ANÁLISE DE VIABILIDADE ECONÔMICA DE PROJETOS …pro.poli.usp.br/.../analise-de-viabilidade-economica-de-projetos-de... · ARIEL SIMIS São Paulo 2010 ANÁLISE DE VIABILIDADE ECONÔMICA

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  • ARIEL SIMIS

    So Paulo

    2010

    ANLISE DE VIABILIDADE ECONMICA DE PROJETOS DE GERAO ELICA NO BRASIL

    Trabalho de formatura apresentado Escola Politcnica da Universidade de So Paulo para obteno de diploma de Engenheiro de Produo.

  • ARIEL SIMIS

    So Paulo

    2010

    Trabalho de formatura apresentado Escola Politcnica da Universidade de So Paulo para obteno de diploma de Engenheiro de Produo.

    Orientador:

    Prof. Dr. Joo Amato Neto

    ANLISE DE VIABILIDADE ECONMICA DE PROJETOS DE GERAO ELICA NO BRASIL

  • AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL OU PARCIAL DESTE

    TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA

    FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

  • FICHA CATALOGRAFICA

  • minha famlia (em especial minha me coruja),

    e aos meus amigos.

  • RESUMO

    O Brasil um pas que vem apresentando considerveis taxas de crescimento econmico nos

    ltimos anos. verdade que esse crescimento est muito aqum daquele observado em outros

    pases denominados emergentes, a exemplo da China. Por outro lado, nosso crescimento

    no acontece a passos tmidos, seguindo o exemplo dos Estados Unidos, Japo e grande parte

    dos pases desenvolvidos, cujas economias, de alguma forma, ainda tentam se recuperar da

    grande crise econmica iniciada em 2008.

    Para que o pas tenha condies de manter o seu crescimento econmico, investimentos no

    setor eltrico so imprescindveis. H enorme correlao entre o crescimento do PIB do pas e

    o crescimento na demanda por energia eltrica, de tal forma que a expanso de nosso parque

    gerador e de nossa capacidade de fornecimento de energia eltrica devem sempre ocorrer em

    ritmo tal que a demanda por energia eltrica seja sempre atendida.

    Apesar de bvia a necessidade de expanso de nosso parque gerador, h discusses sobre

    como ela deve ser feita e sobre qual deve ser a tecnologia de gerao adotada nesse processo.

    Questes relacionadas ao meio ambiente, confiabilidade do sistema eltrico nacional e ao

    custo da energia para o consumidor final so centrais e, de modo geral, no h soluo que

    contemple, simultaneamente, as trs. A opo pela usina hidreltrica, por exemplo,

    geralmente eficiente sob o ponto de vista econmico. Por outro lado, sua implantao pode

    causar impactos ambientais que desagradam a muitos ambientalistas. Obviamente, cada

    tecnologia de gerao possui vantagens e desvantagens quando comparada com as demais.

    Nesse contexto, uma alternativa que vem ganhando relevncia a gerao de eletricidade

    atravs de usinas elicas, caracterizadas principalmente pelo uso de tecnologia limpa e

    renovvel. Tendo isso em vista, esse estudo toma como base o desempenho da Renova

    Energia S.A. no primeiro leilo dedicado exclusivamente gerao elica, e analisa se,

    tambm sob o ponto de vista econmico, essa opo vivel.

    Palavras-Chave: Investimentos (Projeto). Gerao de energia eltrica. Energia elica.

  • ABSTRACT

    Brazils economy has been growing at a good pace over the last few years. It is true that this

    growth is not as strong as what weve been seen in other emerging markets, such as China.

    On the other hand, Brazils growth is not as shy as U.S.A, Japan and other developed

    markets growth, whos economies are, somehow, still recovering from global crisis that

    begin in 2008.

    In order to maintain its economic growth, investments in the electrics utilities sector is vital

    for the country. There is a great correlation between GDP growth and energy demand

    growth, so our electric generation capacity and energy supply capacity must always be

    expanded in order to avoid any supply problem.

    Although this expansions needs are obvious, there are discussions on how they should be

    done and which generation technology should be used in this process. Issues related to the

    environment, the reliability of our national electric system and the energy cost for the final

    consumer have great importance and, usually, there is no solution that take this three points

    into consideration at once. Hydroelectric power plants, for instance, are usually viable on an

    economic perspective. On the other hand, environmental impacts of its construction very often

    displease environmentalists. Obviously, each technology has advantages and disadvantages

    when compared to the others.

    In this context, wind generation, which is clean and renewable, is an alternative that has been

    gaining relevance recently. Taking that into consideration, this study intends to analyze the

    performance of Renova Energia S.A. on Brazilians first wind only energy auction, verifying if,

    on an economic perspective, wind generation is viable.

    Key-Words: Investments (Project). Electricity generation. Wind energy.

  • LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1. O caminho percorrido pela eletricidade desde a gerao at o seu

    consumo....................................................................................................................................21

    FIGURA 2. Principais centros de gerao e consumo de energia eltrica e a rede de

    transmisso do pas...................................................................................................................23

    FIGURA 3. Resumo dos ambientes de contratao de energia................................................35

    FIGURA 4. Parque Elico de Osrio RS...............................................................................39

    FIGURA 5. Velocidade mdia anual do vento no territrio brasileiro.....................................43

    FIGURA 6. Temperatura, precipitao e vento no territrio brasileiro....................................45

    FIGURA 7. Estrutura societria Renova Energia, antes do IPO...............................................47

    FIGURA 8. Estrutura societria atual da Renova Energia........................................................48

    FIGURA 9. Exemplo de fluxo de caixa de um projeto.............................................................52

    FIGURA 10. Comparao de dois projetos com perodos de payback diferentes....................53

    FIGURA 11. Velocidade mdia anual do vento na regio Norte.............................................95

    FIGURA 12. Velocidade mdia anual do vento na regio Nordeste........................................95

    FIGURA 13. Velocidade mdia anual do vento na regio Centro-Oeste.................................96

    FIGURA 14. Velocidade mdia anual do vento na regio Sudeste..........................................96

    FIGURA 15. Velocidade mdia anual do vento na regio Sul.................................................97

  • LISTA DE GRFICOS

    GRFICO 1. Histrico da elasticidade-renda no Brasil...........................................................28

    GRFICO 2. Evoluo do consumo anual de eletricidade no Brasil.......................................32

    GRFICO 3. Evoluo do custo do KWh gerado (US$).........................................................40

    GRFICO 4. Evoluo da capacidade de gerao elica mundial...........................................41

    GRFICO 5. Vazo do Rio So Francisco e velocidade do vento no litoral nordestino.........46

    GRFICO 6. Evoluo do lucro lquido do Projeto Vencedor................................................80

    GRFICO 7. Evoluo do FCFE do Projeto Vencedor...........................................................80

    GRFICO 8. FCFE do Projeto Vencedor com valor residual...................................................84

    GRFICO 9. Variao da TIR do projeto em funo de seu fator de carga............................85

    GRFICO 10. Variao da TIR do projeto em funo do custo de investimento...................87

    GRFICO 11. Variao da TIR do projeto em funo do custo de financiamento.................88

    GRFICO 12. Variao da TIR do projeto em funo do preo de venda da energia...........100

    GRFICO 13. Variao da TIR do projeto em funo do preo de venda de crditos de

    carbono....................................................................................................................................101

    GRFICO 14. Variao da TIR do projeto em funo do desconto na TUST......................101

  • LISTA DE TABELAS

    TABELA 1.Principais empresas geradoras do pas .................................................................25

    TABELA 2.Principais empresas distribuidoras do pas............................................................25

    TABELA 3. Principais empresas de transmisso do pas.........................................................25

    TABELA 4. Capacidade elica instalada em diferentes pases................................................42

    TABELA 5. PCHs da Renova Energia em operao...............................................................49

    TABELA 6. Portflio de projetos das principais empresas participantes do leilo..................65

    TABELA 7. Projetos vencedores do leilo...............................................................................66

    TABELA 8. Projetos vencedores do leilo...............................................................................67

    TABELA 9. Distribuio dos projetos vencedores por estado.................................................67

    TABELA 10. Projetos vencedores da Renova Energia............................................................68

    TABELA 11. Demonstrativo de resultado da empresa.............................................................70

    TABELA 12. FCFE do Projeto Vencedor................................................................................79

    TABELA 13. Sensibilidade da TIR do projeto com relao alavancagem e ao custo do

    financiamento............................................................................................................................89

    TABELA 14. DRE do Projeto Vencedor (2010-2020).............................................................97

    TABELA 15. DRE do Projeto Vencedor (2021-2032).............................................................98

    TABELA 16. DRE do Projeto Vencedor com valor residual (2010-2020). ............................98

    TABELA 17. FCFE do Projeto Vencedor com valor residual (2010-2020)............................98

    TABELA 18. DRE do Projeto Vencedor com valor residual (2021-2030)..............................99

    TABELA 19. FCFE do Projeto Vencedor com valor residual (2021-2030)............................99

    TABELA 20. DRE do Projeto Vencedor com valor residual (2031-2040)..............................99

    TABELA 21. FCFE do Projeto Vencedor com valor residual (2031-2040)..........................100

    TABELA 22. DRE do Projeto Vencedor com valor residual (2041-2052)............................100

    TABELA 23. FCFE do Projeto Vencedor com valor residual (2041-2052)..........................100

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ACL Ambiente de Contratao Livre

    ACR Ambiente de Contratao Regulada

    ANEEL Agncia Nacional de Energia Eltrica

    BNB Banco do Nordeste do Brasil

    BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento

    CAPM Capital Asset Pricing Model

    CCEE Cmara de Comercializao de Energia Eltrica

    DRE Demonstrao do Resultado do Exerccio

    EBIT Earnings before Interest and Taxes

    EBITDA Earnings before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization

    EPC Engineering, Procurement and Construction Contracts

    EPE Empresa de Pesquisa Energtica

    FCFE Free Cash Flow to Equity

    FCFF Free Cash Flow to Firm

    GWEC Global Wind Energy Council

    IGP-M ndice Geral de Preos - Mercado

    IPCA ndice Preos ao Consumidor Amplo

    IPO Initial Public Offering

    Ke Cost of Equity

    LER Leilo de Energia de Reserva

  • MDL Mecanismos de Desenvolvimento Limpo

    MME Ministrio de Minas e Energia

    O&M Operao e Manuteno

    ONS Operador Nacional do Sistema Eltrico

    PCH Pequena Central Hidreltrica

    PPA Power Purchase Agreement

    PROINFA Programa de Incentivo s Fontes Alternativas de Energia Eltrica

    SPE Sociedade de Propsito Especfico

    TIR Taxa Interna de Retorno

    TUSD Tarifa de Uso dos Sistemas Eltricos de Distribuio

    TUST Tarifa de Uso do Sistema de Transmisso

    UNFCCC United Nations Framework Convention on Climate Change

    VPL Valor Presente Lquido

    WACC Weighted Average Cost of Capital

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ....................................................................................................................................................... 17

