licenciamento”. Grifamos.

Em reunião com o Ministério Público de forma a buscar alternativas para a

questão, o Prefeito Municipal de Poços, na sede da Prefeitura, na presença de vários

assessores e Secretariado, e de Diretores da CODEMIG, pareceu ter acedido à

proposta de que o licenciamento clássico para intervenção na área, como garantia

geral, em função dos impactos negativos apontados, inclusive pelos estudos da

Fundação Gorceix, ficasse a cargo da SUPRAM-Sul de Minas, que deveria dar

concreção ao processo de licenciamento para garantia da ordem socioambiental.

Estabeleceu-se, como conclusão da reunião, que essa providência seria encetada o

mais rápido possível. Ademais, em face da ampla repercussão regional do

empreendimento a SUPRAM-Sul de Minas, órgão licenciador regional, vem

acompanhando a questão e interveio emitindo AAF.

A competência ambiental não está clara em função do fato de que a própria

SUPRAM-SM emitiu a Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF), chamando a

si, de forma, a competência para a autorização dos empreendimentos na área, o

licenciamento, e, dentro do pensamento de que isso não excluiria a necessidade de

outras licenças, não dispõe sobre a forma de licenciamento a ser encetado pelo

município.

No entanto, sem embargo de o próprio CODEMA admitir que “não foi iniciado

processo administrativo de licenciamento municipal para análise do

empreendimento”, o Município e a imprensa regional já vem anunciando durante a

Page 27: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

27

semana, como o portal eletrônico da Prefeitura Municipal de Poços de Caldas, o início

das atividades para construção do Centro de Convenções na área questionada.7

Torna-se de conhecimento público, porquanto também notório, o implemento

dos empreendimentos. No dia 20.06.2011, por exemplo, o Jornal Mantiqueira

informou que “nas próximas semanas, a Companhia de Desenvolvimento de Minas

Gerais (CODEMIG), deve dar início ao processo de licitação para construção do

centro de convenções, que será edificado na zona sul da cidade, em área destinada

ao Paço Municipal” e o site da Prefeitura Municipal anunciava um dos

empreendimentos com declarações do Sr. Prefeito Municipal no sentido de que

“mostramos todos os documentos e certidões que comprovam que a área está apta

a receber este investimento” (documento de fls. 1049/1050 – IC – 5º Volume).

O que se constata, ao contrário das declarações do Município, é o

descumprimento da lei federal e estadual, como se verá, além dos dispositivos da

própria lei municipal, devendo-se, mais uma vez, registrar que o artigo 2º -

parágrafo 2º - da Lei Complementar 84/2007, estabelece que para efeito do disposto

no parágrafo 1º (construção do Paço), “ficam estabelecidas as seguintes restrições:

I. O projeto para implantação do empreendimento deverá ser submetido ao

licenciamento ambiental no órgão competente, de acordo com o inciso XV

do art. 2º da Resolução CONAMA 001, de 23 de janeiro de 1986”.

Em 10 de junho de 2010, Simone Gonçalves, através do ofício 10/2010, pela

Associação Ambiental do Sul de Minas – Mãos da Terra, teve que vir requerer a

publicidade da Avaliação de Impacto Ambiental, produzida pela Fundação Gorceix,

contratada pelo município, ao então Presidente da Câmara de Poços de Caldas –

Marcus Togni (fls. 669/671-IC – 4º Volume). Ali lembrava a entidade acerca das

disposições das Resoluções CONAMA 01/86, e 237/97. Registrava, ainda, ao DD.

Presidente da Câmara Municipal, que a atribuição do licenciamento ambiental é

competência da SEMAD – pois o município de Poços de Caldas não mantém convênio

7 Prefeito vai a BH para tratar do centro de convenções e unidade prisional. Disponível em: http://www.pocosdecaldas.mg.gov.br. Acesso em 23.06.2011.

Page 28: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

28

com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, dentro das disposições da DN COPAM

102/2006.8

2. Pressupostos técnicos.

2.1. Laudo efetivado pelo setor técnico do Ministério Público. Local

impróprio para os empreendimentos.

A Central de Apoio Técnico do Ministério Público – CEAT, é órgão de

extrema seriedade do Ministério Público, coordenado por profissional não menos

insuspeito, Dr. Edson de Resende Castro, Promotor de Justiça, que tem

desempenhado um papel de extrema relevância no assessoramento técnico para

enfrentamento de conflitos e posicionamento científico que demandam uma análise

específica dos casos concretos.

Os técnicos da CEAT, não vinculados a obediência hierárquica a membros do

Ministério Público, estão circunscritos aos seus deveres profissionais e sujeitos às

responsabilidades administrativas, cíveis e criminais que a lei prevê. Procuram

efetuar o trabalho com a parcialidade e isenção afetos a essas responsabilidades.

8 A Deliberação Normativa COPAM nº 102, de 30 de Outubro de 2006, estabelece diretrizes para a cooperação técnica e administrativa com os municípios visando ao licenciamento e à fiscalização de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local. O artigo 1º da DN 102/2006, prevê que “os municípios que disponham de sistema de gestão ambiental, nos termos desta Deliberação Normativa, poderão celebrar com o Estado de Minas Gerais, através da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - SEMAD, com a Fundação Estadual do Meio Ambiente - FEAM, com o Instituto Estadual de Florestas - IEF e com o Instituto Mineiro de Gestão das Águas - IGAM, convênio de cooperação técnica e administrativa, em harmonia com as normas e princípios que regem o Sistema Nacional do Meio Ambiente -SISNAMA, instituído pela Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, visando especialmente : I -ao licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto local ou à autorização ambiental de funcionamento, nos termos dos art. 2º e 3º desta Deliberação Normativa e à correspondente fiscalização pela esfera municipal; II - à interação com o sistema de outorga do direito de uso das águas; III - à interação com o sistema de autorização para exploração florestal.”

Page 29: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

29

Dessa forma, foi produzido o laudo técnico juntado a fls. 419/432-IC (3º

Volume), onde, após o histórico da situação, analisou-se a questão do plano diretor,

no sentido de que a área destinada a expansão urbana não corresponde ao local

escolhido para a implantação do Paço Municipal (fls. 422-IC); o sistema de

abastecimento de água, chamando atenção para o fato de que a ocupação do solo

analisada, além de localizar-se em zona rural, encontra-se a montante de uma futura

captação de água para abastecimento de parte do município de Poços de Caldas a

ser realizada pelo Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) (fls. 427-IC);

com conclusão em vistoria que a área destinada ao Paço Municipal tem topografia

plana e compreende uma região localizada entre dois cursos d´água que juntos

formam o córrego Várzea de Caldas.

