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Volume X DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL Estudo de Caso – Japaratinga (AL) Turismo e agricultura familiar Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento Local

Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento Local ... · introdutório, apresenta os conceitos básicos e a evolução dos trabalhos realizados. O segundo discorre sobre o

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Volume X DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL Estudo de Caso – Japaratinga (AL) Turismo e agricultura familiar

Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento Local

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Coletânea

Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento Local

Volume X

DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL

Estudo de Caso – Japaratinga (AL)

Turismo e agricultura familiar

Janeiro – 2014

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BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO

FUNDO MULTILATERAL DE INVESTIMENTOS Especialista Setorial

Ismael Gillio

INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL Superintendente Geral

Paulo Timm

Coordenador Geral do Programa Micro APP Alexandre C. de Albuquerque Santos

Coordenador Adjunto

Gil Soares Junior

Equipe Técnica de Campo Anna Claúdia Farias

Bernardo Mercante Marques Leonardo Lins

Publicação

Coordenação Geral Karin Segala

Redação

Bernardo Mercante Marques

Coordenação Editorial Sandra Mager

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Segala, Karin (Coord.) S454 Desenvolvimento local sustentável: estudo de caso Japaratinga (AL): turismo e agricultura familiar. / [coordenação de] Karin Segala; [redação de] Andrea Pitanguy de Romani – Rio de Janeiro: IBAM; Fomin/BID, 2014. (Coletânea Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento Local, v.10) 28p. 1.Desenvolvimento local sustentável, turismo, agricultura familiar – Japaratinga (AL). I. Instituto Brasileiro de Administração Municipal. II. Banco Interamericano de Desenvolvimento. Fundo Multilateral de Investimentos. III. Título. CDU 364:81

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APRESENTAÇÃO

Este conjunto de publicações sintetiza os mais importantes aprendizados e, sobretudo, informações e conhecimentos produzidos, sistematizados e agregados à experiência do Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM decorrentes dos quatro anos de parcerias com o Fomin/BID (Fondo Multilateral de Inversiones/Banco Interamericano de Desenvolvimento) no Programa de Promoção de Microalianças Público-Privadas municipais.

Estruturada em fascículos, a série inclui os estudos e experiências mais expressivos, sobretudo, pelas lições aprendidas e níveis de amadurecimento resultantes das iniciativas. Todas as informações produzidas estão disponíveis no portal do Programa na internet: www.aliancaspublicoprivadas.org.br

A árvore de conhecimento que orientou a organização da coletânea segue o esquema:

1 – A cooperação entre os setores público, privado e o terceiro setor nos

municípios – um balanço das ações do Programa Alianças Público-Privadas

2 – Marco Legal das Alianças Público-Privadas

3 – Guia de Procedimentos para a constituição de uma

Aliança Público-Privada

4 – Coleta Seletiva

Inclusiva no Contexto das

Alianças Público-Privadas

6 – Gestão Integrada de

Resíduos Sólidos em Região de Fronteira

8 – Mecanismos de Desenvolvimento

Limpo Programático – uma oportunidade

para as Alianças Público-Privadas

9 – Desenvolvimento Local Sustentável –

distintas oportunidades de Alianças Público-

Privadas

5 – Estudo de caso de Ilhéus

(BA) – múltiplas

parcerias para a inclusão produtiva

7 – Estudo de caso de Ponta

Porã (BR) e Pedro Juan

Caballero (PY) – um aterro binacional

10 – Estudo de caso de

Japaratinga (AL) – turismo e agricultura

familiar

11 – Estudo de caso de Ponta Porã (MS) –

Convention & Visitors Bureau

Os três primeiros fascículos tratam dos fundamentos do Programa. O primeiro, introdutório, apresenta os conceitos básicos e a evolução dos trabalhos realizados. O segundo discorre sobre o marco legal, ao mesmo tempo em que traça um panorama

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geral dos instrumentos jurídicos de cooperação a partir do próprio setor público e até as relações com a iniciativa privada e o terceiro setor. O terceiro é um guia de procedimentos para a construção e implementação de uma Aliança Público-Privada (APP), um instrumento de balizamento geral que deve ser adaptado a cada situação.

Os cinco fascículos seguintes compõem o quadro da Política Nacional de Resíduos Sólidos e afetam diretamente as responsabilidades dos Municípios nesta matéria.

O quarto trata especificamente da implantação da coleta seletiva e das diretrizes associadas à inclusão socioprodutiva dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis no âmbito do panorama nacional para o setor. Nesse sentido, destaca-se a possibilidade de uma abordagem inovadora para as APPs, detalhada no estudo de caso de Ilhéus, tema do fascículo cinco. Em outro extremo, no fascículo seis, o foco é a questão da destinação final dos resíduos no cenário desafiante das conurbações existentes em faixa de fronteira. O sétimo texto discute as possibilidades de enfrentamento dessas dificuldades segundo as experiências nas cidades fronteiriças de Ponta Porã, no Brasil, e Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Finalmente, ainda no campo dos resíduos sólidos, o fascículo oito examina as oportunidades para ampliar o potencial do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo Programático no âmbito da constituição de APPs.

Os fascículos nove, dez e onze analisam a promoção do desenvolvimento econômico local e territorial dentro da perspectiva de adoção de APPs, entendida como estratégia de inserção socioprodutiva de segmentos sociais distintos.

Assim, o fascículo nove trata da questão desde um ponto de vista conceitual e os dois textos finais ilustram situações distintas por meio de estudos de casos realizados no âmbito do Programa. O décimo aborda o segmento social de agricultores familiares e periurbanos em uma região afetada intensamente pela expansão do turismo no litoral norte de Alagoas e apresenta as parcerias constituídas no Município de Japaratinga, fundamentais para a inserção daquelas pessoas na cadeia do turismo. O último fascículo também tem a cadeia produtiva do turismo como pano de fundo, especificamente a estruturação de um Convention&Visitors Bureau em Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, ação que mobilizou os empresários do trade dos Municípios conurbados, Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, e abriu caminho para a ação conjunta com o Poder Público Local.

Boa leitura!

Alexandre Carlos de Albuquerque Santos Coordenador Geral Programa de Microalianças Público-Privadas

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ........................................................................................................5

SUMÁRIO.....................................................................................................................7

1. DEFININDO OS ELEMENTOS CENTRAIS DO PROGRAMA...................................8

O que é o projeto?.....................................................................................................8

O desafio da comercialização..................................................................................12

Qual será o público-alvo atendido pelo projeto?......................................................13

2. Metodologia de Execução.......................................................................................14

Planejamento: uma etapa essencial ........................................................................14

Busca de soluções ..................................................................................................18

Formação de Parcerias– articulação e integração dos atores envolvidos................19

3. A criação de uma APP............................................................................................21

Os instrumentos jurídicos de criação de uma APP..................................................22

Sistema de Governança..........................................................................................24

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA..................................................................................26

Anexo PROTOCOLO DE INTENÇÕES ......................................................................27

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1. DEFININDO OS ELEMENTOS CENTRAIS DO PROGRAMA

O que é o projeto?

