Anatomia Foliar de Alpinia

Embed Size (px)

Citation preview

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)1Elaine Santiago Brilhante de Albuquerque2,4 e La de Jesus Neves3 Recebido em 18/03/2003. Aceito em 22/07/2003RESUMO (Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)). Foi realizado o estudo da anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith, espcie da famlia Zingiberaceae, coletada no Horto Botnico da Quinta da Boa Vista, So Cristvo, Rio de Janeiro, RJ. A espcie vulgarmente conhecida como colnia, destacando-se pela beleza de suas inflorescncias e pelo valor medicinal que lhe atribudo. O presente estudo tem como objetivo fornecer dados que possam contribuir para a compreenso das caractersticas morfolgicas da espcie e da taxonomia da famlia. Anatomicamente a folha apresenta organizao dorsiventral do mesofilo, carter no peculiar maioria das monocotiledneas, e pela ocorrncia de clulas oleferas dispersas no mesofilo e na epiderme da face abaxial. A folha anfiestomtica e apresenta hipoderme em ambas as faces. Palavras-chaves: Alpinia zerumbet, Zingiberaceae, anatomia foliar ABSTRACT (Leaf anatomy of Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)). It was accomplished a study of the foliar anatomy of Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith, Zingiberaceae family collected at Horto Botnico of Quinta da Boa Vista, So Cristvo, Rio de Janeiro, RJ. This species is vulgarly known as colnia and is distinguished by its beautiful inflorescence and medicinal value. The main objective of this research is to contribute to the understanding of the morphological characteristics of this species as well its family taxonomy. Anatomically, the leaf presents a dorsiventral organization of the mesophyll, disaccording with most monocotyledonous. Another remarkable aspect is the presence of scattered oil cells throughout the mesophyll and abaxial surface of the leaf. The leaf is amphistomatic and presents hypodermis on both sides. Key words: Alpinia zerumbet, Zingiberaceace, leaf anatomy

IntroduoA famlia Zingiberaceae a maior da ordem Zingiberales, constituda de 53 gneros e mais de 1.200 espcies nativas de regies tropicais, especialmente do sul e sudeste da sia (Cronquist 1981; Kress et al. 2002), expandindo-se atravs da frica tropical at a Amrica do Sul e Central (Tomlinson 1969). Suas espcies, principalmente da floresta primria, crescem em hbitats sombreados ou semi-sombreados, ricos em hmus (Dahlgren et al. 1985). Muitas espcies da famlia tm valor econmico fornecendo alimentos (fculas dos rizomas), perfumes, condimentos de propriedades aromticas, corantes, fibras e papel (Tomlinson 1969). Zingiber officinale Rosc., vulgarmente conhecido como gengibre, utilizado para fins medicinais e como condimento (Joly 1993). No aspecto ornamental destacam-se os gneros1 2

Zingiber, Alpinia, Nicolaia, Hedychium e Kaempferia pela beleza da folhagem e da inflorescncia (Winters 1995). Alpinia o maior gnero da famlia, com mais de 200 espcies (Cronquist 1981) e ocorre na Malsia e nas ilhas do Oceano Pacfico (Dahlgren et al. 1985). A espcie estudada, Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith, muito cultivada pela beleza de suas flores (Joly 1993), conhecida pelos nomes vulgares de colnia, paco-seroca, cuit-au, pacov (Almeida,1993), gengibre-concha (Lorenzi & Souza 1995), cardamomodo-mato, cardamomo-falso, cana-do-brejo, cana-domato e paco-seroso (Machado 1996). Segundo Almeida (1993), as propriedades medicinais da espcie esto relacionadas s folhas, flores e rizomas, sendo consideradas depurativas, diurticas, anti-histricas, estomquicas e vermfugas. ainda, utilizada por lavradores da regio de Ribeiro Preto (SP)

3

4

Parte da Dissertao de Mestrado da primeira Autora Centro Universitrio Augusto Motta, UNISUAM, Centro de Cincias da Sade, Av. Paris, 72, Bonsucesso, CEP 21041-020, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Departamento de Botnica, Quinta da Boa Vista, So Cristvo, CEP 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Autor para correspondncia: [email protected]

110

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)

no tratamento de reumatismo e males cardacos (Carlini 1972). A espcie tem sido largamente estudada em relao s suas propriedades farmacolgicas. Os estudos com o ch das folhas da colnia realizados por Mendona et al. (1991) e Laranja et al. (1992) confirmam o seu efeito hipotensor. Os estudos realizados por Fonteles & Oliveira (1984 apud Almeida 1993) revelaram resultados significativos quanto ao efeito diurtico, entretanto, os mesmos no foram obtidos por Laranja et al. (1992). Santana et al. (1966) mostraram ao antiinflamatria capaz de inibir processos edematosos. A colnia tem sido tambm estudada em relao s atividades antifngicas (Lima et al. 1993) e antibacterianas, alm da produo de inseticidas a partir dos leos essenciais da flor (Morita 1992). A composio qumica dos leos essenciais encontrados na folha e no rizoma da espcie foi estudada por Fujita & Yamashita (1973) e por De Pooter et al. (1995). O uso de leos essenciais remonta a antigos perodos da histria humana (Fahn 1979) fornecendo, ainda hoje, o material bruto para indstrias de inseticidas, antisspticos, produtos farmacuticos, perfumes e condimentos. Segundo Wattiez & Sternon (1942), a ao antimicrobiana dos leos essenciais varivel para cada tipo de leo e tipo de bactria. De Pooter et al. (1995) e Morita (1992) estudando Alpinia speciosa, e Rao & Nigam (1970), Curcuma zedoaria, confirmaram a atividade antimicrobiana dos leos essenciais; enquanto Janssen & Scheffer (1985) e Kishore et al. (1987) comprovam a atividade antifngica dos leos essenciais dos rizomas de Alpinia galanga e Alpinia carinata, respectivamente. O presente trabalho objetivou o estudo da anatomia foliar de Alpinia zerumbet visando contribuir para o conhecimento da morfologia da espcie e para a taxonomia da famlia Zingiberaceae, tal como desenvolvido por Tomlinson (1956; 1962; 1969); Metcalfe (1963); Goldberg (1989); Hussin et al. (2000). A escolha da espcie, embora pertencente ao contingente das plantas exticas, foi motivada por seu largo cultivo e emprego na medicina popular, assim como por suas propriedades teraputicas j comprovadas.