Figura n. 05 Figura n. 06

As imagens acima, presentes no laudo em referência, retratam o local de

interesse de instalação do Paço Municipal com demarcação aproximada da área e

dos cursos d’água. Imagem extraída da planta planialtimétrica da área 6 – zona sul

Page 30: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

30

(figura n. 05) e um reservatório existente próximo a futura área do Paço Municipal

(figura n. 06)

O laudo traz questão de suma importância quando considera que “o Plano

Diretor do Sistema de Abastecimento de Água do município de Poços de Caldas foi

elaborado pela empresa Serviços de Engenharia Consultiva S/C LTDA. (SEREC)

através de contrato com o Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE). As

características do abastecimento de água estão descritas em no volume 1 –

(memorial descritivo - página 16), “o sistema de abastecimento de água do município

é formado por 6 captações de água bruta, cada uma em um manancial diferente, 5

estações de tratamento de água, 42 reservatórios, 23 estações elevatórias de água

tratada e cerca de 600 km de redes de distribuição, unidades que deverão ser

reavaliadas quanto às suas capacidades e necessidades no presente estudo”.

E conclui: “A ocupação do solo analisada, além de localizar-se em zona rural,

encontra-se a montante de uma futura captação de água para abastecimento de

parte do município de Poços de Caldas a ser realizada pelo Departamento Municipal

de Água e Esgoto (DMAE), conforme pode ser verificado no mapa Plano Diretor do

Sistema de Abastecimento de Água – Sistema Produtor – Esquema Geral –

Alternativa 02 (238 00005) (Figura 03), com a indicação da localização da captação

da água. É necessário ter conhecimento de qual classe se enquadra o curso d’água a

fim de verificar as restrições de uso a montante do manancial, pois a lei 10793/92,

que dispõe sobre a Proteção de Mananciais destinados ao Abastecimento Público no

Estado, estabelece em seu art 1º: “Ficam considerados mananciais, para os efeitos

desta Lei, aqueles situados a montante do ponto de captação previsto ou existente,

cujas águas estejam ou venham a estar classificadas na Classe Especial e na Classe I

da Resolução nº 20, de 18 de junho de 1986, do Conselho Nacional do Meio

Ambiente - CONAMA -, e na Deliberação Normativa nº 10, de 16 de dezembro de

1986, do Conselho Estadual de Política Ambiental - COPAM” (grifo no original). (fls.

426/427-IC – 3º Volume)

Page 31: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

31

Conclui o trabalho técnico, entre outras considerações, que “a implantação

do Paço Municipal ocasionará impactos negativos gerados pela instalação

de um núcleo urbano a montante de uma futura captação de água e,

principalmente, como a degradação da qualidade da água, a diminuição da

superfície de recarga, o aumento e a velocidade do escoamento

superficial”.

2.2. Estudo Prévio de Impacto Ambiental produzido pela Fundação

Gorceix. Matriz negativa.

Já em 1993 Paulo Nogueira Neto9, chamava atenção para o fato de que o EIA-

RIMA é um dos mais importantes instrumentos de proteção ambiental, seja no Brasil,

seja nos outros países onde é adotado. O EIA – Estudo de Impacto Ambiental – é um

estudo das prováveis modificações nas diversas características socioeconômicas e

biofísicas do meio ambiente que podem resultar de um projeto proposto.

Tão importante é o EIA, como instrumento preventivo, que veio previsto como

exigência na nossa Carta Cidadã de 1988 onde, no artigo 225 – caput – e parágrafo

1º - inciso IV – da Constituição Federal: “exigir, na forma da lei, para instalação de

obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do

meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”.

Grifamos.

Sob a coordenação do Professor Paulo Cyro Baptista Scudino (Hidrogeólogo

Sênior), a Prefeitura Municipal de Poços de Caldas contratou a Fundação Gorceix,

para realizar um estudo de Avaliação de Impactos Ambientais – AIA.

9 Paulo Nogueira Neto é professor aposentado do Departamento de Ecologia Geral da USP. No Governo Federal foi Secretário de Governo durante 12 anos. Considerado um dos ícones do ambientalismo brasileiro. Fez essas considerações acerca do EIA-RIMA, em prefácio, já em 1993, ao livro de Édis Milaré e Antônio Herman Benjamin, Estudo Prévio de Impacto Ambiental: teoria, prática e legislação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 01/02.

Page 32: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

32

O importantíssimo estudo foi concebido para análise da construção do Paço

Municipal de Poços de Caldas. Vê-se, logo na introdução ao trabalho que o estudo

busca atender ao disposto no artigo 2º da Lei Complementar Municipal N.

84/2007, já aqui anteriormente citada, em seus parágrafos 1º e 2º, no

sentido da necessidade de um estudo técnico da área.

Portanto o estudo faz as vezes de um EIA, sem RIMA, sem licenciamento

ambiental e sem órgão licenciador. Não se sabe ao certo a qual órgão licenciador

será ou foi submetido o EIA apresentado. Seria ao CODEMA de Poços? Seria à

Prefeitura Municipal de Poços? À Secretaria Municipal do Meio Ambiente? Seria à

SUPRAM – Sul de Minas, localizada em Varginha? Ou uma mera satisfação à lei

municipal? A sociedade teve acesso a tais informações e oportunidade de discutir

publicamente tal estudo?

Não existe EIA sem licenciamento, daí todas as medidas compensatórias,

mitigatórias, previsão de impactos ali previstas deverão estar submetidas a algum

órgão ambiental competente.

Luiz Enrique Sánchez em seu clássico “Avaliação de impacto ambiental”, já

preleciona que o vínculo entre o licenciamento e os estudos de impacto

ambiental é também estabelecido pelo decreto regulamentador da Política Nacional

do Meio Ambiente. O caput do art. 17 do Decreto 99.274/90 retoma os termos do

artigo 10 da Lei 6.938/81 e acrescenta quatro parágrafos (...)”.10 – Grifamos.

Em outro plano, definindo a Avaliação de Impactos Ambientais (que aqui

busca tomar a forma de um EIA), Sánchez esclarece que “a compreensão de

objetivos e propósitos da AIA é essencial para apreender seus papéis e funções, e

também para se apreciar seu alcance e seus limites. A AIA é apenas um

instrumento de política pública ambiental e, por isso, não é solução para todas as

10 SANCHEZ, Luis Enrique. Avaliação de impacto ambiental: conceitos e métodos. São Paulo: oficina de textos, 2008, p. 83

Page 33: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

33

deficiências de planejamento ou brechas legais que permitem, consentem

e facilitam a continuidade da degradação ambiental.”11

Pois bem. Não cabe ao EIA dizer se deve ser efetivado ou não um

empreendimento. Ademais, não se conhece um EIA-RIMA que, mandado produzir

pelo próprio empreendedor, recomenda a não realização da obra ou do

empreendimento.

