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UNIVERSIDADE PAULISTA MARINA PRADO SASAO ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO DA TENDÊNCIA ANTISSOCIAL: o placement SÃO PAULO 2013

Alternativa de Tratamento da Tendência Antissocial: o placement

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Trabalho de Conclusão de Curso de Aluna Marina Sasao - Pós-Graduação em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais - UNIP - São Paulo - Paraíso - Vida Mental Saúde Mental e Nutricional.

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UNIVERSIDADE PAULISTA

MARINA PRADO SASAO

ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO DA

TENDÊNCIA ANTISSOCIAL: o placement

SÃO PAULO

2013

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MARINA PRADO SASAO

ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO DA

TENDÊNCIA ANTISSOCIAL: o placement

Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de especialização em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais apresentado à Universidade Paulista – UNIP.

Orientadores: Profa. Ana C. S. Oliveira e Prof. Hewdy L. Ribeiro

SÃO PAULO

2013

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MARINA PRADO SASAO

ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO DA

TENDÊNCIA ANTISSOCIAL: o placement

Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de especialização em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais apresentado à Universidade Paulista – UNIP.

Aprovado em:

BANCA EXAMINADORA

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista – UNIP

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista – UNIP

_______________________/__/___

Prof. Nome do Professor

Universidade Paulista – UNIP

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SASAO, M.P.; OLIVEIRA, A.C.S.; RIBEIRO, H.L. Alternativas de tratamento da

tendência antissocial: o placement. Monografia (Pós-graduação em Saúde Mental para

Equipes Multiprofissionais) - Universidade Paulista, São Paulo, 2013.

RESUMO

Tendo em vista a necessidade de intervenções eficazes para lidar com a tendência

antissocial, o presente artigo visou contribuições dos conceitos de Winnicott para a

prevenção e tratamento da tendência antissocial, articulando esses conceitos sobre as

manifestações da tendência antissocial com o placement. A publicação quase inexistente

sobre placement na língua portuguesa, somada aos poucos relatos de eficácia em casos

clínicos, torna urgente a publicação de estudos nacionais que embasem cientificamente a

prática do placement em crianças brasileiras com tendências antissociais.

Palavras chaves: Winnicott, placement, tendência antissocial, crianças.

ABSTRACT

Given the need of effective interventions to deal with the antisocial tendency, this paper

pretends to discuss the contributions of Winnicott's concepts for the prevention and

treatment of antisocial tendency, articulating these concepts with the practice of

“placement”. The almost nonexistent publication on “placement” in the Portuguese

language, added to the few reports of efficacy in clinical cases, makes urgent the

publication of national studies that scientifically support the practice of “placement” with

Brazilian children with antisocial tendencies.

Keywords: Winnicott, placement, antisocial tendencies, children.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 5

2 OBJETIVOS 9

3 METODOLOGIA 9

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES 9

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 12

REFERÊNCIAS 13

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1 INTRODUÇÃO

O tratamento das chamadas “crianças difíceis” que manifestam atos antissociais,

foi um desafio encontrado por D. W. Winnicott, quando foi encarregado da tarefa de cuidar

de crianças evacuadas de Londres, no período da Segunda Guerra Mundial. As

contribuições da teoria psicanalítica foram muito proveitosas para seu trabalho, no

entanto, Winnicott precisou rever e ampliar sua própria teoria do desenvolvimento,

solicitando o auxílio de alternativas ao emprego do método tradicional da psicanálise.

(WINNICOTT, 2005)

Clare Winnicott, segunda esposa de Winnicott, na introdução da reunião de artigos

intitulada Privação e Delinqüência (2005, p. XI-XVI), aponta que para além da dificuldade

encontrada pelo infausto da guerra, foi constatado que as crianças que não podiam ser

instaladas em lares comuns, já apresentavam problemas no período anterior a guerra, em

seus próprios lares. Por necessitarem de acompanhamento especial, estas eram

encaminhadas aos alojamentos supervisionados por Winnicott. Apesar dessas crianças

se tornarem o grande centro de atenção e preocupação daqueles que se propuseram a

auxiliá-las, percebeu-se que a guerra em si, teve um valor importante e benéfico para

elas, uma vez que as ajudou, na medida em que interrompeu com a continuidade de uma

situação intolerável e inóspita anterior, colocando-as numa nova situação onde puderam

encontrar ajuda e alívio (WINNICOTT, 2005).