Material e mtodosO material estudado foi oriundo do Horto Botnico do Museu Nacional/UFRJ, Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro, Albuquerque 1 (R). As folhas foram coletadas no perodo de 1996 a 1998. Parte foi fixada em lcool etlico a 70 GL

(Johansen 1940) e em FAA 70% (Sass 1951) para ser submetida s tcnicas histolgicas, e parte mantida a fresco para a realizao dos testes histoqumicos. Os cortes histolgicos foram obtidos com auxlio do micrtomo manual, tipo Ranvier, e de congelao filtro Leitz 1213, utilizando-se folhas plenamente desenvolvidas e, ocasionalmente, folhas jovens para o acompanhamento do processo de morfognese do tecido subepidrmico. O estudo organogrfico foi realizado com observaes vista desarmada e sob estereomicroscpio, sendo os pormenores estruturais representados com auxlio de cmara-clara. As convenes adotadas no esquema referente ao pecolo esto de acordo com Metcalfe & Chalk (1950). As fotomicrografias foram obtidas com o auxlio do microscpio Orthoplan, de Leitz, com equipamento fotogrfico Orthomat. A epiderme foi destacada manualmente e corada com Safranina hidroalcolica (Strasburger 1924). Para os clculos da densidade estomtica por mm2 em cada face, utilizou-se 10 folhas. Foi feita a projeo de um campo correspondente a um quadrado de 1mm de lado, calculando-se a mdia aritmtica dos estmatos em 30 campos. Os testes histoqumicos foram feitos em seces realizadas mo livre, de material fresco, sendo submetidas aos seguintes reagentes: Sudan III e IV (Johansen 1940), para observao de compostos de natureza lipdica; reagentes de Benedict (McLean & Ivimey-Cook 1958) e de Fehling (Sass 1951), para identificao de glicdios redutores; lugol (Johansen 1940), para gros de amido; soluo aquosa de sulfato ferroso em formalina (Johansen 1940) e reagente de Hoepfner-Vorsatz (Reeve 1951), para evidenciao de compostos tnicos; reagente de Mayer (Costa 1982) e iodo iodeto de potssio (Dop & Gauti 1928), para alcalides; azul de metileno (Langeron 1949) e vermelho de rutnio (Jensen 1962), para identificao de mucilagem celulsica e pctica, respectivamente; cristais de fenol (Howarth & Warne 1959) e cido fluordrico (Vogel 1981), para colorao e dissoluo de slica, respectivamente. Cristais de oxalato de clcio foram reconhecidos pela solubilidade em cido hidroclrico a 2% (Howarth & Warne 1959) Para a identificao do contedo das clulas oleferas, os cortes histolgicos foram tratados com benzina, clorofrmio, ter (Beille 1925; Wattiez & Sternon 1942), cloral hidratado, cido actico e hidrxido de potssio (Beille 1925) para testar sua solubilidade; com Sudan III, Sudan III em soluo de cloral hidratado,

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

111Lmina foliar - A epiderme, em viso frontal, mostra clulas poligonais de paredes retas, levemente espessadas, por vezes arqueadas ordenadas em fileiras (Fig. 3, 4). Tricomas ocorrem somente nos bordos, e estmatos, do tipo paractico, acham-se em densidade equivalente a 7,3/mm na face adaxial, e a 149/mm na abaxial. Nesta face encontram-se ainda estmatos do tipo tetractico (Fig. 4). As clulas epidrmicas sobre as regies costais tm dimenses reduzidas, paredes suberificadas e encerram corpsculos arredondados de natureza silicosa (Fig. 3, 4). As clulas epidrmicas, em seco transversal, mostram contorno retangular (Fig. 5, 6, 7) e campos de pontoao nas paredes anticlinais. Foram identificados na epiderme gotculas de leo e alcalides, alm de gros de amido nas clulas oclusivas dos estmatos. Registraram-se ainda, na face abaxial, grande concentrao de gotculas de leo nas clulas

nitrato de prata a 1% (Wattiez & Sternon 1942) e soluo aquosa de acetato de cobre (Beille 1925; Wattiez & Sternon 1942) para testar sua afinidade tintorial. A volatilidade do contedo foi testada em banho-maria (Beille 1925). Para a evidenciao de suberina na parede celular das clulas oleferas, as seces das folhas foram tratadas em soluo de hidrxido de potssio a 10% e cloreto de zinco iodado (Tomlinson 1956).

ResultadosCaracterizao morfolgica - Alpinia zerumbet planta herbcea, perene, atingindo 2,5m alt., rizomatosa, com caule areo curto, folhas lanceoladas em disposio dstica, (Fig. 1, 2) de base aguda e pice cuspidado, pubescentes nos bordos. As folhas so curto-pecioladas, com longa bainha aberta e lgula desenvolvida. A sobreposio das bainhas origina um pseudo-caule.

Figuras 1-4. Hbito (1-2) e vista frontal da epiderme de Alpinia zerumbet (3-4). 1. Aspecto geral do exemplar documentado no Horto Botnico do Museu Nacional. 2. Detalhe da inflorescncia. 3. Face adaxial: estmato tetractico e clulas sobre a nervura contendo corpsculo silicoso (barra = 30 m). 4. Face abaxial: estmatos tetracticos (barra = 44m). co clula olefera; cs corpsculo silicoso; csb clulas subsidirias; est estmato; gl gotcula lipdica.