O Programa de Fortalecimento das Instituições Públicas e do Fortalecimento da Agricultura Periurbana do Litoral Norte de Alagoas, financiado com recursos do BID/FOMIM, executado pelo IBAM e pela DESENVOLVE – Agência de Fomento de Alagoas – tem como objetivo central auxiliar na melhoria da gestão de 13 prefeituras, assim como fomentar a comercialização da produção entre agricultores e empresários do setor turístico por maio de alianças cooperativas. Também buscou incentivar a participação do programa governamental de compras públicas, destinado igualmente a potencializar a produção agrícola local.

A área contemplada pelo Programa constitui, em parte, a comumente denominada Costa dos Corais, e abriga Municípios localizados nas microrregiões de Maceió (Paripueira e Barra de Santo Antônio), do Litoral Norte (Japaratinga, Maragogi, Passo de Camaragibe, Porto de Pedras e São Miguel dos Milagres) e da Mata Alagoana (Porto Calvo, São Luís Quitunde, Matriz de Camaragibe, Jundiá, Jacuípe e Campestre)1.

Figura 1 – Municípios que integram o Programa de Fortalecimento das Instituições Públicas e do Fortalecimento da Agricultura Periurbana do Litoral Norte de Alagoas.

1Apenas para facilitar a referência aos Municípios que participaram do programa, daqui por diante, quando nos referirmos ao litoral norte alagoano, estamos na verdade nos referindo aos 13 Municípios, incluindo os pertencentes a microrregião chamada ‘mata alagoana’.

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Desses treze Municípios, seis são costeiros e destacam-se pelas suas belezas naturais exuberantes como praias, mangues e falésias consideradas belíssimas, além dos recifes de corais que representam um expressivo estoque de biodiversidade marinha. Esse conjunto de atrativos naturais associados às facilidades de acesso à capital do estado de Alagoas, Maceió, e a Recife, capital do Estado de Pernambuco, representam vetores de expansão da atividade turística que marca as transformações dessa porção do território. Ali se localizam grandes investimentos do empresariado que compõem o trade turístico (hotéis, resorts, pousadas, restaurantes etc.) em processo de grande expansão.

Figura 2 – Fluxos de interesse turístico na microrregião do Litoral Norte de Alagoas.

Por outro lado, os Municípios localizados no interior, se caracterizam pela ruralidade, especialmente pela presença da monocultura sucroalcooleira, atividade econômica tradicional da região,da agricultura familiar e a economia urbana caracterizada pelo protagonismo do setor de serviços e comércio.

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Figura 3 – Visão panorâmica de uma fazendo produtora de cana-de-açúcar na região do Litoral Norte de Alagoas.

Com efeito, o potencial de integração das cadeias produtivas do turismo e da agricultura familiar – esta última característica ainda existente na região – se encontra subestimado do ponto de vista da produção de sinergias econômicas que possam realizar nos Municípios contemplados: uma rede permanente e constante de oferta de produtos agrícolas para o consumo regional especialmente os estabelecimentos voltados para a prestação de serviços turísticos que, como vimos, representam um mercado em expansão.

Figura 4 – Litoral da região do Litoral Norte de Alagoas, também conhecida como Costa dos Corais.

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A importância da agricultura familiar na região é inquestionável visto que de 32,7% da população da região da Costa dos Corais ainda reside em zonas rurais de seus Municípios. Essa região possui aproximadamente 1.404 propriedades caracterizadas como sendo de atividade agrícola familiar, onde se encontram 2.643 famílias assentadas2.

Figura 5 – Distribuição da população residente nos treze Municípios do Programa de Fortalecimento das instituições Públicas e do Fortalecimento da Agricultura Periurbana do Litoral Norte de Alagoas, IBGE, 2010.

Dentro deste cenário, é sabido, através de inúmeras experiências de organização da comercialização e da produção dos agricultores familiares, que a emergência de pontos de vendas, coletivização da produção através de arranjos cooperativos, transformação e certificação de produtos, além da melhora na logística de circulação das mercadorias, representam um ganho estratégico na dinâmica produtiva desses agricultores, além de significar ganhos expressivos nas economias locais.

Outro elemento importante na matriz do programa se refere ao papel do poder público local, através, especialmente, das prefeituras municipais. Para que as sinergias esperadas entre as cadeias produtivas do turismo e da agricultura familiar possam se integrar de modo sustentável e sistêmico em todos os seus aspectos produtivos – produção, circulação, comercialização – as prefeituras municipais aparecem como atores sociais e institucionais determinantes na adequada implantação de alianças entre o poder público e o setor privado.

2 Censo Agropecuário IBGE, 2010.

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Nesse sentido, é necessária a construção de um ambiente institucional favorável à criação de alianças entre o poder público e o setor privado para, por um lado, gerar oportunidades para pequenos e médios produtores rurais, e por outro promover investimentos e serviços que necessitem de recursos públicos.

A execução do Programa de Fortalecimento das Instituições Públicas e Desenvolvimento da Agricultura Periurbana no Litoral Norte de Alagoas foi dividida em três momentos distintos: o primeiro, diz respeito ao reconhecimento do universo regional, onde foram identificadas potencialidades e debilidades da realidade institucional das 13 prefeituras contempladas pelo projeto; num segundo momento, munidos dos diagnósticos individuais das respectivas prefeituras, o projeto previa a realização de diagnóstico para avaliação das áreas financeira e tributária; uma avaliação dos instrumentos de gestão do território; verificação das condições para o estabelecimento de políticas públicas de fomento ao desenvolvimento econômico; análise de possibilidades de alianças público-privadas no território e avaliação das condições de associativismo intermunicipal. Em um terceiro momento, estavam previstas ações com objetivo de implementar os arranjos institucionais para o fortalecimento das municipalidades através da mobilização dos atores sociais envolvidos no projeto.

O objetivo dessa publicação é compartilhar a metodologia empregada na execução desse programa, tentando sempre que possível salientar ao leitor as potencialidades e desafios relacionados à execução de projetos que visam a comercialização da produção de pequenos agricultores. Assim, estruturamos essa publicação através da utilização de perguntas orientadoras que possam auxiliar os leitores e leitoras no planejamento de ações de projetos que tenham escopos parecidos com o implementado.