As experiências vividas nos alojamentos trouxeram para Winnicott material de

inestimável valor, pois o ajudaram a construir uma nova modalidade clínica e estruturar

sua teoria sobre delinquência e tendência antissocial ao certificar a origem dessas

manifestações vinculadas à privação. Winnicott traz como contribuição inovadora a maior

valorização do ambiente externo dessas crianças, assinalando que elas não possuem um

“ambiente interno” construído, e acabam por recorrer constantemente àquele, para que

exerça um controle sobre si próprias. Winnicott desenvolve uma teoria e uma prática

clínica atrelada ao enfoque interpessoal, contrapondo-se ao tradicional foco intrapsíquico

(GARCIA, 2005), o que se converteu na elaboração de uma modalidade de intervenção

clínica própria: o placement, enfatizando a importância do lugar para a constituição do self

(SAFRA, 2006).

A concepção winnicottiana vê a tendência antissocial como um sintoma de um

bloqueio no desenvolvimento. Este sintoma remete a uma experiência de

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desapossamento/deprivação. O conceito de deprivação refere-se a um ambiente

suficientemente bom que foi vivenciado e perdido, no período do amadurecimento

pessoal, no qual o indivíduo já era capaz de perceber a dependência. Nota-se que a falha

sentida pela criança localiza-se no ambiente, portanto ela é impelida a atacá-lo para que

ele volte ao momento anterior à condição ou momento de privação.

As principais manifestações da tendência antissocial são: o roubo, acompanhado

da mentira, a tendência caótica, enurese, vadiagem e a destrutividade, entre outros.

Apesar de aparentemente ser um mau sinal de comportamento, a tendência antissocial

indica que há esperança, que se acredita na possibilidade de devolução daquilo que se

perdeu por parte do ambiente. O roubo ou furto, por exemplo, traz à tona a percepção de

que existe uma tentativa de pegar algo de valor que lhe pertencia no passado e que foi

“roubado”. A destrutividade indica uma agressão ao ambiente para que ele regrida e

reconheça sua falha. Isto mostra como as manifestações estão voltadas ao mundo

externo, pedindo para que deste venha o controle acompanhado pela proteção

(WINNICOTT, 1989). Nesse trecho que se segue podemos ver como Winnicott (2005,

p.131) elabora sua teoria:

"A delinquência indica que alguma esperança subsiste. Vocês verão que, quando

a criança se comporta de modo antissocial, não se trata necessariamente de uma

doença, e o comportamento antissocial nada mais é, por vezes, do que um SOS

pedindo o controle de pessoas fortes, amorosas e confiantes. Entretanto, a

maioria dos delinquentes está, em certa medida, doente - a palavra doença torna-

se apropriada porque, em muitos casos, o sentimento de segurança não chegou

à vida da criança a tempo de ser incorporado a suas crenças. Enquanto está sob

forte controle, uma criança antissocial pode parecer muito bem. Mas, se lhe for

dada liberdade, ela não tardará em sentir a ameaça de loucura. Diante disso, ela

transgride as regras sociais (sem saber o que está fazendo), a fim de

restabelecer o controle proveniente do exterior."

A natureza e o caminho da tendência antissocial remetem à relação mãe-bebê,

pois essa interação configura o caminho que tem seu início na dependência absoluta,

passando para a necessidade de ser cuidado e finalmente chegando à independência

relativa. A mãe, que ganha contornos de mãe-ambiente, é primeiramente um objeto da

subjetividade do bebê e aos poucos contribui para que o indivíduo se integre, personalize-

se, contribuindo para a constituição de seu self e na construção de relações objetais no

tempo e espaço. Durante esse percurso, ao desempenhar o papel de mãe

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suficientemente boa, a mãe ou quem for exercer essa função, adapta-se com alto grau às

necessidades individuais da criança. Dessa forma, a mãe possibilita ao bebê o encontro

facilitado dos seus objetos subjetivos com os da realidade objetiva, sendo que sua

adaptação vai diminuindo de acordo com a crescente necessidade de experimentar

reações a frustrações contribuindo para a sua consequente diferenciação e maturação

(WINNICOTT, 1989). Nas palavras de Winnicott (1989, p.18): “(...) processo bidirecional

em que a criança vive num mundo subjetivo e a mãe se adapta, com o intuito de dar a

cada criança um suprimento básico da experiência de onipotência. Isso envolve

essencialmente uma relação viva”.