112

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)

subsidirias dos estmatos e clulas oleferas (Fig. 4) que se destacam pelo formato pentagonal em seco transversal (Fig. 5). Sob a epiderme, encontra-se de um a trs estratos hipodrmicos (Fig. 5, 6, 7) constitudos de clulas grandes, de formato arredondado ou quadrangular, de paredes finas com numerosos campos de pontoaes visveis, principalmente nas paredes anticlinais. A hipoderme freqentemente acha-se interrompida pela extenso da bainha fibrosa dos feixes vasculares, que se comunica com o estrato epidrmico. As clulas hipodrmicas reagem ao teste para identificao de mucilagem e leo. O mesofilo possui organizao dorsiventral, formado por um estrato de parnquima palidico e por trs ou quatro estratos de parnquima lacunoso, os quais se

comunicam atravs de um estrato de clulas coletoras (Fig. 6). Por todo o mesofilo encontram-se clulas oleferas (Fig. 6) e cristais prismticos de oxalato de clcio (Fig. 7). Os feixes vasculares do tipo colateral acham-se envolvidos por bainha parenquimtica com extenso de natureza esclerenquimtica (Fig. 5, 6). As clulas do parnquima lacunoso que se comunicam com a bainha parenquimtica do feixe dispem-se radialmente, assemelhando-se a uma coroa (Fig. 6). Mucilagem ocorre nas clulas dos parnquimas palidico e lacunoso, enquanto que gotculas de leo ocorrem em todo o mesofilo, no floema e na bainha parenquimtica dos feixes. O parnquima reage positivamente para os testes de amido e compostos tnicos. Acares redutores so encontrados no

Figuras 5-8. Seces transversais da lmina foliar de Alpinia zerumbet. 5. Notam-se estmatos em ambas as faces e clula olefera na epiderme da face abaxial (barra = 37m). 6. Organizao dorsiventral do mesofilo e clulas oleferas (barra = 88m). 7. Regio prxima nervura mediana, mostrando cristais no mesofilo em luz polarizada (barra = 58m). 8. Detalhe do bordo evidenciando tricomas, feixe transcurrente e hipoderme na poro distal (barra - 69m). co clula olefera; est estmato; hp hipoderme.

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

113Nervura mediana - A nervura mediana, no tero mdio do limbo, exibe seco transversal cncavo-convexa (Fig. 9). A epiderme da face adaxial apresenta clulas retangulares com numerosos cristais de slica e impregnao de suberina, a qual se manifesta tambm nas paredes periclinais internas podendo, ocasionalmente, estender-se atravs dos estratos subepidrmicos (Fig. 10). A epiderme da face abaxial exibe clulas de forma retangular a elptica, com paredes periclinais externas arqueadas, espessadas, anisotrpicas, recobertas por uma tnue cutcula. Esto presentes estmatos com amplas cmaras subestomticas, assim como tricomas

parnquima palidico, bem como alcalides no floema. O bordo do limbo, em seco transversal, mostra-se fletido para a face adaxial (Fig. 8); apresenta tricomas tectores longos com paredes espessas, que reagem positivamente ao teste de compostos tnicos. As clulas epidrmicas tm forma elptica ou retangular, paredes anticlinais e periclinais espessas. Na regio do bordo, as clulas dos parnquimas palidico e lacunoso so menores, e ocorrem clulas oleferas (Fig. 8). As clulas hipodrmicas, na poro distal do bordo, mostram paredes espessadas. O tecido vascular est representado por um ou dois feixes de grande porte de carter transcurrente (Fig. 8).

Figuras 9-11. Seces transversais da nervura mediana. 9. Aspecto geral (barra = 233m). 10. Face adaxial: cristais de slica nas clulas epidrmicas (barra = 29m). 11. Regio de contato entre a nervura e a lmina: notam-se estratos subepidrmicos (setas) sem afinidade tintorial (barra = 100m). ar aernquima; sl cristal de slica.

114

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)

simples, unicelulares, curtos, posicionados, preferencialmente, na regio entre a nervura e a lmina. semelhana das clulas da face adaxial, ocorrem numerosos cristais de slica. O limite entre os tecidos da nervura e da lmina est marcado, em ambas as faces, pela interrupo do tecido subepidrmico suberificado e pela ocorrncia de um conjunto de clulas com paredes espessadas, dispostas em at cinco estratos que, na face abaxial, penetram entre os feixes vasculares. Esses elementos tm fraca ou nenhuma afinidade tintorial, distinguindose facilmente dos tecidos celulsicos e lignificados (Fig. 11). O sistema vascular da nervura dispe-se em trs nveis (Fig. 9). Feixes de pequeno porte, envolvidos por bainha esclerenquimtica, esto relacionados face adaxial (Fig. 9). Feixes de mdio porte, guarnecidos por casquetes de fibras, mais volumosos em relao poro xilemtica, acham-se posicionados ao nvel mediano do parnquima fundamental, enquanto os feixes mais calibrosos acham-se relacionados face abaxial, estando tambm guarnecidos por casquetes de fibras, no entanto, mais desenvolvidos em relao ao floema (Fig. 9). Entre os feixes de grande porte, o parnquima fundamental mostra especializao exibindo clulas menores, ricas em cloroplastos e cristais prismticos de oxalato de clcio, delimitando grandes espaos intercelulares preenchidos por clulas braciformes (Fig. 9). Clulas oleferas ocorrem, em baixa freqncia, prximas aos grandes espaos intercelulares. Pecolo - A regio mediana mostra seco transversal plano-convexa, observando-se na face adaxial projeo mais ou menos acentuada dos bordos (Fig. 12). As clulas epidrmicas, na face adaxial, apresentam forma retangular, em seco transversal, com paredes espessadas, em maior grau as anticlinais e periclinais internas (Fig. 13). As clulas que revestem as pores laterais e abaxial do pecolo podem, contudo, exibir espessamento uniforme de todas as paredes celulares (Fig. 14, 15). Nessas regies, as clulas so menores que as da face adaxial (Fig. 14, 15). Clulas oleferas acham-se aleatoriamente distribudas entre os elementos epidrmicos, distinguindo-se pela forma, em geral pentagonal, e pelo adelgaamento da parede celular (Fig. 14). Os tricomas curtos, unicelulares, com paredes espessadas ocorrem exclusivamente na regio limtrofe ao bordo, enquanto os estmatos posicionam-se nas laterais e mediana do arco abaxial. Internamente epiderme, observa-se um tecido parenquimtico que assume caractersticas prprias

Figura 12. Diagrama do pecolo em seco transversal, evidenciando a disposio do tecido vascular (barra = 1mm).