O desafio da comercialização

Muitos são os programas federais ou estaduais ligados ao incentivo aà produção de pequenos agricultores espalhados por todo o Brasil. Entre outros, podem se destacar: o PRONAF, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, o PAIS, Produção Agroecológica Integrada e Sustentável, o PAA, Programa de Aquisição de Alimentos, além do Programa Nacional de Sementes para a Agricultura Familiar. Embora todos tenham suas contradições, ora extremamente burocráticos no que se referem ao acesso dos agricultores familiares, ora pela ineficiência da execução de seus parceiros-gestores, como os Municípios, estas são iniciativas notadamente reconhecidas por seus êxitos especialmente no que se referem ao fomento à produção. Contudo, um elemento importante dessa cadeia nem sempre é contemplado: a comercialização.

O binômio produção-comercialização, não apenas no Brasil, como no resto do mundo, representa um dos maiores desafios do produtor rural não apenas no ambiente rural como também nas atividades econômicas reconhecidas como sendo industriais localizadas de um modo geral nas áreas urbanas. Dentro desse escopo, a chamada logística de comercialização representa, de modo quase que banal, um dos maiores problemas no fomento de atividades econômicas no âmbito das políticas públicas. Ou seja, de que adianta no interior do Município de Japaratinga, em Alagoas, ser produzida a

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tão renomada própolis vermelha3, cujo valor de mercado pode chegar a R$ 500,004 o quilo, se não se consegue articular essa produção com o mercado consumidor?

Parte desses desafios devem ser enfrentados sob a ótica das políticas públicas, contudo uma vez que sua execução pode acarretar em um tempo hábil excedente aos desejos locais dos produtores, podemos afirmar que os arranjos envolvendo produtores, poder público – seja ele local, estadual ou federal – além dos consumidores, pode sim ser uma alternativa para a dinamização tanto da produção quanto da comercialização. Nesse caso, as alianças público-privadas são apenas os instrumentos jurídicos de reconhecimento desses esforços, colocando no mesmo lado, diferentes instituições públicas e privadas no compartilhamento de um objetivo. Em nosso caso específico, após a fase de avaliação e estudos das condições institucionais das administrações municipais, da dinâmica econômica do empresariado do setor turístico e das condições de organização e produção dos agricultores familiares, focalizamos a iniciativa do projeto na constituição de alianças voltadas para o auxílio à comercialização dos produtos dos pequenos agricultores, cuja base da produção organiza-se pelo envolvimento de toda família, com os empresários do setor turístico do litoral norte alagoano no Município de Japaratinga.

Assim, foi importante definirmos qual o desafio que se pretendeu enfrentar. Esse exercício de identificação clara do objetivo se constituiu na base para a mobilização adequada e organizada aos futuros parceiros do projeto.

Qual será o público-alvo atendido pelo projeto?

Pode parecer que, uma vez definido o problema a ser enfrentado por um projeto que tenha como objetivo formalizar parcerias através de alianças público-privadas, falar de público-alvo seja redundante. Pelo contrário, não são raros os projetos que são elaborados através de exercícios intelectuais de enfrentamento de desafios estruturantes, muitas vezes sem a definição clara de um público-alvo específico.

Em nosso caso, através da adoção de atividades de campo orientadas para esta finalidade, além de realização de diagnósticos nos Municípios da área de abrangência e atuação do projeto foi possível identificar um maior potencial para a realização de um piloto no Município de Japaratinga, especificamente, junto aos agricultores da ACAJ – Associação dos Criadores de Abelha e Pequenos Produtores de Japaratinga.

A identificação dos agricultores de Japaratinga surgiu a partir do reconhecimento de inúmeros elementos ligados tanto pela capacidade associativa, como pela trama institucional favorável que já estava presente no Município (apoio, e fundamentalmente, interesse do poder público local através da prefeitura de Japaratinga, presença de outras

3 Recentemente, em 2012, 17 Municípios alagoanos, incluindo muitos na área do projeto, receberam a certificação de Indicação Geográfica do INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial – sob registro IG201101 , do dia 17/07/2012. Tal registro reconhece, entre outros efeitos, a área como sendo a única produtora destes produtos no Brasil. 4 Valor referente ao produto em 2012.

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instâncias de governo atuando no apoio à produção agrícola, e reconhecimento da iniciativa pelo grupo de empresários de hotéis, pousadas e restaurantes da cidade, representada pela AEJATUR – Associação de Empreendedores de Japaratinga em Turismo).

Mas uma questão parece ficar no ar, o organismo associativo dos pequenos produtores era uma associação de apicultores. Com efeito, a ACAJ, inicialmente, tinha como objetivo estatutário central à produção e comercialização de produtos e derivados do mel, como a própolis vermelha. Entretanto, após a realização de um seminário de apresentação de resultados da primeira fase de diagnóstico da região de abrangência do programa, o diálogo com a associação de apicultores foi se intensificando de tal maneira que a associação de apicultores (que também produziam em pequena escala alimentos) demonstrou, mais que qualquer outra instituição, interesse declarado pelo projeto. Atualmente, estes trabalhadores rurais já alteraram o objetivo estatutário ampliando as possibilidades de ações da Associação.

Pode-se afirmar hoje que a disposição política de localizar o projeto no Município de Japaratinga foi o grande diferencial para a escolha do local da realização do piloto. A Associação de Apicultores e Pequenos Produtores de Japaratinga, o poder público local, especialmente através da Secretaria de Agricultura, e a Associação de Empreendedores de Japaratinga em Turismo agregaram aspectos notáveis para, naquele momento, definirmos aquele como o Município-piloto: capacidade de articulação institucional, organização de demandas e divisão de responsabilidades entre os três grupos.

Em resumo, os mapeamentos e análises produzidas nas primeiras etapas do processo de trabalho, apontaram para essa localidade, como aquela que reunia melhores condições institucionais e de organização social e produtiva para se levar a cabo uma iniciativa capaz de ser replicada na escala microrregional servindo como elemento demonstração.

2. Metodologia de Execução

Planejamento: uma etapa essencial

Dentre inúmeras maneiras de se definir o planejamento pode-se adotar a seguinte formulação: “(...) uma atividade que remete sempre para o futuro. É a forma que os homens têm de tentar prever a evolução de um fenômeno ou de um processo, e, a partir deste conhecimento, procurar se precaver contra problemas e dificuldades, ou ainda aproveitar melhor possíveis benefícios” (SOUZA, 2004, p. 15)5.

Nos exercícios de planejamento de qualquer projeto, deve-se levar em conta, em esforços de abstração e projeção de cenários, aspectos relativos às influências internas e externas ao arranjo institucional e produtivo, visando de modo claro a redução dos riscos e incertezas, a antecipação de fatos e cenários, a projeção de resultados e, certamente, o monitoramento dos processos de trabalho.