Em A delinquência como sinal de esperança, Winnicott (1989) traz que os primeiros

contatos com o objeto são capacitados pela mãe para que seja de modo criativo,

iniciando-o no uso criativo do mundo. Quando isso falha, além de perder o contato com o

objeto, perde-se também a capacidade de encontrar qualquer coisa criativamente. Na

esperança do reencontro com o objeto, a criança o rouba para si. O que ela realmente

procura não é o objeto em si, e sim a capacidade de encontrar, mesmo que haja alguma

satisfação pelo ato em si mesmo. Pode-se aferir, portanto, que o que se busca ao roubar

é o reencontro com a mãe sobre quem a criança tem direitos, pois do ponto de vista

desta, a mãe foi criada por ela, satisfazendo a criatividade primária e convertendo-se no

objeto que a criança estava disposta a encontrar. Ao mesmo tempo, procura a autoridade

paterna que pode pôr limite ao efeito concreto de seu comportamento impulsivo e a

atuação de ideias que lhe ocorrem quando excitado.

Para compreender melhor o comportamento antissocial, é interessante

acompanhar também como Winnicott elabora sua teoria das pulsões e trata sobre as

raízes da agressividade, retratada nos artigos da segunda parte de Privação e

Delinqüência (2005). Segundo seus estudos, o movimento do bebê, já no útero materno,

através do prazer muscular do movimento, constitui as bases da agressão. Esta é vista

como uma reação direta à frustração além de constituir fontes indiretas de energia do

indivíduo. O que inicialmente não tinha intenção de machucar, onde havia apenas o

encontro com algo através do movimento, começa a transpor-se em uma ação que

exprime raiva, ódio e controle do ódio, interpondo-se à intencionalidade do machucar e

aos impulsos destrutivos do bebê. Esse processo é fundamental na distinção entre o eu e

o não-eu, uma vez que o bebê realiza a “destruição mágica” do objeto e este deixa de ser

parte de si para ser do outro. Isto significa que aquilo que se caracterizava por ser um

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fenômeno da subjetividade passa a contemplar o mundo objetivo. Com a maturidade, a

criança começa a manifestar a agressividade sem aniquilar magicamente o mundo,

passando a atingir o concreto de forma positiva, como um sinal de civilização.

Durante a infância, o brincar e o uso de símbolos aparece como modo de conter a

destrutividade interna. Crianças que apresentam tendência antissocial não têm o espaço

para brincar, substituindo-o pelo acting out. Essas crianças não tem a consciência de um

quadro de referência suficientemente bom e confiável, essencial para sentir-se livre para

brincar, desenhar e ser irresponsável. Esse quadro, que estava se construindo pela

criança e ambiente, se desfez, deixando a criança impossibilitada de sentir-se livre.

Emerge a angústia e com alguma esperança, ela é impelida a buscar outra referência fora

do seu lar, procurando encontrar a estabilidade externa para não enlouquecer. A partir da

união da auto-cura e a cura da dissociação dos instintos surge duas tendências: a busca

do reencontro com o objeto e a destruição (WINNICOTT, 2005).

A esperança da tendência antissocial provém de perceber que há algo vital que

subsiste em cada uma de suas transgressões. A criança que a manifesta tem a

esperança de que se restabeleça a segurança, se redescubra a si mesmo, o que implica

no redescobrimento de sua agressividade. A delinquência, ao contrário da tendência

antissocial, possui um prognóstico bem mais difícil por representar uma carência ou

privação de algo bom do ambiente ou uma evolução da tendência antissocial, na qual o

ambiente não devolveu aquilo que foi perdido na deprivação. Na época da privação

original, há uma fusão das raízes agressivas com raízes libidinais. Quando há menos

fusão, a busca do objeto e a agressão são separadas, ou seja, há maior grau de

dissociação pela criança e os vínculos não são construídos com base na agressividade

(WINNICOTT, 2005).

Assim, tendo em vista a importância da intervenção precoce nas tendências

antissociais, a pesquisa justifica-se pela necessidade de novos estudos sobre as

contribuições de Winnicott no trabalho com crianças e adolescentes que apresentam

tendência antissocial. O estudo reúne práticas possíveis relacionadas à prevenção e

tratamento da tendência antissocial. Enfatizou-se a modalidade do placement como

alternativa de tratamento possível dessas manifestações.

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2 OBJETIVOS

Verificar contribuições dos conceitos de Winnicott para a prevenção e tratamento

da tendência antissocial, articulando esses conceitos sobre as manifestações da

tendência antissocial com o placement.