segundo sua posio no rgo. Os estratos adjacentes epiderme adaxial, em nmero de trs a quatro, exibem clulas de paredes moderadamente espessadas e suberificadas (Fig. 13), contrastando com os elementos subepidrmicos da rea correspondente ao bordo, onde o parnquima adquire carter colenquimtico, por vezes assemelhando-se a colnquima angular (Fig. 14). Os elementos parenquimticos adjacentes face abaxial, dispostos em trs a cinco estratos na poro mediana do arco, exibem tambm paredes levemente espessadas, com diferentes graus de suberificao (Fig. 15). Outra especializao do parnquima corresponde formao de um aernquima posicionado entre os feixes vasculares de maior calibre, e relacionados face abaxial do pecolo (Fig. 16). Os espaos delimitados pelas clulas parenquimticas esto, em parte, ocupados por clulas braciformes. O restante da estrutura exibe parnquima fundamental com clulas de paredes finas, seco arredondada ou poligonal e dimenses variveis segundo sua localizao (Fig. 13-15). Assim, os elementos mais calibrosos esto localizados na poro central da seco. Os feixes vasculares tm distribuio irregular, exceto os grandes feixes, que acompanham o arco abaxial da estrutura (Fig. 15). Os feixes so colaterais, protegidos por dois casquetes de fibras, sendo o mais desenvolvido relacionado poro floemtica (Fig. 15). O arco esclerenquimtico que guarnece a poro xilemtica, alm de ter menor nmero de elementos,

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

115oleferas acham-se predominantemente distribudas no parnquima prximo aos feixes de grande porte (Fig. 16). Compostos tanferos foram observados na epiderme e no parnquima. A regio proximal do pecolo distingue-se da mediana por apresentar cinco pequenos feixes vasculares envolvidos por bainha esclerenquimtica, intercalados com os feixes de grande porte; e pela disposio dos casquetes de fibras dos feixes vasculares mais calibrosos, que se tocam atravs de suas extremidades acabando por soldarem-se formando um anel contnuo, sobretudo nos feixes vasculares posicionados nas laterais do arco.

exibe paredes menos espessadas (Fig. 15). Relacionados face adaxial encontram-se feixes muito reduzidos, totalmente envolvidos por um cordo de fibras, cujas paredes mostram diferentes graus de espessamento (Fig. 13). Entre os feixes vasculares, intercalam-se cordes de fibras mais ou menos desenvolvidos chegando, por vezes, a se anastomosarem com os elementos mecnicos que envolvem os feixes (Fig. 13). Ainda, por todo o parnquima, so observados pequenos feixes guarnecidos por elementos mecnicos mais desenvolvidos em relao poro xilemtica (Fig. 14). No parnquima observam-se pequenos cristais prismticos de oxalato de clcio (Fig. 16). Clulas

Figuras 13-16. Sees transversais do pecolo. 13. Face adaxial: estratos subepidrmicos com paredes espessadas e feixes vasculares (barra = 100m). 14. Bordo projetado: feixes vasculares e clulas oleferas (barra = 100m). 15. Face abaxial: feixes de grande porte protegidos por casquetes de fibras. (barra = 90m). 16. Face abaxial: presena de aernquima, clulas oleferas e cristais (barra = 90m). ar aernquima; co clula olefera; cr cristais; est estmato.

116

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)

Na regio proximal da lgula, verifica-se que a epiderme constituda por clulas altas em paliada, exibindo paredes fortemente cutinizadas (Fig. 18). Os estratos subepidrmicos apresentam clulas com paredes espessadas (Fig. 18). A lgula, com textura membrancea, exibe epiderme uniestratificada (Fig. 17). Na face adaxial os elementos epidrmicos apresenta forma retangular em seco transversal, com paredes anticlinais e periclinais internas espessadas. O espessamento acentua-se em relao s paredes periclinais externas nas clulas adjacentes ao bordo.

Na face abaxial observa-se a ocorrncia de estmatos, clulas oleferas e numerosos tricomas unicelulares, simples, de tamanho variado e paredes espessadas (Fig. 17). O mesofilo de natureza parenquimtica exibe clulas com paredes de espessura varivel (Fig. 17). Dispersas por todo o tecido, observam-se clulas oleferas (Fig. 18). O sistema vascular, imerso no parnquima, constitudo por feixes colaterais envolvidos por bainha mecnica (Fig. 17), sendo mais congestos nas proximidades do bordo onde se intercalam com cordes de fibras.

Figuras 17-18. Seces transversais da lgula. 17. Regio adjacente ao bordo: cordo de fibras, clula olefera e tricomas (barra = 58m). 18. Regio proximal: clula olefera (barra = 44m). co clula olefera.

DiscussoAs folhas das monocotiledneas variam em forma e estrutura podendo algumas se assemelharem s folhas das dicotiledneas, diferenciadas em pecolo e lmina. No entanto, a maioria possui bainha e lmina, sendo esta relativamente estreita (Esau 1977). Arber (1918) definiu que a folha tpica das monocotiledneas tem forma simples, mais ou menos linear, com base alargada e nervuras paralelas. A autora questiona como tal folha pode ser comparada com a das dicotiledneas que constituda por estpulas, pecolo e lmina com nervuras reticuladas.

A idia dominante da relao estrutural entre as folhas lineares das monocotiledneas e os apndices foliares das dicotiledneas tem sido a teoria do fildio proposta por De Candolle (1827 apud Kaplan 1975) e apoiada por Henslow (1911 apud Kaplan 1975), Arber (1918) e Eames & Mac Daniels (1953). De acordo com os autores referidos, a poro achatada e fotossinttica observada em Sagittaria, Hyacinthus, Flagellaria e outros gneros, corresponde bainha da folha ou ao pecolo transformado, constituindo o fildio. Para Mauseth (1988), a nervura mediana tambm pode originar o fildio. A esse conceito puramente organogrfico Arber (1918; 1925 apud Kaplan 1975)