    1.1 O TRABALHO E A ENGENHARIA DE PRODUO ................................................................. 18

    1.2 OBJETIVO DO TRABALHO ................................................................................................................... 19

    1.3 ORGANIZAO DO TRABALHO ...................................................................................................... 19

    2 O SETOR DE ENERGIA ELTRICA............................................................................................................. 21

    2.1 GERAO, TRANSMISSO E DISTRIBUIO DE ENERGIA ELTRICA .................... 21

    2.2 A ORGANIZAO INDUSTRIAL DO SETOR E OS PRINCIPAIS PLAYERS DO SETOR ELTRICO NACIONAL .......................................................................................................................... 23

    2.3 A EPE E O PLANEJAMENTO DO SETOR ELTRICO ............................................................... 27

    2.4 AMBIENTES DE CONTRATAO E LEILES DE ENERGIA ELTRICA ..................... 32

    2.5 O PROINFA .................................................................................................................................................... 36

    2.6 A GERAO ELICA .............................................................................................................................. 38

    3 A EMPRESA ............................................................................................................................................................ 47

    4 REVISO CONCEITUAL .................................................................................................................................. 51

    4.1 PERODO DE PAYBACK ......................................................................................................................... 51

    4.2 VPL (VALOR PRESENTE LQUIDO) ................................................................................................. 53

    4.3 TIR (TAXA INTERNA DE RETORNO) .............................................................................................. 55

    4.4 CUSTO DO CAPITAL PRPRIO .......................................................................................................... 57

    4.5 MDIA PONDERADA DO CUSTO DE CAPITAL ........................................................................ 60

    4.6 FLUXO DE CAIXA LIVRE PARA O ACIONISTA ........................................................................ 61

    4.7 FLUXO DE CAIXA LIVRE PARA A EMPRESA............................................................................ 62

    5 ESTUDO DE CASO .............................................................................................................................................. 64

    5.1 SEGUNDO LEILO DE ENERGIA DE RESERVA: PARTICIPANTES E PROJETOS VENCEDORES ............................................................................................................................................................ 64

    5.2 MODELO DE ANLISE ........................................................................................................................... 69

    5.3 ANLISE DOS RESULTADOS ............................................................................................................. 78

    5.4 ANLISES DE SENSIBILIDADE ......................................................................................................... 83

    6 CONCLUSES ....................................................................................................................................................... 91

    7 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................................................................. 92

    8 APNDICE ............................................................................................................................................................... 95

  • 17

    1 INTRODUO

    Apesar de a indstria eltrica possuir uma histria relativamente recente a primeira central

    eltrica pblica europia, por exemplo, foi criada somente em 1881 pelos irmos Siemens o

    incrvel avano tecnolgico pelo qual a humanidade passou desde ento nos trouxe a uma

    realidade onde simplesmente impossvel e inimaginvel a vida sem o uso da eletricidade.

    To bvia sua importncia e presena no cotidiano das pessoas e no funcionamento da

    sociedade moderna que a tentativa de justific-la torna-se quase banal.

    A disponibilidade desse recurso pode ser vista como fundamental para o crescimento

    econmico de qualquer pas. Conforme este cresce, tambm aumenta a sua demanda pela

    energia eltrica, de tal modo que a capacidade de oferta desse recurso deve estar em constante

    expanso, para que ele no seja um fator de limitao ao crescimento econmico do pas.

    Historicamente, o Brasil tem adotado duas opes principais para a expanso de sua

    capacidade de gerao: grandes usinas hidreltricas e usinas termoeltricas. Dados de 2009

    levantados pelo BofA Merrill Lynch Global Research indicam que, aproximadamente, 75%

    de nossa matriz energtica composta de usinas hidreltricas enquanto que quase todo o

    percentual restante corresponde usinas termoeltricas.

    Nesses ltimos anos, a adoo de novas fontes de gerao de energia tem acontecido de forma

    complementar as duas previamente mencionadas. A implantao de pequenas centrais

    hidreltricas (PCHs) e usinas elicas so dois exemplos disso.

    Obviamente, cada fonte de gerao de energia possui suas vantagens e desvantagens quando

    comparada com as demais. Os principais critrios de comparao entre elas so: custo

    econmico (quanto mais cara a implantao e operao da usina, maior o impacto no custo da

    tarifa de energia eltrica para o consumidor final), impacto ambiental provocado por sua

    implantao e operao e contribuio para o aumento da confiabilidade do sistema eltrico

    nacional.

    O presente trabalho analisa, sob a ptica econmica, uma dessas possveis opes: a gerao

    elica. Sua grande vantagem conhecida: ela utiliza uma fonte renovvel de energia e

  • 18

    provoca impacto ambiental limitado. Assim, o foco do presente estudo concentra-se em

    analisar a viabilidade desse tipo de empreendimento, sob o ponto de vista econmico. Para

    isso, o desempenho da empresa Renova Energia S.A. no Segundo Leilo de Energia de

    Reserva (primeiro leilo dedicado exclusivamente gerao elica), realizado em dezembro

    de 2009, utilizado como estudo de caso.

    1.1 O TRABALHO E A ENGENHARIA DE PRODUO

    Esse trabalho est diretamente ligado ao curso de Engenharia de Produo. Ao longo da

    elaborao do mesmo, o autor pode compreender e verificar como o curso foi fundamental

    para a sua plena execuo.

    H matrias estudadas na Escola que relacionam-se diretamente com o que foi desenvolvido

    nesse trabalho. O modelo de anlise desenvolvido para o estudo de caso apresentado no

    captulo 5 demandou conhecimentos vistos na matria de Contabilidade e Custos, por

    exemplo, onde conceitos e noes iniciais relacionadas leitura de balanos e estrutura de

    custos das empresas foram abordados.

    O contedo visto em Engenharia Econmica e Finanas, sem dvida, foi muito importante

    tambm. O uso da matemtica financeira, a elaborao de fluxos de caixa e o uso de

    ferramentas para anlise de rentabilidade de projetos esto presentes em todas as anlises

    realizadas no estudo de caso do trabalho e foram vistas pelo aluno, primeiramente, durante o

    curso acima mencionado.

    H, ainda, diversas outras ferramentas vistas ao longo do curso que foram importantes para a

    elaborao desse Trabalho de Formatura. O referencial terico apresentado no captulo 4

    aborda, por exemplo, o mtodo do CAPM, cuja compreenso depende de conhecimentos

    bsicos que o aluno teve a oportunidade de aprender nos cursos de Estatstica I e Estatstica II.

    Enfim, so diversas as ferramentas, conceitos, formas de anlise e referencial terico vistos ao

    longo do curso que permitiram que esse trabalho fosse realizado de forma plena e satisfatria

    pelo aluno.

  • 19

    Quando da realizao desse trabalho, o aluno trabalhava no banco norte-americano Bank of

    America Merrill Lynch, como estagirio da equipe responsvel pelo acompanhamento e

    anlise de aes das empresas dos setores de eletricidade e saneamento bsico da Amrica

    Latina. Esse, inclusive, foi um dos motivos que contribuiu para a escolha do tema, que

    permitiu ao aluno aliar todas as pesquisas e estudos necessrios para o desenvolvimento desse

    trabalho com o aprofundamento em conhecimentos que, de alguma forma, poderiam ser teis

    tambm no estgio. Alm disso, a atualidade do tema escolhido e a falta de outros trabalhos

    acadmicos abordando o assunto tambm tiveram grande influncia na deciso do tema pelo

    aluno.

    1.2 OBJETIVO DO TRABALHO

    O presente trabalho tem como objetivo analisar e discutir a viabilidade econmico-financeira

    de empreendimentos elicos no pas, entendendo quais so as principais variveis que

    influenciam na sua rentabilidade final. Alm disso, pretende-se apresentar uma descrio

    atual dos principais aspectos do setor eltrico brasileiro, dando enfoque aos elementos mais

    importantes para a compreenso do estudo de caso proposto.

    Para a realizao das anlises desejadas, pretende-se utilizar ferramentas de anlise de

    projetos, especialmente a TIR (Taxa Interna de Retorno), bem como realizar inmeras

    anlises de sensibilidade que permitam um entendimento mais profundo de quais so as

    principais variveis que determinam a viabilidade econmico-financeira de um projeto de

    gerao elica no pas.

    1.3 ORGANIZAO DO TRABALHO

    O presente trabalho est organizado da seguinte forma:

  • 20

    O captulo 1 um captulo introdutrio, que apresenta uma viso inicial do assunto tratado no

    trabalho, bem como sua relao com o curso de Engenharia de Produo, as motivaes para

    sua escolha e objetivos do estudo.

    O captulo 2 introduz o leitor ao setor de energia eltrica nacional. Nele, so apresentados

    conceitos iniciais sobre o funcionamento e organizao do setor, perspectivas de crescimento

    para o setor de gerao no Brasil, bem como outras informaes relevantes para a

    compreenso do estudo de caso proposto posteriormente.

    O captulo 3 apresenta uma descrio da Renova Energia, empresa cujos projetos so o foco

    do estudo de caso proposto no trabalho. So apresentados um breve histrico da empresa, suas

    principais estratgias e dados operacionais relevantes.

    No captulo 4 realizada uma reviso conceitual, cujo objetivo abordar todos os conceitos e

    teorias sem os quais no possvel a realizao e entendimento completo do estudo de caso

    do trabalho.

    O captulo 5 apresenta o estudo de caso em questo, onde so apresentados uma descrio do

    Segundo Leilo de Energia de Reserva, o desempenho da Renova Energia no leilo e uma

    anlise financeira de seus projetos vencedores.

    Finalmente, o captulo 6 apresenta as principais concluses extradas do estudo elaborado,

    com enfoque para as anlises realizadas no captulo imediatamente anterior.

    O Apndice encontra-se aps o captulo 6 e contm informaes relevantes apresentadas

    atravs de grficos e figuras, que no foram includos em nenhum dos captulos anteriores.