3 METODOLOGIA

A metodologia escolhida foi a pesquisa bibliográfica, que se propõe a revisitar os

artigos com as palavras-chaves “tendência antissocial” e “placement”, contendo relatos de

casos ou vinhetas clínicas de crianças e adolescentes. O objetivo foi verificar experiências

práticas em que o embasamento teórico de Winnicott pôde contribuir no trabalho com a

população atendida. Foi realizada uma revisão das publicações dos últimos oito anos

encontradas das bases de dados: Scielo e Pepsic articulando com a obra “Privação e

Delinquência”, de Winnicott.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na base Scielo foram encontradas quatro publicações com a chave “tendência

antissocial”, sendo que apenas uma continha um relato de caso. Não foi encontrado

nenhum artigo com a chave “placement” no Scielo. No Pepsic, foram encontrados seis

artigos, os quais três continham casos clínicos e um continha relato de observação de um

atendimento coletivo. Essa foi a única base de dados em que foi encontrado um artigo

com a chave “placement”. Para este trabalho foram escolhidos três artigos considerados

pertinentes para a temática, apresentados de forma resumida da tabela abaixo:

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Tabela 01: Artigos selecionados

Autores. Ano. Título do artigo Caso Clínico Conclusão

MAIA et al. 2007.

"Crianças

'impossíveis': quem

as quer, quem se

importa com elas?".

Caso clínico: Luis

(criança em situação

de vulnerabilidade

social)

Demanda de uma clínica

diferente e alternativa ao

modelo tradicional. Frente a

um ambiente faltoso, o

objetivo da terapia é

reestabelecer a confiança da

criança nele.

GARCIA. 2005.

O uso da consulta

terapêutica na

clínica da tendência

antissocial

Caso clínico: Luana,

8 anos. Manifestava

furtos na escola.

Este caso de tendência

antissocial pôde ser revertido

com uma única consulta

terapêutica, em que nenhum

furto ocorreu após um ano da

consulta. Na consulta, Luana

pôde integrar a perda

repentina dos cuidados

maternos, no nascimento de

sua irmã, quando tinha três

anos e sua mãe teve

depressão.

SAFRA. 2006.

Placement: modelo

clínico para o

acompanhamento

terapêutico

Casos clínicos:

Garoto de 11 anos

aparentava

desinteresse e sentia-

se deslocado na

escola. Garoto de 10

anos, atormentado

com os delírios de

uma mãe

esquizofrênica, vida

caótica.

O reconhecimento da

singularidade do paciente,

auxilia na criação de um lugar

de reencontro de si frente a

um outro, sob transferência, e

que possibilita inserir-se na

comunidade e ter uma

perspectiva de vida.

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No artigo de 1956 de Winnicott, intitulado “Tendência antissocial”, é importante

observar que a tendência antissocial não se configura como um diagnóstico, mas sim um

continuum de comportamentos e atitudes que todos os indivíduos podem apresentar, em

diversas épocas da vida (JUSTO, 2010), podendo ser encontrada em indivíduos normais,

neuróticos, limítrofes e psicóticos. Winnicott também trata de como a mãe pode “curar”

naturalmente uma tendência antissocial quando ela surge em seu filho, percebendo sua

falha e devolvendo aquilo que foi perdido na deprivação (WINNICOTT, 2005).

Uma das modalidades clínicas forjadas por Winnicott foi a consulta terapêutica, que

se mostrou satisfatória no atendimento de crianças antissociais em serviços públicos, em

que a demanda é alta e as famílias não podem arcar com um tratamento muito longo. Por

meio de três consultas, no máximo, o terapeuta pode utilizar o jogo de rabiscos e deve

permanecer na posição de objeto subjetivo da criança, para que ela estabeleça a

confiança e uma comunicação profunda com o terapeuta. Nos casos de tendência

antissocial, a consulta terapêutica busca auxiliar a criança a chegar ao momento da sua

deprivação e integrá-lo a sua personalidade total (GARCIA, 2005).

No caso descrito por Garcia (2005), narra-se uma experiência em que a tendência

antissocial de uma menina de 8 anos foi revertida com apenas uma consulta terapêutica.

Com o uso do jogo de rabiscos, a criança pôde expressar o momento de sua deprivação,

que ocorreu com o nascimento de sua irmã que teve como consequência a perda dos

cuidados maternos. Após ter conseguido expressar essa perda, a menina possivelmente

reencontrou o que havia perdido, podendo integrar a sua personalidade novamente, não

voltando a furtar mais depois dessa consulta terapêutica.