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

117lembra um pecolo, na forma e funo, mas que teria evoludo, recentemente, de uma folha ancestral sssil. No presente trabalho, a regio posicionada entre a bainha e a lmina descrita como pecolo, ignorandose a denominao dada por Mauseth (1988). No entanto, a presena de clulas parenquimticas modificadas, posicionadas nas proximidades de um dos bordos, pode ser indcio da evoluo sugerida pelo autor. O pecolo curto, carter que se acentua pela assimetria da base da lmina, tornando seus limites pouco precisos e, ao nvel histolgico, exibe as caractersticas comuns ao rgo. O tecido vascular distribui-se, preferencialmente, em cordes relacionados face abaxial da estrutura, guarnecidos por conspcuos cordes de fibras. Por todo o parnquima fundamental encontram-se feixes vasculares de pequeno porte, com padro de distribuio tpico das monocotiledneas, estando todos associados a fibras. A abundncia e posicionamento do tecido mecnico garante a resistncia necessria ao pecolo para manter a posio da lmina foliar, impedindo seu flexionamento. Papel idntico atribui-se s fibras encontradas na nervura mediana da lmina onde formam cordes calibrosos. A importncia das fibras em A. zerumbet foi relatada por Tomlinson (1956), que lhes atribui valor comercial. A presena de lgula tem sido registrada para a famlia Zingiberaceae e Costaceae (Judd et al. 1999). De acordo com Van Nam (1975), a ordem Zingiberales (=Scitamineae) foi pouco estudada no que concerne ao aparelho ligular. Para o autor, das famlias que compem a ordem, somente as Marantaceae e parcialmente as Zingiberaceae foram examinadas, sendo que desta famlia, as observaes so precrias, conduzindo a opinies contraditrias. Barthelat (1893 apud Tomlinson 1956) considerou que a lgula das Zingiberaceae constituda por um prolongamento das duas epidermes da bainha que, ao nvel da base do limbo, fundem-se e continuam a crescer, originando uma lmina fina, bilobada no pice. Segundo Cronquist (1977), a lgula ontogeneticamente uma projeo do extremo da bainha. Muito embora no se tenha realizado, no presente trabalho, estudos relativos origem da lgula, as evidncias morfolgicas e histolgicas permitem consider-la uma projeo da bainha, em concordncia com Barthelat (1893 apud Tomlinson 1956), Cronquist (1977) e Van Nam (1975). Em A. zerumbet a lgula constituda pelos estratos epidrmicos e camadas de tecido parenquimtico, em meio ao qual dispem-se feixes vasculares, fato que se acha em concordncia com as observaes de Chaffey (1985). Para o autor,

acrescentou evidncias anatmicas relacionadas vascularizao. Uma dessas evidncias foi ressaltada por Eames (1961), que relatou a venao paralela, tpica das monocotiledneas, como caracterstica da bainha da folha e do pecolo. A teoria do fildio tambm considera que, em contraste com a reduo da folha pela perda de sua lmina, a especializao pode ocasionar o desenvolvimento de uma nova parte da folha (Kaplan 1975). Assim, uma segunda lmina forma-se pela expanso da extremidade distal do fildio peciolar (Kaplan 1975). Alm das palmeiras, das Alismataceae, dos gneros Smilax, Eichornia e Pontederia, a ordem Scitamineae tambm citada como exemplo (Eames 1961). Em tais lminas, a venao paralela considerada uma evidncia para a natureza peciolar da lmina, muito embora a venao dos grupos citados seja comumente intermediria entre a paralela e a reticulada (Eames 1961). Mauseth (1988) confirmou tal fato ao assinalar que a famlia Zingiberaceae possui folhas largas como as dicotiledneas, mas no possui venao reticulada, observando que todas as nervuras secundrias partem da nervura principal e dirigem-se paralelamente aos bordos. Tal padro de venao ocorre na folha de A. zerumbet e destas nervuras secundrias partem pequenas nervuras tercirias que cruzam transversalmente as secundrias. Segundo Mauseth (1988), essas nervuras so chamadas de feixes comissurais. O padro de venao citado pelo autor como venao lateral paralela, d um indcio do crescimento da lmina a partir da nervura mediana. Alpinia zerumbet tem sido descrita como planta rizomatosa, apresentando folhas diferenciadas em lmina, pecolo curto, lgula e bainha. A maioria das lminas das monocotiledneas tem organizao histolgica homognea do mesofilo, carter que refora a origem peciolar da estrutura. Alpinia zerumbet, no entanto, possui organizao dorsiventral, tpica das lminas das dicotiledneas e que pode aqui ser explicada em relao ao posicionamento das folhas, visto que se apresentam patentes, propiciando a especializao em parnquima palidico e lacunoso. Convm assinalar que a diferenciao do mesofilo dos exemplares que constituem a populao de A. zerumbet no Horto Botnico do Museu Nacional independe do grau de insolao a que esto submetidos os indivduos. Mauseth (1988) relatou que muitas monocotiledneas possuem pseudopecolos, considerando-os uma terceira parte da folha, alm da lmina e da bainha. O autor cita como exemplo o gnero Alpinia, explicando que o termo usado para definir uma estrutura que

118

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae)

as lgulas desempenham papel protetor, uma vez que, por estarem pressionadas contra o caule, evitam que gua e impurezas instalem-se entre a bainha da folha e o caule. A presena de corpsculo silicoso nas clulas epidrmicas que recobrem as nervuras caracterstica marcante na espcie estudada, sendo este carter apontado por Tomlinson (1969) para a tribo Alpineae. Tomlinson (1969) e Metcalfe (1954) denominaram tal arranjo como stegmata, sendo o termo, em verdade, aplicado por Netolitzky (1929) para as clulas que possuem um corpo silicoso ou cristal de oxalato de clcio, dispostas em fileiras paralelas s fibras. Solereder & Meyer (1930 apud Tomlinson 1956) descreveram, para a famlia Zingiberaceae, cinco tipos de clulas silicosas, porm apenas as que so encontradas em Alpinia allughas so consideradas as verdadeiras stegmata devido ao espessamento das paredes celulares. Tomlinson (1956) considerou, entretanto, irrelevante o espessamento da parede para definir os verdadeiros stegmata, enquanto se ignora as caractersticas dos corpos silicosos. Para o autor, devese aplicar o termo stegmata a cada clula mais ou menos isodiamtrica, contendo um nico corpo silicoso, disposta em sries longitudinais, sempre adjacentes e paralelas s fibras das bainhas dos feixes, tal como observado em A. zerumbet. Slica tambm ocorre nas clulas epidrmicas da nervura mediana de A. zerumbet. Essa caracterstica acha-se em desacordo com Tomlinson (1969), que registrou, para a famlia Zingiberaceae, slica em toda a epiderme, com exceo das clulas dos estmatos. Solereder & Meyer (1930 apud Tomlinson 1956) devotaram considervel ateno natureza e distribuio de incluses silicosas em Zingiberaceae, mas assinalaram que sua ocorrncia e distribuio necessitam de maiores investigaes. Na espcie estudada, os estmatos so pouco freqentes na epiderme da face adaxial da lmina foliar, distribuindo-se, preferencialmente, na regio intercostal da face abaxial, o que se acha em concordncia com Tomlinson (1969). Segundo Esau (1977), o nmero de estmatos por unidade de superfcie to varivel que possui pouco valor taxonmico. Entretanto, tratando-se de uma monocotilednea, a diferena de densidade expressa a disposio espacial das lminas, eretas em muitas espcies, e patentes em outras, tal como se observa em A. zerumbet. Segundo a autora, o aspecto dos estmatos em vista frontal, especialmente com referncia natureza e orientao das clulas subsidirias, serve como caracterstica taxonmica.