Observa-se que o importantíssimo estudo apresentado pela Fundação Gorceix,

aqui juntado (anexo 02 – livro encadernado em cor escura) é de matriz negativa.

Ou seja, quando a partir da pág. 266 alude-se aos impactos ambientais faz-se

a referência de que “como sistemática da redução da subjetividade desses impactos,

se procedeu o encaminhamento da citada “check list”, previamente elaborada, com

base em experiências de diversos estudos ambientais anteriores levados a efeito,

para adequada apreciação multidisciplinar, tendo sido a check list repassada a todos

os profissionais (participantes do presente estudo) em suas diferenciadas áreas de

atuação, de modo a permear discussões técnicas, análises e avaliações integradas,

sob diferentes enfoques e abordagens, no intuito de lograr a melhor avaliação

quanto à qualificação destes impactos, e até mesmo agregar sugestões e

complementações pertinentes (fls. 226)”.

Eis alguns impactos apontados pelo estudo:

a) Alteração da paisagem local (impacto negativo) – fls. 268; b) Supressão de solo

agrícola (impacto negativo) – fls. 268; c) Aumento da suscetibilidade à erosão

(impacto negativo) – fls. 269; d) Alterações das propriedades do solo (impacto

negativo) – fls. 270; e) Alteração da qualidade das águas superficiais (impacto

negativo) – fls. 270; f) Alteração da qualidade das águas subterrâneas (impacto

negativo) – fls. 270; g) Alteração da área de recarga (impacto negativo) – fls. 11 SANCHEZ, Luis Enrique. Obra citada, 2008, p. 93

Page 34: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

34

271; h) Alteração da qualidade do ar (impacto negativo) – fls. 273; i) Supressão

de vegetação (impacto negativo) – fls. 274; j) Perda de habitat e área de

alimentação (impacto negativo) – fls. 274; k) Estresse sobre fauna remanescente

(impacto negativo) – fls. 274; l) Retirada do Serviço Público do Centro da cidade

(impacto positivo e negativo) – fls. 275; m) Alteração do comércio local

(impacto negativo) – fls. 276; n) Aumento da pressão urbana nas

circunvizinhanças do Paço Municipal (impacto negativo) – fls. 276; o) Geração de

empregos (impacto positivo) – fls. 277; p) aumento de segurança (impacto

positivo) – fls. 277; q) Aumento do potencial turístico (impacto positivo) – fls.

277; r) Alteração do trânsito na Av. Alcoa (impacto negativo) – fls. 278; s)

Melhoria no sistema administrativo da cidade (impacto positivo) – fls. 278; t)

Redução dos custos da Administração municipal (impacto positivo) – fls. 279.

Grifos nossos

A final, mesmo com matriz negativa, o estudo propõe a viabilidade de um

empreendimento específico, o Paço Municipal, sem consideração especial do Centro

de Convenções, sem conhecimento de qualquer projeto, sem avaliação de sua fase

de implantação, desde que cumpridas as medidas recomendadas e mitigatórias (fls.

288). Ao que se constata, tais medidas, compensações, controles, construções, como

se sabe, registre-se mais uma vez, terão que ser impostas e controladas por um

órgão ambiental licenciador habilitado ao qual se dará a conhecer o estudo, efetivar

o procedimento, com ampla publicidade do mesmo.12

12 A doutrina é pacífica no sentido de que a publicidade do licenciamento ambiental “não é apenas requisito indispensável para eficácia do licenciamento ambiental, sem o que as licenças expedidas ao longo do processo não podem produzir efeitos.” In Álvaro Luiz Valery Mirra (MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Participação, processo civil e defesa do meio ambiente. São Paulo: Letras Jurídicas, 2011, p. 160).

Page 35: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

35

2.3. Relatórios de análise do Estudo da Fundação Gorceix por profissionais

técnicos.

O estudo apresentado pela Fundação Gorceix, anteriormente referido,

mereceu análise da Geóloga Ângela Maria Martins Marques dos Santos, graduada

pela UNESP e Mestre em Geociências pela USP-SP, que tem vindo publicamente

chamar os responsáveis ao debate técnico (vide artigo publicado em 29.06.2011 –

Jornal de Poços – cópia anexa – fls. 1047, 5º Volume)

No estudo estão indicados que a Fundação Gorceix contratou outras empresas

para execução do trabalho. Existem questionamentos acerca de danos ao patrimônio

público, que deverão ser apurados na esfera competente, em função da forma de

contratação, dispensa de licitação por notório saber e ARTs (fls. 675 do IC – 4º

Volume).

Lembrou-se ali que o trabalho da Fundação Gorceix não definiu e caracterizou

o empreendimento, seja em suas características físicas, seja quanto ao cronograma

de implantação e condições de funcionamento, nem o que será construído na área,

tempo de implantação e definição clara de uso. O Centro de Convenções já

anunciado, como a ser iniciado, não está previsto no estudo de forma concreta.

Depois de apontar inúmeros erros, incongruências, e dados incompletos do

Estudo, sobre a legislação municipal (fls. 677-IC), qualidade química das águas

superficiais (fls. 678-IC), inserção do empreendimento na sub-bacia do Ribeirão das

Vargens (fls. 680-IC), águas subterrâneas (fls. 682-IC), hidrogeologia local (fls. 688-

IC) e vulnerabilidade á contaminação (fls. 689-IC), passou-se à metodologia da

avaliação de impactos ambientais utilizada (fls. 689/705-IC e conclusões).

De outro ângulo, há presente nos autos análise urbanística (fls. 706/713-IC);

documento de análise social (fls. 714/715-IC) e sobre o meio biótico (fls. 716/717-

IC), que devem ser verificados, produzidos por profissionais habilitados, com ART,

apontando sérias incongruências no estudo.

Page 36: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

36

2.4. Perspectiva de impacto socioambiental regional. Porte e potencial

poluidor dos empreendimentos de construção do Paço Municipal e Centro

de Convenções. Construção de vias de acesso. Urbanização.

Já se referiu aqui que o conceito de impacto ambiental, o que veio nortear a

necessidade de criação do EIA/RIMA, é prevista no art. 1º da Resolução CONAMA

001/86.13 Aqui não estamos tratando, na questão discutida, de uma simples alteração

do meio ambiente, mas da perspectiva de uma degradação significativa aos meios

biótico e abiótico, com vários apontados aspectos de significativos impactos

negativos, como se verificou pelos estudos técnicos.