Um relato de caso de um menino é apresentado por Vilete (2007) que manifestava

diversos atos antissocias, sendo que os principais eram a destrutividade e a mentira. Esse

relato nos mostra a necessidade do terapeuta extrapolar os limites daquilo que é

esperado dele em algumas ocasiões, enfatizando a importância de acatar a demanda da

criança, tendo que muitas vezes falar e fazer por ele, frente às inúmeras perdas

enfrentadas devido à extrema vulnerabilidade social. Frente a um ambiente muito faltoso,

a terapeuta na tentativa persistente de retomar a confiança do menino, chegou a levá-lo

até o ponto de ônibus e pagar sua passagem após sua tia ter ido embora, antes do

término da sessão.

As intervenções possíveis caminham no restabelecimento da confiança no

ambiente através de um bom contato com ele. Nota-se que a focalização está na

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importância do ambiente e seus aspectos curativos. A questão do espaço é para

Winnicott tão importante que ele elabora uma modalidade de intervenção clínica própria: o

placement; dado o valor do lugar dentro do interjogo entre o dar e receber. O lugar é uma

dimensão fundamental para a constituição do self. Ofertar um lugar ético constitutivo é um

exercício que deve ser promovido pelo profissional juntamente ao auxilio no

estabelecimento das funções psíquicas e em seu trânsito em meio à realidade

compartilhada (SAFRA, 2006).

Safra (2006) traz um caso de análise de um garoto que tinha a característica de ser

bem criativo e que possuía grande inventividade. Foi visto que a escola que frequentava

não era compatível com essa inventividade e originalidade, portanto, era um ambiente

que acabava por menosprezar suas capacidades, já que ficava deslocado e tido como

uma criança desatenta e desinteressada. Somado ao trabalho analítico, foi realizada uma

intervenção no sentido de fornecer um placement. Dessa forma, ao lado dos pais do

garoto, foi procurada uma escola que contemplasse suas características de criatividade,

isto é, um lugar para sua inventividade. Rapidamente seus problemas de aprendizagem

foram resolvidos e a nova escola também possibilitou uma expansão em diversas áreas

de sua vida.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do encontrado na escassa literatura, pode-se verificar a importância do

placement na prevenção da delinquência em crianças com tendências antissociais, ao

proporcionar que ao encontrarem um ambiente indestrutível, recuperem a memória da

situação que havia sido perdida. O ataque ao ambiente torna perceptível o quanto se

pode destruir, retomando contato com sua própria agressividade. Pode-se observar que

tal experiência só pode ser vivida quando o ambiente mostra-se acolhedor e confiável,

como o proporcionado pelas terapeutas.

No texto “Tendência antissocial”, Winnicott (1956) diz que o tratamento para um

delinquente não é a psicanálise e sim o placement. Oferecer um placement implica em

proporcionar uma experiência de lar primário, um ambiente adaptado às necessidades

especiais da criança, o que foi percebido como eficaz nos casos descritos na literatura

encontrada.

Foi possível também identificar a consulta terapêutica, técnica já reconhecida e

alternativa à análise de longo prazo e da psicoterapia breve, como outra forma efetiva de

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intervir no tratamento da tendência antissocial, por auxiliar o paciente retomar o contato

com sua experiência de desapossamento e reintegrá-la a sua personalidade.

Apesar de pouca literatura nacional sobre o tema, pode-se observar a eficácia do

placement e da consulta terapêutica em casos de tendência antissocial em estudos de

casos clínicos. Nesse sentido, mais publicações devem ser realizadas no sentido de

embasar cientificamente essas práticas no contexto de crianças brasileiras.

REFERÊNCIAS

GARCIA, Roseana Moraes. O uso da consulta terapêutica na clínica da tendência anti-social. Nat. hum., São Paulo, v. 7, n. 1, ju., 2005. JUSTO, J. S., BUCHIANERI, L. G. C. A constituição da tendência antissocial segundo Winnicott: desafios teóricos e clínicos. Revista de Psicologia da UNESP 9(2), 115-127, 2010. MAIA et al. "Crianças 'impossíveis': quem as quer, quem se importa com elas?". Psicologia em Estudo, Maringá, v. 12, n. 2, p. 335-342, maio-ago. 2007. SAFRA, G. Placement: modelo clínico para o acompanhamento terapêutico. São Paulo: Psique. Ano. X, n.18., p.13-20, set. 2006. VILETE, Edna Pereira. Esperança e tendência antissocial na clínica. Nat. hum., São Paulo, v. 7, n. 2, dez. 2005. WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. São Paulo: Martins Fontes, 2005. WINNICOTT, D. W. Tudo começa em casa. São Paulo: Martins Fontes, 1989.