  • 21

    2 O SETOR DE ENERGIA ELTRICA

    2.1 GERAO, TRANSMISSO E DISTRIBUIO DE ENERGIA ELTRICA

    Uma das caractersticas mais importantes e, talvez, nica do setor eltrico, o fato de que o

    bem por ele produzido no estocvel. A eletricidade produzida e consumida

    simultaneamente, resultando em um exemplo excelente de um sistema de produo just in

    time.

    Entre sua gerao e consumo, porm, h outras duas etapas intermedirias (transmisso e

    distribuio da energia), das quais depende o pleno funcionamento do sistema eltrico. Dessa

    simultaneidade entre produo e consumo resulta a grande interdependncia existente entre

    essas diversas etapas de tal modo que eventuais problemas em qualquer uma delas (gerao,

    transmisso ou distribuio da energia eltrica) comprometem o pleno funcionamento do

    sistema eltrico como um todo. Essa caracterstica justifica a necessidade de um planejamento

    integrado para o mesmo, de modo a garantir a confiabilidade necessria para o sistema.

    Gerao Transmisso Distribuio Consumo

    Figura 1: O caminho percorrido pela eletricidade desde a gerao at o seu consumo.

    Fonte: Elaborao do autor.

    Para o processo de gerao, h diversas tecnologias diferentes que podem ser empregadas

    com esse fim. Existem hoje usinas hidreltricas, termoeltricas, elicas, solares, entre outras.

    Comum a todas elas est o princpio bsico utilizado na gerao de eletricidade, que consiste

    no uso de um dispositivo denominado gerador eltrico para converter energia mecnica em

    energia eltrica. Dessa forma, a principal diferena entre as diversas tecnologias diz respeito

    ao mtodo utilizado na obteno da energia mecnica utilizada no processo e no na produo

    da energia eltrica em si.

  • 22

    Apesar da predominncia da usina termoeltrica, que responde pela maior parte da energia

    eltrica produzida hoje no mundo, a usina hidreltrica que predomina no Brasil. De acordo

    com dados do BofA Merrill Lynch Global Research, em 2009, quase 75% da capacidade

    instalada nacional (que totalizava 113,546 MW de potncia) era composta por hidreltricas e,

    pouco menos de 25%, por termoeltricas. Uma parcela muito pouco representativa era

    composta de usinas elicas, pequenas centrais hidreltricas e outras formas de gerao. A

    predominncia das hidreltricas pode ser explicada, em grande parte, pelas prprias

    caractersticas do pas, que possui inmeras bacias hidrogrficas e rios que conferem ao pas

    imenso potencial hidreltrico para ser aproveitado na gerao de eletricidade. O mesmo no

    ocorre na grande maioria dos pases que, pelo menos at o presente momento, tem adotado a

    gerao termoeltrica como principal alternativa.

    Com relao etapa de transmisso da energia desde o ponto de gerao at os centros de

    consumo, essa feita atravs da chamada Rede Bsica, que composta por redes de alta

    tenso (acima de 230 kv) espalhadas pelo territrio nacional. Dadas as dimenses continentais

    do pas e a grande distncia existente entre os principais centros de gerao e consumo, a

    extenso dessa rede assombrosa, totalizando 94.312 km, o que equivale a aproximadamente

    cinco vezes a distncia entre as cidades do Rio de Janeiro e de Tquio. A figura 2 abaixo

    apresenta um mapa ilustrativo do Brasil, com a localizao das principais usinas e centros de

    consumo. Pode-se notar como a rede de transmisso extende-se por grande parte do territrio

    nacional, como j mencionado.

  • 23

    Figura 2 Principais centros de gerao e consumo de energia eltrica e a rede de transmisso do pas.

    Fonte: Atlas de Energia Eltrica do Brasil.

    Uma vez que a energia eltrica chega aos centros de consumo, cabe as empresas

    distribuidoras fazer com que ela seja levada at os consumidores finais, sejam eles

    residncias, estabelecimentos comerciais ou grandes indstrias. Esse servio prestado por

    empresas concessionrias (como o caso da AES Eletropaulo na cidade de So Paulo, por

    exemplo) que distribuem a energia atravs de cabos de baixa tenso (com menos de 230 kv),

    espalhados pelas ruas e avenidas das cidades brasileiras.

    2.2 A ORGANIZAO INDUSTRIAL DO SETOR E OS PRINCIPAIS PLAYERS DO

    SETOR ELTRICO NACIONAL

    Anteriormente, mencionou-se a estrutura sistmica que compe o setor eltrico e as relaes

    de interdependncia entre as atividades de gerao, transmisso e distribuio da energia. De

    acordo com Pinto Junior (2007), essa caracterstica, aliada aos grandes investimentos que o

    setor eltrico demanda e o longo prazo de maturao dos mesmos explicam a importncia da

  • 24

    coordenao dos diferentes operadores do sistema eltrico a fim de reduzir custos e garantir a

    estabilidade e a confiabilidade do sistema. Como conseqncia, o autor argumenta que essa

    caracterstica legitimou, na segunda metade do sculo XX, a formao de um modo de

    organizao industrial particular, estruturado por empresas integradas verticalmente e

    operando em regime de monoplio.

    No caso brasileiro, nunca houve uma nica empresa monopolista e verticalizada, mas, ao

    longo da evoluo do setor no pas, essa estrutura podia ser identificada nas trs grandes

    categorias em que as empresas concessionrias podiam ser dividas:

    1. As supridoras regionais de energia (subsidirias da Eletrobrs), responsveis pela

    operao das grandes usinas hidreltricas do pas e da malha bsica do sistema de

    transmisso, cada qual responsvel por uma regio do pas;

    2. Concessionrias verticalizadas, responsveis pela produo, transmisso e distribuio

    de energia eltrica, a exemplo da Cemig no estado de Minas Gerais e da Copel no

    estado do Paran.

    3. Empresas atuantes apenas no segmento de distribuio.

    Conforme comenta Pinto Junior, o perodo ps-Segunda Guerra Mundial observou, no mundo

    todo, um ritmo forte de crescimento na demanda por energia e na expanso dos sistemas

    eltricos. Na dcada de 70, contudo, surgiram os primeiros questionamentos sobre a eficincia

    do modo de organizao industrial do setor, sendo a ineficincia do Estado como gestor e

    operador do sistema eltrico e a condio de monoplio das empresas as duas principais

    crticas.

    Gradualmente, o setor eltrico passou por reformas em todo o mundo. Apesar das

    particularidades desse processo em cada pas, Pinto Junior elenca medidas comuns adotadas

    pela maioria:

    1. Desverticalizao da cadeia produtiva;

    2. Fim dos monoplios com a introduo da concorrncia;

  • 25

    3. Privatizao das empresas pblicas;

    4. Criao de novos mecanismos de regulao e rgos reguladores.

    O Brasil tambm experimentou esse processo de reforma, que, gradualmente, conduziu o

    setor eltrico a sua configurao atual. interessante como a anlise dos principais players

    atuantes hoje no pas permite, de forma clara, a identificao dessas questes colocadas por

    Pinto Junior.

    Abaixo, so apresentadas tabelas com a lista das maiores empresas de gerao (em termos de

    capacidade instalada), distribuio (de acordo com o nmero de clientes atendidos) e

    transmisso (de acordo com a extenso da rede), respectivamente.

    EmpresaLinhas de

    transmisso (km)

    Market

    Share

    Eletrobrs 52.104 55,2%

    Cemig 9.894 10,5%

    CTEEP 8.535 9,0%

    Plena 5.688 6,0%

    CEEE 4.877 5,2%

    Copel 1.775 1,9%

    Outras 11.439 12,1%

    Total 94.312 100,0%

    Tabela 1: Principais empresas geradoras do pas.

    Fonte: BofA Merrill Lynch

    Tabela 2: Principais empresas distribuidoras do pas.

    Fonte: BofA Merrill Lynch

    Tabela 3: Principais empresas de transmisso do pas.

    Fonte: BofA Merrill Lynch

  • 26

    A constatao do nmero elevado de diferentes agentes atuando no setor e suas participaes

    relativas indicadas nas tabelas acima indicam a inexistncia de uma empresa monopolista e,

    portanto, o carter competitivo do mesmo.

    Com relao verticalizao das empresas, h, hoje, vrios agentes que atuam em somente

    um dos trs segmentos da cadeia (caso da Tractebel, quarta maior geradora do pas, da

    Neoenergia, quarta maior distribuidora e da CTEEP, terceira maior transmissora do pas), de

    modo que a integrao vertical no corresponde a uma estratgia comum de todas elas.

    Finalmente, diversas dessas empresas so de controle privado, tanto por serem fruto de

    processos de privatizao (a exemplo da distribuidora AES Eletropaulo, hoje controlada pelo

    grupo norte-americano AES, aps a sua venda por parte do governo do Estado de So Paulo)

    como por serem subsidirias de grandes grupos internacionais que decidiram iniciar operaes

    no pas (caso da Tractebel, veculo de gerao da gigante francesa GDF Suez no pas).

    Vale notar, contudo, que a presena do Estado ainda muito forte no setor. Somente a

    Eletrobrs, cujo controle pertence ao governo federal, possui 35% e 55% de market share nos

    setores de gerao e transmisso, respectivamente. Levando-se em conta as demais estatais

    (Cesp, Cemig, Petrobras, Copel, entre outras), a presena do Estado aumenta para 79% e

    83%, de modo que ele ainda o principal agente do setor. A iniciativa privada predomina

    apenas no setor de distribuio (68% de participao).

    Com relao presena das empresas em todas as etapas da cadeia produtiva, a verticalizao

    continua a existir. Eletrobrs, Cemig e Copel, por exemplo, atuam nos trs segmentos do setor

    eltrico, possuindo participao relevante em todos eles.

    A criao de novos mecanismos de regulao e rgos reguladores (ltima questo levantada

    por Pinto Jnior), tambm ocorreu no pas. Esse processo conduziu o Brasil a uma estrutura

    que conta hoje com diversos rgos e instituies, responsveis pela regulao, operao e

    planejamento do setor. Merecem destaque a ANEEL (Agncia Nacional de Energia Eltrica),

    o ONS (Operador Nacional do Sistema), a CCEE (Cmara de Comercializao de Energia

    Eltrica), a EPE (Empresa de Pesquisa Energtica), entre outros.