O art. 225 da Constituição Federal, em seu parágrafo 1º, IV, diz que “(...)

para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: IV - exigir, na

forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de

significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto

ambiental, a que se dará publicidade”.

O impacto do empreendimento torna-se regional porquanto atinge os recursos

hídricos de mais de um município (Poços de Caldas e Andradas) e tem área de

influência indireta em outros (Poços-MG, Andradas-MG, Caldas-MG, Águas da Prata-

SP).

Segundo Alvaro Luiz Valery Mirra a “significativa degradação do meio

ambiente”, ou “significativo impacto ambiental”, são conceitos indeterminados,

segundo os publicistas, carentes de preenchimento com dados da realidade. E alinha

sobre a questão:

13 Art. 1º . da Res. CONAMA 01/86. “Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I. a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II. as atividades sociais e econômicas; III. a biota; IV. as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V. a qualidade dos recursos ambientais.”

Page 37: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

37

“(...) cabe inicialmente ao órgão ambiental delimitar o conceito de degradação

ambiental “significativa”, ao lhe ser submetido um projeto de atividade

potencialmente causadora de degradação ambiental sujeita a licenciamento

ambiental, para em relação a ela, por suas peculiaridades ou pelas características

do meio afetado, exigir ou não o EIA.” 14

A Lei Complementar Municipal criou a presunção de significativo impacto

ambiental ante qualquer empreendimento e intervenção na ZONA DE

ADENSAMENTO RESTRITO. Conexionou-se tal realidade à necessidade do EIA-

RIMA, atrelando-se ao conceito de significativo impacto ambiental, que, via

conseqüencial, deve ser analisado dentro de um procedimento de licenciamento

ambiental clássico, por órgão ambiental competente.

Segundo a avaliação de impacto ambiental (EIA) apresentado pela Fundação

Gorceix (anexo) o estudo pioneiro sobre geologia do planalto de Poços de Caldas

(imagens abaixo) foi publicado por Derby, no Quaterly Journal, da Sociedade

Geológica de Londres, no qual se encontra a primeira referência sobre sua natureza

vulcânica (fls. 44 – anexo 02). Pode-se dizer que na boca de um vulcão extinto

encontram-se as hoje cidades de Poços de Caldas, Caldas, Águas da Prata e

Andradas (figura 03 – a seguir). Portanto esse planalto da cidade de Poços de

Caldas, tem uma especial feição geológica e geomorfológica na região sudeste do

Brasil, justamente em face dessa natureza vulcânica, constituindo-se por rochas

alcalinas. Trata-se, segundo estudos disponíveis sobre a região, de um maciço

alcalino relativamente novo, formado entre o neo Cretáceo e o Eoceno, com 80 a 60

milhões de anos.

14 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental: aspectos da legislação brasileira. 4 Ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2008, p. 37.

Page 38: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

38

Figura n. 07 Figura n. 08 Imagens presentes em Tese de Mestrado de Heber L. C. Alberti– 2008 UNICAMP.

O que proporciona aquilo que se tornou o grande atrativo turístico da cidade,

suas águas minerais e termais, estabelecem-se na presença de falhas tectônicas e

fraturamentos profundos e abertos, onde há condições para infiltração profunda de

águas meteóricas e para a formação daquelas águas termais.

Portanto, á área em questão, onde se pretende dar um novo implemento

urbano, apresentam características de recarga e descarga que estão diretamente

Page 39: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

39

ligadas às nascentes localizadas na depressão da cidade de Poços de Caldas, ou

exploradas através de poços tubulares.

Tratam-se de uma zona aqüífera rasa, uma zona aqüífera intermediária - ( 150

a 200m ), uma zona aqüífera de circulação profunda ( até 2700 m ), as duas

primeiras zonas estão relacionadas a maior parte das fontes frias e as águas

exploradas através de poços tubulares; à ultima zona estão associadas as fontes

termais. Como ressaltou a geóloga Ângela M. M. Marques dos Santos “a origem

destas fontes termais (Grupo Pedro Botelho e Macacos) e Quisisana Sulfurosa e

Sinhazinha, está relacionada a um extenso e profundo sistema de fraturas abertas,

do qual foram identificadas pelo menos 3 direções principais : N14°E, N50°E e E-W..

As duas primeiras estendem se desde a Serra de São Domingos, ao norte, até o vale

do Ribeirão das Vargens, ao sul; todo o leito do ribeirão Vai e Volta é

encaixado e controlado por uma destas fraturas (N 14° E), devendo

constituir uma zona preferencial de recarga que se estende até o vale do

ribeirão das Vargens, com o qual se intercomunica por fraturas

secundárias. A fratura E-W, coincide com o curso do Ribeirão dos Poços e se

interconecta com outras fraturas secundárias em direção à Serra de São Domingos.

As emergências das fontes termais coincidem como cruzamento ou interconexão

destas três fraturas principais. Como área de descarga deve-se considerar por

segurança toda a depressão urbana num raio de 1000m das fontes

termais.”15 Grifamos.

Portanto, as implicações dos empreendimentos previstos para o local e a

autorização para forma de implementação devem ser analisados por órgão ambiental

independente, dada a dimensão regional do impacto, mesmo que seja em conjunto

com o Município.

O processo de urbanização, de forma não racional e ordenada, avançando

sobre áreas produtoras de recursos naturais e mais propriamente hídricos, pode

15 Exposição sobre “A Geologia local e sua relação com os recursos hídricos: alguns aspectos de uso do solo”, em reunião com o Ministério Público, SUPRAM, Prefeitura Municipal e Comitê de Bacia do Moji-Guaçu-Pardo, na SUPRAM-SM – Varginha, em 30.03.2011.

Page 40: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

40

trazer danos irreversíveis e difícil recuperação numa sociedade moderna muito

marcada pela idéia do risco.

Nesse aspecto, José Rubens Morato Leite e Patyck de Araújo Ayala, aludem à

chamada “teoria da sociedade de risco”, como “característica da fase seguinte ao

período industrial clássico, representa a tomada de consciência do esgotamento

modelo de produção, sendo marcada pelo risco permanente de desastres e

catástrofes. Acrescente-se o uso do bem ambiental de forma ilimitada, pela

apropriação, e expansão demográfica, a mercantilização, o capitalismo predatório

– alguns dos elementos que conduzem a sociedade atual a situações de

periculosidade e de crise ambiental”. (...) “Há consciência da existência de

riscos, desacompanhada, contudo, de políticas de gestão, fenômeno

denominado de irresponsabilidade organizada” 16. Grifamos.