Os estmatos observados na parte vegetativa foram classificados como tetracticos, concordando com Tomlinson (1969) e Paliwal (1969), que os classificaram apenas como tetracticos ou tetrapergenos, respectivamente, com base na presena de um par de clulas posicionadas na regio polar das clulas oclusivas. Em A. zerumbet, estas clulas terminais esto presentes, porm podem ser em maior nmero em decorrncia de divises transversais desses elementos. Metcalfe (1963) relatou que tricomas so menos comuns em monocotiledneas do que em dicotiledneas. Em A. zerumbet registrou-se a presena de tricomas tectores, posicionados no bordo da lmina foliar e na face abaxial da nervura mediana, o que foi confirmado por Tomlinson (1969). Entretanto, o autor no relata a presena de tricomas na epiderme abaxial da lgula, conforme observado na espcie estudada. O mesmo autor assinalou que os tricomas so, em geral, no ramificados, exceto em Renealmia e Aframomum. Entretanto, tricomas com esta caracterstica foram observados, ocasionalmente, no bordo da lmina foliar de A. zerumbet. Tomlinson (1956) comentou que os tricomas so lignificados em algumas espcies de Alpinia, porm, esta caracterstica no foi comprovada no presente trabalho. Tomlinson (1956) assinalou, no entanto, que em A. sanderae, tricomas lignificados ou no podem se alternar, registrando, ainda, que as paredes espessadas dos tricomas coram-se pela safranina mesmo quando o teste para a lignina com floroglucina clordrica revela-se negativo, caracterstica que ocorre em A. zerumbet. Tomlinson (1956) registrou, para o gnero Alpinia, a presena de hipoderme apenas na face adaxial. Entretanto, a espcie aqui estudada apresenta no s hipoderme na face adaxial, como na abaxial, embora nesta no seja contnua e as clulas mostrem menores dimenses. Tomlinson (1956) explicou que, em algumas espcies de Zingiberaceae, pelo fato dos estmatos serem menos freqentes na epiderme superior, a hipoderme adaxial forma uma camada mais ou menos ininterrupta; a hipoderme abaxial, entretanto, interrompida pelas amplas cmaras subestomticas. As clulas hipodrmicas so grandes, aproximadamente cbicas, sem colorao, e, ocasionalmente, contm cristais de oxalato de clcio, tanino e raramente, slica (Tomlinson 1956). Em A. zerumbet no se registrou a presena de cristais ou de slica, porm houve reao para os testes de tanino, acares redutores, mucilagem e alcalides. Para Tomlinson (1956), a hipoderme um tecido caracterstico da ordem Scitamineae, porm de acordo

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004

119no contedo dos tricomas do bordo da folha, o que se confirma no presente trabalho. Cristais so freqentemente classificados, segundo Esau (1977), como produtos de excreo mas, possivelmente, parte do clcio reciclada. Segundo Metcalfe (1989), h opinies divergentes em relao ao papel desempenhado pelos cristais, pois vrios significados metablicos so atribudos sua freqncia, como por exemplo, proteger o vegetal contra herbivoria, dar suporte mecnico aos tecidos em poca de seca e at neutralizar grande quantidade de cido oxlico nocivo planta. Cristais prismticos de oxalato de clcio foram observados no parnquima clorofiliano da lmina foliar e no parnquima intercalar aos feixes vasculares da nervura mediana e do pecolo. Neste ocorrem, tambm, cristais no parnquima fundamental. Tal distribuio concorda com a registrada por Tomlinson (1969) e sugere funo protetora e de suporte mecnico. Solereder & Meyer (1930 apud Tomlinson 1956) sugeriram que a presena de grande quantidade de cristais de oxalato de clcio pode ter valor taxonmico em certas espcies, porm os autores assinalaram que podem haver variaes na quantidade de cristais em diferentes amostras de uma mesma espcie, como em Alpinia javanica. Segundo Tomlinson (1956), a distribuio destes cristais sugere que estejam associados com a sntese de carboidratos, j que so abundantes na lmina foliar e esto confinados no clornquima do pecolo e da bainha da folha, enquanto so incomuns nas partes mais inferiores, como as razes. Elementos secretores considerados especializados ocorrem em algumas famlias de Scitaminae, como por exemplo, as clulas de mucilagem de Cannaceae, os laticferos de Musaceae e as clulas oleferas de Zingiberaceae (Tomlinson 1962). Tomlinson (1956) registrou para as Zingiberaceae a presena de clulas oleferas de forma isodiamtrica, paredes suberificadas, distribudas no parnquima fundamental de todos os rgos estudados e na epiderme da lmina. Em A. zerumbet, as clulas oleferas tm as mesmas caractersticas e foram encontradas em toda a folha. No entanto, a forma isodiamtrica s reconhecida para as clulas oleferas encontradas no parnquima, uma vez que as clulas posicionadas na epiderme tm seco poligonal. As clulas oleferas so provavelmente a fonte de muitas substncias que tornam as espcies de Zingiberaceae comercialmente importantes como plantas aromticas (Tomlinson 1956). As essncias ou leos essenciais, contidas em tais clulas, segundo Fahn