  • 27

    2.3 A EPE E O PLANEJAMENTO DO SETOR ELTRICO

    Mencionou-se anteriormente que a energia eltrica no um bem estocvel, de modo que sua

    produo e consumo acontecem de forma simultnea. Desse fato, decorrem duas outras

    caractersticas importantes do setor eltrico: a necessidade de previso e antecipao da

    demanda e a necessidade de um superdimensionamento do sistema, dadas as oscilaes

    naturais de seu consumo, que apresenta picos e vales.

    nesse contexto que a EPE (Empresa de Pesquisa Energtica) se insere.

    Ela uma empresa pblica, vinculada ao Ministrio de Minas e Energia, que foi criada em 16

    de agosto de 2004 e tem como finalidade prestar servios na rea de estudos e pesquisas

    destinadas a subsidiar o planejamento do setor energtico, tais como energia eltrica, petrleo

    e gs natural e seus derivados, carvo mineral, fontes energticas renovveis e eficincia

    energtica, dentre outras.1

    Nota-se, pelo exposto acima, que a empresa possui diversas atribuies, prestando servios

    para o setor energtico como um todo e, especificamente, para o setor eltrico.

    Uma anlise dos diferentes estudos disponibilizados pela empresa em seu website permite um

    entendimento mais profundo de como o planejamento para o setor feito. So particularmente

    interessantes os estudos de projeo da demanda nacional por energia eltrica.

    Uma varivel que tem grande correlao com o comportamento do consumo de energia

    eltrica no pas e que, portanto, muito utilizada pela empresa em seus estudos de projees

    de demanda para o setor o PIB nacional. A relao entre a variao na demanda e o seu

    crescimento recebe o nome tcnico de elasticidade-renda da demanda de eletricidade. Uma

    elasticidade-renda alta indica que uma pequena variao no PIB provoca uma grande variao

    1 Extrado do art 2 da Lei 10.847 de 15 de maro de 2004

  • 28

    na demanda por eletricidade. Por outro lado, uma elasticidade-renda pequena indica que a

    variao na demanda acompanha de forma muito prxima a variao do PIB do pas.

    Em pases desenvolvidos essa elasticidade muito prxima a um enquanto que em pases

    menos desenvolvidos esse valor maior.

    Conforme um pas caminha em direo ao desenvolvimento, sua elasticidade-renda tende a

    diminuir de valor e convergir para a unidade. Esse fenmeno pode ser explicado,

    principalmente, por ganhos de produtividade na economia do pas, ou seja, pela capacidade

    que ele adquire em produzir mais utilizando menos energia.

    No caso brasileiro, a elasticidade-renda , historicamente, alta. O grfico abaixo mostra sua

    evoluo desde 1970 at o ano 2000, utilizando a taxa mdia do crescimento do PIB brasileiro

    e do consumo de energia eltrica para um perodo de cinco anos. A elasticidade-renda

    calculada facilmente pela relao entre o crescimento do consumo de energia e o crescimento

    do PIB.

    Grfico 1: Histrico da elasticidade-renda no Brasil.

    Fonte: Elaborao do autor, EPE.

    Apesar dos valores historicamente altos, observa-se uma mudana brusca no valor da

    elasticidade-renda para o perodo compreendido entre os anos 2000 e 2005. Conforme

  • 29

    comentado no documento Projees de Demanda de Energia Eltrica PDE 2008-2017

    (Sumrio Executivo) elaborado pela EPE, a elasticidade-renda para o perodo foi de 1,03,

    indicando uma sensvel diminuio.

    Ao analisar as causas dessa diminuio, o documento afirma que possveis mudanas

    estruturais esto em curso na economia brasileira, impactando na demanda futura de energia,

    e traz trs questes principais que ajudam a explicar essa mudana. A primeira delas,

    chamada de efeito estrutura, diz respeito ao crescimento mais rpido da produo de produtos

    que possuem intensidade eltrica menor (ou seja, que demandam menos energia para serem

    produzidos). O segundo efeito o efeito contedo, explicado da seguinte forma:

    [...] est diretamente relacionado ao aumento da eficincia no uso final da energia. Menor

    consumo especfico significa objetivamente menor consumo de energia para uma mesma

    produo. De acordo com dados do Balano Energtico Nacional, editado anualmente pela

    EPE, diversos setores industriais experimentaram reduo no seu consumo especfico de

    energia eltrica, entre os quais se destacam o setor de cimento, de papel e celulose e de no

    ferrosos. (EPE Projees de Demanda de Energia Eltrica PDE 2008-2017 (Sumrio

    Executivo), p. 5)

    Finalmente, h uma terceira questo, relacionada a um aumento na contribuio para o

    crescimento do PIB brasileiro do consumo interno de sua populao e uma diminuio da

    contribuio das exportaes, que diminuem a presso na demanda de energia eltrica, como

    explicado a seguir:

    No passado recente, antes do atual perodo de crescimento que se iniciou em 2003, o

    crescimento da economia se apoiava fortemente nas exportaes e, nelas, havia naturalmente

    uma energia intrinsecamente incorporada. Agora, o crescimento se explica pelo aumento do

    consumo das famlias, o qual, em parte tem sido atendido com importaes (e nelas h tambm

    uma energia intrinsecamente incorporada, s que, agora, aliviando presso sobre a demanda

    domstica de energia). Apenas como exemplo, tome-se o ano 2000, o ltimo, antes da atual

    fase, em que houve maior crescimento da economia. A evoluo do PIB entre o 4 trimestre de

    1999 e o 3 trimestre de 2000 acumulou crescimento de 4,6% no perodo, o que indica uma

    taxa mdia de crescimento trimestral de 1,13% (trimestre contra trimestre anterior). Entre o 4

    trimestre de 2006 e o 3 trimestre de 2007, a expanso acumulada do PIB foi de 5,6%, taxa

    mdia trimestral de 1,37%, portanto numericamente comparveis. Esse indicador agregado de

    crescimento poderia fazer supor que agora, em 2008, a economia do pas provoque a mesma

    presso (ou at maior) sobre a demanda de energia eltrica que se sentiu em 2001, quando

  • 30

    houve inclusive racionamento. Isso, contudo, no ocorre. (EPE Projees de Demanda de

    Energia Eltrica PDE 2008-2017 (Sumrio Executivo), p. 5-6)

    Assim, essas trs questes so apontadas como principais fatores que explicam a reduo da

    varivel elasticidade-renda do Brasil.

    Para a obteno da elasticidade-renda futura do pas, o documento Projees da Demanda de

    Energia Eltrica PDE 2008 2017 apresenta as quatro principais premissas adotadas pela

    EPE nesse estudo:

    1. Crescimento econmico brasileiro de 5% ao ano para os prximos dez anos;

    2. Crescimento demogrfico de 20 milhes de pessoas em dez anos;

    3. Premissas para o setor industrial, relacionadas principalmente evoluo de sua

    capacidade instalada;

    4. Crescimento da auto-produo2 de energia eltrica.

    A partir dessas premissas, o estudo obtm uma elasticidade-renda resultante de 1,1, ou seja,

    projeta-se um crescimento mdio anual de 5,5% na demanda. Assim, sabendo que o consumo

    total do pas foi de 412,6 TWh em 2007, projeta-se para 2017 um consumo de 706,4 TWh.

    Assumindo que 14,5% dessa demanda ser suprida atravs da autoproduo (hiptese adotada

    pela EPE), toda a demanda restante (604 TWh) deve ser suprida pelo sistema eltrico

    nacional.

    Com esses dados, possvel definir a necessidade de gerao de energia eltrica do pas e,

    portanto, a expanso necessria nossa capacidade de gerao instalada. Por fim, o estudo da

    2 Autoprodutor de Energia Eltrica: sua concesso ou autorizao lhe permite produzir

    energia eltrica para seu uso exclusivo.

  • 31

    EPE conclui que, para o perodo de 2007-2012, nossa capacidade de gerao instalada deve

    crescer entre 3500 MW e 4800 MW e para o perodo 2012-2017 entre 4000 MW e 5200 MW.

    Essa necessidade de expanso dada atravs de intervalos, pois so considerados no estudo

    dois cenrios extremos de expanso. O primeiro (correspondente ao valor mnimo dos

    intervalos apresentados) assume que ela ocorrer somente via usinas termeltricas, que

    possuem alto fator de capacidade, e o segundo cenrio considera uma expanso apenas

    atravs de usinas hidreltricas, cujo fator de capacidade bem menor quando comparado ao

    das termoeltricas. O mais provvel, contudo, uma expanso atravs de um mix entre as

    diferentes tecnologias disponveis de gerao, como vem acontecendo historicamente.

    A necessidade de expanso da capacidade para o perodo 2008-2017 mencionada acima

    significativa. Apenas para efeito de anlise, considerando o cenrio de expanso via

    hidreltricas somente, seria necessria a construo de 50.000 MW em um perodo de dez

    anos, o que equivale a mais de 3,5 vezes a capacidade instalada da usina hidreltrica de Itaipu,

    que a segunda maior do mundo.

    nesse contexto de grande necessidade de expanso de nosso parque gerador que as

    empresas de gerao de energia eltrica esto inseridas atualmente. Ele representa, sem

    dvida, uma grande oportunidade para a implementao de novos projetos e crescimento

    futuro dessas empresas.

    Uma ltima anlise que tambm se revela interessante diz respeito a evoluo histrica que o

    consumo nacional de energia eltrica tem apresentado nos ltimos anos. O grfico abaixo

    mostra, ano a ano, o consumo anual de energia eltrica no pas em GWh e refora como a

    demanda nacional por energia eltrica tem apresentado ritmo de crescimento fortssimo, que,

    nos ltimos 15 anos, j de 60%. Vale notar tambm dois momentos de queda repentina do

    consumo nacional: em 2001, quando o pas enfrentou uma grave crise energtica (conhecida

    at os dias de hoje como apago) e em 2008, ano em que a ltima grande crise econmica

    mundial teve incio.

  • 32

    Grfico 2 - Evoluo do consumo anual de eletricidade no Brasil.

    Fonte: Elaborao do autor, EPE.

    Uma vez que apresentado o papel da EPE e discutida a necessidade de expanso da

    capacidade de gerao do pas, esse trabalho prossegue com uma explicao de como a

    energia eltrica efetivamente comercializada no setor eltrico brasileiro.

    2.4 AMBIENTES DE CONTRATAO E LEILES DE ENERGIA ELTRICA

    O setor de energia eltrica brasileiro conta com dois ambientes distintos de contratao de

    energia. Ambos foram criados em 2004, com a promulgao da Lei do Novo Modelo do Setor

    Eltrico, que reestruturou e modernizou o setor.

