3
Análise: “A caçada” Antes de passar para a própria analise do conteúdo(a historia, propriamente dita), observemos a estética do conto, pontuada a seguir: Extremamente imagético, chegando a ser tangível. “A velha tirou o grampo do coque, e limpou a unha do polegar.” “Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo...” Sinestesia Ainda nesses trechos é possível perceber a vivacidade que as cores tomam, remetendo à sentimentos e emoções. “ Ouviu o assobio da seta varando a folhagem...” “Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo...” “ A loja de antiguidades tinha o cheiro de uma arca de sacristia... Teor filosófico “Era o caçador? Ou a caça?” Metafórico “Viu-se enredado nos fios e quis fugir, mas a tarja o aprisionou nos seus braços. No fundo, lá no fundo do fosso podia distinguir as serpentes enleadas num nó verde- negro...”

Análise- A caçada

Embed Size (px)

DESCRIPTION

analise do conto A caçada

Citation preview

Page 1: Análise- A caçada

Análise: “A caçada”

Antes de passar para a própria analise do conteúdo(a historia, propriamente dita), observemos a estética do conto, pontuada a seguir:

Extremamente imagético, chegando a ser tangível.

“A velha tirou o grampo do coque, e limpou a unha do polegar.”

“Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo...”

SinestesiaAinda nesses trechos é possível perceber a vivacidade que as cores tomam, remetendo à sentimentos e emoções.

“ Ouviu o assobio da seta varando a folhagem...”

“Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo...”

“ A loja de antiguidades tinha o cheiro de uma arca de sacristia...

Teor filosófico

“Era o caçador? Ou a caça?”

Metafórico

“Viu-se enredado nos fios e quis fugir, mas a tarja o aprisionou nos seus braços. No fundo, lá no fundo do fosso podia distinguir as serpentes enleadas num nó verde-negro...”

As principais características estéticas citadas podem ser percebidas ao longo de todo o conto: a sinestesia, o descritivismo, que engendra um tom imagético, beirando ao tangível. Além do inegável tom nostálgico e as metáforas presentes em todo o texto. Partindo desse principio, a análise da história propriamente, pode iniciar-se.

O conto “A caçada”, inicia-se retratando um episódio comum, um homem entra em uma loja de antiguidades(é possível inferir que já havia visitado

Page 2: Análise- A caçada

algumas vezes a loja em questão). Observa a totalidade da loja, até que seu olhar é desviado para uma “simples” e velha tapeçaria.

O homem concentra-se na tapeçaria de tal forma, que acaba por “ver além” do que uma simples tapeçaria. Nesse instante uma sensação de deja vu o envolve. Deste episódio, no qual a imaginação do homem é levada às últimas consequências, percebe-se no texto uma discussão, subentendida/ oculta, é claro, mas há uma discussão, que pode ser dividida em dois pontos na obra, a primeira neste momento, e a segunda já ao fim do texto.

Primeiro, o olhar dissidente do homem sobre o quadro, vendo além do que existe. Esse olhar pode ser estendido, a vários âmbitos. Um deles pode tratar-se da própria visão de mundo de um indivíduo, demonstrando a veia filosófica do texto. Como é demonstrado no trecho a seguir, o homem “vê além” ao contrário da velha:

- Ontem não podia ver se ele tinha ou não disparado a seta...

- Que seta? O senhor está vendo alguma seta?

- Aquele pontinho ali no arco...

A velha suspirou.

- Mas esse não é um buraco de traça? Olha aí, a parede já está aparecendo, essas traças dão cabo de tudo...”

O homem volta para casa, atordoado, o quadro havia despertado diversas emoções nele, que inicia um questionamento, sugerindo a própria loucura. Ainda perturbado, volta no outro dia à loja de antiguidades. Ao deparar-se novamente com o quadro, a sensação do dia anterior intensificou-se, ele agora estava imerso no quadro. Iniciou-se seu questionamento, seria a caça ou o caçador? E é logo pontuado que isso não importa mais, como é percebido no trecho: “Era o caçador? Ou a caça? Não importava, não importava, sabia apenas que tinha que prosseguir correndo sem parar...”

Esse trecho acima contextualiza a segunda discussão filosófica: o papel das pessoas na sociedade. Seria o homem: O opressor, ou o oprimido? O caçador, ou o caça? No final não importava mais, ele apenas continuava a correr, é sutil, mas percebe-se que essa ideia de “continuar a correr” remete a continuar a vida, remete ao torpor do homem à tentativa de encontrar seu papel, ou mesmo a desistência de tal. Essas ideias superpostas permitem o entendimento do porque do título: “A caçada”. Revelando a profunda reflexão, que tem como pano de fundo uma simples tapeçaria.

Texto por: Maria Alice F. Lima