5SOUZA, Marcelo Lopes de & RODRIGUES, Glauco Bruce. Plajenamento urbano e ativismos sociais. São Paulo: UNESP, 2004.

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Dito desta maneira, o processo de planejar ações deve nos remeter à criação e reflexão coletiva, ou seja, de forma participativa. Assim, todas as fases ou etapas desse processo podem ser analisadas, refletidas e pactuadas, gerando ao final, deste exercício, metas que incluam objetivos, responsáveis, prazos, prioridades etc.

Na figura 6, a seguir, podemos observar um esquema, mesmo que rudimentar, que pode nos auxiliar na compreensão desta etapa fundamental de trabalho.

Figura 6 – Estruturação das distintas etapas dos processos e atividades de planejamento.

O exercício de planejamento, não apenas em programas dessa natureza, mas também em qualquer atividade de racionalização de projeções e construção de cenários, deve ocorrer de modo constante em todas as etapas de execução de projetos sociais. Esses exercícios de planejamento ocorrem naturalmente ao longo da execução, contudo é importante, em momentos considerados cruciais de sua execução, que os mesmos sejam realizados, de preferência, envolvendo todos os agentes sociais envolvidos na execução das atividades propostas.

Por mais que o desenho acima demonstre, de maneira rudimentar, algumas atividades importantes desse processo, tentamos ilustrar apenas o princípio do dispositivo em si. Logo, em um primeiro momento, partindo de objetivos centrais, é muito importante a realização de análises conjunturais, sejam dos aspectos internos que possam comprometer a execução do programa, seja dos aspectos externos que possuam e possam determinar a evolução das atividades.

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Internamente, se podem citar, apenas como exemplos, alguns aspectos relevantes ao planejamento, como: a mensuração dos custos de execução, a incipiência dos processos de organização coletiva do trabalho de associações, a identificação de fragilidades estruturais nas relações institucionais entre agências políticas e sociais executoras, entre tantos aspectos que podem determinar o alcance dos objetivos. Com relação aos aspectos externos, se podem relacionar, entre tantos outros, a alteração de políticas públicas voltadas para o fomento da produção agrícola de pequenos agricultores, como alteração de linhas de crédito rural ou limitações burocráticas aos processos de recuperação de crédito com a mesma finalidade, a existência de concorrência de mercados mais dinâmicos, ou mesmo, a ausência de condições infraestruturais de tráfego e locomoção entre as propriedades rurais e os centros de distribuição e comercialização.

Identificados os fatores que podem influenciar o alcance dos objetivos centrais do programa, foi fundamental a realização de exercícios de definição de objetivos menores, mais específicos, que possam fortalecer e balizar as relações sociais, políticas e produtivas presentes no ambiente do projeto.

A partir dessa definição, pudemos desenhar estratégias de superação de problemas, diminuição das debilidades e alcance dos objetivos, delegar tarefas e atividades para grupos, através da divisão do trabalho entre os agentes envolvidos, compartilhar responsabilidades, além de muitas outras possibilidades não presentes no fluxograma.

Não apenas em sua etapa final, mas em todo processo, foi e é fundamental a realização de atividades que visem ao monitoramento e avaliação das etapas e tarefas compartilhadas. Tal processo será o responsável pela manutenção da qualidade com que as tarefas estão sendo realizadas e permitirá, em curto espaço de tempo, a identificação de anomalias e combate imediato de efeitos indesejados.

No caso do programa, foram realizadas, em diferentes momentos, inúmeras etapas de planejamento que envolviam objetivos distintos. Em um primeiro momento, a equipe técnica precisava levantar um panorama das realidades institucionais e produtivas dos 13 Municípios envolvidos. O objetivo central era identificar o Município que serviria como base para o desenvolvimento de um projeto-piloto a fim de realizarmos as primeiras ações de apoio à comercialização de produtos agrícolas para o consumo regional, em especial para os empreendimentos do setor turístico.

Para isto, foi realizado um diagnóstico institucional que pudesse identificar possibilidades e desafios nos municipais da região focalizada. Assim, foram realizadas visitas técnicas aos 13 Municípios da área de abrangência com objetivos de identificar a existência e averiguar indicadores ligados a diferentes aspectos, tais como os territoriais, ambientais, tributários e econômicos6. Para isto, foi elaborado um instrumento em forma de questionário para levantar informações que fossem pertinentes ao escopo do programa, ou seja, que permitisse informações sobre as potencialidades e dificuldades dos Municípios em enfrentar os problemas de gestão, de uma forma geral e em especial a

6 O modelo de questionário aplicado encontra-se ao final deste documento, em anexo.

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urbana7, bem como o cenário de oportunidades de desenvolvimento e a capacidade das administrações em apoiar as atividades econômicas à disposição para protagonizar o desenvolvimento econômico local, com o foco na potencialização de atividades agrícolas socialmente inclusivas.

Frente à compreensão dos problemas verificados nos Municípios e em função da inventariação do capital social em cada lugar, ou seja, da presença de associações, cooperativas ou entidades de classe como sindicatos rurais, foi possível definir os Municípios que apresentavam maior potencial para execução de um projeto piloto naquele momento.

Inicialmente é importante registrar que em muitos Municípios a presença de outras instâncias ligadas ao apoio à produção agrícola não foi mencionada mesmo que de alguma forma, com o tempo, foi percebida a presença de entidades estaduais de extensão rural, como a EMATER. Ou seja, na visão da maioria dos agentes públicos e dos pequenos produtores, a assistência rural era realizada apenas com a distribuição de sementes, dentro de Programa, já mencionado, do governo federal.

Outro aspecto pertinente levantado nessa avaliação diz respeito à baixa capacidade associativa e cooperativa encontrada no local. Em muitos casos, o que se deu foi, mais uma vez, a incapacidade do poder público local de reconhecer e inventariar as instituições dessa natureza. Mesmo tendo realmente uma baixa capacidade de produção de arranjos de trabalho similares, a região possui uma potencial ainda incipiente, sobretudo em face dos elevados índices de população rural, para a formação de associações e cooperativas.

Finalmente, ainda com a expectativa de realizar dois projetos-pilotos, foi realizada uma pesquisa de mercado, direcionada aos empreendimentos do setor turístico e destinada a inventariar a oferta e a demanda de alimentos desses empreendimentos. A pesquisa foi importante para o reconhecimento que existe sim demanda por alimentos por parte dos empreendimentos turísticos, mesmo que de modo sazonal, contudo a oferta era realizada, naquele momento, por grandes fornecedores provenientes do Centro de Abastecimento e Logística de Recife.