    Esses dois ambientes so denominados Ambiente de Contratao Regulada (ACR) e

    Ambiente de Contratao Livre (ACL).

    O primeiro, como o prprio nome sugere, trata-se de um mercado mais regulado. Nele,

    participam apenas as empresas geradoras e distribuidoras de energia eltrica e as primeiras

    tentam vender sua energia de modo a atender s necessidades das distribuidoras, que

    informam previamente CCEE a quantidade de energia que precisam contratar.

  • 33

    A venda da energia feita atravs de leiles organizados pela CCEE e o critrio para

    determinao dos vencedores o de menor preo ofertado (o leilo realizado do tipo

    reverso), determinado pela relao R$/MWh. Esse critrio interessante pois estimula a

    competio entre as empresas geradoras, que devem ser capazes de fornecer sua energia por

    um preo competitivo caso contrrio, pouco provvel que obtenham sucesso nos leiles -

    e, pelo modo como o sistema eltrico brasileiro atualmente organizado, quanto menor o

    custo da energia eltrica vendida nos leiles, menor a tarifa de energia final paga pelos

    consumidores3. Isso porque os custos com compra de energia eltrica incorridos pelas

    empresas distribuidoras so 100% repassados tarifa final de energia.

    Nesse tipo de leilo, as empresas distribuidoras atuam de forma passiva, como um nico

    comprador, assinando contratos bilaterais com todos os geradores vencedores, de acordo com

    suas necessidades energticas previamente transmitidas CCEE.

    Os leiles acima mencionados podem ser de trs tipos:

    (A-5);

    (A-3);

    (A-1);

    onde A significa o ano em que a energia vendida comea a ser entregue pelo gerador ao

    distribuidor.

    Assim, se em 2010, por exemplo, so realizados os trs tipos de leiles, ento a energia

    vendida no leilo (A-1) deve ser entregue a partir de 2011, a energia vendida no leilo (A-3) a

    partir de 2013 e a energia vendida no leilo (A-5) a partir de 2015.

    Vale ressaltar que no leilo (A-1) vendida energia de empreendimentos de gerao j

    existentes (essa energia denominada energia velha) enquanto que nos leiles (A-3) e (A-5) a

    energia vendida chamada de energia nova uma vez que novos empreendimentos de gerao

    3 Nesse caso, os consumidores em questo so denominados consumidores cativos, que no tem a possibilidade de escolher sua empresa de distribuio. O consumidor cativo est submetido a uma tarifa de energia regulada, determinada pela ANEEL e paga para sua empresa de distribuio, e ele tem disponibilidade ilimitada de energia. O melhor exemplo desse tipo de consumidor so os consumidores residenciais. No caso da cidade de So Paulo, por exemplo, todas as residncias so atendidas pela distribuidora de energia AES Eletropaulo, que a concessionria atuante na regio.

  • 34

    so construdos a partir desses tipos de leilo. , inclusive, por esse motivo que esses leiles

    so realizados com trs e cinco anos de antecedncia ao incio da entrega, de modo que existe

    tempo hbil suficiente para a construo de tais empreendimentos.

    Os contratos de venda de energia celebrados nos leiles (A-5) e (A-3) tem durao de 15 30

    anos enquanto que os contratos celebrados em leiles (A-1) tem durao de 5 15 anos. Esse,

    inclusive, um dos aspectos que mais atraem os agentes geradores para esse tipo de leilo,

    uma vez que pouco provvel que se consiga a negociao de contratos to longos no ACL.

    Um outro tipo de leilo tambm realizado no ACR o Leilo de Reserva, cujo objetivo

    contratar energia para aumentar a confiabilidade do sistema eltrico nacional.

    Essa confiabilidade representada em termos de risco de racionamento para cada ano e esse

    risco calculado a partir de cenrios operativos do sistema simulados pelos rgos

    reguladores. Historicamente, o risco adotado havia sido de 5%, ou seja, aceitava-se que, para

    cada 100 cenrios simulados para o ano, cinco levassem a uma situao de racionamento.

    Em 2008 esse percentual foi reduzido para cerca de 3% e, para evitar uma reviso de todos os

    contratos de energia previamente celebrados, determinou-se a criao dos leiles de reserva,

    que permitiriam a adequao do sistema eltrico nacional para esse novo nvel de

    confiabilidade estabelecido atravs da contratao de novos empreendimentos.

    Esse tipo de leilo totalmente definido pelo rgo regulador, que determina o tipo de energia

    a ser contratada, a demanda total do leilo, entre outros aspectos.

    Existem ainda outros leiles realizados no ACR: leiles de ajuste, leiles de energia

    alternativa, leiles de projetos estruturantes e leiles especiais.

    Passando agora para o ACL, nele no existe a obrigatoriedade de que a comercializao de

    energia seja feita atravs de leiles. Ela pode ser negociada livremente entre comprador e

    vendedor, que combinam o preo e quantidade da energia negociada, bem como a durao do

    contrato.

    Nesse ambiente, h trs participantes principais: as empresas geradoras, empresas

    comercializadoras e os consumidores livres.

  • 35

    A figura do gerador j foi apresentada anteriormente.

    As empresas comercializadoras so aquelas que compram energia para depois revend-la aos

    consumidores livres por um preo maior e o consumidor livre definido pela ANEEL como

    aquele que possui carga mnima de 3MW instalada em um nico ponto (caso de consumidores

    industriais apenas) e opta por deixar a condio de consumidor cativo, podendo negociar

    livremente com agentes geradores e comercializadores. Apesar do consumidor livre no estar

    sujeito tarifa cobrada pelas distribuidoras, elas recebem desse tipo de consumidor a TUSD

    (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuio), que uma remunerao referente ao uso de sua

    infra-estrutura de distribuio.

    O trade-off que envolve a deciso de um consumidor optar por ser livre ou no simples. Se,

    por um lado, a liberdade que ele possui para negociar sua energia diretamente com o agente

    gerador lhe permite conseguir tarifas melhores do que as pagas pelos consumidores cativos, a

    contrapartida que ele passa a ter a preocupao e responsabilidade de contratar toda a

    energia necessria para a sua atividade, o que no ocorre com o consumidor cativo.

    Um resumo dos dois ambientes de contratao apresentado abaixo.

    Ambientes de

    contratao de

    energia

    ACR - Ambiente de

    contratao regulada ACL- Ambiente de

    contratao livre

    Participantes: agentes geradores e agentes

    distribuidores

    Preo da energia: determinado atravs de

    leiles

    Quantidade de energia negociada no leilo:

    determinada por uma das partes

    Consumidor final: cativo

    Participantes: agentes geradores,

    comercializadores e consumidores livres

    Preo da energia: negociado entre os

    participantes

    Quantidade de energia negociada:

    determinada entre as partes

    Consumidor final: livre

    Figura 3: Resumo dos ambientes de contratao de energia.

    Fonte: Elaborao do autor.

    Uma caracterstica muito importante dos contratos de venda de energia, sejam eles negociados

    no ACR ou no ACL, a garantia de receita por parte dos agentes geradores. Isso porque,

    independentemente da quantidade de energia efetivamente gerada, o gerador receber a

    receita determinada em seu contrato de venda. Assim, supondo que um gerador vendeu um

  • 36

    contrato de fornecimento de energia de, por exemplo, 100MWh anuais a um preo de

    R$100,00/MWh por um perodo de 30 anos, ele j sabe previamente que ter, nesse perodo

    de 30 anos, uma receita de R$300 mil (100MWh x R$100/MWh x 30 anos) no importando a

    quantidade de energia que ele de fato venha a gerar no perodo.

    Apesar das simplificaes desse clculo (no levou-se em conta o reajuste anual do preo de

    venda de energia pela inflao), ele revela umas das principais caractersticas do setor de

    gerao brasileiro: a previsibilidade das receitas dos agentes geradores.

    2.5 O PROINFA

    O PROINFA (Programa de Incentivo s Fontes Alternativas de Energia Eltrica) foi institudo

    pela Lei 10.438 de 26 de abril de 2002. Coube ao MME (Ministrio de Minas e Energia) a

    definio das diretrizes e o planejamento do programa e a responsabilidade de agente executor

    foi deixada para a Eletrobrs, responsvel pela celebrao de todos os contratos de compra e

    venda de energia.

    Como definido pelo prprio MME em sua pgina oficial na internet, o objetivo do programa

    aumentar a participao da energia eltrica produzida por empreendimentos concebidos com

    base em fontes elica, biomassa e pequenas centrais hidreltricas (PCHs). Dessa forma, o

    programa prope uma diversificao da matriz energtica brasileira, hoje dependente quase

    que exclusivamente das fontes hidreltricas e termeltricas, incentivando o desenvolvimento

    de tecnologias consideradas limpas e renovveis.

    Ainda de acordo com o prprio ministrio, o PROINFA tem como meta a implantao de

    3.300 MW de capacidade, o que equivale a 3% da capacidade total instalada do pas em 2009.

    Com relao s tecnologias de gerao contempladas pelo programa, no faz parte do escopo

    desse trabalho analis-las com profundidade. De qualquer forma, vale uma brevssima

    meno acerca de cada uma delas para esclarecimento do leitor. A fonte elica que ser

    discutida mais adiante - aquela que se aproveita da energia cintica dos ventos e, atravs da

    utilizao de turbinas elicas (aerogeradores), transforma-a em energia eltrica. J a biomassa

  • 37

    utiliza matria orgnica, que pode ser tanto de origem animal quanto vegetal, para a produo

    de energia. Como exemplo de materiais utilizados por essa tecnologia h o bagao de cana-

    de-acar e resduos de madeira. Finalmente, a ltima tecnologia de gerao contemplada

    pelo PROINFA so as PCHs, cuja tecnologia empregada para gerao exatamente igual a

    das usinas hidreltricas convencionais. A grande diferena entre elas, porm, diz respeito ao

    tamanho dos empreendimentos j que considerada uma PCH somente a usina com

    capacidade de gerao instalada mxima de 30 MW.

    Como j mencionado, todas essas tecnologias utilizam fontes renovveis e limpas para a

    gerao de energia eltrica, de modo que sua implementao possui impacto ambiental

    reduzido quando comparado ao de outras fontes, em especial hidreltricas e termoeltricas.