3. Pressupostos jurídicos.

3.1. Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Sadia qualidade de vida.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso

comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público

e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras

gerações, é o que conhecidamente dispõe o art. 225 da Constituição Federal.

É certo que os comandos constitucionais em análise, reduzem a

discricionariedade da Administração Pública, pois impõem ao administrador o

permanente dever de levar em conta o meio ambiente e de, direta e positivamente,

protegê-lo, bem como exigir seu respeito pelos demais membros da comunidade,

16 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patyck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. Teoria e prática. 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 113.

Page 41: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

41

abrindo ao cidadão a possibilidade de questionar “ações administrativas que de

forma significativa prejudiquem os sistemas naturais e a biodiversidade”.17

Os valores contrapostos são sempre os mesmos: empregos, obras

necessárias, desenvolvimento, recursos que não podem ser perdidos, exigência de

bom senso. No entanto, para concreção desses inegáveis benefícios, o que se requer

é a simples obediência à lei imposta pelas disposições constitucionais e ordinárias

pátrias, com atenção aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, e leis

impostas pelo próprio município.

Isso de forma a remeter ao Estado a autorização de atividades no local,

através de licenciamento ambiental competente, com produção de EIA-RIMA, que

está conexionado ao conceito de significativo impacto ambiental em função da área

tratada.

O art. 170 da Lei Orgânica do Município de Poços de Caldas, exige o

Licenciamento de atividades que causem degradação ambiental.18

Não basta a existência da norma, mas sua efetiva implementação pelos

órgãos responsáveis. O fato é que se as normas estão a regular uma ordem que está

posta em face de um campo de conflituosidade, de natureza coletiva,

consequentemente, tal sistematização legal, por si só, muitas vezes não gera, de

forma efetiva e natural, a prevenção e resolução dos danos ambientais e

socioculturais. É quando emergem os chamados deveres da implementação. A

17 BENJAMIN, Antônio Herman. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição Brasileira. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; José Rubens Morato LEITE. Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 75. 18 Art. 170 da Lei Orgânica de Poços de Caldas prevê que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, impondo-se ao Município e à coletividade o dever de defendê-lo e conservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º. Para assegurar a efetividade do direito a que se refere este artigo, incumbe ao Município, entre outras atribuições: (...) II - exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, licença de operação expedida pelo órgão ambiental competente; § 2º. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de obras ou atividades efetiva e potencialmente poluidoras, bem como as capazes de causar degradação do meio ambiente, dependerão, na forma da lei, de prévio licenciamento pelo órgão ambiental competente, devendo as licenças de instalação e operação ser apresentadas ao Município para a efetiva fiscalização.” O grifo é nosso. Disponível em: http://www.camarapocos.mg.gov.br/a_camara/lei_organica.php. Acesso em: 27.06.2011.

Page 42: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

42

implementação ambiental não vem exaurir-se nas atividades formais e funcionais

pertinentes à repressão, punição ou reparação, mas deverá estabelecer-se como

uma dinâmica efetiva, capilarizada, atenta ao princípio da ubiqüidade do direito

ambiental, tudo isso no sentido de concreção da legislação ambiental e

eficiência de seus instrumentos, com proibição de retrocesso.

3.2. Imposição legislativa do Licenciamento Ambiental. Presunção de

significativo impacto ambiental.

Como já lembrado, quando a Lei Complementar Municipal 84/2007, em

seu artigo 2º - parágrafo 2º, estabeleceu que para efeito do disposto no

parágrafo 1º (construção do Paço), “ficam estabelecidas as seguintes restrições: I. O

projeto para implantação do empreendimento deverá ser submetido ao

licenciamento ambiental no órgão competente, de acordo com o inciso XV do

art. 2º da Resolução CONAMA 001, de 23 de janeiro de 1986”, impôs o

licenciamento considerando a sensibilidade da área, a área de influência dos

empreendimentos, a repercussão do processo de urbanização e toda a participação

popular nas deliberações sobre a forma e indução do crescimento da cidade de

Poços de Caldas.

Hamilton Alonso Jr. salienta que “a competência para o licenciamento

ambiental das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras é questão de

debate acirrado na atualidade, pois os Estados que na frente dos Municípios se

organizaram para análise desse importante instrumento da política nacional do meio

ambiente vêem a ameaça de esvaziamento parcial de suas funções com a

organização, pelos entes federativos municipais, de suas próprias agências

licenciadoras”.19 Grifamos

19 ALONSO JR. Hamilton. Da competência para o licenciamento ambiental. In Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2 ed. FINK, Daniel Roberto; ALONSO JR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo. São Paulo: 2002, Forense Universitária. p. 38.

Page 43: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

43

Não é o caso aqui discutido. Enquanto o Estado de Minas Gerais tem uma

organização e estrutura licenciatória organizada, com capacitado corpo técnico,

regionalizado (o órgão situa-se em Varginha-MG), com os pareceres a serem

submetidos ao COPAM – Sul de Minas, que é órgão paritário e deliberativo, o

município de Poços ainda não efetuou sua organização criando a instrumentalização

necessária.20 O órgão próprio deveria ser o CODEMA, que é o mesmo que diz não

existir a ferramenta do licenciamento ao nível municipal.

No entanto, “como se nota pela análise do sistema brasileiro, essa função

preventiva do Poder Público, através do licenciamento ambiental não é uma

faculdade, mas, sim, um dever. Aliás, poder-dever (...)”21

Embora a doutrina aponte no sentido de que a competência administrativa

para licenciar é comum entre União, Estado e Municípios (art. 23 – VI – da CF), “(...)

o município é competente (para o licenciamento ambiental), posto que ninguém

nega ao mesmo sua competência exclusiva (...) e sua integração ao Sistema

Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA”22 há quem defenda o contrário.