O projeto-piloto de comercialização de alimentos, a princípio, nunca teve a falsa pretensão de abastecer todos os empreendimentos do turismo em Maragogi ou Japaratinga. Pelo contrário, o objetivo, inicial foi abastecer a cadeia turística com alimentos de maior valor de comercialização (como hortaliças, frutas etc.) e a partir de um fornecimento contínuo com a qualidade desejada pelos empresários e com o preço minimamente justo pela mercadoria produzida ir ampliando o fornecimento a ponto de assegurar um mercado consistente para a produção local.

7 Uma vez que parte do programa diz respeito ao apoio e fortalecimento das instituições públicas locais, notadamente as prefeituras, o programa, em sua etapa inicial, procurou diagnosticar entre outros aspectos a capacidade das prefeituras em realizar a gestão do território através da identificação de instrumentos de gestão urbana, ambiental, tributária, etc. Parte desse diagnóstico propiciou um curso realizado em Maragogi sobre Elaboração e Gestão de Projetos na Plataforma SICONV.

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Além de aspectos ligados à demanda, foi possível identificar elementos importantes associados à logística de produção e comercialização de alimentos, como a debilidade da malha viária nos períodos mais chuvosos, a necessidade da criação de centrais e núcleos de distribuição de alimentos, aproximar o projeto das entidades estaduais de apoio técnico à produção, reforçar as técnicas de gestão de processos das associações, assim como ampliar a participação dos agricultores locais nos programas federais e estaduais de apoio a produção agrícola.

Inicialmente foram identificadas como potenciais duas associações de agricultores familiares, uma em Japaratinga e outra em Maragogi, que foram objeto de ações de aprofundamento do cenário e capacitação e mobilização para o processo proposto. A ideia era poder realizar o piloto nas duas cidades, uma vez que logisticamente a pequena distância elas facilitaria a sua execução, e em ambas havia uma expansão mais intensa da atividade turística, combinado com o fato de que os respectivos governos locais possuíam cenários institucionais menos frágeis em relação ao conjunto de administrações analisados. Entretanto, registraram-se problemas de ordem burocrática em relação à associação localizada em Maragogi, pois seu registro legal a situava em Barreiros-PE, Município vizinho, localizado em outro Estado da Federação, constituindo-se assim um impedimento decisivo.

Justamente em função desses estudos e prospecções realizadas o projeto-piloto terminou por ser focalizado no Município de Japaratinga.

Busca de soluções

No texto acima, se pode identificar elementos desafiadores do ponto de vista da execução de uma operação tão complexa como a de dar apoio técnico à produção, superar algumas debilidades de logística de circulação de mercadorias, melhorias na gestão, ter rentabilidade através de produtos que possuam competitividade regional. A partir daí, foram iniciadas diferentes reuniões de trabalho incluindo membros da ACAJ, AEJATUR e poder público local, com objetivo de montar estratégias para a solução dos desafios apresentados.

Um dos problemas durante a fase do diagnóstico se referia à sazonalidade das compras dos empreendimentos turísticos. Isto porque durante determinados meses do ano, nos períodos de alta temporada, as compras aumentavam enquanto em outros momentos, na baixa temporada, as quedas eram significativas. Ou seja, a flutuação com que as relações comerciais se realizavam fazia com que fossem estruturadas ações para além dos momentos de alta comercialização. Logo, foi levantada a necessidade de se criar estratégias que apoiassem os pequenos agricultores, como por exemplo a inserção destes trabalhadores no Programa de Aquisição de Alimentos pelo setor público municipal, tema que será objeto de considerações finais ao final deste documento.

Assim, dentro de um ambiente colaborativo propício, foram discutidas possíveis soluções e compartilhamentos de responsabilidades, delegação de tarefas e prazos para a execução destas. Tendo em vista dos problemas encontrados, alguns eram de ordem burocrática, contudo possuíam enorme significado simbólico para a construção das

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alianças. Referimo-nos à alteração estatutária em que a associação de apicultores inseriria em seus objetivos a produção de alimentos, tendo como base de produção a agricultura familiar. Esse, sem dúvida, foi um grande passo para a confiança dos até então apicultores na direção de um fortalecimento entre as partes envolvidas.

Outro passo importante em processos de construção coletiva de soluções de problemas foi o exercício de priorização. Isto porque uma vez que podemos relacionar aos problemas o desenho de soluções, bem como a definição de metas e prazos, certas soluções revelavam-se mais estruturantes que outras, tanto do ponto de vista do fortalecimento institucional, como dos elementos de suporte à produção e comercialização. Assim, optar coletivamente pelos processos pelos quais vão ser direcionadas as escolhas foi nesse caso fundamental para legitimar coletivamente as decisões, assim como envolver os participantes, proporcionando o sentimento de pertencimento tão necessário em ações dessa natureza.

Formação de Parcerias– articulação e integração dos atores envolvidos

Na medida em que os principais problemas encontrados foram inventariados e as suas respectivas soluções priorizadas, um passo fundamental se referiu à formação de parcerias. Mas algumas perguntas são recorrentes nesses momentos: a quem, que instituições públicas e privadas, devemos recorrer? Será que existirá aceitação pelos gestores desses órgãos? Quais deverão ser as respostas?

Figura 7 – Modelo esquemático da articulação institucional da Aliança Público-Privada

Parte dessas perguntas, de um ponto de vista pragmático, são difíceis de responder previamente. Isto porque a alegação socialmente compartilhada, com frequência, se

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materializa na representação do Estado moroso e ineficiente. É claro que parte dessa imagem desoladora ainda existe em um país como o Brasil. Contudo, esse mesmo Estado, em diferentes oportunidades, é composto por gestores dispostos a apoiar as iniciativas coletivas. No nosso caso, o apoio estatal foi imprescindível e fundamental para a criação do projeto-piloto. E isto só foi possível por encontrarmos gestores públicos dispostos, mesmo em condições de trabalho degradantes, a participarem das estratégias de ação do programa.

Se por um lado, os agricultores estavam dispostos a produzir e os empresários do turismo ansiosos para comprar um produto local de qualidade, quatro desafios foram apresentados: 1) melhorar a gestão da associação; 2) conseguir apoio técnico à produção; 3) capacitar os trabalhadores rurais, melhorando as técnicas de produção e beneficiamento dos alimentos e, por fim, 4) criar uma estratégia mínima de logística para comercialização dos produtos.