    De modo a viabilizar os projetos de gerao que utilizam as tecnologias contempladas pelo

    PROINFA, o programa traz uma srie de benefcios e incentivos econmicos. Dentre eles,

    destacam-se:

    1. Garantia de contratao dos projetos pela Eletrobrs por um prazo de 20 anos (todos

    os custos incorridos pela empresa so posteriormente repassados aos consumidores

    finais);

    2. Condies de financiamento especiais concedidas pelo BNDES, que pode financiar at

    80% dos custos de construo das usinas inseridas no programa;

    3. Desconto de 50% na TUST4;

    4. Iseno do encargo de P&D5.

    Outro aspecto importante do PROINFA que ele proporciona aos consumidores com carga

    entre 500kV e 3MW a possibilidade de migrao para o mercado livre, desde que adquiram

    4 TUST significa Tarifa de Uso do Sistema de Transmisso e a tarifa paga pelas empresas geradoras, distribuidoras e consumidores livres s empresas de transmisso de energia pelo uso de sua rede.

    5 P&D um encargo do setor no qual geradores, transmissores e distribuidores devem investir anualmente pelo menos 1% de sua receita operacional lquida em programas de eficincia energtica e estudos de pesquisa e desenvolvimento.

  • 38

    sua energia com geradores de energia incentivada. Nesses casos, esse consumidor

    denominado Consumidor Especial.

    A criao desse novo ator no mercado de energia brasileiro particularmente interessante

    para geradores que adotem a estratgia de atuar no mercado de energia incentivada (a

    exemplo da Renova Energia S.A.) pois eles representam um nicho de mercado restrito (j que

    s geradores incentivados tem acesso) e com grande potencial de crescimento, dado que

    apenas uma parcela pequena dos consumidores que podem optar pela condio de

    Consumidor Incentivado o tem feito.

    2.6 A GERAO ELICA

    Conforme apresentado anteriormente, a gerao elica uma das tecnologias contempladas

    pelo PROINFA. Por se tratar da tecnologia de gerao que ser analisada posteriormente no

    estudo de caso desse trabalho, a seguir, ela explorada com mais profundidade. O objetivo

    dessa seo introduzir o leitor no s a tecnologia de gerao em si, mas tambm ao cenrio

    atual de sua indstria tanto no Brasil quanto no mundo.

    2.6.1 Princpio Fsico

    Como o prprio nome revela, a gerao elica a gerao de eletricidade a partir dos ventos,

    ou seja, a converso da energia cintica dos deslocamentos de ar em energia eltrica.

    Essa converso feita atravs dos chamados aerogeradores (tambm conhecidos como

    turbinas elicas), que conseguem captar parte da energia cintica do vento que atravessa o

    espao varrido pelo rotor das turbinas. Conforme pode ser verificado na equao abaixo, a

    potncia eltrica gerada pela turbina depende quadraticamente dessa varivel.

    Equao 1: Potncia eltrica de um aerogerador. Fonte: Atlas do Potencial Elico Brasileiro (2001)

    Onde,

  • 39

    = densidade do ar em kg/m;

    = .D/4, em que D o dimetro do rotor;

    velocidade do vento;

    = coeficiente aerodinmico de potncia do rotor;

    eficincia do conjunto gerador transmisso.

    Ao absorver a energia do vento, o aerogerador provoca sua desacelerao jusante do rotor,

    de modo que ele recupera sua velocidade anterior gradualmente, conforme se mistura com as

    demais massas de ar predominantes na atmosfera. Essa a razo pela qual, nos parques

    elicos, observa-se certa distncia (da ordem de 10 vezes o dimetro do rotor da turbina) entre

    uma turbina elica e outra instalada a jusante, conforme pode ser observado na figura abaixo.

    Dada a relao cbica entre a velocidade do escoamento e a potncia da turbina elica, a

    instalao de aerogeradores muito prximos uns dos outros comprometeria sensivelmente sua

    potncia.

    Figura 4: Parque elico de Osrio RS.

    Fonte: E-brigade (2010).

    2.6.2 A gerao elica no mundo

    Em nossa histria mais recente, sabido que j no sculo XIV a energia elica era bastante

    utilizada na Holanda, principalmente para a moagem de gros e bombeamento de gua. Seu

    aproveitamento para a gerao de energia eltrica, contudo, ocorreu bem mais tarde, de modo

    que os primeiros trabalhos nesse sentido foram realizados nos EUA somente em 1940.

  • 40

    Apesar desses trabalhos iniciais terem sido realizados na primeira metade do sculo passado,

    foi necessrio que se passassem muitos anos para que o uso da energia elica como fonte de

    gerao de energia eltrica ganhasse importncia.

    Isso s foi acontecer na dcada de 1970, aps a crise do petrleo, que impulsionou o interesse

    e investimentos de diferentes naes no setor com o intuito de desenvolver novas alternativas

    para suas necessidades energticas. Essa ateno recebida foi muito importante para o

    desenvolvimento do setor de gerao elica mundial que, com investimentos suficientes,

    conseguiu transformar as pesquisas realizadas em aprimoramento e desenvolvimento

    tecnolgico.

    Hoje, passadas algumas dcadas, o desenvolvimento tecnolgico obtido notvel e as

    turbinas elicas so um bom exemplo disso. Se, no incio da dcada de 90, sua potncia

    variava entre 100kW e 300kW, hoje, j existem turbinas com 4MW de potncia.

    Esse fato, aliado a uma produo da indstria elica como um todo em escalas cada vez

    maiores, tm possibilitado uma reduo constante no custo de gerao, que , obviamente,

    fator-chave para a expanso do setor como um todo.

    0,38

    0,30

    0,150,13

    0,10 0,09 0,08 0,07 0,06 0,05 0,04

    $ 0,00

    $ 0,05

    $ 0,10

    $ 0,15

    $ 0,20

    $ 0,25

    $ 0,30

    $ 0,35

    $ 0,40

    1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000

    Custo do KWh gerado (US$)

    Grfico 3: Evoluo do custo do KWh gerado (US$).

    Fonte: Amndola (2007).

    Essa expanso pode ser verificada no grfico abaixo. Dados extrados do Global Wind 2009

    Report mostram a evoluo da capacidade elica instalada mundial e revelam que, nos

  • 41

    ltimos anos, ela tem crescido em ritmo muito forte, apresentando um crescimento anualizado

    mdio de 28,5% nos ltimos 13 anos.

    0,00%

    20,00%

    40,00%

    60,00%

    80,00%

    100,00%

    0

    20.000

    40.000

    60.000

    80.000

    100.000

    120.000

    140.000

    160.000

    1996

    1997

    1998

    1999

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    2006

    2007

    2008

    2009

    Capacidade

    mundial

    instalada (MW)

    Crescimento

    percentual

    anual

    Grfico 4: Evoluo da capacidade de gerao elica mundial.

    Fonte: Elaborao do autor, Global Wind 2009 Report.

    Hoje, as regies do mundo que mais contribuem para a expanso do setor de gerao elica

    so Amrica do Norte, Europa e sia, e, de acordo com as projees elaboradas pelo GWEC

    (Global Wind Energy Council) em seu relatrio Global Wind 2009 Report, sero elas as

    responsveis por quase 93% de toda a expanso na capacidade de gerao instalada no mundo

    nos prximos cinco anos.

    Analisando ainda dados referentes ao ano de 2009 disponveis no mesmo relatrio, chama

    ateno a participao de quatro pases em especial na composio da capacidade de gerao

    elica instalada mundial. Como nota-se na tabela apresentada a seguir, somente Estados

    Unidos, China, Alemanha e Espanha, em conjunto, concentram quase 67% de toda ela.

  • 42

    PasCapacidade total

    instalada (MW)

    Estados Unidos 35.064

    China 25.805

    Alemanha 25.777

    Espanha 19.149

    India 10.926

    Itlia 4.850

    Frana 4.492

    Reino Unido 4.051

    Portugal 3.535

    Dinamarca 3.456

    Mundo 158.505

    Tabela 4: Capacidade elica instalada em diferentes pases.

    Fonte: Elaborao do autor, Global Wind 2009 Report.

    2.6.3 A gerao elica no Brasil

    Conforme apresentado no documento Atlas do Potencial Elico Brasileiro, elaborado pela

    ANEEL em 2001, o Brasil possui um potencial elico estimado em 143,5 GW6. Esse valor

    muito significativo, principalmente levando-se em conta que hoje o pas conta com

    aproximadamente 113 GW de capacidade instalada, considerando toda sua matriz energtica.

    Apesar de que a expanso da capacidade instalada do pas provavelmente continuar a ser

    liderada por empreendimentos hidroeltricos e termeltricos, esse potencial elico disponvel

    indica uma alternativa existente que, como apresentado a seguir, possui algumas

    caractersticas bastante positivas que favorecem a sua implementao.

    Abaixo, h um mapa extrado do Atlas do Potencial Elico Brasileiro que mostra a velocidade

    mdia anual do vento no territrio brasileiro e, portanto, permite identificar as localidades

    com maior potencial para o aproveitamento de energia elica.

    6 Esse valor considera apenas regies com velocidade do vento de, pelo menos, 7 m/s, a uma altura de 50m.

  • 43

    Figura 5: Velocidade mdia anual do vento no territrio brasileiro.

    Fonte: Atlas do Potencial Elico Brasileiro.

    Nele, possvel notar como, principalmente, as regies nordeste e sudeste do Brasil possuem

    condies de vento mais favorveis, por apresentarem localidades com as mais altas

    velocidades mdias do vento para o territrio nacional. De fato, o potencial elico estimado

    para cada uma delas de 75 GW e 29,7 GW ou 52% e 21% do potencial elico total do pas,

    respectivamente. Ainda, em ordem decrescente, seguem as regies sul, norte e centro-oeste

    do pas, com potenciais estimados de 22,8 GW, 12,8 GW e 3,1 GW, respectivamente. O

    Apndice desse trabalho apresenta os mapas com as velocidades mdias do vento para cada

    regio brasileira, caso seja de interesse do leitor analisar as condies de cada regio

    especificamente.

    Um dos aspectos mais interessantes e positivos no aproveitamento da energia elica para o

    caso brasileiro especificamente a complementaridade que ela possui com o regime de

    chuvas no pas. Em outras palavras, quando h chuva no h vento e quando h vento no h

    chuva.

  • 44

    Como o sistema de gerao brasileiro atual predominantemente hidreltrico

    (aproximadamente 75% de toda a capacidade instalada), ele possui grande dependncia dos

    regimes de chuva e das condies hidrolgicas do pas, de modo que condies hidrolgicas

    muito desfavorveis e no previstas pelos rgos reguladores e operadores do sistema eltrico

    nacional podem acarretar em problemas srios de abastecimento. por essa razo, inclusive,

    que o pas possui tambm usinas termeltricas, que conferem maior confiabilidade e

    segurana ao sistema eltrico nacional j que sua capacidade de gerao independe da

    aleatoriedade da natureza. Nesse sentido, tambm a energia elica pode ser utilizada para

    aumentar a confiabilidade do sistema, dada a complementaridade sazonal mencionada

    anteriormente.