com Solereder & Meyer (1930 apud Tomlinson 1956), ela menos desenvolvida em Zingiberaceae. Estes dois autores sugeriram que a hipoderme tem a funo de armazenar gua, o que foi confirmado por Skutch (1930) ao estudar algumas espcies de Scitamineae, como Alpinia exaltata. O autor menciona que as clulas hipodrmicas na nervura mediana esto associadas com o desenrolar da folha, atuando como clulas de expanso. Tal teoria pode justificar a existncia do maior nmero de estratos celulares na poro da lmina de A. zerumbet nas proximidades da nervura mediana, tendo em vista a pr-foliao convoluta da folha. A presena de canais aerferos nos tecidos da folha de muitas monocotiledneas fato que levou Henslow (1892 apud Tomlinson, 1962) a sugerir que todo o grupo tivesse um ancestral aqutico. Essa idia no foi compartilhada por Tomlinson (1962), que a considerou resultante da teorizao de um botnico familiarizado apenas com as monocotiledneas de regies temperadas, onde elas no mostram sua maior diversidade. Aernquima nos tecidos das Scitamineae, de acordo com Tomlinson (1962), provavelmente uma conseqncia mecnica da utilizao de menor quantidade de tecido fundamental por um rgo grande que se desenvolve rapidamente. Em A. zerumbet foi registrado aernquima tanto no pecolo quanto na nervura mediana da folha, posicionado entre os feixes de grande calibre relacionados face abaxial. Tomlinson (1962) comentou que a presena de dois sistemas de aernquima, um adaxial e outro abaxial, caracterstica primitiva e que tende reduo at um nico arco abaxial em todas as famlias de Scitamineae, exceto Heliconiaceae e Lowiaceae, enquanto em Costaceae os canais aerferos so reduzidos ou ausentes. Para as Zingiberaceae, o autor referiu que os canais aerferos esto mais ou menos alternados com os feixes vasculares da face abaxial, o que foi constatado no presente trabalho. Tomlinson (1956) relatou que compostos tanferos so muito freqentes em todas as espcies de Zingiberaceae, sendo sua distribuio caracterstica muito varivel e, conseqentemente, no tm valor taxonmico dentro da famlia. Tais compostos conferem apenas proteo planta contra a desidratao, putrefao e leses causadas por animais (Fahn 1985). Em A. zerumbet foi observada grande quantidade de idioblastos tanferos concordando com Tomlinson (1969), que registrou grande concentrao de tais idioblastos no tecido parenquimtico fundamental de todas as partes vegetativas estudadas. O mesmo autor comentou que ocasionalmente, pode-se encontrar taninos

120

Albuquerque & Neves: Anatomia foliar de Alpinia zerumbet (Pers.) Burtt & Smith (Zingiberaceae) Cronquist, A. 1981. An integrated system of classification of flowering plants. Columbia University Press, New York. Dahlgren, R. M. T.; Clifford, H. T. & Yeo, P. F. 1985. The families of the Monocotyledons - Structure, evolution, and taxonomy. Springer-Verlag, Berlim. De Pooter, H. L.; Aboutabl, E. A. & EL-Shabrawy, A. O. 1995. Chemical composition and antimicrobial activity of essential oil of leaf, stem and rhizome of Alpinia speciosa (J. C. Wendl.) K. Schum, grown in Egypt. Flavour Fragrance Journal 10(2): 63-67. Dop, P. & Gauti, A. 1928. Manuel de technique botanique. 2 ed. J. Lamarre, Paris. Eames, A. J. 1961. Morphology of the Angiosperms. Tata McGraw-Hill Publishing Co., India. Eames, A. J. & Mac Daniels, L. H. 1953. An introduction to plant anatomy. 2 ed. McGraw-Hill Book Company, New York. Esau, K. 1977. Anatomy of seed plants. 2 ed. John Wileys and Sons, New York. Fahn, A. 1979. Secretory tissues in plants. Academic Press, London. Fahn, A. 1985. Anatomia Vegetal. Ediciones Pirmide, Madrid. Fujita, H & Yamashita, M. 1973. The constituents of the essential oil from Alpinia speciosa K. Schum. Yakugakuzasshi 93(12): 1635-1638. Goldberg, A. 1989. Classification, evolution, and phylogeny of the families of Monocotyledons. Smithsonian Contributions to Botany 71: 1-74. Howarth, W. & Warne, L. G. G. 1959. Practical botany for the tropics. University of London Press, London. Hussin, K. H.; Seng, C. T.; Ibrahim, H.; Gen, W. Q.; Ping, L. J. & Nian, L. 2000. Comparative leaf anatomy of Alpinia Roxb. species (Zingiberaceae) from China. Botanical Journal of the Linnean Society 133(2): 161-180. Janssen, A. M. & Scheffer, J. J. C. 1985. Acetoxychavicol acetate, an antifungal component of Alpinia galanga. Planta Medica 6: 507-510. Jensen , W. A. 1962. Botanical histochemistry. H. H. Friman & Co., San Francisco. Johansen, D. A. 1940. Plant Microtechnique. Mc Graw Hill Book, New York. Joly, A. B. 1993. Botnica - Introduo taxonomia vegetal. Companhia Editora Nacional, So Paulo. Judd, W. S.; Campbell C. S.; Kellog, E. A. & Stevens, P. F. 1999. Plant systematics a phylogenetic approach. Sinauer Associates, Sunderland, Massachussets, Kaplan, D. R. 1975. Comparative developmental evaluation of the morphology of unifacial leaves in the monocotyledons. Botanische Jahrbcher fr Systematik, Pflanzengeschichte und Pflanzengeografrie 95(1): 1-105. Kishore, N.; Asthana, A. & Dubey, N. K. 1987. Antifungal activity of rhizome vapours of Alpinia carinata against Rhizoctonia solani. Transactions of the British Mycological Society 88(1): 136-138. Kress, W. J.; Prince, L. M. & Williams, K. J. 2002. The phylogeny and a new classification of the gingers (Zingiberaceae): evidence from molecular data. American Journal of Botany 89(10): 1682-1696.