Para o primeiro desafio, referente à gestão da associação, era necessário encontrar um parceiro local que pudesse realizar treinamentos em gestão, melhoria de processos e técnicas de logística mesmo que de forma rudimentar para ampliar a capacidade de gerenciamento dos processos por parte dos agricultores. Logo, foi levantado o SEBRAE-AL como um parceiro em potencial o que, pouco tempo depois do primeiro contato se materializou em uma consultoria curta porém, minimamente eficiente para esse primeiro momento. A instituição disponibilizou um consultor que se deslocou de Maceió a Japaratinga, algumas vezes, para a realização das oficinas com os produtores rurais.

O segundo desafio foi o mais complexo do ponto de vista da montagem de uma engenharia que contemplasse a solução do problema. Era necessária uma instituição para oferecer apoio técnico e imediatamente foi referenciada a EMATER-AL, entidade pertencente à Secretaria Estadual de Agricultura, SEAGRI. A disponibilidade com que o projeto foi aceito foi imediata, contudo, devido a questões orçamentárias, não havia técnicos agrícolas disponíveis para a realização destas atividades. Contudo, já havia uma estrutura de apoio logístico montado na cidade de Japaratinga e um banco de currículos a ser explorado para encontrar o técnico agrícola mais adequado para a execução do cargo. Logo, a saída foi construção de um Termo de Cooperação entre o IBAM e a EMATER-AL, onde o primeiro se comprometeria a arcar as despesas financeiras do técnico agrícola, em troca do uso das estruturas já implantadas pelo governo do estado, como acesso a veículos e escritórios.

Outro desafio a ser superado se referia à necessidade de se identificar uma instituição pública para capacitar os trabalhadores em técnicas de produção de hortaliças (a produção era voltada para o plantio de tubérculos, como a macaxeira), além de técnicas de beneficiamento dos alimentos para suprir as expectativas do mercado consumidor. A instituição que prontamente foi identificada foi o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, o SENAR. As capacitações ocorreriam gratuitamente, contudo, a Associação deveria, através de um mobilizador identificado por eles, levantar o mínimo de 18 pessoas para passarem pelas orientações de capacitação. O mobilizador foi identificado e acionado, as pessoas necessárias para serem capacitadas foram convocadas e o curso

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aconteceu de modo tão satisfatório que outras capacitações ainda estão sendo planejadas.

Por fim, o último desafio, a responsabilidade de se criar estruturas de logística como centrais e núcleos de distribuição, apoio às atividades de escritório e institucional foi assumida pela prefeitura de Japaratinga.

De modo geral, é fundamental reconhecer instituições e parceiros que possam se comprometer com os processos a serem desenvolvidos, definindo claramente os seus respectivos papéis frente aos objetivos do projeto, esperando a maximização dos efeitos esperados tanto a curto, como em médio e longo prazos.

Figura 8 – Modelo esquemático do ciclo de construção e implementação da Aliança Público-Privada

3. A criação de uma APP

A etapa a seguir, se refere à criação de uma aliança pública-privada. Muitos podem se perguntar quais são as vantagens e a necessidade de “burocratizar” as relações através de um instrumento jurídico que reforça os compromissos previamente pactuados. Ainda, se as instituições já manifestaram desejo e interesse em colaborar com os processos, estando todos “apalavrados”, não existe a necessidade de formalizarmos esses arranjos institucionais dessa maneira. As respostas a essas inquietações são simples: existem diferentes aspectos relacionados com a formalização de arranjos institucionais dessa natureza sejam eles de caráter simbólico, institucional ou político.

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A criação de um instrumento que regule e oriente as participações de diferentes instituições no alcance de um objetivo em comum representa, de modo significativo, para aqueles da que estão executando as ações primárias do projeto (no caso, nos referimos, especialmente, aos pequenos agricultores e empresários do setor turístico) uma conquista simbolizada pelo reconhecimento público das ações desenvolvidas.

Institucionalmente representa, entre outros aspectos, o surgimento de uma nova relação intrainstituições, como se uma nova entidade fosse formada pelas partes e compromissos pactuados. Ou seja, a estruturação de canais de comunicação entre as instituições participantes pode dar maior segurança ao grupo beneficiado para administração e negociação das ações, exigindo constantemente por parte de todos uma reafirmação das responsabilidades previamente assumidas.

Politicamente, projetos sociais voltados para o desenvolvimento econômico local que contam com redes institucionais de apoio (seja técnico, financeiro, administrativo, político, entre tantos outros) tendem a se fortalecer frente a novos parceiros e instituições podendo significar capital político suficiente para a abertura de novas frentes de ação coletiva.

Os instrumentos jurídicos de criação de uma APP

Muitas são as modalidades jurídicas previstas pela legislação brasileira a respeito da formação de alianças público-privadas8 ou parcerias público-privadas9. A escolha adotada no caso do projeto-piloto foi a realização de um protocolo de intenções onde as instituições parceiras manifestariam, através de documento onde todas as instituições seriam signatárias, suas responsabilidades e compromissos assumidos ao longo do processo de desenvolvimento das fases anteriores do Programa.

A realização de estratégias dessa natureza, através de atos públicos de pactuação de objetivos em comum entre instituições sociais tão distintas, colabora de modo significativo para o fortalecimento das relações sociais entre os signatários, gerando, de modo especial, um ganho de confiança no desenvolvimento e na manutenção dos processos elaborados. É importante ressaltar que alguns atores sociais, como a ACAJ, convivem com um cenário de fragilidades estruturais significativas e, como em muitas associações de produtores rurais, são testadas cotidianamente a superarem certas debilidades referentes às incipiências relacionadas ao processo de organização social da instituição. Dessa maneira, a simbolização em forma de ato público, materializado pela pactuação

8 Para saber mais, recomendamos o artigo de Gil Soares, intitulado Alianças Público-Privadas. Atores e Mecanismos, em http://www.aliancaspublicoprivadas.org.br/app/wp-content/uploads/2012/06/aliancas_publico-publicas_e_publico-privadas-vs_final.pdf (visitado em Fevereiro de 2013). 9 Utilizamo-nos do termo aliança público-privada ao invés de parcerias público-privadas por conta de uma representação compartilhada onde arranjos institucionais dessa natureza são comumente associados a grandes obras de engenharia, privatização de estradas, etc. Por conta da restrição escalar dos objetos e objetivos em questão, adotamos tal termo para disassociar projetos dessa natureza com os acima mencionados.

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verbal documentada em um instrumento destinado a gerar garantias de diferentes formas de apoio (institucional, político, logístico etc.) certamente gera expectativas e responsabilidades maiores por parte de todos os envolvidos, criando um ambiente de confiança e proatividade.

O protocolo de intenções, que se encontra ao final deste documento, trata-se, em suma, de uma declaração pública sobre os compromissos assumidos pelas instituições signatárias. Os compromissos foram pautados pelas atribuições constituintes de cada uma das entidades e, para isso, muitos se questionaram sobre a necessidade da construção de um documento dessa natureza quando parte das instituições são públicas.