    A figura 6 permite visualizar de maneira clara essa sazonalidade, principalmente para o

    perodo de dezembro a fevereiro (chuvoso e sem ventos) e para o perodo de junho a agosto

    (sem chuvas e com maior intensidade de ventos).

  • 45

    Figura 6: Temperatura, precipitao e vento no territrio brasileiro.

    Fonte: Atlas do Potencial Elico Brasileiro.

    O grfico 5 traz outro exemplo desse fenmeno. Ele compara a vazo do Rio So Francisco

    (onde esto instaladas grandes usinas hidreltricas, como a usina de Xing e a usina Paulo

    Afonso IV, que, somadas, tem capacidade de gerao instalada de 5.624,4MW) com a

    velocidade do vento no litoral nordestino.

  • 46

    Grfico 5:Vazo do Rio So Francisco e velocidade do vento no litoral nordestino.

    Fonte: Atlas de Energia Eltrica do Brasil.

    Alm da questo sazonal j apresentada, favorece tambm a explorao da energia elica no

    pas o fator geogrfico pois, diferentemente do que acontece com as principais usinas

    hidreltricas do pas, o potencial elico brasileiro localiza-se prximo aos centros de

    consumo, de modo que no h necessidade de grandes investimentos em redes de transmisso

    para viabilizar a explorao dessa fonte energtica.

    Apesar disso, esse potencial existente ainda muito pouco aproveitado. No final de 2009,

    havia somente 606 MW de capacidade elica instalada, concentrada principalmente nas

    regies nordeste e sul do pas (com aproximadamente 67% e 27% de participao para cada

    uma). Dentre os estados brasileiros, destacava-se o Cear, que contava com aproximadamente

    35% de toda a capacidade de gerao elica brasileira.

  • 47

    3 A EMPRESA

    A histria da Renova Energia comeou em 2001, com a constituio da Enerbras por alguns

    dos atuais controladores da companhia, com o objetivo de explorar o mercado ainda

    incipiente de PCHs no Brasil. Em 2003, a Enerbras constituiu o consrcio Enerbras & WM

    com outra empresa (Watermark), atravs do qual as atuais trs PCHs que ela possui foram

    construdas e implantadas.

    Nos anos de 2004 e 2005 a empresa ainda passou por mudanas societrias e somente em

    2006, aps nova reorganizao, que a Renova Energia foi constituda. A organizao

    societria da empresa em 2010, antes da realizao de seu IPO (Initial Public Offering), era a

    seguinte:

    Ricardo Lopes DelneriRenato do Amaral

    Figueiredo

    RR ParticipaesInfraBrasil

    34 SPEs de Gerao de

    Energia Elica

    Renova Elica Bahia Elica Salvador Elica Enerbras

    ESPRA

    Renova Energia S.A

    100,00% 100,00% 100,00% 100,00% 100,00%

    100,00%

    32,18% 67,82%

    65,00% 35,00%

    Figura 7: Estrutura societria Renova Energia, antes do IPO.

    Fonte: Elaborao do autor, Renova Energia S.A.

    Como mencionado acima, no ano de 2010, a Renova Energia decidiu por abrir o seu capital

    na Bovespa. A empresa, cujo cdigo de negociao na bolsa RNEW11, pertence hoje ao

    Nvel 2 de governana corporativa. importante ressaltar que ela foi a primeira empresa de

    gerao de energia eltrica atuando exclusivamente no segmento de fontes renovveis a abrir

    o capital no pas.

    Aps o IPO, que permitiu empresa levantar R$160,7 milhes, sua estrutura societria

    novamente sofreu mudanas, com a entrada de dois novos grandes acionistas: o banco

    Santander (que, inclusive, foi a instituio coordenadora de seu IPO) e o Fundo de

  • 48

    Investimento em Participaes Ambiental, de modo que, hoje, a estrutura acionria da

    empresa tal como apresentada na figura abaixo:

    Figura 8: Estrutura societria atual da Renova Energia.

    Fonte: Elaborao do autor, Renova Energia S.A.

    O objetivo principal da empresa, conforme consta em seu prospecto definitivo de oferta

    inicial de aes criar valor para seus acionistas, a partir do desenvolvimento e execuo de

    projetos de gerao de energia eltrica por fontes de energia renovveis. Para alcanar esse

    objetivo, a empresa tem seis estratgias principais:

    1. Posicionamento da empresa como referncia no setor de energia renovvel, que ainda

    muito incipiente e constitudo por empresas de porte pequeno e mdio, que tem

    capacidade operacional e financeira limitada. A Renova Energia acredita que, dada

    sua experincia e rapidez no desenvolvimento e implementao de projetos de

    gerao de energia renovvel, aliada a uma maior capacidade financeira da empresa

    obtida com o seu IPO, possvel consolidar o seu papel de liderana no setor.

    2. Implementao do atual portflio de projetos de energia renovvel (que totaliza

    3.673,2 MW de capacidade, entre projetos de PCHs e parques elicos) e

    monitoramento do mercado para encontrar oportunidades interessantes e rentveis

    com outras fontes renovveis, tais como a biomassa e solar.

    3. No restrio venda de energia somente no ACR, explorando tambm o ACL que,

    eventualmente, pode proporcionar oportunidades de negcio mais rentveis.

  • 49

    4. Maximizao das oportunidades de sinergia que podem ser obtidas entre os diferentes

    projetos de gerao da empresa, seja na fase de construo, operao ou manuteno.

    Isso pode ser alcanado, principalmente, atravs da proximidade geogrfica dos

    mesmos.

    5. Implementao dos projetos de gerao de acordo com as regras exigidas pelo

    Protocolo de Kyoto e pela UNFCCC (United Nations Framework Convention on

    Climate Change), de modo que a empresa possa ter acesso ao mercado mundial de

    crditos de carbono e, com isso, possa usufruir de outra fonte geradora de receita.

    6. Atrao de investidores que valorizam e privilegiam investimentos em empresas com

    forte poltica de responsabilidade scio-ambiental.

    A anlise do estudo de caso proposto (apresentada no captulo 5 desse trabalho) revela, na

    opinio do autor, o sucesso da empresa em implementar algumas dessas estratgias. Maiores

    detalhes sobre essa questo so exploradas no captulo acima mencionado.

    A Renova Energia possui hoje uma capacidade de gerao instalada de 41,8 MW, proveniente

    de um conjunto de trs PCHs localizadas no estado da Bahia e em operao desde 2008. A

    energia das trs usinas foi 100% contratada pela Eletrobrs no contexto do PROINFA por

    R$159,20/MWh (ajustado anualmente pelo IGP-M) e por um prazo de 20 anos. So esses

    contratos que garantem a sade financeira da empresa e permitem a realizao de seus

    projetos de investimento e planos de crescimento, dada a gerao de caixa estvel e segura

    que eles proporcionam. Em 2009, por exemplo, a receita operacional bruta por eles gerada foi

    de R$35 milhes, como pode ser verificado na tabela abaixo.

    PCH Localizao

    Potncia

    instalada

    (MW)

    Energia

    assegurada

    (MW mdio)

    Incio do

    contratoPPA (anos)

    Receita Bruta

    em 2009 (R$

    milhes)

    Ms base

    de reajuste

    (IGP-M)

    Cachoeira da Lixa Bahia 14,8 8,3 mai/08 20 11,0 Junho

    Colino 1 Bahia 11,0 7,3 jul/08 20 10,0 Junho

    Colino 2 Bahia 16,0 10,5 set/08 20 14,0 Junho Tabela 5: PCHs da Renova Energia em operao.

    Fonte: Elaborao do autor, Renova Energia.

  • 50

    Essa tabela introduz ao leitor dois termos novos, no apresentados anteriormente:

    Energia assegurada: a energia que efetivamente pode ser comercializada pela

    empresa geradora, j que ela no consegue operar o seu parque de gerao com toda a

    potncia instalada em 100% do tempo. Desse fato surge o conceito de fator de carga

    (load factor em ingls) que consiste na relao entre a energia assegurada e a

    capacidade total instalada do empreendimento. A PCH Cachoeira da Lixa, por

    exemplo, possui load factor de 56%.

    PPA: significa power purchase agreement. Trata-se do contrato de compra e venda de

    energia eltrica.

    No Leilo de Energia de Reserva de 2009, realizado no final do ms de dezembro, a Renova

    Energia conseguiu vender 270 MW de capacidade a um preo mdio de R$145,80/MWh. A

    empresa foi a maior vendedora de todo o leilo. Por se tratar de um leilo do tipo (A-3), o

    incio da operao comercial dos projetos vendidos est previsto para julho de 2012, de modo

    que, se no houver atrasos, nessa data, a empresa ter sua capacidade de gerao instalada

    aumentada dos atuais 41,8 MW para 311,8 MW.

    Alm das PCHs que j se encontram em operao e dos parques elicos j em construo, a

    empresa possui tambm um grande portflio de projetos (tanto de PCHs quanto de parques

    elicos) que se encontram em diferentes estgios de desenvolvimento. H tanto projetos que

    j possuem registro na ANEEL, licena ambiental e terras arrendadas para posterior

    construo quanto projetos em estgios bem menos avanados de desenvolvimento.

    Considerando todos eles, a Renova Energia tem um potencial portflio de projetos de gerao

    elica de 2.205,70 MW, que seriam distribudos em 77 diferentes parques elicos, e 1.467,50

    MW em projetos de PCHs. A grande questo, porm, diz respeito a sua qualidade e

    rentabilidade, que poder ser verificada ao longo dos prximos anos, conforme a empresa

    tenha sucesso em implement-los ou no.

  • 51

    4 REVISO CONCEITUAL

    Existem diversos conceitos, metodologias e ferramentas que podem ser aplicados na avaliao

    de projetos. Os mais relevantes e comumente utilizados sero abordados nesse captulo, com o

    intuito de desenvolver o referencial terico necessrio s anlises elaboradas no captulo 5.

    Assim, nesse captulo, sero abordados os seguintes conceitos:

    Perodo de payback;

    VPL (Valor Presente Lquido);

    TIR (Taxa Interna de Retorno);

    Custo do capital prprio;

    WACC (Weighted Average Cost of Capital);

    Fluxo de Caixa Livre para o Acionista (FCFE, do ingls Free Cash Flow to Equity)

    Fluxo de Caixa Livre para a Empresa (FCFF, do ingls Free Cash Flow to Firm).