No entanto, um dos ícones do estudo do direito ambiental no Brasil, por sua

construção doutrinária e prática do sistema de licenciamento ambiental hoje em

atividade no Brasil, Dr. Antônio Inagê de Assis Oliveira, ao abordar o licenciamento

pelos municípios, chega a sustentar o seguinte:

20 No Estado de Minas Gerais, a competência para os atos de licenciamento ambiental foi atribuída ao Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), órgão criado pelo Decreto Estadual nº 18.466/77 como Comissão Estadual de Política Ambiental. Atualmente, a estruturação e funcionamento do COPAM estão disciplinados pelo Decreto nº 44.316/06 e pela Lei Delegada nº 178/07. O COPAM é um órgão colegiado, normativo, consultivo e deliberativo, que se subordina à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD). A sua estrutura, fundamentada em um sistema colegiado, consagrou a fórmula do gerenciamento participativo, inovando a forma de organização de conselhos governamentais. Os pedidos de licença ambiental para a implantação e funcionamento de quaisquer empreendimentos, independentemente de seu porte ou potencial poluidor são apreciados e decididos no âmbito das Unidades Regionais Colegiadas (URCs), em sessões plenárias itinerantes, que se realizam mensalmente, cada vez em um Município de circunscrição da URC. O assessoramento técnico e jurídico das URCs é feito pela SEMAD, por meio das Superintendências Regionais de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, as SUPRAMs, consideradas órgãos seccionais de apoio ao COPAM. Atualmente são dez as URCs no Estado de Minas Gerais, sendo que sede e circunscrição de cada uma estão estabelecidas no anexo do mencionado Decreto. Além disso, cada URC é composta por, no máximo, vinte membros designados pelo Presidente do COPAM, observado o critério paritário de representações. 21 ALONSO JR. Hamilton. Obra citada, 2002, p. 40. 22 ALONSO JR. Hamilton. Obra citada, 2002, p. 44.

Page 44: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

44

“(...) A Resolução CONAMA n. 001/86, que se propunha a estabelecer os critérios

básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto

Ambiental, como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, mas

que, na prática, terminou por regulamentar apenas uma ferramenta do licenciamento

ambiental (o estudo de impacto ambiental – que se utiliza de métodos de AIA),

emprega várias vezes da expressão “quando couber, o Município” (...). Esse

fato, que apenas disponibiliza o uso dessa ferramenta pelos municípios,

tendo em vista a emissão das licenças edilícias, causou, em alguns, a errônea

impressão que os Municípios teriam competência para a outorga do

licenciamento”.23 Grifamos

“Ao município não foi outorgada esta competência, que há de ser

expressa”.24 Chega o renomado professor e advogado a defender que os

dispositivos da Resolução CONAMA 237/97, que conferem aos municípios capacidade

para emitir licenças ambientais, são absolutamente inválidos, com o apontamento da

inconstitucionalidade do art. 6º da Res.25

É inegável que em função da interpretação histórica (as atas e audiências

apontam nesse sentido), sistemática e lógica do dispositivo legal previsto na

legislação municipal, impondo a necessidade do licenciamento, o EIA-

RIMA, e agregando-o às disposições da Resolução CONAMA 001/86, para

qualquer construção na área, é de se exigir a competência do licenciamento

para o âmbito estadual, de forma a dar concreção legislativa à lei citada, e em

função das realidades jurídicas e fáticas demonstradas.

23 OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. O licenciamento ambiental. São Paulo: Iglu, 1999, p. 108-109. 24 OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. Obra citada, 1999, p. 109. 25 OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. Obra citada, 1999, p. 111.

Page 45: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

45

Ademais, a Lei 8.666/93 (Lei de Licitações), em seu art. Art. 7.º prevê que

“as licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão

ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência: I - projeto

básico; II - projeto executivo; III - execução das obras e serviços. § 1o A

execução de cada etapa será obrigatoriamente precedida da conclusão e

aprovação, pela autoridade competente, dos trabalhos relativos às etapas

anteriores, à exceção do projeto executivo, o qual poderá ser desenvolvido

concomitantemente com a execução das obras e serviços, desde que também

autorizado pela Administração. § 2o As obras e os serviços somente poderão ser

licitados quando: I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e

disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório; II -

existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os

seus custos unitários; III - houver previsão de recursos orçamentários que

assegurem o pagamento das obrigações decorrentes de obras ou serviços a serem

executadas no exercício financeiro em curso, de acordo com o respectivo

cronograma; IV - o produto dela esperado estiver contemplado nas metas

estabelecidas no Plano Plurianual de que trata o art. 165 da Constituição Federal,

quando for o caso”.

Já o art. 12 prevê, que “nos projetos básicos e projetos executivos de obras e

serviços serão considerados principalmente os seguintes requisitos: (Redação dada

pela Lei nº 8.883, de 1994) – (...) VII - impacto ambiental”.

Não se tem conhecimento se o licenciamento ambiental terá como base o

estudo da Gorceix (EIA-RIMA?) apresentado, ou se a CODEMIG, que fará licitação

anunciada para início de um empreendimento – Centro de

Convenções – efetuará projeto básico adequado ao licenciamento. Haja vista que os

estudos de impacto ambiental deverão preceder ao projeto básico, como seus

resultados terão influência direta na elaboração do projeto executivo. Não há

Page 46: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

46

qualquer consonância entre as obras, que já se anunciam, licenciamento e

obediências aos ditames da Lei de Licitações.

3.3. Licenciamento que poderá ser efetivado de forma conjunta pelo

Estado e pelo Município. Autolicenciamento pelo município. Ausência de

neutralidade.

No caso concreto, não se torna viável que o órgão licenciador seja o

município, ou uma Secretaria Municipal - que inclusive determinou a efetivação de

EIA - pessoa jurídica de direito público, assuma o papel de órgão analítico dos

projetos como o Paço Municipal, vias rodoviárias de acesso e Centro de Convenções,

a serem instalados na área que tem influência direta em outros municípios com

Andradas, por exemplo.

É inaceitável a situação de insegurança criada quando o órgão licenciador

(que ao se parece será o município) se coloca como agência licenciatória e

proponente dos empreendimentos.

Nesse aspecto vale a consideração de Hamilton Alonso Jr. “ao licenciar a si

própria a Administração atenta contra os princípios da impessoalidade e

moralidade previstos na Lei Maior (art. 37 da CF), contaminando o processo de

licenciamento em face do contraste gritante do senso comum e do interesse

coletivo com a conduta administrativa perpetrada, pois, em sã consciência,

ninguém pode admitir a dúplice função administrativa”.26 Grifo nosso

Em decisão inédita a Desembargadora Federal Consuelo Yatsuda Moromizato

Yoshida, “teve a oportunidade de manifestar-se em sentido contrário ao citado

dispositivo (art. 7º da Res. 237/1997), nos autos que envolviam o licenciamento para

26 ALONSO JR. Hamilton. O autolicenciamento ambiental. In Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2 ed. FINK, Daniel Roberto; ALONSO JR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo. São Paulo: 2002, Forense Universitária. p. 68.

Page 47: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

47

construção do Rodoanel, sustentando a necessidade de fazer o licenciamento

conjunto entre o Estado de São Paulo e IBAMA”.27

De outro quadrante, o licenciamento formal torna-se premente ante a

constatação de que não existiu, no caso presente, a confecção do Estudo de

Impacto de Vizinhança – EIV: esse sim, no caso, a cargo do Município. No

entanto, não há existência prática desse instrumento também no município, sequer

na legislação municipal.