(1979), contm grande variedade de terpenos, sendo o grupo mais importante das substncias secretadas. Para a planta, alm de representar reservas, os leos essenciais desempenham outras funes (Wattiez & Sternon 1942). Seu perfume, alm de atrair os polinizadores, til para proteger a planta contra o ataque de herbvoros. Confere-se a tais leos a proteo dos tecidos contra o excesso de calor nas regies onde o clima seco, na reduo da atividade de transpirao, no controle da funo osmtica, provocando e acelerando o movimento da gua atravs da parede celular e, por conseqncia, o transporte de enzimas e materiais solveis (Wattiez & Sternon 1942). Metcalfe (1963) ressaltou que a anatomia pode ser utilizada para solucionar diversos problemas taxonmicos, principalmente no que se refere ao grupo das monocotiledneas. Relatou ainda que a ocorrncia e/ou a distribuio de corpsculos silicosos, de clulas oleferas, de hipoderme, de aernquima e de estmatos, caractersticas estas estudadas no presente trabalho, possuem grande valor taxonmico dentro no grupo. A folha de Alpinia zerumbet possui muitas caractersticas comuns mencionadas por Tomlinson (1956; 1962; 1969) e Metcalfe (1963) para a famlia Zingiberaceae. Como as monocotiledneas so relativamente pouco estudadas, conclui-se que o reconhecimento dos caracteres anatmicos aqui analisados torna-se relevante para o conhecimento da morfologia da espcie de A. zerumbet, bem como da taxonomia da famlia.

Referncias bibliogrficasAlmeida, E. R. 1993. Plantas medicinais brasileiras conhecimentos populares e cientficos. Hemus Editora, So Paulo. Arber, A. 1918. The phyllode theory of the monocotyledonous leaf, with special reference to anatomical evidence. Annals of Botany 32: 465-501. Beille, L. 1925. Prcis de Botanique Pharmaceutique. Maloine et Fils, Paris. Carlini, E. A. 1972. Screening farmacolgico de plantas brasileiras. Revista Brasileira de Biologia 32(2): 265274. Chaffey, N. J. 1985. Structure and function in the grass ligule: optical and electron microscopy of the membranous ligule of Lolium temulentum L. Annals of Botany 55: 65-75. Costa, A. F. 1982. Farmacognosia. Fundao Calouste Gulbenkian, Lisboa. Cronquist, A. 1977. Introduccion a la Botanica. 2 ed. Ed. Continental, Mxico.

Acta bot. bras. 18(1): 109-121. 2004 Langeron, M. 1949. Prcis de Microscopie. Masson et Editeurs, Paris. Laranja, S. M. R.; Bergamaschi, C. M. & Schor, N. 1992. Avaliao de trs plantas com potencial efeito diurtico. Revista Associao Mdica Brasileira 38(1): 13-16. Lima, E. O.; Gompertz, O. F.; Giesbrecht, A. M. & Paulo, M. Q. 1993. In vitro antifungal activity of essential oils obtained from officinal plants against dermatophytes. Mycoses 36: 333-336. Lorenzi, H. & Souza, H. M. 1995. Plantas ornamentais no Brasil - arbustivas, herbceas e trepadeiras. Editora Plantarum, So Paulo. Machado, L. D. 1996. Alpnia. Revista Natureza 101(5): 39-42. Mauseth, J. D. 1988. Plant Anatomy. The Benjamin/ Cummings Publishing Company, California. Mc Lean, R. C. & Ivimey-Cook, W. R. 1958. Plant science formulae. Mc Millan & Co., London. Mendona, V. L. M.; Oliveira, C. L. A.; Craveiro, A. A.; Rao, V. S. & Fonteles, M. C. l. 1991. Pharmacological and toxicological evaluation of Alpinia speciosa. Memrias do Instituto Oswaldo Cruz 86(Suppl. II): 93-97. Metcalfe, C. R. 1954. Recent work on the systematic anatomy of the monocotyledons - with special references to investigations at the Jodrell Laboratory at Kew. Kew Bulletin 523-532. Metcalfe, C. R. 1963. Comparative anatomy as a modern botanical discipline - with special reference to recent advances in the systematic anatomy of monocotyledons. Advances in Botanical Research 1: 101-147. Metcalfe, C. R. & Chalk, L. 1950. Anatomy of the Dicotiledons. Clarendon Press, Oxford. Metcalfe, C. R. 1989. Secreted mineral substances. In: C.R. Metcalfe & L. Chalk. Anatomy of the Dicotiledons. Clarendon Press, Oxford, v.2. Morita, D. 1992. Insecticides and bactericide made of sell flower essential oil. Int. Cl A 01 N 25/00. US Patent 5110594.

121Netolitzky, F. 1929. Die Kieselkrper. Pp. 1-19. In: Linsbauer. K. Handbuch der Pflanzenanatomie. Gebrder Borntraeger, Berlim. Paliwal, G. S. 1969. Stomatal ontogeny and phylogeny. I. Monocotyledons. Acta Botanica Neerlandica 18(5): 654-668. Rao, B. G. V. N. & Nigam, S. S. 1970. The in vitro antimicrobial efficiency of essential oils. Indian Journal of Medical Research 58(5): 627-633. Reeve, R. M. 1951. Histochemical tests for polyphenols in plant tissues. Stain Technology 26(2): 91-96. Santana, C. F.; Pinto, K. V. & DAlbuquerque, I. L. 1966. Estudos farmacolgicos de antiinflamatrios de alguns vegetais. Revista do Instituto de Antibiticos 6(1/2): 75-89. Sass, J. E. 1951. Botanical microtechnique. Iowa Press Building, Iowa. Skutch, A. F. 1930. Unrolling of leaves of Musa sapientum and some related plants and their relation to environmental acidity. Botanical Gazette 90: 337-365. Strasburger, E. 1924. Handbook of practical botany. George Allen e Nonviirn, Ltd., 8 ed., Iowa. Tomlinson, P. B. 1956. Studies in the systematic anatomy of the Zingiberaceae. Journal of the Linnean Society 55: 547-592. Tomlinson, P. B. 1962. Phylogeny of the Scitamineae Morphological and anatomical considerations. Evolution 16: 192-213. Tomlinson, P. B. 1969. Commelinales - Zingiberales. Pp. 341-359. In: C. R. Metcalfe. Anatomy of the monocotyledons. Clarendon Press, Oxford. Van Nam, T. 1975. Costaceae et Zingiberaceae: Leurs appareils ligulaires. Adansonia 14(4): 561-570. Vogel, A. I. 1981. Qumica analtica qualitativa. Editora Mestre Jou, So Paulo. Wattiez, N. & Sternon, F. 1942. lements de chimie vgtale. Masson et Cie, 2 ed., Paris. Winters, G. 1995. Jardinagem - Zingiberceas. Revista Natureza 91(7): 14-23.

Verso eletrnica do artigo em www.scielo.br/abb