    4.1 PERODO DE PAYBACK

    De acordo com Damodaran (2002), o perodo de payback de um projeto a medida de

    quanto tempo os fluxos de caixa gerados pelo projeto levam para cobrir o investimento

    inicial.

    Um detalhe muito importante dessa metodologia que ela utiliza os fluxos de caixa nominais

    do projeto, de forma que o valor que o dinheiro possui no tempo7 no levado em conta na

    anlise.

    7 Valor do dinheiro no tempo: intuitivo que R$1,00 hoje vale mais do que R$1,00 daqui a um ano, dado que

    esse montante pode, por exemplo, ser aplicado em uma caderneta de poupana, que remunerar a aplicao com

    o pagamento de juros.

  • 52

    Como exemplo de utilizao do mtodo, h o fluxo de caixa abaixo ilustrado. (Considera-se,

    para todos os exemplos desse captulo, que os fluxos de caixa ocorrem no final de cada

    perodo de tempo).

    $200 $200 $200 $200$200 $200$200

    $1000 Figura 9: Exemplo de fluxo de caixa de um projeto.

    Fonte: Elaborao do autor.

    Nesse caso, o projeto demanda um investimento inicial de $1.000 no ano zero e possui fluxos

    positivos de $200 nos demais anos de modo que, em cinco anos, o projeto se paga, ou seja,

    seus fluxos de caixa nominais j se igualam ao investimento inicial requerido.

    Essa metodologia pode ser aplicada na deciso de investimentos atravs da determinao de

    um tempo mximo de payback aceitvel para os projetos. Assim, projetos com um perodo de

    payback maior do que o limite determinado so excludos e projetos com perodo de payback

    menor ou igual so aceitos.

    Uma grande crtica que se faz a essa metodologia, porm, que ela despreza o que acontece

    com o projeto uma vez que o investimento inicial foi recuperado e isso pode levar o tomador

    de deciso a uma escolha equivocada caso ele use o perodo de payback como nico critrio

    de deciso. A figura 7 abaixo ilustra bem essa situao.

  • 53

    $100 $200 $300 $2000$400 $1200$800

    $1000

    Projeto A

    $500 $500 $100 $100$100 $100$100

    $1000

    Projeto B

    Figura 10: Comparao de dois projetos com perodos de payback diferentes.

    Fonte: Elaborao do autor.

    Nesse caso, o projeto A possui um perodo de payback maior que o projeto B (quatro anos e

    dois anos, respectivamente). Contudo, uma vez pago o investimento inicial, ele proporciona

    fluxos de caixa bem maiores que os de B de modo que a escolha de B como melhor

    alternativa de investimento duvidosa.

    Como ser apresentado a seguir, existem outras ferramentas mais completas para a tomada de

    decises de projetos, que levam em conta aspectos relevantes desprezados pela metodologia

    do payback. De qualquer maneira, ela no deve ser necessariamente descartada. Como sugere

    Damodaran (2002), ela pode ser utilizada como um critrio secundrio de deciso ou como

    critrio de desempate entre alternativas excludentes e semelhantes.

    4.2 VPL (VALOR PRESENTE LQUIDO)

    Damodaran (2002) define o VPL de um projeto como a soma dos valores presentes de cada

    um dos fluxos de caixa tanto positivos, quanto negativos que ocorrem atravs da vida do

    projeto. Ele pode ser calculado atravs da seguinte frmula:

  • 54

    Equao 2: Clculo do VPL de um projeto. Fonte: Damodaran (2002)

    Onde,

    VPL = Valor presente lquido;

    = Fluxo de caixa no perodo ;

    r = taxa de desconto;

    N = vida do projeto.

    O clculo do VPL pode ser feito sob duas perspectivas diferentes. A primeira seria a

    perspectiva de todos os investidores da empresa que implementa o projeto e ela implica no

    clculo do Fluxo de Caixa Livre para Empresa como o fluxo de caixa dos diferentes perodos

    do projeto e no uso do WACC como taxa de desconto. A outra perspectiva que resta

    daqueles que investiram somente nas aes da empresa em questo de modo que o fluxo de

    caixa a ser utilizado o Fluxo de Caixa Livre para o Acionista e a taxa de desconto o custo

    do capital desse acionista. Assim, fundamental que se tenha claro qual a perspectiva

    adotada e quais so os fluxos de caixa e taxa de desconto que essa perspectiva implica pois

    uma confuso entre os diferentes tipos de fluxos de caixa e taxas de desconto significa um

    clculo totalmente equivocado do VPL.

    O critrio de deciso para a aceitao ou no do projeto simples:

    Se VPL > 0 deve-se aceitar o projeto;

    Se VPL < 0 deve-se rejeitar o projeto.

    Isso porque um VPL positivo indica que o projeto capaz de gerar um retorno maior que o

    mnimo exigido para o investimento (representado pela taxa de desconto) enquanto que um

    VPL negativo indica o contrrio.

    O fluxo de caixa representado pela figura 6 ser utilizado novamente como exemplo.

    Considerando que ele apresenta o FCFE do projeto e assumindo um custo de capital anual de

    5% obtm-se um VPL de $157,27, que indica que ele deve ser aceito. Assumindo um custo de

  • 55

    capital mais elevado, de 10%, o VPL seria -$26,32, indicando que o projeto deve ser

    rejeitado.

    4.3 TIR (TAXA INTERNA DE RETORNO)

    A TIR trata-se da taxa de desconto que iguala o VPL de uma oportunidade de investimento a

    zero (porque o valor presente das entradas de caixa se iguala ao investimento inicial)

    (Gitman, 2004). Em outras palavras, a TIR calcula qual a rentabilidade do projeto analisado.

    Matematicamente, a TIR o valor da varivel r da seguinte equao:

    Equao 3: Clculo da TIR de um projeto. Fonte: Gitman (2004)

    Onde,

    = Fluxo de caixa no perodo t;

    r = TIR;

    N = vida do projeto.

    Os critrios de deciso baseados no uso da TIR so os seguintes:

    Se TIR > taxa de desconto, deve-se aceitar o projeto;

    Se TIR < taxa de desconto, deve-se rejeitar o projeto.

    Assim como para o critrio do VPL, aqui tambm necessrio manter a coerncia entre os

    fluxos de caixa e a taxa de desconto utilizados, ou seja, para o FCFF utiliza-se o WACC como

    taxa de desconto enquanto que para o FCFE utiliza-se o custo de capital do acionista.

    Voltando mais uma vez ao exemplo do projeto ilustrado na figura 6, ao calcular a sua TIR,

    obtm-se o valor de 9,2%, ou seja, essa a rentabilidade que o projeto em questo

    proporciona. Observa-se que esse resultado est de acordo com as concluses obtidas quando

  • 56

    ele foi analisado atravs do mtodo do VPL. Para uma taxa de desconto de 10%, o VPL do

    projeto era negativo e para uma taxa de desconto de 5% ele era positivo. Assim, um VPL nulo

    deveria ser necessariamente obtido para uma taxa de desconto pertencente ao intervalo 5% < r

    < 10%, como verificou-se agora.

    importante ressaltar que nem sempre a TIR capaz de calcular corretamente o retorno dos

    projetos analisados. Isso pode acontecer quando ela empregada no clculo de projetos de

    investimento no convencionais (onde h inverso no sinal do fluxo de caixa do projeto por

    mais de uma vez), como comenta Assaf Neto (2008).

    Nessa situao, o clculo da TIR que, observando-se novamente a equao 3, nada mais

    do que a soluo para uma equao polinomial de grau t pode levar a trs tipos de solues

    diferentes, que so:

    O projeto possui uma nica TIR (o polinmio de grau t possui apenas uma raiz real);

    O projeto possui mais de uma TIR (o polinmio de grau t possui mais de uma raiz

    real);

    No possvel determinar a TIR do projeto (o polinmio de grau t no possui raiz

    real).

    Finalmente, h uma ltima observao importante que deve ser feita sobre a TIR. Por se tratar

    de uma ferramenta que mede o retorno de projetos em termos percentuais e no em valores

    monetrios (como o caso do VPL), ela s pode ser utilizada para verificar se um projeto

    vivel ou no, ou seja, se o seu retorno maior que a taxa de desconto. Utiliz-la na

    comparao entre diferentes projetos para afirmar que um projeto A, por exemplo, deve ser

    feito em detrimento do projeto B pois A tem uma TIR maior errado.

  • 57

    4.4 CUSTO DO CAPITAL PRPRIO

    Como definido por Assaf Neto (2008), o custo do capital prprio, representado pelo smbolo

    , revela o retorno desejado pelos acionistas de uma empresa em suas decises de aplicao

    de capital prprio.

    Para quantific-lo, existe um mtodo derivado do modelo de precificao de ativos conhecido

    como CAPM (sigla em ingls para Capital Asset Pricing Model), desenvolvido pelos

    professores Harry Markowitz e William F. Sharpe. Conforme comenta Assaf Neto (2008),

    esse um modelo de grande importncia e de uso bastante generalizado entre analistas

    financeiros e investidores de mercado. Antes de sua descrio, vale ressaltar que a

    determinao do custo do capital prprio constitui o segmento de estudo mais complexo das

    finanas corporativas, assumindo diversas hipteses e abstraes tericas em seus clculos

    (Assaf Neto, 2008). Alm disso, como discutido por Brigham (1999), a simples verdade

    que ns no sabemos precisamente como medir nenhum dos inputs necessrios para

    implementar o CAPM uma vez que eles dependem de decises arbitrrias de quem est

    implementando o mtodo.

    Para o seu clculo, proposta a seguinte frmula matemtica:

    Equao 4: Clculo do custo do capital prprio. Fonte: Assaf Neto (2008)

    Onde,

    = taxa de retorno mnima requerida pelos investidores do ativo (custo de capital prprio);

    = taxa de retorno de ativos livres de risco;

    = coeficiente beta, medida do risco do ativo em relao ao risco sistemtico da carteira do mercado;

    = rentabilidade oferecida pelo mercado em sua totalidade e representada pela carteira de mercado.

    Assim, para o clculo do custo do capital prprio so necessrios trs inputs: a taxa de retorno

    dos ativos livres de risco8 ( ; o coeficiente e a rentabilidade oferecida pelo mercado

    .

  • 58

    Para a taxa de reto