Para efetivar o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado (art. 225 da CF) e o bem-estar dos habitantes da cidade, escopo da

política urbana (art. 182, § 2º, da CF), exige a Constituição Federal a realização de

estudos ambientais, como o Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança (EIV), e

o licenciamento ambiental da atividade, nos termos doa art. 225, § 1º, inc. IV, da

Constituição Federal. (destacamos): Art. 225 [...] Com os mesmos objetivos o art.

4º, inc. V, alínea “c”, e inc. VI, bem como o art. 36, ambos da Lei nº 10.257/2001

(Estatuto da Cidade) institui e prevê o Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança

(EIV): Art. 4º. Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:

[...] V – institutos jurídicos e políticos: [...] c) limitações administrativas; [...] VI –

estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto de

vizinhança (EIV). Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades

privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo

prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de

construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.

3.4. Prequestionamentos

Em observância ao postulado constitucional da necessidade de fundamentação

das decisões judiciais, previsto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal, bem

27 SIRVINKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 164-165.

Page 48: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

48

assim nos arts. 165, 458, inc. II e 435, do Código de Processo Civil e, ainda, para

fins de preenchimento dos requisitos de admissibilidade de recurso especial e

extraordinário, necessário alinhar que houve contrariedade aos seguintes

dispositivos:

Constituição Federal: a) Art. 225 – caput – da CF; b) Art. art. 225, parágrafo 1º,

incisos I, III, IV, da CF; c) Art. art. 23 – VI – da CF; d) Art. 37 da CF;

Legislação Federal: a) Arts. 1º, incs. I, IV e VI, 3, 11, 12 e 21, da Lei nº 7.347/85

(Lei da Ação Civil Pública); b) Arts. 334, inc. I, e 461, §§ 3º ao 5º, do Código de

Processo Civil; c) Art. 3º, parágrafo único – inciso V da Lei 6.766/1979 (Lei do

Parcelamento do Solo) ; d) Arts. 2º, incs. III, VII, VIII e IX, 3º, incs. II, III e IV, 4º,

inc. I e VII, 5º, 10, 14, § 1º, 56 da Lei nº 6.938/1981 (Lei de Política Nacional do

Meio Ambiente); e) Arts. 17, 18 e 19, do Decreto nº 99.274/1990 (Regulamenta as

Leis nº 6.902/1981 e a 6.938/1981); f) Arts. 2º, 7º da Res. CONAMA 01/86, art. 1º,

inc. I, 2º, 6º, e 8º, incs. I, II e III, da Resolução CONAMA nº 237/1997

(Regulamenta o Licenciamento Ambiental); g) Art. 7.º, - parágrafos 1º e 2º, e 12º -

inciso VII - da Lei 8.666/93 – Lei de Licitações; h) Art. 2º, inc. VI, a, b, c, d, e g, 4º,

inc. V, alínea “c”, e art. 36, 38, 39, da Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade);

Legislação Estadual: a) Lei 10.793/92 – art. 4º – inciso VI – aliena “a”; b)

Deliberação Normativa COPAM nº 102, de 30 de Outubro de 2006; c) Deliberação

Normativa COPAM 74/2004, arts. 3º e 4º; d) Decreto Estadual N. 18.466/77 e

Decreto 44.316/06;

Legislação Municipal: a) Lei Complementar nº 074 publicada em 29/12/2006 -

Plano Diretor, de autoria do; b) A Lei Complementar Municipal n. 84/2007; c) Art.

170. Inciso II – parágrafo 2º da Lei Orgânica do Município de Poços de Caldas.

Page 49: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

49

4. Dos Pedidos.

4.1. Pedidos imediatos. Liminar.

O pedido liminar tem apoio nos arts. 11 e 12 da Lei nº 7.347/1985 (Lei da

Ação Civil Pública) (destacamos): Art. 11. Na ação que tenha por objeto o

cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento

da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob

pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente

ou compatível, independentemente de requerimento do autor. Art. 12. Poderá o

juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão

sujeita a agravo. Referido dispositivo deve ser lido em conjunto com o art. 84, § 3º,

da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), que é aplicável a ação civil

pública por força do art. 21 da Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública)

(destacamos): Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação

de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou

determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do

adimplemento. [...] § 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo

justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a

tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu. § 4° O juiz poderá, na

hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de

pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo

razoável para o cumprimento do preceito. § 5º Para a tutela específica ou para a

obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas

necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas,

desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força

policial.

Pelo exposto, a citação dos réus pode tornar ineficaz a medida liminar adiante

pleiteada, dada a urgência dos pedidos que baseiam a necessidade de concessão

imediata da tutela, pelo que se requer a concessão inaudita altera parte.

Page 50: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

50

Estão, de outro ponto, fartamente indicados, a existência de elementos

inerentes à urgência, à verossimilhança do direito alegado e o perigo na demora. Há

o fundado temor de que, não sendo deferido o pleito in limine, sem embargo da

manifesta presença dos pressupostos, qual sejam a “fumaça do bom direito” e o

“perigo da demora”, possam ocorrer atos – que já se anunciam de forma expressa -

que frustrem totalmente o pedido e a conseqüente tramitação do feito, lesionando,

por todo o exposto, direitos coletivos e ocasionando o perigo de dano irreparável ou

de difícil reparação.

4.1.1. Dessa forma a tutela específica que se pleiteia consiste em impor ao

Segundo Réu (Município de Poços de Caldas) o cumprimento da legislação

ambiental, que implica na obrigação liminar de não fazer, consistente em não operar

qualquer atividade formalizadora de intervenção, desafetação, doação de área ou

construção, visando início de qualquer empreendimento, na chamada Zona Rural

de Proteção Ambiental – ZRPA – e Zona de Adensamento Restrito – ZAR

(área 05) – previstas no Plano Diretor de Poços de Caldas, e Lei Complementar

Municipal 84/2007, art. 2º, sem as devidas autorizações e licenças emitidas através

de licenciamento ambiental clássico (Deliberação Normativa 74/2004, Resoluções

CONAMA 001/86 – art. 5º, 9º; 237/1997, art. 1º - inciso I, art. 8º, 10º, 14º, 18º; e

Lei 6938/81), via órgão ambiental competente qual seja a SUPRAM/COPAM - Sul de

Minas (1º Réu), sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000.000,00 (dez

milhões de reais), nos moldes do artigo 13 da Lei n.º 7.347/85, sendo que os

valores, cobrados sob este título, deverão ser revertidos ao Fundo Estadual de

Defesa dos Direitos Difusos (FUNDIF).