Como foi dito anteriormente, existe uma diferença prática e simbólica relacionada a este tipo de acordo institucional: as instituições quando se colocam frente a um instrumento dessa natureza praticamente assume uma postura distinta daquelas denominadas demandas de balcão, comuns ao cotidiano das administrações públicas. Logo, para os principais beneficiários da aliança o documento representa possibilidades práticas de superação de desafios e garantias do cumprimento dos serviços a serem prestados. Sustentabilidade, enfim.

Uma grande mudança do ponto de vista qualitativo encontra-se no âmbito comunicacional e da representação política, seja através da nomeação dos agentes públicos responsáveis pelo arranjo institucional ou pela possibilidade de articulação direta de demandas em um canal específico de comunicação desburocratizado pelas formalidades estatais.

Dessa forma, com o “objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável na Região dos Corais através de alianças público-privadas que promovam a integração entre as atividades da agricultura familiar e as atividades vinculadas ao turismo regional10”, seis instituições foram signatárias do termo de compromisso, a saber: DESENVOLVE, EMATER, IBAM, Prefeitura de Japaratinga, ACAJ e AEJATUR.

De acordo com o arranjo institucional construído: a DESENVOLVE se incumbiu da realização do fomento necessário à operacionalização da aliança, seja por mecanismos de crédito ou pela sessão de insumos; a EMATER realizaria as atividades voltadas para o assessoramento técnico rural da produção dos integrantes e membros da ACAJ; o IBAM forneceria serviços de consultoria voltados para o aperfeiçoamento da gestão das associações, assim como demais serviços voltados para melhorias no âmbito da qualidade dos serviços e mecanismos institucionais; a Prefeitura de Japaratinga de maneira mais efetiva pelo apoio logístico dentro do território municipal, pela realização de compras públicas através do Programa de Aquisição de Alimentos – assegurando o escoamento da produção em períodos de baixa temporada do turismo – e pela cessão de alguns insumos (sementes, mudas, espaço físico para funcionamento da sede da ACAJ, entre outros); a AEJATUR se responsabilizaria pela mobilização e articulação com os demais empresários do trade turístico; e por fim, a ACAJ ficaria responsável pela

10 Protocolo de intenções do Programa de Fortalecimento das Instituições Públicas e da Agricultura Periurbana do Litoral Norte de Alagoas, 11/12/2012.

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produção e fornecimento de alimentos para os empreendimentos turísticos da região e para a Prefeitura de Japaratinga.

Dentro desse arranjo, é necessário destacar o papel preponderante que o Município pode desenvolver em arranjos institucionais com essa finalidade, isto porque é no âmbito municipal que as atividades econômicas e produtivas se desenvolvem e, de modo privilegiado, as relações sociais se dão. Logo, o Município pode incentivar, através de legislação própria, instrumentos de fomento e apoio ao aparecimento de novas alianças público-privadas. Assim, leis municipais desenvolvidas para apoiar inovações institucionais como essas representam um grande salto qualitativo nas possibilidades de desenvolvimento econômico local. Outra possibilidade refere-se à realização e construção de políticas públicas, como por exemplo a realização de fóruns para o debate de soluções relacionadas ao desenvolvimento econômico local no Município. Esses novos espaços de participação social caracterizam-se como sendo uma grande mudança de paradigma na construção de políticas públicas no Brasil, onde ao longo das últimas décadas, vem representando uma possibilidade efetiva do estabelecimento de canais diretos para a realização de uma gestão democrática do Município, aproximando o setor público do privado.

Sistema de Governança

Definido o instrumento que viabilizará a aliança público-privada, um passo importante da estratégia de gestão do arranjo institucional estabelecido refere-se ao sistema de governança. O conceito de governança tem sofrido alterações ao longo das décadas recentes. No final do século XIX, o termo era amplamente utilizado para realizar uma oposição às limitações do conceito de governo com a separação setorial de Estado, Sociedade e Mercado. Entretanto, apesar dos diferentes usos e apropriações conceituais, os aspectos setoriais neoliberais passam a dar lugar a uma apropriação mais coletivista do ponto de vista organizacional.

Podemos definir governança pelo processo de coordenação de atores, grupos sociais e instituições para o alcance de objetivos próprios, debatidos coletivamente, em ambientes marcados por incertezas. A governança tem o papel de recuperação do fornecimento de serviços contribuindo para a estabilidade de uma determinada sociedade ou de um regime político. Os interesses sociais embutidos em determinados grupos sociais passam a influenciar e determinar procedimentos administrativos e estruturas formais de gestão.

Parece-nos indissociável a compreensão de um modelo de governança à adoção de mecanismos estabelecidos para a realização da regulação das ações entre diferentes instituições e grupos sociais, através da adoção de mecanismos próprios e coletivamente estabelecidos. Trata-se, portanto, de um importante mecanismo de gestão, deliberação e controle social.

No caso do projeto-piloto de Japaratinga, apesar de não se ter desenvolvido um modelo de governança para a aliança público-privada estabelecida no Programa, é de fundamental importância a elaboração de um espaço de debate e busca de soluções

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compartilhadas para os desafios enfrentados e novos que, certamente, se colocarão diante da rede de parcerias.

Acreditamos que a estruturação de um modelo de governança deve ser um passo fundamental para a construção de estratégias de agregação de novos parceiros. O funcionamento da aliança proposta deve se pautar pela constante busca de novas parcerias, mercados e demais agentes que possam melhorar as condições de funcionamento das relações produtivas e comerciais que o projeto-piloto exige.

Logo, a estruturação de um modelo de governança pode se dar em um momento posterior à estruturação do arranjo institucional, entretanto, ao longo desse processo o modelo vai tomando forma com os exercícios práticos de criação. Nesse caso, a modelagem deve respeitar determinados sinais e atribuições constituintes e finalísticas de cada instituição.

É fundamental a construção de um espaço pautado pela autonomia dos parceiros institucionais da aliança público-privada. Isto porque existe o risco do estabelecimento de uma hierarquização política que subjugue os parceiros privados, no caso a ACAJ e a AEJATUR, as determinações políticas e práticas dos atores públicos. A construção de um espaço autônomo e pautado pela isonomia na condução das relações institucionais é uma medida imprescindível para que o modelo de governança possa produzir os efeitos desejados.