4.1.2. Em face do 1º Réu (Estado de Minas Gerais) requer seja imposta

liminarmente a obrigação de fazer, no sentido de assumir a regularização

ambiental, por parte da SUPRAM-Sul de Minas, através da imposição de condução de

procedimento de licenciamento ambiental clássico (Deliberação Normativa 74/2004,

Page 51: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

51

Resoluções CONAMA 001/86 – art. 5º, 9º; 237/1997, art. 1º - inciso I, art. 8º, 10º,

14º, 18º; e Lei 6938/81), com obrigatoriedade de exigir-se, ao proponente de

projeto, a Avaliação de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), em razão de

empreendimentos pertinentes à construção do Paço Municipal, Centro de

Convenções, e consequentes aberturas de acesso rodoviário, na chamada Zona

Rural de Proteção Ambiental – ZRPA – e Zona de Adensamento Restrito –

ZAR (área 05) – Zona Sul, previstas no Plano Diretor de Poços de Caldas e Lei

Complementar Municipal 84/2007, art. 2º, sob pena de pagamento de multa no valor

de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), nos moldes do artigo 13 da Lei

n.º 7.347/85, sendo, também, que os valores cobrados sob este título deverão ser

revertidos ao Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos (FUNDIF).

4.2. Pedidos mediatos. Procedência.

4.2.1. Requer-se a procedência final, de forma que ao Segundo Réu

(Município de Poços de Caldas), seja imposto o cumprimento da legislação

ambiental, com proibição de retrocesso, que implica na obrigação de não fazer,

consistente em não operar qualquer atividade formalizadora de intervenção,

desafetação, doação de área ou construção, visando início de qualquer

empreendimento, na chamada Zona Rural de Proteção Ambiental – ZRPA – e

Zona de Adensamento Restrito – ZAR (área 05) – previstas no Plano Diretor de

Poços de Caldas, e Lei Complementar Municipal 84/2007, art. 2º, sem as devidas

autorizações e licenças emitidas através de licenciamento ambiental clássico, via

órgão ambiental competente qual seja a SUPRAM/COPAM - Sul de Minas (1º Réu),

sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de

reais), nos moldes do artigo 13 da Lei n.º 7.347/85, sendo que os valores, cobrados

sob este título, deverão ser revertidos ao Fundo Estadual de Defesa dos Direitos

Difusos (FUNDIF).

Page 52: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

52

4.2.2. Da mesma forma, requer-se a procedência final, de molde que ao 1º

Réu (Estado de Minas Gerais), seja imposta a obrigação de fazer, no sentido

de assumir a regularização ambiental, por parte da SUPRAM-Sul de Minas, através da

imposição de condução de procedimento de licenciamento ambiental clássico, em

razão de empreendimentos pertinentes à construção do Paço Municipal, Centro de

Convenções, e consequente abertura de acessos rodoviários, na chamada Zona

Rural de Proteção Ambiental – ZRPA – e Zona de Adensamento Restrito –

ZAR (área 05) – Zona Sul, previstas no Plano Diretor de Poços de Caldas e Lei

Complementar Municipal 84/2007, art. 2º, sob pena de pagamento de multa no valor

de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais), nos moldes do artigo 13 da Lei

n.º 7.347/85, sendo, também, que os valores cobrados sob este título deverão ser

revertidos ao Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos (FUNDIF).

4.2.3. Requer-se, ainda, seja imposto ao 2º Réu (Município de Poços de

Caldas) a obrigação de elaboração de EIV – Estudo de Impacto de Vizinhança

– para qualquer empreendimento a ser construído na chamada Zona Rural de

Proteção Ambiental – ZRPA – e Zona de Adensamento Restrito – ZAR (área 05) –

Zona Sul, prevista no Plano Diretor de Poços de Caldas, dentro das disposições dos

arts. 37 – caput – e parágrafo único, e 38 do Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001).

4.2.4. Requer-se que, por todo o exposto de ordem fática e jurídica, a

chamada Zona Rural de Proteção Ambiental – ZRPA, conforme disposições

do Plano Diretor de Poços de Caldas (Lei Complementar 74/2006, Lei

5.488/1994), seja declarada como espaço territorial especialmente

protegido, nos termos do art. 225 - 1º, inciso III, da Constituição Federal.

Page 53: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

53

4.2.5. Seja intimado da decisão liminar o Superintendente da SUPRAM Sul de

Minas, Dr. Luciano Junqueira Melo - Avenida Manoel Dias, 145 – Bairro Industrial JK -

CEP 37062-480 – Varginha/MG, e o DD. Diretor Presidente da CODEMIG, Exmo. Sr.

Dr. Oswaldo Borges da Costa Filho - Rua Aimorés, 1697 – Lourdes - CEP 30140-071

– Belo Horizonte/MG.

4.2.6. Seja determinada a citação dos requeridos, por oficial de justiça, para,

querendo, contestar o pedido, cientificando-lhes que a ausência de defesa implicará

revelia e, então, reputar-se-ão como verdadeiros os fatos articulados nesta inicial.

4.2.7. Seja julgado procedente o pedido, tornando definitiva a liminar

pretendida.

4.2.8. O Ministério Público provará o alegado por todos os meios de prova

legalmente admitidos, notadamente documental, pericial e testemunhal.

4.2.9. Malgrado inestimável atribui-se à causa o valor de R$ 10.000.000,00

(dez milhões de reais).

Termos em que aguarda deferimento.

Belo Horizonte/Lavras/Poços de Caldas, 06 de julho de 2011

Bergson Cardoso Guimarães

Promotor de Justiça – Coordenador Regional das Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente

da Bacia do Rio Grande – CRRG

Avenida Ernesto Matioli, 960 – Bairro Santa Efigência – Lavras – MG

CEP. 37.200-000 - (Designação para atuação no feito pela Portaria 549/2011 – publicada em

12.03.2011 – Inquérito Civil 0518.08.000037-6 – Poços de Caldas e N. 0382.11.000051-2 –

Coordenadoria Regional/Lavras)

Page 54: Acp poços caldas licenciamento plano diretor 10

54

DOCUMENTOS ANEXOS

Seguem juntos a esta petição de Ação Civil Pública, em 54 (cinquenta e quatro)

laudas, os seguintes documentos:

a) Inquérito Civil N. MPMG 0518.08.000037-6 (PJ Poços de Caldas) e N. MPMG

0382.11.000051-2 (Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça do Meio

Ambiente da Bacia do Rio Grande), em 05 (cinco) volumes.

b) Anexos 01, 02 e 03.

c) Volume encadernado de AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL (EIA) efetuado

pela Fundação Gorceix, em 305 páginas com anexos.