Dentre esses efeitos, podemos destacar a construção e manutenção de sinergias benéficas aos objetivos pactuados e a construção de um ambiente pautado pelo fortalecimento da sustentabilidade institucional tão necessária ao perfeito andamento das relações. A qualidade das relações institucionais através da rede de parceiros depende da capacidade de todos lidarem responsavelmente dos processos cotidianos de trabalho. Dessa maneira, o modelo de governança, pautado pela autonomia política entre os agentes, favorece a criação de sinergias institucionais que criaram um ambiente favorável a novas parcerias e ao alcance dos objetivos, tornando dessa forma, o modelo estável, autorregulado e sustentável.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BOURDIEU, P. A Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1974.

BOBBIO, Norberto. “A Teoria do Estado e do Poder”. In BOBBIO, Norberto. Ensaios Escolhidos.

São Paulo, C.H. Cardim Editores, s/d, pp. 157-184.

SANTOS, Maria Helena de Castro. “Governabilidade, Governança e Democracia: Criação da

Capacidade Governativa e Relações Executivo-Legislativo no Brasil Pós-Constituinte”. In: DADOS

– Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, volume 40, nº3, 1997. pp. 335-376.

SOUZA, Marcelo Lopes de e RODRIGUES, Glauco Bruce. Planejamento Urbano e ativismos

sociais. São Paulo: UNESP, 2004.

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Anexo PROTOCOLO DE INTENÇÕES

PROTOCOLO DE INTENÇÕES QUE ENTRE SI CELEBRAM A SECRETARIA DE ESTADO DA AGRICULTURA E DE DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO DE ALAGOAS, A AGENCIA DE FOMENTO DE ALAGOAS S/A, O INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, A PREFEITURA DE JAPARATINGA, A ASSOCIAÇÃO DE EMPREENDEDORES DE JAPARATINGA, E A ASSOCIAÇÃO DE CRIADORES DE ABELHAS DE JAPARATINGA PARA DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA REGIÃO ATRAVÉS DA INTEGRAÇÃO ENTRE AGRICULTURA FAMILIAR E TURISMO REGIONAL.

A AGÊNCIA DE FOMENTO DE ALAGOAS S/A, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob nº. 10.769.660/0001-95, com sede na Rua Antonio Cansanção, nº 465, Ponta Verde, Maceió/AL, doravante denominada DESENVOLVE, neste ato representada pelos Diretores, Sr. Antonio Carlos Sampaio Quintiliano inscrito no CPF/MF sob o nº 222.800.144-91 e Sr. Laudeny Fábio Barbosa Leão inscrito no CPF/MF sob o nº 786.976.384-53, o INSTITUTO DE INOVAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL - EMATER, pessoa jurídica de direito publico, autarquia especial, inscrita no CNPJ sob o nº 15.731.016/0001-41, com sede na Rua Cincinato Pinto, s/nº, bairro Centro, CEP: 57020.050, Maceió/AL, doravante denominado EMATER, representado neste ato pela sua Diretora Presidente, a Senhora Maria Inês Nogueira Pacheco, brasileira, casada, portador da Cédula de Identidade nº. 544.984 SSP/AL inscrito no CPF sob o nº. 382.452.234-20, o INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, pessoa jurídica de direito privado, associação civil de caráter educativo, científico e cultural, sem fins lucrativos, inscrito no CNPJ/MF sob o nº 33.645.482/0001-98, doravante denominado IBAM, com sede no Largo do IBAM, n. 01, Humaitá, Rio de Janeiro/RJ, representado neste ato por seu Superintendente Geral, Sr. Paulo Timm, inscrito no CPF/MF sob o nº 457.512.429-04, a PREFEITURA DE JAPARATINGA, pessoa jurídica de direito público inscrita no CNPJ sob o n° 12.247.946/0001-36, com sede na Praça Nossa Senhora das Candeias, 106, Centro, Japaratinga, neste ato representada pela Secretário de Agricultura, Sr. Humberto Carneiro Silva, portadora do CPF/MF nº 083065164-00, a ASSOCIAÇÃO DE EMPREENDEDORES DE JAPARATINGA EM TURISMO, pessoa jurídica de direito privado e associação civil sem fins lucrativos, inscrito no CNPJ/MF sob o nº.11.907.831/0001-68 , sediado na Rua Deusval José Barbosa, s/n, Centro, Japaratinga, doravante denominada AEJATUR, representada neste ato por seu Presidente Anton Rene Bleuler, inscrito no CPF/MF sob o nº 014.937.144-65, e a ASSOCIAÇÃO DE CRIADORES DE ABELHAS DE JAPARATINGA, pessoa jurídica de direito privado e associação civil sem fins lucrativos, inscrito no CNPJ/MF sob o nº , sediado na Rua Francisco de Barros Regis, S/N, Centro, Japaratinga, doravante denominada ACAJ, neste ato representada pelo José Ivan de Lima, inscrito no CPF/MF sob o nº 816.235.264-34.

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CONSIDERANDO a relevância da promoção do desenvolvimento da região da Costa dos Corais em bases sustentáveis;

CONSIDERANDO que o fomento da agricultura familiar na região é essencial para este desenvolvimento econômico e para as conquistas de inclusão social;

CONSIDERANDO que a integração entre as atividades da agricultura familiar e as do turismo regional estabelecem um circuito virtuoso neste processo de desenvolvimento econômico e social;

E, CONSIDERANDO que as alianças entre o setor público e o setor privado são instrumentos que contribuem efetivamente para a sinergia das ações e para o atingimento dos objetivos pretendidos,

RESOLVEM celebrar o presente PROTOCOLO DE INTENÇÕES, na forma das cláusulas e condições que seguem:

CLÁUSULA PRIMEIRA – DOS OBJETIVOS:

O presente Protocolo de Intenções tem por objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável na Região dos Corais através de alianças público-privadas que promovam a integração entre as atividades da agricultura familiar e as atividades vinculadas ao turismo regional.

CLÁUSULA SEGUNDA – DOS INSTRUMENTOS JURÍDICOS COMPLEMENTARES

Para possibilitar o atingimento dos objetivos estabelecidos no presente protocolo as entidades que o firmam poderão celebrar Termos de Cooperação e contratos pactuando as condições e os critérios das ações conjuntas intencionadas pelo presente Protocolo.

CLÁUSULA TERCEIRA – DA VIGÊNCIA

O prazo de vigência do presente Protocolo é de 06 (seis) meses, a iniciar-se na data de sua assinatura, prorrogáveis, por acordo entre as partes.

CLÁUSULA QUARTA - DA RESCISÃO

O presente Protocolo poderá ser rescindido, por iniciativa de quaisquer das partes, mediante comunicação expressa aos demais partícipes, com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.

E, por estarem de acordo, as partes assinam o presente instrumento em 3 (três) vias de igual teor e forma na presença das testemunhas subscritas.

Maceió, 11 de Dezembro de 2012.